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Unidade 1 - Introdução ao Direito Digital a Lei do Processo Eletrônico Nesta unidade você verá: // introdução ao Direito Digital // análise dos pontos mais relevantes da Lei 11.419/2006 // fraudes no sistema de distribuição dos processos // entendimento e jurisprudência sobre o estelionato judicial // benefícios do processo eletrônico no combate às fraudes processuais Apresentação Devido ao grande número de horas que, diariamente, passamos “imersos” na rede mundial de computadores – o que nos permite utilizar todas as facilidades da tecnologia em nossas operações financeiras, intelectuais e até mesmo na interação com nossos círculos sociais –, o Direito Digital é hoje um campo do Direito em expansão e se constitui como área interdisciplinar que engloba diferentes ciências, como as ciências da tecnologia, informática, matemática com algoritmos, entre outras. A área é também relativamente recente, de modo que ainda não há jurisprudências que foram superadas para compararmos. No entanto, com base nas recentes decisões, já podemos ter ideia do caminho que seguimos. Nesse sentido, muitos dos conhecimentos que passarei a vocês são os mais recentes entendimentos doutrinários e jurisprudências, a fim de entendermos melhor qual direção estamos tomando. Depois das leis em si, os entendimentos jurisprudenciais são os aprendizados mais relevantes, pois, assim, vocês saberão como funciona o mundo jurídico real. Faremos, então, um sobrevoo histórico para ver como surgiu o Direito Digital, quais necessidades levaram à criação das leis e como elas estão evoluindo no sistema jurídico, com as alterações de entendimento jurisprudencial e das próprias leis, a fim de que cumpram seu papel social. Espero que aproveitem o conteúdo e possam aprofundar ainda mais seus conhecimentos. AUTOR O professor Gabriel Zanetti Alves é formado em Direito pela Universidade FMU – SP e atua como advogado desde 2015, ano de sua formação, nas áreas do Direito do Consumidor e Criminal, além de prestar consultoria para empresas. Estas aulas são dedicadas a todos os professores que tive durante minha trajetória acadêmica, que me inspiraram e puderam formar minha base intelectual. Dedico também aos meus colegas de profissão. Gabriel Zanetti Alves Presidente do Conselho de Administração: Janguiê Diniz Diretor-presidente: Jânyo Diniz Diretoria Executiva de Ensino: Adriano Azevedo Diretoria Executiva de Serviços Corporativos: Joaldo Diniz Diretoria de Ensino a Distância: Enzo Moreira Autoria: Gabriel Zanetti Alves Projeto Gráfico e Capa: DP Content DADOS DO FORNECEDOR Análise de Qualidade, Edição de Texto, Design Instrucional, Edição de Arte, Diagramação, Design Gráfico e Revisão. © Ser Educacional 2019 Rua Treze de Maio, nº 254, Santo Amaro Recife-PE – CEP 50100-160 *Todos os gráficos, tabelas e esquemas são creditados à autoria, salvo quando indicada a referência. Informamos que é de inteira responsabilidade da autoria a emissão de conceitos. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem autorização. A violação dos direitos autorais é crime estabelecido pela Lei n.º 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal. Imagens de ícones/capa: © Shutterstock Objetivos OBJETIVOS DA UNIDADE bullet Apresentar o histórico do Direito Digital; bullet Elucidar como surgiu a ideia da Lei nº 11.419, de 19 de dezembro de 2006 (Lei do Processo Eletrônico); bullet Comentar os pontos mais importantes da Lei 11.419/2006; bullet Mostrar alterações que ocorreram no Direito brasileiro para atender às mudanças trazidas pela Lei 11.419/2006; bullet Explicar a figura do jus postulandi no processo eletrônico; bullet Explicar o que é estelionato judicial; bullet Processo eletrônico como forma de combater fraudes processuais; bullet Explanar os benefícios trazidos pelo processo eletrônico. TÓPICO DE ESTUDO Introdução ao Direito Digital – // Conceito de Direito Digital // Surgimento do Direito Digital // Como surgiu o Projeto de Lei do Processo Eletrônico Análise dos pontos mais relevantes da Lei 11.419/2006 – // Ações que discutiram a constitucionalidade da Lei 11.419/2006 // O Processo Judicial Eletrônico na Justiça do Trabalho (PJe-JT) // Dificuldades do jus postulandi no processo eletrônico Fraudes no sistema de distribuição dos processos – - Entendimento e jurisprudência sobre o estelionato judicial – - Benefícios do processo eletrônico no combate às fraudes processuais – - Introdução ao Direito Digital Nesta unidade, vamos abordar alguns pontos essenciais para a compreensão da matéria e, assim, teremos uma base da história de como foi implementada a Lei nº 11.419, promulgada em 19 de dezembro de 2006, conhecida como Lei do Processo Eletrônico: com qual intuito se desenvolveu essa lei, quais as necessidades apresentadas à época para que fosse possível sua implementação, como foi essa implementação, como os tribunais efetivaram seus sistemas eletrônicos, quais os impactos da lei, como sua aprovação foi vista pela OAB, quais remédios constitucionais foram impetrados contra ela e quais as decisões do STF sobre o assunto. Faremos uma análise da Lei, trazendo os artigos mais relevantes e fazendo a conexão destes com as leis vigentes naquele momento, as alterações no Código de Processo Civil para que não houvesse conflito entre as normas e algumas dificuldades que as exigências dos sistemas implementados trazem para o cidadão que busca seu acesso, já que nem todas as pessoas que procuram o Judiciário possuem acesso à internet. Abordaremos a Lei do Processo Eletrônico como forma de combate às fraudes e os problemas de transparência que existiam nos sistemas eletrônicos de distribuição dos processos, que acabaram por gerar dúvidas relativas à segurança desses sistemas – e como os novos sistemas foram utilizados para corrigir esse tipo de questão. Analisaremos os benefícios trazidos pelos sistemas eletrônicos ao Judiciário brasileiro, que agora tem uma ferramenta muito mais eficiente na produtividade e com menor custo, o que auxilia os servidores a terem maior qualidade de vida no ambiente de trabalho. Veremos também quais as decisões mais relevantes em relação a essa Lei, como os tribunais superiores entendem as demandas relacionadas ao tema, jurisprudências atuais referentes ao estelionato judicial e como o combate a esse tipo de crime está sendo feito com o auxílio dos sistemas eletrônicos. CONCEITO DE DIREITO DIGITAL Por ser uma área em extrema ascensão, encontramos diversos conceitos referentes ao assunto: cada autor acaba por seguir uma definição própria. No entanto, apesar de suas diferenças e peculiaridades, os conceitos acabam por convergir para um mesmo sentido. Adotaremos, então, a seguinte definição de Direito Digital: o Direito Digital resulta da relação bidirecional do Direito e da Ciência da Computação, desenvolvendo novas tecnologias e legislações para que as duas ciências se adaptem aos novos desafios no mundo contemporâneo. Ele regulamenta todas as novas relações jurídicas desenvolvidas no mundo virtual – entre elas, as transações e as obrigações firmadas por meio de contratos virtuais que utilizam certificação digital para validação jurídica. Com esses novos tipos de contratos firmados por meio tecnológico, em ambiente virtual, surgiu a necessidade dessa nova vertente do Direito, que, como várias outras, acaba por necessitar do auxílio de outras ciências para suprir pontos que fogem de seu escopo de estudo. Assim, com o surgimento desses novos métodos de contratos e obrigações oriundos do meio digital, surgem também novos delitos, novas fraudes, que também necessitam de uma resposta do Estado. A fim de que a persecução penal possa ser eficiente, as ciências computacionaissão aliadas fundamentais para o desenvolvimento de novas técnicas de investigação, atuantes na análise forense computacional. SURGIMENTO DO DIREITO DIGITAL O Direito Digital surge com o fenômeno da internet, com o intuito de resguardar a vida íntima da pessoa, tutelando seus dados, que, no mundo digital, acabam por refletir sua vida pessoal. Existem alguns registros de crimes cometidos em computadores na década de 1970, nos quais o agente