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2018 Título: Coleção Super Material: Fisiologia Módulo 3 Editor: Guilherme Melo Projeto gráfico: Bruno Bru Revisão de texto: Thaís Nacif Diagramação: Editorando Birô Capa: Mateus Machado Conselho Editorial: Caio Vinicius Menezes Nunes, Itaciara Larroza Nunes, Paulo Costa Lima, Sandra de Quadros Uzêda e Silvio José Albergaria da Silva Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Tuxped Serviços Editoriais (São Paulo, SP) M515a Fisiologia - Módulo 03 / Organizador: Ilson Meireles Neto.– 1. ed.– Salvador, BA : Editora Sanar, 2021. 224 p. 17x24 cm. (Coleção Super Material)..; 17x24 cm. (Coleção Super Material). Inclui bibliografia. ISBN 978-65-89822-08-0 1. Fisiologia. 2. Medicina. 3. Sanarflix. 4. Super Material. I. Título. II. Assunto. III. Meireles Neto, Ilson. CDD 612 CDU 612.53 ÍNDICE PARA CATÁLOGO SISTEMÁTICO 1. Medicina. 2. Medicina. Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário Pedro Anizio Gomes - CRB-8 8846 Editora Sanar Ltda. Rua Alceu Amoroso Lima, 172 Caminho das Árvores Edf. Salvador Office e Pool, 3º andar. CEP: 41820-770 – Salvador/BA Telefone: 0800 337 6262 sanarsaude.com atendimento@sanar.com Coordenador ILSON MEIRELES NETO CRM BA - 35068 Coordenador Pedagógico SANAR Graduação em Medicina pela Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública Revisores AMANDA RISTOW REINERT Graduação em Medicina pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) ANA CLARA DE FREITAS BRITO ARÊAS Acadêmica do curso de Medicina da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública ANNA MARIA EUGENIA PRIETO SCUCATO Graduação em Medicina pela Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública BRUNA RODRIGUES DE SANTANA PISANESCHI MARQUES Acadêmica do curso de Medicina da Universidade Federal da Bahia (UFBA) DIANA CASTRO DE JESUS LIMA Acadêmica do curso de Medicina da Universidade Federal da Bahia (UFBA) GABRIEL LIMA SILVA Acadêmico do curso de Medicina da Universidade Federal da Bahia (UFBA) GEOVALDO BARRETO CORREIA JUNIOR Acadêmico do curso de Medicina da Universidade Federal da Bahia (UFBA) LAURA MARIA DA CRUZ BATISTA Acadêmica do curso de Medicina da Universidade Federal da Bahia (UFBA) Autores – Módulo 3 – fisiologia Ane Caroline Rodrigues Carvalho Bianca Lima Barreto Gabriel Campos Lobo Luís Cláudio Porto Góes Maria Fernanda Correia Moreno Pedro Henrique Andrade Araújo Salvatore Barletta SUMÁRIO 01 SISTEMA DIGESTÓRIO – SECREÇÕES E MOTILIDADE 1. Função secretora do trato gastrointestinal 2. Secreção salivar 3. Secreção gástrica 4. Secreção pancreática 5. Secreção biliar 6. Motilidade do trato gastrointestinal Referências Bibliograficas 02. FISIOLOGIA DO SISTEMA GASTROINTESTINAL 1. Introdução 2. Carboidratos 3. Proteínas 4. Lipídeos 5. Água e eletrólitos 6. Funções metabólicas do fígado 7. Metabolismo da bilirrubina 8. Processamento da amônia Referências Bibliográficas 03. FUNÇÃO RENAL 1. O rim 2. Filtração glomerular 3. Sistema tampão Referências Bibliograficas 04. FORMAÇÃO DA URINA E MICÇÃO 1. Introdução 2. Funções do sistema urinário 3. Formação da Urina 4. Micção Referências Bibliográficas 05. DISTÚRBIOS DO SÓDIO 1. Introdução 2. Hiponatremia 3. Quadro Clínico da Hiponatremia 4. Tratamento da Hiponatremia 5. Hipernatemia 6. Quadro Clínico da Hipernatremia 7. Tratamento da Hipernatremia Referências bibliográficas 06. FISIOLOGIA DO SISTEMA REPRODUTOR FEMININO 1. Introdução 2. Ciclo ovariano 3. Ciclo uterino 4. Interação hormonal Referências bibliográficas 07. FISIOLOGIA DO SISTEMA REPRODUTOR MASCULINO 1. Introdução 2. Embriologia 3. Histofisiologia 4. Ductos genitais 5. Glândulas acessórias 6. Pênis Referências bibliográficas PREFÁCIO No início do curso, no decorrer dos dois primeiros anos, os quais chamamos de ciclo básico, criamos toda a nossa base de conhecimento para o desenvolvimento do conhecimento médico. Um bom ciclo básico permite um bom ciclo clínico que, em última análise, permite uma boa graduação médica. E, dentre todos os temas que estudamos no ciclo básico, o estudo da fisiologia humana está entre os mais decisivos. É nas aulas de fisiologia que o estudante tem o primeiro contato com mecanismos sistêmicos do corpo humano, como, por exemplo, com toda a complexa fisiologia do batimento cardíaco ou as diversas sinalizações da fisiologia da alimentação no sistema gastrointestinal. É da fisiologia que desenvolvemos os conceitos do funcionamento normal para entendermos e compararmos com o patológico. Preocupados em trazer esse conteúdo tão especial e de maneira completa, mas sempre com linguagem acessível, nós da Sanar desenvolvemos a coleção de Super Materiais de Fisiologia, trazendo os conteúdos sobre a fisiologia humana de maneira sistematizada com diversos fluxogramas e mapas mentais e com a melhor qualidade de referências. Vamos juntos nessa jornada do aprendizado! 1. SISTEMA DIGESTÓRIO – SECREÇÕES E MOTILIDADE 1. FUNÇÃO SECRETORA DO TRATO GASTROINTESTINAL O trato gastrointestinal apresenta quatro processos básicos: motilidade, secreção, digestão, absorção intestinal e exceção. A secreção é a adição de líquidos, enzimas e muco ao lúmen do Trato Gastrointestinal (TGI). Essas secreções são produzidas pelas glândulas salivares (saliva), células da mucosa gástrica (secreção gástrica), células exócrinas do pâncreas (secreção pancreática) e pelo fígado (bile). Em todo o trato gastrointestinal as glândulas secretoras servem a duas funções primárias: primeira, produção de enzimas digestivas que são secretadas na maioria das áreas do trato alimentar; segundo, lugar, glândulas mucosas, desde a boca até o ânus, proveem muco para lubrificar e proteger todas as partes do trato alimentar. Em relação às enzimas digestivas, a maioria é formada apenas em resposta à presença de alimento no trato alimentar, e a quantidade secretada também é proporcional à quantidade de alimento a ser digerido. A presença mecânica do alimento é o que gera o estímulo à produção das secreções e ativa o sistema nervoso entérico através de três mecanismos: estimulação tátil, irritação química e distensão da parede do TGI. A estimulação dos nervos parassimpáticos aumenta a secreção do trato digestivo glandular, principalmente na porção superior do TGI, inervada pelos nervos glossofaríngeo e parassimpático vagal. Já a estimulação simpática causa aumento de leve a moderado na secreção de algumas glândulas locais e também leva à vasoconstricção dos vasos que suprem as glândulas, tendo assim um duplo efeito. Quando a estimulação parassimpática já estiver causando franca secreção pelas glândulas, a estimulação simpática sobreposta, em geral, Hora da revisão: Diferentes tipos de glândulas produzem os diferentes tipos de secreção do trato gastrointestinal. As células mucosas atuam em resposta à irritação local e produzem muco, que protege a superfície da escoriação e da digestão. Já no estômago e duodeno existe grande número de glândulas tubulares profundas (a glândula oxíntica é um exemplo). Por último, existem glândulas complexas associadas ao trato alimentar, que são as glândulas salivares, o pâncreas e o fígado, que produzem secreções para a digestão e emulsificação dos alimentos. reduz esta secreção pela redução do suprimento sanguíneo glandular. 2. SECREÇÃO SALIVAR A saliva é um líquido que contêm eletrólitos e solutos orgânicos, secretados pelas glândulas salivares. As principais glândulas salivares são as parótidas, submandibulares e sublinguais, cada uma tendo seu par. A secreção diária de saliva normalmente é de 800 a 1.500 mL, com valor médio de 1.000 mL. As funções da saliva incluem a digestão inicial do amido e dos lipídios pelas enzimas salivares, diluição e tamponamento do alimento ingerido, lubrificação do alimento para facilitar seu movimento pelo esôfago, ação antibacteriana por íons tiocianato e lisozima, além de participar da gustação, uma vez que a solubilização dosalimentos estimula as papilas gustativas. Figura 1. Glândulas salivares. Adaptado de: Alila Medical Media/Shutterstock.com. A saliva contêm dois tipos principais de secreção de proteína: a secreção serosa contendo ptialina (ou alfa- amilase salivar), enzima que hidrolisa até 75% dos carboidratos da boca ao estômago; e secreção mucosa, contendo mucina, para lubrificar e proteger as superfícies. As glândulas parótidas produzem quase toda a secreção do tipo serosa, enquanto as submandibulares e sublinguais produzem secreção serosa e mucosa. Existem ainda glândulas bucais que só secretam muco. Cada glândula salivar tem a aparência de um “cacho de uvas”, sendo que cada uva corresponde a um ácino. O ácino é a unidade secretora, revestido por células acinares e envolto por células mioepiteliais alongada, que, ao se contraírem, expulsam a secreção acinar para o sistema de ductos. A saliva contêm quantidade elevada de íons potássio e bicarbonato. Por outro lado, as concentrações de sódio e cloreto são menores que as do plasma. A secreção da saliva é uma operação de dois estágios, o primeiro envolve as células acinares e o segundo os ductos salivares. As células acinares produzem a secreção primária contendo ptialina e/ou mucina em solução de íons em concentrações não muito diferentes das típicas dos líquidos extracelulares. À medida que essa secreção primária flui pelos ductos, ocorrem processos de transporte ativo que modificam a saliva. O primeiro é a reabsorção ativa do sódio e secreção de potássio, com consequente redução da concentração de sódio e aumento de potássio na saliva. Ocorre também uma queda na concentração dos íons cloreto. O bicarbonato é secretado na saliva pelo epitélio dos ductos para o seu lúmen. O resultado é uma concentração de sódio e cloreto na saliva em repouso de cerca de 15 mEq/L, potássio de 30 mEq/L e bicarbonato de 50 a 70 mEq/L. Quando a secreção salivar é intensificada, as concentrações iônicas salivares