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EXMO. SR. DR. JUIZDE DIREITO DA 30.ᵃ VARA CRIMINAL DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA CAITAL- DO ESTADO DE SÃO PAULO. PROCESSO N.° ACUSADO: GERSON GERSON, já qualificado nos autos da ação penal em epígrafe, vem à presença de V. Exa., por intermédio dos advogados que esta subscrevem (mandato anexo), com fulcro no artigo 396 e s.s., do Código de Processo Penal, apresentar RESPOSTA À ACUSAÇÃO nos termos que se seguem: - 2 - O acusado foi denunciado pela prática do delito tipificado no artigo 155, §§ 3.º e 4.º, inciso II, do Código Penal. Isso porque, segundo consta da inicial acusatória: “Consta do incluso inquérito policial que, em diversas datas, até o dia 23 de janeiro de 2019, no trailer de venda de comida denominado ‘Big Burguer’ situado na Rua XXXXXX, altura do n.º 256, bairro Brás, nesta capital, GERSON, qualificado à fls. 13, subtraiu para si, mediante fraude, energia elétrica, gerando prejuízo estimado de R$ 4.669,08 (quatro mil seiscentos e sessenta e nove reais e oito centavos), de propriedade da empresa vítima ‘ENEL’. Ao que se apurou, no dia 23 de janeiro de 2019, policiais civis, juntamente com um técnico da empresa ENEL, realizaram diligências para o combate da subtração de energia. No local dos fatos, visualizaram que o estabelecimento comercial do tipo ‘food truck’, denominado ‘Big Burguer’, possuía sinais de irregularidades quanto ao fornecimento de energia. Realizada a vistoria, constataram a existência de ligação direta entre a fiação da via pública e a fiação do comércio, conforme laudo de fls. 41/46, gerando prejuízo estimado em R$ 4.669,08 (quatro mil seiscentos e sessenta e nove reais e oito centavos) (fls. 39). A subtração se deu mediante fraude posto que a empresa fornecedora de energia elétrica não percebia a subtração que somente foi descoberta em razão de fiscalização realizada com este fim específico. Ao ser interrogado, confessou a prática delitiva (fls. 05).” A denúncia é de ser rejeitada quanto à qualificadora prevista no §4.º, inciso II, do artigo 155, do Código Penal, vez que ausente a justa causa para o exercício da ação penal com relação a ela. Com efeito, a imputação da utilização do meio fraudulento para a prática do delito não se coaduna com os elementos colhidos no auto de prisão em flagrante. A ausência de elementos mínimos que indicassem a existência de fraude configura, portanto, hipótese de rejeição da denúncia nesse aspecto. Senão vejamos: - 3 - A denúncia imputa ao acusado a prática de furto mediante fraude eis que a “empresa fornecedora de energia elétrica não percebia a subtração que somente foi descoberta em razão de fiscalização realizada com este fim específico.” Há, na imputação, uma impropriedade consubstanciada na discrepância entre o quanto imputado e aquilo que fora coligido no auto de prisão em flagrante. Isso porque, a leitura da denúncia permite inferir – de forma equivocada – que a empresa de energia, em fiscalização aleatória com o fim de localizar eventuais furtos de energia, teria se deparado com a ligação realizada pelo acusado, tomando conhecimento dela a partir de tal fiscalização. Isso não é verdade. Os depoimentos colhidos em sede de auto de prisão em flagrante delito dão conta de que a fiscalização realizada naquela data derivou da suspeita de subtração de energia elétrica no endereço indicado. Ou seja, a vítima já tinha ciência da existência da ligação irregular e, por este motivo, solicitou o apoio dos policiais civis para efetuar a diligência de combate àquela atividade ilícita. Com efeito, JOSÉ (fls. 04), representante da empresa vítima, afirma que “foi designado para apurar suposta subtração de energia no endereço indicado”. FERNANDO