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BIOÉTICA ANA KELY DE CARVALHO C A D E R N O D E ESTUDO A AUTORA Ana Kely de Carvalho Sou a Professora Drª Ana Kely de Carvalho, possuo graduação em Ciências Biológicas com ênfase em Biotecnologia pela Universidade do Vale do Itajaí (2006) e Licenciatura em Ciências Biológicas também pela Universidade do Vale do Itajaí (2006), Doutorado em Ciências no programa da Fisiopatologia Experimental pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (2012). Sou docente do Curso de Odontologia, do Curso de Educação Física Licenciatura e Bacharelado, do Curso de Psicologia, do Curso de Enfermagem e do Curso de Gastronomia na Faculdade Avantis; além de lecionar a disciplina de Metodologia Científica na pós-graduação do Instituto Odontológico das Américas (IOA) em Balneário Camboriú - SC e no Centro de Ensino Odontológico da Ilha (CEOI) em Florianópolis - SC. 3BIOÉTICA SUMÁRIO APRESENTAÇÃO ........................................................................................................ 4 PLANO DE ESTUDO .................................................................................................... 5 CAPÍTULO 1 BIOÉTICA E SEUS FUNDAMENTOS ......................................6 1.1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................7 1.2 DEFINIÇÃO BIOÉTICA .....................................................................................................................8 1.3 PRINCÍPIOS BIOÉTICOS FUNDAMENTAIS ......................................................................................10 1.3.1 Autonomia ..........................................................................................................................10 1.3.2 Beneficência .......................................................................................................................11 1.3.3 Não Maleficência ................................................................................................................11 1.3.4 Justiça ...............................................................................................................................12 CAPÍTULO 2 BIOÉTICA E A PESQUISA ..................................................13 2.1 INTRODUÇÃO ...............................................................................................................................14 2.2 CÓDIGO DE NUREMBERG ............................................................................................................14 2.3 DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DO HOMEM ...................................................................16 2.4 DECLARAÇÃO DE HELSINQUE ......................................................................................................17 2.5 RELATÓRIO BELMONT ................................................................................................................17 2.6 PROPOSTAS DE DIRETRIZES ÉTICAS INTERNACIONAIS PARA PESQUISAS BIOMÉDICAS ENVOLVENDO SERES HUMANOS ............................................................................................................................19 2.7 RESOLUÇÕES DO CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE ......................................................................19 REFERÊNCIAS ..........................................................................................................23 4BIOÉTICA APRESENTAÇÃO Caro (a) pós-graduando (a) Instituições de pós-graduação têm por objetivo não apenas aprimorar a técnica através de especializações, mas também proporcionar ao estudante uma visão crítica através dos princípios éticos que regem a sua profissão. Neste sentido, esta apostila tem por objetivo oferecer a vocês, pós-graduandos, uma visão ampla do que é bioética e como esta se relaciona diretamente com sua atuação profissional. Desta forma será feita uma contextualização dos acontecimentos históricos que demonstraram a necessidade de se criar regras para conduzir as pesquisas com seres humanos de forma a respeitar o ser humano