sempre era o técnico de informática. Com o passar dos anos, alterou-se o perfil criminológico do autor, e, nos anos 80, além dos técnicos, também faziam parte desse grupo os colaboradores de instituições financeiras – o que era óbvio, pois, até então, somente essas pessoas tinham conhecimento técnico e acesso aos dispositivos para que pudessem transgredir as leis (SILVA, 2000). Silva (2000) também nos explica que com o crescimento do mercado de informática e a facilidade em obter os equipamentos, esses seletos grupos que dispunham de conhecimento e oportunidade acabaram por não ser mais os principais criminosos. Na verdade, nas décadas seguintes, qualquer pessoa passou a tornar-se criminoso potencial. No entanto, apesar dessa alteração do grupo criminológico, ainda hoje, 90% dos crimes cibernéticos são cometidos por colaboradores das próprias empresas. É um fenômeno que não exige muito estudo para ser explicado pelo simples fato de o agente ter fácil acesso às informações dos bancos de dados, facilitando, também, o cometimento do crime (SILVA, 2000). No Quadro 1, podemos ter uma ideia do panorama histórico das leis criadas para proteção de dados e do quanto são recentes. Quadro 1. Cronologia de legislações sobre proteção de dados. Fonte: FAUSTINO, 2016. (Adaptado). Mesmo com muitos estudos sobre esse tema, ainda não há consenso, entre os doutrinadores, quanto à classificação e os tipos de crimes cibernéticos – mas, de forma geral, todas as definições acabam por englobar praticamente os mesmos crimes, como podemos ver no exemplo: Alguns principais exemplos são: fraude por e-mail e pela internet; fraude de identidades, quando informações pessoais são roubadas e usadas; roubo de dados financeiros ou relacionados a pagamento de cartões; roubo e venda de dados corporativos; extorsão cibernética, que exige dinheiro para impedir o ataque ameaçado; ataques de ransomware, um tipo de extorsão cibernética; cryptojacking, quando hackers exploram criptomoedas usando recursos que não possuem; espionagem cibernética, quando hackers acessam dados do governo ou de uma empresa. Esses crimes podem se dividir em dois grupos: atividade criminosa que visa computadores ou atividade criminosa que usa computadores para cometer outros crimes (KASPERSKY, [s.d.]). Com a evolução tecnológica, nossas vidas cotidianas acabam por ser regidas, praticamente por inteiro, pelo uso de computadores, celulares e outros meios de comunicação digital. Dessa maneira, o Direito Digital se faz necessário, seja em nossa vida privada (com as redes sociais, por exemplo), seja em nossa vida financeira (com aplicativos de bancos ou com todas as nossas transações bancárias e de compras on-line, que hoje acabam por ser uma tendência global e se encaminham para o comércio digital por completo, inclusive por conta da pandemia de Covid-19, que acelerou ainda mais esse processo de digitalização do mundo contemporâneo). Apesar de o Direito Digital, ainda, não ser reconhecido como uma área autônoma do Direito, como o Civil ou o Penal, existe a tendência de que acabe por ser reconhecido como tal, por sua complexidade e por atuar de forma célere, acompanhando as constantes mudanças no mundo virtual. A tecnologia da informação é considerada uma das ciências de evolução mais rápida, e sua mutação constante faz com que o Direito como hoje conhecido e utilizado se torne totalmente obsoleto para acompanhar essa mudança. Enquanto uma nova tecnologia de algoritmo ou até mesmo um novo software é lançado e, em poucos meses, já se torna obsoleto ou uma nova criptografia é criada e, em poucos dias, já existem relatos de que foi “quebrada”, o Direito acaba por não conseguir acompanhar essa evolução frenética: para que uma lei seja criada, existe todo um trâmite burocrático, e, nos casos em que o Estado precisa de uma resposta a algum novo tipo de crime por meio de sistema cibernético, o Direito Penal acaba por trazer essa resposta de maneira tardia. Temos como exemplo o caso da atriz Carolina Dieckmann, que, em 2011 foi vítima de uma invasão de hackers em seu computador, no qual havia algumas fotos íntimas que acabaram publicadas. Após uma grande repercussão midiática do seu caso, houve a apresentação de um projeto de lei no mesmo ano, quando a Lei nº 12.737, de 30 de novembro de 2012 foi aprovada, descrevendo esse novo tipo de crime, alterando o artigo 154 e incluindo os artigos 154-A, 154-B, 266 e 298 no Código Penal. Na atualidade, o Direito Digital é tão relevante que, em 2005, a CIA (Agência Norte-Americana de Inteligência) criou uma versão da famosa Wikipedia com o intuito de fomentá-la com conteúdo voltado à inteligência e espionagem, conhecida como Intellipedia. Essa página pode ser acessada por 16 agências norte-americanas de inteligência, e seus usuários a alimentam e trocam informações, classificadas em três níveis de segurança: top secret, secret, e sensitive but unclassified (ultrassecreto, secreto e sensível, mas não confidencial, respectivamente). Para ter acesso a esse sistema de inteligência, é necessário ter credenciais de acesso válidas, o que pode ser feito no próprio sistema intranet das agências com o uso do cartão de identificação na estação de trabalho, ou remotamente com uso de uma VPN. Fica evidente que o acesso por qualquer pessoa não autorizada é proibido (SZOLDRA, 2016). COMO SURGIU O PROJETO DE LEI DO PROCESSO ELETRÔNICO Segundo Petersen (2019), antes mesmo de se imaginar um sistema digital que abarcasse todo o Judiciário brasileiro, mais precisamente na década 1990 já começavam a surgir tecnologias para auxiliar o andamento dos processos, como foi o caso da implementação de alguns sistemas de gestão processual nos quais já havia o sorteio eletrônico de processos, trazendo enormes benefícios à época. Esses sistemas podem ser considerados os primeiros rascunhos do que hoje se conhece por processo eletrônico. Com todas as dificuldades e morosidade que os processos físicos traziam para o sistema judiciário, como os custos com armazenagem, conservação e translado e até mesmo algumas doenças causadas pelo excesso de poeira e bolor que se acumulavam, a Associação dos Juízes Federais do Brasil, AJUFE, encaminhou um anteprojeto de lei à Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados, que o aprovou sem restrições. Esse projeto teve como principal objetivo aumentar a eficiência do Judiciário com o auxílio das tecnologias atuais. Antes da entrada em vigor da lei, não havia a possibilidade de consultar os processos de maneira remota, com o uso da internet: apenas era possível presencialmente, o que acabava por trazer muitas dificuldades aos operadores do Direito (OLIVEIRA, 2013). Figura 1. A implantação do processo judicial eletrônico modificou a forma como os operadores do Direito trabalham. Fonte: TJRR. Acesso em: 23/06/2020. Imagine que você é advogado na cidade de São Paulo e precisa consultar um processo que tramitava em Fortaleza. Além da distância física, imagine que você tivesse certa urgência em verificar algum despacho, movimentação do processo ou algum documento anexado... Mesmo se deslocando até o cartório onde o processo se encontrava, teria a possível demora para o cartorário atender todas as pessoas e encontrar seu processo, que, muitas das vezes, sequer estaria disponível, pois poderia estar na “fila” na mesa do juiz paraser julgado. Com essa dificuldade que se tinha antes da entrada em vigor da Lei e da implementação dos sistemas digitais pelos tribunais, foi desenvolvido o projeto, que não teve dificuldades em ser aprovado, tendo em vista os inúmeros benefícios que traria: muito mais celeridade, redução significativa nos custos e redução dos riscos de se perder algum documento anexado ao processo para quase zero (OLIVEIRA, 2013). Para que os tribunais pudessem implementar seus sistemas e atender à nova Lei de Processo Eletrônico, tramitou concomitantemente outra Lei, a de nº 11.280, de 16 de fevereiro de 2006, que alterou diversos dispositivos do CPC que estava em vigor na época, como descreve o preâmbulo: Altera os arts. 112, 114, 154, 219, 253, 305, 322, 338, 489 e 555 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil, relativos