se alteram porque aumenta a velocidade de formação da saliva primária e essa secreção flui rapidamente pelos ductos, reduzindo os processos de modificação da saliva. A secreção salivar é sempre hipotônica, e o pH varia de 6,0 a 7,0 (favorável à ação enzimática da ptialina). Existem diversos tipos de ductos nas glândulas que transportam as secreções dos ácinos até a cavidade oral: os ductos intercalados drenam o fluido acinar para ductos maiores, os ductos estriados, que drenam para os ductos intralobulares, estes originam os ductos extralobulares e, por fim, formam os ductos excretores principais, que se abrem na cavidade oral. As glândulas salivares são controladas principalmente por sinais nervosos parassimpáticos que se originam nos núcleos salivatórios superior e inferior, no tronco encefálico. Os núcleos salivatórios estão localizados próximo à junção do bulbo com a ponte e são excitados por estímulos gustativos e táteis da língua e outras áreas da boca e faringe. A salivação também pode ser inibida por sinais que chegam aos núcleos salivatórios provenientes dos centros superiores do sistema nervoso central. Por exemplo, quando a pessoa sente o cheiro de sua comida preferida, a salivação é maior quando comparada a quando sente o cheiro de uma comida de que não gosta. A área do apetite no cérebro que regula esses efeitos funciona em resposta a sinais das áreas do paladar e do olfato do córtex cerebral ou da amígdala. A salivação ocorre ainda em resposta a reflexos que se originam no estômago e parte superior do intestino delgado, particularmente quando alimentos irritativos são ingeridos ou quando a pessoa está nauseada. Figura 2. Regulação nervosa parassimpática da secreção salivar. Fonte: Autoria própria Se liga! A Síndrome de Sjögren primária é uma doença autoimune, crônica e progressiva, que afeta predominantemente o sexo feminino. Nesta doença são gerados anticorpos que reagem contra as glândulas salivares e lacrimais, originando um processo inflamatório, produzindo lesão nos ácinos e ductos secretores com redução das secreções. A síndrome também pode ser secundária a uma manifestação sistêmica de doenças autoimunes, como a artrite reumatoide. Os pacientes desenvolvem xerostomia e ceratoconjuntivite (olhos secos). O tratamento é feito com substâncias estimuladoras da secreção salivar, como metilcelulose, e em casos graves são usados corticoides e imunossupressores. Saiba mais! O esôfago também produz secreção, no entanto, esta é totalmente mucosa e tem como função a lubrificação do alimento para a deglutição. O muco produzido pela porção superior do esôfago evita a escoriação mucosa causada pela entrada do alimento, enquanto a secreção da sua porção distal protege a parede da digestão por sucos gástricos ácidos, que com frequência refluem do estômago. 3. SECREÇÃO GÁSTRICA O estômago tem funções secretórias, motoras e hormonais importantes no processo digestivo. Além do HCl, secreta enzimas que continuam a hidrólise dos nutrientes iniciada na cavidade oral. Do ponto de vista secretor, as diferentes regiões do estômago são: cárdia – contêm apenas glândulas secretoras de muco; região oxíntica no corpo do estômago – tem células parietais e principais; região antropilórica – com glândulas contendo células endócrinas (células G que secretam gastrina e células D, secretoras de somatostatina). Figura 3. Regiões do estômago. Fonte: sciencepics/Shutterstock.com Os diferentes tipos de células encontradas são: células mucosas superficiais, células indiferenciadas ou regenerativas (mais profundamente localizadas, originam as células que migram para a superfície), células parietais ou oxínticas (secretoras de HCl e fator intrínseco), células principais ou pépticas (secretoras de pepsinogênio) e células endócrinas (secretoras de gastrina e somatostatina). O estômago secreta cerca de 1 a 2 litros de fluido por dia, conhecido como suco gástrico. Compõem esse suco: Componente Célula que produz Função HCl Células parietais Confere ao suco gástrico pH próximo a 1 ou 2. O pH ácido regula a secreção e pepsinogênio e a sua conversão à pepsina no lúmen gástrico. O HCl tem importante função bactericida e na sua ausência ocorrem mais infecções no TGI. Pepsinogênio Células principais Lançado no lúmen na forma de proenzima, sendo hidrolisada a pepsina em pH < 5. A pepsina hidrolisa ligações no interior de cadeias polipeptídicas. Lipase gástrica Células específicas das glândulas gástricas Lançada no lúmen gástrico na forma ativa. Hidrolisa triacilgliceróis em meio ácido. Componente Célula que produz Função Muco Células superficiais Forma a barreira mucosa gástrica que protege mecânica e quimicamente a superfície interna do estômago contra o HCl e a pepsina. HCO 3- Células superficiais mucosas Tampona o HCl e protege a mucosa gástrica. Gastrina Células G Estimula a secreção de HCl pelas células parietais e tem efeito trófico sobre a mucosa gástrica, estimulando seu crescimento. Somatostatina Células D Regula a secreção do HCl, inibindo-a. Histamina Células enterocromafins Estimula as células parietais. Fator intrínseco Células parietais Necessário para a absorção da vitamina B12. É a única função essencial do estômago. Tabela 1. Componentes do suco gástrico. Figura 4. Camadas histológicas do estômagoa. Fonte: udaix/Shutterstock.com A composição do suco gástrico varia conforme o fluxo secretório. A baixos fluxos secretórios a secreção gástrica contêm NaCl e baixas concentrações de H+ e K+, sendo ligeiramente hipotônica em relação ao plasma. A altas taxas secretórias, a concentração de H+ se eleva e a de Na+ reduz. O Cl- e K+ elevam-se discretamente e o suco gástrico torna-se isotônico em relação ao plasma. Hora da revisão: Vômitos recorrentes podem levar a uma alcalose metabólica hipocalêmica e hipoclorêmica. As células parietais secretam H+ proveniente da reação de hidrataçãodo CO2 resultante do metabolismo celular, gerando HCO3- e H+. Essa reação é catalisada pela anidrase carbônica. O H+ é secretado para o lúmen gástrico em troca de K+ pela H+/K+-ATPase situada na membrana luminal. O K+ acumulado dentro da célula vaza através de canais específicos nas membranas luminal e basolateral. O HCO3- resultante é transportado no sentido absortivo para o plasma, em troca por Cl-, por um transportador aniônico da membrana basolateral. Assim, durante a secreção gástrica, o pH do sangue venoso do estômago eleva-se pela absorção de HCO3-, tornando-se maior que o pH do sangue arterial (fase alcalina pós-prandial). A força necessária para o influxo de Cl-, contra o gradiente, através da membrana basolateral, vem do transporte HCO3- no sentido oposto. Com o influxo de Cl-, sua concentração celular se eleva, possibilitando que seja transportado passivamente para o lúmen gástrico, via canais luminais. Figura 5. Secreção de HCl pela célula gástrica parietal. Fonte: Autoria própria Saiba mais! Alguns fármacos, como os omeprazólicos, ligam-se de forma irreversível à H+/K+-ATPase, inibindo a secreção do H+. Esses fármacos são usados no tratamento de Os principais secretagogos estimuladores da secreção de HCl com ação direta nas células parietais são: acetilcolina (neurotransmissor parassimpático vagal), gastrina (hormônio sintetizado pelas células G do antro gástrico), e histamina (parácrino sintetizado a partir da histidina pelas células enterocromafins). Esses três agonistas têm receptores específicos na membrana basolateral das células parietais. Para a acetilcolina são os receptores muscarínicos (M3) colinérgicos, que podem ser inibidos pela atropina; os receptores de gastrina (CCKB) podem ser inibidos pela proglumida e os receptores H2 da histamina podem ser inibidos pela cimetidina ou ranitidina. Os inibidores endógenos da secreção do HCl, que agem diretamente nas células parietais, são a somatostatina, as prostaglandinas e os fatores de crescimento epidérmico (EGF). Células D, presentes na mucosa do antro gástrico, percebem a presença e grande quantidade de H+ e secretam a somatostatina em resposta, que age inibindo a liberação da gastrina e, consequentemente, reduzindo a secreção do HCl. Dessa forma, ocorre a regulação do pH no estômago. Já a secreção do pepsinogênio é estimulada principalmente pela acetilcolina. O nervo vago estimula as células parietais a secretarem HCl, e então o HCl estimula a secreção do pepsinogênio por dois mecanismos: o ácido ativa reflexos locais intramurais colinérgicos e também há um efeito do ácido no duodeno, estimulando células úlceras pépticas, resultantes da hipersecreção de HCl. secretoras de secretina (hormônio que estimula as células principais a secretarem pepsinogênio). Figura 6. Secreção de Pepsinogênio. Fonte: Autoria própria O fator intrínseco é uma glicoproteína secretada pelas células parietais que atua na absorção da vitamina B12 (cianocobalamina). No lúmen gástrico a vitamina B12 se liga à proteína R (secretada pelas glândulas gástricas), que protege a vitamina da ação proteolítica da pepsina e do HCl. No duodeno a proteína R é digerida, liberando a B12, e então, esta forma um complexo com o fator intrínseco. A absorção da vitamina B12 ocorre no íleo e depende da sua ligação ao fator intrínseco. A secreção desse fator é a única função essencial, indispensável, do estômago. Se liga! A anemia perniciosa é uma anemia megaloblástica causada por destruição autoimune das células parietais do estômago que sintetizam o fator intrínseco. Como a absorção da vitamina B12 depende desse fator, o resultado é uma deficiência da vitamina, cursando com distúrbios neurológicos, além da anemia. Saiba mais! A úlcera péptica é uma área escoriada de mucosa gástrica ou intestinal e a causa comum é o desbalanço entre a intensidade da secreção de suco gástrico, o grau de proteção da barreira mucosa gastroduodenal e neutralização do ácido gástrico pelos sucos duodenais. A área mais acometida é em torno do piloro. Atualmente a principal causa de doença ulcerosa péptica é a infecção por Helicobacter pylori, que rompe a barreira da mucosa gastroduodenal e estimula a secreção de ácido gástrico. Outros fatores predisponentes à formação de úlceras são o tabagismo, álcool e AINEs. 