que participa da pesquisa. Espero que vocês aproveitem esta apostila, e que esta sirva de inspiração para o desenvolvimento de uma classe mais ética e unida. Bons estudos! Ana Kely de Carvalho 5BIOÉTICA PLANO DE ESTUDO Ementa Bioética – princípios. Fundamentos da Bioética. Beneficência. Não Maleficência. Autonomia. Justiça. Panorama das normas internacionais. Panorama das normas nacionais. Relação profissional paciente e a bioética. A pesquisa e a bioética. Objetivo Esta disciplina tem por objetivos: • Conhecer as definições de bioética. • Conhecer as diferentes teorias relacionadas a bioética. • Conhecer os princípios bioéticos. • Compreender de que maneira a bioética afeta as questões relacionadas a odontologia. • Compreender os processos bioéticos no desenvolvimento de pesquisas com seres humanos. Nosso estudo inicia com uma breve introdução ao conceito de bioética, na sequência serão abordados os quatros princípios fundamentais da bioética e por fim um panorama da pesquisa com seres humanos e suas normativas. 6BIOÉTICA CAPÍTULO 1 Bioética e seus fundamentos Objetivo de aprendizagem A partir desta unidade você deverá ser capaz de: • Conhecer e compreender as definições de bioética. • Conhecer as diferentes teorias relacionadas a bioética. • Compreender e aplicar os quatro princípios fundamentais da bioética. Plano de Estudos Esta unidade está dividida em três seções, e ao longo do texto você encontrará links importantes para uma melhor reflexão sobre os temas abordados. 7BIOÉTICA 1.1 INTRODUÇÃO A bioética é um novo campo de estudo que derivou da ética. Surgiu a partir da necessidade de parâmetros para que os princípios éticos fossem respeitados durante a realização de pesquisas científicas, sendo num primeiro momento associada apenas a atuação de pesquisas médicas. Conforme podemos observar na figura 1 a bioética é multidisciplinar, haja visto que envolve diversas áreas do conhecimento em prol de garantir os direitos básicos do ser humano. Figura 1: Composição de palavras intimamente relacionada a bioética. Fonte: The Center of Bioethics and Human Dignity. Seguindo a ótica da interdisciplinaridade, é possível realizar o estudo da bioética através de três abordagens distintas, conforme proposto por Diniz e Guilhem (2012): Abordagem Historicista: a qual o próprio nome sugere, visa elucidar o desenvolvimento da bioética através de uma narrativa cronológica dos acontecimentos que consolidou a bioética como uma nova disciplina. a. Abordagem Filosófica: busca uma abordagem associada a filosofia moral. b. Abordagem Temática: permite uma compreensão do fazer bioético a partir de casos e/ou situações da vida. c. A abordagem temática é a mais aplicada nos cursos de graduação e pós-graduação, uma vez que é possível utilizar acontecimentos práticos para a melhor compreensão desta teoria. 8BIOÉTICA 1.2 DEFINIÇÃO BIOÉTICA O conceito de bioética foi utilizado pela primeira vez em 1971, por Van Rensselear Potter, o qual afirmou que os valores éticos não podem estar separados de fatos biológicos. Neste sentido, Diniz e Guilhem (2012) afirmam que Potter propunha a democratização contínua do conhecimento científico como única maneira de difundir este olhar zeloso da ética. Henk (2005) afirma que a bioética lida com evidências fatuais que têm por objeto um próximo existente e/ou próximos ausentes. Trata de temas específicos como nascer/não nascer (aborto), morrer/não morrer (eutanásia), saúde/doença (ética biomédica), bem-estar/mal-estar (ética biopsicológicas) e se ocupa de novos campos de atuação do conhecimento, como clonagem (ética genética), irresponsabilidade perante os pósteros (ética de gerações), depredação da natureza extra-humana circundante e agressões ao equilíbrio sistêmico das espécies (ecoética), e assim por diante. VAMOS REFLETIR: Você saberiame dizer qual a diferença entre ética e moral? A moral, está relacionada a um valor, sendo este uma crença duradoura, já a ética é a ciência que estuda a moral. Busca um juízo crítico sobre os valores que geralmente estão em conflito, buscando sempre a liberdade. Vale salientar, que a moral está associada a crenças e costumes, portanto o que é moral em uma região ou país, pode não ser em outro. 