à incompetência relativa, meios eletrônicos, prescrição, distribuição por dependência, exceção de incompetência, revelia, carta precatória e rogatória, ação rescisória e vista dos autos; e revoga o art. 194 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil. A Lei 11.280/2006 cuidou da alteração do artigo 154, incluindo um parágrafo único no antigo Código de Processo Civil de 1973 para que abrisse margem de liberdade a fim de que cada tribunal decidisse a implementação da forma que melhor lhe conviesse, trazendo para o CPC a seguinte redação: Art. 154 - Código de Processo Civil – Os atos e termos processuais não dependem de forma determinada senão quando a lei expressamente a exigir, reputando-se válidos os que, realizados de outro modo, lhe preencham a finalidade essencial. Parágrafo único – os tribunais, no âmbito da respectiva jurisdição, poderão disciplinar a prática e a comunicação oficial dos atos processuais por meio eletrônico, atendidos os requisitos de autenticidade, integridade, validade jurídica e interoperabilidade da Infra Estrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP Brasil. § 2º - Todos os atos e termos do processo podem ser produzidos, transmitidos e armazenados e assinados por meio eletrônico, na forma da lei. Os primeiros tribunais a implementarem o sistema de processo eletrônico foram o Supremo Tribunal Federal, o Superior Tribunal de Justiça e o Tribunal Regional Federal da 3ª e 4ª Região, logo após entrarem em vigor as leis supracitadas (OLIVEIRA, 2013). Análise dos pontos mais relevantes da Lei 11.419/2006 A Lei 11.419/2006 é curta, muito simples de entender e não demanda muito tempo para ser lida. Não trataremos dela por completo, pois muitos artigos não serão relevantes no nosso estudo, portanto, vamos focar apenas os de maior interesse para análise, os que realmente trouxeram algo de novidade para o Direito brasileiro. Concomitantemente às leis que trazemos aqui, buscaremos os entendimentos jurisprudenciais para melhor compreensão do que estamos tratando e as consequências jurídicas práticas que a inobservância destes pode acarretar para o operador do Direito. No seu primeiro artigo, a Lei já traz sua abrangência em relação à tramitação, comunicação e transmissão dos dados e movimentações processuais, e, no seu parágrafo 1º, explicita que todas as searas deverão utilizar-se dos meios eletrônicos, em todos os graus de jurisdição; ou seja, todas as possibilidades de buscar assistência judiciária deverão ocorrer por meio eletrônico. O parágrafo 2º trata da definição dos termos, e aqui temos algumas divergências quanto aos benefícios e as dificuldades que a Lei trouxe. Vejamos: III - assinatura eletrônica as seguintes formas de identificação inequívoca do signatário: a) assinatura digital baseada em certificado digital emitido por Autoridade Certificadora credenciada, na forma de lei específica; b) mediante cadastro de usuário no Poder Judiciário, conforme disciplinado pelos órgãos respectivos. Figura 2. Captura de tela do Manual do Usuário Interno, retirada do site do PJe. Fonte: PJe. Acesso em: 23/06/2020. Logo, todo advogado e qualquer outra pessoa que queira ter acesso ao Judiciário, além dos servidores públicos abarcados por essa mesma exigência, precisam ter uma assinatura digital, o que acaba gerando mais um gasto. Além disso, essa assinatura é intransferível. Dessa maneira, caso um advogado esteja como patrono de uma das partes, mesmo com procuração o autorizando em anexo, terá de incluir qualquer documento tendo sua assinatura digital no momento do envio. Caso outro o faça, mesmo que tenha sua assinatura no documento escrito, será considerada nulidade relativa, e o magistrado abrirá prazo para que se sane esse problema. Já se tornou jurisprudência a nulidade da falta da assinatura digital: caso não seja sanada pelo advogado no prazo, qualquer que seja a peça processual, esta será considerada inexistente, conforme julgados aqui colacionados: bullet AgInt no AREsp 790442/SC - Agravo Interno No Agravo Em Recurso Especial 2015/0247120-0 Relator(a) Ministro Antonio Carlos Ferreira; bullet AgRg no AREsp 725.263/RO, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 10/05/2016, DJe 27/05/2016; bullet AgInt no REsp 1802216 / SP - Agravo Interno No Recurso Especial - 2019/0065417-9; bullet AgInt no AREsp 1148514 / AM - Agravo Interno No AgravoO Em Recurso Especial - 2017/0194706-0; bullet AgInt no REsp 1711048 / SP - Agravo Interno No Recurso Especial - 2017/0301226-3. Então, muito cuidado ao assinar um documento via certificado digital para outra pessoa, ou vice-versa: o documento será considerado inexistente caso não se sane esse vício. O artigo 2º traz o requisito da assinatura eletrônica nos atos processuais e o cadastro obrigatório nos tribunais no qual o operador atuará. Já o artigo 3º trata dos prazos considerados no sistema eletrônico de petição – todos os atos são considerados no dia do envio sem limite de horário, mas atenção aos fusos horários de que os tribunais fazem parte, para que não se envie um documento fora do prazo. O artigo 4º trata da criação do Diário da Justiça Eletrônico de cada tribunal e dos atos de publicidade e intimação que serão feitos através deles. A contagem do prazo de publicação será sempre no dia útil subsequente ao da publicação no Diário Eletrônico. O artigo 5º trata das intimações e seus meios. Toda intimação será feita por meio do endereço eletrônico cadastrado para consulta do processo. Será considerada feita a citação no dia útil subsequente ao dia em que for consultado o processo por parte do advogado. Caso não haja nenhum tipo de consulta dentro de 10 dias corridos a partir do envio da intimação, considerar- se-á feita no final desse prazo. Mais uma advertência: os sistemas eletrônicos da Justiça nem sempre enviam e-mail de citação; em alguns estados, apenas publicam no Diário Oficial; então, é preciso ter atenção às publicações e aos prazos, consultando regularmente os processos, já que a própria Lei dispensa a publicação em órgão oficial. Figura 3. Modelo de carta de citação eletrônica. Fonte: RODRIGUES, 2016. O artigo 6º trata das citações que poderão ser feitas por meio eletrônico. O artigo 8º define que cada tribunal poderá desenvolver seu próprio sistema eletrônico, mas também obriga todos os atos a serem assinados digitalmente, como forma de maior segurança e transparência. O artigo 9º novamente trata das citações, intimações e notificações que devem ser feitas por meio eletrônico, apenas definindo melhor o já exposto no artigo 5º. O artigo 10 foi fundamental para a economia de tempo e celeridade dos processos, pois explicita que não é necessária intervenção humana para algumas movimentações eletrônicas. O artigo também diz, em seu parágrafo primeiro, que os envios serão tempestivos até a meia-noite do último dia do prazo. No artigo 11, temos a presunção de veracidade dos documentos juntados eletronicamente, masé necessária atenção, pois todos os originais dos remetidos ao tribunal deverão ser armazenados até o trânsito em julgado da sentença, ou até o prazo final para interposição de ação rescisória, caso seja admitida. No artigo 12, vemos a preocupação com os documentos físicos nos processos digitais, pois, além de tratar da segurança dos sistemas de armazenamento digital, o artigo faz referência aos processos físicos já existentes no parágrafo 5º, dando a possibilidade das partes em buscar os documentos originais que estão em juízo para poder armazená-los caso queiram, demonstrando a clara intenção de não haver mais armazenagem de processos físicos nos tribunais. Outro ponto que chama atenção é o caso do parágrafo 2º, que deixa claro que cada tribunal pode decidir por seu sistema eletrônico, mostrando que podem não ser compatíveis entre si. Caso isso ocorra, o tribunal terá de transformar o processo eletrônico, que será remetido a outro tribunal com sistema diferente e não compatível em processo físico, porém isso vai totalmente contra o intuito da Lei, de diminuir o consumo de papel e espaço físico. O artigo 14 traz um grande debate, pois, para serem auditados alguns procedimentos que devem ser imparciais, como o