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TENDÊNCIAS DE MÍ- DIAS SOCIAIS E PLA- TAFORMAS DIGITAIS Autoria: Nádia Maria Lebedev Martinez Moreira Indaial - 2021 UNIASSELVI-PÓS 1ª Edição CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Copyright © UNIASSELVI 2021 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: Reitor: Prof. Hermínio Kloch Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Carlos Fabiano Fistarol Ilana Gunilda Gerber Cavichioli Jóice Gadotti Consatti Norberto Siegel Julia dos Santos Ariana Monique Dalri Jairo Martins Marcio Kisner Marcelo Bucci Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI M838t Moreira, Nádia Maria Lebedev Martinez Tendências de mídias sociais e plataformas digitais. / Nádia Maria Lebedev Martinez Moreira – Indaial: UNIASSELVI, 2021. 127 p.; il. ISBN 978-65-5646-416-9 ISBN Digital 978-65-5646-417-6 1. Inovação digital. - Brasil. II. Centro Universitário Leonardo da Vinci. CDD 004 Sumário APRESENTAÇÃO ............................................................................5 CAPÍTULO 1 Origem E História Das Redes Sociais ......................................... 7 CAPÍTULO 2 Criação de Conteúdo e Planejamento De Ações Em Mídias Sociais ........................................................ 49 CAPÍTULO 3 Conteúdo Patrocinado e Divulgação de Marcas Nas Redes ....................................................................... 89 APRESENTAÇÃO A forma de divulgação de marcas, produtos e pessoas mudou consideravel- mente desde a popularização da internet e, mais recentemente, com o baratea- mento de aparelhos móveis e a entrada da tecnologia 3G, 4G, 5G. Na disciplina de Tendências de Mídias Sociais e Plataformas Digitais vamos nos dedicar ao estudo desse contexto, avaliando práticas e investigando estratégias bem-sucedidas para esses novos formatos. É evidente que toda mudança de cenário tem suas conse- quências, por isso, sem atualização, muitos profissionais da área da comunicação e do marketing se tornaram obsoletos para o mercado. Entretanto, novas carreiras e profissões emergiram, e você, caro estudante, poderá compreender melhor as implicações e possibilidades contemporâneas nesse nosso curso. No nosso primeiro capítulo, Origem e história das redes sociais, refletiremos sobre a evolução dos meios de comunicação, desde a sociedade de massa até as mais recentes mídias digitais. Você será apresentado a conceitos essenciais da cultura digital, como Convergência; Participação; Cibercultura; Segurança e Vigi- lância; Ubiquidade; e Inteligência Coletiva. Esses conceitos e o processos abar- cados por eles são essenciais para nossa prática profissional, principalmente para quem busca uma atuação ao mesmo tempo crítica e estratégica. Por fim, você en- tenderá o que é capital social e como os influenciadores digitais, conscientemente ou não, demostram seu alcance e capacidade de geração de renda através dele. Já no segundo capítulo, Criação de conteúdo e planejamento de ações em mídias sociais, você será apresentado aos mais recentes estudos do neuromarke- ting, da neuroestética e do neurodesign, bem como as tendências atuais para a produção de conteúdo nas plataformas digitais. Após essa introdução inicial, nos dedicaremos ao planejamento de mídia voltado à internet e como o storytelling pode ser fundamental para a produção de conteúdo digital. Ao final desse texto, apresentaremos algumas estratégias baseadas no neuromarketing, para uma di- vulgação eficaz de empresas, marcas e pessoas no ambiente virtual. É importante ressaltar que estamos nos valendo do que há de mais recente, tanto em termos acadêmicos quanto em pesquisas de mercado para nossa área. Tanto que nossos três principais autores são Daniel Kahneman, Darren Bridger e Philip Kotler. O primeiro é vencedor do Prêmio Nobel de Economia e, até hoje, se dedica aos estudos da economia comportamental e às formas contemporâneas de consumo. Bridger, por sua vez, é um dos principais pesquisadores do neu- romarketing hoje, e estuda técnicas que procuram compreender como podemos produzir conteúdo significativo nos valendo de conhecimentos das áreas do de- sign, do marketing e das relações públicas. Já Kotler é conhecido como guru do marketing e criador do conceito 4Ps e suas atualizações e desdobramentos, tam- bém é professor de Marketing Internacional na Kellogg School of Management na Universidade Northwestern (EUA). O terceiro e último capítulo, Conteúdo patrocinado e divulgação de marcas nas redes, investigará o que são e quais são as diferenças, vantagens e desvan- tagens entre conteúdos patrocinados em relação aos conteúdos orgânicos que circulam nas mídias digitais. Ainda que seja uma área relativamente recente e impressionantemente inconstante, conheceremos um pouco mais sobre as mé- tricas que medem o engajamento na internet hoje, e como podemos usá-las na divulgação das marcas e produtos que trabalhamos. Perceba que estamos falando do que há de mais recente no Marketing Digi- tal, mas ainda assim é fundamental reconhecer que a constante mudança e evo- lução tecnológica dos meios de comunicação, principalmente das redes sociais, torna uma série de estratégias e técnicas obsoletas em pouco tempo. Basta nos lembrarmos do esforço que diversas empresas fizeram para estarem em plata- formas como o Orkut, o My Space e o Second Life que, caso você seja bastante jovem, sequer lembra delas, ou, se for um pouco mais velho, talvez até tenha tido contas pessoais que hoje, com certeza, não existem mais. Por isso não podemos parar de estudar nunca, afinal, um mercado dinâmico exige que seu profissional também o seja. Bons estudos! Professora Dra. Nádia Maria Lebedev Martinez Moreira CAPÍTULO 1 Origem E História Das Redes Sociais A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: � conhecer o processo sócio-histórico que contempla a evolução dos meios de comunicação; � identificar os principais conceitos e teorias das mídias digitais; � analisar a evolução das mídias sociais; � constatar a importância dos estudos teóricos e principais conceitos para a com- preensão dos processos desencadeados pelas mídias sociais; � discutir a real influência e capital social de pessoas e marcas que se destacam no ambiente virtual. 8 Tendências de Mídias Sociais e Plataformas Digitais 9 Origem E História Das Redes SociaisOrigem E História Das Redes Sociais Capítulo 1 1 CONTEXTUALIZAÇÃO Antes de contextualizarmos o surgimento das redes sociais ou mídias digi- tais, ou ainda mídias sociais, ou mesmo redes digitais é importante deixar claro que não se trata de um fenômeno meramente tecnológico: a tecnologia é apenas a forma de conexão entre pessoas. Como você pode perceber, caro aluno, essas várias expressões – para além das já mencionadas, poderíamos também incluir a famosa TICs (Técnicas de Informação e Comunicação), bastante comum no meio acadêmico – indicam processos análogos e absolutamente recentes, tanto na história da própria espécie, como na também relativamente recente história dos meios de comunicação. Nesse primeiro capítulo do livro da disciplina Tendências de Mídias Sociais e Plataformas Digitais vamos estudar as origens e a evolução das mídias digitais, procurando entender como elas se inserem e se relacionam com os meios ditos “tradicionais”, como a fotografia, o rádio, o cinema e a televisão, afetando pro- fundamente a experiência de consumo e produção de conteúdo de todos eles. Vamos compreender o caminho histórico e a mudança social impulsionada pela popularização da internet a partir da década de 1990, e comopor estarmos co- nectados por essas mídias, desencadeamos um processo que alterou o que en- tendíamos até então por cultura, política, arte e economia. Em seguida, você será apresentado a alguns dos principais conceitos estuda- dos nas Teorias da Comunicação voltadas para o digital, a saber: Convergência, Cultura da Participação, Cibercultura, Segurança e Vigilância, Ubiquidade e Inteli- gência Coletiva. Todos são amplamente discutidos nas pesquisas sobre mídias di- gitais, por isso tornam-se fundamentais para quem pretende dedicar sua carreira ao uso das redes, independentemente do conteúdo que venha a ser produzido. Por fim, vamos procurar entender, de forma crítica, o que viria a ser o capital social dessa forma de comunicação e a importância da figura do influenciador digital para esse processo. Sobre isso, cabe uma provocação: considerando a velocidade com que o conteúdo que circula nas redes é descartado, como poderí- amos argumentar em prol da real capacidade de influência daqueles que contam com milhares ou até mesmo milhões de seguidores? Afinal, é preciso lembrar que estamos tratando de fenômenos muito recentes, aos quais não temos a devida distância histórica para garantirmos que algo postado por alguém tenha efeitos sociais marcantes. Entretanto, é inegável que já não conseguimos pensar nosso cotidiano sem a internet, os smartphones e as redes. Rapidamente, eles saíram do lugar do lazer (mas sem abandoná-lo) para ocupar o mundo dos negócios, nosso trabalho, nos- so estudo e, de forma mais ampla, nossas relações sociais. 