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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS FACULDADE DE DIREITO CYNTIA CHRISTINA MASSOTE DANIELLE DE CARVALHO CAMPOS FERREIRA PHILLIPE NOGUEIRA TAMIRES ANDREASSA DIAS THIAGO MENDES OLIVEIRA 3ª AVALIAÇÃO SEMESTRAL DISCIPLINA: DIP-050 – CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE BELO HORIZONTE 2022 2 1) Disserte sobre a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), enfatizando, especificamente: a) Natureza dos legitimados ativos; b) Objeto; c) Efeitos possíveis da decisão definitiva de procedência da ADI; d) Hipóteses de cabimento ou não de uma ADI. Prevista nos artigos 102, I, alínea “a” e 125, §2º da CR/88, a ação direta de inconstitucionalidade (ADI) é uma ação que visa expurgar atos normativos incompatíveis com o paradigma de confronto (seja a Constituição da República ou constituições estaduais). Nesse sentido, tal ação pode ser direcionada tanto para o STF quanto para os tribunais de justiça estaduais (se o parâmetro for a constituição estadual). Trata-se, destarte, de um método de aferição de constitucionalidade concentrado em abstrato e vertical, que tem por objetivo a manutenção da higidez constitucional. Quanto aos legitimados ativos para propor essa ação, é preciso, antes, uma reflexão. Partindo de um pressuposto doutrinário, depreende-se que se deve ter muita cautela ao se cogitar a existência de legitimados ativos ou passivos neste instituto, haja vista a ADI ser um processo objetivo. Ou seja, um processo sem partes, sem lide, sem conflito de interesses subjetivos, tratando-se, portanto, de uma análise meramente em abstrato. Feita essa primeira consideração, infere-se, tendo por base o artigo 103 da Constituição, que os legitimados ativos para a ADI seriam aqueles dispostos no rol taxativo presente no referido diploma constitucional. Entretanto, segundo construção jurisprudencial, há ainda, dentro de tal relação, uma classificação entre legitimados universais e legitimados especiais. Os legitimados ativos especiais são os elencados nos incisos IV, V e IX do art. 103 CR/88 e, por conseguinte, todos os demais incisos tratam daqueles considerados legitimados ativos universais. A diferença fundamental para se distinguir classes de legitimados ativos para propor ADI se fundamenta na exigência ou não da pertinência temática. Nesse sentido, os legitimados especiais (ou interessados) devem demonstrar interesse vinculado à sua finalidade como instituição para proporem ação direta de inconstitucionalidade. Isso se justifica pelo temor de se acumular demasiadamente demandas relativas a ADIs na suprema corte brasileira, o que poderia, nitidamente, impactar na celeridade da prestação jurisdicional referente a outras matérias. Isso porque, até o paradigma constitucional de 1967, apenas o procurador geral da república figurava-se como legitimado ativo para propor ADI, fato este que se 3 modificou drasticamente com a vigência da atual Constituição, dado à grande ampliação de legitimados ativos. Outrossim, torna-se oportuno uma análise mais detida dessa pertinência temática, uma vez que, ao ser observado o interesse de agir para a propositura da ADI, não estar-se-ia, de certo modo, examinando pressupostos subjetivos do processo? Nesse sentido, como muito bem dissertado por RANGEL, criou-se, jurisprudencialmente, um requisito subjetivo extra para um processo que, em sua essência, é objetivo. Aliás, fica nítido que o STF, ao criar tal requisito, estaria também, em certa medida, limitando o acesso a uma garantia constitucional, de modo a comprometer o equilíbrio dos três poderes, ao ter usurpado de uma função exclusiva da Assembleia Constituinte. Porém, não se pode deixar de considerar que as restrições criadas pelo STF visam conferir maior lógica à ação e, ao mesmo tempo, impedir a sobrecarga de ADIs no Supremo Tribunal. Outro aspecto importante de se pautar é que a legitimidade ativa não se confunde com capacidade postulatória, visto que os legitimados dos incisos VIII e IX do artigo 103 CR/88 não possuem capacidade postulatória. Quanto ao seu objeto e, de acordo com a CR/88, depreende-se que pode ser objeto de ADI todos os atos normativos dispostos no art. 59, tendo por base o art. 102, I, alínea “a” c/c art. 125, § 2° da Constituição. Outrossim, segundo teses jurisprudenciais do STF, regimentos internos de tribunais, bem como as chamadas “espécies secundárias”, podem também ser matéria de ADI, desde que ostentem caráter geral, abstrato