sorteio de distribuição do processo, o código de programação deveria ser aberto – assim, qualquer um teria acesso, como prevê a Lei. Isso, porém, não ocorre, pois a grande maioria dos sistemas dos tribunais têm programação de código fechado e apenas a empresa que vendeu a plataforma tem acesso ao código, o que dificulta uma auditoria externa. No artigo 18, encontramos a referência com a alteração do artigo 154 do Código de Processo Civil à época, dando liberdade para os tribunais adotarem os sistemas que melhor os atendiam, como já ilustramos no tópico referente ao surgimento da Lei de Processo Eletrônico. Para finalizar, o artigo 22 traz a vacatio legis da referida Lei, que dispunha de um prazo de 90 dias para a entrada em vigor. EXPLICANDO A expressão vacatio legis vem do latim, e sua tradução direta é “vacância da lei”. Nada mais é do que o prazo que a lei percorre entre sua publicação e a entrada em vigor. O prazo pode vir expresso na própria lei; caso contrário, adota-se o disposto no art. 1º da LINDB, que é de 45 dias depois da sua publicação. Existe também a possibilidade de não se cumprir uma vacatio legis, quando, no texto legal, está disposto: “esta Lei entra em vigor na data de sua publicação”. AÇÕES QUE DISCUTIRAM A CONSTITUCIONALIDADE DA LEI 11.419/2006 Logo que a Lei 11.419/2006 entrou em vigor, no ano de 2007, o Conselho Federal da OAB ingressou com uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI nº 3880) no STF, com pedido de liminar contra os dispositivos da referida Lei, com a alegação de que estavam sendo feridos os princípios da proporcionalidade, da publicidade, além dos preceitos constitucionais que tratam da OAB, também os artigos 5º, caput, XII, LX, 84, IV e 133 da CF (STF, 2007). EXPLICANDO A ADI é um "remédio constitucional". É uma ação que visa à declaração da inconstitucionalidade de uma lei, ou parte dela. É um instrumento de controle concentrado de constitucionalidade, cabível no caso de norma em tese, ao contrário do mandado de segurança, que somente será admitido no caso de lesão ou ameaça concreta a direito líquido e certo do impetrante. Foi questionada, entre outros pontos, a extinção do diário impresso em papel devido à criação do Diário da Justiça Eletrônico, além da utilização de meios digitais para intimação dos atos processuais. Esses elementos geraram preocupação para a entidade devido ao número de pessoas que efetivamente têm acesso a computadores no Brasil, uma vez que o Comitê Gestor da Internet apurou que 66,68% dos brasileiros sequer utilizaram alguma vez a rede mundial de computadores (STF, 2007). Desse modo, essas alterações e a extinção das publicações em meio físico trariam prejuízo à maior parte da população, que não teria acesso às publicações no meio digital, infringindo o princípio da publicidade. Outro questionamento relevante foi a exigência do prévio cadastramento dos advogados nos tribunais nos quais exerceriam a profissão para o processo eletrônico. Foi destacado que é exclusiva da OAB a função de credenciar os advogados para exercer a profissão, não havendo necessidade de qualquer outro tipo de credenciamento (STF, 2007). Por fim, a OAB sustentava que a regulamentação que a Lei autoriza ao Judiciário tratar é de competência exclusiva do Presidente da República, ferindo a competência (STF, 2007). O STF julgou o caso em 2020, em uma sessão virtual no dia 14 de fevereiro, decidindo por unanimidade a improcedência da ação, como vemos a seguir: Decisão: O Tribunal, por unanimidade, conheceu da ação direta e julgou improcedentes os pedidos formulados, declarando a constitucionalidade dos artigos impugnados da Lei 11.419/2006, nos termos do voto do Relator. O Ministro Marco Aurélio acompanhou o Relator com ressalvas. Não participou deste julgamento, por motivo de licença médica, o Ministro Celso de Mello. Plenário, Sessão Virtual de 14.2.2020 a 20.2.2020. Outros questionamentos surgiram durante algumas mudanças na Lei, como foi o caso dos advogados de São Paulo, que impetraram um mandado de segurança (MS nº 32888) contra a Resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) nº 185/2013, que instituía o Sistema PJe (Processo Judicial Eletrônico) como sistema de processamento de informações e prática de atos processuais, além de estabelecer parâmetros para sua implementação. Foi feito pedido de liminar para suspensão de eficácia dessa resolução. Nos autos, fixa-se um prazo para que os tribunais apresentem os cronogramas de implantação com lapso temporal de 120 dias. A OAB-SP alegou que essa resolução acaba por limitar o acesso à Justiça, por não abrir outra opção ao jurisdicionado em acessar ao sistema “uma vez que vedada a utilização de qualquer outro sistema de peticionamento eletrônico” (BOLETIM JURÍDICO, 2014). O que fundamentou a OAB-SP ao impetrar o MS foi que o PJe imposto pelo CNJ ocorreu um ano após o Tribunal de Justiça de São Paulo ter implementado seu sistema próprio, o que fez com que todos os advogados de São Paulo e os escritórios investissem em tecnologia para se adequarem a esse sistema e obter treinamento para o uso do mesmo, além do valor de R$ 300 milhões gastos pelo poder público na implementação do sistema. A entidade, por meio de nota, publicou que “não é razoável que o CNJ modifique a orientação em tão curto espaço de tempo” (STF, 2014), e prossegue: É ilegal ato coator que obriga os advogados de São Paulo a não mais se utilizarem do sistema adotado do Tribunal de Justiça, impedindo-os de promover estudos, planejamento, desenvolvimento e teste, inviabilizando o pleno funcionamento do sistema eleito originariamente, em detrimento desse essencial serviço à cidadania que é a prestação jurisdicional. A ministra Rosa Weber acabou por indeferir o pleito, aplicando a Súmula 266 do próprio Supremo Tribunal Federal, que traz em seu texto: “não cabe mandado de segurança contra lei em tese” – e negou trâmite ao MS nº 32888. A ministra afirmou que os autores não apontaram, na demanda, ato concreto que ameaçasse direito líquido e certo, requisito para mandados de segurança, e somente demonstraram, na ação, “pretensão voltada ao reconhecimento da inconstitucionalidade de resolução do CNJ” (STF, 2014). Também houve outro requerimento ao CNJ para que fossem feitas 63 modificações no PJe. Dessa vez, o presidente da OAB – na época, Marcus Vinicius Furtado Coêlho – disse que a implementação do sistema na Justiça do Trabalho apresentava muitas falhas e ocasionava sérios problemas para os operadores do Direito. Disse ainda que a entidade era a favor de um sistema único de peticionamento,já que, também na época, havia 46 sistemas distintos – e era complicado a um advogado habituar-se à maioria deles, tendo em vista as peculiaridades de cada plataforma. Uma das solicitações de Marcus Vinicius, a de número 8 da lista, foi a de obrigar os tribunais a instalarem equipamentos de acesso ao sistema para a população em geral, a fim de que pudessem consultar seus processos, além da presença de servidores para que auxiliassem as pessoas quando necessário onde havia tramitação de processos eletrônicos. O PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO NA JUSTIÇA DO TRABALHO (PJE-JT) De todas as áreas do Judiciário no Brasil, a mais demandada normalmente era a Trabalhista, pelo menos antes da entrada em vigor da nova Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017 (conhecida como “reforma trabalhista”), que diminuiu drasticamente o número de novos processos, com redução de 34% do montante total entre os anos 2017 e 2018: 2.630.522 contra 1.726.009, respectivamente, quase um milhão a menos (REDAÇÃO RBA, 2019). Para demonstrar melhor o valor percentual dos dados, o IBGE, em 2009, realizou uma pesquisa denominada Características de vitimização e acesso à Justiça no Brasil, com 12,6 milhões de entrevistados que relataram ter ingressado com algum tipo de ação judicial; 23,3% afirmaram que buscaram a Justiça do Trabalho para buscar uma solução de sua lide; a seara do Direito de Família representou 22% dos entrevistados; e 12,6%, a área criminal (OLIVEIRA, 2013). O Supremo Tribunal Federal, em 6 de outubro de 1994, determinou, por meio de liminar, que é