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Capítulo 3 - Noções básicas sobre acústica, psicoacústica e calibração Iêda Chaves Pacheco Russo (in memoriam) Lopes Filho O (ed), Campiotto AR, Levy CCAC, Redondo MC, Anelli W. Novo tratado de Fonoaudiologia, 3a. edição. Barueri, SP : Manole, 2013. ISBN 978-85-204-3805-3 Introdução O conhecimento de como é o universo e de como a natureza opera é o objeto da Física, a mais geral e ampla das ciências. Esse conhecimento pode fornecer uma base segura, bem como uma lógica adequada, para o desenvolvimento filosófico a respeito de nossa própria existência e de outros aspectos humanos importantes que, há milhares de anos, vêm intrigando a mente humana. A Física é a mais fundamental e a mais geral das ciências. Na verdade, é o equivalente atual da antiga Filosofia Natural, da qual provém a maior parte das ciências modernas. A Física pode fornecer dois tipos diferentes de contribuição para outras ciências: teórica e técnica. As contribuições teóricas auxiliam diretamente na compreensão de um determinado fenômeno. Por exemplo, a Biologia: olhando mais de perto os processos biológicos dos seres vivos, vê-se que existem muitos fenômenos físicos envolvidos: a circulação do sangue, o bombeamento e a pressão sanguínea. Por outro lado, as contribuições técnicas compreendem o desenvolvimento de aparelhos e equipamentos (mecânicos e eletrônicos) que auxiliam no desenvolvimento e aperfeiçoamento de recursos específicos das mais diversas áreas, dentre elas: Medicina, Fonoaudiologia, Engenharia, Pedagogia, Psicologia, Informática. Sendo um ramo da Física, a Acústica pode ser definida como a ciência que se preocupa com o estudo do som, tanto em sua produção e transmissão quanto na detecção. Usualmente, a Acústica pode ser estudada segundo dois aspectos: Acústica Física, que trata das vibrações e ondas mecânicas, e Acústica Fisiológica ou Psicoacústica, relacionada à sensação que o som produz nos indivíduos (Russo, 1999). A Audiologia, por sua vez, é a ciência da audição e tem a sua base científica na Psicoacústica. Os testes audiométricos subjetivos, utilizados na Audiologia, com o intuito de medir a acuidade auditiva do indivíduo, são chamados testes psicométricos ou psicoacústicos e só foram possíveis a partir de estudos da Psicoacústica que, além de outros aspectos, determinaram a área de sensibilidade do ouvido humano. Para o fisiologista alemão Hermann Von Helmholtz, percepções sensoriais humanas não são apenas sensações do sistema nervoso, “havendo ainda a participação de uma atividade característica da alma, para se chegar da sensação dos nervos até a representação daquele objeto que provocou a sensação”. Este capítulo, que fornece as noções básicas das ciências que fundamentam e constituem a base do conhecimento para a Audiologia, está dividido em três partes. A primeira aborda as noções básicas da Acústica Física, com ênfase na caracterização da onda sonora, seus aspectos, dimensões mensuráveis, qualidades e processos de mensuração. Na segunda parte, são enfocados alguns temas relacionados à Acústica Fisiológica ou Psicoacústica, que incluem a faixa de audição humana, determinação do nível de audição e sensação, e aspectos psicoacústicos da percepção do som. Finalmente, a terceira parte trata do processo de calibração e sua importância na obtenção precisa dos resultados obtidos na avaliação audiológica. Noções básicas sobre Acústica Física Onda sonora e propriedades de transmissão De acordo com Davis (1970), ao perguntar a um indivíduo o que é som, ele responderá: som é tudo aquilo que ouvimos. Para o físico, o som é uma forma de energia vibratória que se propaga em meios elásticos. Para o psicólogo, o som é uma sensação inerente a cada indivíduo. Ao fisiologista, interessa a maneira pela qual o som caminha pelas vias auditivas até atingir o cérebro. Ao analisar cada uma das respostas dadas, verifica-se que todas estão corretas, pois cada profissional lida com o conceito de som de acordo com o interesse e a necessidade de sua área de conhecimento. Entretanto, há uma interdependência dessas áreas, ou seja, o psicólogo necessita das informações do físico para poder comparar as sensações de frequência e intensidade com os atributos físicos mensuráveis do som que, por sua vez, as propiciam. A abordagem psicológica na definição do som parece partir do sujeito que ouve, pois, nesse caso, a compreensão dos eventos físicos que caracterizam o som tem como referência sensações que estão associadas à variedade de sons que nos estimulam diariamente. Entretanto, se uma árvore cai em uma floresta e não há ninguém por perto para ouvir, ainda assim existe som, pois as propriedades físicas da fonte que gerou esse evento e do meio no qual ele foi transmitido não podem ser esquecidas na definição de som. Muitos corpos podem servir como fontes sonoras: as cordas de um instrumento musical como o violão, uma membrana de um tambor, uma barra no xilofone, etc. Todavia, há um prérequisito indispensável para um corpo funcionar como fonte sonora: precisa ser capaz de vibrar. Se um corpo pode ser posto em movimento vibratório, ele necessita de duas propriedades físicas que são inerentes a cada corpo: massa e elasticidade (Speaks, 1992). Quando um abalo faz uma fonte sonora vibrar ou oscilar, um evento sonoro ocorreu e esse pode ser transmitido para algum meio. O ar é provavelmente o meio mais comum de ser encontrado, mas outros meios como água, fios, cordas e aço também são capazes de transmitir som. Em razão de as estruturas moleculares terem massa e elasticidade finitas, elas são capazes de funcionar tanto como fonte de um som quanto como meio para sua transmissão (Russo, 1999). A onda sonora é, então, produzida por um elemento vibrante ou fonte que, quando estimulado, é capaz de produzir perturbações ou variações na densidade do meio ao seu