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Vanguardas Artisticas Europeias

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Vanguardas Artísticas Europeias 
 
INTRODUÇÃO: 
Hoje, numa época em que a democracia deve reger todas as coisas, seria ilógico a 
arte, que conduz o mundo, ficar para trás na revolução que está ocorrendo agora na 
França. Para alcançar esse objetivo, discutiremos em uma assembleia de artistas os 
planos, projetos e as ideias que nos serão submetidos, no intuito de realizar uma 
nova reorganização da arte e de seus interesses materiais. 
 
É possível identificar o contexto histórico e artístico dessas palavras? De imediato, 
podemos observar interesses marcados por uma nova tomada de posição diante da arte, da 
prática artística e das instituições que a legitimam. Podemos notar também que a palavra-
chave que rege esse pensamento é revolução. 
A citação é de Gustave Courbet (2009) e foi apresentada em uma assembleia junto a outros 
artistas em 18 de março de 1871, durante a Comuna de Paris, da qual era partidário. O 
artista francês, eleito presidente de um comitê responsável por fiscalizar a administração 
pública das Belas Artes, especialmente da École des Beaux-Arts, alertou os artistas para a 
necessidade da liberdade não só da vida, mas da própria arte. 
 
 
O que isso significava? Que os 
artistas deveriam governar a si mesmos assegurando direitos, razões e 
propósitos próprios. Pois até aquele momento, a prática e a exposição 
das obras de arte obedeciam às normas e diretrizes das instituições 
oficiais de arte. E essa situação não atendia mais aos interesses de 
muitos artistas que desejavam se emancipar dos regimes estéticos 
estabelecidos por uma tradição artística formulada ao longo de 
aproximadamente quatro séculos. 
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Com o desenvolvimento da tecnologia industrial, as relações de produção e 
consumo foram alteradas e impactaram uma práxis artística. Durante as quatro 
primeiras décadas do século XX, veremos o nascimento de grupos, movimentos e 
trajetórias singulares de artistas que alteraram os modos de se criar e perceber 
outras realidades a partir da arte. 
Nomeamos vanguardas artísticas estes processos de renovação profunda na forma, 
no conteúdo e no modo como a arte se desenvolveu no interior de uma cultura 
figurativa ocidental. 
Iniciaremos pelo movimento expressionista; conheceremos a formação da École de 
Paris pelo movimento Fauvista e Cubista; os radicalismos do Dada; o projeto 
pedagógico e artístico da Bauhaus e, por fim, as manifestações do Surrealismo. 
 
MÓDULO 1 
 
MOVIMENTO EXPRESSIONISTA 
Há um consenso entre os historiadores da arte sobre o uso do termo 
Expressionismo para diferenciar as obras de arte do movimento impressionista de 
natureza fundamentalmente sensorial. 
Figura 2. O Grito, de Edvard Munch 
Segundo Norbert Wolf (2004), foi o marchand e editor alemão Paul Cassirer quem 
utilizou, pela primeira vez, o termo ao entrar em contato com as obras do artista 
norueguês Edvard Munch (1863-1944). Você provavelmente conhece uma de suas 
pinturas. A obra O grito (1893), da qual a imagem se tornou umas das mais 
populares da história da arte e da cultura visual, está entre as mais reconhecidas do 
artista e se tornou uma referência quando mencionamos a emoção como matéria 
de expressão e representação na arte. 
 
Para Giulio Carlo Argan (2010) foi Wilhelm Worringer (1881-1965), historiador e 
teórico da arte, que criou o termo para definir um conjunto de obras de Vincent van 
Gogh (1853-1890), Paul Cézanne (1839-1906) e Henri Matisse (1869-1954). Afirmar 
que uma pintura, por exemplo, apresenta características expressionistas era o 
mesmo que reconhecer que a representação da realidade não partia somente da 
observação da natureza, mas da atitude do artista diante dela e, sobretudo, diante 
do desenvolvimento de uma prática da arte que vinha se distanciando dos modelos 
acadêmicos. Segundo o historiador da arte, o movimento francês fauvismo e o 
vocabulário plástico dos grupos Die Brücke (A ponte) e Der Blaue Reiter (O cavaleiro 
azul) caracterizaram o momento no qual a arte é comumente chamada de 
expressionista. 
Figura 3. Castelo Negro, 
de Paul Cézanne 
Nota-se, também, a influência do pensamento do filósofo alemão Friedrich 
Nietzsche (1844-1900) e a sua crítica à verdade judaico-cristã. A relação com o 
divino mediada pela natureza é uma das reflexões do filósofo, que vai considerar 
que o homem moderno, ao criar a realidade em vez de apenas representá-la, inicia 
um processo de ruptura com o abrigo e a proteção das leis divinas. Nesse ponto, 
observaremos que os ideais utópicos regeram grande parte da prática artística das 
vanguardas, para as quais a manifestação do novo constitui a ponte para o futuro e 
o princípio ativo para uma mudança social. 
A emancipação da razão impactou o pensamento e o modo como se pratica a arte, 
pois muitos artistas perceberam a necessidade de construir a sua relação com o 
mundo, com as coisas, distanciados de padrões de moralidade que confinavam a 
cultura. No entanto, para compreendermos o enfrentamento à realidade e o novo 
modo de representá-la, precisamos conhecer a obra de Vincent van Gogh, cujas 
pinturas são usualmente citadas como antecedentes dessa mudança de paradigma 
na prática artística da virada do século XIX para o século XX. 
 
VINCENT VAN GOGH (1853 – 1890) 
 
Figura 4. Os Comedores de Batata, de Vincent van Gogh. 
Em uma das cartas a seu irmão Théo, van Gogh conta que embora estudasse as 
cores e os tons a partir da observação da natureza, para a tela pouco lhe interessava 
transpô-las de forma idêntica. Para o artista, as cores da sua palheta são mais 
pertinentes que as da natureza, pois são fruto de uma investigação que aliava 
experimentação e razão, ou seja, a formulação de sua própria verdade. Ele diz: “A 
cor por si só exprime alguma coisa. Não se pode prescindir disto, é preciso tirar 
partido.” 
A série de estudos dos camponeses que realizou quando viveu na cidade de 
Nuenen, na Holanda, ilumina as questões trazidas pelo artista sobre a gradual 
renúncia aos códigos estéticos pautados pelas referências clássicas do belo e do 
bom. A pintura Os comedores de batatas (1885), reconhecida pelo próprio artista 
como uma de suas obras-primas, sofreu diversos julgamentos por deformar a 
anatomia das figuras humanas e representá-las de maneira sombria e grosseira. 
Para a crítica de arte especializada, a pintura não passava de um estudo repleto de 
erros e excessos de tons escuros que comprometiam a visualidade e a 
compreensão da cena. 
Figura 5. Cabeça de mulher, Vincent van 
Gogh 
No entanto, ao lermos a carta em que van Gogh detalha o processo de criação da 
pintura, percebemos claramente o que Argan (2008) definiu sobre o Expressionismo 
ser um movimento do interior para o exterior formulado a partir da produção de 
subjetividade do artista. Nesta perspectiva, é o sujeito que constrói uma dada 
realidade com base no modo como a percebe, acionando seus estados sensíveis e 
racionais. Mesmo sendo realista, não se restringe à representação do mundo 
material tal como se apresenta. A miséria nos campos, em decorrência dos 
processos de industrialização das cidades, toca o corpo e o espírito do artista, que 
opera a partir daquilo que observa, mas se autoriza a subvertê-lo, seja na forma e/ou 
no conteúdo, de acordo com o que sente, percebe e interroga na realidade. 
O que foi visto como distorção, van Gogh viu com acerto na escolha do tema e no 
modo como representou aquela realidade. Acentuou o esforço do trabalhador do 
campo com cores “sabão verde-escuro”, maduras, borradas, desbotadas e 
iluminadas apenas com a luz do candeeiro, tal como a cena que testemunhou nas 
cartas. Pelo tom de alguns escritos, percebe-se o seu dilema entre se posicionar no 
mercado de arte assumindo determinados padrões e códigos estéticos para que a 
sua obra encontrasse um comprador e as revoluções visuais que vinha provocando 
na sua pesquisa pictórica. 
Figura6. Sapatos, 
por Vincent van Gogh 
Van Gogh confia na série de estudos que vinha desenvolvendo e firma seus 
propósitos. Opõe-se à massificação do trabalho mecânico e solta o gesto, a 
pincelada, os contornos e desloca a prática da pintura para outros níveis de 
compreensão, tal como afirma Argan (2008), “[...] o quadro não representa: é.” 
 
 
 
Figura 7. Duas Mulheres no Pântano, por Vincent van Gogh 
Nesta esteira, verificaremos como os artistas dos grupos Die Brücke e Blaue Reiter 
desenvolveram a sua linguagem artística com base em uma realidade atravessada 
pela guerra em que a forma e a cor distorcem as cenas com a consciência e o 
objetivo de se distanciar cada vez mais das convenções estéticas das belas artes, 
das representações naturalistas, além dos temas apontarem também para uma 
crítica social. 
DIE BRÜCKE (A PONTE) 
Figura 8. Um convite em 
xilogravura para uma exposição do grupo de artistas Brücke (1906) criado por Kirchner, no acervo 
da National Gallery of Art 
No dia 7 de junho de 1905, em Dresden (Alemanha), os artistas Erich Heckel (1883-
1970), Ernst Ludwig Kirchner (1870-1938), Max Pechstein (1881-1955) e Karl 
Schmidt-Rottluff (1884-1976) fundam o grupo Die Brücke (A ponte). O nome do 
grupo se deve aos estudos iniciais que desenvolveram a partir do nu, da paisagem 
natural, dos desenhos à mão livre, da perspectiva e da história da arte para 
estabelecer uma “ponte” (daí o nome), entre o passado e os novos valores da 
produção artística. 
Esse ano foi considerado o marco do Expressionismo como movimento artístico, e a 
primeira exposição de van Gogh, onde a mostra da sua linguagem pictural 
organizada pela galeria Ernst Arnold, na Alemanha, impactou os artistas. Seis anos 
depois, o grupo migra para Berlim, a cidade de luz elétrica e ritmo dinâmico, onde os 
contornos trágicos, melancólicos, tensos das cores e da gestualidade marcaram a 
expressão pictórica e gráfica do grupo. Die Brücke se desfez em 27 de maio de 1913 
marcando a presença de uma juventude artística fervorosa pela liberdade de criação 
e pelo distanciamento dos imperativos estilísticos da tradição acadêmica da 
pintura. 
O grupo organizou mais de oitenta exposições que circularam por várias cidades 
alemãs e com a produção gráfica divulgou as obras por meio de impressos como 
pôsteres, cartazes, convites e cartões. 
Os temas das obras estão relacionados à vida cotidiana, à cidade, ao campo, à vida 
noturna, porém longe de apenas representá-los, os expressionistas criaram 
realidades e as direcionaram criticamente à sociedade. É uma pintura que rejeita a 
verossimilhança com o mundo concreto e utiliza a intensidade das cores e a 
distorção como expressão máxima. 
A cultura material dos grupos étnicos da África e da Oceania, reunida nos acervos 
dos museus etnográficos, chamou a atenção dos artistas, assim como os cubistas, 
pela simplificação e expressividade das formas. Os termos instinto ou instintivo, por 
vezes, são utilizados superficialmente e, em alguns casos, pejorativamente para 
nomear a assimilação desse contato, especialmente nas obras, onde os artistas se 
apropriaram do vocabulário formal desses objetos culturais para criar suas 
composições. 
Figura 9. Marinheiro Ferido, por Erich Heckel 
 