4. SECREÇÃO PANCREÁTICA O pâncreas, localizado sob o estômago, é uma glândula tubuloacinar com secreções endócrina e exócrina. A endócrina é produzida nas ilhotas de Langerhans e seus principais hormônios são: insulina (secretada pelas células beta), glucagon (secretado pelas células alfa) e somatostatina (secretada pelas células delta). A porção exócrina pancreática produz enzimas digestivas, secretadas pelos ácinos pancreáticos e bicarbonato, secretado pelos ductos pancreáticos. Os ácinos pancreáticos, como os das glândulas salivares, têm fundo cego e agrupam-se em lóbulos separados por tecido conjuntivo. Os ductos intercalares drenam os ácinos. Estes ductos esvaziam-se nos ductos intralobulares, que confluem para os extralobulares, que desembocam nos interlobulares, que por fim originam o ducto excretor principal (ducto de Wirsung). Figura 7. Pâncreas endócrino e exócrino. Fonte: Alila Medical Media/Shutterstock.com O produto combinado de enzimas e bicarbonato flui pelo ducto pancreático principal que se esvazia no duodeno pela papila de Vater, envolta pelo esfíncter de Oddi. O suco pancreático é secretado de forma mais abundante em resposta à presença de quimo nas porções superiores do intestino delgado, e as características do suco pancreático são determinadas, até certo ponto, pelos tipos de alimento no quimo. As enzimas pancreáticas são capazes de digerir proteínas, carboidratos e gorduras. A digestão das proteínas ocorre pela ação da tripsina, quimiotripsina e carboxipolipeptidase. A tripsina e a quimiotripsina hidrolisam proteínas a peptídeos de tamanhos variados, sem levar à liberação aminoácidos individuais. A carboxipolipeptidase cliva alguns peptídeos até aminoácidos individuais, completando assim a digestão de algumas proteínas. A digestão de carboidratos ocorre através da amilase pancreática, que hidrolisa amidos, glicogênio e outros carboidratos, para formar principalmente dissacarídeos e alguns trissacarídeos. A digestão de gorduras ocorre pela ação da lipase pancreática, capaz de hidrolisar gorduras neutras a ácidos graxos e monoglicerídeos; da colesterol esterase, que hidrolisa ésteres de colesterol; e da fosfolipase, que cliva ácidos graxos dos fosfolipídeos. Quando sintetizadas nas células pancreáticas, as enzimas digestivas proteolíticas estão em formas inativas: tripsinogênio, quimiotripsinogênio e procarboxipolipeptidase, concentradas em grânulos de zimogênio, localizados na borda apical das células acinares. As enzimas digestivas são ativadas somente após serem secretadas no trato intestinal por meio de exocitose dos grânulos de zimogênios. O tripsinogênio é ativado pela enzima enterocinase, secretada pela mucosa intestinal, quando o quimo entra em contato com a mucosa. Além disso, o tripsinogênio pode ser ativado pela própria tripsina já formada. O quimiotripsinogênio é ativado pela tripsina, para formar quimiotripsina, e a procarboxipolipeptidase é ativada de maneira semelhante. Se liga! É importante que as enzimas pancreáticas sejam armazenadas na sua forma inativa, pois a tripsina e outras enzimas poderiam digerir o próprio pâncreas. Por isso, as mesmas células que secretam as enzimas pancreáticas secretam também um inibidor de tripsina, evitando sua ativação. Quando o pâncreas é lesado gravemente ou ocorre bloqueio do ducto, grande quantidade de secreção pancreática se acumula nas áreas comprometidas do pâncreas. Nesses casos, o efeito do inibidor de tripsina não é suficiente e as secreções pancreáticas ficam ativas, podendo digerir o próprio pâncreas, condição conhecida como pancreatite aguda.O bicarbonato presente na secreção contribui para a neutralização da acidez do quimo transportado do estômago para o duodeno. Ele é secretado juntamente com a água pelas células epiteliais dos ductos pancreáticos. Para a sua secreção, o dióxido de carbono se difunde para as células a partir do sangue e, pela ação da anidrase carbônica, se combina com a água para formar ácido carbônico (H2CO3). O ácido carbônico, por sua vez, se dissocia em íons bicarbonato e íons hidrogênio. Os íons bicarbonato são transportados de forma ativa, associados a íons sódio, na membrana luminal da célula para o lúmen do ducto. Os íons hidrogênio formados por dissociação do ácido carbônico na célula são trocados por íons sódio, na membrana sanguínea da célula, por processo de transporte ativo secundário. O movimento global de íons sódio e bicarbonato do sangue para o lúmen do ducto cria um gradiente de pressão osmótica que causa fluxo de água também para o ducto pancreático, formando assim uma solução de bicarbonato quase isosmótica. Como ocorre com as secreções salivar e gástrica, a taxa secretória altera a composição do suco pancreático. A baixos fluxos secretórios, a composição eletrolítica da secreção é mais próxima da do plasma. Quando o pâncreas é estimulado, ocorre um aumento do fluxo secretório, a concentração de HCO3- se eleva, a concentração de Cl- se reduz, enquanto as concentrações de Na+ e K+ não se alteram. Três estímulos básicos são necessários para a secreção pancreática: A acetilcolina, liberada pelas terminações do nervo vago parassimpático e por outros nervos colinérgicos para o sistema nervoso entérico; colecistocinina, secretada pela mucosa duodenal e do jejuno superior quando o alimento chega ao intestino delgado; e secretina, também secretada pelas mucosas duodenal e jejunal quando alimentos ácidos entram no intestino delgado. A acetilcolina e a colecistocinina estimulam as células acinares pancreáticas a produzirem enzimas digestivas. Já a secretina estimula a secreção de solução aquosa de bicarbonato de sódio. A secreção pancreática ocorre em três fases: cefálica, em que estímulos visuais, auditivos e olfatórios, por reflexos condicionados via vagal, elevam a secreção pancreática, mesmo antes da ingestão dos alimentos; fase gástrica, em que a distensão das paredes do estômago pelo alimento aciona reflexos vagovagais entre o estômago e o pâncreas e estimula a secreção pancreática; e a fase intestinal, em que a secreção pancreática fica mais abundante em resposta à secretina e colecistocinina. Se liga! A Fibrose Cística é uma doença genética que resulta na produção de moléculas defeituosas da proteína formadora do canal para Cl- do tipo CFTR (regulador de condutância transmembrana da fibrose cística). Este canal se expressa na membrana luminal de vários epitélios secretores, como das glândulas salivares, ductos pancreáticos e vias respiratórias. A perda deste canal altera a secreção de íons em várias membranas luminais de ductos secretores. No pâncreas, altera a secreção de HCO3-, Cl- e de água, originando um fluido espesso, rico em proteínas enzimáticas que podem obstruir a drenagem da secreção e causar destruição do parênquima pancreático. Saiba mais! A secretina é um polipeptídeo secretado pelas células S na mucosa do duodeno e jejuno. Quando o quimo ácido, com pH menos que 4,5 a 5,0, entra no duodeno, vindo do estômago, causa ativação e liberação da secretina para o sangue. A secretina, por sua vez, faz com que o pâncreas secrete grande quantidade de bicarbonato, neutralizando o conteúdo ácido. Esse mecanismo é essencial para evitar o desenvolvimento de úlceras duodenais. 5. SECREÇÃO BILIAR A bile é sintetizada continuamente nos hepatócitos, a partir do colesterol da dieta. É composta principalmente por ácidos biliares (67%), fosfolipídeos (22%), colesterol (4%), bilirrubina (0,3%) e proteínas (4,5%). A bile primária, elaborada nos hepatócitos, contêm os sais biliares primários (cólico e quenodesoxicólico), colesterol, fosfolipídeos, bilirrubina e um fluido isotônico contendo Na+, K+, Cl- e HCO3-. Ela é secretada nos canalículos biliares, e daí segue para os canais de Hering, ductos perilobulares, ductos biliares interlobulares, até chegar nos ductos hepáticos direito e esquerdo. Estes ductos hepáticos se unem, formando o ducto hepático comum. O ducto cístico drena o conteúdo da vesícula biliar e se comunica com o ducto hepático comum, formando o ducto colédoco, que desemboca no duodeno, na ampola de Vater. Figura 8. Anatomia das vias biliares. Fonte: marina_ua/Shutterstock.com Nas células epiteliais do sistema de ductos biliares (colangiócitos) e na vesícula biliar (onde a bile é armazenada), ocorre uma modificação na composição da bile primária, com a reabsorção de água e íons. Nos períodos digestivos, após 30 minutos da ingestão do alimento, ocorre um aumento da secreção de colecistocinina que estimula a contração da vesícula biliar e o relaxamento do esfíncter de Oddi, permitindo o fluxo secretor de bile para o duodeno. No intestino delgado ocorre desidroxilação dos sais biliares primários, por ação e bactérias intestinais, formando sais biliares secundários (desoxicólico e litocólico). Sais biliares, fosfolipídeos e colesterol, componentes da bile, formam micelas que interagem com as gorduras em suspensão no fluido luminal do delgado, diminuindo a sua tensão superficial e rompendo-as em gotículas, processo conhecido como emulsificação. O objetivo é ampliar a área superficial das gorduras expostas à ação de enzimas pancreáticas. Após esta ação da bile no delgado, os sais biliares são reabsorvidos predominantemente no íleo e retornam para o fígado pela circulação êntero-hepática. Apenas uma quantidade muito pequena dos sais biliares é excretada nas fezes, sendo reposta pela síntese de novos sais nos hepatócitos, a partir do colesterol. Saiba mais! Um grande número de adultos acima dos 30 anos tem cálculos biliares (litíase biliar), sendo na maioria das vezes assintomáticos. A formação desses cálculos é associada a fatores de risco como idade avançada, obesidade, doença ileal, gravidez e sexo feminino. Para o colesterol se manter solubilizado na bile, é preciso que haja uma concentração proporcional de sais biliares. Quando há um aumento da concentração de colesterol na bile ou redução dos sais biliares, a bile fica supersaturada em colesterol (litogênica), e assim são formados os cálculos de colesterol (principal tipo de cálculo biliar). Doenças ileais como a doença de Crohn ou a ressecção ileal resultam numa redução da circulação êntero-hepática de sais biliares. O fígado não consegue excretá-los em quantidade suficiente e a bile tona-se pobre em sais biliares, favorecendo a formação de cálculos. 