dispensável a atuação do advogado, não sendo requisito fundamental nas ações que envolvem Justiça do Trabalho, Juizados Especiais e Justiça de Paz (ADI nº 1.127-8) (SOUZA FILHO; SODRÉ; SILVA, 2015). De acordo com o Tribunal Superior do Trabalho, no dia 29 de março de 2010, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Tribunal Superior do Trabalho (TST) e o Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) celebraram um acordo, firmado pelo Termo de Acordo de Cooperação Técnica sob o número 51/2010, determinando a adesão ao processo judicial eletrônico pela Justiça do Trabalho. Nesse mesmo dia, foi assinado o Acordo de Cooperação Técnica nº 01/2010, que firmava a integração do projeto nos tribunais. Figura 4. Captura de tela do PJe TRT. Fonte: Redação Trabalhista Legal. Acesso em: 23/06/2020. Cuiabá (MT) foi a cidade onde o projeto-piloto foi instalado pela primeira vez, em 10 de fevereiro de 2011. Em um primeiro momento, foram priorizadas as ações de execução, e, após treinamento dos colaboradores e desenvolvimento, foi implementado o sistema. Após o aprimoramento, também foram implementadas, para uso do sistema, as cidades de Navegantes (SC), Caucaia (CE) e Várzea Grade (MT). Dessa maneira, houve a expansão e a implementação em 1ª e 2ª instâncias, de maneira concomitante (CSJT, 2013). Somente em 23 de março de 2012, o Conselho Superior da Justiça do Trabalho estabeleceu o PJe-JT (Processo Judicial Eletrônico na Justiça do Trabalho), por meio da Resolução nº 94, trazendo em seu primeiro artigo: Art. 1º. A tramitação do processo judicial no âmbito da Justiça do Trabalho, a prática de atos processuais e sua representação por meio eletrônico, nos termos da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006, serão realizadas exclusivamente por intermédio do Sistema Processo Judicial Eletrônico da Justiça do Trabalho - PJe-JT regulamentado por esta Resolução. Como se observa, todos os processos deverão ser apresentados por meio eletrônico, o que pode trazer dificuldades para os que necessitam do auxílio judicial para suas demandas, mas não tenham acesso à internet; ou que tenham, mas não cumpram com os requisitos para o cadastro da petição inicial, como veremos mais à frente. DIFICULDADES DO JUS POSTULANDI NO PROCESSO ELETRÔNICO Jus postulandi é o meio em que uma pessoa que pretende ingressar com uma ação no Poder Judiciário o faz sem o auxílio de um advogado, peticionando e fundamentando seu pedido por conta própria. Esse instituto é conhecido na esfera da Justiça do Trabalho, pois, nos Juizados Especiais, normalmente um servidor auxilia no desenvolvimento da petição inicial com um certo conhecimento técnico, e, nas audiências, normalmente se institui um advogado dativo, por meio do convênio com a Defensoria Pública que atua no tribunal. Em 2010, o jus postulandi acabou por ser limitado na Justiça do Trabalho, e, até então, não havia nenhum tipo de limite para atuação em causa própria. Conforme o artigo 791 da CLT, tanto o empregador quanto o empregado tinham seus direitos assegurados e podiam atuar no processo sem nenhum limite, do início ao fim. Art. 791. Os empregados e os empregadores poderão reclamar pessoalmente perante a Justiça do Trabalho e acompanhar suas reclamações até o final. Além do supracitado, o artigo 4º da Lei nº 5.584, de 26 de junho de 1970, faz referência ao jus postulandi: Art. 4º. Nos dissídios de alçada exclusiva das Juntas e naqueles em que os empregados ou empregadores reclamarem pessoalmente, o processo poderá ser impulsionado de ofício pelo Juiz. Até que, em 2010, o TST limitou a atuação do Jus Postulandi por meio de súmula: O jus postulandi das partes, estabelecido no art. 791 da CLT, limita-se às Varas do Trabalho e aos Tribunais Regionais do Trabalho, não alcançando a ação rescisória, a ação cautelar, o mandado de segurança e os recursos de competência do Tribunal Superior do Trabalho. Entretanto, a Constituição Federal, no seu artigo 133, trata explicitamente da obrigatoriedade do advogado como participante da Justiça: Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei. Logo, verifica-se, em um primeiro momento, que tal previsão constitucional impossibilitaria a CLT de cumprir o instituto do jus postulandi, uma vez que este seria considerado como não recepcionado pela Constituição. Entretanto, não é esse o entendimento dos tribunais, que não apenas aceitam o instituto, como já manifestaram esse entendimento em diversas sentenças, como vemos nas jurisprudências do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região – STJ, REsp 1027797/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, DJ. 23/02/2011 (SOUZA FILHO; SODRÉ; SILVA, 2015). Mesmo com a figura do jus postulandi ainda existindo, percebe-se que o mesmo encontra em desuso, tendo em vista todas as dificuldades encontradas para exercer um direito, seja pelos sistemas de informatização, seja pelo requisitos para ingressar no sistema e poder peticionar de forma remota, além do pouco conhecimento sobre o assunto (SOUZA FILHO; SODRÉ; SILVA, 2015). Fraudes no sistema de distribuição dos processos O sistema de distribuição de processos nos tribunais já era feito por meio de sorteio eletrônico bem antes de entrar em vigor a Lei do Processo Eletrônico, e, nessa época, já se levantavam diversas questões de confiabilidade, o que, às vezes, trazia certa dúvida, por haver meios de burlar os sistemas que existiam. No TJRJ, houve algumas suspeitas, quando em 2004, foi aberto um processo de investigação interno para apurar uma denúncia por meio de um mandado de segurança impetrado pelo grupo Telecom Itália ao presidente do TJRJ na época, alegando estranheza de que um de seus processos havia sido distribuído ao desembargador Marcus Tullius Alves, da 9ª Câmara Cível, já que não estava obedecendo ao critério do sorteio automático e, muito menos, levando em conta que o mesmo não tirava férias ou licença nos últimos dois anos que se passavam (CONJUR, 2004). Além do exposto, ainda se contestou, no mandado de segurança, supostas irregularidades na distribuição de outros recursos. O Grupo Opportunity levantou suspeita sobre o escritório patrono ter recorrido e o recurso ter sidodistribuído manualmente para o desembargador Edson Scisinio, da 14ª Câmara (CONJUR, 2004). Após a abertura de investigações internas, foram afastados das funções cinco funcionários do setor que estavam responsáveis pelo sistema de distribuição, e 13 processos que tinham suspeita de terem sido distribuídos de forma intencional para algum magistrado foram redistribuídos (CONJUR, 2004). Ainda em 2004, agora no TRTSP, o Ministério Público Federal ingressou com uma ação cautelar para que fosse aberta uma investigação por meio de uma auditoria no sistema de distribuição de processos do TRT 2ª Região, com a suspeita de havia irregularidades na distribuição dos processos de 1ª instância, ações rescisórias e mandados de segurança (MICHAEL, 2005). Pelo menos 22 processos tinham fortes indícios de terem sido beneficiados pela manipulação de distribuição manual, demonstrando clara parcialidade do julgador e do interessado em que fosse julgado por aquele magistrado. Também houve suspeita de irregularidade na distribuição dos processos no Tribunal de Justiça do Pará, segundo matéria publicada no final de 2008, época em que já estava em vigor a Lei do Processo Eletrônico. Na ocasião, o CNJ enviou especialistas para analisar suposto esquema que envolvia escritórios de advocacia na distribuição de processos na segunda instância. A desembargadora Maria Helena Ferreira foi quem denunciou as supostas irregularidades. A denúncia sustentava que um grupo de escritórios sempre acabava com seus recursos distribuídos para os mesmos desembargadores e, coincidentemente, sempre havia decisões favoráveis. Maria Helena Ferreira, em entrevista concedida a um jornal, disse: “Isto não é novo, mas precisa ter um basta, porque há desembargadores que acabam perdendo seu tempo nesses julgamentos”. Declarou, ainda, que estava sendo ameaçada de processo (CONJUR, 2008). Mais recentemente, em 2018, pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB) publicaram um relatório que identificou