Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Carla Bertelli – 4° Período – Compreender a classificação e epidemiologia do Aborto – Entender o quadro clínico do aborto (completo, retido, incompleto, infectado e inevitável) – Analisar o tratamento mecânico e farmacológico do aborto – Discutir as condutas para o aborto previstas na Legislação é çã A OMS, na CID-11, define abortamento como a interrupção da gestação com menos de 20 semanas ou com produto da concepção (embrião ou feto), pesando menos de 500g. Levando-se em conta a viabilidade do produto conceptual, considera-se abortamento a interrupção da gestação antes do feto ser capaz de sobreviver fora do útero. No Brasil, o Ministério da Saúde define como abortamento a interrupção da gravidez até a 20° ou 22° semana e com produção da concepção menor de 500g. Quanto à intenção e cronologia o abortamento pode ser classificado em: • à çã : pode ser espontâneo, se ocorrer sem ação deliberada de qualquer natureza, ou induzido/provocado, caso a interrupção antes de alcançadas as condições mínimas de sobrevivência extrauterina • à : é denominado como precoce quando a perda ocorre até 12 semanas, e tardio se ocorrer entre 12 e 20 semanas. A perda precoce da gravidez, que ocorre no primeiro trimestre, é o tipo mais comum. Os sintomas inespecíficos de sangramento vaginal e cólicas uterinas associados à perda gestacional podem ocorrer em gestações normais, ectópicas e molares, o que pode ser uma fonte de frustração para as pacientes e confusão clínica para os profissionais de saúde. O abortamento representa a complicação mais frequente da gravidez. Aproximadamente uma em cada 4 mulheres terá um abortamento espontâneo durante sua vida reprodutiva. Ainda que a real incidência de abortamento seja desconhecida, entre 15 e 20% das gestações clinicamente diagnosticadas terminarão em abortamento. Etiologia do Aborto – Alterações cromossômicas, alterações endócrinas (lútea, diabetes, tireopatias, ovários policísticos), causas uterinas (mioma, sinequias intrauterinas, incompetência cervical), fatores imunológicos, trombofilias hereditárias, drogas/agentes nocivos e traumas. ç – É uma complicação frequente que ocorre em 15 a 20% das gestações. O quadro clínico caracteriza-se por sangramento vaginal em pequena quantidade, acompanhada ou não de dor em cólica na região hipogástrica. No exame ginecológico o colo uterino encontra-se fechado e o tamanho do útero é compatível com o atraso menstrual. A USG evidencia atividade cardíaca do produto conceptual, ou em idade <6 semanas, evidencia a presença de saco gestacional. Pode ter presença de hematoma subcoriônico observada à ultrassonografia entre 4 e 40% dos casos de ameaça de abortamento. Estudos mostram que hematomas subcoriônicos estão mais relacionados a risco de perda fetal. Aproximadamente 40 a 50% das mulheres que apresentam sangramento vaginal no início da gestação irão abortar. A taxa de abortamento cai consideravelmente, para 4 a 10%, se a ameaça de abortamento ocorrer após a visualização de atividade cardíaca do produto conceptual à ultrassonografia. Ainda que muito utilizada na prática clínica, não há evidências de alta qualidade que recomendações como repouso no leito, administração de gonadotrofina coriônica humana (hCG), uso de relaxantes musculares e suplementação com vitaminas, melhore o prognóstico das gestações com ameaça de abortamento. Carla Bertelli – 4° Período – Caracterizado clinicamente por sangramento moderado ou intenso, acompanhado de dor abdominal em cólica, geralmente de forte intensidade. No exame físico, dependendo da intensidade da hemorragia, pode-se evidenciar anemia, taquicardia e hipotensão arterial. No exame especular, observa-se sangramento ativo proveniente do canal cervical, geralmente com presença de restos dos produtos da concepção. O orifício interno do colo uterino encontra- se dilatado no exame de toque vaginal. A ultrassonografia pode evidenciar o