10 Tendências de Mídias Sociais e Plataformas Digitais 2 EVOLUÇÃO DAS MÍDIAS: DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA AO DIGITAL É inegável o papel central que a comunicação desempenha na sociedade: a humanidade não sobreviveria sem a comunicação. Talvez por isso seja tão difícil conceituar comunicação, ainda que nos pareça tão óbvia num primeiro momen- to. Vilém Flusser – importante filósofo tcheco-brasileiro, em seu ensaio O que é comunicação? –, propõe-se a refletir sobre o tema, argumentando que a comuni- cação na nossa espécie não ocorre de maneira natural, mas sim artificial, afinal: “[...] na fala não são produzidos sons naturais, como, por exemplo, no canto dos pássaros, e a escrita não é um gesto natural como a dança das abelhas” (FLUS- SER, 2007, p. 89). Exatamente, por isso, as teorias da comunicação não cabem às ciências na- turais, mas às chamadas humanidades. A artificialidade está justamente no pro- cesso de criação de códigos aprendidos socialmente e, diferentemente dos outros animais, absolutamente próprios a cada cultura humana. Esses códigos vão des- de o mais simples gesto até as mais elaboradas tecnologias informacionais. Caro estudante, para compreender o argumento de Flusser (2007) basta considerar a cabal diferença entre nossa espécie e todas as outras: enquanto as outras espécies vivem sempre da mesma for- ma, a nossa está em constante modificação. Ao que se sabe, abelhas, ursos, gorilas e pássaros dependem do espaço para sobreviverem e, se esse espaço for preservado, eles vão manter sua sobrevivência in- dependentemente da geração. Exatamente, por isso, o tigre de ben- gala entrou em extinção, pois não há mais florestas tropicais na Índia. Já a nossa espécie é capaz de se adaptar a quase todo tipo de espaço: temos humanos em regiões quentes, frias, montanho- sas, desertas e até mesmo vivendo em estações espaciais. O fato de nos comunicarmos, de criarmos códigos, fez com que a evolução da nossa espécie tornasse a vida das diferentes gerações bastante diferente. Compare o mundo ao qual está inserido àquele que sua avó habitava quando tinha sua idade, completamente diferente, não? 11 Origem E História Das Redes SociaisOrigem E História Das Redes Sociais Capítulo 1 Entretanto essa comunicação, que é artificial, é tão cotidiana e comum a nós que esquecemos que por trás dela está todo tipo de significado. Para Flusser (2007), a comunicação maquia o código e nos iludimos que ele seja natural, mas o fato é que nenhum gato precisa aprender a miar, mas nós precisamos aprender um idioma – quanto melhor adaptado você for, quanto mais importante socialmen- te se tornar, provavelmente aprenderá bem mais que um único idioma em vida –, o que não é tarefa fácil, além de ser totalmente condicionada ao local que cres- cemos. E o autor arrisca dar uma função à comunicação: fazer-nos esquecer que estamos absolutamente sozinhos e que nosso destino é a morte. Somos a única espécie consciente da própria morte. Ainda que outras, como os elefantes, por exemplo, reconheçam a iminência do fim – elefantes que estão pres- tes a morrer costumam se distanciar da manada –, nós somos os únicos animais que desde muito cedo reconhecem a certeza da morte. Basta lembrar de quando você era bem pequeno e se deparou com a morte pela primeira vez, seja de um pet, seja de um parente querido, logo lhe explicaram que isso acontecerá com todos. A comunicação humana é um artifício cuja intenção é nos fazer esquecer a brutal falta de sentido de uma vida condenada à morte. Sob a perspectiva da “natureza”, o homem é um animal solitário que sabe que vai morrer e que na hora de sua morte estará sozinho. Cada um tem que morrer sozinho por si mesmo. E, potencialmente, cada hora é hora da morte. Sem dúvida, não é possível viver com esse conhecimento da solidão fundamental e sem sentido. A comunicação humana tece o véu do mundo codificado, o véu da arte, da ciência, da filosofia e da religião, ao redor de nós, e o tece com pontos cada vez mais apertados, para que esqueçamos nossa própria solidão e nossa morte, e também a morte daqueles que amamos (FLUSSER, 2007, p. 90-91). Não é por acaso que temos a tendência de confundir a comunicação com os meios de comunicação de massa, isso é extremamente cotidiano. Pense no ves- tibular, por exemplo: – O que você vai prestar? – Comunicação. Quero trabalhar na televisão. Um equívoco do ponto de vista teórico/acadêmico, sem dúvida. Afinal, a co- municação é um fenômeno humano, mas historicamente parece que a igualamos a meios como rádio, cinema, televisão e agora as próprias mídias digitais. Isso sem dúvida ocorre porque somos atraídos por essas tecnologias a ponto de hoje elas fazerem parte da vida de praticamente todos os membros da nossa espécie. Mas como isso foi acontecer? Os meios de comunicação são propagadores de histórias, de narrativas de todos os tipos e, desde seu surgimento, nossa espécie era atraída por histórias. 12 Tendências de Mídias Sociais e Plataformas Digitais Voltando às diferenças entre nós e os outros animais, Harari (2016a, p. 163) ex- plica que estes últimos vivem uma realidade dupla: eles reconhecem entidades objetivas externas como as rochas, as árvores, o chão, as águas, e são capazes de reconhecer as próprias experiências subjetivas, como o medo, a fome ou o desejo. Nós vivemos ainda uma terceira realidade: “Em acréscimo a árvores, rios, medos e desejos, o mundo Sapiens também contém histórias sobre dinheiro, deu- ses, nações e corporações” (HARARI, 2016a, p. 163). O professor argumenta que desde sempre nossa espécie busca entender o mundo ao seu redor e, para isso, cria todo tipo de história. Justificamos nossa existência e tudo que acontece conosco nos valendo de todo tipo de narrativa: mitológica, científica, religiosa, folclórica, corporativa, política, identitária, econô- mica, familiar etc. Isso tornou nossa linguagem muito mais complexa que a dos outros animais: Um papagaio pode dizer qualquer coisa proferida por Albert Einstein, além de imitar o som de telefones chamando, portas batendo e sirenes tocando. Qualquer que fosse a vantagem de Einstein sobre um papagaio, não era vocal. O que, então, há de tão especial em nossa linguagem? A resposta mais comum é que nossa linguagem é incrivelmente versátil. Podemos conectar uma série limitada de sons e sinais para produzirum número infinito de frases, cada uma delas com um significado diferente. Podemos, assim, consumir, armazenar e comunicar uma quantidade extraordinária de informação sobre o mundo à nossa volta (HARARI, 2016b, p. 31). Compartilhar informações sobre o mundo através de histórias faz parte da evo- lução da nossa espécie. Mas por que estamos falando disso? Porque todo o conte- údo que circula nas mídias são histórias: fotos no Instagram dizem sobre os lugares aonde você esteve, sobre as comidas que experimentou, sobre as roupas que com- prou. Perceba que as narrativas organizam nossa existência: toda vez que você vai se apresentar para alguém, o que você faz? Conta parte de sua própria história. E é por isso que os meios de comunicação de massa atraem e mobilizam tantos da nossa espécie desde seu surgimento. E mais: as histórias que conta- mos estão cada vez mais complexas. Se no início tentávamos justificar grandes tempestades em razão da fúria dos deuses, hoje, ao tratarmos temas como geo- política no Oriente Médio precisamos recorrer a histórias de cunho religioso, so- cial, político, histórico, econômico e por aí vai. Ainda há muitos rios no mundo, e as pessoas são motivadas por seus medos e seus desejos, mas Jesus Cristo, a República Francesa e a Apple represam e refreiam os rios e aprenderam a moldar nossos mais profundos anseios e ânsias. Como é provável que as novas tecnologias do século XXI tornem essas ficções ainda mais poderosas, para compreender nosso futuro 13 Origem E História Das Redes SociaisOrigem E História Das Redes Sociais Capítulo 1 precisamos compreender como as histórias sobre Jesus Cristo, a República Francesa e a Apple adquiriram tamanho poder [...]. As aptidões básicas dos humanos não mudaram muito desde a Idade da Pedra. Mas a teia de histórias cresceu e ficou cada vez mais forte, o que impulsionou a história desde a Idade da Pedra até a Idade do Silício (HARARI, 2016a, p. 163). Assista ao TED Talks, com o professor e historiador Yuval Noah Harari, Why humans run the world? (Por que os humanos coman- dam o mundo?), e entenda um pouco mais sobre as diferenças entre nós e as outras espécies, bem como a importância das ficções para a evolução dos Sapiens. As configurações do vídeo permitem que você selecione legendas em português. Link: https://www.youtube.com/watch?v=nzj7Wg4DAbs Agora que estabelecemos a importância das histórias para a humanidade, precisamos pontuar como os meios de comunicação de massa colaboraram para que essas histórias fossem partilhadas entre um número nunca antes visto de humanos, ao mesmo tempo. O impacto social desse processo é impressionante. Imagine, por exemplo, que você é um brasileiro no século XVIII que trabalha no porto de Santos. Você recebe imigrantes portugueses e faz amizade com alguns deles, eles lhe contam sobre Portugal, narram como eram suas vidas na Europa e até mostram desenhos de suas vilas. Você consegue ter uma ideia de como é viver naquele país. Agora vamos dar um salto de três séculos: você viaja para Portugal e do seu smartphone transmite, em tempo real, tudo o que vê para seus seguidores no Ins- tagram. Antes mesmo de viajar, viu seu hotel pelo Google Street View, conversou pelo Skype com uma amiga que mora lá há alguns anos, assistiu a programas de televisão sobre Portugal, enfim, experimentou todo tipo de imagem de Portugal an- tes mesmo de conhecer o país. Que diferença para o “você” do século XVIII, não? Aliás, não precisamos nem ir tão longe para reconhecer os impactos dos meios de comunicação. Basta reconhecer como pessoas de gerações mais ve- lhas que não são aptas no uso das novas tecnologias estão privadas de uma série de experiências que acabam, inclusive, limitando suas interações sociais. https://www.youtube.com/watch?v=nzj7Wg4DAbs 14 Tendências de Mídias Sociais e Plataformas Digitais A cada surgimento de uma nova tecnologia de comunicação, mais impacta- das são as relações cotidianas, a política, a economia e a cultura de uma forma geral. O surgimento da fotografia, primeiro meio de comunicação analógico, foi revolucionário na época. Para entendermos um pouco mais sobre esse processo, precisamos conversar sobre as imagens