e inovador. Ademais, segundo o RE 599.633 AgR, ADI 2.361 MC, ADI 1.268 AgR, ADI 2.141, dentre outros, não pode ser objeto de ADI a aferição de constitucionalidade de forma concentrada de leis municipais, tendo como parâmetro a CR/88, salvo se se tratar de norma de reprodução obrigatória pelos estados-membros da federação. Nesse sentido, cabem as seguintes passagens: “Inexiste controle concentrado de lei ou ato normativo municipal frente à Constituição Federal, quer perante os tribunais de justiça dos estados, quer perante o STF (CF, art. 102, I, a; art. 125, § 2º). A Constituição Federal somente admite o controle, em abstrato, de lei ou ato normativo municipal em face da Constituição estadual, junto ao tribunal de justiça do estado (CF, art. 125, § 2º.)”. (ADI 1.268 AgR, 20-9-1995). Ainda: "Se a ação direta de inconstitucionalidade é proposta inicialmente perante o tribunal de justiça local e a violação suscitada diz respeito a preceitos da Carta da República, de reprodução obrigatória pelos estados-membros, deve o STF, nesta parte, julgar a ação, suspendendo-se a de lá". (ADI 2.361 MC). E a explicação jurídica para isso se encontra no seguinte recurso especial julgado pelo Supremo Tribunal Federal: 4 “[...] É que, como compete ao Supremo Tribunal Federal a última palavra sobre o sentido normativo das regras constitucional, não poderia haver submissão deste Tribunal ao pronunciamento de Tribunal hierarquicamente inferior, deixando, pois, de exercer a missão precípua de Guardião da Constituição. [...]”. (RE 599633 AgR). E, por fim, seguindo a mesma lógica demonstrada acima, vale destacar a súmula vinculante 642: Não cabe ação direta de inconstitucionalidade de lei do distrito federal derivada da sua competência legislativa municipal. (STF/2003). É válido destacar que esse tema ainda está em processo de construção, sendo tal matéria extremamente influenciada por questões jurisprudenciais. Nesse viés, torna-se fundamental o acompanhamento das teses jurisprudenciais construídas pelo Supremo Tribunal Federal a fim de que se possa compreender nitidamente o que pode ou não ser objeto de ADI. Em relação aos efeitos da decisão definitiva da ADI, poderão ser classificados em erga omnes, vinculantes e ex tunc. O efeito erga omnes tem como intuito a proteção de interesses coletivos e, portanto, produzirá efeitos contra todos, conforme art 102, § 2º, CRFB/88. O efeito ex tunc, garantirá retroatividade à decisão do STF, gerando a nulidade desde a origem, retornando a situação jurídica anterior. Um exemplo desse efeito ocorre quando uma lei é revogada por outra apontada como inconstitucional e terá sua eficácia restaurada devido ao efeito repristinatório, que é a o retorno de uma norma jurídica anteriormente revogada por outra, em detrimento de uma nova norma jurídica, sendo nula a possibilidade de direitos adquiridos ou atos jurídicos perfeitos gerados de lei considerada inconstitucional. Ao se tratar do efeito vinculante, previsto no artigo 102 da CRFB/88, a partir da Emenda Constitucional nº45 de 2004, garante que as decisões definitivas da matéria impugnada em ADI produzirão efeitos vinculantes em relação à administração pública direta e indireta nos âmbitos federal, estadual e municipal e aos demais órgãos do Poder Judiciário. A ADI tem por objeto ato normativo ou leiestadual ou federal, previstos no art 59 da CRFB/88, que são denominados atos normativos primários, pois surgem diretamente da Carta Magna, também estão inclusos o decreto presidencial e o decreto legislativo, uma vez que, são fundamentados no texto Constitucional. Por fim, depreende-se que as hipóteses de não cabimento de ADI são as seguintes. Primeiro, não pode ser objeto de ADI norma constitucional originada do Poder Constituinte Originário, uma vez que o Brasil não adota a tese da “Inconstitucionalidade de Normas Constitucionais”, de Otto Bachof. Em segundo lugar, normas anteriores ao paradigma de confronto (CR/88) também não podem ser objeto de ADI, haja vista o Princípio da Contemporaneidade, 5 salvo raríssimas exceções. Em terceiro lugar, não cabe ADI em caso de inobservância da pertinência temática, como já abordado anteriormente. E, por último, todos os demais casos que, por exclusão, não forem objeto de ADI, seja por limitação legal ou jurisprudencial. 