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Interceptação das comunicações telefônicas e ambientais 1. Terminologia a) Comunicações telefônicas: abrange não apenas a conversa por telefone, mas também a transmissão, emissão ou recepção de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza, por meio de telefonia estática ou móvel. Assim, é possível a interceptação de qualquer comunicação via telefone, conjugada ou não com a informática (abrange mensagens via internet, e-mail, correios eletrônicos, etc). b) Comunicação ambiental: é aquela realizada diretamente no meio ambiente, sem transmissão e recepção por meios físicos artificiais. É a conversa mantida entre duas ou mais pessoas em qualquer recinto, privado ou público. c) Interceptação telefônica ou ambiental em sentido estrito: consiste na captação da comunicação alheia por um terceiro, sem o conhecimento de nenhum dos comunicadores. d) Escuta telefônica ou ambiental: é a captação da comunicação efetuada por um terceiro, com o conhecimento de um dos interlocutores. ⤿ A Lei 9.296/96 abrange tanto a interceptação em sentido estrito quanto a escuta. Art. 5º XII, CF - É inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal; Art. 5º X, CF - São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; e) Gravação telefônica ou ambiental clandestina: é a gravação da comunicação por um dos interlocutores, normalmente sem conhecimento do outro. Em regra, é prova lícita, mesmo sem autorização judicial, sobretudo quando utilizada como: - Meio de defesa; - Em razão de investida criminosa; - Se não há obrigação de guardar segredo; - Não há violação de sigilo. ⤿ Gravação clandestina de eventual confissão de suspeito sem prévia advertência quanto ao direito ao silêncio: é prova ilícita. ⤿ Sistema de viva-voz: quando não houver consentimento do investigado ou autorização judicial, são consideradas ilícitas as provas obtidas pela polícia por meio de conversas realizadas entre ele e outras pessoas pelo sistema de viva-voz de telefones (STJ). ⤿ Crime contra incapaz e consentimento do genitor para a gravação das comunicações telefônicas: não há ilicitude, pois o genitor age na qualidade de representante civil do menor. → Não confundir com acesso a dados já armazenados em algum dispositivo eletrônico: a cláusula de reserva de jurisdição se limita à comunicação dos dados (informações dinâmicas), e não aos dados em si (informações estáticas). → Na hipótese de equipamento (computador, pen drive, HD externo...) apreendido em busca e apreensão domiciliar, o próprio mandado judicial pode facultar o acesso às informações que nele constem. ⤿ Extração de dados e conversas registradas em celulares apreendidos: a 6ª turma do STJ decidiu que, pelo menos em regra, há necessidade de autorização judicial prévia. Exceções: - Aparelho celular de vítima morta; - Situação excepcional que justifique o acesso imediato; - Autorização do proprietário; - Aparelho com propriedade desconhecida; * Acesso exclusivo aos registros telefônicos e agenda do celular. ⤿ Quando o aparelho celular se tratar do próprio corpo de delito, ou seja, quando a própria materialidade do crime se encontrar plasmada em fotografias armazenadas no aparelho, a autorização judicial não será imprescindível. ⤿ É impossível aplicar analogia entre a interceptação telefônica e o espelhamento do whatsapp por meio do whatsapp web, vez que neste caso o investigador de polícia tem possibilidade de atuar como participante (e não mero espectador) das conversas, ou mesmo de alterar e apagar mensagens antigas. ⤿ Também é ilegal a quebra do sigilo telefônico mediante habilitação de chip da autoridade policial em substituição ao do investigado titular da linha. 2. Natureza jurídica a) Comunicações telefônicas ou ambientais: fonte de prova; b) Interceptação telefônica ou ambiental: meio de obtenção de prova; c) Gravação da interceptação das comunicações: materialização da fonte de prova; d) Transcrição das gravações: meio de prova. 3. Quebra do sigilo de dados Consiste na utilização ou divulgação de informações privadas contidas em transações bancárias (dados bancários), em declarações da Receita Federal (dados fiscais), registros das operadoras de telefonia (dados telefônicos) ou arquivos eletrônicos (dados informáticos). Dados são informações pretéritas/estáticas. Não estão sujeitos à cláusula de reserva de jurisdição, pois a quebra do sigilo pode ser decretada por CPI. [resumo const] 3.1 Acesso aos dados cadastrais de vítimas e de suspeitos Previsto na lei de lavagem de capitais, na lei das organizações criminosas e no art. 13-A do CPP. Independe de prévia autorização judicial. 