descolamento ovular com saco gestacional em posição baixa e dilatação cervical. – Quando ocorre no primeiro trimestre da gravidez, principalmente nas 10 semanas iniciais, é comum a expulsão completa dos produtos da concepção. Rapidamente o útero se contrai e o sangramento, juntamente com as cólicas, diminui de intensidade. O orifício interno do colo uterino tende a fechar-se em poucas horas. Ao exame ultrassonográfico, pode não haver evidência de conteúdo uterino; algumas vezes, porém, observa-se mínima quantidade de conteúdo heterogêneo e líquido. A ultrassonografia transvaginal tem sido considerada indicativa de abortamento completo por vários autores - O abortamento incompleto é mais frequente após 10 semanas de gravidez. Nesses casos, ocorre a eliminação parcial dos produtos da concepção. O sangramento vaginal persiste e, por vezes, torna-se intermitente. O volume uterino é menor que o esperado para a idade gestacional e, no exame de toque, o orifício interno do colo uterino geralmente se encontra pérvio; contudo, algumas vezes pode se apresentar fechado, sendo o diagnóstico realizado pelos achados ultrassonográficos. À ultrassonografia, observa-se a presença de conteúdo intrauterino de aspecto amorfo e heterogêneo, com presença ou não de líquido. A medida da espessura endometrial ao corte longitudinal mediano do útero à ultrassonografia acima de 15 mm tem sido considerada indicativa de abortamento incompleto. Classicamente, o tratamento de escolha é o esvaziamento cirúrgico do conteúdo uterino, por curetagem ou aspiração manual intrauterina. Curetagem é um procedimento médico utilizado para a raspagem da cavidade uterina. – Ocorrência de morte embrionária ou fetal antes de 20 semanas de gravidez, associada à retenção do produto conceptual por período prolongado de tempo, por vezes dias ou semanas. Geralmente, as pacientes relatam cessação dos sintomas associados à gravidez (náuseas, vômitos, ingurgitamento mamário). Pode ocorrer sangramento vaginal, na maioria das vezes em pequena quantidade, de forma semelhante ao observado nos casos de ameaça de abortamento. O volume uterino é menor que o esperado para a idade gestacional e o colo uterino encontra-se fechado ao exame de toque. Atualmente, por meio de ultrassonografia transvaginal, denomina--se morte do produto conceptual a ausência de atividade cardíaca em embriões com comprimento cabeça-nádegas maior ou igual a 7 mm. Em alguns casos, ocorre a reabsorção do embrião antes da confirmação ultrassonográfica ou o desenvolvimento deste não chega a ocorrer. Essa Carla Bertelli – 4° Período situação recebe o nome de çã . Os principais critérios, por meio de ultrassonografia transvaginal, são: não visualização de embrião com diâmetro interno médio do saco gestacional maior ou igual a 25 mm – O abortamento infectado, principalmente em países em que a lei proíbe a interrupção da gestação, muitas vezes encontra-se intimamente ligado à ilegalidade, sendo sua prática realizada em condições inadequadas. Cerca de 13% das mortes maternas que ocorrem no mundo são decorrentes do abortamento induzido de forma clandestina. As bactérias envolvidas no abortamento infectado são aeróbias e anaeróbias, e merecem destaque: estreptococos beta-hemolíticos, Enterococcus spp., Escherichia coli, Peptostreptococcus spp., Bacteroides fragilis e Clostridium spp. A infecção que se inicia no útero (endomiometrite) pode se propagar para os anexos (anexite), peritônio pélvico (pelviperitonite), cavidade peritoneal (peritonite generalizada) e, ainda, disseminar-se por via hematogênica (sepse). Situação em que há restos intrauterinos e infecção. Na maioria das vezes é resultado de abortamentos provocados de forma ilegal. A paciente apresenta quadro clínico de aborto incompleto associado a sinais de infecção, como dor local importante, útero amolecido,eliminação de material com odor fétido, comprometimento do estado geral, febre e taquicardia. Nos casos não complicados