 
 
Figura 10. Banhistas no Gramado, 
por Ernst Ludwig Kirchner 
O uso desses termos definia também uma juventude artística inconformada com o 
conservadorismo da sociedade alemã. Nesse ponto, cenas de nu com uma 
conotação erótica são frequentes, porém a distorção das formas gera outros tipos 
de sensação como mal-estar, fragilidade, solidão e angústia. Mesmo que as suas 
composições não toquem diretamente nos avanços catastróficos, causados pela 
revolução industrial alemã, que culmina na Primeira Guerra Mundial, a descarga de 
tensão é imediata. Percebemos isso pelo contraste das cores, pelos contornos e 
pelas pinceladas bem marcadas e uma liberdade na criação das formas figurativas. 
Podemos observar, nas obras dos artistas André Derain (1880-1954) e Ernst Ludwig 
Kirchner (1880-1938), por exemplo, essas características bem marcadas, porém 
cada um desenvolve sua linguagem artística. Derain integra o fauvismo considerado 
parte do Expressionismo na França, movimento sobre o qual comentaremos 
adiante; e Kirchner é o representante do Expressionismo alemão. Para conhecermos 
com mais detalhes os desdobramentos da pesquisa do Die Brücke na obra de 
Kirchner, destacaremos duas pinturas bastante comentadas do artista como 
expressionistas. 
ERNST LUDWIG KIRCHNER (1880-1938) 
A primeira exposição das obras de Kirchner, nos Estados Unidos, foi na emblemática 
mostra coletiva Armory Show de 1913. Essa mostra entrou para a história da arte 
como marco da apresentação oficial da arte moderna na América. Obras 
impressionistas, cubistas, fauvistas e expressionistas chocaram o público ainda 
acostumado aos cânones artísticos das belas artes. 
 
Com a eclosão da Primeira Guerra Mundial e o fim do grupo, Kirchner resolve se 
alistar como voluntário no exército alemão, mas sofre um colapso nervoso que 
comprometerá toda a sua vida. Contudo, mesmo após essa crise, não deixou de 
produzir pinturas, gravuras, desenhos e esculturas que, segundo Argan (2008), 
“extrai penosamente de si, um fragmento vivo de sua própria existência.” 
Observe a obra Rua (1913) do acervo do MoMA NY. Segundo a descrição técnica, 
essa obra foi realizada em Berlim e representa um “período de solidão e 
insegurança, logo após o grupo Brücke se separar [...].” De acordo com o museu, as 
mulheres representadas na pintura estão na condição de prostitutas, tema frequente 
dos artistas desse período, justamente por simbolizar a cidade moderna, o cenário 
de glamour e risco, intimidade e excitação. 
O modo como o artista pintou o quadro se aproxima da estética futurista que 
acentuava o movimento e a rapidez faiscante da velocidade das máquinas. Preste 
atenção nos movimentos da pincelada, na composição dinâmica das linhas, dos 
personagens que parecem se articular simultaneamente. Os rostos foram 
estilizados a ponto de compararmos às máscaras no sentido formal e simbólico, já 
que se trata de um tema que contorna a vida noturna e boêmia das cidades. 
Figura 11. Street, de Ernst Ludwig 
Kirchner 
Figura 12. Potsdamer Platz, de 
Ernst Ludwig Kirchner 
Esse tema também pode ser visto em sua obra Potsdamer Platz (1914), porém com 
mais dados quanto à sua localização. O título da obra significa “A praça de 
Potsdam” na qual Kirchner tinha um ateliê nas proximidades, logo era um lugar onde 
frequentemente circulava e observava. 
À esquerda do quadro, encontramos a insinuação da fachada de um famoso café, 
ponto de encontro dos artistas e das mulheres representadas, em primeiro plano, 
com seus chapéus adornados com penas de aves de rapina que ‘tocam’ o relógio da 
estação de trem, que está em segundo plano. O relógio marca a meia-noite, 
expressa pelo azul tempestuoso que cobre a área do céu. 
Esta é uma pintura de aproximadamente 2,00m x 1,50m de dimensão. Uma obra 
monumental que destaca a relação entre as pessoas no quadro e o modo como 
estão posicionadas. As duas mulheres, no centro da composição, foram pintadas 
conforme as cores do céu e das ruas. Tons azuis e verdes cobrem suas roupas e 
peles, respectivamente. A intensidade do azul no vestido e o uso do véu da mulher à 
esquerda associa-se ao luto, rito do qual as mulheres eram socialmente conduzidas 
a seguir a fim de lamentar a perda do marido, o que parece uma contradição dada a 
condição dessas mulheres. Uma interpretação possível foi dita por Nobert Wolf 
(2004), sobre a pintura ter sido concluída logo após a eclosão da Primeira Guerra 
Mundial, portanto o luto também foi imposto às mulheres em prostituição que 
andavam pelas ruas de Berlim nomeadas de “viúvas de guerra”. 
Os danos da guerra poderiam estar expressos indiretamente nesse quadro, mas 
foram citadosde forma explícita pelo artista em seu autorretrato como soldado, 
onde aparece com a mão amputada à frente de um quadro de nu feminino. Self-
portrait as a soldier (1915) pode ser lido tanto como um testemunho individual dos 
seus sofrimentos psíquicos em decorrência da guerra, mas também como metáfora 
da crise e da instabilidade alemã no conflito. 
Figura 13. Autorretrato como 
soldado, de Ernst Ludwig Kirchner 
Aproximadamente trinta obras de Kirchner foram exibidas na exposição Arte 
Degenerada (Entartete Kunst), de 1937, produzida por Adolf Hitler (1889-1945), 
chanceler da Alemanha desde 1933. A mostra representava sua campanha pública 
contra a arte moderna, considerada prejudicial à imagem do governo nacional-
socialista alemão (1933-1945). Mais de 600 obras foram retiradas de coleções 
públicas e muitas destruídas. Diante do cenário aterrorizante, de humilhação e 
sofrimento que aquela exposição causara, Kirchner comete suicídio em 1938. 
A ARTE GRÁFICA DE KÄTHE KOLLWITZ (1867-1945) 
A retomada das artes gráficas, especialmente da xilogravura, marca a relação com a 
tradição alemã do trabalho manual, popular, ilustrativo e, também, da impressão da 
matéria sobre a imagem. Nas xilogravuras, a partir de uma peça de madeira, se 
escava com o ferro das goivas (ferramentas de corte) os veios que formarão as 
ideias e expressões do artista. O que permanece em relevo é o que será impresso 
no papel. As características da madeira, do modo como o artista talha e dos 
resultados da imagem formam uma unidade precisa e intencional: a mão, o trabalho, 
o esforço do artista são impressos junto à cena criada. 
Figura 14. Os 
Voluntários, de Käthe Kollwitz 
As gravuras de Käthe Kollwitz, uma das únicas artistas mulheres citadas no 
Movimento Expressionista, primam pela deformidade, pela redução de cores, pelo 
uso frequente do preto e do branco na representação da condição humana, no 
período da guerra, em que o luto e sofrimento são temas recorrentes. A série de 
xilogravuras Krieg (Guerra) responde aos anos indescritíveis da tragédia que abalou 
diversos artistas e, logo, impactou a sua maneira de expressar em imagens a 
compreensão do seu próprio tempo. 
As composições em preto e branco trazem mulheres em situação de dor e medo e 
jovens combatentes, incluindo a perda de um de seus filhos na guerra, como se 
estivessem experimentando a tradição das danças medievais da morte. Em outras 
gravuras, a morte é representada na figura de líderes militares. 
Figura 15. As Mães, 
de Käthe Kollwitz 
Em 1933, o crítico de arte Mario Pedrosa (1900-1981) realizou uma conferência 
sobre a obra da artista no Clube de Artistas Modernos, em São Paulo, aproveitando 
o momento político no Brasil para falar da arte como expressão crítica da realidade. 
Pedrosa desenvolveu uma reflexão sobre a função social da arte ao tratar de temas 
tão impactantes e, ainda assim, o artista se manter fiel à construção de uma 
realidade expressiva distanciada de manifestações ideológicas ou tendenciosas. Ele 
diz: “A guerra de Kollwitz só tem sacrifícios anônimos e monstruosos, só tem viúvas 
a quem não resta mais nada, na miséria e na dor.” 
DER BLAUE REITER (O CAVALEIRO AZUL) 
Em 1911, o artista russo Wassily Kandinsky (1866-1944) funda em Munique 
(Alemanha) uma associação livre de pintores composta por Paul Klee (1879-1940), 
Franz Marc (1880-1916), Heinrich Campendonk (1889-1957) entre outros artistas, 
interessados em desenvolver uma arte não figurativa com referências espiritualistas 
de vertente oriental opostas às pesquisas racionalistas do Cubismo. O nome do 
grupo se refere ao encantamento de Kandinsky por cavaleiros e Marc por cavalos, e 
ambos tinham fascínio pela cor azul. 
Figura 16. Casal Cavalgando, de 
Wassily Kandinsky 
 
Comentário 
Embora o movimento não tenha definido um programa artístico, as 
obras apresentavam um princípio em comum: a comunicação 
intersubjetiva, ou seja, de pessoa para pessoa sem o intermédio da 
natureza ou do mundo material. O foco estava na atividade da alma 
humana e nos diferentes conteúdos semânticos contidos nos arranjos 
das formas e das cores. 
 