3.2 Requisição de informações acerca das estações radio base (ERBs) A antena possibilita a localização aproximada de um aparelho celular, e consequentemente das zonas de inclusão (perto do crime) e exclusão (longe do crime). Art. 13-B. Se necessário à prevenção e à repressão dos crimes relacionados ao tráfico de pessoas, o membro do Ministério Público ou o delegado de polícia poderão requisitar, mediante autorização judicial, às empresas prestadoras de serviço de telecomunicações e/ou telemática que disponibilizem imediatamente os meios técnicos adequados - como sinais, informações e outros - que permitam a localização da vítima ou dos suspeitos do delito em curso. § 1o Para os efeitos deste artigo, sinal significa posicionamento da estação de cobertura, setorização e intensidade de radiofrequência § 2o Na hipótese de que trata o caput, o sinal: I - não permitirá acesso ao conteúdo da comunicação de qualquer natureza, que dependerá de autorização judicial, conforme disposto em lei; II - deverá ser fornecido pela prestadora de telefonia móvel celular por período não superior a 30 (trinta) dias, renovável por uma única vez, por igual período; III - para períodos superiores àquele de que trata o inciso II, será necessária a apresentação de ordem judicial. § 3o Na hipótese prevista neste artigo, o inquérito policial deverá ser instaurado no prazo máximo de 72 (setenta e duas) horas, contado do registro da respectiva ocorrência policial. § 4o Não havendo manifestação judicial no prazo de 12 (doze) horas, a autoridade competente requisitará às empresas prestadoras de serviço de telecomunicações e/ou telemática que disponibilizem imediatamente os meios técnicos adequados - como sinais, informações e outros - que permitam a localização da vítima ou dos suspeitos do delito em curso, com imediata comunicação ao juiz. ⤿ Em razão da controvérsia entre o caput e o §4º, existem dois posicionamentos acerca da necessidade de prévia autorização judicial: - 1ª corrente: não é necessário; - 2ª corrente (STJ): é necessário → Não é possível a quebra de sigilo de dados informáticos estáticos (registros de geolocalização) nos casos em que haja a possibilidade de violação da intimidade e vida privada de pessoas não diretamente relacionadas à investigação criminal – vedação ao fishing expedition ou da interceptação de prospecção (STJ). 3.3 Requerimento de guarda dos registros por prazo superior ao legal Os registros de conexão devem ser guardados pelo provedor pelo prazo de 1 ano. A autoridade policial ou administrativa, ou o MP, pode requerer cautelarmente que os registros sejam guardados por prazo superior, sem necessidade de prévia autorização judicial. 4. Finalidade da interceptação telefônica Segundo a CF, o sigilo das comunicações é inviolável, exceto para fins de investigação criminal ou instrução processualpenal, mediante ordem do juiz competente (art. 1º da Lei 9296/96). → É possível a utilização dos elementos probatórios decorrentes da interceptação em eventual processo administrativo, com natureza de prova emprestada. Por outro lado, o mesmo não é possível em processo cível. 5. Requisitos Além da ordem do juiz competente, para prova em investigação criminal ou instrução processual, a interceptação de comunicações não será admitida: → A interceptação só será deferida quando não houver outros meios de prova disponíveis à época na qual a medida invasiva foi requerida, sendo ônus da defesa demonstrar violação ao disposto no art. 2º, II. • Teoria do juízo aparente: é válida tanto para a interceptação quanto para qualquer medida cautelar. Se, no momento inicial das investigações, as aparências levarem a crer que a competência seria de determinado juiz, caso ele se revele incompetente em momento posterior, eventuais medidas por ele decretadas não serão consideradas ilícitas. • Crimes de catálogo: são os crimes que admitem interceptação telefônica, exigindo-se a lei que sejam puníveis com pena de reclusão. 6. Encontro fortuito de elementos probatórios em relação a outros fatos delituosos ou outras pessoas (serendipidade) A teoria da serendipidade significa sair ao encontro de uma coisa e se encontrar outra, até mais valiosa que a procurada. Doutrina e jurisprudência entendem que se o encontro foi casual, há possibilidade Art. 2° Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando ocorrer qualquer das seguintes hipóteses: I - não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal; II - a prova puder ser feita por outros meios disponíveis; III - o fato investigado constituir infração penal punida, no máximo, com pena de detenção. Parágrafo único. Em qualquer hipótese deve ser descrita com clareza a situação objeto da investigação, inclusive com a indicação e qualificação dos investigados, salvo impossibilidade manifesta, devidamente justificada. de aproveitar os elementos, até mesmo se o delito for punido com detenção. ⤿ Para o Min. Alexandre de Moraes, a prova é considerada lícita, mesmo que o “crime achado” não tenha relação com o delito que estava sendo investigado, desde que tenham sido respeitados os requisitos constitucionais e legais e desde que não tenha havido desvio de finalidade ou fraude. → As provas coletadas a partir da interceptação podem subsidiar denúncia com base em crimes puníveis com pena de detenção, desde que conexos aos tipos penais que justificaram a interceptação. → Encontro fortuito de diálogos mantidos com autoridade dotada de foro por prerrogativa de função e momento adequado para a remessa dos autos ao Tribunal competente: a jurisprudência do STF é no sentido de que a simples menção ao nome de autoridade detentora de prerrogativa de foro é insuficiente para o deslocamento da competência para o juízo hierarquicamente superior. 