9BIOÉTICA Desta forma, é importante reforçar que a bioética é um desdobramento da ética, que está intimamente relacionada a condutas e costumes de um povo. As ações decorrentes do pensamento bioético ocorreu principalmente a partir de denúncias relacionadas a conduta dos médicos ao desenvolver pesquisas científicas com seres humanos, assim como experimentos realizados em campos de concentração durante a segunda guerra mundial, no qual se utilizava como sujeitos da pesquisa judeus, ciganos e prisioneiros. Ainda de acordo com Rego e colaboradores (2009), nesta época, os pesquisadores utilizavam pessoas que não eram consideradas de uma classe social relevante. A bioética se estabelece como uma instância mediadora e democrática para os conflitos morais. Desta forma, Henk (2005) afirmou que todo e qualquer exercício das relações profissionais de médicos, enfermeiros, dentistas, psicólogos, nutricionistas, biólogos, fisioterapeutas e demais técnicos especializados em saúde e doença, bem como os usuários das novas técnicas biomédicas e farmacológicas tornam-se destinatários do discurso bioético e ficam, também na condição de pacientes, devendo respostas à bioética. A partir das barbáries que foram cometidas principalmente durante a 2ª Guerra Mundial, assim como alguns casos específicos ocorridos em território norte americano, que se criou em 1974 a “Comissão Nacional para a Proteção dos Sujeitos Humanos na Pesquisa Biomédica e Comportamental”, que obteve como resultado o Relatório de Belmont, os quais serão discutidos no próximo capítulo. Em 1979, Beauchamp e Childress publicaram o livro Princípios da Ética Bioética, dentre os quais definiu quatro princípios, no entanto, adicionando aos princípios determinados pelo Relatório de Belmont o princípio da Não Maleficência. Conforme podemos observar na figura 1, todos estes princípios são de suma importância para uma ação bioética, uma vez que todos os princípios são fundamentes para uma conduta bioética. 10BIOÉTICA Figura 2: Relação entre os princípios bioéticos. Fonte: Elaborado pela autora, 2017. 1.3 PRINCÍPIOS BIOÉTICOS FUNDAMENTAIS 1.3.1 Autonomia Este princípio explicita a dignidade e a liberdade da pessoa humana. O qual permite a pessoa alternativas de escolha a partir das informações que lhe serão dadas e neste sentido ser capaz exercer a tomada de decisão. “Embora ‘autonomia’ seja um termo sujeito a várias interpretações, no âmbito do principialismo ela deve ser compreendida como um governo pessoal do eu, que é livre tanto das interferências controladoras por parte dos outros quanto de limitações pessoais que criam embaraços para a escolha, tais AUTONOMIA 11BIOÉTICA como a compreensão inadequada. O indivíduo autônomo age livremente de acordo com um plano escolhido por ele mesmo, da mesma forma como um governo independente administra seu território e define suas políticas. Para essa corrente, respeitar um agente autônomo é, no mínimo, reconhecer o direito dessa pessoa de ter suas opiniões, fazer escolhas e agir com base em valores e crenças pessoais”. (Rego et al. 2009 p. 44-45) Desta forma, é direito do paciente compreender o que se passa consigo, desta forma a informação deve chegar a este paciente de forma compreensível de uma pessoa de seu nível cultural. 1.3.2 Beneficência A beneficência é o princípio que assegura ao bem-estar das pessoas que estão envolvidas direta ou indiretamente em pesquisas e/ou experimentos. Tendo em vista sempre que não se deve causar nenhum dano aos envolvidos, assim como maximizar os benefícios previstos. Desta forma deverá ser ofertado ao paciente o melhor tratamento, seja em relação à técnica utilizada quanto às necessidades físicas, psicológicas ou sociais do paciente. 1.3.3 Não Maleficência Este princípio está intimamente ligado ao princípio da Beneficência. Está associado a máxima primum non nocere, que significa, “acima de tudo, não cause danos”. Deste modo, este princípio estabelece que deve-se ter o máximo de prudência para evitar qualquer acidente que possa prejudicar o paciente. 