2) a) O que é a denominada “Teoria da Transcendência dos Motivos Determinantes”? A Teoria da Transcendência dos Motivos Determinantes consiste no reconhecimento da eficácia que transcende o caso singular, não se limitando à parte dispositiva da decisão, de modo a se aplicar aos próprios fundamentos determinantes do julgado que o Supremo Tribunal Federal venha a proferir em sede de controle abstrato, especialmente quando consubstanciar declaração de inconstitucionalidade. (LEITE, 2009) Isso significa que, na prática, os fundamentos da decisão do STF em sede de controle concreto ou abstrato de constitucionalidade vinculam o Poder Judiciário e Administração Pública à sua observância. (LEITE, 2009) 2) b) O STF admite essa citada tese interpretativa? Justifique. De acordo com o Exmo. Min. Barroso, o Supremo Tribunal Federal estendeu, em sucessivas decisões, os limites objetivos e subjetivos das decisões proferidas em sede de controle abstrato de constitucionalidade, com base em uma construção que vem denominando transcendência dos motivos determinantes. Assim sendo, continua o Min. Barroso, juízes e tribunais devem acatamento não apenas à conclusão do acórdão, mas igualmente às razões de decidir. Como consequência, seria admissível reclamação contra qualquer ato, administrativo ou judicial, que contrarie a interpretação constitucional consagrada pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado de constitucionalidade, ainda que a ofensa se dê de forma oblíqua. De forma coerente, a Corte reconheceu legitimidade ativa para ajuizar a reclamação a terceiros — isto é, a quem não foi parte no processo objetivo de controle concentrado — desde que necessária para assegurar o efetivo respeito aos julgados da Corte. Ainda segundo o Min. Luís Roberto Barroso, essa linha jurisprudencial parece afinada com o propósito de racionalização da jurisdição constitucional e da carga de trabalho do Supremo Tribunal Federal, privilegiando as teses constitucionais que hajam sido firmadas em controle abstrato. Por outro lado, Barroso admite que o Tribunal, em decisões posteriores, passou a rejeitar a eficácia transcendente e a adotar uma posição defensiva 6 em matéria de reclamação, limitando seu cabimento ao descumprimento das decisões proferidas em sede concentrada. Por exemplo, quando a matéria em questão refere-se à liberdade de expressão ou à liberdade de imprensa, algumas decisões do STF têm admitido reclamações e deferido liminares, com o propósito de assegurar o conteúdo conferido pela Corte a tais direitos, mesmo quando a decisão reclamada não se baseia no mesmo ato declarado inconstitucional em sede concentrada. 3) O Estado ABC promulgou, em 2015, a Lei Estadual 1234, concedendo, unilateralmente, redução expressiva de alíquota sobre o tributo incidente em operações relativas à circulação interestadual de mercadorias (ICMS) usadas como insumo pela indústria automobilística. O referido ente federativo, com essa política de tratamento diferenciado, conseguiu atrair um grande número de montadoras para seu território. Em razão disso, o Governador do Estado XYZ, possuidor de um vasto parque automobilístico, propõe uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), com pedido de Medida Cautelar, junto ao STF, contra a citada legislação do Estado ABC. Diante do caso hipotético acima descrito, tendo como base a ordem constitucional vigente e a sua interpretação pelo STF, responda: a) Segundo a tese vigente no STF, o Governador do Estado XYZ possui legitimidade para ajuizar uma ADI contra a lei do Estado ABC? Justifique. Não. O rol do Art. 103 da CR/1988 é taxativo ao tratar de quem dispõe de legitimidade para propor Ações Diretas de Inconstitucionalidade. Uma vez que o Art. 103 CR/88 não prevê Estados, o Estado XYZ não tem legitimidade ativa para propor uma ADI contra a lei do Estado ABC. O Governador do Estado XYZ, por outro lado, dispõe de legitimidade ativa conforme previsto pelo Art. 103, inc. V e corroborado pelo Art. 2º, inc. V da Lei 9.868/99. A ilegitimidade de Estados da Federação, tanto de propor, quanto de recorrer de decisões em sede de ADI, também já foi abordada e corroborada pelo STF no Agravo Regimental da ADI 2.130-3, em que o Estado de Santa Catarina agravou uma decisão proferida em ADI proposta pelo Governador de SC. O Relator Min. Celso de Mello1 não conheceu do recurso, uma vez que Estados não possuem legitimidade ativa para propor ADI, sob o fundamento do Art. 103 da CR/88, e que não são admitidas intervenções de 1 STF – ADI-AgR 2.130-3, Relator: Min. Celso de Mello, julgado em 03/10/2001, DJ 14/12/2001 7 terceiro em processos de Ação Direta de Inconstitucionalidade nos termos do Art. 7º, caput da Lei 