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CENTRO UNIVERSITÁRIO DO NORTE – UNINORTE DISCIPLINA: SISTEMAS JURÍDICOS INTERNACIONAIS ALUNO: ELKE QUEIROZ SIMONETTE MAT: 03145158 DIREITO COMPARADO: RESUMO SOBRE O DIREITO ISLAMICO Manaus - AM 2020 LIÇÃO N.º 7 A FAMÍLIA JURÍDICA ISLÂMICA A RELIGIÃO é uma característica que predomina no Direito islâmico, que tem por fundamento a vontade de Deus e por objeto a regulação de todos os aspectos da vida dos fiéis, desde as suas relações sociais até aos seus deveres morais e religiosos para com Deus. A sua jurisdição é tão ampla quanto a comunidade de fiéis do Islão – a umma251 –, onde quer que estes se encontrem. A jurisdição do Direito islâmico não coincide, por isso, com fronteiras geopolíticas, ainda que possamos, por facilidade de discurso, indicar como Estados pertencentes à família jurídica islâmica todos os Estados com população maioritariamente muçulmana252, como Marrocos, Argélia, Tunísia, Líbia, Egito, Arábia Saudita, Síria, Iraque, Irão, Indonésia e Paquistão. Porém, nenhum destes Estados é regido exclusivamente pelo Direito islâmico, ou seja, pela Sharia, a Lei revelada. Como vimos, as ordens jurídicas destes Estados são híbridas, na medida em que nelas coexistem a tradição jurídica islâmica, aspectos do subsistema romano-germânico e/ou do common law e costumes africanos ou asiáticos. O Direito islâmico, de fonte divina, coexistiu sempre, de resto, desde a fundação da umma, com normas jurídicas de outras proveniências, desde os costumes das tribos árabes pré- islâmicas até às normas administrativas (qánons) impostas pelos califas. A Bíblia desse direito e chama Alcorão, no qual pode ser visto como um código, ainda que o número de disposições “propriamente jurídicas” seja relativamente pequeno. Porque “essencialmente um livro de princípios religiosos e morais”263, o Alcorão estabelece as bases da comunidade sem atentar especialmente na dimensão jurídica das relações entre os seus membros. A relação primordial a ordenar não é a que une os homens entre si, mas a que une os fiéis a Deus. A matéria jurídica inscrita no Alcorão é, por conseguinte, pouco expressiva. Isso não implica, no entanto, que as normas que, no Alcorão, têm por objeto a ordenação das relações sociais sejam menos importantes. Elas tratam, de resto, variadíssimas matérias, desde a interdição do consumo de carne de porco até à punição do adultério, passando pelo dever de uso do véu, pela proibição de corromper juízes e pela proibição da usura. O tratamento dado a cada um dos assuntos não é, de modo algum, exaustivo, no que os preceitos corânicos acabam por se assemelhar a decisões pontuais, desprovidas de uma intenção reguladora de alcance geral. A formulação dos preceitos é, além disso, muito diferente da que encontramos nos códigos dos países integrados no subsistema romano- germânico, o que não é surpreendente, atenta a natureza religiosa do texto. Para além do tom exaltado dos versículos, são também frequentes as repetições de ideias entre versículos e capítulos e há algumas aparentes contradições entre preceitos, de que é exemplar a afirmação, por um lado, de que não há constrangimento na religião e, por outro lado, de que a hostilidade contra os infiéis cessará se eles se converterem ao Islão. Ainda que os islamistas dominem a retórica dos direitos humanos na perfeição e não tenham qualquer dificuldade em alternar entre referências aos direitos humanos da Sharia e referências aos padrões internacionais de direitos humanos, é evidente que, pelo menos no que respeita à igualdade de género, estarão sempre a falar de coisas muito diferentes daquelas em que pensamos quando falamos em direitos humanos numa perspectiva ocidental. Isso mesmo pode ser confirmado pelas reservas apostas pela generalidade dos países de maioria muçulmana aos instrumentos de ratificação dos tratados internacionais sobre a matéria e pelas frequentes afirmações da superioridade da Sharia na proteção das mulheres, de que é um bom exemplo o artigo 3.º, n.º 3, da Carta Árabe de Direitos Humanos, de 2004, nos termos do qual os homens e as mulheres são iguais em dignidade, direitos e deveres, dentro do regime de discriminação positiva estabelecido pela Sharia em benefício das mulheres. Este fosso interpretativo entre ocidentais e muçulmanos sobre o que sejam os direitos humanos e a igualdade de género é muito difícil de superar, o que torna especialmente fátua, ainda que porventura compreensível, a insistência dos líderes políticos ocidentais na promoção da igualdade de género como condição sine qua non do seu apoio aos processos de transição democrática no mundo árabe.
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