12BIOÉTICA 1.3.4 Justiça Este princípio é o que apresenta uma maior proximidade entre a sociedade e a bioética, uma vez que visa trazer à tona o problema da resolução de conflitos existente entre reinvindicações e interesses particulares em contraposição aos interesses da sociedade. De acordo com Diniz e Guilhem (2002) as regras da justiça serviriam para contrabalancear os diferentes, e muitas vezes conflituosos, interesses que emergem da vida coletiva. Desta forma a sintetizar os princípios bioéticos, podemos afirmar que o princípio da autonomia está diretamente ligado ao direito de liberdade dos envolvidos na pesquisa, uma vez que este tem o direito de saber todos os procedimentos aos quais será submetido; a beneficência e a não maleficência estão relacionados aos riscos e benefícios que o sujeito poderá ser exposto durante o desenvolvimento da pesquisa, assim como evitar causar qualquer dano a este sujeito; e ainda a justiça que visa tratar cada indivíduo com dignidade e equidade, conforme demostrado na figura 2. Figura 2: Síntese dos princípios bioéticos. Autoria própria. SAIBA MAIS! Bioética e sua relação direta e atual com a Odontologia. Acesse: “A importância da bioética e a odontologia do século XXI Termo de Consentimento Livre e Esclarecido https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/2616505/mod_resource/content/1/LEITURA_COMPLEMENTAR_02_bioetica_e_etica_profissional.pdf 13BIOÉTICA CAPÍTULO 2 Bioética e a Pesquisa Objetivo de aprendizagem A partir desta unidade você deverá ser capaz de: • Conhecer os contextos históricos que resultaram no surgimento da bioética. • Conhecer a resolução 466/2012 que regulamenta a pesquisa com seres humanos no Brasil. • Compreender os processos de elaboração de projeto de pesquisa envolvendo seres humanos. Plano de Estudos Esta unidade está dividida em sete seções, e ao longo do texto você encontrará links importantes para uma melhor reflexão sobre os temas abordados. 14BIOÉTICA 2.1 INTRODUÇÃO Inicialmente é necessário comentar sobre a evolução da bioética em pesquisa no Brasil e no mundo. Desta maneira, vamos comentar um pouco sobre os principais momentos que resultaram no desenvolvimento de parâmetros e regras necessárias para o desenvolvimento de pesquisa com seres humanos. Serão relatados o código de Nuremberg, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Declaração de Helsinque, o Relatório de Belmont, culminando nas Propostas de Diretrizes Éticas Internacionais para Pesquisas Biomédicas Envolvendo Seres Humanos, assim como Resolução 196/1996 do Conselho Nacional de Saúde que regulariza a pesquisa envolvendo seres humanos no Brasil. 2.2 CÓDIGO DE NUREMBERG O código de Nuremberg trata do julgamento ocorrido em Nuremberg, na Alemanha em 1947, no qual foram julgados os criminosos de guerra. Durante a Segunda Guerra Mundial, médicos alemães realizaram diversos experimentos com os prisioneiros em nome do interesse no estado alemão. As pesquisas realizadas visavam conhecer os limites da tolerância humana a condições extremas como hipotermia, déficit de oxigênio e injeção massiva de germes patogênicos. Foram dissecados vários gêmeos, a fim de entender as semelhanças corporais, com experiências como injeção de tinta nos olhos, cirurgias sem anestesias, transfusão de sangue entre os pares e suturas para criar siameses. No geral, as experiências resultavam em morte, desfiguração ou incapacidade permanentedo indivíduo (Rovida e Garbin, 2013). Fruto deste julgamento, criou-se o primeiro documento referente à conduta que um pesquisador cientifico deveria seguir. Ficou estabelecido 10 pontos importantes 15BIOÉTICA Consentimento voluntário Os indivíduos submetidos a experimento devem ser legalmente capazes, exercendo o livre direito de escolha, sem a intervenção de elementos como co- ação, fraude, mentira ou outra forma de restrição, além de terem conhecimento suficiente do assunto em estudo. Para isto deve-se explicitar a natureza, a duração e o propósito