fragilidades no sistema de distribuição de processos do Supremo Tribunal Federal. Esse documento foi publicado no Diário da Justiça Eletrônico 193/2018. No mesmo documento, faz-se ressalva de que não foi esgotado o sistema a ponto de atestar que não é confiável – mas evidenciou-se que existe uma fragilidade que o torna suscetível à manipulação no resultado de sorteio para distribuição de processos. O documento afirma que o sistema contém alguns mecanismos de compensação que tornam igualitárias as distribuições, mas que acabam envolvendo algumas variáveis que tornam ainda mais complexa a questão. Há também a ressalva de que o sistema utilizado, o PJe, utiliza código de programação fechado, impossibilitando atestar com precisão. Além disso, o parecer informa que o modelo de distribuição individual dos processos fragiliza o sistema, na medida em que o torna mais suscetível à manipulação no resultado do sorteio (OLIVEIRA, 2019). Entendimento e jurisprudência sobre o estelionato judicial Este é mais um tema em que a doutrina se divide e até mesmo os tribunais ainda não entraram em consenso, apesar de a grande maioria dos julgados penderem para o reconhecimento da atipicidade da conduta. Os casos, porém, merecem especial atenção, pois cada um tem suas peculiaridades. Reuni algumas decisões para melhor visualizarmos essas diferenças. Temos o caso do advogado que foi condenado pelo famoso “estelionato judicial”, enquadrado no artigo 171, parágrafo 3º, do Código Penal, pois induziu a erro a Justiça quando ajuizou ações fraudulentas por meio do processo eletrônico. Foi assim que decidiu a 4ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, ao negar provimento a embargos infringentes, que buscava o reconhecimento da atipicidade da conduta. O réu foi sentenciado com base na denúncia do Ministério Público Federal, que tinha os elementos probatórios dos delitos cometidos. Foram anexados aos processos 13 documentos adulterados de clientes que o réu representava, além de alegações de que a União devia valores a ex-militares. Todas essas ações estavam baseadas em procurações falsas, e todos os documentos foram carregados no sistema de processo eletrônico da Justiça Federal da 4ª Região, o E-proc (MARTINS, 2015). Ao final do processo, o réu foi sentenciado pelo crime previsto no artigo 171, parágrafo 3º, combinado com os artigos 14, inciso II, e 71, por 10 vezes; e no artigo 298, pela prática do crime previsto no artigo 304, combinado com o artigo 71, por três vezes, todos do Código Penal. Em suma: estelionato cometido em detrimento de entidade assistencial na forma tentada e de maneira continuada; e falsificação de documento particular com o emprego de papéis falsificados ou alterados (comprovantes ‘‘frios’’ de endereços), de maneira continuada. As penas: quatro anos, cinco meses e 20 dias de prisão no regime semiaberto e pagamento de multas, de acordo com o site que veiculou a notícia (MARTINS, 2015). Apesar de o julgamento conter duas teses que se colidem, prevaleceu a do crime. A tese vencida que declara atípica a conduta delituosa do estelionato judicial – no caso, o voto do desembargador Victor Luiz dos Santos Laus – fundamenta que, pela falta de consenso na doutrina e pelo fato de o Ministério Público ter enquadrado o advogado apenas na conduta de uso de documento falso, considerava-se atípica a conduta pelos seguintes motivos: ‘‘inidoneidade presuntiva’’ do julgador para ser enganado, impossibilidade de considerar sentença judicial como uma ‘‘vantagem ilícita’’ e existência de tipos penais específicos para a proteção da administração da Justiça (MARTINS, 2015). Na fundamentação do desembargador João Pedro Gebran Neto, porém, ficou caracterizado o crime de estelionato, que ele enxerga como um tipo penal aberto, como já se havia manifestado no Acórdão nº 5000858- 94.2011.404.7118, do dia 19 de dezembro de 2014: O artigo 171 do CP constitui tipo aberto, de forma que a obtenção da vantagem pode ser efetuada por qualquer meio fraudulento. Assim, a ação judicial movida fraudulentamente pode configurar o delito em questão, qualificado pela jurisprudência como estelionato judiciário. Essa discussão já havia sido pacificada pela 4ª Seção do TRF-4, da qual fazem parte os desembargadores da 7ª e 8ª turmas, especializada em matéria penal, refutando a tese da atipicidade do estelionato judicial como o do processo citado acima, de acordo com a posição do desembargador Marcelo Malucelli: “A conduta de quem usa de ardil para manter o Poder Judiciário em erro é grave e merece a atenção do Direito Penal, pois lesa a dignidade da função jurisdicional do Estado” (MARTINS, 2015). Não se deve confundir com a atipicidade que é amplamente reconhecida pelos tribunais superiores no caso de se fomentar as demandas com alegações falsas, que acabam sendo excluídas do crime de estelionato judicial. Nesse caso, porém, foi utilizado meio ardil para ludibriar o Judiciário, utilizando-se documentos e demandas inexistentes, o que torna a ação um potencial ofensivo para efetiva manutenção da Justiça. Claro que esse entendimento e posição dos tribunais superiores podem ser alterados com o tempo. Em outros casos que apenas contenham alegações falsas nas demandas, o Judiciário entende ser cabível a atipicidade da conduta e fundamenta que a ação cível e as consequências nessa esfera são suficientes para combater esse tipo de prática, levando em conta que o Direito Penal deve ser usado apenas em ultima ratio, como vemos nas seguintes decisões, nas quais foi reconhecida a atipicidade material da conduta pela fundamentação de que as condutas do agente não caracterizavam os pressupostos do estelionato judicial, que são: uso do processo para auferir lucros ou vantagem indevida, fraudando ou usando de ardil para ludibriar a Justiça e, importante, que tenha a ciênciadessas atitudes. Como as condutas do advogado configuraram apenas infrações civil e administrativa, estas devem ser combatidas por leis próprias (Ação Penal nº 023634-39.2011.8.26.0196; HC 435.818/SP, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 03/05/2018, DJe 11/05/2018). Em outra demanda de mesmo teor, a fundamentação da atipicidade foi de que o processo já engloba a possibilidade de as partes produzirem provas no exercício do contraditório e ampla defesa. Assim, já existem recursos e instrumentos para combater esse tipo de infração, não podendo ser alegado que o magistrado foi induzido a erro. Esse tipo de conduta deve ser combatido pelos meios expostos em lei específica, como condenação do litigante de má- fé ao pagamento de multa, além da possível punição disciplinar no âmbito do Estatuto da Advocacia (RHC 88.623/PB, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 13/03/2018, DJe 26/03/2018). Benefícios do processo eletrônico no combate às fraudes processuais Mesmo com alguns pontos que geram debates, um aspecto considerado unânime é que o processo eletrônico trouxe consigo uma arma muito eficiente no combate às fraudes cometidas nos processos, originando celeridade e conseguindo algo que, há pouco tempo, não poderia se imaginar: análise rápida e precisa dos processos nas varas onde tramitam, em todas outras varas dos estados e até mesmo em todos processos que tramitam em todo o Brasil. Um dos exemplos é o do advogado que foi preso durante a audiência em que era patrono, no estado do Rio de Janeiro, no dia 25 de maio de 2016, acusado de cometer os crimes de estelionato, documento falso, falsidade ideológica e formação de quadrilha. O modus operandi era o mesmo, e a juíza suspeitou de o advogado já ter outra audiência com o mesmo pedido, mesmas provas e mesmos fatos. Foi, então, que pesquisou no sistema eletrônico de dados do tribunal e percebeu que, em várias outras ações, ele ora atuava como advogado, ora como autor da demanda, e todas as provas eram as mesmas, inclusive com mesmas fotos, como vemos na descrição de um dos sites que veicularam a notícia: A violação de uma mala e o roubo de um relógio Rolex no valor de R$12.500,00 – a juíza descobriu que em todos os processos as provas eram iguais: declaração de venda com o mesmo número de série do Rolex e fotografias iguais da