No texto O efeito da cor (1911), Kandinsky comenta que o modo como 
estabelecemos nossa relação com a cor pode desencadear uma série de sensações 
psíquicas que estão para além do contato visual que, na maioria dos casos, ocorre 
de uma maneira superficial quando se trata de realidades familiares. Ele diz: “[...] os 
objetos com os quais deparamos pela primeira vez exercem imediatamente sobre 
nós uma impressão que nos toca a alma.” O artista compara essa experiência com 
o encanto das crianças que se deslumbram com as descobertas do mundo! 
Saiba mais 
Entre 1911 e 1912, Wassily Kandinsky e Franz Marc publicaram o Almanaque Der 
Blaue Reiter, um livro com xilogravuras pintadas a mão e textos sobre a questão da 
forma e da cor. 
O Museu Boijmans Van Beuningen exibiu uma edição excepcional do Der Blaue 
Reiter Almanac adquirido pelo escritor, historiador e anarquista holandês Arthur 
Lehning. 
Figura 17. Gabriele 
Münter Pintando, de Wassily Kandinsky 
Em suas pesquisas teóricas e práticas, Kandinsky estabelece alguns estágios de 
relacionamento com as cores. O primeiro estágio seria a correlação entre as cores e 
as sensações ativadas pelo repertório de experiências e saberes que temos sobre 
elas. Ele exemplifica: “a cor vermelha pode provocar uma vibração espiritual 
semelhante à da chama, pois o vermelho é a cor do fogo. [...] Neste caso, portanto, a 
cor desperta a lembrança de outro agente físico que sem dúvida exerce um efeito 
pungente sobre a alma.” 
Outro estágio é o da associação da cor a outros sentidos como paladar e tato, 
quando alguns tons rementem às sensações quentes, frias, ásperas ou aveludadas. 
Nesse ponto, o artista considera que pensar sobre a harmonia das cores e o toque 
dos seus efeitos na percepção sensível, especialmente no espírito, caracteriza um 
dos seus propósitos na arte. 
Figura 18. Nina 
Kandinsky in Akhtyrka, de Wassily Kandinsky 
Após a primeira exposição do grupo em Munique, Kandinsky desenvolve uma longa 
reflexão sobre a forma como “matéria” que “oculta o espírito criador”, considerando 
que a liberdade está na busca pelo caminho da abstração. Afirma: “A forma é a 
expressão exterior do conteúdo interior”, ou melhor, a arte é expressão da alma, do 
espírito do artista que pode se dar de maneiras distintas. Se essa expressão for 
elaborada a partir das referências já existentes no mundo concreto, essa liberdade 
criadora não acontece, pois não há fórmulas, modelos ou padrões a seguir. Contudo 
reconhece que cada época imprime pelo menos três formas de expressão: da 
criação do “elemento nacional”; do “estilo” e do “movimento”, do qual reconhece, 
neste último, a inter-relação dos artistas dominados pelo “espírito da época”. 
Na passagem do texto Sobre a questão da forma [1912] (2013), o artista é bastante 
enfático: “o mais importante não é a forma (a matéria), mas o conteúdo (o espírito). 
[...] o mais importante não é se a forma é pessoal ou nacional, ou se tem estilo; nem 
se ela corresponde ou não aos principais movimentos contemporâneos; nem se ela 
guarda ou não semelhanças com muitas ou poucas outras formas. O mais 
importante, na questão da forma, é se ela se originou ou não de uma necessidade 
interior.” Para Kandinsky, essa necessidade interior estava ligada diretamente a esta 
dimensão espiritual como realidade psíquica, não racional, tão importante para a 
existência quanto a realidade física. 
Figura 19. 
Sonhador, por Wassily Kandinsky 
A série Improvisação, de Kandinsky, e as pinturas de Klee que remetem aos 
grafismos infantis retomam o conceito de “primitivismo” como estágio inicial da 
vontade de expressão do artista na construção de um vocabulário visual que toque, 
de outro modo, a própria realidade. 
Não há a necessidade de se reconhecer objetos, mas de se percebero ritmo, o 
movimento, as desordens e tensões provocadas por um arranjo de linhas, círculos, 
cores, curvas, espirais, triângulos como estímulos sensoriais capazes de ampliar a 
nossa experiência com a arte. 
Tanto na obra de Kandinsky quanto na de Klee é possível estabelecer uma relação 
com a música por causa da impressão rítmica e sonora que as composições 
expressam. Suas obras nos convidam a uma interação. Há um aspecto lúdico 
importante a ser considerado. Na obra de Klee, ao tratar da atividade gráfica da 
infância coloca em cena também a região do inconsciente, apresentada pelas 
pesquisas de Sigmund Freud (1856-1939), como impulso expressivo, onde imagens 
e signos se conectam sem obedecer à lógica racional. 
No texto Credo criativo, de 1920, Paul Klee (2004) tem uma frase bem conhecida que 
diz: “A arte não reproduz o visível, mas torna visível.” A construção dos elementos 
gráficos de sua obra conduz, nas palavras do artista, a uma “sinfonia formal” em 
que as linhas, os planos, as estruturas e, especialmente, o espaço são operados 
pelo conceito de tempo. 
Figura 20. Women in their 
Sunday Best, de Paul Klee 
Comentário 
O artista continua a reflexão: “A transformação de um ponto em movimento e linha 
requer tempo. O mesmo ocorre quando uma linha se desloca para formar um plano. 
E o mesmo vale para os planos móveis que formam espaços.” Constata que o 
movimento é a base da transformação das coisas e a arte também contribui para 
essa percepção. 
 
 
 
 
 
 
 
EXPRESSIONISMO 
 
 
Figura 21. Die Wölfe, de Franz Marc 
A arte vanguardista é fortemente autoral como você deve ter percebido. Os autores 
passam a dialogar, mas ao mesmo tempo criam suas expressões, sua própria 
maneira de discutir o mundo. Optamos por conhecer o Expressionismo circulando 
pela autoria e propostas dos artistas. Afinal a ideia de que não existe arte, mas sim 
artistas é fundamento de nossas perspectivas. 
 
VERIFICANDO O APRENDIZADO 
1. “Trabalhando diretamente no local, procuro fixar no desenho o que é essencial – 
mais tarde, encho os espaços delimitados pelos contornos – expressos ou não, mas de 
qualquer modo, sentidos – com tons que também são simplificados, no sentido de 
que tudo o que vai ser solo terá o mesmo tom parecido com violeta, que todo céu 
terá um tom azul, que a vegetação verde será verde-azulada, ou verde-amarelada, 
exagerando deliberadamente os amarelos e azuis nesse caso. Em suma, meu querido 
camarada, nada de ilusões de ótica.” (CHIPP, 1988, p. 28) 
 
Parte da obra de Vincent van Gogh é enquadrada pela história da arte como pós-
impressionista ou expressionista. Na perspectiva pós-impressionista, por exemplo, a 
sua pintura partia da prática en plein air (ao ar livre) e incorporava os gestos rápidos, 
as pinceladas curtas e irregulares. Essa maneira de pintar também estava contida na 
estética expressionista, sentido do qual assumimos para a obra do artista neste 
módulo. 
 
A partir da reflexão acima e do trecho da carta de Vincent van Gogh a Émile Bernard, 
de junho de 1888, indique a alternativa que apresenta outra característica marcante 
que aproximaria a obra do artista à estética expressionista. 
 
 
A) A captura da sensação visual da cor obtida pela observação da natureza. 
B) A subjetividade do artista como base para a pintura, tendo a cor como 
expressão do seu estado sensível. (correto) 
C) A pintura é a representação do que está diante do pintor em uma situação 
externa ao ateliê. 
D) O estudo da cor como base científica para a compor uma pintura. 
E) Valorizar as expressões da realidade e a necessária crítica social. 
 
2. Observe as duas pinturas. A primeira composição é de Kirchner, que 
integrou o grupo Die Brücke (A ponte), e a segunda obra é de Kandinsky, 
que fundou o grupo Der Blaue Reiter (O cavaleiro azul). Ambas pertencem 
ao Expressionismo, movimento do qual os artistas romperam 
definitivamente com a mimese da natureza. No entanto, são composições 
com propostas bem diferentes. Em que ponto esses artistas, que 
pertenciam à mesma estética expressionista, se diferenciavam? 
 
 
 
A) Na rejeição à verossimilhança com o mundo concreto. 
B) No distanciamento da perspectiva linear. 
C) Na abordagem das cores como expressão interna. 
D) Na construção do espaço pictórico – arranjo de formas e cores. (correto) 
E) Na impressão sobre o mundo real, com cores e valorização da luz. 
 
MÓDULO 2 
 
MOVIMENTOS FAUVISTA, CUBISTA E DADAÍSTA 
A cidade de Paris, no final do século XIX e nas primeiras quatro décadas do século 
XX, foi um notável centro de produção, exposição e circulação artística. Diversos 
artistas migravam para a cidade com o intuito de conhecer e estabelecer contatos 
com outros artistas, escritores, filósofos, colecionadores, marchands, críticos de arte 
etc. Esses encontros ocorreram em diferentes lugares, restaurantes, ateliês, 
exposições e, especialmente nos cafés do bairro Montparnasse, onde a École de 
Paris (Escola de Paris) se reunia frequentemente. 
Figura 22. Fábricas 
em Eauplet, de Robert Antoine Pinchon 
A École de Paris foi formada nos primeiros anos do século XX por diversos artistas 
franceses e de diferentes nacionalidades que viviam na cidade, dentre os quais 
estavam o espanhol Pablo Picasso (1881-1973), os franceses Georges Braque 
(1882-1963), Henri Matisse, Fernand Léger (1881-1955), André Derain e Pierre 
Bonnard (1867-1947), o italiano Amedeo Modigliani (1884-1920) e Marc Chagall 
(1887-1985) natural da Rússia. 
O ambiente cultural cosmopolita produzido pelo grupo não determinava nenhuma 
diretriz estética, pois preservava a liberdade artística como princípio fundamental. 
Os artistas filiados buscavam se atualizar sobre as tendências e revoluções na 
própria prática e no modo de se expor as obras de arte. Nesse ponto, foi refúgio de 
diversos artistas que viviam sob regimes totalitários e, também aqueles que 
queriam renunciar aos imperativos acadêmicos. Não foi uma instituição concreta, 
física, mas “abrigou” as ideias, as inovações de importantes artistas da história da 
arte moderna europeia. 
 