midiáticas, ou seja, o conteúdo veiculado pelos meios de comunicação, sejam eles analógicos (a fotografia, o cinema e as gravações de áudio e vídeo armazenadas em filme) ou digitais (que se valem do código computacional para compor seu conteúdo, fotografia e audiovisual digitais, bem como todo conteúdo que circula na internet e nas redes móveis). A forma como experimentamos o tempo e o espaço é bastante distinta da- quela que vivenciávamos a poucas décadas. Seus avós, com certeza, quando ti- nham sua idade não contavam com o acesso a imagens midiáticas que você tem, e isso afeta a forma como eles percebem a própria existência se compararmos com você. Afinal, os meios de comunicação nos mostram o mundo, diminuem distâncias e otimizam o tempo. As imagens midiáticas são informação, contam histórias e têm uma linguagem bastante própria. Falar em linguagem, hoje, necessariamente significa abordar, também, as imagens midiáticas, absolutamente presentes em nosso cotidiano. Flusser, no texto Imagens nos novos meios, afirma que: “Uma imagem é, entre outras coisas, uma mensagem: ela tem um emissor e procura por um receptor. Essa procura é uma questão de transporte” (FLUSSER, 2007, p. 152). Antes de nos aprofundarmos mais na postulação do filósofo, precisamos compreender o conceito de imagem. Antônio Damásio, um relevante cientista e neurologista português, em seu livro O mistério da consciência (2000), explica que quando usamos o termo imagem, estamos tratando de um padrão mental que pode ser consciente ou inconsciente (os sonhos são um exemplo de imagens do inconsciente). Ou seja, as imagens não se referem a processos mentais exclusi- vamente visuais: Refiro-me ao termo imagens como padrões mentais com uma estrutura construída com sinais provenientes de cada uma das modalidades sensoriais – visual, auditiva, olfativa, gustatória e sômato-sensitiva. A modalidade sômato-sensitiva (a palavra provém do grego sôma, que significa “corpo”) inclui várias for- mas de percepção: tato, temperatura, dor, e muscular, visceral e vestibular. A palavra imagem não se refere apenas a imagem “visual”, e também não há nada de estático nas imagens. A pa- lavra também se refere a imagens sonoras, como as causadas pela música ou pelo vento [...] (DAMÁSIO, 2000, p. 402). Portanto, quando ouvimos uma música, por exemplo, decodificamos ima- gens sonoras e somos altamente estimulados por aquilo que estamos ouvindo. As 15 Origem E História Das Redes SociaisOrigem E História Das Redes Sociais Capítulo 1 imagens táteis também são muito fortes. Pense naquele momento em que alguém que você detesta encosta no seu corpo: o corpo reage na hora, como se estivesse travando, se contorce e rejeita aquele toque indesejado. Perceba que pensar em imagens não pode ser apenas a escolha por algo essencialmente visual, como uma fotografia, uma série ou um filme. A popularização dos meios de comunicação de massa, a saber a fotografia, o rádio, o cinema e, posteriormente, a televisão – essencialmente visuais, mes- mo no caso do próprio rádio, considerando que ele sempre foi acompanhado por revistas especializadas na programação radiofônica e de propagandas visuais –, o sentido da visão parece sobrepor a todos os outros. Retornando à reflexão proposta por Flusser (2007, p. 159), essas imagens midiáticas são transportadas até nós, os consumidores, ouvintes, telespectadores, internautas ou ainda, numa percepção mais ampla, os receptores, e incorporadas ao nosso cotidiano: “[...] os novos meios, da maneira como funcionam hoje, transformam as imagens em ver- dadeiros modelos de comportamento e fazem dos homens meros objetos”. Evidente que a crítica de Flusser (2007) é muito fatalista e,mesmo que não concordemos totalmente com ela, não é possível negar que as imagens midiáti- cas têm um papel social tão determinante que parece que todas as nossas rela- ções passam por ela. Isso ficou ainda mais evidente durante o enfrentamento da Covid-19: lives, meeting, home office, ensino a distância etc. A linguagem visual midiática, impulsionada pelos meios de comunicação de massa e amplificada pelas mídias móveis é parte fundamental da nossa existên- cia e, sem dúvida, esse é um processo que começa com o surgimento da fotogra- fia. Ainda que de alguma forma você saiba a história dos meios de comunicação, é sempre bom organizarmos essa sequência. Observe o infográfico a seguir orga- nizado a partir dos períodos de popularização de cada mídia. Mas lembre-se: um meio nunca substitui o outro, ainda mais contemporaneamente, em que todas as técnicas são incorporadas pelas mídias digitais. 16 Tendências de Mídias Sociais e Plataformas Digitais QUADRO 1 – LINHA DO TEMPO: TECNOLOGIAS DA COMUNICAÇÃO MIDIÁTICA FONTE: A autora Leia o artigo História da arte/história da fotografia no Brasil no século XIX: algumas considerações, escrito pelo pesquisador Tadeu Chiarelli, que explica como foi o início da fotografia no Brasil e como essa técnica logo é associada a arte. Link: https://bit.ly/3ksHfEN. Ainda sobre a importância das imagens midiáticas, Hans Belting (2014), em sua obra Antropologia da Imagem, percorre a história das imagens produzidas pe- los Sapiens ao longo do tempo da nossa espécie. Belting finaliza sua reflexão re- forçando a relevância que esse tipo de imagem tem no comportamento humano. O autor afirma que os meios de comunicação (ou meios da imagem, valendo-nos de sua terminologia específica) determinam a percepção que os indivíduos têm de si mesmos e do mundo que habitam: 17 Origem E História Das Redes SociaisOrigem E História Das Redes Sociais Capítulo 1 A história dos meios está ligada à história do olhar, que, por seu turno, pode ser lida a partir da história medial [a mediação, ou o que Flusser chamou de “transporte” entre imagem e indivíduo]. As transformações dos meios e do olhar estimularam o seu mútuo movimento. A percepção, enquanto estilo e padrão, foi decerto marcada e moldada pelos meios da imagem a que esteve exposta [...] (BELTING, 2014, p. 284). Portanto, quanto mais os meios de comunicação evoluem tecnologicamen- te e se popularizam, mais determinantes eles são para o nosso comportamento, nossas escolhas e nossas interações sociais. As imagens midiáticas representam o mundo e a nós mesmos. Nossa percepção passa a ser moldada por elas e esse fenômeno da visualidade acaba acompanhando todo tipo de experiência. A fotografia, as gravações em áudio e vídeo pressupõem todo tipo de uso, seja nas redes sociais, seja em plataformas próprias, como nos aplicativos do tipo Tik Tok e Instagram, por exemplo, ou ainda nas músicas e podcasts que ouvimos e que cada vez mais caminham para o meio digital. Fique atento a uma questão importante: essas imagens midiáticas de que tanto falamos são transportadas pelos meios de comunicação ou, como pontua Baitello (2012), são mediadas pelos aparelhos de mídia. Isso nos leva a um outro fenômeno, que o pesquisador classifica como tela-dependência: Curiosa essa patologia da “dependência das telas”. Já há estudos que comprovam que são as telas ou écrans o objeto da dependência. Falar em objeto da dependência significa falar em objeto do desejo ao qual não se consegue resistir. Portanto, é o desejo por telas, um desejo por imagens e por superfícies que exibem imagens. Tal display parece exercer um fascínio pelos usuários (BAITELLO, 2012, p. 89). As telas atraem o nosso olhar, elas apresentam um mundo mediado por ima- gens desse próprio mundo. Trata-se de um processo bastante complexo, que infe- lizmente não pensamos muito sobre, pois já estamos habituados, já “naturalizamos” a mídia. Entretanto, nós, os profissionais da comunicação, precisamos refletir sobre isso, afinal, uma evidente questão ética emerge a partir deste cenário: se as telas causam dependência, como vamos nos atentar ao que veicularemos nelas? 2.1 MEIOS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA: O PARADIGMA FUNCIONALISTA Já comentamos anteriormente que o impacto do surgimento de uma nova mídia parece ser sempre muito grande, afinal, elas sempre apresentam novas 18 Tendências de Mídias Sociais e Plataformas Digitais formas de percebermos o mundo e de nos relacionarmos. Exatamente por obser- varmos esse impacto é que fazemos ciência. Pesquisadores que assumiram os meios de comunicação como objeto de estudo, refletiram e refletem sobre esse processo, mas sempre dentro de um contexto histórico, político, econômico e so- cial bastante próprio. Sem dúvida, o início da popularização desses meios, ocorri- do na primeira metade do século passado, quando passamos a considerá-los “de massa”, foi absolutamente afetado pelo contexto no qual cada Escola de Pensa- mento estava inserida. Se a noção de comunicação constitui problema, a teoria da comunicação não fica atrás. Também ela é produtora de cliva- gens. Antes de mais nada, o estatuto e a definição da teoria, a exemplo do que ocorre em várias das ciências do homem e da sociedade, contrapõem-se vigorosamente de uma escola a outra, de uma epistemologia a outra. Além disso a designação “escolas” pode ser ilusória. Uma escola pode abrigar numerosos componentes e estar longe de possuir a homogeneidade que seu nome parece sugerir (MATTELART, 2005, p. 11). A esse nosso estudo não cabe um aprofundamento tão extenso na história das teorias da comunicação, mas para nós, que estamos preocupados em entender o fenômeno das novas mídias e suas principais tendências, é importante compre- ender a origem de duas posturas comuns diante do midiático: uma postura mais entusiasmada, que crê no potencial de influência das mídias para o bem, e uma postura mais crítica, que também acredita nesse potencial de influência, mas a todo momento o coloca em xeque, além de identificar uma possível manipulação com consequências sociais graves. Ambos direcionamentos – evidentemente que esta- mos reduzindo todo um processo a título de compreensão de um contexto maior – possuem origens e contextos bastante próprios e, de certa forma, datados. O primeiro deles é o contexto americano da primeira metade do século XX, origem do paradigma funcionalista. O segundo, também originado na primeira me- tade do século passado, mas situado nas escolas do norte da Europa, muitas ve- zes é identificado com a Escola de Frankfurt, que estudaremos na próxima seção. O paradigma funcionalista foi pensado a partir da observação da força que rádio, cinema e, posteriormente, a televisão, tiveram (têm) na sociedade norte-a- mericana. Historicamente, é importante destacar a mudança geopolítica ocasiona- da pelas duas grandes Guerras Mundiais: até então, a orientação político-econô- mica do mundo se voltava para o continente europeu, que ao ser arrasado pelas guerras, abriu espaço para uma nova liderança mundial, disputada afinco pelos Estados Unidos e pela então União Soviética. Não há como negar a relevância dos meios de comunicação de massa para a disseminação da cultura norte-ame- ricana, que passa a guiar o comportamento de consumo do mundo ocidental. 