suposta mala danificada (TJRJ, 2016). A juíza Flávia Machado, da 5ª Turma Recursal, deu uma entrevista coletiva, no próprio Tribunal (TJRJ), contando detalhes: O que chamou atenção é que a autora da ação dizia que sua bagagem teria sido violada e os pertences desaparecido, totalizando prejuízo de R$ 17 mil. Inicialmente, ela ganhou a ação em primeira instância, mas quando o processo chegou à Turma Recursal, verificamos que a mesma autora tinha outro processo igual. Fizemos uma busca mais específica e constatamos que a declaração de venda do objeto que teria sido roubado era igual em todos os processos. Tudo indicava que se tratava de uma fraude, principalmente a repetição dos fatos. Temos conhecimento de pelo menos três processos fraudulentos ajuizados por este advogado (TJRJ, 2016). Em 2016, também no TJRJ, houve a descoberta de fraudes processuais que foram coordenadas: 14 ações parecidas foram ingressadas no sistema, do mesmo autor; apenas alguns dados eram diferentes, como sobrenomes alterados e números de CPF. Descobriu-se que o autor “inventava” os casos de dano para que lucrasse com as indenizações, o que somente foi descoberto pela facilidade de cruzamento de dados por parte dos sistemas automatizados (AMAERJ, 2017). Com isso, o Comitê Antifraude do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro estava comunicando os magistrados de possíveis fraudes nas ações que lhes eram distribuídas. Por meio do uso de técnicas de inteligência artificial, criaram uma tecnologia que detecta padrões comportamentais, indicando possíveis anormalidades. Todo esse desenvolvimento teve auxílio dos departamentos de Informática e Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC-Rio (AMAERJ, 2017). Um item que é obrigatório para qualquer movimentação nos sistemas eletrônicos processuais, por parte de advogados, magistrados e servidores de tribunais, é o certificado digital, que foi escolhido por ser altamente seguro e evitar fraudes. Evidentemente, nenhum sistema é totalmente seguro, mas, após anos de uso e de teste, o certificado mostrou-se com alto nível de segurança. Por esse motivo, o CNJ o elegeu como requisito obrigatório (CONJUR, 2014). CURIOSIDADE O sistema de certificação digital utilizado nos sistemas de processo eletrônico pode ser instalado na própria carteira de identificação do advogado, emitida pela OAB, trazendo maior praticidade, já que a mesma tem fé pública e pode ser utilizada também como documento de identificação civil, necessitando apenas de um leitor conectado ao computador. O sistema pode ter validade de três anos e é o mesmo aceito em várias operações feitas pela internet, como, por exemplo, o sistema da Receita Federal, que exige uma certificação digital, além de todos os tribunais. Esse certificado digital, que pode ser fornecido por meio de dispositivo criptografado de token, pen drive e com o chip da carteira da OAB de identificação do advogado, é baseado em Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil), que envolve entidades públicas e privadas responsáveis por emitir esse certificado (CONJUR, 2014). A facilidade da certificação digital está no fato de que todos os tribunais aceitam a mesma, não sendo necessária a aquisição de outra chave para tribunais diferentes, além da já citada validade de três anos. O certificado deve ser emitido em nome do próprio advogado e não é aceito em nome de sociedade de advogados. Qualquer das partes do processo também pode adquirir o certificado digital para ter acesso às movimentações do processo, bastando fazer cadastro na plataforma do tribunal (CONJUR, 2014). Figura 5. Captura de tela de modelo de código de protocolo de assinaturas. Fonte: Blog Certisign Explica, 2016. Figura 6. Assinatura digital do processo eletrônico. Fonte: MONTEIRO, 2015. SINTETIZANDO Vimos o conceito de Direito Digital, que é a unificação das ciências jurídicas e da computação, buscando uma maior eficiência e agilidade nas trocas de informações, utilizando-se todos os benefícios tecnológicos de que se tem alcance para otimizar o mundo jurídico. Também temos o lado de toda essa evolução tecnológica e a vivência quase que diária de nossa imersão no mundo digital. Precisamos, portanto, de leis e regulações que tragam maior segurança jurídica, necessárias para que o mundo digital não se torne um “mundo sem leis”. É possível utilizar legislações já existentes ou, em alguns casos, criar novas leis que tragam essa segurança. Outro aspecto importante é o tráfego de informações que necessitam de algum tipo de validação jurídica, sendo utilizadas, para isso, chaves de autenticação chamadas de certificados digitais. Todo esse avanço trouxe muitos benefícios e celeridade para os operadores do Direito e grande economia para o Estado, que já não necessita mais de um armazenamento físico e nem mesmo de muitos servidores para atender às necessidades logísticas dos processos em papel. Sendo os sistemas informáticos usados primeiramente para os sorteios de distribuição de processos nas varas, acabaram por ser os precursores na implementação do processo eletrônico, que veio com a necessidade de mais velocidade e eficiência por parte dos tribunais – e hoje vemos que está cumprindo sua função. Como todos os avanços tecnológicos, estes acabaram acompanhados por novos tipos de crimes, como o ocorrido com a atriz Carolina Dieckmann, que culminou na criação de tipos penais descritos nosartigos 154-A e B, 266 e 298 do Código Penal. Vimos que o projeto que originou a Lei de Processo Eletrônico surgiu de uma iniciativa da AJUFE, com o principal objetivo de tornar o Judiciário mais célere e eficiente, assim como resolver o problema de armazenagem e as dificuldades logísticas dos processos físicos. Além disso, houve alteração no Código de Processo Civil para atender às novas diretrizes de cada tribunal e para implementar seus sistemas informáticos. Fizemos uma análise dos pontos de maior importância da Lei 11.419/2006, tratando especialmente dos artigos: 1º, que gerou algumas discussões acerca da acessibilidade das pessoas que não tinham à disposição um meio de acesso à internet e da certificação digital para assinatura eletrônica, que é pessoal e intransferível; 3º, referente ao horário para realização dos atos processuais no ambiente virtual; 4º, que trata da criação do Diário da Justiça Eletrônico; 5º, 6º e 9º, sobre as intimações e citações; 8º, que deu liberdade para que os tribunais desenvolvessem seus sistemas eletrônicos; 10º, que retirou a intervenção humana por parte dos tribunais nas movimentações eletrônicas; 11º, que trouxe a presunção de veracidade dos documentos enviados; 14º, um dos mais controversos, pois indica a utilização de sistemas de código aberto, o que acabou não ocorrendo na prática; e o 22º, que tratou da vacatio legis, importante instituto de vigência das leis. Trouxemos algumas discussões que ocorreram na época da entrada em vigor da Lei, com ADI e MS para discutir sua constitucionalidade, tendo em vista que alguns institutos, como o do jus postulandi, acabaram tornando-se mais difíceis de serem exercidos pelos cidadãos. Outros aspectos relevantes foram as fraudes que ocorriam nos sistemas de distribuição dos processos, problema este que aparentemente foi sanado com a entrada do processo eletrônico, pois os sistemas acabam por ser muito mais complexos e difíceis de burlar, trazendo maior segurança jurídica. E, por fim, os benefícios que os sistemas eletrônicos implementados nos tribunais foram, além da distribuição de processos: esses sistemas acabaram por se tornar excelentes mecanismos de combate a fraudes processuais, pois trouxeram a possibilidade de pesquisar milhares de processos simultaneamente, evitando, assim, que existissem vários processos iguais tramitando. 