As expressões artísticas do fauvismo e do Cubismo, tendo Matisse, Picasso e 
Braque como principais representantes, tiveram início nesse momento. Essa tríade, 
que Argan (2008) reconheceu como os três pilares da Escola e do mercado de arte, 
revolucionou a tradição figurativa ocidental. 
Figura 23. Atirador 
de arco, de Vicente do Rego Monteiro 
Vale notar que, em 1930, o artista brasileiro Vicente do Rego Monteiro (1899-1970) e 
o crítico Géo-Charles (1892-1963) organizaram uma exposição itinerante da École de 
Paris no Brasil. A exposição seria inaugurada em Recife e depois seguiria para São 
Paulo e Rio de Janeiro. As obras de Picasso, Braque e Léger foram exibidas pela 
primeira vez no país. 
Residindo na Europa há quase uma década, Monteiro pôde construir uma rede de 
amizades e contatos, entre colecionadores, marchands e artistas o que possibilitou 
a ideia da mostra Exposição de Arte Francesa com o objetivo de apresentar ao 
público sua obra ao lado “da pintura de meus companheiros da Escola de Paris, da 
qual fazia parte.” 
Embora a mostra tenha apresentado um caráter inédito, a sua recepção se revelou 
um fracasso de visitação. Moacir dos Anjos e Jorge Ventura Morais (1998), ao 
analisarem a recepção negativa dessa mostra em Recife, argumentaram que o 
desinteresse do público pelos arlequins (s/d) de Picasso, por exemplo, não se referia 
à falta de acolhimento ou desdém, mas era “o resultado de uma divergência entre os 
códigos culturais a que os quadros faziam referência” e o não reconhecimento da 
arte moderna, da qual o público, que ali esteve presente, tivesse mais familiaridade. 
Diferente dos outros movimentos, o Dada migrou para outros lugares em virtude dos 
impactos gerados pela Primeira Guerra Mundial. Paris é uma das cidades onde essa 
vanguarda também se desenvolveu. Tristan Tzara (1896-1963), líderdo grupo, 
chega à cidade e se une a André Breton (1896-1966) e outros artistas e produzem 
uma série de manifestações dadaístas criticando, inclusive, o modo como as outras 
vanguardas vinham se conformando no campo artístico. A partir de agora, veremos 
cada movimento, suas principais ideias e artistas e os desdobramentos de cada 
proposta na prática artística. 
Figura 24. Retrato de Tristan Tzara, 
de Robert Delaunay 
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MOVIMENTO FAUVISTA 
 
Figura 25. La Danse (segunda versão), de Henri Matisse 
Como vimos, o fauvismo é associado ao movimento expressionista por partir da cor 
como expressão máxima da formulação de uma linguagem artística e do 
compromisso com a pesquisa que Vincent van Gogh, Paul Gauguin (1848-1903) e 
Cézanne vinham desenvolvendo quanto à construção do espaço pictórico cada vez 
mais distanciado da mimese da natureza. 
O artista Henri Matisse é o nome de referência deste movimento que, segundo 
Argan (2008), sobreviveu física e emocionalmente às duas guerras e não alterou sua 
pesquisa em virtude das dores e dos sofrimentos percebidos diante de tamanha 
catástrofe. A sua linguagem artística permaneceu fiel a uma poética construída 
sobre as bases de uma simplificação das formas figurativas acentuadas pela 
vivacidade das cores, dos tons e da expressão das suas próprias emoções. 
A tradução de fauve significa fera e os termos são análogos a selvagem, feroz, 
bárbaro e passou a corresponder às pinturas que apresentam uma potência 
mediada pela cor, tal como uma força apaixonada de uma sensação percebida. 
Além de Matisse, os franceses Maurice de Vlaminck (1876-1958), André Derain, 
Othon Friesz (1879-1949), Georges Rouault (1871-1958), Albert Marquet (1875-
1947), Raoul Dufy (1877-1953) e o holandês Kees van Dongen (1877-1968) 
adotaram as ideias do fauvismo para a pintura. Alguns desses artistas transitaram 
entre o impressionismo e o próprio fauvismo, mas sempre tendo a cor como fonte 
principal da pesquisa formal. 
Matisse sofre uma influência direta das obras de Gauguin que, assim como van 
Gogh, desenvolveu uma poética de trabalho bastante singular, sobretudo quando 
decide sair de Paris no final do século XIX e firma residência no Taiti, à época, 
província francesa. Na obra Vision after the Sermon or Jacob wrestling with the angel, 
de 1888 (Visão após o Sermão ou Jacó lutando com o anjo), de Gauguin, a cor se 
apresenta emancipada da representação natural. 
Figura 26. Mulheres à beira-mar ou 
Maternidade I, de Paul Gauguin 
O uso do vermelho na pintura é muito marcante. Cobre todo o plano de fundo e, 
pelas tonalidades, podemos associar a uma situação de violência, de luta ou 
energia. É um vermelho bem marcante e mesmo que produza sensações que 
encontramos em nosso cotidiano, a composição se distancia de uma tentativa de 
construir uma ilusão de realidade. No momento dessa pintura, ele ainda se 
encontrava na França, mas longe da efervescência cultural parisiense. Embora o 
tema da obra seja religioso, a experiência visual, logo sensorial encontra-se em 
primeiro plano no ato da observação. 
Figura 27. The Red 
Studio, de Henri Matisse 
O vermelho saturado que cobre grande parte da pintura de Gauguin, também está 
presente na tela The red studio (Ateliê vermelho), de 1911, de Matisse. Não são os 
mesmos tons, mas convergem para um ponto em comum: confundem os planos 
que constroem a arquitetura do espaço. Percebemos que há um espaço insinuado 
pela relação entre os outros elementos da composição: linhas, formas, texturas. 
Não há incidência de luzes ou sombras, assim como percebemos, ainda que 
sutilmente na obra de Gauguin. 
A obra de Matisse não sofreu apenas o impacto das pesquisas de Gauguin, mas 
também de Cézanne, que trabalhou intensamente na quebra da janela renascentista, 
ou seja, quando a composição é organizada segundo as leis da perspectiva linear, 
cujas formas convergem para um ou mais pontos de fuga. 
Para o artista, a tarefa da arte àquela altura era a de interpretar e submeter a 
natureza ao espírito do quadro e não o contrário, copiá-la servilmente. Seus 
desenhos, por exemplo, revelam essa busca. Os contornos não obedecem à 
aparência externa do objeto ou da pessoa representada, mas o que importa é a 
caligrafia construída a partir do que se vê independente da exatidão anatômica. 
Essas pesquisas revisaram o único modo de se representar a realidade até aquele 
momento. Os objetos representados nesse quadro podem ser vistos de diferentes 
ângulos, frontalmente, lateralmente e até do alto, como o prato e a caixa de lápis 
sobre a mesa. Isso significa que o artista insere ângulos simultâneos em uma 
mesma cena e nos convida a observar a mesma pintura em situações distintas e a 
refletir sobre as convenções artísticas. 
Esse vocabulário visual seria absorvido também por Picasso e Braque com o 
Cubismo, que renunciaria cada vez mais ao ilusionismo renascentista que se 
perpetuou durante tantos séculos. No entanto, antes mesmo de avançarmos para as 
obras desses dois artistas, se pretendemos compreender as intenções do programa 
Cubista, algumas questões da obra de Cézanne ainda precisam ser ressaltadas. 
PAUL CÉZANNE 
[...] O que há por trás do fenômeno natural? Talvez, nada; talvez, tudo. Portanto, 
cruzo estas mãos errantes. Pego à direita, à esquerda, aqui e ali, em toda a parte, as 
suas cores, as suas nuanças; congelo-as, aproximo-as uma das outras e elas formam 
linhas, tornam-se objetos, rochas, árvores, sem que eu pense nisso. Adquirem um 
volume. Minha tela aperta as mãos, não vacila, é verdadeira, é densa, é cheia. 
A partir dessas palavras de Cézanne, citadas por Mario de Micheli (2004), 
percebemos que o uso das cores e das formas, em van Gogh, não se aplica à prática 
de Cézanne, que investiu sua pesquisa pictórica na justaposição de formas e planos 
na superfície da tela, no rompimento com uma perspectiva linear comentada há 
pouco. Argan (2008) conclui com a pesquisa de Cézanne que, “a arte não é efusão 
lírica, é problema, e Cézanne era totalmente problemático.” O artista investiga o 
problema da forma no espaço pictórico. A sua obra não apresentou conteúdos 
sociais ou políticos, mas provocou uma revolução nos códigos visuais e, 
especialmente na tradição da pintura de paisagem. 
 