6. MOTILIDADE DO TRATO GASTROINTESTINAL Para compreender a motilidade do TGI é necessário revisar algumas propriedades da função do músculo liso. O movimento da parede das vísceras gastrointestinais controla o fluxo do conteúdo luminal, ao longo da sua extensão. Os principais padrões de motilidade são os de mistura (segmentação) e de propulsão (peristalse). Na musculatura lisa do Trato Gastrointestinal, as células fusiformes formam feixes circulados por bainha de tecido conjuntivo. Existem junções comunicantes (gap junctions) que acoplam as células, de modo que a contração ocorre com sincronicidade. As células intersticiais de Cajal são células especializadas da parede intestinal que estão envolvidas na transmissão da informação dos neurônios entéricos para as células musculares lisas. Estas células têm também a função de marca-passo, com capacidade de gerar o ritmo elétrico básico, ou atividade de “onda lenta”, que é característica da musculatura lisa do TGI. As células de Cajal têm longos processos que formam junções comunicantes com as células musculares lisas longitudinais e circulares, permitindo que as ondas lentassejam conduzidas rapidamente para as duas camadas musculares. Eletrofisiologia da Musculatura lisa Gastrointestinal O potencial de repouso da membrana no trato gastrointestinal varia de acordo com o ritmo elétrico básico, ou onda lenta. A frequência das ondas lentas é de 3 a 5 por minuto, no estômago, 12 a 20 por minuto no intestino delgado e 6 a 8 por minuto no cólon. A frequência dessas ondas lentas é determinada por regiões de marca-passo (células de Cajal), em diferentes locais do TGI. As ondas lentas não são potenciais de ação, mas sim despolarização e repolarização oscilatória da membrana das células musculares lisas. Geralmente não causam, por si sós, contração muscular, na maior parte do trato gastrointestinal. Basicamente estimulam o disparo intermitente de potenciais em ponta e estes, de fato, provocam a contração muscular. Os potenciais de ponta são verdadeiros potenciais de ação. Ocorrem automaticamente quando o potencial de repouso da membrana do músculo liso fica mais positivo que -40 milivolts (o potencial de repouso normal da membrana do músculo liso intestinal é entre -50 e -60 milivolts). Assim, toda vez que os picos das ondas lentas ficam mais positivos que -40 milivolts, surgem os potenciais Saiba mais! A Despolarização ocorre quando o potencial de membrana fica MENOS NEGATIVO e, nesse caso, as fibras musculares ficam mais excitáveis. A Hiperpolarização ocorre quando o potencial de ação fica MAIS NEGATIVO e, nesse caso, as fibras ficam menos excitáveis. Os fatores que despolarizam a membrana são: estiramento do músculo, estimulação pela acetilcolina (liberada por terminações parassimpáticas) e hormônios gastrointestinais específicos. Fatores que hiperpolarizam a membrana são: adrenalina e noradrenalina. de ponta, seguidos de contração. Quanto maior o número de potenciais de ação que ocorre no pico de uma onda lenta, mais intensa a contração da musculatura lisa. Na musculatura lisa do TGI, os canais responsáveis pelos potenciais de ação são canais para cálcio-sódio. Eles se abrem e fecham lentamente, levando a uma longa duração dos potenciais de ação. A movimentação de íons cálcio para o interior da fibra muscular leva à contração do músculo liso através da ligação da miosina e actina. As ondas lentas não promovem entrada de cálcio na fibra, por isso não são capazes de gerar contração. Parte da musculatura lisa do TGI exibe contração tônica, que é contínua (dura minutos a horas), não associada ao ritmo elétrico básico das ondas lentas. São encontradas na região superior do estômago, esfíncter esofágico inferior, válvula ileocecal e esfíncter anal interno. Sistema nervoso entérico O trato gastrointestinal tem um sistema nervoso próprio, denominado sistema nervoso entérico, localizado inteiramente na parede intestinal, começando no esôfago e se estendendo até o ânus. É composto por dois plexos: o mioentérico ou de Auerbach, localizado entre as camadas musculares longitudinal e circular, e o plexo submucoso ou de Meissner, localizado na submucosa. O plexo mioentérico leva ao aumento da contração tônica, aumento da intensidade das contrações rítmicas, ligeiro aumento no ritmo das contrações e aumento na velocidade de condução das ondas excitatórias. O plexo submucoso está envolvido com o controle da secreção intestinal local, absorção local e contração local do músculo submucoso. A estimulação parassimpática aumenta a atividade do sistema nervoso entérico. Mastigação Na cavidade oral o alimento é reduzido a pequenas porções pelos dentes e lubrificado pela saliva. Os dentes anteriores (incisivos) possibilitam a ação de cortar, e os posteriores (molares), ação de trituração. A redução do tamanho das partículas de alimento facilita a deglutição. Saiba mais! A Acalasia é a doença associada a um aumento do tônus do esfíncter esofágico inferior (EEI) ou falha do seu relaxamento. O alimento deglutido acumula-se na porção inferior do esôfago, dilatando-o. É causada por uma destruição do plexo de Auerbach. Pode ser classificada como primária ou secundária, sendo a causa secundária mais comum no Brasil a Doença de Chagas. O paciente cursa com disfagia e perda de peso. O diagnóstico pode ser feito pela esofagomanometria (padrão-ouro) ou esofagografia baritada com o achado do “sinal do bico de pássaro”. Durante a mastigação, a mistura do alimento com a saliva inicia o processo de hidrólise dos carboidratos pela ptialina. Grande parte do processo de mastigação é causada pelo reflexo de mastigação. A presença de bolo alimentar na boca primeiro desencadeia a inibição reflexa dos músculos da mastigação, permitindo que a mandíbula inferior se abaixe. Isso inicia o reflexo de estiramento dos músculos mandibulares, que leva à contração reflexa, o que, automaticamente, eleva a mandíbula. Esse processo é repetido continuamente. Deglutição A deglutição é a passagem do bolo alimentar da boca para o estômago através do esôfago. É um ato parcialmente voluntário e parcialmente reflexo, que ocorre em frações de segundos. O esôfago é um tubo muscular, com cerca de 15 cm de comprimento, que se estende da orofaringe até o estômago, atravessando o tórax e penetrando no abdome pelo hiato diafragmático. No seu terço superior a musculatura é estriada, enquanto nos 2 terços inferiores a musculatura é lisa. O esôfago se comunica com a orofaringe pelo esfíncter esofagiano superior (EES) ou cricofaríngeo (um espessamento da musculatura estriada do músculo cricofaríngeo). Na sua porção inferior, o esôfago se comunica com o estômago através do esfíncter esofagiano inferior (EEI). Nos períodos interdigestivos, o esôfago é flácido e a pressão interna na sua porção torácica é igual à torácica. A pressão do EES é de cerca de 40 mmHg superior à do esôfago torácico e a do EEI aproximadamente 30 mmHg superior. Esses esfíncteres funcionam como barreiras, prevenindo na porção superior a entrada de ar para o esôfago e na porção distal o refluxo gástrico. A fase reflexa da deglutição é controlada pelo centro da deglutição, localizado no bulbo e porção posterior da ponte, no tronco cerebral. Essa fase compreende uma sequência ordenada de eventos, que propelem o bolo alimentar da orofaringe ao estômago, com inibição da respiração. O processo da deglutição é compostopor 3 fases: oral (voluntária), faríngea e esofágica (reflexas). Figura 9. Esôfago e esfíncteres associados. Fonte: Blamb/Shutterstock.com Na fase oral da deglutição o alimento é pressionado pela ponta da língua contra o palato duro e propelido em direção à orofaringe, contra o palato mole. O bolo alimentar estimula receptores somatossensoriais da orofaringe e começa a fase faríngea da deglutição. Na fase faríngea ocorre uma sequência de eventos em menos de 1 segundo: elevação do palato mole em direção à nasofaringe (as dobras palatofaríngeas impedem a entrada do alimento na nasofaringe), as cordas vocais se aproximam e a laringe é deslocada para trás e para cima, contra a epiglote (evitando que o alimento entre na traqueia), O EES se relaxa para receber o bolo alimentar e os músculos constritores superiores da faringe se contraem fortemente para forçar o bolo profundamente na laringe. É iniciada uma onda peristáltica com a contração dos músculos constritores superiores faríngeos, e a onda se move em direção ao esôfago. Essa onda força o bolo alimentar através do EES relaxado, e após a sua passagem o EES se contrai de forma reflexa. Na fase esofágica, o esôfago, EES e EEI atuam impulsionando o alimento para o estômago, protegendo as vias aéreas durante a deglutição e o esôfago do refluxo gástrico, respectivamente. O estímulo para a propulsão esofágicos vem da faringe durante a deglutição e da distensão da parede esofágica e envolve reflexos extrínsecos (vagos) e intrínsecos. A presença do bolo no esôfago estimula mecanorreceptores e vias reflexas, iniciando a onda peristáltica (contração alternando comrelaxamento do músculo), que é chamada de peristaltismo primário. Essa onda se desloca do esôfago para baixo lentamente (3 a 5 cm/s). A distensão do esôfago pelo alimento desencadeia uma outra onda, chamada de peristaltismo secundário. A deglutição leva ao relaxamento do EEI; assim, quando o bolo chega ao final do esôfago, encontra o esfíncter relaxado, permitindo a sua passagem para o estômago. A porção proximal do estômago também relaxa ao mesmo tempo que o EEI, processo chamado de relaxamento receptivo. Figura 10. Variações da pressão em regiões diferentes da faringe, esôfago e esfíncteres associados. O traçado de pressão é uma representação obtida durante manometria. Fonte: rumruay/Shutterstock.com Funções motoras do estômago Do ponto de vista motor, o estômago exerce as funções de armazenamento, mistura e trituração do alimento, propulsão peristáltica e regulação da velocidade de esvaziamento gástrico. O estômago pode ser dividido em duas porções funcionais: proximal ou oral e distal ou caudal. A porção proximal se encarrega da recepção do bolo alimentar vindo do esôfago, por isso tem paredes mais finas, enquanto a porção caudal tem paredes mais espessas com musculatura proeminente para realizar a função de mistura e trituração dos alimentos. Como já citado, a primeira função motora do estômago é o relaxamento receptivo, que ocorre junto com o relaxamento do EEI para receber o bolo alimentar, sem elevar a pressão intragástrica. É um reflexo vagovagal. 