redor, como consequência do aumento ou diminuição da pressão sonora. É mecânica, pois necessita de um meio material para propagar-se, não o fazendo no vácuo; é tridimensional, pois sua propagação se dá em todas as direções. Caracterizada, primordialmente, por sua(s) frequência(s) e pela amplitude de cada uma delas, a onda sonora pode assumir várias formas, desde senoidal, quadrada e triangular até complexa, periódica ou aperiódica e apresentar espectros discretos ou contínuos; pode, ainda, diferir em altura, intensidade e timbre, em função das características físicas da fonte sonora e dos respectivos componentes tonais por ela gerados (Figura 1). Figura 1 Representação esquemática de três ondas sonoras: forma de onda e espectro de amplitude. Dimensões das ondas sonoras Frequência Chama-se frequência (f) o número de ciclos que as partículas materiais realizam na unidade de tempo (segundo). A expressão “ciclos por segundo” foi substituída por Hertz (Hz) em homenagem ao físico alemão Heinrich Hertz, sendo essa a unidade de medida usada internacionalmente. As ondas sonoras propagadas por meio do ar ocorrem em sincronia com a vibração de uma fonte sonora. A taxa em que a fonte sonora vibra em Hertz (Hz) é conhecida como a sua frequência (Figura 2). Figura 2 Representação de dois movimentos ondulatórios de diferentes frequências. Amplitude A outra dimensão da onda sonora é a chamada amplitude (A), que é a medida do afastamento ou deslocamento horizontal das partículas materiais de sua posição de equilíbrio. A amplitude pode ser instantânea, quando é medida em um tempo ou ângulo de rotação definidos; pode ser máxima, também denominada amplitude de pico e corresponde em uma onda senoidal a 90° ou 270°; e, finalmente, relacionada à raiz média quadrática (rms) dos desvios da pressão sonora. A amplitude relaciona-se à intensidade sonora, sendo um dos processos físicos utilizados na medida dessa, junto com a pressão efetiva e a energia transportada pelo som (Figura 3). Figura 3 Representaçãode dois movimentos ondulatórios de mesma frequência com diferentes amplitudes. Qualidades da onda sonora Às dimensões ou aos atributos da onda sonora estão relacionadas as qualidades: altura, intensidade e timbre, embora este último seja uma qualidade não do som, mas da fonte sonora que o produziu. A altura é a qualidade relacionada à frequência da onda sonora que, por sua vez, permite classificá-la em uma escala que varia de grave a agudo. Quanto mais alta for a frequência, mais agudo é o som. Quanto mais baixa for a frequência, mais grave ele será. Ainda com relação à frequência, é importante observar que os termos “alto” e “baixo” referem-se às ondas sonoras de alta e baixa frequência, sendo, portanto, equivalentes aos termos “agudo” e “grave” e não à intensidade sonora, como geralmente são empregados. A intensidade é uma qualidade relacionada tanto à amplitude da onda sonora quanto à sua pressão efetiva e sua energia transportada, permitindo classificá-la dentro de uma escala, que varia de fraco a forte. Dessa maneira, quanto maiores forem a amplitude, a pressão efetiva e a energia transportada pela onda sonora, mais forte será o som. Quanto menores forem, mais fraco ele será. O timbre não é uma qualidade do som, mas, sim, da fonte sonora. Por meio dele, pode-se diferenciar, por exemplo, a mesma nota musical emitida por instrumentos diferentes, graças à contribuição das diversas frequências harmônicas de que se compõe o som denominado complexo (Russo, 1999). Tipos de ondas sonoras Dependendo do número de frequências presentes na onda sonora, ela pode ser classificada em senoidal ou complexa, periódica ou aperiódica. Onda senoidal (tom puro) Denomina-se onda senoidal a onda sonora que resulta de um movimento harmônico simples, proveniente de uma relação que contém uma função de seno. Dela se origina o chamado tom puro, constituído por uma única frequência. Ele não é encontrado na natureza, sendo gerado apenas eletronicamente, embora o som do diapasão se pareça com um tom puro. Encontra grande aplicação na área de Audiologia, mais especificamente na mensuração da acuidade auditiva, isto é, na determinação dos limiares tonais do indivíduo, realizada com o uso de audiômetros, calibrados segundo padrões internacionais (Figura 4). Figura 4 Representação gráfica de uma onda senoidal (tom puro). Onda complexa Uma onda complexa pode ser definida como qualquer onda sonora composta de uma série de senoides simples que podem diferir em amplitude, frequência ou fase. A voz humana e o som produzido por instrumentos musicais constituem alguns exemplos de sons complexos, ou seja, formados por mais de uma frequência (Figura 5). Figura 5 Representação gráfica de uma onda complexa. “O grau de complexidade de uma onda sonora complexa depende do número de ondas senoidais combinadas, bem como dos valores dimensionais específicos de amplitude, frequência e fase dos componentes senoidais.” Esse teorema foi primeiramente proposto por um matemático francês que viveu na época de Napoleão I, chamado Joseph Fourier. A série de ondas senoidais, que combinadas formam a onda complexa, é conhecida como série de Fourier, em homenagem a esse matemático. Dessa série, deriva um processo denominado análise de Fourier, que significa que qualquer forma de onda complexa pode ser decomposta ou analisada, para determinar as amplitudes, frequências e fases das ondas senoidais que a compõem. Todas as ondas sonoras podem ser classificadas com relação à presença ou à ausência de periodicidade e ao grau de complexidade da onda. Onda periódica Quando a onda sonora se repete em iguais intervalos de tempo, ela é conhecida como onda periódica, isto é, as características do ciclo da onda são duplicadas exatamente nos demais ciclos. De acordo com o teorema de Fourier, qualquer onda complexa consiste em um número de ondas senoidais simples