a infecção está restrita ao útero. Nos casos complicados, a infecção pode se estender aos anexos, peritônio ou se generalizar e evoluir para septicemia. Geralmente são infecções polimicrobianas a partir da ascensão de germes que fazem parte da flora vaginal e intestinal, como cocos anaeróbios, gram-negativos, bacteroides e Clostriduim perfingrens (ou welchii). Nesse último caso, a paciente evolui rapidamente com quadro de icterícia cianótica e hemoglobinúria. Os índices de mortalidade são altos. á – Definido quando o produto conceptual perde a vitalidade e não existe possibilidade de evolução da gestação. A sintomatologia é mais intensa quanto à hemorragia e à dor. O colo do útero pode estar dilatado, embora o produto gestacional possa ou não ter sido eliminado total ou parcialmente. Os sinais da gravidez costumam sofrer atenuação. Pode ser completo ou incompleto. Nas amenorreias de curta duração em que o ovo é pequeno, o processo pode ser confundido com menstruação, diferenciando-se dela pela maior quantidade de sangue pela presença de embrião e decídua ao exame do material eliminado. Esse mecanismo é raro após 8 semanas. O cório frondoso bem desenvolvido fixa o ovo à decídua. A partir de 8 semanas, o processo de abortamento adquire, progressivamente, as características do trabalho de parto. O diagnóstico não oferece dificuldades. O episódio é, quase sempre, precedido por período de ameaça de abortamento; excepcionalmente, pode manifestar-se pela primeira vez no estágio de iminente expulsão. As hemorragias tendem a ser mais abundantes que as da fase de ameaça, e o sangue apresenta cor viva. O volume do útero corresponde à data da amenorreia, exceto quando a morte do ovo é antiga. O colo mostra- se permeável, notando-se as membranas herniadas pelo orifício externo na cavidade uterina. O quadro clínico inconfundível dispensa exames complementares. Carla Bertelli – 4° Período – A conduta expectante tem sido utilizada em casos selecionados de perda gestacional precoce, com taxas variadas de sucesso, dependendo principalmente do tipo de abortamento e dos sintomas das pacientes. Em casos de abortamento incompleto, esse tipo de conduta tem sido empregado há alguns anos e mostra resultados estimulantes. A conduta expectante tem sido bem tolerada pelas mulheres, desde que devidamente esclarecidas sobre os riscos e benefícios desse tipo de tratamento. Geralmente, a eliminação do produto conceptual ocorre nas primeiras semanas de acompanhamento. – O misoprostol, um análogo sintético de prostaglandina E1, foi originalmente comercializado para tratamento e prevenção de úlcera péptica em pacientes que fazem uso crônico de anti- inflamatórios não hormonais. Entretanto, por seus efeitos na contratilidade uterina e no esvaecimento cervical, esse medicamento tem sido utilizado na prática obstétrica em várias situações, como no esvaecimento cervical pré- curetagem, no tratamento medicamentoso do abortamento e do óbito fetal, na indução do trabalho de parto e na hemorragia pós-parto Após a absorção, o misoprostol é transformado em seu metabólito farmacologicamente ativo, o misoprostol ácido. O pico máximo plasmático, quando aplicado na vagina, é inferior ao da administração oral; porém, a concentração plasmática do misoprostol é sustentada por período superior a 4 horas – A mifepristona é um antagonista do receptor de progesterona que resulta em necrose decidual, separação placentária, amolecimento e dilatação do colo do útero e sensibilização do miométrio a uterotônicos, como o misoprostol . Quando usado junto com o misoprostol para o aborto medicamentoso no primeiro trimestre, o efeito combinado resulta em expulsão aprimorada e rápida dos produtos da concepção Como resultado, a combinação de mifepristone- misoprostol é mais eficaz do que qualquer uma das drogas isoladamente A mifepristona é uma antiprogestina, é um antagonista da progesterona com atividade agonista parcial. Sua administração