Figura 28. Les Grandes Baigneuses, de Paul Cézanne 
A série de pinturas sobre o Monte Santa Vitória é fruto de uma pesquisa avançada 
sobre a prática da pintura e da visualidade. A realidade é apresentada como uma 
estrutura, em que o objetivo principal é produzir uma visualidade e não apenas 
representá-la. Esta petite sensation, à qual o artista se refere, foi formulada 
juntamente à construção de um pensamento analítico, racional, expresso junto a cor 
como elemento estrutural. Percebemos o volume das formas pela densidade 
matérica da tinta, da pincelada e da relação entre as cores que, postas lado a lado, 
produzem contrastes, delimitam formas ou convergem diluindo seus limites. Não há 
a intenção de produzir emoções pelas escolhas dos tons. Podemos até sentir ao 
observarmos a pintura, mas esse não era o objetivo do artista. 
Os planos que compõem a paisagem de Cézanne se fundem com o ritmo impresso 
nas pinceladas, possibilitando novas experiências visuais divergentes do ultra-
acabamento das pinturas de paisagem do século XVIII, em que havia uma tentativa 
de se reproduzir mimeticamente as cores e texturas observadas do mundo natural. 
O espaço é construído a partir de uma massa cromática estrategicamente 
elaborada. Empastes e veladuras produzidas pela densidade da tinta e pelo gesto da 
pincelada produzem uma ilusão de profundidade a partir dos contornos das formas 
geometrizadas que se organizam em meio a linhas perpendiculares. E, dependendo 
da distância que tomamos da obra ou do zoom que podemos realizar na imagem, 
encontraremos uma pintura figurativa ou abstrata. 
Figura 29. Mont Sainte-Victoire, de 
Paul CézanneSaiba mais 
Desenvolvendo o tema da possibilidade de percepção abstrata em suas obras, 
Cézanne descreve ao pintor francês Émile Bernard, em abril de 1904, o processo de 
construção da sua pintura: “abordar a natureza através do cilindro, da esfera, do 
cone, colocando o conjunto em perspectiva, de forma que cada lado de um objeto, 
de um plano, se dirija para um ponto central. [...] Ora, para nós, seres humanos, a 
natureza é mais em profundidade do que em superfície, donde a necessidade de 
introduzir nas nossas vibrações de luz, representadas pelos vermelhos e amarelos, 
uma quantidade suficiente de azulado, para se fazer sentir o ar.” 
Micheli (2004) resume: “No fundo, seu drama não era muito diferente de van Gogh; 
porém, enquanto em van Gogh a explosão dos sentimentos acabara se 
sobressaindo, Cézanne comprimiria os sentimentos, encerrando-os numa definição 
formal.” Esta desconstrução do espaço pictórico e a prática da pintura como 
questão central, na obra de Cézanne, irá influenciar a obra de Picasso e o 
nascimento do Cubismo como um movimento revolucionário que impactou a 
tradição artística ocidental. 
CUBISMO 
A nova escola de pintura é conhecida como Cubismo, nome esse forjado por decisão, 
no outono de 1908, por Henri Matisse, ao contemplar um quadro representando 
algumas casas, cuja aparência cúbica o impressionou vivamente. 
Estas palavras são de Guillaume Apollinaire (1880-1918), escritor e crítico de arte 
francês, reconhecido por teorizar o movimento no livro Pintores cubistas: meditações 
estéticas, de 1913 (APPOLINAIRE, 1997). 
Quando nos deparamos com uma pintura do Cubismo, podemos ter a mesma 
impressão que Matisse teve ao observar o quadro. À primeira vista, as composições 
parecem ter sido criadas a partir de um conjunto de formas geométricas, no entanto, 
precisamos compreender que essas pinturas investigam as formas a partir da sua 
realidade geométrica e não o contrário. É outro ângulo de percepção. A natureza do 
Cubismo é essencialmente mental. Os temas são mero pretextos. O que interessava 
aos artistas era a própria prática da pintura que poderia valer-se da memória e 
também do que era percebido pela própria visão diante de uma realidade concreta. 
Figura 30. Vista da 
baía, de Juan Gris 
O interesse dos artistas do Cubismo pelas formas e pelos volumes vinha da 
consciência objetiva da pintura de Cézanne. Os artistas Fernand Léger, Juan Gris 
(1887-1927), Pablo Picasso e Georges Braque integraram as pesquisas cada um 
desenvolvendo seu próprio método de trabalho. Perceberam a superfície da pintura 
como uma arquitetura, onde as formas e os planos são articulados de outra 
maneira. Os objetos são representados de variados pontos de vista, como 
enunciamos em Matisse. 
Tanto na pintura de Cézanne quanto dos artistas cubistas vemos que a perspectiva 
ganha outras soluções formais. Não olhamos apenas para uma ou duas direções, 
mas para várias ao mesmo tempo. Foi uma ruptura com um modo de se construir a 
realidade diante dos nossos olhos sem precedentes na história da arte. 
Picasso entrou em contato com a retrospectiva da obra de Cézanne no Salão de 
Outono (Paris) em 1907. Um ano antes, havia iniciado os estudos de Les demoiselles 
d’Avignon e concluiu a pintura no mesmo ano da exposição. Não por acaso, essa 
obra traz as questões que colocávamos há pouco sobre o rompimento com a 
perspectiva linear reinventando a estrutura da composição em planos que até 
sugerem uma lógica espacial, mas não mais em profundidade. 
Figura 31. Les 
demoiselles d'Avignon, de Pablo Picasso 
Acrescenta-se ainda o modo como o artista representou o rosto das mulheres. Uma 
apropriação direta das sínteses encontradas nos objetos, nas máscaras dos grupos 
étnicos africanos que tanto interessaram os artistas franceses àquele momento. As 
regras de imitação, os fundamentos da perspectiva linear foram completamente 
suprimidos. Os volumes se encontram reduzidos, há ainda incidência de luz e 
sombra sugerindo volume, mas o que perceberemos em algumas fases da pintura 
cubista é o seu total desaparecimento. 
Figura 32. A Mulher que Chora, de 
Pablo Picasso 
No Cubismo a composição nos remete a um quebra-cabeça, cujos planos ora estão 
justapostos, ora sobrepostos. As formas parecem desmontadas, porém ao 
permanecer observando a imagem por alguns minutos, mesmo aparentemente 
desconstruídas, identificamos a figura ali colocada. No entanto, a intenção não era 
estabelecer um jogo visual de montagem e desmontagem, mas uma estratégia de 
rompimento com as convenções, com antigos sistemas de representação. Ao invés 
de iludir nosso olhar com a tridimensionalidade, é a consciência da superfície da 
tela que ganha visibilidade, ou melhor, a própria pintura e não mais o tema 
representado. 
Para tanto, as formas necessariamente precisavam ser simplificadas ao seu 
máximo. No lugar de volumes, vemos linhas horizontais, verticais, diagonais, curvas 
abertas que imprimem um ritmo, o que possibilita a observação da pintura em 
outras direções. Em algumas pinturas, ao girarmos a imagem, observamos outro 
arranjo composicional. 
Saiba mais 
Picasso e Braque são considerados os pioneiros do movimento Cubista. Entre 1989 
e 1990, o Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA) organizou uma exposição 
com obras dos dois artistas, que se encontra disponível na página do museu. 
Acesse o site, clique nas imagens da exposição Picasso and Braque: Pioneering 
Cubism e veja alguns destaques. 
Outro dado importante é a redução da paleta de cores, pois o que interessa aos 
artistas e, especialmente a Picasso, é a estrutura da linguagem artística criada junto 
a seus contemporâneos. O sorriso da Mona Lisa ou um violino estilhaçado são mais 
reais do que tudo aquilo que se encontra fora da obra, pois não há nada mais 
concreto do que uma pintura ser compreendida pelo estado sensível e racional dos 
nossos sentidos. 
Figura 33. Violin Melodie, de 
Georges Braque 
Sobre esta revolução diante da tradição da arte que remonta pelo menos quatro 
séculos, concluiremos com o movimento Dada, nomeado de antiarte pelos artistas, 
pois começou pela própria arte das vanguardas os seus protestos e as suas 
renúncias. 
DADA 
Figura 34. Abstract 
Construction, de Marcel Janco 
O movimento Dada nasce em Zurique, na Suíça, em 1916, com um grupo de artistas 
alemães e franceses refugiados da guerra. Fundado por Hugo Ball (1886-1927), 
Jean Arp (1886-1966) - já reconhecido como artista por ter integrado o movimento 
Der Blaue Reiter -, Tristan Tzara, Marcel Janco (1895-1984) e Richard Huelsenbeck 
(1892-1974). De todas as vanguardas, o Dada é o único movimento que se estendeu 
às cidades de Nova York e Paris. No mesmo período, os artistas franceses Marcel 
Duchamp (1887-1968) e Francis-Marie Martinez Picabia (1879-1953) migram para 
os Estados Unidos e, três anos depois, Tzara chega à França divulgando as ideias 
dadaístas. 
Você deve estar se perguntando sobre o significado da palavra Dada, certo? É 
possível que até hoje algumas hipóteses sejam lançadas sobre a “descoberta” 
desse termo. Os próprios artistas insinuaram algumas probabilidades, mas o 
sentido do movimento vinha da incompreensão e intolerância de um grupo que, 
reconhecendo a guerra como não tendo fim, revolta-se contra as necessidades 
humanas que àquela altura soavam demasiadamente contraditórias. E essa reflexão 
incluía o próprio campo da arte. 
Segundo Micheli (2004), Tzara, teórico do movimento, elege como epígrafe das 
publicações do movimento a seguinte frase do filósofo, físico e matemático francês 
René Descartes (1596-1650): “Não quero nem saber se antes de mim houve outros 
homens.” Isso significa que se instaurava àquele momento um desejo pelo novo 
rompendo radicalmente com tudo que correspondesse às aspirações e convenções 
passadas. Por outro lado, foi um movimento que enfatizava sua própria inutilidade, 
indiferença e espontaneidade da práticaartística, mesmo se colocando contrário a 
qualquer definição de arte. 
O Cabaret Voltaire, um café localizado em Zurique, concentrou diversos artistas das 
vanguardas e, especialmente as manifestações artísticas do Dada. As noites do 
cabaré eram reservadas às movimentadas performances dos artistas. É um 
momento onde se reconhece historicamente o nascimento da performance como 
arte, porém essa prática se oficializará como linguagem artística somente na 
década de 1970 com as pesquisas da historiadora da arte RoseLee Goldberg, que 
narrou a história da performance desde as manifestações das vanguardas artísticas 
até às práticas contemporâneas. 
Figura 35. Café Concert, de Marcel 
Janco 
Saiba mais 
Quer ter uma ideia de como eram as performances dadaístas? Procure assistir ao 
vídeo Dada and Cabaret Voltaire na internet. 
Tzara, em uma conferência sobre o Dada, em 1924, responde sobre as pretensões 
do grupo que, de todas as vanguardas, foi a proposta que mais exigiu uma tomada 
de posição dos artistas diante das contradições sociais, políticas e artísticas àquele 
momento: “Não é a nova técnica que nos interessa, mas o espírito. Por que vocês 
querem que nos preocupemos com uma renovação pictórica, moral, poética, 
literária, política ou social? Temos perfeita consciência que de que essas 
renovações de meios são meramente sucessivos mantos de várias épocas da 
história, questões desinteressantes e de fachada. [...]” (TZARA, 2018). 
Figura 36. Von oben, de Hannah 
Höch 
Como poeta e escritor, menciona que o Dada buscava uma maneira de responder 
aos absurdos do mundo. Nesse ponto, faz sentido o uso da palavra que nomeia o 
movimento que foi encontrada por acaso em um dicionário e que, dependendo do 
seu contexto cultural, pode conter significados distintos como o rabo de uma vaca, 
um cubo, uma mãe, um cavalo de madeira etc. 
O encontro, aparentemente, aleatório da palavra que nomeia o grupo acabou se 
tornando um método de criação de poesias dadaístas orientado por Tzara (1976) da 
seguinte maneira: 
“Pegue um jornal. 
Pegue uma tesoura. 
Escolha no jornal um artigo do tamanho que você deseja da 
Os artistas produziram obras de arte, pinturas, esculturas, objetos, mas a circulação 
da palavra, dos manifestos, das ideias pelo mundo era fundamental para a 
divulgação do movimento. Embora se considerassem aleatórios, seus atores eram 
estratégicos ao promover o seu posicionamento diante da arte e da sociedade. Nos 
cartazes, mensagens como “Abra finalmente a sua cabeça. Deixe-a livre para as 
exigências de nossa época”; “Abaixo a arte”; “Abaixo o intelectualismo burguês”; “A 
arte morreu”; “Dada é a destruição voluntária do mundo burguês das ideias” 
promoviam o tom do grupo. 
Marcel Duchamp, com uma trajetória singular na arte do século XX, simpatizava-se 
com o Dada, pois havia um aspecto niilista, ou seja, uma descrença total que rompia 
radicalmente com as tradições e convenções sociais para libertar os artistas dos 
lugares comuns, das zonas de conforto. Eram contrários às pesquisas que 
primavam apenas pela natureza formal, física da pintura sem problematizar o 
próprio ambiente da arte atravessado pela guerra. Como pensar apenas na pintura 
como um problema formal se o mundo desmoronava com a grande guerra? 
Figura 37. The 
Chess Players, por Marcel Duchamp 
No entanto, Duchamp se distancia desta posição de revolta e acabou não 
produzindo ideias novas para a prática da arte. Sofreu mais influências do Cubismo 
do que do Dada, mas provocou uma reflexão oportuna e, por vezes, excêntrica sobre 
o posicionamento dos artistas absorvidos pelo próprio sistema da arte. 
Em 2006, o Museu de Arte Moderna, de Nova York, sediou a primeira exposição 
organizada pela National Gallery of Art concentrada no grupo. Nomeada 
simplesmente de “Dada” reuniu as obras dos principais integrantes do movimento: 
Sophie Taeuber-Arp (1889-1943), Hans Arp (1886-1966), Marcel Duchamp, Max 
Ernst (1891-1976), Raoul Hausmann (1886-1971), Hannah Höch (1889-1978), 
Francis Picabia, Kurt Schwitters (1887-1948) entre outros artistas. Atualmente, ao 
passarmos o olho pelas imagens da exposição e por algumas obras em destaque, 
não notamos toda essa irreverência. São pinturas abstrato-geométricas, colagens, 
altos-relevos de formas orgânicas, máscaras, marionetes, esculturas, objetos etc. 
Porém, ali estavam exibidas propostas artísticas que renunciavam às técnicas 
artísticas tradicionais e ao uso de materiais e objetos da produção industrial. 
Figura 38. The Gray Day, de Georg 
Grosz 
A crítica dadaísta era mais ampla. Voltava-se para a cultura capitalista, burguesa e 
os valores da sociedade moderna. Não por acaso, vemos diversos movimentos 
artísticos contemporâneos remeter à experiência dadaísta justamente por ter sido 
uma das vanguardas mais contestadoras. 
Comentário 
Duchamp reproduz a Mona Lisa, de Leonardo da Vinci, de bigodes em L.H.O.O.Q 
(1919) e cria uma série de instalações que nomeou de ready-mades a partir de 
objetos encontrados em lojas ou em quintais. Altera a posição, a apresentação de 
uma roda de bicicleta, de um mictório, de uma pá de neve e apresenta como uma 
obra de arte. Segundo a análise de Argan (2008), “não há um procedimento 
operativo, e sim uma alteração de juízo, intencionalmente arbitrária. [...] Para os 
dadaístas, o ambiente não traz em si qualquer qualidade estética, mas cada qual 
pode interpretar e experimentar esteticamente, isto é, livremente, as coisas que o 
compõe, desviando-as da finalidade utilitária que lhes é atribuída por uma sociedade 
utilitária.”. Para o historiador da arte, os ready-mades ofereciam um modelo de 
comportamento diante da arte liberto de qualquer regra ou condicionamento 
cultural. 
DISTINGUINDO MOVIMENTOS 
Esses movimentos fazem parte de um grande momento para a arte, mas muito 
triste para a humanidade. A pressão das guerras, a crítica à fragilização humana e a 
destruição e atrocidades promovidas levaram o homem a mergulhar sobre si, 
criticar seu mundo e transformar a arte em uma forma densa de crítica e reflexão 
social. 
Ao distinguirmos as proposições, conseguimos perceber o que as aproxima: 
compromisso com a sociedade e as distinções estruturadas pelos grupos e 
principalmente pelos artistas. 
No próximo módulo, faremos uma aproximação de como esses movimentos nos 
levam e se materializam também no Brasil. 
 