1 a 2 litros de alimento pode acomodar-se no fundo gástrico, por 1 a 2 horas, sem sofrer ação de mistura. As peristalses gástricas começam na região proximal do estômago, onde está localizada a região de marca-passo. As ondas peristálticas aumentam de intensidade e velocidade em direção à região antropilórica, em consonância com o espessamento da camada muscular externa. As contrações rápidas e vigorosas do corpo gástrico propiciam a mistura do alimento com as secreções gástricas, otimizando a digestão. O alimento parcialmente digerido chama-se quimo. O piloro se relaxa, permitindo escape de pequenas quantidades de quimo para o duodeno, e em seguida se contrai de forma rápida e abrupta (conhecida como sístole antral), causando uma retropulsão do quimo. Esses processos repetem-se, levando à trituração do quimo. O quimo permanece no estômago entre 2 a 3 horas, dependendo da sua natureza química. Gorduras são os últimos nutrientes a serem esvaziados. Carboidratos são esvaziados mais rapidamente. Essa regulação da velocidade de esvaziamento gástrico é exercida pela região antropilórica e pelo duodeno. O piloro funciona como barreira entre o estômago e o duodeno, evitando a regurgitação do conteúdo alcalino do duodeno para o estômago, e regula a velocidade de esvaziamento gástrico de acordo com a capacidade do duodeno de processar o quimo. A atividade do piloro é controlada pelo sistema nervoso autônomo e hormônios gastrointestinais: gastrina, secretina, colecistocinina, peptídeo inibidor gástrico (GIP) e enterogastrona. Todos esses hormônios, assim como a acetilcolina e norepinefrina, contraem o piloro. O pH, a tonicidade e a composição do quimo gástrico que chega ao duodeno desencadeiam mecanismos neurais e hormonais que, por retroalimentação negativa, regulam a motilidade do piloro e a velocidade de esvaziamento gástrico. O pH ácido do quimo no duodeno estimula a secreção de secretina que, além de contrair o piloro, retardando o esvaziamento gástrico, provoca a secreção alcalina do pâncreas, tamponando o HCl. Os produtos da hidrólise lipídica estimulam a secreção de colecistocinina, GIP, que contraem o piloro, retardando o esvaziamento gástrico. No estômago há fibras vagais colinérgicas eferentes, excitatórias, que elevam tanto a motilidade como as secreções gástricas. A gastrina e motilina também atuam aumentando a motilidade gástrica. Já o sistema nervoso autônomo simpático, a secretina e o GIP (peptídeo inibidor gástrico) atuam no sentido oposto, reduzindo a frequência e a força das contrações gástricas. Se liga! O vômito consiste na expulsão do conteúdo gastrointestinal para o exterior através da cavidade oral. Ele é desencadeado por estimulação do TGI por agentes tóxicos e infecciosos, assim como pelo estímulo de diversos tipos de receptores sensoriais, como do aparelho vestibular, região posterior da Funções motoras do intestino delgado Os padrões motores do intestino delgado, durante o período pós-prandial, são predominantemente voltados para a mistura e consistem, em sua maioria, em segmentação e contrações retropulsivas. As segmentações correspondem a anéis que contraem a musculatura circular, dividindo o quimo em segmentos ovais. Envolvem apenas 1 a 4 cm de delgado e ocorrem a intervalos de 5 segundos. Essas contrações alternam-se e são os principais movimentos de mistura e renovação do quimo com a garganta e quarto ventrículo. É precedido por uma descarga do sistema nervoso autônomo, com sudorese, taquipneia, taquicardia, midríase, salivação, palidez, náuseas (nem sempre) e ânsias. As ânsias se desencadeiam por peristalse reversa, que se inicia nas porções distais do intestino (em geral, jejuno) e que propelem o conteúdo intestinal para o estômago, por relaxamento do piloro. Fortes contrações antrais impulsionam o conteúdo gástrico para o esôfago, através do EEI relaxado. Uma inspiração profunda, com glote fechada e diafragma elevado, aumenta a pressão intratorácica, forçando o relaxamento do EES e a expulsão do conteúdo intestinal. mucosa intestinal. Ocorrem também no delgado peristalses curtas que percorrem pequenas extensões do seu segmento, movendo o quimo em direção caudal. Figura 11. Sequência de contrações segmentais. Fonte: joshya/Shutterstock.com Função motora do cólon As principais funções do cólon são a absorção de água e eletrólitos do quimo para formar fezes sólidas e armazenamento de material fecal. O aspecto externo do cólon apresenta segmentos ovoides (haustras), que se formam e se desfazem conforme ocorrem contrações da musculatura circular colônica. Os movimentos nesse segmento são normalmente lentos e podem ser divididos em movimentos de mistura ou segmentação e movimentos de massa. Com as segmentações, todo o material fecal é revolvido de forma que tenha contato com a mucosa colônica para que haja a reabsorção de líquido. O movimento de massa contrai grandes extensões do cólon, propelindo seu conteúdo no sentido cefalocaudal. Esse movimento costuma ocorrer cerca de 1 a 3 vezes por dia. Figura 12. Esquema de haustrações do cólon e movimento de massa. Fonte: Tsyntseus Anastasiia/Shutterstock.com Os esfíncteres anais (interno e externo) estão contraídos tonicamente. A distensão do reto, pela chegada das fezes, em resposta ao movimento de massa, desencadeia o reflexo de defecação e também sinaliza a conscientização da necessidade de defecar. Se essa for protelada, os esfíncteres retomam os seus tônus normais e ocorre retropulsão das fezes do reto ao sigmoide. Se a defecação ocorrer, há relaxamento voluntário do esfíncter anal externo e do músculo puborretal. A estimulação parassimpática colinérgica aumenta a motilidade do cólon, ao passo que a simpática causa obstipação por inibição da motilidade. Saiba mais! A doença de Hirschsprung, ou megacólon agangliônico congênito, caracteriza-se pela ausência do sistema nervoso entérico principalmente no cólon distal e esfíncter anal interno. Os segmentos envolvidos apresentam tônus aumentado, o que reduz o lúmen intestinal, havendo ausência de atividade propulsiva. Por esse motivo, o reflexo de defecação é inexistente, ocorrendo constipação intestinal. Ocorre dilatação das regiões colônicas acima dos segmentos contraídos, causando o megacólon. O tratamento é cirúrgico. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS AIRES, MM. Fisiologia, 5ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018 BERNE, RB; LEVY, MN. Fisiologia. 6ed.Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. GUYTON, AC; HALL, JE. Tratado de Fisiologia Médica. 12ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. 2. FISIOLOGIA DO SISTEMA GASTROINTESTINAL DIGESTÃO E ABSORÇÃO DE ÁGUA E NUTRIENTES & FUNÇÕES METABÓLICAS DO FÍGADO 1. INTRODUÇÃO Os principais alimentos que sustentam a vida do corpo podem ser classificados como carboidratos, gorduras e proteínas, conhecidos também como os macronutrientes orgânicos. Em termos gerais, esses alimentos não podem ser absorvidos em suas formas naturais por meio da mucosa gastrointestinal e, por essa razão, são inúteis como nutrientes caso não haja digestão preliminar. A digestão e a absorção são as principais funções do trato gastrointestinal. A digestão é a degradação química dos alimentos ingeridos até moléculas absorvíveis, e é efetuada pelas enzimas do trato gastrointestinal (TGI). Estas são hidrolases, que catalisam a adição de moléculas de água aos nutrientes, que geram, por consequência, moléculas menores e absorvíveis. Essas hidrolases, que são enzimas secretadas no lúmen do sistema digestório, denominam-se enzimas luminais, enzimas que compõem o suco salivar, gástrico e pancreáticos; e as sintetizadas nos enterócitos e incorporadas às suas membranas luminais como proteínas integrais são as enzimas da borda em escova, presentes na membrana apical do epitélio intestinal. As atividades destas enzimas digestivas são facilitadas pela secreção de água e íons para o lúmen do TGI. Resultam dos processos de digestão: monômeros, dímeros e trímeros, absorvidos através do epitélio do delgado. Os processos hidrolíticos ocorrem nas seguintes porções do sistema digestório: cavidade oral, estômago, duodeno (onde são predominantes) e nas porções proximais do íleo. O cólon não apresenta enzimas luminais e da borda em escova. A absorção é o movimento dos nutrientes, da água e dos eletrólitos do lúmen do intestino para o sangue. Existem duas vias para absorção, a via celular e a paracelular. Na via celular, a substância deve