do experimento. Garantia de benefícios à sociedade Os experimentos devem produzir resultados van- tajosos, impossíveis de serem obtidos por outros métodos e feitos de maneira necessária. Experimentos baseados em resultados prévios Devem ser baseados em resultados de experimen- tação em animais e no conhecimento da evolução da doença, justificando a condição do experimento. Evitação de sofrimento e danos desnecessários Devem ser evitados sofrimentos e danos desneces- sários à pessoa, tanto físicos quanto mentais Evitação de riscos de morte e invalidez Não se deve ser conduzido experimento quando existam razões para crer que possa haver morte ou invalidez permanente, justificados apenas quando o sujeito da pesquisa é o próprio pesquisador. Relação custo / benefício O grau de risco aceitável deve limitar-se conforme a importância do problema que o pesquisador se propõe a resolver Medidas de proteção para os sujeitos da pesquisa Cuidados especiais devem ser tomados para prote- ger o indivíduo de qualquer possibilidade de dano, invalidez ou morte, mesmo que remota. Qualificação dos pesquisadores O experimento deve ser conduzido somente por pessoas cientificamente qualificadas. Liberdade de retirar o consentimento O indivíduo participante do experimento deve ter a liberdade de se retirar no decorrer do estudo. Suspensão do experimento pelo pesquisador O pesquisador deve estar preparado para interrom- per o estudo em qualquer etapa, caso haja motivos sugerindo que a continuação do experimento possa causar dano, invalidez ou morte do paciente. Fonte: Rovida e Garbin (2013) p. 114 e 115. 16BIOÉTICA 2.3 DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DO HOMEM Com o intuito de garantir os direitos humanos básicos, em 10 de dezembro de 1948, a Assembleia Geral das Nações Unidas adotou e proclamou a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Rovida e Garbin (2013) afirmam que esta declaração é um ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o intuito de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade tenham sempre em mente essa declaração e se esforce, por meio do ensino e da educação, promover o respeito a esses direitos e liberdades. SAIBA MAIS! Clique no link < https://www.youtube.com/watch?v=qRw1gIp8J_s> e assista ao filme de 2000 dirigido por Yves Simoneau. PESQUISA Quer saber mais sobre a Declaração Universal dos Direitos do Homem? Clique no link a seguir a tenha acesso ao documento na íntegra. http://unesdoc. unesco.org/images/0013/001394/139423por.pdf https://www.youtube.com/watch?v=qRw1gIp8J_s http://www.interfilmes.com/buscaperson.Yves.Simoneau.html http://unesdoc.unesco.org/images/0013/001394/139423por.pdf http://unesdoc.unesco.org/images/0013/001394/139423por.pdf 17BIOÉTICA 2.4 DECLARAÇÃO DE HELSINQUE Visando minimizar as falhas existentes no Código de Nuremberg, em junho de 1964, durante a 18ª Assembleia Geral da Associação Médica Mundial, a declaração de Helsinque consiste em um conjunto de princípios éticos que dirigem a pesquisa com seres humanos. Esta declaração tem como prioridade o bem-estar do ser humano, uma vez que este deve ter prioridade sobre os interesses da ciência e da sociedade. A declaração ganha destaque pela preocupação com o consentimento voluntário dos participantes de pesquisas médicas que envolvam seres humanos. A declaração de Helsinque sofreu algumas revisões e alterações com o passar dos anos, visando sempre o bem-estar do paciente. 2.5 RELATÓRIO BELMONT Em 1974, o Governo e o Congresso dos Estados Unidos da América constituíram uma Comissão Nacional para Proteção de Humanos Submetidos a Pesquisa Biomédica, reagindo ao escândalo causado principalmente por três casos que mobilizaram a opinião pública norte americana: a) 1963, no Hospital Israelita de Doenças Crônica, em Nova York, foram injetadas células cancerosas vivas em pacientes senis com o objetivo de observar a resposta imunológica destes SAIBA MAIS! Clique no link para ter acesso a declaração, já com as diversas revisões realizadas ao longo dos anos. http://unesdoc.unesco.org/images/0013/001394/139423por.pdf