fls. 02) afirma que “foi designado pela sua Chefia para prestar apoio à empresa ENEL DISTRIBUIÇÃO SÃO PAULO, a qual realizou, na data de hoje, operação visando o combate ao furto de energia elétrica na circunscrição desta Unidade de Polícia Judiciária”. EDUARDO (fls. 03), por sua vez, declarou - 4 - que “no endereço indicado, um estabelecimento comercial do tipo estacionamento particular, sob o qual havia suspeita da ocorrência de ligação direta, o funcionário da empresa identificou a suposta existência de fraude, consistente em ligação irregular entre a fiação da via pública e a fiação que distribui energia elétrica para o imóvel”. Ora, é evidente que a empresa vítima já tinha conhecimento da subtração de energia! A solicitação de apoio se deu de forma prévia à ida de qualquer representante da empresa vítima ao local dos fatos. A fiscalização se deu de forma específica naquele local – não há notícias de qualquer outra diligência realizada naquela mesma data. Se a ligação irregular de energia era de conhecimento da empresa vítima, não há que se falar, como narrado erroneamente na denúncia, que a “empresa fornecedora de energia elétrica não percebia a subtração”. Referida alegação é descolada do quanto apurado no auto de prisão em flagrante e configura evidente excesso de acusação. Isso porque a falaciosa alegação de desconhecimento da ligação irregular por parte da empresa vítima teve como objetivo o de acrescentar ao furto praticado pelo acusado a qualificadora do emprego de fraude, que nunca existiu. Com efeito, o furto praticado mediante fraude é aquele no qual o agente se utiliza de ardil, artifício ou meio enganoso para diminuir ou iludir a vigilância da vítima e realizar a subtração. No furto - 5 - mediante fraude, o agente, através do engodo, burla a vigilância do proprietário e se apodera da coisa, sem o conhecimento dele. Não é a hipótese dos autos. O laudo de fls. 41/46 constatou a “existência de uma derivação (by-pass) do fluxo de energia elétrica do sistema público situado nos postes, através de cabos”. As fotografias de fls. 44 e 45 mostram claramente a ligação, feita às escâncaras, entre os fios provenientes do poste e o ‘food truck’. Assim, não houve qualquer emprego de meio enganoso para iludir a vigilância da vítima! Trata-se da hipótese mais simples e evidente de furto de energia elétrica: ligação direta do poste! Trata-se, evidentemente, da hipótese equiparada ao caput do artigo 155, do Código Penal. Assim, a inverdade alegada – e, obviamente, desprovida de qualquer elemento mínimo de prova a subsidiá-la – deve ser rechaçada de plano, pela rejeição da denúncia quanto à qualificadora, por ausência de justa causa em relação a ela. É certo que a possibilidade de rejeição parcial da denúncia não é pacífica. Contudo, há precedentes admitindo a rejeição parcial, sobretudo nas hipóteses em que o excesso de acusação inviabiliza a aplicação da suspensão condicional do processo a que o acusado faria jus caso a denúncia tivesse sido lançada nos termos do quanto efetivamente praticado pelo agente. - 6 - Muito embora a norma do artigo 383, parágrafo 1º, do Código de Processo Penal seja no sentido de que o juiz poderá, após a instrução processual, e já na fase da sentença, constatar a possibilidade e proceder à aplicação da suspensão condicional do processo, em face de entender por definição jurídica diversa e mais benéfica ao acusado, esta previsão não pode subtrair do magistrado a prerrogativa de realizar este juízo já na fase liminar e vestibular da ação penal, corrigindo a capitulação legal dos fatos quando manifestamente representar violação a princípios básicos de Direito Penal e Processual Penal, evitando-se assim uma restrição abusiva a direitos subjetivos