Buscar

Prévia do material em texto

Urupês – Monteiro Lobato
Análise
“Urupês”, obra publicada originalmente em 1918, reúne ao todo 14 contos de Monteiro Lobato. Segundo o prefácio da 2a. Edição do livro, esta obra surgiu do artigo “Velha praga”, publicado originalmente no jornal O Estado de São Paulo no ano de 1914 .
Recebeu uma fazenda de herança em época de seca e para piorar ele ficava irritado com as queimadas provocadas pelos caboclos. Esses fatos fizeram com que ele escrevesse “Velha Praga” e pela escrita que impressionava, ele ainda escreveu para o mesmo jornal, outros 13 contos.
Os contos de Urupês têm como cenário cidades interioranas de São Paulo – todas sintetizadas em localidade fictícia: Itaoca.
Pelo moralismo empregado, para Lobato, a literatura não podia apenas deleitar; era fundamental extrair dela uma utilidade didática, um aprendizado existencial.
Importância do livro
Monteiro Lobato pertence a uma geração de escritores dispostos a pensar a realidade brasileira de maneira crítica, como Euclides da Cunha, Lima Barreto e Graça Aranha. Urupês é um exemplo bastante significativo dessa atuação, no terreno da prosa de ficção. Os narradores dos contos se colocam como típicos contadores de causos, dos quais buscam extrair algumas lições.
O título do livro, Urupês, faz referência ao fungo orelha-de-pau (Pycnoporus Sanguineus), popularmente chamado de urupê. Na capa original do livro, José Wasth Rodrigues desenhou uma figueira-vermelha ou mata-pau (Ficus Clusiifolia) agarrada a outra árvore, fazendo referência a um conto do livro. Tanto o fungo quanto a epífita são representações do caboclo que Monteiro Lobato incendeia nos seus textos críticos a respeito do “caipirão raiz“.
2 ensaios: São eles Velha Praga (originalmente publicado em O Estado de S. Paulo, 12 de novembro de 1914) e Urupês (originalmente publicado em O Estado de S. Paulo, 23 de dezembro de 1914). 
No primeiro texto, o autor fala das queimadas provocadas pelo caboclo para “melhorar o solo” e que acaba gerando desastres difíceis de se controlar, além de arrasar o solo a longo prazo. Já no segundo texto — que dá título ao livro e é um dos mais famosos de Lobato –, temos uma crítica absurdamente feroz a esse tipo de indivíduo, com o autor fazendo um histórico a partir do louvor indianista de José de Alencar e por aí chegando ao “índio da vez“, o “caboclo coitado” que o autor vê como fraco, indolente, preguiçoso, passivo, estúpido. 
Uma abordagem sociologicamente problemática, mas coberta de razão em diversos pontos. Ambos os textos são excelentes, uma leitura obrigatória para se conhecer uma das faces que Lobato via nesse tipo nacional e para se ter contato com as duas primeiras aparições do personagem Jeca Tatu na literatura brasileira, primeiro citado rapidamente ao fim de Velha Praga e depois como “personagem” principal do mega insulto cultural/social que é Urupês.
Urupês – O conto
Aqui, Monteiro Lobato personifica a figura do caboclo, criando o famoso personagem Jeca Tatu, apelidado de urupê (uma espécie de fungo parasita). 
Vive "e vegeta de cócoras", à base da lei do menor esforço, alimentando-se e curando-se daquilo que a natureza lhe dá, alheio a tudo o que se passa no mundo, menos do ato de votar. Representa a ignorância e o atraso do homem do campo.
Sem nenhum tipo de educação e alheio a tudo o que acontece pelo mundo, o Jeca Tatu representa a ignorância do homem do campo. Por fim, pode-se dizer que ele é a denúncia do descaso do governo com elação às pessoas da zona rural uma vez que, segundo Monteiro Lobato, “Jeca Tatu não é assim, ele está assim”. 
Os faroleiros
- O narrador, em meio a um bate-papo, propõe-se a contar uma história surpreendente. Relata que, seduzido pelo ar solitário e isolado de um farol, consegue realizar seu sonho passando uns dias nesse local. É quando conhece duas figuras misteriosas que não se conversam: Gerebita e Cabrea. 
O primeiro defende a ideia, insistentemente confessada para o narrador, de que o segundo está louco. Pergunta então se seria crime se defender de um ataque de um maluco matando-o. 