19 Origem E História Das Redes SociaisOrigem E História Das Redes Sociais Capítulo 1 O funcionalismo é uma corrente que fundamenta o pensamento sociológico que crê que “[...] os processos de ação social se estruturam em sistemas que procuram reduzir as tensões do mundo, da vida, e manter equilibrado o funciona- mento da sociedade” (RÜDIGER, 2011, p. 55). Nessa perspectiva, a sociedade é estudada como um sistema de relações funcionais, que só ocorre porque os indivíduos que a compõem agem de forma conjunta e colaborativa. Esse sistema de relações funcionais é estruturado em diversos níveisque buscam solucionar problemas comuns ao cotidiano. Assim: Os sujeitos sociais são vistos por isso como seres que, sendo capazes de se adaptar aos sistemas de sentido da ação social vigentes (as semânticas dominantes) e exercer os papéis prescritos pelos diversos subsistemas em que vivem, podem se comportar conforme as regras e os princípios funcionais necessários à manutenção do sistema social. Conforme essa perspectiva, a comunicação deve ser vista como fundamento do processo de interação social (RÜDIGER, 2011, p. 55). O surgimento e popularização dos meios de comunicação de massa contribui para esse processo de organização do sistema social, de acordo com o paradigma funcionalista que acreditava, inclusive, que as mídias eram ferramentas essenciais para a democracia. Harold Lasswell (1902-1978) procurou definir, de forma analíti- ca, a função e a estrutura da comunicação social a partir da perspectiva funcionalis- ta, no final da década de 1930. Sua pesquisa originou “[...] uma visão linear, direta e mecânica do processo de comunicação [que por sua vez] constitui um processo de cunho intencional, através do qual as pessoas procuram influenciar o pensamen- to das demais por meio da transmissão de mensagens” (RÜDIGER, 2011, p. 56). Para Lasswell, a ação da comunicação deverá responder às seguintes perguntas: Quem? Diz o quê? Em que canal? Para quem? Com que efeito? Ainda que essa teoria tenha quase cem anos, as mídias digitais, principal- mente as de cunho publicitário, muitas vezes organizam seus conteúdos a partir dessa lógica. Alinhado a essa tese, também está o sistema de transmissão de informações proposto pelos estudiosos americanos Claude Shannon (1916-2001) e Warren Weaver (1894-1978), na mesma época: FIGURA 1 – ESQUEMA PROPOSTO PELA TEORIA DA INFORMAÇÃO FONTE: Rüdiger (2011, p. 20) 20 Tendências de Mídias Sociais e Plataformas Digitais Esse tradicional modelo acabou passando por uma série de revisões, à me- dida que os meios de comunicação de massa se tornavam mais populares, e foi posto em xeque com o surgimento da internet e, em especial, das mídias móveis e das redes sociais. Ainda que em muitos momentos essa comunicação pareça de fato ser linear, com as mídias digitais o destinatário passou, inclusive, a deter- minar como o conteúdo da mensagem era construído. Entretanto, é inegável o de- sejo de nós, produtores de conteúdo, de nossas mensagens alcançarem o público e serem recebidas da forma que intencionamos. 2.2 MEIOS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA: A ESCOLA DE FRANKFURT Enquanto a sociologia funcionalista compreendia os meios de comunicação como uma ferramenta asseguradora da democracia moderna e como um meca- nismo determinante para a regulação da sociedade, a teoria crítica, cuja uma das principais representantes foi a Escola de Frankfurt, passou a questionar as conse- quências desse processo de influência: Escolas de pensamento crítico irão interrogar sobre as consequ- ências do desenvolvimento desses novos meios de produção e transmissão cultural, recusando-se a tomar como evidente a ideia de que, dessas inovações técnicas, a democracia sai necessaria- mente fortalecida. Descritos e aceitos pela análise funcional como mecanismos de ajuste, os meios de comunicação tornam-se sus- peitos de violência simbólica, e são encarados como meios de poder e de dominação (MATELLART, 2005, p. 73). Como explicado no tópico anterior, o contexto é bastante determinante da percepção que as escolas de pensamento terão sobre as mídias. A Escola de Frankfurt, na Alemanha, era liderada por vários pesquisadores judeus que tes- temunharam a ascensão do nazismo, e a importância que o rádio e o cinema tiveram para convencer o público a aderirem a esse regime autoritário. Governos fascistas são absolutamente antidemocráticos e, curiosamente, muitos se valem dos meios de comunicação para garantir seguidores e assegurar a manutenção de seu status quo. Conhecemos bem a forma como o governo nazista manipulou a população alemã através do cinema e dos pronunciamentos para o rádio de seu líder Adolf Hitler. Ainda que as consequências desse regime autoritário sejam motivo de vergonha até hoje, parece que o 21 Origem E História Das Redes SociaisOrigem E História Das Redes Sociais Capítulo 1 uso da mídia para manipular eleitores e colocar em risco o processo democrático se mantêm, mas de forma ainda mais complexa. Leia os dois textos a seguir sobre o recente caso da Cambridge Analytica, empresa americana que usou dados das redes sociais para interferir em eleições de diversos países ao longo da década de 2010. • Entenda o escândalo de uso político de dados que derrubou valor do Facebook e o colocou na mira de autoridades. BBC News Bra- sil. 20.03.2018. Disponível em: https://bbc.in/3sVeUKR • Invasão de privacidade chancelada por lei. Revista Piauí. 29.09.2020. Disponível em: https://bit.ly/3DmMjD7 O Instituto de Pesquisa Social, abrigado pela Universidade de Frankfurt, foi fundado durante a República de Weimar (Alemanha) pelo economista Friedrich Pollock e pelo filósofo Max Horkheimer. Tratava-se de um instituto abertamente marxista, cujos primeiros objetos de pesquisa foram os movimentos operários e a economia capitalista. Entretanto, com a ascensão de Hitler ao poder, Horkheimer e todos os pesquisadores judeus, como Theodor Adorno, Jürgen Habermas, Her- bert Marcuse, Erich Fromm – entre outros – da Escola de Frankfurt, são destituí- dos de seus cargos e perseguidos politicamente. Para sobreviver, o instituto é transferido aos Países Baixos, com sedes par- ceiras em Genebra, Paris e Londres. Porém, a ampliação dos regimes nazifas- cistas em toda a Europa força seus integrantes a serem exilados do continente e, numa manobra de parceria de pesquisa – mas também com o intuito de salvar seus colegas – a convite de Paul Lazarsfeld, vários dos teóricos da Escola são recebidos na Universidade Columbia (Nova Iorque, EUA), em 1938: Lazarsfeld, por meio dessa colaboração, espera desenvolver uma convergência entre a teoria europeia e o empirismo americano. Espera que a pesquisa crítica revitalize a pesquisa administrativa. Essa esperança será frustrada. A colaboração termina em 1939. A oposição entre as duas mentalidades revela-se insuperável. Ador- no recusa dobrar-se à lista de questões proposta pelo financiador [Fundação Rockefeller], que, em sua opinião, encerra o objeto de pesquisa nos limites do sistema de rádio comercial em vigor nos Estados Unidos e impede a análise desse sistema, suas conse- quências culturais e sociológicas, e seus pressupostos sociais e econômicos (MATELLART, 2005, p. 75-76). A incompatibilidade é evidente entre os apocalípticos e os integrados e, sem dúvida, a experiência que cada um deles tivera da sociedade de massa e dos meios de comunicação até então foi determinante para a construção de suas teorias. 