fundamentais do acusado criminalmente. Nesse sentido: PENAL E PROCESSUAL PENAL - DENÚNCIA APENAS PELOS DELITOS DOS ARTS.304 E 171, § 3º, DO CÓDIGO PENAL - DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DO ART. 1º, IV, DA LEI 8.137/90, QUANDO DA APRECIAÇÃO DA DENÚNCIA - POSSIBILIDADE E EXCEPCIONALIDADE - EXCESSO DE ACUSAÇÃO - APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE - DELITO ÚNICO - PARCELAMENTO DO DÉBITO TRIBUTÁRIO - SUSPENSÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA, QUANTO AO CONTRIBUINTE - ART. 9º DA LEI 10.684/2003 - EXTENSÃO AO OUTRO DENUNCIADO - ART. 580 DO CPP - POSSIBILIDADE - RECURSO IMPROVIDO. I - Omissis. VI - Possível, desde logo, a definição jurídica diversa do fato criminoso descrito na denúncia, em hipóteses excepcionais - como in casu, em face do evidente excesso de acusação, com reflexos jurídicos imediatos sobre os denunciados, que têm assegurada a suspensão da pretensão punitiva do Estado, em face do parcelamento do débito regularmente adimplido (art. 9º e § 1º, da Lei 10.684/2003) -, consoante a jurisprudência do egrégio STJ e do TRF/1ª Região. VII - "Não há vedação a que se altere a capitulação logo no recebimento da exordial, nos casos em que é flagrante que a conduta descrita não se amolda ao tipo penal indicado na denúncia. Tal - 7 - possibilidade acentua-se ainda mais quando o tipo indicado e aquele aparentemente cometido possuem conseqüências jurídicas diversas, com reflexos imediatos na defesa no acusado. Nessas hipóteses, é patente o excesso de acusação (Precedentes do STJ e do STF). Na espécie, o enquadramento da conduta descrita na denúncia como delito de violência arbitrária (art. 333 do CPM) é manifestamente inadequada, já que descreve, de fato, as elementares do delito de lesões corporais, previsto no art. 209 do COM. O equívoco na capitulação jurídica, na espécie, acarreta reflexos jurídicos imediatos na defesa no paciente, já que a correta classificação jurídica do fato, no caso, implicaria nulidade da ação penal, por ausência do exame de corpo de delito, imprescindível, na hipótese, por se tratar de crime que deixa vestígio (art. 328, caput, do CPPM). Ordem concedida." (STJ, HC 103763/MG, Rel. Felix Fischer, 5ª Turma unânime, DJe de 16/03/2009). VIII - "A classificação dada ao fato na denúncia ou na queixa não implica vinculação do órgão julgador a ela, pois ocorrerão casos em que, da simples narrativa da imputação, poder-se-á perceber erro de direito na classificação, daí resultando alterações significativas para o processo com repercussão para o acusado. Na mesma hipótese de erro de direito na classificação do fato descrito na denúncia, é possível, de logo, proceder-se à desclassificação e receber a denúncia com a tipificação adequada à imputação de fato veiculada, se, por exemplo, da sua qualificação depender a fixação da competência ou a eleição do procedimento a seguir." (TRF/1ª Região, RCCR 2007.37.00.004500-2/MA, Rel. Juiz Federal Convocado César Cintra Fonseca, 3ª Turma, maioria, e-DJF-1 de 25/04/2008, p. 226) IX - Amoldando-se a conduta dos denunciados tão somente à figura típica do art. 1º, IV, da Lei 8.137/90, e em face do parcelamento do débito tributário, pelo contribuinte, conforme comprovado nos autos, faz a recorrida, contribuinte, jus à suspensão da pretensão punitiva, prevista no art. 9º da Lei 10.684/2003, quanto ao referido delito de sonegação fiscal, com extensão ao segundo denunciado, nos termos do art. 580 do CPP. X - Em face do art. 580 do CPP, os efeitos do parcelamento do débito tributário, pelo contribuinte, alcançam os demais denunciados, quanto ao delito do art. 1º, IV, da Lei 8.137/90, por - 8 - não consubstanciar o aludido parcelamento do débito circunstância de caráter