http://unesdoc.unesco.org/images/0013/001394/139423por.pdf 18BIOÉTICA pacientes e comparar com pacientes saudáveis. O protocolo de pesquisa consistia em aplicações regulares de células cancerígenas no fígado de 22 pacientes idosos que foram hospitalizados devido a doenças crônicas; b) entre as décadas de 1950 e 1970, na Escola Estadual de Willowbrook, em Nova York, injetaram o vírus da hepatite em crianças com deficiência mental, neste caso os pesquisadores utilizaram um termo de consentimento do pais, no entanto, não foi devidamente esclarecido quais eram as condições da pesquisa, assim como muitos pais foram coagidos a aceitar o termo, uma vez que alegava superlotação na escola, no entanto havia vaga apenas para a seção de pesquisa. A figura 3 mostra uma cópia do termo de permissão entregue aos pais ou responsáveis para a realização da pesquisa. Fonte: Rothman, D.; Rothman S.The Willowbrook Wars. Cambridge: HarperCollins 1984. p. 265–6. c) Em 1932, em Tuskegee estado do Alabama, foi realizado um ensaio clínico elaborado pelo Serviço Público de Saúde dos Estados Unidos, que utilizou 400 negros com sífilis pobres e analfabetos. O objetivo deste estudo era observar a progressão natural da sífilis, uma vez que estes não eram tratados com medicamentos. Em 1972 a pesquisa foi interrompida após denúncia no The New York Times. Restaram 74 pessoas vivas sem tratamento. Ressaltando ainda, que em momento algum os pacientes foram informados de que estavam participando de uma pesquisa, nem mesmo informados de que eram portadores de sífilis. Tendo em vista estes acontecimentos e a manifestação da população frente a estes casos, objetivo principal desta Comissão foi identificar os princípios éticos “básicos” que deveriam conduzir a experimentação em seres humanos. Como resultado final deste trabalho, em 1978, obteve-se o Relatório de Belmont, o qual norteia os princípios éticos básicos para a pesquisa 19BIOÉTICA biomédica com seres humanos, que são os quatro princípios fundamentais comentados no capítulo anterior. Este relatório estabelece três princípios éticos, o respeito às pessoas, que posteriormente foi denominado de Autonomia; a beneficência e a justiça. Princípios estes que estabelecem padrões que orientam, guiam e avaliam condutas, enquanto não são sobrepostos pela alegação de fatos ou argumentos dos quais, novamente, resulta prima facie um bem maior, mais útil, mais justo, e assim por diante (HENK, 2005). 2.6 PROPOSTAS DE DIRETRIZES ÉTICAS INTERNACIONAIS PARA PESQUISAS BIOMÉDICAS ENVOLVENDO SERES HUMANOS Em 1982, a Organização Mundial da Saúde e o Conselho para Organizações Internacionais de Ciências Médicas publicaram as Diretrizes Internacionais, uma vez que os direitos éticos dos humanos envolvidos em pesquisas por muitas vezes continuavam a ser desrespeitados. Ficou estabelecido, segundo o documento, que toda a pesquisa que envolve seres humanos deve ser conduzida de acordo com os três princípios éticos fundamentais: autonomia, beneficência e justiça (relatados no capítulo anterior). 2.7 RESOLUÇÕES DO CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE O Conselho Nacional de Saúde (CNS) instância máxima de deliberação do Sistema Único de Saúde – SUS - de caráter permanente e deliberativo, tem como missãoa deliberação, fiscalização, acompanhamento e monitoramento das políticas públicas de saúde (BRASIL, 2017). Algumas resoluções foram estabelecidas pelo Conselho Nacional de Saúde desde a década de 1980 visando normatizar a pesquisa com seres humanos no Brasil. A resolução 1/1998 normatizou 20BIOÉTICA as pesquisas na área da saúde no âmbito da biossegurança, ética e vigilância sanitária. Esta foi revogada pela resolução 196/1996 devido a sua dificuldade de aplicação, exigência de novas abordagens devido ao avanço tecnológico entre outros fatores. Atualmente está em vigor a resolução 466/2012, a qual, assim como as outras resoluções estão embasadas nos principais documentos internacionais, foram amplamente discutidas pelas diferentes áreas afins e visa conduzir a uma nova ética