22 Tendências de Mídias Sociais e Plataformas Digitais Umberto Eco, em 1964, na obra Apocalípticos e Integrados, classifica as pesquisas sociológicas feitas a partir da primeira meta- de do século XX, ou seja, que analisam a sociedade de massa e os meios de comunicação, como parte de um jogo entre os detratores e os apartidários da cultura de massa: “Apocalípticos, os que veem nesse novo fenômeno uma ameaça de crise para a cultura e para de- mocracia. Integrados, os que se rejubilam com a democratização do acesso dos milhões a cultura do lazer” (MATELLART, 2005, p. 83). Enquanto o americano Lazarsfeld entendia a expansão do rádio como popu- larização da música – no que não estava equivocado, afinal, até o surgimento do rádio, a única forma que se tinha de experimentar música era se alguém tocasse um instrumento na sua frente – como a expansão da cultura e do lazer, Adorno e Horkheimer entendiam que a indústria da música era uma forma de reduzir as capacidades artísticas e a experiência estética, a um produto industrial a serviço do consumoe da economia capitalista. A partir dessa observação, os teóricos críticos elaboram o conceito de indús- tria cultural, através da análise da produção de bens culturais produzidos em es- cala industrial, como os filmes, produtos radiofônicos e revistas voltadas ao lazer: A indústria cultural fornece por toda a parte bens padronizados para satisfazer às numerosas demandas, identificadas como distinções às quais os padrões da produção devem responder. Por intermédio de um modo industrial de produção, obtém-se uma cultura de massa feita de uma série de objetos que tra- zem de maneira bem manifesta a marca da indústria cultural: serialização-padronização-divisão do trabalho. [...] A racionali- dade técnica é o caráter coercitivo da sociedade alienada (MA- TELLART, 2005, p. 77-78). Racionalidade Técnica ou a Razão Instrumental: conceito am- plamente trabalhado por Herbert Marcuse (1898-1979), em sua obra O homem unidimensional (1964), analisa que a sociedade burguesa que passa a ser moldada pela ciência e pela tecnologia subjuga os indivíduos ao invés de torná-los independentes e críticos. Para o fi- lósofo, a racionalidade técnica (ou razão instrumental) reduz o pen- 23 Origem E História Das Redes SociaisOrigem E História Das Redes Sociais Capítulo 1 samento e o discurso a uma dimensão única que: “[...] promove o acordo entre a coisa e sua função, entre a realidade e a aparência, a essência e a existência. Essa ‘sociedade unidimensional’ anulou o espaço do pensamento crítico” (MATTELART, 2005, p. 81). Para a Escola Crítica, os meios de comunicação transformam a cultura em mercadoria a ser consumida em escala industrial, impondo o modo de vida dos seus produtores para o resto do mundo, padronizando desejos e comportamen- tos. Isso também parece ser verdade hoje, e aqui, nos valeremos de uma provo- cação: tudo que você deseja comprar, as cidades que quer visitar costumam ter uma mesma origem? Diferentes da cultura na qual você nasceu? Provavelmente, a resposta é sim, provavelmente seu desejo de consumo tem muito a ver com a produção de imagens midiáticas da indústria de entretenimento, moda, cosméti- cos, automotiva etc., americana, talvez europeia. Mesmo o que aparenta ser tipicamente brasileiro, em sua forma de produção, conta com características dessa indústria do capital, como é o caso do funk e do sertanejo atuais. Muitas das marcas e mercadorias que se apresentam como fon- tes de desejo dos artistas e consumidores desses estilos têm origem na indústria norte-americana altamente imposta a nós através das imagens midiáticas. Você provavelmente entrou em contato, na sua vida, com mais imagens de Nova Ior- que, Londres e Paris do que da maioria das capitais brasileiras. 1) Imagine a seguinte situação: um youtuber jovem, com muitos segui- dores, formado em Educação Física e patrocinado por uma marca de esportes, que ensina sequências de exercícios para serem feitos em casa durante a quarentena. Avalie o cenário proposto a partir da perspectiva teórica dos integrados e dos apocalípticos. 3 TEORIAS DAS MÍDIAS DIGITAIS: PRINCIPAIS CONCEITOS Agora daremos um salto no tempo, afinal, sairemos da primeira metade do século XX para sua última década e, principalmente, para o século XXI. Mas 24 Tendências de Mídias Sociais e Plataformas Digitais antes, é importante reforçar que essas primeiras análises teóricas feitas pelos fun- cionalistas e pelos apocalípticos também cabem à reflexão das mídias digitais, e isso será facilmente observado nos conceitos que iremos abordar neste tópico: Convergência, Cultura da Participação, Cibercultura, Segurança e Vigilância, Ubi- quidade e Inteligência Coletiva. As teorias cibernéticas que hoje contam com a análise das redes sociais e mídias digitais partem de uma mudança de entendimento se compararmos às te- orias da comunicação social anteriores a esse período: ainda que estas últimas evidenciem a importância dos meios de comunicação para o tecido social, as te- orias cibernéticas vão creditar centralidade dessas tecnologias na cultura de uma forma bastante ampla. “As tecnologias de comunicação parecem ter-se tornado o principal fator para explicar o conjunto da cultura” (RÜDIGER, 2011, p. 115). Antes de nos aprofundarmos na tese afirmada pelo professor Rüdiger, vamos nos voltar um pouco para o conceito de cultura, muito claro à análise dos meios de comunicação. Conceituar cultura não é tarefa simples, afinal estamos lidando com um fenômeno absolutamente amplo e complexo. A origem da palavra está no latim colere que significa literalmente cultivar, cuidar de plantas. Não costumamos pensar muito sobre isso, mas o ato de cultivar é algo exclusivo aos Sapiens e uma das várias razões que nos diferenciam dos outros animais. O professor Harari (2016b) explica que o início da agricultura se deu por volta de 12 mil anos atrás e seu aparecimento impulsionou uma revolução estrutural e social que mudou a história da nossa espécie: [(...)há cerca de 10 mil anos (...)] os sapiens começaram a de- dicar quase todo seu tempo e esforço a manipular a vida de algumas espécies de plantas e animais. Do amanhecer ao en- tardecer, os humanos espalhavam sementes, aguavam plantas, arrancavam ervas daninhas do solo e conduziam ovelhas a pas- tos escolhidos. Esse trabalho, pensavam, forneceria mais frutas, grãos e carne. Foi uma revolução na maneira como os humanos viviam – a Revolução Agrícola (HARARI, 2016, p. 87). E por que essa mudança foi tão relevante? Porque pela primeira vez, os ho- mens modificaram o ambiente onde viviam e transformaram a natureza para be- nefício próprio. Antes, a espécie dependia de tudo aquilo que encontrava em seu caminho, caça e frutos. Após a Revolução Agrícola, os Sapiens não ficaram mais à mercê do espaço e do tempo, passaram a domesticar a natureza e cultivar o que precisavam para sobreviver. Assim, o conceito de cultura implica em transformação do ambiente, do espa- ço, uma ação modificadora sobre o outro. No caso do agricultor, sua ação trans- formadora está na modificação da natureza. Como explica Rüdiger (2011 p. 123): 25 Origem E História Das Redes SociaisOrigem E História Das Redes Sociais Capítulo 1 Cultura, vendo bem, não é nada que se possa definir objetiva- mente, mas uma relação social mediada por certos bens, a co- meçar por nossos corpos, investidos por uma certa semântica. Os romanos absorvem dos gregos o entendimento de que so- mos passíveis de aperfeiçoamento livre e individualizado, em meio a certas condições de socialização. A convicção de que isso deve ser objeto de cuidado e é direito de toda a espécie só se estabeleceu, porém, na era burguesa, quando a ideia latina de agricultura, cultivo da terra, ensejou o aparecimento de ideia de cultura, cultivo e aperfeiçoamento do ser humano. Na ideia de cultura também está implícita a noção de transformação, de or- ganização, o que nós chamamos de “[...] ‘cultura do espírito’, designando a for- mação intelectual do homem por meio da filosofia, da ciência, da ética e da arte” (BAITELLO, 2012, p. 27). Portanto, não é difícil pensarmos em cultura digital, ou mesmo em cibercultura, afinal, todas as novas tecnologias da comunicação pare- cem determinar comportamento, impulsionar processos de socialização, formar o “espírito contemporâneo”. Lembrando que essa ideia de “espírito contemporâneo” ou “espírito do tempo” está diretamente ligada ao conceito de zeitgeist, ou seja, fenômenos coletivos similares que aparecem em épocas determinadas e direcio- nam comportamentos, gostos, características da vida sócio-histórica do indivíduo, que refletem nas escolhas políticas e econômicas da humanidade. SAIBA MAIS: a recente história da nossa espécie comparada ao tempo do Universo. Observe o quadro a seguir e localize o surgimento da nossa es- pécie. Reflita sobre as drásticas mudanças que a cultura humana imprimiu no planeta em tão pouco tempo. QUADRO – ASDRÁSTICAS MUDANÇAS QUE A CULTURA HUMANA IMPRIMIU NO PLANETA EM TÃO POUCO TEMPO ANOS ATRÁS O QUE ACONTECEU 13,5 bilhões de anos Estima-se que nesse período surgem energia e matéria, é o começo do uni- verso. Também marcado pelo início da física e da química, com o apareci- mento dos primeiros átomos e moléculas. 4,5 bilhões de anos Formação do nosso planeta Terra. 3,8 bilhões de anos Aparecem os primeiros organismos, o começo da biologia. 6 milhões de anos A ciência postula o desaparecimento do último ancestral comum ao chimpanzé e aos humanos. É preciso deixar claro que não fomos os únicos hominídeos a habitarem a Terra, ainda que, muito provavelmente, sejamos os únicos hoje. Muitas outras espécies de humanos existiram: Homo rudolfenis, Australopithe- cusafarensis, Homo erectus, Homo neanderthalensis, Homo floresiensis etc. 26 Tendências de Mídias Sociais e Plataformas Digitais 2,5 milhões de anos Criação das primeiras ferramentas talhadas em pedra. Também ocorre a evolução, na África, do gênero Homo. 2 milhões de anos As diferentes espécies de hominídeos se espalham por toda África e Eurásia. 500 mil anos atrás Os neandertais passam a habitar o Oriente Médio e na Europa. 300 mil anos Surgem os primeiros Homo Sapiens. A arqueologia também credita a esse período o uso cotidiano do fogo, não somente pelos Sapiens. Outros huma- nos também dominavam essa técnica. 70 mil anos Ocorre a Revolução Cognitiva, ou seja, o começo registrado da linguagem ficcional. Os Spaiens começam a contar histórias sobre eles mesmos e regis- trá-las nas pinturas rupestres. Nossa espécie passa a transmitir uma quantidade cada vez maior de infor- mação sobre seu cotidiano, sobre o mundo, sobre suas relações sociais e sobre entidades que não existem no mundo real: figuras místicas e mitológi- cas, espíritos tribais, deuses etc. 12 mil anos As plantas e animais são domesticados e por isso o Homo Sapiens abando- na o nomadismo e passa a construir assentamentos permanentes. Esse é o fenômeno conhecido como Revolução Agrícola. 5 mil anos Primeiros grandes reinos, as religiões politeístas, a escrita e o dinheiro. 