É uma premonição, além de deixar nas entrelinhas que o que está para ocorrer tinha sido premeditado. Pouco depois, os dois mergulham num duelo sangrento, em que Gerebita consegue matar o seu oponente com dentadas na jugular. Quando o narrador abandona o farol, massacrado por experiências tão carregadas, toma conhecimento dos motivos que levaram a essa tragédia. 
Gerebita fora casado com uma mulher chamada Maria Rita, que o trocou por Cabrea, que também é trocado por outro homem.
Tempos depois o destino fez com que os dois fossem nomeados para trabalhar no mesmo farol, passando a estabelecer uma convivência de tensão surda. 
Não se deve perder de vista que este conto foge ao padrão de Monteiro Lobato, já que não é regionalista. Passa-se no litoral, ou seja, bem longe do seu conhecido Vale do Paraíba.
O mata-pau - 1915
Um conto com um símbolo muito interessante e que justifica a escolha do artista José Wasth Rodrigues para representar, na capa original de Urupês, um Mata-pau agarrado à outra árvore. O Mata-pau a gente já conhece: é uma planta que surge discretamente numa árvore, cresce rapidamente e, com o tempo, começa a sugar-lhe toda a seiva, matando a árvore original. Partindo dessa imagem é que Lobato transforma uma passagem deslumbrada de um viajante qualquer pela mata em uma história familiar trágica, triste e violenta, apontando filosoficamente para “um outro tipo de Mata-pau“. Mais uma vez, um conto sobre o “monstro humano”.
Dois homens conversam na mata sobre uma planta chamada mata-pau, que cresce e mata todas as outras árvores ao seu redor. O assunto termina no trágico caso de um próspero casal, Elesbão e Rosinha, que encontram um bebê em suas terras e resolvem adotá-lo. Crescido o menino, se envolve com a mãe e mata o pai. Com os negócios paternos em ruina, resolve vende-los, o que vai contra os gostos da mãe-esposa.
Bocatorta - 1915
Na fazenda do Atoleiro, vivia a família do major Zé Lucas. Nas matas da fazenda, havia um negro com a cara defeituosa com fama de monstro: Bocatorta. Cristina, filha do major, morre justamente alguns dias depois de ter ido com o pai ver a tal criatura. Seu noivo, Eduardo, não aguenta a tristeza e vai até o cemitério chorar a morte da amada. Encontra Bocatorta desenterrando a moça. Volta correndo e, junto a um grupo de homens da fazenda, sai em perseguição a Bocatorta. Esse, em fuga, morre ao passar num atoleiro, depois de ter dado o seu único beijo na vida.
“A quarto de légua do arraial do Atoleiro começam as terras da fazenda de igual nome, pertencente ao major Zé Lucas“. 
Assim começa este tenebroso relato de Monteiro Lobato que é uma história capaz de abarcar diversas dimensões de leitura, de aproximações simbólicas a tratamento social (e ideológico também, considerando o pensamento do autor), mas o foco principal aqui é a realidade nua e crua vestida de uma aura tão macabra que, aos olhos que “alguém da cidade”, parece mesmo superstição caipira, coisa que ninguém deve acreditar, eventos que podem ser explicados por uma racional observação do mesmo fato.
São dois estágios de construção da atmosfera de medo: o primeiro, com uma ótima descrição geográfica de todo o arraial do Atoleiro (e do próprio atoleiro em si, profundo e responsável por engolir sem cerimônia homens e animais); e o segundo, com a criação de uma expectativa, certa ameaça e grande desconfiança em torno do horrendo Bocatorta, que a pedido de Eduardo, noivo de Cristina, todos se dispõem a “visitar”. Uma visita de constatação da feiura: o preto deformado como espetáculo, como sustentação de um “relato popular” que se mostra bem verdadeiro.
“__ Bocatorta é a maior curiosidade da fazenda — respondeu o major. — Filho duma escrava de meu pai, nasceu, o mísero, disforme e horripilante como não há memória de outro. Um monstro, de tão feio. Há anos que vive sozinho, escondido no mato, donde raro sai e sempre de noite. O povo diz dele horrores — que come crianças, que é bruxo, que tem parte com o demo. Todasas desgraças acontecidas no arraial correm-lhe por conta. Para mim, é um pobre-diabo cujo crime único é ser feio demais. Como perdeu a medida, está a pagar o crime que não cometeu…”

Mais conteúdos dessa disciplina