7. Duração da interceptação Prazo máximo de 15 dias, podendo ser sucessivamente prorrogado, desde que demonstrada a necessidade da medida (art. 5º). São ilegais as motivações padronizadas. Há precedentes nos Tribunais Superiores admitindo, em caráter excepcional, a fixação de prazo de 30 dias consecutivos para execução da interceptação. 8. Transcrição da gravação das conversas interceptadas Não há necessidade de transcrição integral das gravações. A transcrição não precisa ser feita por perito. O espectrograma da voz (perícia de análise da voz) não é obrigatório. A conversão do conteúdo das interceptações em formato escolhido pela defesa não é ônus atribuído ao Estado. → Apesar disso, é necessário que se mantenha íntegra a cadeia de custódia: se parte das provas obtidas a partir da interceptação for extraviada, ou o conteúdo dos áudios não for disponibilizado da forma como captado, havendo descontinuidade nas conversas e na sua ordem, com omissão de alguns áudios, ocorrerá a quebra na cadeia de custódia e a lesão ao direito à prova, ensejando a anulação das provas produzidas nas interceptações. 9. Interceptação e escuta ambiental → Interceptação telefônica: infração penal punida com reclusão, independentemente do quantum ≠ interceptação ambiental: infração penal com pena máxima superior a 4 anos ou em infrações penais conexas (independe se detenção/reclusão, mas depende do quantum). 9.1 (Des)necessidade de prévia autorização judicial Segundo a doutrina, a captação ambiental estaria sujeita ao art. 5º, X da CF, que não exige autorização judicial (diferente do que ocorre para a interceptação telefônica). Assim, de acordo com a doutrina, a captação ambiental poderia ser feita sem autorização judicial, considerando as seguintes hipóteses: a) Captação de conversa alheia mantida em local público: não haveria necessidade de autorização; b) Captação de conversa alheia mantida em local público, porém em caráter sigiloso, expressamente admitido pelos interlocutores: haveria necessidade de autorização; Art. 8º-A. Para investigação ou instrução criminal, poderá ser autorizada pelo juiz, a requerimento da autoridade policial ou do Ministério Público, a captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos, quando: I - a prova não puder ser feita por outros meios disponíveis e igualmente eficazes; e II - houver elementos probatórios razoáveis de autoria e participação em infrações criminais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos ou em infrações penais conexas. c) Captação de conversa alheia mantida em local privado: haveria necessidade de autorização. ⤿ Contudo, o pacote anticrime não fez nenhuma distinção entre local público/privado, de modo que, pela literalidade do art. 8º-A, exige-se prévia autorização judicial para ambos os casos. 9.2 Possibilidade de ingresso em domicílio no período noturno para fins de instalação de equipamentos destinados à captação de sinais óticos ou acústicos - 1ª corrente (minoritária): impossibilidade de instalação de dispositivos no interior da casa, inclusive durante o dia; - 2ª corrente (majoritária – literalidade do artigo): possibilidade de instalação de dispositivos no interior da casa, exclusivamente durante o dia; - 3ª corrente (já foi orientação do STF): possibilidade de instalação de dispositivos de captação ambiental no interior da casa, inclusive no período noturno. 9.3 Procedimento e requisitos para a captação ambiental - Requisitos: 1. Para investigação ou instrução criminal; 2. Autorização do juiz competente; 3. A requerimento da autoridade policial ou MP; § 2º A instalação do dispositivo de captação ambiental poderá ser realizada, quando necessária, por meio de operação policial disfarçada ou no período noturno, exceto na casa, nos termos do inciso XI do caput do art. 5º da Constituição Federal. 4. Quando a prova não puder ser feita por outros meios disponíveis; 5. Infração com pena máxima superior a 4 anos ou infrações conexas. - Prazo de 15 dias, renovável por iguais períodos, desde que comprovada a indispensabilidade da medida e quando presente atividade criminosa permanente, habitual ou continuada. ⤿ Reputa-se lícita, pelo menos em regra, a gravação ambiental clandestina, passível de utilização tanto em favor da acusação quanto da defesa, mesmo que desprovida de prévia autorização judicial. § 4º A captação ambiental feita por um dos interlocutores sem o prévio conhecimento da autoridade policial ou do Ministério Público poderá ser utilizada, em matéria de defesa, quando demonstrada a integridade da gravação.
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