2 mil anos Começo do cristianismo, do Império Han na China e do Império Romano no mediterrâneo. 1,4 mil anos Início do Islamismo. 500 anos Acontecem a Revolução Científica e as grandes navegações que, associa- dos, levam à integração do planeta e sua compreensão enquanto um territó- rio único. Início da ascensão do sistema capitalista. 200 anos A Revolução Industrial marca uma mudança de orientação política, social e econômica na humanidade. Substituímos núcleos sociais como família e co- munidade, por organizações e entidades como Estado e mercado. Inicia-se a extinção em massa de diversas espécies de plantas e animais. Hoje As mídias digitais conectam a espécie em todo o mundo. Nós transcendemos os próprios limites terrestres e passamos a habitar todos os espaços, todos seguindo narrativas políticas e econômicas bastante similares, e o mercado nos torna interdependentes. FONTE: HARARI (2016b, p. 7-8) e Pesquisa FAPESP (2017, s.p) A cibercultura, antes de tudo, é uma forma de denominar um tipo de relacio- namento humano. Esse termo é usado para designar “[...] a reunião de relações sociais, das produções artísticas, intelectuais e éticas dos seres humanos que se articulam em redes interconectadas de computadores, isto é, no ciberespaço” (MARTINO, 2015, p.27). Já o ciberespaço é um espaço metafórico “[...] de interação 27 Origem E História Das Redes SociaisOrigem E História Das Redes Sociais Capítulo 1 criado no fluxo de dados digitais em redes de computadores, virtual por não ser localizável no espaço, mas real em suas ações e efeitos” (MARTINO, 2015, p. 11). O ambiente virtual permite um fluxo intermitente de ideias, textos, imagens, sons, práticas, representações e ações que ocorrem entre indivíduos conectados através de dispositivos tecnológicos de comunicação: smartphones, tablets, com- putadores, notebooks etc. Isso faz da cibercultura uma extensão das relações que também acontecem off-line, ainda que possua características bastante específicas: Dessa maneira, a cibercultura não é um marco zero na cultura da humanidade, mas traz uma série de particularidades por acontecerem em um espaço conectado por computadores. Em outras palavras, é a cultura – entendida em um sentido bastan- te amplo como a produção humana, seja material, simbólica, intelectual – que acontece no ciberespaço. Isso não significa dizer que, na cibercultura, a tecnologia determina as ações humanas. [...] as tecnologias criam condições de algumas prá- ticas. O que separa a “cultura” da “cibercultura” é a estrutura técnico-operacional” (MARTINO, 2015, p. 27-28). Essa é uma das discussões mais difíceis para o digital: nossa persona virtual é capaz de ações que nós mesmos, no mundo real, nunca cogitaríamos fazer? A princípio, essa é uma das desculpas mais comuns, por exemplo, para a cultura do cancelamento. Mas o fato é: a tecnologia nada pode sem a ação humana. Portanto, não é só por ser virtual que não nos afeta. Pense no fenômeno catfish, as pessoas que pelo meio on-line se apaixonam por avatares! Você acredita estar conversando com uma moça incrível e jovem, mas na verdade trata-se de um personagem criado por um senhor de meia-idade. Mesmo você sendo enganado, você se apaixona! E isso só é possível porque a cultura cibernética é uma cultura de conexão. 3.1 CONVERGÊNCIA DE MÍDIAS E CULTURA DA PARTICIPAÇÃO A mídia digital é tão presente em nossas vidas que dificilmente refletimos sobre seu uso, nem sempre pensamos no contexto que ela constrói e como afeta o nosso cotidiano. Aliás, essa é uma grande prova de sua relevância: “[...] quando deixam de chamar a atenção e se tornam triviais, as mídias se tornam realmen- te importantes. Se sua articulação com o cotidiano atinge um nível muito alto, a própria vida se transforma” (MARTINO, 2015, p. 10). Por isso, não é incomum tratarmos os aparelhos de mídia como extensões do nosso próprio corpo, sem perceber o quanto eles pautam as nossas escolhas. Basta nos lembrarmos de quantas vezes voltamos para casa em busca de um celular esquecido, mesmo já estando quase no final do trajeto. 28 Tendências de Mídias Sociais e Plataformas Digitais Talvez você seja muito jovem, talvez já tenha nascido no século XXI, mas se for um pouco mais velho, se recordará do mundo antes do celular. Não podemos nos esquecer de que os smartphones e as tecnologias móveis se popularizaram quase que ao final da primeira década dos anos 2000, ou seja, antes desse perí- odo, se quiséssemos falar com familiares e amigos era preciso ligar para a casa deles por meio de um telefone fixo, e só assim poderíamos ouvir suas vozes. Hoje, nos conectamos usando as câmeras de nossos celulares, enviamos ví- deos, áudios e fotos, acompanhamos o que acontece no mundo em tempo real, sem precisarmos da mídia tradicional de massa para nos dizer o que aconteceu. Podemos ouvir podcasts, assistir a lives, baixar todo tipo de conteúdo, enfim, usar o digital das mais diversas formas: para o lazer, para o trabalho, para organizar a nos- sa vida, para pagar contas, para encontrar os amigos, para registrar memórias etc. Esse processo está tão arraigado a nossa própria existência que é quase impossível pensar uma vida sem a presença do virtual. Mas afinal, o que caracte- riza as mídias digitais? Uma das formas de compreendê-las passa por identificar a diferença entre o analógico e o digital. Apesar de ser aparentemente simples, essa distinção caracteriza fenômenos sociais complexos. De forma mais simples, podemos separar o analógico do digital nos baseando no suporte: a fita K7, o disco de vinil, a fotografia e o cinema fixados em película são alguns exemplos de mídias analógicas. FIGURA 2 – VIDEOCASSETE SONY, LANÇADO EM 1985 FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Videocassete#/media/Ficheiro:- Sony_Betamax_SL-HF150_1.jpg>.Acesso em: 7 abr. 2021. 29 Origem E História Das Redes SociaisOrigem E História Das Redes Sociais Capítulo 1 FIGURA 3 – PRIMEIRO MODELO DE WALKMAN, DA SONY FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Fita_cassete#/media/Ficheiro:O- riginal_Sony_Walkman_TPS-L2.JPG>. Acesso em: 7 abr. 2021. O digital, por sua vez, ainda que não dispense o suporte, pode ser decodifi- cado nos mais diversos aparelhos. Isso faz com que o conteúdo registrado nunca esteja passível de apagamento – basta pensarmos nos trágicos efeitos do vaza- mento não autorizado de fotos íntimas, é praticamente impossível deletar esse tipo de conteúdo. O digital é um código que pode ser “lido” em qualquer smartpho- ne, computador, tablet e/ou notebook com um sistema operacional compatível, afinal, seu conteúdo pode ser decodificado em frações de segundo por qualquer tecnologia adaptada para isso. Ainda que as diferenças técnicas não importem muito, o que nos interessa realmente são as mudanças que as tecnologias geram, mesmo porque defini-las apenas pelo viés do suporte ou mesmo do software é reduzir demais um processo bastante complexo. Na perspectiva das teorias da comunicação, uma série de contradições e lugares comuns impedem de compreendermos os fenômenos com os quais estamos lidando, e seu impacto tanto para os indivíduos, quanto para a sociedade como um todo. Henry Jenkins (2009; 2014), em suas pesquisas sobre convergência e cul- tura da participação, conceitua o digital como uma forma propagadora da mídia que nunca antes havia sido experimentada pela espécie e, exatamente por isso, 30 Tendências de Mídias Sociais e Plataformas Digitais acabou criando uma série de processos sociais mediados pelos computadores, smartphones e mídias móveis em geral. A “propagabilidade” se refere aos recursos técnicos que tornam mais fácil a circulação de algum tipo de conteúdo em comparação com outros, às estruturas econômicas que sustentam ou restringem a circulação, aos atributos de um texto de mídia que podem despertar a motivação de uma comunidade para compartilhar material e às redes sociais que ligam as pessoas por meio da troca de bytes significativos (JENKINS, 2014, p. 26-27). Martino (2015, p. 55) argumenta que para a compreensão do significado das mudanças ocasionadas pelo digital e da importância dos conteúdos que circulam nesse ambiente, faz-se necessário conceitos que muitas vezes refletem sobre as mesmas práticas ou processos análogos: “redes sociais digitais, mídias digitais, redes sociais conectadas, redes sociais on-line etc.”. Ainda assim, parece seguro afirmar que essas práticas e processos só são possíveis graças à interação entre seres humanos, nas mais diversas plataformas, com o suporte de aparelhos conec- tados à internet. Também é preciso evidenciar o caráter horizontal desse tipo de rede, que acaba não apresentando uma hierarquia rigorosa, tal como a propostas pela Teoria da Informação, ao explicar os meios de comunicação de massa: Redes sociais podem ser entendidas como um tipo de relação entre seres humanos pautada pela flexibilidade de sua estrutura e pela dinâmica entre seus participantes. Apesar de relativamente antiga nas Ciências Humanas, a ideia de rede ganhou mais força quando a tecnologia auxiliou a construção de redes sociais conectadas pela internet, definidas pela interação via mídias digitais. [...] Embora seja geralmente utilizada para falar de agrupamentos sociais on-line, a noção de “redes sociais” é um conceito desenvolvido pelas Ciências Sociais para explicar alguns tipos de relações entre pessoas. O uso da noção de “redes sociais” no ambiente da internet significa transpor um modelo de análise social para o espaço virtual, o que requer algumas mudanças no conceito (MARTINO, 2015, p. 55). É cada vez mais comum os internautas produzirem, sem um contrato co- mercial e de forma autônoma, conteúdo inédito, complementar ou mesmo em resposta ao que marcas, artistas, organizações e personalidades de uma forma geral, postam em suas redes sociais e plataformas de compartilhamento virtual. A cultura da convergência, termo cunhado por Jenkins, refere-se às trocas de con- teúdos entre pessoas que partilham das mesmas referências, estabelecendo rela- ções mesmo sem se conhecerem, recriando imagens midiáticas que circulam nos meios de comunicação, compartilhando ideias e práticas transmitidas por meio das mais diversas redes. 