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AULA 02 DIREITO CIVIL – PARTE GERAL PRINCÍPIOS – PESSOA NATURAL – TEORIAS DO INÍCIO DA PERSONALIDADE PRINCÍPIOS DO DIREITO CIVIL • SOCIALIDADE O Código Civil de 1916 era individualista, preocupava-se com a tutela individual da pessoa. Diferentemente, o Código Civil de 2002 preocupa-se com a impactação coletiva no exercício de direitos, ou seja, de que forma o exercício de um direito, pelo seu titular, irá impactar sobre a coletividade. Assim, TODOS os institutos do Direito Civil devem cumprir uma função social. Com a vigência do Código Civil de 2002, passará a prevalecer os direitos coletivos sobre os individuais, respeitando os direitos fundamentais da pessoa humana. Ex.: princípio da função social do contrato, da propriedade, entre outros. Art. 421. A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato. Art. 1.228. § 1º O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas. • ETICIDADE Trata-se da interpretação dos institutos do Direito Civil de maneira ética, ou seja, no exercício de um direito o titular deverá respeitar certos limites, nem tudo será possível. Como exemplo, cita-se o art. 422 do CC que prevê que os contratantes devem agir de boa-fé (objetiva), ou seja, de forma ética. • OPERABILIDADE Também chamada de concretude. Significa que a interpretação das normas de Direito Civil deve ser feita de maneira simples, todos os direitos garantidos no Código Civil devem ser facilmente compreendidos, o titular deve entender com facilidade quais são os seus direitos, o sistema deve ser facilmente operável, deve-se evitar expressões difíceis, conceitos complexos. PESSOA NATURAL 1. CONCEITOS INICIAIS Importante consignar que, no plano do Direito Civil, não se deve utilizar a expressão “pessoa física” ou “homem” (CC/16), mas sim pessoa natural ou pessoa humana (art. 1º, III, CF). 1.1. CAPACIDADE DE DIREITO OU DE GOZO O art. 1º do CC consagra a capacidade de direito ou de gozo, conferida a TODAS as pessoas, sem distinção. Art. 1º - Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil. Segundo Orlando Gomes, a capacidade de direito (todos têm) confunde-se com a noção de personalidade, porque toda pessoa é capaz de direitos. De acordo com o autor, não há diferença fundamental entre capacidade de direito e personalidade, são faces da mesma moeda. 1.2. CAPACIDADE DE FATO OU DE EXERCÍCIO Consiste na capacidade de exercer direitos, há pessoas (incapazes – arts. 3º e 4º do CC) que não a possuem. Em regra, a capacidade de direito pressupõe a capacidade de fato. Capacidade de Direito Capacidade de Fato Capacidade Civil Plena 1.3. LEGITIMAÇÃO Trata-se de capacidade especial para determinado ato ou negócio jurídico. De acordo com Calmon de Passos, é a pertinência subjetiva para a prática de determinado ato, ou seja, mesmo capaz, uma pessoa pode estar impedida de praticar determinado ato. Neste caso, falta-lhe legitimidade. A legitimação está ligada a prática de um ato específico ao passo que a capacidade possui um significado genérico. Já Venosa entende que a legitimação é uma forma específica de capacidade para determinados atos da vida civil. A legitimação é um ‘plus’ que se agrega à capacidade em determinadas situações. Exemplos: é o caso de dois irmãos, de sexo diferente que mesmo capazes, não podem se casar entre si (art. 1521, IV CC). O tutor não poderá adquirir bens móveis ou imóveis do tutelado (art. 1.749, I, CC). A venda de imóveis, no regime de comunhão de bens, precisa da outorga conjugal. 1.4. LEGITIMIDADE É capacidade processual, isto é, capacidade específica para o processo, conforme disposto no art. 17 do CPC/15. Art. 17. Para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade. Apesar de não se confundirem, a própria lei, em alguns casos, utiliza as expressões “legitimidade” e “legitimação” como sinônimas. Cita-se, como exemplo, o art. 12 do CC. Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei. Parágrafo único. Em se tratando de morto, terá legitimação LEGITIMIDADE para requerer a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau. 1.5. PERSONALIDADE Trata-se da soma de caracteres ou aptidões da pessoa, quem ela é para sim e para a sociedade. Obs.: Capacidade é medida da personalidade (quantum), é apenas um de seus aspectos. Sendo a personalidade um “quid”, ou seja, a essência da pessoa. 2. INÍCIO DA PERSONALIDADE Conforme art. 2º do CC, a personalidade civil da pessoa inicia-se a partir do nascimento com vida, mas a lei protege, desde a concepção, os direitos do nascituro. Art. 2º. A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. “Nascer com vida” significa operar-se o funcionamento do aparelho cardiorrespiratório do recém-nascido, independentemente da forma humana e de tempo mínimo de sobrevida em respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana. CC Espanhol: “somente se reputará nascido o feto que tiver figura humana e um tempo de sobrevida de 24hrs” – no Brasil tal disposição seria impossível em face do princípio acima citado. COMO A QUESTÃO JÁ FOI COBRADA EM CONCURSO: MP/SP: “Consiga separar-se por inteiro ou parcialmente do ventre materno respirando, mediante parto natural ou intervenção cirúrgica, pouco importando que o cordão umbilical seja rompido, que seja viável ou não, e que não tenha necessariamente a forma humana”. Correto! “Nascituro” é aquele que foi concebido, mas ainda não nasceu. 2.1. TEORIAS EXPLICATIVAS DO NASCITURO A segunda parte do art. 2º CC, ao se referir ao nascituro (aquele que ainda, embora concebido, não nasceu), reconhece direitos em seu favor. Ora, se o nascituro é dotado de direitos não deveria também ser considerado uma pessoa? A doutrina diverge a este respeito construindo três teorias fundamentais: a Teoria Natalista, a Teoria Concepcionista e a Teoria Da Personalidade Condicionada. 2.1.1. TEORIA NATALISTA Defendida por Silvio Rodrigues, Caio Mário, Eduardo Espínola, Vicente Ráo, Venosa. Sustenta que a personalidade só seria adquirida a partir do nascimento com vida, de maneira que o nascituro não seria considerado pessoa, gozando de mera expectativa de direito. É a teoria clássica. 2.1.2. TEORIA DA PERSONALIDADE CONDICIONADA Entende que o nascituro só será considerado pessoa SE nascer com vida, o nascituro possui direitos sob condição suspensiva. Vale dizer, ao ser concebido, já pode titularizar alguns direitos (extrapatrimoniais), como o direito à vida, mas só adquire completa personalidade, quando implementada a condição do seu nascimento com vida. No entendimento de Flávio Tartuce, equivale a teoria natalista. 2.1.3. TEORIA CONCEPCIONISTA Possui influência francesa, defendida por Silmara Chinelato, Teixeira de Freitas, Maria Helena Diniz, Giselda Hironaka, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona, Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald. Para esta teoria, o nascituro seria considerado pessoa desde a concepção, inclusive para efeitos patrimoniais, razão pela qual seria titular de direito e não de mera expectativa. Se ele nasce com vida, este nascimento retroage seus efeitos à concepção. A teoria da “Personalidade Formal” (desdobramento da Teoria Concepcionista), citada por MHD, afirma que o nascituro na vida intrauterina tem personalidade jurídica formal, no que atina a direitos personalíssimose aos de personalidade, passando a ter personalidade jurídica material, alcançando os direitos patrimoniais, que permaneciam em estado potencial, somente com o nascimento com vida. Se nascer com vida, adquire personalidade jurídica material, mas se tal não ocorrer, nenhum direito patrimonial terá. Independentemente de qualquer teoria, o nascituro tem proteção. Com base na doutrina de Clóvis Beviláqua, ainda aplicável ao novo sistema, podemos dizer que o legislador aparentemente abraça a teoria natalista por ser mais prática, mas sofre forte e inequívoca influência da teoria concepcionista, pois o sistema jurídico reconhece ao nascituro diversos direitos como pessoa. Salienta-se que na doutrina prevalece a Teoria Concepcionista, inclusive consagrada no Enunciado 1, da I JDC. Enunciado 1 - A proteção que o Código defere ao nascituro alcança o natimorto no que concerne aos direitos da personalidade, tais como: nome, imagem e sepultura. Ao encontro da teoria concepcionista, reforçando a tese de que o nascituro é um sujeito de direito, poderíamos apontar em nosso sistema, importantes direitos a ele reconhecidos: direito à vida, à proteção pré-natal, direito de receber doação e herança (caiu Defensoria/MG), tutela penal do aborto e nomeação de curador. Salienta-se que no STJ prevalece a Teoria Concepcionista, reconhece o cabimento de dano moral pela morte do pai do nascituro ocorrida antes do seu nascimento. STJ - AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. NASCITURO. PERDA DO PAI. 1.