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Responsabilidade civil dos provedores e Código de Defesa do Consumidor Gabriel Zanetti Alves OBJETIVOS DA UNIDADE bullet Analisar o histórico e a evolução do comércio eletrônico; bullet Definir o comércio eletrônico do ponto de vista legal; https://www.businessinsider.com/nsa-version-wikipedia-called-intellipedia-2016-9 https://www.businessinsider.com/nsa-version-wikipedia-called-intellipedia-2016-9 https://tj-rj.jusbrasil.com.br/noticias/343864370/advogado-e-preso-por-fraude-em-processos-durante-audiencia-no-forum-central https://tj-rj.jusbrasil.com.br/noticias/343864370/advogado-e-preso-por-fraude-em-processos-durante-audiencia-no-forum-central http://www.tjrr.jus.br/pje/pje.html https://trabalhistalegal.com.br/consultar-processo-trabalhista/https://trabalhistalegal.com.br/consultar-processo-trabalhista/ bullet Aprender legislações pertinentes à cada serviço e produto comercializado pela internet; bullet Explorar as responsabilidades aplicadas aos danos ou prejuízos decorrentes de falha ou erros na prestação de serviço dos provedores de internet; bullet Compreender a aplicação do Código de Defesa do Consumidor nos contratos em ambientes virtuais; bullet Identificar e analisar cláusulas e práticas abusivas contra o consumidor; bullet Estudar o decreto nº 7.962, de 15 de março de 2013 (Lei do e-commerce); bullet Explorar as definições dos provedores de internet. TÓPICO DE ESTUDO Comércio eletrônico – // Evolução do comércio eletrônico // Definição legal do comércio eletrônico Legislaçâo sobre comércio eletrônico – // Código de Defesa do Consumidor // Proteção do consumidor na internet // Lei e-commerce Tipos de provedores de internet – // Provedores de internet // Provedor backbone // Provedor de acesso // Provedor de correio eletrônico // Provedor de hospedagem // Provedor de conteúdo Comércio eletrônico // Surgimento do comércio eletrônico Com o crescimento do número de usuários na internet, surgiram novos modelos de negócios virtuais, como as redes de grandes varejistas de comércio eletrônico. Graças a esse novo fenômeno, veio a regulamentação desses contratos, sejam de comercialização de produtos ou de prestação de serviços. Na década de 1960, com a necessidade de otimizar as trocas de informações entre as grandes empresas e diminuir os custos e riscos oriundos do transporte de grande quantidade de documentos, nasceu o sistema EDI (Eletronic Data Interchange - Intercâmbio Eletrônico de Dados). Diagrama 1. Edi (Eletronic Data Interchange - Intercâmbio Eletrônico de Dados). Fonte: Adobe Stock. Acesso em: 05/07/2020. EXPLICANDO De acordo com Chan e Swatman, em um artigo publicado em 1998, o EDI trata-se de uma tecnologia para compartilhar informações e documentos comerciais entre empresas de forma telemática, padronizada e segura. Com a nova ferramenta, foi desenvolvido nos Estados Unidos, ao final da década de 1960, um grupo de trabalho para definir um padrão internacional de troca de informações pelo sistema. Nos anos seguintes, diante da necessidade de massiva troca de informações por meio digital, a indústria automobilística formou o Comitê Coordenador dos Dados de Transporte (TDCC). Já nos anos 1970, o Instituto Norte Americano de Normalização criou o Padrão de troca eletrônica de dados ANSI X12, fundamento da Working Party 4, concebido pelas Nações Unidas como padrão internacional de troca de informações pela internet e utilizado até hoje com a denominação de Electronic Data Interchange for Administration, Commerce and Transport (EDIFACT). Nos anos 1980, as trocas de informações por meio digital eram baseadas em formulários simples, em razão da conexão lenta, que não suportava demasiadas informações nas trocas, fazendo com que, como complemento, partes das trocas fossem manuais. Em consequência da evolução dos sistemas de conexão de internet, hoje é difícil haver conexão lenta, uma vez que as redes são de velocidade quase instantânea, possibilitando o intercâmbio de quantidades enormes de dados sem problema algum e com total segurança. Figura 1. Concepção abstrata do compartilhamento via internet. Fonte: Adobe Stock. Acesso em: 05/07/2020. EVOLUÇÃO DO COMÉRCIO ELETRÔNICO Segundo Martins, em artigo publicado em 2004, as redes de conexões de internet rápida proporcionaram um ambiente perfeito para diversas transações e o aperfeiçoamento nos contratos, tornando o comércio eletrônico, em alguns casos, mais usual do que o presencial. A evolução dos contratos eletrônicos abrangem as firmadas por trocas de mensagens por e-mail, pelas propostas oferecidas em páginas de web (homepage) ou nos ambientes virtuais chamados de “estabelecimento virtual”, mantidos por provedores e nos quais a aceitação do contrato por parte do contratante é feita pelo “click” no botão “concordo” (Click-wrap agreement ou pointand-click agreement). As lojas que operam no meio virtual, comercializando produtos ou prestação de serviços, são consideradas parte integrante do estabelecimento comercial, devido à sua similaridade da propriedade física e tendo idêntica natureza jurídica. Analisando a utilização dos provedores pelos usuários, já é possível enxergar a caracterização de uma prestação de serviços. Mesmo que de forma gratuita, isso ocorre apenas nesses casos, pois o entendimento jurisprudencial dos tribunais superiores é de que os provedores são remunerados indiretamente pelas propagandas veiculadas. No caso dos provedores pagos, não há o que se discutir, tendo em vista a inequívoca prestação de serviços. Com a utilização massiva da internet, diversos contratos são firmados a todo momento, mesmo de maneira imperceptível, pela falta de conhecimento do usuário. Praticamente todos os contratos pela internet são firmados pelo aceite, pressionando apenas uma tecla, que constitui numa aceitação declarada de vontade perante a lei, assim como os firmados pessoalmente, não havendo diferença entre eles, tanto em relação à segurança jurídica quanto às formalidades. O IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), através da Pesquisa Nacional de Amostragem Domiciliar Contínua (PNAD Contínua), mostrou que 1 em cada 4 brasileiros não têm acesso à internet, demonstrando que a grande maioria da população utiliza a rede e o número de contratos por esse meio é algo bem representativo, colocando o Brasil entre os 10 maiores países do mundo em número de usuários. DEFINIÇÃO LEGAL DO COMÉRCIO ELETRÔNICO Com base no exposto por Teixeira no livro Comércio eletrônico - conforme o Marco Civil da Internet e a regulamentação do e-commerce no Brasil, de 2017, o termo comércio eletrônico é definido como toda atividade que tem por objetivo a troca de bens físicos ou digitais por meios eletrônicos. O comércio eletrônico acontece na seara do direito público, quando o Estado firma um contrato, contratando um serviço ou adquirindo um bem de uma empresa ou de um cidadão, e do direito privado, quando é firmado um contrato entre particulares. O comércio eletrônico pode ser à distância ou de maneiras não presenciais, como a compra por ligação telefônica ou no ambiente da operadora de televisão a cabo, mas o uso da rede mundial de computadores é mais comum. Partindo do histórico e da sua evolução, o comércio eletrônico não é algo tão recente, já que a compensação de cheque ou as transações bancárias existem há muito tempo, assim como os contratos via fax e transações pagas com cartão bancário. Figura 2. Ilustração referente ao comércio eletrônico. Fonte: Adobe Stock. Acesso em: 05/07/2020. Ainda dentro da acepção de comércio eletrônico, há a divisão sobre a transação, que pode ser do tipo direta, quando se usam somente meios eletrônicos para concretização do negócio em todas as fases, como na compra de um curso on-line cuja contratação e uso se dão apenas no ambiente digital, ou do tipo indireta, quando alguma parte do processo da transação é presencial, como a compra de um produto físico a ser retirado ou entregue. Antes do advento da internet, o comércio de produtos e serviços tinha uma barreira geográfica, uma vez que as grandes marcas possuíam monopólio do comércio, causado pelos altos custos com propaganda e logística a fim de que o produto chegasse aos consumidores. Com o crescimento do comércio eletrônico, houve uma democratização do mercado, fazendo com que pequenas empresas figurassem no mercado vendendo seus produtos até para outros países graças à internet. A desconfiança com o comércio em ambiente virtual era algo presente na maioria das pessoas, mas,
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