31 Origem E História Das Redes SociaisOrigem E História Das Redes Sociais Capítulo 1 Evidentemente, o barateamento dos aparelhos e a facilidade técnica para a produção de conteúdo fazem parte desse cenário amplo denominado convergên- cia, mas não é o único fator responsável por ele: Convergência cultural acontece na interação entre indivíduos que, ao compartilharem mensagens, ideias e valores, acres- centam suas próprias contribuições a isso, transformando-os e lançando-os de volta nas redes. Não é porque um telefone tem dezenas de funções além de fazer chamadas que se poderia falar em “convergência”: ela acontece de fato, no momento em que referências culturais de origens diversas, às vezes contra- ditórias, se reúnem por conta de uma pessoa ou de um grupo social – fãs, por exemplo (MARTINO, 2015, p. 35-36). O fenômeno da franquia Harry Potter é um exemplo de convergência de mi- diática e cultura de fãs. A saga literária infanto-juvenil originalmente descrita nos sete livros de J. K. Rowling, entre a década de 1990 e ao longo dos anos 2000, foi desdobrada em uma série de outros produtos (midiáticos ou não). Alguns comer- ciais e franqueados, como é o caso dos oito filmes, do parque temático Universal Harry Potter, na Flórida (EUA), dos diversos games; e alguns “espontâneos” ela- borados pelos fãs da saga, como blogs, fóruns de discussão, vídeos, páginas em redes sociais etc. Assim, o universo desenvolvido pela escritora é expandido, não só por uma iniciativa coorporativa – toda a empresa que quiser utilizar qual- quer elemento de suas criações precisa comprar cotas e estar franqueada –, mas também, por pessoas, consumidores, internautas que se envolvem com a série e produzem conteúdo de forma livre a partir dela. Jenkins (2009) explica que a convergência é esse grande fluxo de conteú- dos que circulam pelas mais diversas plataformas, numa cooperação mútua entre corporações e internautas. É importante pontuar que os públicos dos meios de comunicação nesse tipo de cultura digital são marcados por um comportamento migratório, imprevisível e aleatório. Ainda que alguns produtores de conteúdo e programadores pareçam ter certo domínio sobre esse movimento, a busca por experiências de entretenimento por parte dos consumidores é bastante volátil. Convergência é uma palavra que consegue definir transformações tecnológicas, mercadológicas, culturais e sociais, dependendo de quem está falando e do que imaginam estar falando. [...] No mundo da convergência de mídias, toda história importante é contada, toda marca é vendida e todo consumidor é cortejado por múltiplas plataformas de mídia. [...] A circulação de conteúdos – por meio de diferentes sistemas de mídia, sistema administrativos de mídias concorrentes e fronteiras nacionais –, depende fortemente da participação ativa dos consumidores (JENKINS, 2009, p. 29). Mas não só de grandes franquias de entretenimento vive a cultura da con- vergência. Os “memes” também são um ótimo exemplo desse tipo de processo. 32 Tendências de Mídias Sociais e Plataformas Digitais Surgem, não se sabe muito bem de onde – evidentemente têm um autor origi- nal, mas nem sempre é reconhecido por sua criação e – são compartilhados nas mais diversas situações, chegando a diferentes plataformas que vão desde uma mensagem de WhatsApp até programas televisão que se dedicam à transmissão desse tipo de imagem na busca por audiência. A expressão cultura da participação é definitivamente uma ruptura com a posturapassiva que o público tinha diante dos meios de comunicação de massa. Hoje, já não conseguimos mais separar com clareza os produtores de conteúdo dos seus consumidores, mesmo em veículos mais tradicionais. No telejornalis- mo, por exemplo, é cada vez mais comum observarmos vídeos, textos e/ou áu- dios enviados por telespectadores, seja comentando o noticiário, seja sendo parte testemunhal da notícia – basta pensarmos em coberturas de desastres naturais, em que é comum observarmos vídeos gravados por vítimas, sendo estes usados como recurso em reportagens. É possível advogarmos por uma diferença marcante entre audiência e pú- blico na era do digital. A audiência é passiva e determinada por uma medição de constante vigilância, já o público não é apenas monitorado, ele é estudado e exige a atenção dos produtores de conteúdo, por isso acabam interferindo no que é veiculado pelos meios de comunicação. A audiência é a mera soma dos que con- somem; o público é um coletivo com capacidade de ação. Ao empregar esses termos [audiência e público], pode ser útil distinguir, como outros fizeram, entre “fãs”, entendidos como indivíduos que têm uma relação fervorosa com uma franquia de mídia em particular, e fandoms, cujos membros se identificam conscientemente como parte de uma comunidade maior com a qual sentem algum grau de comprometimento e lealdade. Os fãs individuais podem ser tidos como integrantes do grupo de espectadores, enquanto os fandoms começam a demonstrar algumas características dos públicos, ligados entre si por meio de sua “sociabilidade compartilhada” e sua “identidade compartilhada”. Os fandoms procuram direcionar a atenção das indústrias de mídia e, com isso, dão forma às suas decisões, objetivo que perseguem com graus variados de sucesso (JENKINS, 2014, p. 210). O consumo é um processo coletivo, o que por sua vez gera uma inteligência coletiva que terá poder de influência sobre os monopólios midiáticos que, até a popularização da internet, pareciam inabaláveis. Considere, por exemplo, a que- da de audiência tanto nos canais abertos quanto na TV fechada nesses últimos anos. Cabe às empresas de comunicação incorporarem esse novo consumidor às escolhas de conteúdo, caso queiram que suas marcas, produtos e serviços sobre- vivam ao teste do tempo. 33 Origem E História Das Redes SociaisOrigem E História Das Redes Sociais Capítulo 1 Vamos nos aprofundar mais nesse conceito nos tópicos seguin- tes, mas por enquanto basta saber que o termo inteligência coletiva diz respeito à “[...] possibilidade aberta pelas tecnologias de rede de aumentar o conhecimento produzido de maneira social e coletiva” (MARTINO, 2015, p. 11). Assista à palestra do professor Henry Jenkins, The New Audien- ce (A Nova Audiência), e entenda um pouco mais sobre cultura da participação e convergência. As configurações do vídeo permitem que você selecione legendas em português. Link: https://www.youtube.com/watch?v=AjkyvlBCqmU 3.2 SEGURANÇA E VIGILÂNCIA A percepção do que é público e do que é privado mudou consideravelmente nas últimas décadas, assim como o que entendemos por política. No sentido mais ordinário e raso, a política diz respeito às relações entre sociedade civil, partidos políticos e governos, a forma como esses últimos administram o que é público e como isso afeta a vida dos cidadãos. Porém, com a popularização das mídias digitais, política e ciberespaço se contaminam e, como vimos anteriormente no texto, alteram diretamente o dia a dia da população – basta lembrarmos do caso da Cambridge Analytics. Para além do Estado, elementos políticos das mídias digitais também afetam questões jurídicas, econômicas e sociais: [...] a desigualdade de acesso à internet, a chamada “exclusão digital”, é um problema [...] desde a liberação comercial da rede, ainda nos anos de 1990. O fato de existir uma rede mundial de computadores e informações não significa que todos tenham acesso a ela. Ao contrário, isso tem custo – pelo menos um com- putador [ou smartphone] e uma conexão com a internet, algo longe de ser universal. A procura pela inclusão digital, isto é, a criação de mecanismos que permitam o aumento do número de https://www.youtube.com/watch?v=AjkyvlBCqmU 34 Tendências de Mídias Sociais e Plataformas Digitais pessoas com acesso à internet é um problema político na me- dida em que implica, entre outras coisas, a criação de políticas públicas que facilitem esse acesso (MARTINO, 2015, p. 86). Esse aspecto reforça a importância da democratização das redes: ela pode ser um fator assegurador da democracia – segurança –, mas, o outro lado dessa moeda, diz respeito à vigilância na qual somos todos submetidos ao participarmos do digital. Aqui, de certo modo, recuperamos a perspectiva dos apocalípticos e dos integrados, adaptando as perspectivas teóricas ao mundo digital. Quadro comparativo: QUADRO – A PARTICIPAÇÃO POLÍTICA E A INTERNET: SEGURANÇA E VIGILÂNCIA PARTICIPAÇÃO (integrados) CRÍTICA (apocalípticos) Superação do espaço/tempo na participação política. A informação política que circula é uma informação de qualidade? Ampliação e armazenamento consideráveis da informação disponível. Desigualdade no acesso e no destaque à informação qualificada. Custo relativamente baixo, comodidade e conforto para que a participação política se dê. O desenvolvimento de uma cultura política limitada às técnicas da rede e, muitas vezes, destoante das necessidades reais do cidadão. Não há filtro ou controle. Propagação de informações falsas. Interatividade e interação constantes. Liberdade sem consequências legais e, ao mesmo tempo, um processo de vigilância constante, exemplar da cultura do cancelamento. Possibilita que minorias excluídas tenham voz ativa. A perspectiva panóptica. FONTE: A autora A ideia de panóptico proposta pelo jurista Jeremy Bentham, no século XVIII, inicialmente fez referência a um modelo circular de pri- são, onde as celas ocupariam a circunferência, divididas de