somadas. Entretanto, para que uma onda complexa seja periódica, seus componentes senoidais não podem ser selecionados ao acaso. Em vez disso, precisam obedecer a um requisito matemático chamado de relação harmônica. A expressão “relação harmônica” quer dizer que as frequências de todas as senoides que compõem a série devem ser múltiplas integrais (números inteiros) da frequência senoidal de mais baixa frequência da série. Todas as senoides incluídas na série harmônica são chamadas de harmônicos. Esses, por sua vez, são numerados, consecutivamente, a partir da frequência mais baixa da série – frequência fundamental (f0) conhecida como primeiro harmônico de f1, f2, f3… até a mais alta, ou até o último componente da série harmônica. Para compreender melhor o conceito de timbre, suponha que a nota musical lá, cuja frequência predominante e fundamental é de 440 Hz, seja tocada em um instrumento como o violão e, ao mesmo tempo, ao piano e no diapasão. Certamente, ao ouvi-las, não haverá maiores dificuldades em diferenciá-las, pois apesar de saber que se trata da mesma nota musical, a quantidade e a qualidade dos harmônicos irão variar, em função das características físicas de cada fonte sonora (Russo, 1999). Onda aperiódica A principal característica distintiva das ondas periódicas complexas é a sua regularidade no tempo ou periodicidade. Elas se repetem indefinidamente. A onda aperiódica, contudo, é uma segunda categoria de forma de onda e seu nome deriva exatamente da falta de periodicidade. Assim, é muito difícil e quase impossível prever a forma da onda em um intervalo de tempo, a partir do conhecimento de suas características, durante outro intervalo de tempo de igual duração. O movimento vibratório de uma onda aperiódica é, ao acaso, aleatório e, por essa razão, imprevisível. As ondas aperiódicas são encontradas diariamente e exemplos familiares são os ruídos produzidos por aviões, automóveis, cachoeiras e, até mesmo, alguns sons de fala; principalmente os sons sibilantes são caracterizados por movimentos vibratórios aleatórios, isto é, aperiódicos (Russo, 1999). Processos de medida da intensidade sonora A intensidade de uma onda sonora pode ser medida por meio de processos absolutos e relativos. Quando se mede o afastamento da partícula material de sua posição de equilíbrio, mede-se a sua amplitude em metros ou centímetros. Também pode-se fazê-lo por meio da energia que atravessa uma área na unidade de tempo, ou seja, em watt/m2 ou erg/cm2s. Finalmente, através da força exercida pela partícula material sobre uma superfície na qual incide, isto é, pela pressão efetiva, usando como unidades o Pascal, o Newton/m2 ou dina/ cm2. Os três processos são denominados processos absolutos de medida da intensidade, pois fornecem diretamente os valores por meio das respectivas unidades. Quando se usa um processo de medida de intensidade sonora, tomando um valor de referência que estabeleça uma razão ou relação entre os valores de energia ou pressão, esse é denominado processo relativo de medida da intensidade. Quando a pressão ou a energia sonora de um ruído decresce, a sensação auditiva humana também o faz, da mesma forma que, quando ambas aumentam, existe um aumento em nossa sensação de intensidade sonora. Entretanto, intensidades sonora e auditiva não variam linearmente. Pode-se aumentar a pressão sonora de um tom de 1.000 Hz um milhão de vezes a partir de 20 Pa, até que esse seja incômodo aos nossos ouvidos. A energia sonora é proporcional ao quadrado da pressão sonora, de forma que a relação para a pressão é de 1:1.000.000, para a energia é de 1:1.000.000.000.000 ou 1:1012 para o mesmo tom de 1.000 Hz, sendo a menor energia necessária para ser ouvida da ordem de 10–16 watt/cm2 ou 10–12 watt/m2. De acordo com a lei de Fechner-Weber, para um indivíduo, ao receber um estímulo (E), a sensação (S) não é proporcional ao estímulo, mas diretamente proporcional a uma constante (K) multiplicada pelo logaritmo do estímulo, tomandopor base um estímulo preexistente (E ref), isto é, um valor de referência. Matematicamente: S = K log E/E ref Nesse caso, ao substituir o estímulo pela energia ou pela pressão, pode-se afirmar que a sensação produzida pelo som não é diretamente proporcional à pressão ou à energia, mas a uma constante multiplicada pelo logaritmo da pressão ou da energia, tomando por base uma pressão ou uma energia de referência, que são, respectivamente, 20 Pa e 10–12 watt/m2 ou 10–16 watt/cm2. Os processos que tomam por base essa lei são chamados de audiológicos ou relativos de medida da intensidade sonora, ou seja, o nível de intensidade sonora (NIS) e o nível de pressão sonora (NPS), cuja unidade de medida é o decibel (dB), em homenagem a Alexander Graham Bell, inventor do telefone. O Bel era uma unidade usada para medições de perdas nas linhas telefônicas, nos EUA, da qual derivou o decibel, ou seja, a décima parte do Bel, definido como uma raiz que estabelece em que razão um valor é maior ou menor do que outro, sendo este último tomado como referência. Nível de intensidade sonora (NIS) (sound intensity level – SIL) O decibel é uma unidade de medida ambígua, a menos que a intensidade de referência seja especificada. Qualquer confusão pode ser evitada, se uma intensidade convencional de referência for comparada a alguma intensidade absoluta e se pudermos calcular a relativa. Quando a referência for igual a 10–16 watt/cm2 ou 10–2 watt/m2, o resultado é expresso em dB NIS. Considere um som cuja intensidade sonora seja I. Chama-se NIS desse som o resultado numérico da expressão: em que I0 é igual ao menor valor de intensidade de energia audível, isto é: 10–16 watts/cm2, devendo ser especificado o resultado em dB NIS. Sendo o decibel uma unidade relativa, a intensidade de energia de referência deve ser sempre especificada, uma vez que se tal referência for modificada o resultado