VERIFICANDO O APRENDIZADO 
 
1. O fauvismo e Cubismo partem da mesma matriz: 
simplificação das formas figurativas e múltiplas 
perspectivas (vistas) no mesmo plano. No entanto, os 
dois movimentos constroem percursos distintos para 
formular a construção do espaço pictórico distanciado da 
chamada “janela renascentista”. Aponte quais são as 
soluções de cada movimento. 
 
A) A cor como estrutura da pintura e a fragmentação dos planos no arranjo 
composicional, respectivamente. (correto) 
B) A construção da profundidade pela relação das cores e a sugestão de volume 
pelo uso de luz e sombra, respectivamente. 
C) A construção de outros modos de representação da realidade e o 
rompimento com a perspectiva linear, respectivamente. 
D) O arranjo de elementos que possam estruturar o espaço pictórico e a 
superfície da pintura como uma arquitetura, respectivamente. 
E) A perspectiva e o apuro técnico reproduzindo a realidade como elemento 
central. 
 
 
2. O movimento Dada tinha a ambição de ser 
reconhecido internacionalmente. Inicia em Zurique, mas 
chega até Paris pelo escritor e poeta Tristan Tzara e, em 
Nova York, pelo artista Marcel Duchamp. Tzara foi 
teórico e divulgador das ideias do grupo e Duchamp, 
como simpatizante, criou um conjunto revolucionário de 
obras denominado ready-mades, em que transformou 
objetos comuns em obras de arte. Em uma entrevista em 
1968, concedida por Duchamp a Joan Bakewell, na BBC, 
constata que o público não consegue ser mais chocado 
pela arte como acontecia com as proposições antiarte doDada, por exemplo, que pautava sua prática pelo fazer e 
não mais pelo construir. 
 
Com base no texto, identifique, entre as citações de 
diferentes artistas, o choque como provocação para a 
reflexão sobre a arte e sociedade. 
 
A) “A essência da arte gráfica seduz o artista, facilmente e não sem razão, para 
a abstração.” 
B) “Entre os vários pecados que fui acusado de cometer, nenhum é mais falso 
do que o de dizer que tenho como objetivo principal de meu trabalho o 
espírito da pesquisa.” 
C) “A arte não é a manifestação mais preciosa da vida. A arte não tem o valor 
celestial e universal que as pessoas gostam de lhe atribuir. A vida é muito 
mais interessante.” (correto) 
D) “O que há de admirável no fantástico é que ele já não é fantástico: o que há é 
apenas o real.” 
E) “Não existe arte, o que existe são artistas.” 
 
MÓDULO 3 
 
BAUHAUS 
Dos processos de reconstrução da Europa devastada pela Primeira Guerra Mundial, 
a criação da Bauhaus, em 1919, pelo arquiteto alemão Walter Gropius (1883-1969), 
na República de Weimar, foi de grande importância, não somente para o campo da 
arte, da arquitetura e do designer, mas também para a educação artística. O 
programa metodológico previa uma reforma da linha academicista presente na 
educação alemã, cujas atividades ali desenvolvidas deveriam acompanhar o mundo 
do trabalho. 
Figura 39. Memorial 
aos que caíram em março, projeto do arquiteto Walter Gropius, no Cemitério de Weimar, na 
Alemanha 
A história de Gropius encontra-se entrelaçada à própria razão da primeira escola de 
design existir diante da crise política que a Alemanha vivia no pós-guerra. Sua obra 
respondeu com otimismo aos processos de reconstrução social por meio de uma 
lógica construtiva ao mesmo tempo em que reconheceu seu pleno colapso àquele 
momento. Por esse motivo, seu projeto previa uma intervenção artística e, 
sobretudo pedagógica. Para tanto, renovou radicalmente toda uma metodologia 
empregada na arquitetura e no desenho industrial, conjugando dessa forma as 
atividades didáticas e artísticas. 
 
Comentário 
A crise social e política também impactaria os projetos artísticos e arquitetônicos. 
Ao contrário de Le Corbusier, um dos expoentes e defensores de uma arquitetura 
racionalista que pudesse resolver problemas urbanísticos, Gropius desenvolveu um 
método de trabalho, tendo a racionalidade como base, mas para localizar os 
problemas e pensar nas soluções. A racionalidade como meio e não como fim. 
Podemos inclusive observar com a Bauhaus e, também, com os programas das 
outras vanguardas uma vontade de ressignificar a função da arte nas mudanças que 
vinham ocorrendo na sociedade. Argan (2010) ressaltou que neste momento, “toda 
eventual retomada artística deveria necessariamente se fundar sobre uma nova 
concepção do valor da existência e da organização humana.” 
 
O significado da palavra Bauhaus é “casa de construção”. E, nesse sentido, teve 
como finalidade desenvolver uma relação entre arte e indústria sob parâmetros 
democráticos em que professores e estudantes construiriam, em colaboração, as 
pesquisas e os projetos dos cursos que tinham uma natureza interdisciplinar. Argan 
(2008) nos chama a atenção para a razão democrática da escola, uma vez que o 
compromisso dos artistas era preponderantemente social, logo político. 
 