- Não há falar em omissão, contradição ou obscuridade no acórdão recorrido, que apreciou todas as questões que lhe foram submetidas de forma fundamentada, ainda que de modo contrário aos interesses da Recorrente. 2.- "O nascituro também tem direito aos danos morais pela morte do pai, mas a circunstância de não o ter conhecido em vida tem influência na fixação do quantum" (...) (STJ - AgRg no AgRg no AREsp: 150297 DF 2012/0041902-2, Relator: Ministro SIDNEI BENETI, Data de Julgamento: 19/02/2013, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/05/2013). Além disso, o STJ possui posição consolidada acerca do cabimento de indenização por seguro DPVAT pela morte do nascituro. SEGURO DPVAT. MORTE. NASCITURO. Trata-se de REsp em que se busca definir se a perda do feto, isto é, a morte do nascituro, em razão de acidente de trânsito, gera ou não aos genitores dele o direito à percepção da indenização decorrente do seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre (DPVAT). Para o Min. Paulo de Tarso Sanseverino, voto vencedor, o conceito de dano-morte como modalidade de danos pessoais não se restringe ao óbito da pessoa natural, dotada de personalidade jurídica, mas alcança, igualmente, a pessoa já formada, plenamente apta à vida extrauterina, embora ainda não nascida, que, por uma fatalidade, teve sua existência abreviada em acidente automobilístico, tal como ocorreu no caso. Assim, considerou que sonegar o direito à cobertura pelo seguro obrigatório de danos pessoais consubstanciados no fato ‘morte do nascituro’ entoaria, ao fim e ao cabo, especialmente aos pais já combalidos com a incomensurável perda, a sua não existência, malogrando- se o respeito e a dignidade que o ordenamento deve reconhecer, e reconhece inclusive, àquele que ainda não nascera (art. 7º da Lei n. 8.069/1990, Estatuto da Criança e do Adolescente). Consignou não haver espaço para diferenciar o filho nascido daquele plenamente formado, mas ainda no útero da mãe, para fins da pretendida indenização ou mesmo daquele que, por força do acidente, acabe tendo seu nascimento antecipado e chegue a falecer minutos após o parto. Desse modo, a pretensa compensação advinda da indenização securitária estaria voltada a aliviar a dor, talvez não na mesma magnitude, mas muito semelhante à sofrida pelos pais diante da perda de um filho, o que, ainda assim, sempre se mostra quase impossível de determinar. Por fim, asseverou que, na hipótese, inexistindo dúvida de quem eram os ascendentes (pais) da vítima do acidente, devem eles figurar como os beneficiários da indenização, e não como seus herdeiros. Diante dessas razões, entre outras, a Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, deu provimento ao recurso. Cumpre registrar que, para o Min. Relator (vencido), o nascituro não titulariza direitos disponíveis/patrimoniais e não detém capacidade sucessória. Na verdade, sobre os direitos patrimoniais, ele possui mera expectativa de direitos, que somente se concretizam (é dizer, incorporam-se em seu patrimônio jurídico) na hipótese de ele nascer com vida. Dessarte, se esse é o sistema vigente, mostra-se difícil ou mesmo impossível conjecturar a figura dos herdeiros do natimorto, tal como propõem os ora recorrentes.” Precedente citado: REsp 931.556-RS, DJe 5/8/2008. (REsp 1.120.676- SC, Rel. originário Min. Massami Uyeda, Rel. para acórdão Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 7/12/2010 - DJe: 04/02/2011).
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