será diferente. Sendo assim, escreve- se da seguinte forma: NIS = 100 dB relativo (re) a 10–16 watt/cm2 ou, simplesmente, NIS = 100 dB re 10–16 watt/cm2. A relação entre intensidade absoluta em watt/cm2 e dB NIS é mostrada na Tabela 1. Nível de pressão sonora (NPS) (sound pressure level – SPL) O decibel é uma unidade relativa, sendo, portanto, imprescindível especificar o valor tomado como referência. No caso do NPS, o padrão de referência equivale à menor pressão sonora audível, ou seja, 20 Pa, que, por sua vez, equivale à menor intensidade de energia audível: 10–16 watt/cm2. Considere agora um som cuja pressão sonora seja P. Chama-se nível de pressão sonora o resultado da expressão numérica: em que P0 é igual ao menor valor de pressão sonora audível, isto é, 20 Pa, sendo o resultado especificado em decibel NPS (dB NPS). A relação entre pressão sonora e dB NPS pode ser encontrada na Tabela 2. Relação entre NPS e NIS Operando com NIS e com o NPS, por não serem processos lineares ou absolutos de medida da intensidade sonora, não são permitidas, pois, adições ou subtrações comumente utilizadas. Em vez disso, é necessário o trabalho com logaritmos. Quando a intensidade de energia é duplicada, o NIS aumenta em 3 dB e, quando a pressão sonora é duplicada, o NPS aumenta em 6 dB. Para saber o motivo dessa diferença de aumento entre os dois processos relativos de medida da intensidade, calcula-se, primeiramente, o que acontece quando a intensidade de energia é duplicada. Matematicamente: Duplicando-se a intensidade de energia (2I), o NIS2 será: NIS2 = 10 log 2I/I0 NIS2 = 10 log (2 × I/I0) = 10 log 2 + 10 log I/I0, ora: log 2 = 0,3 e 10 log I/I0 = NIS1, portanto: NIS2 = 10 × 0,3 + 10 log I/I0 NIS2 = 3 dB + NIS1. Dessa forma, ao duplicar a intensidade de energia, o NIS é acrescido em 3 dB. Ao dobrar a pressão sonora, calculando a variação no NPS, tem-se: Assim, ao duplicar a pressão (2P), o NPS2 é: NPS2 = 20 log 2P/P0 NPS2 = 20 log (2 × P/P0) = 20 log 2 + 20 log P/P0 (log 2 = 0,3) NPS2 = 20 × 0,3 + 20 log P/P0 NPS2 = 6 dB + NPS1 Concluindo, ao duplicar a pressão sonora, o NPS aumenta em 6 dB. Noções básicas sobre Acústica Fisiológica Psicoacústica Durante toda a vida, o homem recebe uma corrente contínua de informações sonoras, que são captadas por seus ouvidos, classificadas e arquivadas na memória de seu cérebro. Desde o batimento cardíaco no peito de nossas mães, a cantiga de ninar, a música preferida, até um grito de socorro, a buzina de um carro, o disparo de um canhão, a decolagem de um avião a jato, nada escapa ao sensível ouvido humano, considerado uma das mais perfeitas obras de engenharia da qual somos dotados. Dependendo do indivíduo, os sons podem provocar as mais diversas reações físicas e emocionais: sustos, risos, lágrimas, sensações de prazer ou desprazer, participação e segurança vitais, as quais são compartilhadas com os nossos semelhantes, principalmente por intermédio da linguagem falada, adquirida basicamente pela audição. Como se fosse um radar, nossa audição estende-se em todas as direções e a grandes distâncias, fornecendo informações sobre a localização e a que distância se está da fonte sonora, constituindo, assim, um mecanismo de defesa e alerta extremamente importante para nossa segurança vital. Centenas de milhares de sinais sonoros, cujo fluxo não cessa nem mesmo ao dormir, são captados por nossos ouvidos, que permanecem em constante vigília. A Audiologia é a ciência da avaliação da audição e tem sua base científica na Psicoacústica que, por sua vez, está relacionada àquilo que ouvimos, descrevendo as relações existentes entre nossas sensações auditivas e as propriedades físicas de um estímulo sonoro, como, por exemplo: sua frequência, intensidade, forma de onda, velocidade, etc. A Psicoacústica lida com os atributos da sensação do indivíduo para frequência (pitch), para a intensidade (loudness) e, ainda, em relação a ruídos, sons musicais e vozes humanas. Está relacionada à habilidade dos ouvintes em distinguir diferenças entre os estímulos e não diretamente aos mecanismos fisiológicos que servem de base para a detecção ou diferenciação dos sons, mas a relatos dos ouvintes sobre tais sons. Os testes audiométricos subjetivos utilizados em Audiologia, com o intuito de medir a acuidade auditiva do indivíduo, só foram possíveis a partir das pesquisas psicoacústicas realizadas no fim do século passado por Helmholtz, Fechner e Weber e, no século XX, principalmente na década de 1930, por Fletcher e Munson, Stevens e Newman, Davis e Glorig, Sivian e White e Békésy, cujos resultados são perfeitamente válidos nos dias de hoje. A diferença básica entre a Audiologia e a Psicoacústica reside na metodologia empregada. A Psicoacústica interessa-se por pequenas diferenças e efeitos sutis, podendo submeter os pacientes a inúmeros testes, por horas a fio, para determinar a média dos resultados obtidos para um grande número de indivíduos, a fim de investigar esses efeitos. A Audiologia, por outro lado, utiliza testes simples, de rápida aplicação, em um indivíduo em particular, a fim de determinar a natureza do distúrbio e o local da lesão na via auditiva. A diferença de abordagem, contudo, não impede o intercâmbio de ideias entre as duas disciplinas, o que efetivamente ocorreu, pois uma é base para a outra (Russo, 1999). Aspectos psicoacústicos da percepção do som Na percepção auditiva dos sons em geral, desde puros ou complexos, periódicos ou aperiódicos, o ouvido humano necessita de algumas informações básicas referentes a quatro aspectos: pitch – sensação subjetiva de frequência; duração – tempo em segundos da vibração sonora; loudness – sensação subjetiva de intensidade; e timbre – qualidade fornecida pela combinação harmônica do som, decorrente das características da fonte sonora que o produziu (Russo, 1999). Sensação de frequência – pitch A sensação