Figura 40. Conjunto Habitacional Törten, na cidade de Dessau, na Alemanha 
A escola foi planejada por Gropius como um centro funcional de formação da 
sociedade com foco na questão do urbanismo, do planejamento da cidade do micro 
para o macro, ou seja, do projeto da casa, da mobília, dos objetos a um plano 
urbanístico maior. O vasto campo da comunicação visual e da cidade estava no 
escopo do programa da Bauhaus que atuava em todas as escalas: urbana, 
construção civil, desenho industrial e da expressão artística permeando todas essas 
esferas. Um programa que partia da esfera individual para a coletiva. 
Diferentemente da proposta dos ready-mades, a forma (estética) e a função dos 
utilitários deveriam estar no mesmo projeto de criação. 
A forma predominante é a geométrica que funciona como um padrão a ser 
reconhecido por qualquer pessoa pela sua familiaridade. Não há um signo, uma 
simbologia, um significado a ser codificado para seu uso ou sua apreciação. O que 
modula são as combinações entre as cores e, nesse sentido, podem produzir 
diferentes sensações e experiências visuais. A cor, como estrutura espacial, tal 
como vimos em Cézanne; porém, nesse caso, aplicada a objetos e ambientes. 
Figura 41. Bauhaus Stairway, de 
Oskar Schlemmer 
A didática da Bauhaus prima por uma racionalidade advinda de um pensamento que 
procurou responder às experiências da vida, da relação com o mundo. Não se trata 
de uma atividade mecânica própria da rotina industrial, mas da arte como 
mediadora do estado racional e sensível na criação de meios que não se 
distanciassem de uma consciência social e política. 
Oskar Schlemmer (1888-1943) foi um artista alemão plural; convidado por Gropius 
para compor o corpo docente da escola, ministrou aulas de pintura, escultura, 
design e, também, artes cênicas. Coreografou Das Triadisches Ballett (Balé triádico), 
de 1922, considerado um de seus trabalhos mais importantes, e desenhou seus 
figurinos com formas cônicas, cilíndricas, esféricas e espiraladas. O termo “triádico” 
se refere à divisão do balé em três atos, com três bailarinos e três cores. Essa 
experiência influenciou suas pinturas, que passaram a apresentar mais volume, 
profundidade e movimento. 
Figura 42. Crystal Gradation, por 
Paul Klee 
Além de Schlemmer, outros artistas ministraram aulas na escola como Paul Klee, 
Wassily Kandinsky e os arquitetos Mies van der Rohe (1886-1969) – que inclusive 
assumiu a direção da Bauhaus com a saída de Gropius em 1928 – e Frank Lloyd 
Wright (1867-1959). 
A partir de 1925, a escola funcionou em Dessau e, depois de 1932, em Berlim. Por 
determinação do regime nazista, a Escola foi fechada definitivamente em 1933. 
Houve uma migração de professores e estudantes para outros países como 
Inglaterra, Israel, México e Estados Unidos, sendo este último o principal difusor de 
centros de educação formal com base nos seus métodos desenvolvidos por artistas 
refugiados como László Moholy-Nagy (1895-1946) e Josef Albers (1888-1976). 
INFLUÊNCIAS DA BAUHAUS NO BRASIL 
 
Figura 43. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP 
Alfred Barr (1902-1981), então diretor do MoMA NY, realizou visitas à escola em 
Dessau, reconhecendo a sua importância para a educação, sobretudo para os 
métodos de ensino de história da arte moderna integrada a outras práticas, tais 
como a pintura, a escultura, a fotografia, as artes gráficas e o cinema. 
A presença de Gropius nos Estados Unidos, como diretor do curso de arquitetura da 
Universidade de Harvard, onde se estabeleceu após a ascensão do nazismo na 
Alemanha, e a sua vinda ao Brasil para a 2ª Bienal de São Paulo, em 1953, tendo 
uma sala especial dedicada à arquitetura, demarcam a presença e as influências da 
Escola no país. 
A exposição Bauhaus: 1919-1928 organizada pelo MoMA NY, em 1939, popularizou 
as ideias da escola alemã sobre o par arquitetura/design, além de ser utilizada 
como referência para a estruturação dos departamentos multidisciplinares do 
museu e de escolas americanas de design. 
Houve algumas filiações às ideias da Bauhaus, no Brasil, manifestadas nas décadas 
de 1920 e 1930, como por exemplo, o projeto da residência (1927) do arquiteto 
Gregori Warchavchik (1896-1972), considerada por muitos historiadores de 
arquitetura moderna como a pioneira dos princípios construtivos. O mobiliário 
residencial (1932) criado por Lasar Segall (1889-1957) também nos indica esta 
proximidade formal e a introdução do concreto armado, tendo a Alemanha como 
pioneira no seu uso, dos arquitetos Alexander Siegfried Buddeüs e Alexander Altberg 
(1908-2009).Este último, ex-aluno da Bauhaus, em Weimar, organizou, junto aos 
arquitetos Alcides da Rocha Miranda (1909-2001) e João Lourenço Silva, o I Salão 
Internacional de Arquitetura Tropical (1933) no Rio de Janeiro, cuja organização 
intentava deflagrar definitivamente na capital federal um movimento 
antiacademicista pela “racionalização da arte de construir em nosso país.” 
O catálogo do Salão trazia um texto de Walter Gropius, além de uma fotografia da 
Bauhaus, em Dessau, acompanhada da legenda “fechada pela situação política”. A 
revista Base de arte, técnica e pensamento (1933) foi editada por Altberg que, 
segundo Pedro Moreira (2005), foi “ao mesmo tempo seu editor, financiador, 
designer gráfico, ilustrador, autor, ‘curador’ de textos e – por motivo de redução de 
custos – até mesmo tipógrafo.” 
Figura 44. 
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP 
O periódico tinha o propósito não só de compartilhar conteúdos sobre arquitetura e 
design, mas apresentar-se como uma revista moderna, no sentido estético e 
funcional. A abertura da primeira edição foi escrita por Mário de Andrade (1893-
1945) que trazia em suas palavras o fomento à integração da arte à vida, 
considerando os problemas de ordem estética aproximados às questões científicas, 
tecnológicas e sociológicas. Nas suas palavras: “Hoje a arte quer penetrar nos 
escaninhos mais ásperos da vida coletiva; entra nos laboratórios, nos hospitais, nas 
fábricas, nunca se fez tanta arte no mundo [...]” (MOREIRA, 2005). 
Figura 45. 
Biblioteca da FAU-USP 
Na década de 1950, a primeira iniciativa diretamente associada à Escola, foi do 
Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (MASP) na criação do Instituto de 
Arte Contemporânea (IAC). A arquiteta Lina Bo Bardi (1914-1992) e Pietro Maria 
Bardi (1900-1999), então diretor, coordenaram as atividades durante apenas dois 
anos (1951-1953), tendo como objetivo formar jovens artistas a serviço das 
demandas da indústria nacional. Esperava-se que os objetos de design 
correspondessem ao gosto e ao progresso com ênfase à racionalidade. 
O envolvimento com as ideias da Bauhaus no país se deu mais pela via da citação e 
da adaptação ao contexto artístico e social, sobretudo carioca que aqui se 
desenvolveu, do que uma apropriação direta. Observamos que alguns princípios 
metodológicos foram incorporados pelos cursos teóricos e práticos, como o ateliê 
de pintura de Ivan Serpa (1923-1973), por exemplo, mas que não se restringiu aos 
seus domínios e, que, sob a formulação teórica de Mario Pedrosa (1900-1981), a 
dupla arte e sociedade deveria vincular-se aos propósitos da criação como 
revolução ética e estética. Mas a absorção de um projeto político pedagógico 
baseado em ideias socialistas e comunistas, alternativo aos avanços de um 
capitalismo industrial, não teria campo imediato no contexto brasileiro, colonizado 
pela cultura capitalista americana, que acabou absorvendo ou recepcionando 
conferências sobre a Bauhaus na intenção de se formar tecnicamente o artista nos 
fundamentos do design. 
VANGUARDAS E O MUNDO 
As vanguardas europeias foram uma via importante de consolidação do domínio 
europeu, ainda que tenham experimentado a crise das guerras, permaneciam fortes 
nas décadas seguintes. O movimento Bauhaus é excelente para explicar essa 
disseminação nos projetos de arte no mundo! 
A cidade de São Paulo, no Brasil, tentando ser um espaço mais industrial e 
artisticamente moderno, mergulhou, uma vez mais, nessas vanguardas. 
Esses movimentos não se limitam geograficamente, tampouco temporalmente. 
Suas formas e proposições estão vivas e disseminadas ainda nos dias atuais. 
Veremos isso a seguir quando conheceremos um dos mais notórios movimentos 
vanguardistas: o Surrealismo. 
 
VERIFICANDO O APRENDIZADO 
 
1. “[...] formar jovens que se dediquem à arte industrial e se mostrem capazes de 
desenhar objetos nos quais o gosto e a racionalidade das formas correspondam ao 
progresso e à mentalidade atualizada." 
 
Essa citação é da arquiteta Lina Bo Bardi a respeito dos objetivos do Instituto de Arte 
Contemporânea (IAC) do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (MASP), 
de 1951, formulados com base nos modelos de ensino da Bauhaus Dessau. Assinale a 
alternativa em que o programa pedagógico da escola foi assimilado com receptividade 
pelo IAC. 
 
A) A formação de um espaço pedagógico que habilitasse profissionais nas 
áreas de design gráfico e de produto como polo irradiador para outras 
práticas sociais. (correto) 
B) Diferenciação das áreas – design, arquitetura e arte – como práticas 
independentes e individualizadas. 
C) Partir da forma geométrica como uma figura canônica a ser reproduzida e 
replicada. 
D) Os modelos clássicos como adoção da prática arquitetônica e do desenho 
industrial. 
E) As grandes cidades do mundo constituíram centros Bauhaus como forma de 
marcar a hegemonia do movimento em termos de vanguarda. 
 
2. Esta imagem se refere ao mobiliário criado por 
Lasar Segall com filiações aos designers dos móveis 
criados na Bauhaus. Observe a imagem e assinale a 
alternativa que aponta essa aproximação. 
 