cruzar a membrana apical (luminal), entrar na célula gástrica epitelial e, então, passar por extrusão da célula, através da membrana basolateral, para o interior da corrente sanguínea. Os transportadores nas membranas apicais e basolaterais são os responsáveis pelos processos absortivos. Na via paracelular, a substância se move pelas junções ocludentes (tight junctions), entre as células epiteliais intestinais, entre espaços intercelulares e vão para o sangue. A estrutura da mucosa intestinal é idealmente apropriada para a absorção de grande quantidade de nutrientes. Características estruturais, chamadas microvilosidades, aumentam a área de superfície do intestino delgado, maximizando a exposição dos nutrientes às enzimas digestivas e criando grande superfície absortiva. A superfície do intestino delgado é disposta em dobras longitudinais, chamadas de dobras de Kerckring. Vilosidades semelhantes a dedos se projetam para fora dessas dobras. Essas vilosidades são mais longas no duodeno, onde ocorre a maior parte da digestão e absorção, e são mais curtas no íleo. As superfícies das vilosidades são recobertas por células epiteliais (enterócitos) entremeadas por células secretoras de muco (células caliciformes). A superfície apical das células epiteliais é, em si, expandida por pequenos dobramentos chamados microvilosidades. Essa superfície microvilar é chamada borda em escova devido à sua aparência de “escova” sob microscopia óptica de luz. Juntas, as dobras de Kerckring, as vilosidades e as microvilosidades aumentam a área da superfície total em cerca de 600 vezes! As células epiteliais do intestino delgado têm velocidades de renovação (reciclagem) maiores que qualquer outra célula do corpo – elas são renovadas a cada 3 a 6 dias. A elevada renovação das células da mucosa intestinal as torna particularmente susceptíveis aos efeitos da irradiação e da quimioterapia. 2. CARBOIDRATOS A quantidade de carboidratos da dieta humana é extremamente variável, sendo função de fatores culturais, geográficos e socioeconômicos das populações. Seu consumo varia inversamente com o poder aquisitivo das populações. A proporção relativa de carboidratos da dieta humana, recomendada pela Organização Mundial da Saúde e pelo Comitê Americano de Nutrição, é de 58%. Mas a proporção efetivamente utilizada na dieta das populações de países desenvolvidos é de 50%, o que varia de 300 a 500 g/dia. Como cada grama de carboidratos, quando totalmente degradados cada grama fornece 4 kcal de energia, uma ingestão diária de 300 a 500 g representa 1.200 a 2.000 kcal/dia. Digestão de Carboidratos Os carboidratos da dieta são compostos por várias classes moleculares diferentes. O amido, o primeiro deles, é a mistura de polímeros de glicose, retos e ramificados. Os polímeros de cadeias retas são chamados amilose, e as moléculas de cadeia ramificada são chamadas de amilopectina. O amido é fonte particularmente importante de calorias, em especial nos países em desenvolvimento, e é encontrado, predominantemente, em cereais. Os dissacarídeos são a segunda classe de carboidratos , que inclui a sacarose ou sucrose (consistindo em glicose e frutose) e a lactose (consistindo em glicose e galactose), e que é importante fonte calórica para as crianças. Todavia, é princípio-chave que o intestino só pode absorver monossacarídeos, ou seja, a glicose, galactose ou frutose. Além disso, muitos itens alimentares de origem vegetal contêm fibras dietéticas, que consistem em polímeros de carboidratos que não podem ser digeridos pelas enzimas humanas. Esses polímeros são digeridos por bactérias presentes no lúmen colônico, permitindo, dessa forma, recuperar os valores calóricos. Quando o alimento é mastigado, ele se mistura com a saliva, contendo a enzima digestiva amilase salivar ou ptialina, secretada, em sua maior parte, pelas glândulas parótidas. Essa enzima hidrolisa o amido no dissacarídeo maltose em outros pequenos polímeros de glicose, contendo três a nove moléculas de glicose. O alimento, porém, permanece na boca apenas por curto período de tempo, de modo que não mais do que 5% dos amidos terão sido hidrolisados até a deglutição do alimento. Entretanto, a digestão do amido continua no corpo e no fundo do estômago por até 1 hora, antes de o alimento ser misturado às secreções gástricas. Então, a atividade da amilase salivar é bloqueada pelo ácido das secreções gástricas, já que a amilase é essencialmente inativa como enzima, quando o pH do meio cai abaixo de 4,0. Contudo, em média, antes de o alimento e a saliva estarem completamente misturados com as secreções gástricas, até 30% a 40% dos amidos terão sido hidrolisados para formar maltose. A secreção pancreática, como a saliva, contêm grande quantidade de α-amilase, também conhecida como amilase pancreática, que é quase idêntica em termos de função à α-amilase da saliva, mas muitas vezes mais potente. Portanto, 15 a 30 minutos depois de o quimo ser transferido do estômago para o duodeno e misturar-se com o suco pancreático, praticamente todos os carboidratos terão sido digeridos. Em geral, após ação da amilase pancreática os carboidratos são quase totalmente convertidos em oligômeros curtos de glicose, incluindo dímeros (maltose) e trímeros (maltotriose), bem como estruturas ramificadas mais simples, que são chamadas dextrinas α-limitadas, antes de passar além do duodeno ou do jejuno superior.Os enterócitos que revestem as vilosidades do intestino delgado contêm quatro enzimas (lactase, sacarose, maltase e α- dextrinase), que são capazes de clivar os dissacarídeos lactose, sacarose e maltose, mais outros pequenos polímeros de glicose nos seus monossacarídeos constituintes. Essas enzimas ficam localizadas nos enterócitos que forram a borda em escova das microvilosidades intestinais, de maneira que os dissacarídeos são digeridos quando entram em contato com esses enterócitos.A lactose se divide em molécula de galactose e em molécula de glicose. A sacarose se divide em molécula de frutose e molécula de glicose. A maltose e outros polímeros pequenos de glicose se dividem em múltiplas moléculas de glicose. Assim, os produtos finais da digestão dos carboidratos são todos monossacarídeos hidrossolúveis absorvidos imediatamente para a circulação portal. Na dieta comum, contendo muito mais amidos do que todos os outros carboidratos combinados, a glicose representa mais de 80% dos produtos finais da digestão de carboidratos, enquanto a fração de galactose ou frutose raramente ultrapassa 10%. Saiba mais! A intolerância à lactose é uma doença que pode ser congênita, acometendo recém-nascidos, ou ser programada geneticamente, induzindo diminuição ou desaparecimento total da lactase da borda em escova após o desmame. Predomina em negros e asiáticos, ocorrendo, em menor proporção, em populações brancas. Sua frequência é alta na Absorção dos Carboidratos Os monossacarídeos solúveis em água têm, a seguir, que ser transportados através das membranas hidrofóbicas dos população brasileira, provavelmente devido à miscigenação. Como a lactase não é digerida, ela permanece no lúmen intestinal, podendo causar um espectro de sintomas gastrintestinais, como: diarreia osmótica, distensão abdominal, cólicas e flatulência, ou apresentar sintomas pouco definidos. Diferentes fatores determinam as variações individuais dos sintomas na intolerância à lactose: variações da velocidade de esvaziamento gástrico, tempo de trânsito intestinal e, principalmente, a capacidade das bactérias do cólon de metabolizar a lactose (originando ácidos graxos voláteis ou de cadeias curtas, CO2 e H2). O tratamento de indivíduos com intolerância à lactose é feito por redução ou eliminação da ingestão de leite e seus derivados, mas leite comercialmente tratado com lactase pode ser utilizado. enterócitos. O transportador 1 de sódio/glicose (SGLT1) é um simportador que leva a glicose e a galactose contra seu gradiente de concentração, pelo acoplamento de seu transporte ao do Na+, contra seu gradiente eletroquímico. A energia para essa etapa não vem, diretamente, do trifosfato de adenosina (ATP), mas de gradiente através da membrana; o gradiente de Na+, é claro, criado e mantido pela Na+-K+- ATPase, na membrana basolateral. Uma vez no citosol, a glicose e a galactose podem ser retidas para as necessidades metabólicas do epitélio, ou podem sair da célula através do polo basolateral via transportador conhecido como GLUT2. A frutose, em contrapartida, é levada através da membrana apical pelo GLUT5. Entretanto, devido ao transporte de frutose não ser acoplado ao do Na+, sua entrada é relativamente ineficiente e pode, com facilidade, ser interrompida se forem ingeridas grandes quantidades de alimento contendo esse açúcar. Os sintomas que ocorrem devido a essa má absorção são similares aos experimentados por pacientes intolerantes à lactose e que a consomem. Figura 1. Absorção de glicose, frutose e galactose no intestino delgado. Fonte: Autoria própria. Saiba mais! A Síndrome de má absorção de glicose e galactose é uma doença de origem genética, bastante rara, devido a múltiplas mutações que resultam em substituições de um único aminoácido do cotransportador 2Na+- glicose ou galactose (SGLT1). Cada uma destas substituições induz alterações que previnem o transporte de glicose e/ou galactose nos indivíduos afetados. Os pacientes apresentam diarreia osmótica, consequente à má absorção das hexoses e de Na+. Neste caso, a dieta não deve conter amido, glicose ou lactose. A frutose é bem tolerada. As outras dissacaridases da borda em escova são normais. Os pacientes não apresentam glicosúria, uma vez que o túbulo proximal do néfron tem as isoformas SGLT1 e SGLT2, ocorrendo, assim, reabsorção tubular normal de glicose, no rim. 3. PROTEÍNAS A quantidade de proteína na dieta, necessária para manter o balanço nitrogenado, varia extremamente com as