de frequência é um atributo da impressão auditiva que mostra uma elevaçãoou diminuição na percepção da escala musical e está sujeita, primeiramente, altura, tonalidade das ondas sonoras, ou seja, a sensação auditiva de que sons podem ser ordenados, variando de graves a agudos. A sensação de frequência está relacionada à taxa de repetição da forma da onda de um som. Para um tom puro, isso corresponde à sua frequência e, para uma onda complexa periódica, corresponde à frequência fundamental (Moore, 1989). Uma vez que é um atributo subjetivo, não pode ser medida diretamente, embora tenha sido criada uma unidade denominada sone para medir a sensação de frequência. Pesquisas têm mostrado que o ouvido humano é notavelmente sensível às diferenças de frequência, podendo detectar, na faixa de 20 a 20.000 Hz, mudanças de frequência da ordem de 1% (o intervalo entre uma nota musical branca e uma preta do piano é da ordem de 6%), dando cerca de 1.000 intervalos discrimináveis nessa faixa (Boothroyd, 1986). Duração Os indivíduos diferem extraordinariamente nas suas habilidades para julgar intervalos de tempo em segundos, minutos ou dias. A duração está relacionada à habilidade de detectar diferenças nos estímulos sonoros, em função do tempo. É possível detectar diferenças de cerca de 10 milionésimos de segundo de intervalo de tempo entre os estímulos sonoros que atingem nossas orelhas, graças à audição estereofônica. Com apenas um ouvido, podem-se detectar mudanças temporais da ordem de 1 milionésimo de segundo, percebendo a ordem de dois eventos sonoros distintos, separados por apenas 1/50 de segundo (Boothroyd, 1986). Stevens e Davis revelaram que o ouvido humano muito aguçado pode detectar uma diferença no tempo de duas notas musicais da ordem de 0,01 segundo. Por outro lado, ouvidos menos sensíveis podem requerer 0,10 ou 0,20 segundo para perceberem a diferença. Sensação de intensidade – loudness É também uma impressão subjetiva relacionada à intensidade de um som, a partir de sua pressão, energia ou amplitude. Em geral, quanto maior é a amplitude de um som, mais intensamente ele é ouvido, embora não haja linearidade nesse processo e variações existam, dependendo da frequência. Quando a pressão sonora é reduzida, a sensação de intensidade também decresce e, abaixo de certo nível de pressão, o som não é mais ouvido. A menor pressão sonora capaz de impressionar o ouvido humano é de 20 Pa para um tom de 1.000 Hz e pode-se aumentá-la um trilhão de vezes, até atingir o limiar da dor. A loudness é definida como o atributo da sensação auditiva em termos de quais sons podem ser ordenados, em uma escala que varia de fraco a forte (Moore, 1989). Nossa sensibilidade auditiva para mudanças na intensidade sonora é menos precisa do que para as de frequência. É preciso pelo menos 1 dB de intervalo para se perceber diferenças na intensidade, o que corresponde a uma mudança de 10%, dando, na faixa audível, cerca de 100 intervalos discrimináveis, entre o limiar de audibilidade e o de desconforto (Boothroyd, 1986). A unidade de medida da loudness é o fone, que equivale à sensação de intensidade em dB produzida para um tom de 1.000 Hz, a partir das curvas de igual audibilidade ou isofônicas, determinadas em experiências realizadas por Fletcher e Munson, ilustradas na Figura 6. Figura 6 Curvas de igual audibilidade ou isofônicas. Fonte: Fletcher e Munson,1933. A fim de saber quantas vezes um som é mais audível do que outro, foi decidido que o nível correspondente a 1 sone seria igual a 40 fones, com base no conhecimento de que cada aumento ou diminuição do nível de audibilidade de um som em 10 fones corresponde ao dobro ou à metade da audibilidade, sendo possível, assim, determinar a associação entre essas duas unidades (Gonzalez, 1980). Timbre Na natureza, pode ser encontrada uma infinita série de variedades na qualidade de um tom e ainda é possível descobrir neles uma base fundamental e relativamente simples, para sua classificação e descrição. O que torna possível a distinção entre a mesma nota musical, executada em instrumentos diferentes, é a qualidade e a quantidade de harmônicos presentes na onda sonora complexa, modificados pela sensação de frequência absoluta e pela intensidade total, e é definido como timbre. Sendo também uma impressão subjetiva, não pode ser medido diretamente, e sabe-se que o timbre de um som pode ser alterado por mudanças na intensidade e/ou no número dos seus componentes harmônicos, ou seja, alterações no modelo sonoro. O timbre está diretamente relacionado à nossa habilidade de analisar frequências e depende das várias combinações de frequências e intensidades, no modelo físico da estimulação acústica (Davis, 1970). Faixa de audição humana O ouvido humano não é igualmente sensível para todas as frequências, e vários experimentos psicoacústicos foram realizados com o intuito de esclarecer as relações existentes entre as alterações nas propriedades físicas das vibrações sonoras e as correspondentes alterações subjetivas na sensação auditiva. Teoricamente, existem ondas sonoras de qualquer frequência. Entretanto, o ouvido humano é sensível somente aos sons cuja faixa de frequências situa-se entre 20 e 20.000 Hz, denominada faixa audível. Ondas sonoras situadas abaixo de 20 Hz são chamadas de infrassom e, acima de 20.000 Hz, de ultrassom. A faixa de frequências audíveis difere para alguns animais; por exemplo: gatos = 10 Hz a 60 kHz; cães = 15 Hz a 50 kHz; morcegos = 10 kHz a 120 kHz; golfinhos = 10 kHz a 240 kHz (Okuno et al., 1982). Nesses experimentos, foi determinada a faixa de audição humana, que compreendia a área de frequências de 20 a 20.000 Hz, incluindo o limiar mínimo de detecção ou audibilidade, isto é, a mais fraca intensidade sonora capaz de impressionar o ouvido humano para um tom puro, em 50% das vezes em que o estímulo sonoro é apresentado, tomando