 
A) Referências orgânicas em contraponto às racionalistas. 
B) Ênfase aos elementos decorativos. 
C) Padrão clássico adotado pelo design. 
D) formulação de contracultura e negação da arte. 
E) Funcionabilidade e simplicidade no design de móveis. (correto) 
 
MÓDULO 4 
 
SURREALISMO 
“Não é o medo da loucura que nos vai obrigar a hastear a meio-pau a bandeira da 
imaginação” escreve André Breton (2020), escritor francês, poeta e teórico do 
Manifesto Surrealista (1924). Além das suas atividades intelectuais, Breton estudou 
Medicina e se formou em Psiquiatria, e teve contato com as teses de Sigmund Freud 
sobre a investigação do inconsciente como uma região da psique e com o 
encarceramento das pessoas consideradas loucas nos hospitais psiquiátricos. 
Figura 46. A 
Desintegração da Persistência da Memória, de Salvador Dalí 
Sabemos que a desorganização mental de muitas dessas pessoas produzia 
sofrimentos, mas também impulsos criativos, vide o Museu do Inconsciente criado 
pela Dra. Nise da Silveira (1905-1999) que abriga um acervo extraordinário de obras 
de arte dos internos da Seção de Terapêutica Ocupacional do Centro Psiquiátrico 
Nacional na cidade do Rio de Janeiro. 
A poética surrealista representa essa natureza ambígua, pois responde às 
inquietações de um grupo de artistas e teóricos que estavam atentos à sua própria 
realidade e ao mesmo tempo às estruturas repressivas, incongruentes, que 
interviam na saúde mental das pessoas. As propostas artísticas desse movimento 
buscavam investigar e apresentar a condição humana na sua dimensão profunda, 
inconsciente, orientada, por vezes, por uma dimensão onírica. 
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Figura 47. Equação de Shakespeare: 
décima segunda noite, de Man Ray 
A composição, o conjunto da obra, pode nos causar uma confusão mental entre o 
que parece real ou ilusório, mas esta é uma das maiores habilidades dos artistas 
desse movimento: Salvador Dalí (1904-1989), René Magritte (1898-1967) e Man Ray 
(1890-1976) estimularam os limites da razão e da irracionalidade. A técnica 
usualmente utilizada foi a trompe-l’oeil (pintura a óleo) que possibilitou a construção 
de imagens com uma expressão figurativa bastante verídica, porém subvertida das 
coisas do mundo concreto. 
Até onde conseguimos compreender o que está sendo exposto? Tal como os 
sonhos, as imagens se justapõem, as temporalidades – passado-presente-futuro – 
se fragmentam, se embaralham, se desconectam. Não é possível compreender 
racionalmente todos os pormenores de uma pintura surrealista. Os historiadores da 
arte nos orientam com as suas interpretações e análises, mas o mecanismo 
psicológico ou as particularidades presentes na subjetividade de cada artista nos 
parece poder ser acessadas até certo ponto. 
 
Figura 48. Subúrbios de uma CidadeParanoica Crítica, Tarde na Periferia da História Europeia, de 
Salvador Dalí 
Outra possibilidade que a pintura surrealista nos oferece é o reino das maravilhas, 
do fantástico, liberto de qualquer princípio de realidade concreta e debilitada. Ao 
violar as leis da coerência e da lógica, operações criativas colocadas nas 
fotomontagens, nas pinturas, nas esculturas e nos objetos divertem nossos 
sentidos e nos conduzem a outras esferas da imaginação e da reflexão do artista 
diante do mundo. 
BRETON 
Breton definiu o Surrealismo, na sua primeira fase, ainda como linguagem: “é 
automatismo psíquico puro através do qual nos propomos exprimir tanto 
verbalmente quanto por escrito ou de outras formas o funcionamento real do 
pensamento; é o ditado do pensamento com a ausência de todo o controle exercido 
pela razão, além de toda e qualquer preocupação estética e moral” (BRETON, 2020). 
Mas o que significa a palavra automatismo neste contexto artístico? Diferentemente 
do Dada, que também praticava o automatismo na construção de poesias, no 
Surrealismo esse exercício ganha uma dimensão conceitual. Para o escritor, a 
estrutura do pensamento é revolucionária na medida em que a mecânica psíquica 
inicial não obedece ao reino da lógica. Porém, para fins de organização mental, 
criamos métodos racionais a fim de obter algum acesso, controle e domínio daquilo 
que nomeia de “profundeza do espirito” ou “inconsciente”. 
Em paralelo ao lançamento do Manifesto, os artistas e escritores franceses 
lançaram a revista La Révolution Surréaliste. Foram doze edições no total, publicadas 
entre 1924 e 1929, com poesias, textos, reflexões sobre o movimento, relatos de 
sonhos, escritas automáticas. Tratavam de temas tabus como sexo, morte, 
violência, políticas partidárias, mas também incluíam reproduções de obras de arte. 
Alguns temas provocaram escândalos como a terceira edição que trazia um texto 
do poeta, dramaturgo e ator Antonin Artaud (1896-1948) sobre o fim da era cristã e 
a repressão dos corpos causada pela moralidade religiosa. 
SEGUNDA FASE DO MOVIMENTO 
Na sua segunda fase, a prática surrealista parte desta lógica, mas sem a dimensão 
mecânica do automatismo, e inicia um percurso pela própria estrutura do 
pensamento manifestada nos objetos que passam a revelar a própria experiência 
surrealista. 
Veremos o sonho e a realidade física em um mesmo arranjo formal. Mesmo que as 
pinturas expressem uma aparente desconexão e sentido, as escolhas do artista 
possuem uma lógica, uma razão, um sentido no momento em que medita sobre a 
criação da obra. 
Figura 49. Sonho Causado Pelo Voo 
de uma Abelha ao Redor de Uma Romã um Segundo Antes de Acordar, de Salvador Dalí 
Exemplo 
Figura 50. L'Énigme 
d'un après-midi d'automne, de Giorgio de Chirico 
Um exemplo é o testemunho do artista italiano Giorgio de Chirico (1888-1978) sobre 
o quadro Enigma de uma tarde de outono, de 1910: “Numa radiosa tarde outonal eu 
estava sentado num banco no meio da Piazza Santa Croce, em Florença. Não era, 
claro, a primeira vez que via aquela praça. Acabava de sair de uma prolongada e 
dolorosa enfermidade intestinal e achava-me num estado de sensibilidade quase 
mórbida. Todo mundo, até o mármore dos edifícios e dos chafarizes, parecia-me 
estar convalescendo. No meio da praça ergue-se uma estátua de Dante envolto num 
longo manto, segurando suas obras junto do corpo, a cabeça coroada de louros 
inclinada pensativamente para a terra. A estátua é em mármore branco, mas o 
tempo deu-lhe um matiz cinzento, muito agradável ao olhar. O sol de outono, cálido 
e pouco suave, iluminava a estátua e a fachada da igreja. Tive então a estranha 
impressão de que estava olhando para todas aquelas coisas pela primeira vez, e a 
composição do meu quadro me veio à mente.” (DE CHIRICO, 2020) 
No texto de 1912, Meditações de um pintor, Chirico constata que a obra mencionada 
é um enigma para ele, pois não consegue explicar a revelação súbita dessa imagem. 
Constata que todas as vezes que observa o quadro rememora àquela ocasião. A 
sensação de estranhamento diante de tudo, que até o momento era bastante 
familiar, dialoga com a experiência onírica, tal como sonhamos com alguém que 
conhecemos, mas no sonho não é a mesma pessoa de nossa realidade. 
O artista vai considerar que uma obra de arte é a prova de uma “realidade 
metafísica”, isto é, uma realidade capaz de ser produzida a partir do nosso espírito, 
de uma dimensão misteriosa dos nossos mecanismos internos independentes da 
relação que estabelecemos com o mundo concreto. Ele diz: “o que conta é apenas o 
que meus olhos veem quando estão abertos, e mais ainda quando estão fechados.” 
Na esteira de Chirico, Breton também refletiu sobre a importância do ver, mas 
provoca uma distinção da prática do olhar. Para o escritor, o ato de ver dependia da 
ativação de distintos graus de sensações, da realidade e, sobretudo da necessidade 
de se revolucionar a relação secular estabelecida entre a imitação e a criação para a 
fixação de imagens visuais. Afirma que foi um erro considerar que toda obra de arte 
é resultado de um único modelo tomado da realidade exterior. Constata 
enfaticamente, quatro anos após a publicação do Manifesto Surrealista, que a obra 
plástica, para atender à necessidade de revisão absoluta dos valores reais, se 
referirá, pois, a um modelo puramente interior ou deixará de existir. Esse “modelo 
interior” do qual se refere também está associado ao compromisso e à 
responsabilidade dos artistas com o seu próprio tempo e ao alcance revolucionário 
que determinadas obras poderiam ter. 
Argan (2008) considera que o Surrealismo foi um contraponto à agenda racionalista 
dos movimentos construtivistas, especialmente a vanguarda russa que integrou os 
programas políticos de reconstrução e reforma das estruturas sociais. A experiência 
surrealista decidiu ironizar o que considerava escandaloso e irremediável na 
sociedade burguesa. 
A aplicação do sarcasmo e uma dose de irracionalidade e desordem consciente nas 
obras de arte dos surrealistas advinha das performances desinibidas dos dadaístas 
que se propuseram a agir do mesmo modo, tão irracional quanto as catástrofes 
provocadas pelos conflitos mundiais. Se a vida se apresentava tão absurda àquele 
momento, por que a arte não poderia reagir de forma incoerente a um sistema de 
valores tão contraditório? Há um jogo de verossimilhanças e incongruências da 
própria estrutura social que se revela tanto na produção artística do Dada, como nas 
obras do Surrealismo. 
Em 1931, Dalí, artista catalão que vai morar em Paris, sugere aos surrealistas uma 
proposta coletiva e experimental, onde enumera e sistematiza uma série de itens a 
serem desenvolvidos pelos artistas considerando todas as ações que se adequam a 
uma prática surrealista, tais como: 
Descrever a transcrição de devaneios 
Produzir experiências relativas ao conhecimento irracional das coisas 
Desenvolver um estudo coletivo da fenomenologia 
Criar uma escultura automática 
Descrever oralmente os objetos percebidos pelo tato etc. 
Esses exercícios propunham alterar o modo como percebemos as coisas ao nosso 
redor. Compreender como os objetos operam simbolicamente. 
Nesse caminho, o artista se interessou pela produção de pinturas de paisagens 
naturalistas, porém o conteúdo de suas obras não era nem um pouco naturalista. 
Observe The Persistence of Memory, de 1931. 
Figura 51. A 
Persistência da Memória, de Salvador Dalí 
À primeira vista identificamos uma paisagem árida, desértica, com o mar ou uma 
lagoa ao fundo. Há uma predominância de tons terrosos e azulados. A incidência de 
luz sobre os objetos nos remete a um fim de tarde. E é nesse ponto que o 
reconhecimento da imagem começa a ganhar outras impressões quando tocamos 
na questão do tempo. É possível identificar quatro relógios: três deles parecem 
derreter ou amolecer; o único supostamente íntegro é o que está

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