exclusivamente pessoal, na forma da jurisprudência do TRF/1ª Região (TRF/1ª Região, RCCR 2007.38.15.000463-2/MG, Rel. Juiz Federal Convocado César Cintra Fonseca, 3ª Turma, unânime, e-DJF1 de 07/03/2008, p. 123). XI - Recurso improvido. (RSE 200838000145850, DESEMBARGADORA FEDERAL ASSUSETE MAGALHÃES, TRF1 - TERCEIRA TURMA, e-DJF1 DATA:08/04/2011 PAGINA:165.) ( grifos nossos). Na doutrina, Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar alinham-se também a esse entendimento, conforme se transcreve in verbis: “Acreditamos ser possível ao magistrado, sem se imiscuir nas atribuições do órgão acusador, rejeitar parcialmente a inicial acusatória. Nada impede que o juiz rejeite parcialmente a inicial para excluir um ou alguns imputados, quando não haja lastro probatório mínimo vinculando-os aos fatos. O mesmo raciocínio pode ser seguido na hipótese de pluralidade de infrações objeto de uma mesma denúncia, onde, em não havendo justa causa, algumas podem ser excluídas. O mesmo se diga quanto às qualificadoras ou causas de exasperação de pena” (Curso de Direito Processual Penal, 6ª Edição, Ed. Jus Podvm, p.191) E os motivos que autorizariam essa atuação antecipada por parte do magistrado são de três ordens: A uma, o princípio da economia processual orienta seja evitada toda uma instrução processual inexoravelmente fadada a um desfecho que poderia ter sido obtido desde o início da ação penal; - 9 - A duas, conforme demonstrado, se hoje o magistrado pode, inclusive, absolver sumariamente o acusado, dentro das hipóteses do artigo 397 e incisos do Codex, é inarredável a conclusão de que ele também pode, ao invés de proceder à absolvição sumária, vir a corrigir a classificação jurídica apontada na denúncia ou queixa, com todos os consectários processuais e penais daí resultantes, pois quem pode o mais, pode o menos; A três, mormente quando a classificação legal errônea importar em vedação a benefícios processuais e materiais do acusado, que se não fossem estes excessos ou impropriedades acusatórias, poderiam ser desde logo usufruídos por aquele, extinguindo- se ou suspendendo a ação penal. Não é proporcional ou razoável seja mitigado um direito do acusado de usufruir, desde logo, de um benefício despenalizador, a fim de se prestigiar a premissa do monopólio da ação penal pública pelo Ministério Público, por exemplo, uma vez que ambas as vertentes (direito ao devido processo legal pelo acusado e monopólio da ação penal pelo Ministério Público ou querelante) possuem majestade constitucional, devendo assim haver uma convivência harmônica entre estes postulados constitucionais. Ante o exposto, requer: I) A juntada do incluso instrumento procuratório. - 10 - II) O deferimento do pedido para o fim de que seja a denúncia rejeitada quanto à qualificadora do emprego de meio fraudulento, em razão da falta de justa causa por ausência de demonstração de substrato mínimo de sua ocorrência; e a conseqüente apresentação de proposta de suspensão condicional do processo; Caso V. Exa. assim não entenda – o que se admite apenas por hipótese – protesta o peticionário por sua inocência e requer a produção de todas as provas admitidas em direito e, desde já, a oitiva das mesmas testemunhas arroladas pela acusação, bem assim aquela constante do rol anexo, em caráter de imprescindibilidade, que deverão ser intimadas. Termos em que, Pede deferimento. São Paulo, 09 de outubro de 2019. CRISTIANE CAETANO SIMÕES OAB/SP 183.654 ROL DE TESTEMUNHAS: 1. Elias Joaquim dos Santos - 11 - Avenida Senador Queiroz, n.º 65 – apto. 45 – Bairro Sta. Ifigênia – São Paulo – SP. 2. Luiz Carlos Martins Fusco Avenida General Ataliba Leonel, 3173 apto. 75B – Tucuruvi – São Paulo - SP
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