em pesquisa no país. Atualmente a pesquisa envolvendo seres humanos no Brasil necessita de aprovação no Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), que visa proteger o bem-estar, a segurança e os direitos, além de defender a dignidade dos sujeitos da pesquisa, por meio de avaliação e acompanhamento dos aspectos éticos das pesquisas que envolvam a participação de seres humanos (Rovida e Garbin 2012). A resolução 466/2012 apresenta algumas definições importantes para desenvolver um projeto de pesquisa. Assentimento livre e esclarecido: anuência do participante da pesquisa, criança, adolescente ou legalmente incapaz, livre de vícios (simulação, fraude ou erro), dependência, subordinação ou intimidação. Tais participantes devem ser esclarecidos sobre a natureza da pesquisa, seus objetivos, métodos, benefícios previstos, potenciais riscos e o incômodo que esta possa lhes acarretar, na medida de sua compreensão e respeitados em suas singularidades. Assistência imediata ao participante da pesquisa: é aquela emergencial e sem ônus de qualquer espécie ao participante da pesquisa, em situações em que este dela necessite. Assistência integral ao participante da pesquisa: é aquela prestada para atender complicações e danos decorrentes, direta ou indiretamente, da pesquisa; Benefícios da pesquisa: proveito direto ou indireto, imediato ou posterior, auferido pelo participante e/ou sua comunidade em decorrência de sua participação na pesquisa; Consentimento livre e esclarecido: anuência do participante da pesquisa e/ou de seu representante legal, livre de vícios (simulação, fraude ou erro), dependência, subordinação ou intimidação, após esclarecimento completo e pormenorizado sobre a natureza da pesquisa, seus objetivos, métodos, benefícios previstos, potenciais riscos e o incômodo que esta possa acarretar; Instituição proponente de pesquisa: organização, pública ou privada, legitimamente constituída e habilitada, à qual o pesquisador responsável está vinculado; Participante da pesquisa: indivíduo que, de forma esclarecida e voluntária, ou sob o 21BIOÉTICA esclarecimento e autorização de seu (s) responsável (eis) legal (is), aceita ser pesquisado. A participação deve se dar de forma gratuita, ressalvadas as pesquisas clínicas de Fase I ou de bioequivalência; Pesquisa: processo formal e sistemático que visa à produção, ao avanço do conhecimento e/ ou à obtenção de respostas para problemas mediante emprego de método científico; Pesquisa envolvendo seres humanos: pesquisa que, individual ou coletivamente, tenha como participante o ser humano, em sua totalidade ou partes dele, e o envolva de forma direta ou indireta, incluindo o manejo de seus dados, informações ou materiais biológicos; Pesquisador responsável: pessoa responsável pela coordenação da pesquisa e corresponsável pela integridade e bem-estar dos participantes da pesquisa; Protocolo de pesquisa: conjunto de documentos contemplando a descrição da pesquisa em seus aspectos fundamentais e as informações relativas ao participante da pesquisa, à qualificação dos pesquisadores e a todas as instâncias responsáveis; Relatório final: é aquele apresentado após o encerramento da pesquisa, totalizando seus resultados; Ressarcimento: compensação material, exclusivamente de despesas do participante e seus acompanhantes, quando necessário, tais como transporte e alimentação; Risco da pesquisa: possibilidade de danos à dimensão física, psíquica, moral, intelectual, social, cultural ou espiritual do ser humano, em qualquer pesquisa e dela decorrente; Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE: documento no qual é explicitado o consentimento livre e esclarecido do participante e/ou de seu responsável legal, de forma escrita, devendo conter todas as informações necessárias, em linguagem clara e objetiva, de fácil entendimento, para o mais completo esclarecimento sobre a pesquisa a qual se propõe participar. Termo de Assentimento: documento elaborado em linguagem acessível para os menores ou para os legalmente incapazes, por meio do qual, após os participantes da pesquisa serem devidamente esclarecidos, explicitarão sua anuência em participar da pesquisa, sem prejuízo do consentimento de seus responsáveis legais. Vulnerabilidade: estado de pessoas ou grupos que, por quaisquer razões ou motivos, tenham a sua capacidade de autodeterminação reduzida ou impedida, ou de qualquer forma estejam impedidos de opor resistência, sobretudo no que se refere ao consentimento livre e esclarecido. 