por base a frequência de 1.000 Hz e a pressão sonora de referência de 20 Pa. Esse valor de pressão determinou o estabelecimento do 0 dB NA (nível de audição). O procedimento foi empregado para as demais frequências e foi construído um gráfico em que, na abscissa, eram dispostas as frequências, e na ordenada, os valores de pressão sonora. Nesse mesmo gráfico, foram também registrados os limiares de desconforto que, para um tom de 1.000 Hz encontra-se a 120 dB, e de dor a 140 dB. Determinação do nível de audição A área de audibilidade, ou nível de audição, foi determinada para um grupo de indivíduos otologicamente normais, com idades variando entre 18 e 25 anos, inicialmente para tons puros apresentados em campo livre e, posteriormente, com o uso de fones, no Laboratório Nacional de Física, na Inglaterra. Os mesmos testes foram, também, realizados nos Laboratórios Telefônicos Bel, nos EUA. Na Figura 7, observam-se várias linhas; a contínua representa a mediana da população (50%) e as tracejadas representam o restante daquela, criando-se, portanto, uma zona de limiares de audibilidade, em vez de uma única linha marcando o limiar mínimo para tons puros. Observa-se, também, que a área da fala concentra energia na faixa de frequências entre 400 e 4.000 Hz, embora inclua frequências mais baixas (área da frequência fundamental) e mais altas (formantes de várias consoantes), iniciando, portanto, em torno de 100 Hz e indo até aproximadamente 8.000 Hz, com intensidades variando de 40 a 65 dB NA. Figura 7 Campo dinâmico de audição. O audiômetro de tons puros foi projetado como um instrumento eletrônico calibrado de tal forma que a leitura zero, para cada frequência, correspondesse a um nível de audição médio para jovens adultos normais. Os valores de nível de pressão sonora eram, pois, diferentes para cada frequência e a audiometria tonal mediria, por sua vez, o número de dB em que o limiar do indivíduo se situasse com relação a cada valor médio. O resultado era anotado em um gráfico, que horizontalizou os limiares de audibilidade –o audiograma. Níveis de audição positivos representariam a pressão adicional necessária para ser ouvida por ouvidos menos sensíveis do que a média da população e foram colocados para baixo a fim de expressar a ideia de redução na sensibilidade auditiva, ao contrário dos gráficos físicos. No audiograma, as frequências variam de 125 a 8.000 Hz em intensidades que vão de –10 dB a 120 dB NA. A razão de existirem valores negativos (–5 e –10 dB NA) justificou-se pelo fato de existirem indivíduos que ouviram valores de pressão sonora inferiores ao de referência, ou seja, 20 Pa; sua audição foi considerada acima do normal. Considerando a variação individual, encontra-se o nível de sensação, ou seja, o zero audiométrico de cada indivíduo, que é um valor subjetivo e depende do nível de audição individual. Se, por exemplo, ao imaginar três indivíduos com níveis de audição médios de 20, 40 e 60 dB, expostos a um som de 100 dB NA, seus respectivos níveis de sensação serão 80, 60 e 40 dB NS, isto é, a diferença entre o seu nível de audição e o estímulo sonoro apresentado (Russo e Santos, 1993). A importância da calibração Por que calibrar? A calibração é um processo que visa a controlar as características de frequência, intensidade e tempo e verificar o funcionamento dos equipamentos utilizados em Audiologia. Ela é necessária para assegurar que um audiômetro produza um tom puro em um nível e frequência específicos e que esse sinal esteja presente somente no transdutor ao qual foi direcionado, estando livre de distorção ou interferência de ruído indesejável (Wilber, 1994). Equipamentos calibrados com a frequência exigida podem contribuir para aumentar a confiabilidade do fonoaudiólogo nos resultados dos testes audiométricos realizados, uma vez que a calibração periódica determina se o equipamento está de acordo com os padrões apropriados para cada um dos instrumentos ou se sofreram alterações com o tempo de uso. Equipamento para a calibração O equipamento básico para calibração dos níveis de saída inclui: um voltímetro, um microfone de condensador (pressão e campo livre), um acoplador de 6 mL (NBS-9A para a ANSI* e 318 para a IEC**), um peso de 500 g, um acoplador mecânico para mensuração do vibrador ósseo (mastoide artificial), um medidor de nível sonoro ou analisador de espectro. O processo de calibração eletroacústica deve ser realizado por um técnico habilitado pelo próprio fabricante do equipamento. Processo de calibração O primeiro passo para aprender como verificar o funcionamento e calibrar o equipamento é a leitura do manual de instruções que o acompanha. Algumas vezes, os resultados dos testes, por si mesmos, revelam a necessidade de calibração do instrumento. É preferível assumir que o problema seja do equipamento antes de o atribuir ao paciente sob teste. Inicialmente, é recomendável que o fonoaudiólogo faça a calibração biológica do audiômetro, verificando, com o uso de seu próprio ouvido, a saída do sinal acústico nos diferentes transdutores: fones, alto-falantes e vibrador ósseo. Não é necessário ser portador de um ouvido especial ou absoluto para fazê-lo, pois, com um pouco de prática, qualquer profissional pode detectar falhas no instrumento. Em seguida, deve ser feita a inspeção do audiômetro, a fim de verificar possíveis fontes de mau funcionamento, tais como: plugues e tomadas; fios enrolados ou partidos dos fones e vibrador ósseo; botões e interruptores quebrados ou fora de alinhamento; cliques mecânicos audíveis por meio dos fones, quando os atenuadores ou osciladores são manipulados. Geralmente, há duas abordagens para a calibração dos fones do audiômetro. Uma é a biológica, que utiliza o ouvido humano como referência, e a outra, a artificial ou eletroacústica, feita no acoplador de 6 mL. A calibração biológica é feita quando 10 