condições socioeconômicas da população. Nos países desenvolvidos, são ingeridos entre 70 e 100 g de proteínas por dia; isso é considerado excessivo, em relação às necessidades do organismo (representa 10 a 15% da ingestão calórica – e 1 g de proteína fornece aproximadamente 4 kcal). Nas populações pobres, por exemplo, nas africanas, a ingestão proteica é em média de 50 g diários. Nestas, como as crianças (cujo requisito proteico é maior que o dos adultos) ingerem frequentemente cerca de 4 g/dia de proteína, são os indivíduos mais afetados. As proteínas são polímeros solúveis em água, que precisam ser digeridas em constituintes menores, antes que seja possível sua absorção. Sua absorção é mais complicada do que a dos carboidratos, porque contêm 20 aminoácidos diferentes e pequenos oligômeros desses aminoácidos (dipeptídeos, tripeptídeos e, provavelmente, até tetrapeptídeos), que também podem ser transportados pelos enterócitos. O corpo, em particular o fígado, tem capacidade substancial de interconverter vários aminoácidos, sujeitos às suas necessidades. Entretanto, alguns aminoácidos, denominados aminoácidos essenciais, não podem ser sintetizados pelo corpo nem a partir de outro aminoácido e, então, têm que ser obtidos da dieta. Digestão de proteínas Os processos de digestão proteica luminal podem ser divididos nas fases gástrica e intestinal (ou pancreática), segundo os locais de origem das enzimas proteolíticas. Na fase gástrica, a hidrólise proteica ocorre pelas pepsinas e pela presença do HCl, o qual confere um pH adequado para a ativação do pepsinogênio à pepsina. A pepsina consiste em uma endopeptidase que hidrolisa proteínas nas ligações peptídicas formadas por aminogrupos de ácidos aromáticos, como a fenilalanina, a tirosina e o triptofano, originando oligopeptídeos, e não aminoácidos livres. Ela tem capacidade para digerir o colágeno, que é pouco hidrolisado por outras enzimas proteolíticas. A digestão do colágeno pela pepsina facilita a penetração de outras enzimas proteolíticas nos tecidos a serem digeridos. Cerca de 10 a 15% das proteínas da ingesta são hidrolisadas pela pepsina, resultando oligopeptídeos. A ação proteolítica da pepsina não é, porém, essencial; a sua importância reside na ação dos oligopeptídeos hidrolisados, que estimulam tanto a secreção de gastrina pelo estômago como a de colecistocinina (CCK) por células endócrinas do duodeno, estimulando as células acinares do pâncreas a secretarem enzimas. A fase intestinal da digestão proteica é efetuada pelas enzimas proteolíticas lançadas no duodeno pela secreção pancreática. A chegada do quimo proveniente do estômago estimula as células endócrinas do delgado, mais concentradas no duodeno, a secretarem tanto secretina (células S) como CCK (células I). Estes dois hormônios gastrintestinais estimulam, respectivamente, as células dos ductos pancreáticos a secretarem bicarbonato de sódio, e as acinares pancreáticas a secretarem enzimas. O bicarbonato não só tampona o HCl, como gera o ambiente alcalino propício à ação das enzimas pancreáticas, cujas atividades são máximas a valores de pH próximos à neutralidade. Existem 5 principais enzimas proteolíticas pancreáticas: tripsina, quimotripsina, carboxipolipeptidase A e B e elastase. Tanto a tripsina como a quimotripsina clivam as moléculas de proteína em pequenos polipeptídeos; as carboxipolipeptidases então liberam aminoácidos individuais dos terminais carboxila dos polipeptídeos. A proelastase, por sua vez, é convertida em elastase que, então, digere as fibras de elastina, abundantes em carnes. Apenas pequena porcentagem das proteínas é digerida completamente até seus aminoácidos constituintes, pelos sucos pancreáticos. A maioria é digerida até dipeptídeos e tripeptídeos. O último estágio na digestão das proteínas no lúmen intestinal é feito pelos enterócitos que revestem as vilosidades do intestinodelgado, especialmente no duodeno e no jejuno. Essas células apresentam borda em escova, que consiste em centenas de microvilosidades que se projetam da superfície de cada célula. Nas membranas de cada uma dessas microvilosidades, encontram-se múltiplas peptidases que se projetam através das membranas para o exterior, onde entram em contato com os líquidos intestinais. Dois tipos de peptidases são especialmente importantes: aminopolipeptidase e diversas dipeptidases. Elas continuam a hidrólise dos maiores polipeptídeos remanescentes em tripeptídeos e dipeptídeos e de uns poucos aminoácidos. Aminoácidos, dipeptídeos e tripeptídeos são facilmente transportados através da membrana microvilar para o interior do enterócito. Absorção de proteínas O corpo também é dotado de uma série de transportadores de membrana, capazes de promover a captação de produtos da digestão proteica que são solúveis em. Devido ao grande número de aminoácidos, existe um número relativamente grande de transportadores específicos. Em geral, os transportadores de aminoácidos têm especificidade razoavelmente ampla e, transportam um subgrupo de aminoácidos (p. ex., neutros, aniônico ou catiônico), mas com alguma sobreposição de sua afinidade para aminoácidos particulares. Além disso, alguns transportadores de aminoácidos são simporte de seus substratos aminoácidos, em conjunto com absorção obrigatória de Na+. O intestino delgado também é notável por sua capacidade de absorver pequenos peptídeos. O transportador primário e responsável por essa absorção é chamado PepT1 (ou peptídeo transportador 1) e é um simporte que carrega peptídeos em conjunto com prótons. Os peptídeos absorvidos pelos enterócitos são imediatamente hidrolisados por uma série de peptidases citosólicas em seus aminoácidos constituintes. Os aminoácidos não necessários pelos enterócitos são exportados através da membrana basolateral e entram nos capilares sanguíneos para serem transportados para o fígado através da veia porta. O PepT1 é, também, de interesse clínico porque pode mediar a absorção dos chamados fármacos peptidomiméticos, que incluem diversos antibióticos, bem como agentes quimioterápicos. 4. LIPÍDEOS Definidos como substâncias que são mais solúveis em solventes orgânicos do que em água, os lipídeos são a terceira classe principal de macronutrientes da dieta humana. Os lipídeos fornecem, significativamente, mais calorias por grama do que as proteínas ou os carboidratos, por isso têm maior importância nutricional, assim como são propensos a contribuir para a obesidade, se consumidos em quantidades excessivas. Os lipídeos também dissolvem compostos voláteis e contribuem para o sabor e o aroma dos alimentos. A forma predominante dos lipídeos na dieta humana é o triglicerídeo, encontrado em óleos e outras gorduras. A maioria desses triglicerídeos tem cadeia longa de ácidos graxos esterificados no arcabouço glicerol. Lipídeos adicionais são fornecidos na forma de fosfolipídeos e colesterol, originados, principalmente, das membranas celulares. Também é importante considerar que chegam ao intestino, diariamente, não apenas lipídeos da dieta, mas também lipídeos originados no fígado, nas secreções biliares. Quando a refeição gordurosa é ingerida, os lipídeos se liquefazem na temperatura corporal e flutuam na superfície do conteúdo gástrico. Isso poderia limitar a área de superfície entre as fases aquosa e lipídica do conteúdo gástrico e restringir o acesso de enzimas capazes de quebrar os lipídeos para formar os que poderiam ser absorvidos, pois as enzimas lipolíticas, como as proteínas, ficam na fase aquosa. Por esse motivo, o estágio inicial na absorção dos lipídeos é sua emulsificação. A mistura ocorrida no estômago faz com que os lipídeos da dieta fiquem na forma de pequenas esferas em suspensão, que aumenta em muito a área da superfície da fase lipídica. A absorção dos lipídeos também é facilitada pela formação de solução de micelas, com ajuda dos ácidos biliares, existentes nas secreções biliares. Figura 2. Representação esquemática das micelas mistas, conjuntos cilíndricos de ácidos biliares e outros lipídios da dieta. Fonte: J. Marini/Shutterstock.com Digestão dos lipídeos A digestão dos lipídeos começa no estômago. A lipase gástrica é liberada, em grandes quantidades, pelas células principais gástricas; ela se adsorve à superfície das micelas de gordura, dispersas no conteúdo gástrico, e hidrolisa os componentes triglicerídeos em diglicerídeos e ácidos graxos livres. Entretanto, pouca absorção de gordura ocorre no estômago, por causa do pH ácido do lúmen, que resulta em protonação dos ácidos graxos livres, liberados pela lipase gástrica. A lipólise também é incompleta no estômago, porque a lipase gástrica, a despeito de sua ótima atividade catalítica em pH ácido, não é capaz de hidrolisar a segunda posição do éster triglicerídico, o que significa que a molécula não pode ser completamente quebrada em componentes que podem ser absorvidos pelo corpo. Também existe pouca ou nenhuma quebra dos ésteres de colesterol ou dos ésteres das vitaminas lipossolúveis. Na verdade, a lipólise gástrica é dispensável em indivíduos saudáveis por causa do excesso acentuado de enzimas pancreáticas. A maior parte da lipólise ocorre no intestino delgado dos indivíduos saudáveis. O suco pancreático contêm três importantes enzimas lipolíticas, que têm suas atividades otimizadas em pH neutro. A primeira delas é a lipase pancreática. Essa enzima difere da enzima gástrica por ser capaz de hidrolisar as posições 1 e 2 do triglicerídeo, produzindo grande quantidade de ácidos graxos livres e monoglicerídeos. Em pH neutro, as cabeças dos ácidos graxos livres têm carga; assim, essas moléculas migram para a superfície das gotículas de óleo. A lipase também apresenta paradoxo aparente, onde é inibida pelos ácidos biliares, que também fazem parte do conteúdo do intestino delgado. Os ácidos biliares se adsorvem à superfície das micelas de óleo, por isso