9.868/99. b) Em sua perspectiva, quais poderiam ser os argumentos apresentados pelo Governador do Estado XYZ, para justificar o pedido de concessão de Medida Cautelar na ADI proposta? O Art. 155, §2º, inc. XII, alínea g da Constituição de 1988, determina que cabe à lei complementar regular, mediante deliberação dos Estados e do DF, como serão concedidas isenções fiscais ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços. Uma vez que o Estado ABC passou a isenção de ICMS por meio de uma lei estadual, a Lei 4321, de forma unilateral, esse dispositivo legal contradiz o que é exigido pela disposição constitucional do Art. 155 e é, portanto, inconstitucional. Posicionamento similar foi apresentado pela Procuradoria Geral da República nos autos da ADI 45892. A PGR manifestou-se pela inconstitucionalidade de lei estadual que promove isenção de ICMS, em violação ao Art. 155, § 2º, inc. XII, alínea g, assim como pela inconstitucionalidade de lei que delegue ao governador de um estado poderes para determinar isenções fiscais, em violação ao Art. 150, § 6º da CR/88, antes de a ADI 4589 ter sido extinta sem julgamento do mérito por perda superveniente de objeto. c) Diante da situação descrita, sendo a Medida Cautelar pleiteada na ADI concedida, quais seriam os possíveis efeitos dessa concessão pelo STF? Conforme ensina BARROSO (2016), a partir do deferimento da Medida Cautelar a norma discutida ficará suspensa imediatamente. Além do caráter erga omnes das decisões em ação direta, há entendimento de que reconheça-se o efeito vinculante (2003, MENDES apud BARROSO, 2016) das decisões concessivas em ação direta de inconstitucionalidade. Sendo assim, a concessão da liminar demandaria a suspensão dos julgamentos que abarcariam a aplicação da lei contestada. A jurisprudência do STF, em consonância com o positivado no § 1º do art. 11 da Lei 9.868/1999, a decisão tem eficácia ex nunc, estando a Corte Superior autorizada pelo mesmo trecho da lei a determinar que os efeitos da decisão seja ex tunc (MENDES, 2021). Com o deferimento da Medida Cautelar, o relator pedirá informações à Assembleia Legislativa do Estado ABC, nostermos do art. 6º da Lei 9.868. A Casa Legislativa terá então 30 dias contados da data da 2 ADI 4589, Relatora: Min. Rosa Weber, extinto em 12/02/2021, DJE nº 29, divulgado em 17/02/2021 8 publicação da decisão para prestar as informações solicitadas, conforme disposto no parágrafo único do art. 6º. Dispõe o art. 22 da Lei 9.868 que o julgamento quanto a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo requer a presença de pelo menos oito ministros na sessão plenária, sendo formado entendimento quando ao menos seis ministros se manifestarem em um mesmo sentido, conforme art. 23 da mesma lei. Em conformidade com o art. 26, a decisão que declara a constitucionalidade ou inconstitucionalidade de uma norma é irrecorrível, cabendo apenas embargos de declaração por parte do requerente ou do requerido (BARROSO, 2016). Inversamente da decisão liminar, o pronunciamento quanto à constitucionalidade da norma tem eficácia ex tunc, podendo o pleno restringir os efeitos da decisão, sob razões excepcionais, desde que haja concordância de dois terços dos ministros, em atenção à redação do art. 27. Ainda, o parágrafo único do art. 28 fixa que a decisão final tem caráter vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal. REFERÊNCIAS: ARGUELHES, Diego Werneck. Poder não é querer: preferências restritivas e redesenho institucional no Supremo Tribunal Federal pós-democratização. In: Gilmar Ferreira Mendes; Jorge Galvão; Rodrigo Mudrovitsch. (Org.). Jurisdição Constitucional. 1ed. São Paulo: Saraiva, 2016. BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2016. BRASIL. Lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941. Lei de Acesso à Informação. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9868.htm>. Acesso em 15 dez. 2021. LEITE, Ravênia Márcia de Oliveira. Teoria da transcendência faz decisões serem vinculantes. Revista Consultor Jurídico, 22 de fevereiro de 2009. MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 2ª edição. São Paulo: Saraiva, 2008. MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo. Curso de direito constitucional. 16. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021. RANGEL, G. D. R. Crítica a pertinência temática. R.EMERJ, Rio de Janeiro, nº4, p.101- 124. 2017. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9868.htm
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