indivíduos otologicamente normais de 18 a 25 anos de idade são submetidos, no mínimo mensalmente, à audiometria tonal, para verificar se a média de sua audição está em 0 dB para cada frequência, obedecendo à referência de limiares, proposta pela norma ANSI S3.6 – 1989. Embora seja possível de ser realizada, a calibração biológica não é considerada tecnicamente correta por se referir a um nível de audição arbitrariamente aceito por normas de padronização, sendo preferível a calibração eletroacústica dos fones do audiômetro, pelo uso do acoplador de 6 mL, também chamado de ouvido artificial. A calibração eletroacústica consiste no uso de um microfone de condensador ligado a um acoplador de 6 mL, volume semelhante ao do ouvido humano, quando o fone está colocado (Corliss e Burkhard, 1953). O fone é colocado no acoplador e sobre ele é depositado um peso de 500 g. Em seguida, é gerado no fone um tom de baixa frequência (125 ou 250 Hz) até que a intensidade mais elevada seja atingida. A saída é registrada em voltagem, e depois transformada em dB (re 20 Pa), e comparada com os valores de NPS esperados para cada frequência, segundo os padrões ISO*** 7566 – 1987, antiga ISO 1964 ou ANSI S3.6 – 1989. Diferenças de até 15 dB devem ser levadas em consideração pelo uso de um cartão de correção, que mostra a discrepância entre a saída do audiômetro e os padrões de calibração. Quando tais diferenças excederem os 15 dB em qualquer frequência ou 10 dB em três ou mais frequências, o audiômetro deve ser calibrado pelo próprio fabricante (Wilber, 1994). Para a calibração do vibrador ósseo, é empregada uma mastoide artificial, pressupondo que os limiares para as vias aérea e óssea sejam equivalentes. Nesse procedimento, também são avaliados os parâmetros de intensidade, frequência e tempo, mas a ênfase é dada à obtenção dos níveis de distorção do vibrador ósseo nas várias frequências. O padrão ANSI S3.43 – 1992 fornece os valores apropriados para o vibrador ósseo do tipo B-71 usado com uma haste P-3333, atualmente em uso (Wilber, 1994). Padrões de calibração para audiômetros e cabinas acústicas Fowler e Wegel, em 1922, descreveram o primeiro audiômetro eletrônico produzido comercialmente nos EUA: o modelo Western Electric 1A, que gerava oitavas de frequências entre 32 e 16.384 Hz e possuía um atenuador logarítmico. Esse modelo de audiômetro foi substituído pelo Western Electric 2A, mais econômico, criado nos Laboratórios Telefônicos Bell, abrangendo a faixa de frequências de 64 a 8.192 Hz (Olsen, 1991). Quando os audiômetros foram introduzidos no mercado, cada indústria fabricava o modelo cujas especificações audiométricas mais se adequassem aos julgamentos de seus engenheiros e consultores. Tal situação, contudo, levou à incerteza e confusão quanto aos valores a serem tomados como referência na escala de intensidade, para especificar a normalidade auditiva, ou seja, o 0 dB NA. Em 1951, a American Standards Association (ASA) determinou experimentalmente para cada frequência os valores de pressão sonora que correspondessem aos limiares de audibilidade normais, empregando fones do tipo WE 705A. Foram, então, selecionados 85 jovens adultos, todos funcionários dos Laboratórios Bell, sem qualquer passado otológico, os quais foram submetidos aos testes audiométricos, que fixaram para o 0 dB os valores de pressão sonora constantes na Tabela 3. A fixação desses valores, contudo, não foi considerada definitiva e os estudos prosseguiram até que, em 1964, a International Standards Organization (ISO), composta por representantes de vários países, propôs novos valores para o nível de referência zero do audiômetro, levando em conta o tipo de fone empregado, o coxim no qual o fone está embutido e o equipamento usado na calibração, denominado de ouvido artificial (modelo NBS-9A). Como os valores entre os dois padrões diferiram, para se converterem os valores de perdas auditivas obtidas no padrão ASA 51 para o padrão ISO 64, bastava adicionar, para cada frequência, os valores encontrados na Tabela 4. Em1969, a antiga ASA, agora denominada American National Standards Institute (ANSI), realizou novo experimento com o uso do fone modelo TDH-39, embutido no coxim MX 41/AR, medido no ouvido artificial NBS-9A, fixando novos valores para o nível zero de referência, para audiômetros em sua norma regulamentadora ANSI S3.6 – 1969. Entretanto, esses valores praticamente coincidiram com aqueles obtidos no padrão ISO 64, variando menos de 5 dB, em vigor até o presente e que podem ser encontrados na Tabela 5. As normas ANSI S3.6 – 1989, IEC 1988 e ISO 7566 – 1987 são as que continuam a reger a calibração dos parâmetros acústicos dos fones dos audiômetros utilizados no processo de avaliação audiológica, embora o Inmetro tenha criado o GT3 que está traduzindo e adaptando as normas internacionais à realidade brasileira, constituindo assim a ISO 8253. A Tabela 6 mostra os níveis de pressão sonora que devem constar na calibração dos fones TDH-49 e TELEX- 1470 dos audiômetros, segundo a norma ANSI S3.6 – 1989, usando o acoplador NBS-9A. Portanto, ao se anotar no audiograma os níveis de audição de um indivíduo, é importante especificar o padrão de calibração ao qual o audiômetro foi submetido, uma vez que os valores de referência para o 0 dB diferem de padrão para padrão. O audiograma, por sua vez, permite o registro dos limiares de audibilidade do indivíduo, e suas especificações básicas são recomendadas pela American Speech-Language-Hearing Association (ASHA – 1974 e 1988) e adotadas pela ANSI S3.21 – 1978 e R – 1986. Essas recomendações referem-se à construção do gráfico, mantendo as frequências (Hz) na abscissa em escala logarítmica, enquanto o nível de audição (dB NA) deve estar na ordenada, expresso linearmente. Além disso, a ASHA recomenda que uma divisão de uma oitava, na escala de frequência, seja equivalente a 20 