em mulheres no início da gestação geralmente resulta em aborto do feto devido à interferência na progesterona necessária para manter a gestação. A mifepristona em geral é combinada com misoprostol, um análogo de prostaglandina (administrado por via oral ou intravaginal), para induzir contrações uterinas. O principal efeito adverso é o sangramento uterino significativo e a possibilidade de aborto incompleto. – O tratamento clássico para abortamentos, tanto de primeiro quanto de segundo trimestres, é a curetagem uterina. A complicação mais frequente é a infecção, atingindo até 10% dos casos, seguida de esvaziamento uterino incompleto (2 a 3%). Complicações com menos de 1% incluem laceração cervical, perfuração uterina, lesão de órgãos pélvicos e hemorragia. A conduta cirúrgica é indicada nas situações de urgência, como nos casos de sangramento moderado https://www.uptodate.com/contents/mifepristone-drug-information?search=F%C3%A1rmacos%20usados%20para%20aborto&topicRef=3296&source=see_link https://www.uptodate.com/contents/progesterone-drug-information?search=F%C3%A1rmacos%20usados%20para%20aborto&topicRef=3296&source=see_link https://www.uptodate.com/contents/misoprostol-drug-information?search=F%C3%A1rmacos%20usados%20para%20aborto&topicRef=3296&source=see_link https://www.uptodate.com/contents/mifepristone-and-misoprostol-united-states-not-available-drug-information?search=F%C3%A1rmacos%20usados%20para%20aborto&topicRef=3296&source=see_link https://www.uptodate.com/contents/mifepristone-and-misoprostol-united-states-not-available-drug-information?search=F%C3%A1rmacos%20usados%20para%20aborto&topicRef=3296&source=see_link Carla Bertelli – 4° Período ou intenso, na presença de infecção e ainda para aquelas mulheres que não desejam esperar a eliminação espontânea ou medicamentosa dos produtos da concepção. Nas últimas décadas, como tratamento alternativo à curetagem uterina e à aspiração elétrica a vácuo, tem- se preconizado a aspiração manual intrauterina em casos de abortamento de primeiro trimestre. Por ser uma prática ilegal, há escassez de dados sobre o tema no Brasil. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), são realizados cerca de 25 milhões de abortos inseguros por ano em todo o mundo. No Brasil, o aborto é considerado crime, previsto nos artigos 124 a 126 do Código Penal, que data de 1940. A lei fixa que uma mulher que provocar aborto em si mesma ou consentir que outra pessoa lhe provoque – um médico, por exemplo – pode ser condenada a um até três anos de prisão. Caso uma pessoa provoque aborto em uma gestante sem que ela autorize, também é considerado crime, com pena de um a quatro anos de prisão. Como é considerado um crime contra a vida, o aborto deve ser julgado pelo tribunal do Júri As únicas exceções previstas na lei são nos casos em que o aborto é necessário para salvar a vida da grávida, ou quando a gestação é fruto de um estupro. Nestes casos, o aborto é permitido e o Sistema Único de Saúde (SUS) deve disponibilizar o procedimento. Uma terceira exceção é quando o feto é anencéfalo. Em 2012, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a interrupção da gravidez de feto anencéfalo não pode ser criminalizada. Zugaib, Marcelo, and Rossana Pulcineli Vieira Francisco. Zugaib obstetrícia 4a ed. . Disponível em: Minha Biblioteca, (4ª edição). Editora Manole, [Inserir ano de publicação]. Montenegro, Carlos Antonio, B. e Jorge de Rezende Filho. Rezende Obstetrícia Fundamental, 14ª edição . Disponível em: Minha Biblioteca, Grupo GEN, 2017. Whalen, Karen, et ai. Farmacologia Ilustrada . Disponível em: Minha Biblioteca, (6ª edição). Grupo A, 2016. BARTZ, D. (2022). Interrupção da gravidez no primeiro trimestre: abortomedicamentoso. https://www.uptodate.com/contents/first-trimester- pregnancy-termination-medication- abortion?search=F%C3%A1rmacos%20usados%20para %20aborto&source=search_result&selectedTitle=1~150& usage_type=default&display_rank=1
Compartilhar