maneira a não permitir nenhum tipo de comunicação entre os prisioneiros. No centro do presídio existiria uma torre, repleta de armas, todas apon- tadas para os presos e dispostas de tal forma que os prisioneiros não saberiam se estavam sendo vigiados. Isso resultava num sentimento 35 Origem E História Das Redes SociaisOrigem E História Das Redes Sociais Capítulo 1 enlouquecedor de vigilância constante. Muitos estudiosos das mídias digitais acreditam que essa é uma característica evidente das redes: elas funcionam em uma lógica panóptica, observável na cultura do cancelamento, por exemplo. FIGURA 4 – MODELO DE PRISÃO PANÓPTICA: DESENHO ELABORADO POR JEREMY BENTHAM, EM 1791 FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Jeremy_Bentham#/me- dia/Ficheiro:Panopticon.jpg>. Acesso em: 7 abr. 2021. Um dos fenômenos mais evidentes das mídias digitais, e que afetou por com- pleto nossa percepção do que é público e privado, é a entrega voluntária e gratui- ta por parte dos usuários de uma quantidade inimaginável de informações sobre si: gostos, lugares que frequentam, formação, status de relacionamento, hábitos de consumo, relações pessoais etc. O rastro deixado nas redes, hoje, permite-nos mapear, quase que por completo, a vida dos internautas: 36 Tendências de Mídias Sociais e Plataformas Digitais As mídias digitais abriram horizontes diferentes para se pensar essas questões. A multiplicação das fontes de informação, a pos- sibilidade de compartilhamento instantâneo e a velocidade de cir- culação de dados reconfigurou o que se imaginava como “contro- le”. A noção de “público” e “privado” se transformou, bem como as ideias de “vigilância” e “transparência”. Se, em algum momento, as fronteiras entre esses conceitos eram fixas, sua característica atual parece ser a mobilidade (MARTINO, 2015, p. 256). Ao mesmo tempo em que a circulação de informação é sobre-humana, as instâncias de controlee vigilância se multiplicaram da mesma velocidade: “O sim- ples ato de ligar um computador a uma rede, por exemplo, permite potencialmente que a máquina seja rastreada” (MARTINO, 2015, p. 257). Os dados que circulam nas mídias digitais existem de forma independente do ambiente físico e podem se desenvolver livres de qualquer barreira, o que é um ponto importante da nossa reflexão: não existe apagamento nas mídias digitais. Deletar é apenas o ato de zipar um conteúdo qualquer, pois, mesmo que você delete uma foto que acabou de tirar com seu smartphone, é possível resgatá-la, afinal, ela gerou um código computacional no momento em que foi criada. Não há apagamento dos códigos e, se eles forem compartilhados, é impossível deletá-los. Basta pensar no caso de influenciadores digitais ou celebridades que tentam apagar posts publicados, isso é virtualmente impossível, já que os seguidores compartilham instantaneamente esses dados, o que impende o desaparecimento dos mesmos. 3.3 UBIQUIDADE E INTELIGÊNCIA COLETIVA Ubiquidade das redes não é uma perspectiva difícil de se entender, na ver- dade temos falado dela ao longo de todo o texto, mas, talvez, o fenômeno da inteligência coletiva que é resultante dessa ubiquidade, precise dela para poder ser contextualizado. A ubiquidade diz respeito à aparente onipresença das mídias digitais, conectadas à internet, em cada vez mais espaços, sobrepondo, inclusive, o próprio tempo. Byung-Chul Han, professor de Filosofia e Estudos Culturais da Universidade de Berlim, publicou um ensaio intitulado No enxame: perspectivas do digital. Nele, o filósofo explica que: “A mídia digital é uma mídia da presença. A sua temporali- dade é o presente imediato. A comunicação digital se caracteriza pelo fato de que informações são produzidas, enviadas e recebidas sem mediação por meios inter- mediários” (HAN, 2018, p. 18). O autor afirma que os conteúdos que circulam nas redes, cada vez menos estão suscetíveis a filtros ou formas de controle, tendem a uma prática colaborativa que acaba definindo todo o processo: 37 Origem E História Das Redes SociaisOrigem E História Das Redes Sociais Capítulo 1 Hoje não somo mais destinatários e consumidores passivos de informação, mas sim remetentes e produtores ativos. Não nos contentamos mais em consumir informações passivamen- te, mas sim queremos produzi-las e comunicá-las ativamente nós mesmos. Somos simultaneamente consumidores e produ- tores. Esse duplo papel aumenta enormemente a quantidade de informação. A mídia digital não oferece apenas uma jane- la para assistir passivo, mas sim também portas através das quais passamos informações produzidas por nós mesmos. [...] Mídias como blogs, Twitter ou Facebook desmediatizam [ent- mediatisieren] a comunicação. A sociedade de opinião e de informação de hoje se apoia nessa comunicação desmedia- tizada. Todos produzem e enviam informação. A desmediati- zação da comunicação faz com que jornalistas, esses antigos representantes elitistas, esses ‘fazedores de opinião’ e mesmo sacerdotes da opinião, pareçam completamente superficiais e anacrônicos (HAN, 2018, p. 18). O professor evidentemente propõe uma provocação e, ao longo de seu texto, reflete sobre a mudança inevitável de lugar do jornalismo – e dos produtores de conteúdo midiático de forma mais geral –, com a popularização das mídias mó- veis e das redes sociais. Antes de mais nada, devemos deixar claro que na era das fakenews, a informação apurada se tornou essencial para a manutenção do sistema capitalista e para a garantia de governos democráticos. Entretanto, é ine- gável que o que Han (2018) afirma ser elitista na prática jornalística, ou mesmo no consumo de mídia, foi definitivamente posto em xeque. Caro aluno, dependendo de sua idade, talvez sua consciência de si já te- nha sido formada por meio da interação possibilitada pela internet, mas é preciso destacar que, até a última década do século XX e mesmo nos primeiros anos do século XXI, a rotina de produção de conteúdo que seria veiculado nos meios de comunicação de massa era basicamente unilateral. Ou seja, nós, comunicadores, desenvolvíamos o conteúdo que seria consumido pelo público e não havia uma rotina de interação tal como vivenciamos hoje em dia. Uma das características mais marcantes das mídias digitais é a colaboração, a construção coletiva dos conteúdos. Isso modificou profundamente o fazer midiá- tico e ressignificou a nossa profissão. O conceito de inteligência coletiva, bastante caro ao ambiente digital, foi primeiramente estabelecido a partir de análises feitas por cientistas de dados sobre as possibilidades interativas exploradas em sites comerciais de compra e venda: A Web hoje é colaborativa. Sites que possibilitavam apenas interações monousuário passaram a incorporar recursos para interação entre os usuários. Por exemplo, sites de comércio eletrônico, como Amazon (www.amazon.com), oferecem para cada produto suporte a avaliação, resenha, tro- ca de mensagens, wiki, compartilhamento de fotos, filtragem 38 Tendências de Mídias Sociais e Plataformas Digitais colaborativa, recomendação etc. Surge uma “inteligência cole- tiva” a partir da análise das interações entre os usuários. Esta nova forma de enxergar a web ficou conhecida como Web 2.0. Sites deixaram de ser apenas páginas estáticas de entrega de conteúdo e se tornaram aplicativos colaborativos favorecendo a participação do usuário (MICHALSKY; MAMANI; GEROSA, 2010, p. 41). Os mesmos autores caracterizam três pontos fundamentais à interação e participação na Web 2.0 por meio da produção colaborativa do conteúdo, o que define a inteligência coletiva (MICHALSKY; MAMANI; GEROSA, 2010, p.41): 1. Formação de comunidade: as temáticas comuns criam os laços virtuais que geram a produção coletiva de conteúdo. 2. Adição de valor à participação do usuário: o valor da plataforma é diretamente proporcional à participação dos in- ternautas. Plataformas do tipo wiki evidenciam isso, mas, sem sombra de dúvidas, o mesmo ocorre com a avaliação de pro- dutos – considere os tutoriais ou mesmo vídeos críticos de marcas e serviços – e, em certa medida, nos comentários em deixados sites de notícia e no compartilhamento de conteúdo, por exemplo. 3. Colaboração como parte constitutiva e acima da própria plataforma: novamente, o caso das plataformas tipo wiki, mas aqui damos um passo para além dos espaços destinados aos comentários e os vídeos-resposta: a colaboração é constitutiva do próprio conteúdo. Um fenômeno bastante comum são as FanFics, nelas os fãs estendem os universos narrativos para além da história original. Outro exemplo, são games virtuais de códigos aberto, onde os jogadores/programadores desenvol- vem e disponibilizam novas etapas do jogo on-line. Colaboração e ubiquidade são essenciais para a inteligência coletiva. “O modelo 3C, comum em artigos científicos que buscam identificar modelos cola- borativos na produção de conteúdo, é comumente utilizado para explicar esse processo” (MICHALSKY; MAMANI; GEROSA, 2010, p. 41), 3C: COMUNICAÇÃO, COORDENAÇÃO E COOPERAÇÃO. A comunicação aponta para a interação en- tre usuários, evidenciada no compartilhamento de conteúdo digital (códigos de programação, textos, fotos, vídeos e/ou áudios), a coordenação diz respeito à gestão e organização de pessoas e conteúdos, e a cooperação, o conjunto total do fenômeno de compartilhamento que corre dentro das plataformas, ou seja, a inteligência coletiva na web. 39 Origem E História Das Redes SociaisOrigem E História Das Redes Sociais Capítulo 1 FIGURA 5 – MODELO 3C DE COLABORAÇÃO FONTE: Michalsky, Mamani e Gerosa (2010, p. 42) A figura anterior ilustra processos de colaboração que ocorrem dentro e fora do ambiente digital. Por isso, valemo-nos da explicação oferecida por Michalsky, Ma- mani e Gerosa (2010) a partir do conceito de inteligência coletiva emergente no vir-
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