dB e, na escala do nível de audição, em dB (Jacobson e Northern, 1991). O padrão ANSI S3.43 – 1992 fornece os valores em nível de pressão sonora, apropriados para o vibrador ósseo do tipo B-71, usado com uma haste P-3333, empregados atualmente, conforme mostra a Tabela 7. A determinação dos limiares de audibilidade ou do nível de audição dos indivíduos deve ser feita em local apropriado, isto é, em uma cabina acústica. Essa deve ter paredes constituídas de várias camadas de material isolante, a fim de impedir a entrada de som para o seu interior, e absorvente, para dissipar as ondas sonoras em sua estrutura. Contudo, não pode ser totalmente à prova de som, uma vez que o indivíduo examinado poderá ouvir ruídos provenientes de seu próprio organismo, distraindo sua atenção dos estímulos sonoros utilizados na audiometria tonal. Dessa forma, é recomendável que exista um nível de ruído para mascarar esses sons, específico para cada frequência ou banda de oitava, obedecendo à norma ANSI S3.1 – 1991. Esses valores foram obtidos tanto para fones quanto para alto-falantes empregados nos testes em campo livre e podem ser observados na Tabela 8. A cabina acústica deve estar situada no local menos exposto a ruídos, longe de ruas movimentadas, de elevadores, ventiladores, etc. Deve possuir uma janela de observação, contendo três vidros, se possível unidirecionais, e ser fechada por meio da porta dupla ou bastante espessa, que utilize trinco do tipo usado para portas de frigoríficos. Seu tamanho pode variar de 1 × 1, 2 × 2, 2 × 1 metros, de acordo com as limitações de espaço físico disponível no local de sua construção. Entretanto, para a realização de audiometria tonal com o uso de alto-falantes ou caixas acústicas, simulando a situação de campo livre, o indivíduo testado deve estar sentado a uma distância de, pelo menos, 1 metro dessas (Hodgson, 1980). Calibração dos analisadores de orelha média (imitanciômetros) O padrão empregado na obtenção das medidas da imitância acústica é o ANSI S3.39 – 1987, que descreve quatro tipos de unidades para mensuração, listados simplesmente como tipos 1, 2, 3 e 4. Os requerimentos mínimos são: tom de sonda de pelo menos 256 Hz, um sistema pneumático (manual ou automático), um modo de medir a imitância acústica estática, a timpanometria e o reflexo acústico. Assim, a fim de verificar um imitanciômetro, é necessário um analisador de frequência para determinar o(s) tom(s) de sonda, cuja precisão deve situar-se em 3% do valor nominal. A distorção harmônica não deverá exceder 5% da fundamental, quando medida em um acoplador de 2 mL. O tom de sonda não poderá exceder 90 dB no acoplador. Isso é feito conectando-se a sonda do equipamento às cavidades de teste e verificando a precisão da saída em temperaturas específicas e pressões barométricas ambientais, descritas por Lilly (1984). A pressão de ar pode ser medida conectando-se a sonda a um manômetro ou tubo U e determinando-se o deslocamento em deca-Pascals (daPa), que não deve diferir do que está no equipamento: +200 daPa em mais de 10 daPa ou 15% da leitura. O padrão determina que a medida da pressão de ar deve ser realizada em cavidades de 0,5 a 2 cm3 (Wilber, 1994). O sistema de eliciação do reflexo acústico contralateral pode ser medido no acoplador NBS9A e o do ipsilateral no acoplador do tipo HA-1. As tolerâncias para frequência, intensidade e distorção harmônica deverão ser as mesmas esperadas para os fones dos audiômetros, ou seja, 3% do valor esperado para frequência e distorção harmônica e 5% ou menos para o transdutor da sonda. O NPS dos ativadores tonais deve estar entre 3 dB do valor declarado para as frequências de 250 a 4.000 Hz e 5 dB para frequências de 6.000 e 8.000 Hz e para ruído (Wilber, 1994). Os imitanciômetros ou analisadores de orelha média vêm acompanhados de uma cavidade metálica de calibração que deve ser utilizada semanalmente, ou diariamente, a fim de assegurar o funcionamento adequado do equipamento. Novamente, é imprescindível que o fonoaudiólogo leia o manual do fabricante com atenção antes de manipular o equipamento. Isso poderá evitar erros desnecessários na obtenção dos resultados dos testes, e poderá fazer com que o instrumento possa funcionar bem por um maior período de tempo. Resumo Este capítulo procurou fornecer as noções básicas da Acústica Física e da Psicoacústica e sua importância para a Audiologia, uma vez que constituem a pedra fundamental sobre a qual essa ciência foi edificada. Aspectos acústicos da onda sonora, como suas características, atributos físicos mensuráveis, bem como aspectos psicoacústicos da percepção auditiva e a determinação do nível de audição foram neste capítulo enfatizados. Finalmente, o capítulo ressaltou a responsabilidade do fonoaudiólogo na verificação da saída do equipamento de teste usado na avaliação audiológica. Mesmo que alguns dos problemas possam ser detectados por ouvidos humanos treinados e mais sensíveis, isso não é suficiente para garantir a precisão necessária para assegurar o funcionamento adequado dos instrumentos. Desse modo, verificações eletroacústicas periódicas são imprescindíveis, uma vez que os resultados obtidos nos testes espelham, dentre outros, o funcionamento dos equipamentos utilizados na avaliação audiológica rotineira. Leitura recomendada American Speech-Language-Hearing Association (ASHA). Commitee on audiometric evaluation. Guidelines for audiometric symbols. Rockville: ASHA, 1974. p. 260-4. American Speech-Language-Hearing Association (ASHA). Commitee on audiometric evaluation. Guidelines for audiometric symbols. Rockville: ASHA, 1988. p. 39-42. American Standards Association (ASA). American standards specification for audiometers for general diagnostic purposes. Z24.5- 1951. New York, ASA, 1951. American National Standards Institute (ANSI). 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