poderiam causar a dissociação da lipase. Entretanto, a atividade da lipase é mantida por um cofator importante, a colipase, que também faz parte do suco pancreático. A colipase é uma molécula ponte que se liga aos ácidos biliares e à lipase; ela ancora a lipase às gotículas de óleo, mesmo em presença dos ácidos biliares. O suco pancreático também contêm duas enzimas adicionais, importantes para a digestão da gordura. A primeira delas é a fosfolipase A2, que hidrolisa os fosfolipídeos, como os presentes nas membranas celulares, resultando na formação de lisolecitina e ácidos graxos. Previsivelmente, essa enzima pode ser bastante tóxica na ausência de substratos da dieta, por isso é secretada como pró-forma inativa que só é ativada quando atinge o intestino delgado. Além disso, o suco pancreático contêm a chamada colesterol esterase relativamente inespecífica, que pode quebrar não só os ésteres de colesterol, como seu nome implica, mas também os ésteres de vitaminas lipossolúveis, e até mesmo triglicerídeos. É interessante que essa enzima requer ácidos biliares para sua atividade (diferentemente da lipase) e é relacionada à enzima produzida no leite materno, com participação importante na lipólise em recém-nascidos. À medida que ocorre a lipólise, seus produtos são movidos das micelas lipídicas; primeiro, para a fase lamelar, ou membranosa, e subsequentemente para micelas mistas, compostas por produtos lipolíticos e ácidos biliares. Os ácidos biliares anfipáticos (têm as faces hidrofóbica e hidrofílica) servem para proteger as regiões hidrofóbicas dos produtos lipolíticos da água, enquanto apresentam próprias faces hidrofílicas em ambiente aquoso. As micelas ficam, na verdade, em solução, por isso aumentam a solubilidade do lipídio no conteúdo intestinal. Isso aumenta a intensidade ou velocidade com que as moléculas, como os ácidos graxos, podem se difundir para a superfície intestinalabsortiva. Dada a grande área de superfície do intestino delgado e a considerável solubilidade dos produtos da hidrólise dos triglicerídeos, as micelas não são essenciais para a absorção dos triglicerídeos. Por esse motivo, os pacientes com produção insuficiente de ácidos biliares (causada, por exemplo, por cálculo biliar que obstrui a saída da bile) normalmente não apresentam má absorção de gordura. Por sua vez, o colesterol e as vitaminas lipossolúveis são quase totalmente insolúveis em água; portanto, necessitam de micelas para serem absorvidos mesmo após terem sido ingeridos. Assim, se a concentração luminal de ácidos biliares cair abaixo da concentração crítica de micelas, o paciente ficará deficiente de vitaminas lipossolúveis (vitaminas A, D, E e K). Saiba mais! Alterações da digestão lipídica podem ocorrer por insuficiência pancreática, com diminuição ou ausência da secreção de lipase pancreática. Neste último caso, cerca de 2/3 da gordura da ingesta aparecem nas fezes (na forma de triglicerídeo). A diminuição da atividade das enzimas pancreáticas pode acontecer em várias condições, como pancreatite, fibrose cística ou outras afecções Absorção dos Lipídeos Acredita-se que os produtos da digestão da gordura sejam capazes de atravessar facilmente as membranas celulares devido à sua lipofilicidade. Entretanto, evidências recentes sugerem que sua absorção pode ser, alternativa ou adicionalmente, regulada pela atividade de transportadores de membrana específicos. Uma proteína ligante de ácidos graxos na membrana das microvilosidades parece ser responsável pela absorção de ácidos graxos de cadeia longa através da borda em escova. Os lipídeos se diferem dos carboidratos e das proteínas, em termos de seu destino, após a absorção pelos enterócitos. Ao contrário dos monossacarídeos e aminoácidos, que deixam os enterócitos na forma molecular e entram na circulação porta, os produtos da lipólise são reesterificados, nos enterócitos, para formar triglicerídeos, pancreáticas. Alterações do pH luminal no delgado também podem inativar a lipase pancreática ou mesmo desnaturá-la. Isso pode ocorrer em consequência de uma hipersecreção gástrica, como, por exemplo, no gastrinoma ou na síndrome de Zollinger-Ellison, em que a gastrina plasmática está sempre elevada devido a um tumor pancreático secretor de gastrina. Secreção insuficiente de bicarbonato pancreático, em caso de pancreatite, pode também inativar a lipase pancreática. fosfolipídeos e ésteres de colesterol. Esses eventos metabólicos ocorrem no retículo endoplasmático liso. Ao mesmo tempo, os enterócitos sintetizam uma série de proteínas, conhecidas como apolipoproteínas, no retículo endoplasmático rugoso. Essas proteínas são combinadas com os lipídeos ressintetizados, para formar estrutura conhecida como quilomícron, que consiste em núcleo lipídico (predominantemente triglicerídeo, com muito menos colesterol, fosfolipídio e ésteres de vitaminas lipossolúveis) recoberto por apolipoproteínas. Os quilomícrons são exportados dos enterócitos por processo de exocitose. Entretanto, ao chegar na lâmina própria, eles são muito grandes para permear pelos espaços intercelulares dos capilares da mucosa. Em vez disso, eles são absorvidos por linfáticos da lâmina própria e passam ao longo da circulação porta e do fígado. Por fim, os quilomícrons na linfa entram na corrente sanguínea pelo ducto torácico e servem como veículo para transportar lipídeos pelo corpo, para uso pelas células em outros órgãos. A única exceção para esse transporte, mediado pelos quilomícrons, são os ácidos graxos de cadeia média. Esses ácidos são relativamente solúveis em água e podem permear as junções fechadas dos enterócitos, o que significa que se desviam doseventos de processamento intracelular descritos acima e não são incluídos nos quilomícrons. Por esse motivo, entram na circulação porta e ficam mais facilmente disponíveis para outros tecidos. Dieta rica em triglicerídeos de cadeia média pode ser de particular benefício em pacientes com reservatório inadequado de ácidos biliares. 5. ÁGUA E ELETRÓLITOS A fluidez do conteúdo intestinal, especialmente no intestino delgado, é importante para permitir que a refeição seja propelida ao longo da extensão do intestino e para permitir que os nutrientes digeridos se difundam para seus sítios de absorção. Parte desse fluido é derivado da ingestão oral, mas, na maioria dos adultos, isto consiste em apenas 1 ou 2 L/dia derivados do alimento e da bebida. Fluido adicional é suprido pelo estômago e pelo próprio intestino delgado, bem como pelos órgãos que drenam para o trato gastrointestinal. No total, essas secreções adicionam outros 8 L, o que significa que o intestino recebe quase 9 L de fluido por dia. Entretanto, em indivíduos saudáveis, somente em torno de 2 L desse total passa para o cólon para reabsorção e, eventualmente, apenas 100 a 200 mL saem na evacuação. Assim, o transporte de fluido pelo intestino enfatiza a absorção. Durante o período pós-prandial, essa absorção é promovida, predominantemente, no intestino delgado via efeitos osmóticos da absorção dos nutrientes. Esse gradiente osmótico é estabelecido através do epitélio intestinal, que, simultaneamente, impede o movimento da água pelas junções fechadas. O sódio consiste no principal eletrólito do líquido extracelular; é absorvido em todo o trajeto intestinal, embora sua absorção diminua no sentido cefalocaudal, por redução da área absortiva. É altamente responsável pela manutenção da volemia, estando envolvido com os processos absortivos intestinais de vários substratos orgânicos, como glicose, galactose, aminoácidos, várias vitaminas hidrossolúveis, sais biliares etc. O conteúdo do intestino delgado é isotônico e tem aproximadamente a mesma concentração de Na+ que a do plasma, ou seja, cerca de 140 mEq/L. Sendo assim, no delgado, a absorção de Na+ normalmente acontece na ausência de um gradiente de potencial eletroquímico significante, entre o lúmen intestinal e o compartimento intersticial vascular. Como pouco Na+ é eliminado por via intestinal (cerca de 40 mEq/L), este íon é extensivamente reciclado. A taxa de absorção resultante do Na+ é mais alta no jejuno, em acoplamento com solutos orgânicos (por cotransporte). O Na+ move-se do lúmen intestinal para o interior das células do delgado, através da membrana apical, a favor do seu gradiente de potencial eletroquímico; com isso, provê a energia para o transporte dos solutos orgânicos, por mecanismo de transporte ativo secundário. Subsequentemente, o Na+ é transportado de modo ativo para fora das células epiteliais pela Na+/ K+-ATPase da membrana basolateral. Mesmo que o transporte efetivo de água e de eletrólitos no intestino delgado ocorra, predominantemente, segundo o vetor absortivo, isso não implica que o tecido não participe da secreção de eletrólitos. Essa secreção é regulada em resposta a sinais originados no conteúdo luminal e na deformação da mucosa ou da distensão abdominal, ou de ambos. Secretagogos críticos incluem a acetilcolina, o VIP, as prostaglandinas e a serotonina. A secreção garante que o conteúdo intestinal fique apropriadamente fluido enquanto a digestão e a absorção estão ocorrendo, e pode ser importante para lubrificar a passagem das partículas de alimento ao longo do intestino. Por exemplo, algumas evidências clínicas sugerem que a constipação e a obstrução intestinal, a última sendo observada na fibrose cística, podem ocorrer quando a secreção é anormalmente baixa. A maioria do fluxo secretório de fluido para o lúmen é impulsionada pela secreção ativa de íons cloreto. Alguns segmentos do intestino podem participar de mecanismos secretórios adicionais, como a secreção de íons bicarbonato. Presumivelmente, esse bicarbonato protege o epitélio, particularmente nas porções mais proximais do duodeno, imediatamente abaixo do piloro, da lesão causada pelo
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