22BIOÉTICA Definidos estes termos, é possível escrever um projeto de pesquisa de forma adequada a normativas brasileiras. Mas, o que deve conter no projeto de pesquisa envolvendo seres humanos para envio ao Comitê de Ética em Pesquisa? Além da organização de um projeto de pesquisa, seu projeto será avaliado pelo CEP se conter: Folha de Rosto: inclui título do projeto, nome, número da carteira de identidade, CPF, telefone e endereço para correspondência do pesquisador responsável e do patrocinador, nome e assinatura dos dirigentes da instituição. Este documento será gerado após a inclusão dos dados na Plataforma Brasil, que deverá ser assinado e anexado na plataforma. Descrição da pesquisa: inclui a descrição das hipóteses levantadas a partir da pergunta problema, referencial teórico, descrição detalhada dos materiais e métodos, descrição detalhada dos riscos e benefícios do projeto, desfechos primários e secundários, cronograma da pesquisa (este deve-se considerar o início apenas após aprovado no CEP), orçamento financeiro. Documentos anexo ao projeto: folha de rosto assinada, termo de consentimento livre e esclarecido, termo de compromisso confiabilidade e sigilo, projeto detalhado. Para ter acesso a todas as informações necessárias para elaborar seu projeto de pesquisa, acesse o link abaixo e baixe os manuais e modelos que os auxiliarão a elaborar seu projeto de forma correta e objetiva. É inquestionável que estas resoluções que orientam e regulamentam o desenvolvimento de pesquisas envolvendo seres humanos são necessárias para respeitar e zelar pelo bem-estar do ser humano. Desta forma, deve-se estar sempre atendo para evitar que os erros cometidos no passado “em nome da ciência” jamais possam ser repetidos. SAIBA MAIS! Acesse o site http://avantis.edu.br/comite-de-etica/ e tenha acesso a todas as informações e modelos necessários para a elaboração de seu projeto de pesquisa. http://avantis.edu.br/comite-de-etica/ 23BIOÉTICA REFERÊNCIAS BEAUCHAMP T. L.; CHILDRESS J. F. Princípios de ética biomédica. São Paulo: Loyola. 2002. BRASIL. Conselho Nacional de Saúde: apresentação. Disponível em: < http://conselho.saude. gov.br/>. Acesso em Acesso em 3 jul 2017. ______. Resolução 466/2012. Conselho Nacional de Saúde. Disponível em: <http://conselho. saude.gov.br/>. Acesso em 3 jul 2017. DINIZ, D.; GUILHEM D. O que é bioética. 1. ed. São Paulo: Brasiliense, 2012. HENK, J. N. Bioética: contexto histórico, desafios e responsabilidade. Ethic@. 2005; 4:2. REGO, S.; PALÁCIOS, M.; SIQUEIRA-BATISTA R. Bioética para profissionais da saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz,2009. ROVIDA, T. A. S.; GARBIN, C. A. S. Noções de odontologia legal e bioética. São Paulo: Artes Médicas, 2013. ROTHMAN, D.; ROTHMAN, S. The Willowbrook Wars. Cambridge: HarperCollins, 1984. http://conselho.saude.gov.br/ http://conselho.saude.gov.br/ Av. Marginal Leste, n. 3.600, Bairro dos Estados | CEP: 88.339-125 - Balneário Camboriú (SC) Telefone: (47) 3363-0631 | avantis@avantis.edu.br | www.avantis.edu,br _GoBack APRESENTAÇÃO PLANO DE ESTUDO CAPÍTULO 1 Bioética e seus fundamentos 1.1 Introdução 1.2 Definição Bioética 1.3 Princípios Bioéticos Fundamentais 1.3.1 Autonomia 1.3.2 Beneficência 1.3.3 Não Maleficência 1.3.4 Justiça CAPÍTULO 2 Bioética e a Pesquisa 2.1 Introdução 2.2 Código de Nuremberg 2.3 Declaração Universal dos Direitos do Homem 2.4 Declaração de Helsinque 2.5 Relatório Belmont 2.6 Propostas de Diretrizes Éticas Internacionais para Pesquisas Biomédicas Envolvendo Seres Humanos 2.7 Resoluções do Conselho Nacional de Saúde REFERÊNCIAS
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