Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Tópicos de Filosofia e História da Matemática Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Profa. Dra. Ana Lucia Nogueira Junqueira Revisão Textual: Profa. Ms. Selma Aparecida Cesarin A Matemática na Antiguidade • Introdução • Matemática na Mesopotâmia e no Antigo Egito • A Matemática na Grécia Antiga • Concluindo · Apresentar as principais ideias matemáticas desenvolvidas na Antiguidade na Mesopotâmia, no Egito e na Grécia, estabelecendo possíveis relações entre elas ou destacando as diferenças e descontinuidades, sob o novo enfoque levantado pelas correntes filosóficas de estudos históricos. · Destacar e discorrer brevemente sobre alguns problemas matemáticos clássicos da época, entre a álgebra babilônica, números e operações no Antigo Egito e Geometria grega. OBJETIVO DE APRENDIZADO Já dissemos que a Disciplina como um todo trata dos aspectos de evolução do pensamento. Nesta Unidade vamos tratar dos primórdios do pensamento matemático. Melhor dizendo, dos primórdios das primeiras manifestações que estão nas origens do pensamento matemático. E olhem que vocês poderão se surpreender com alguns procedimentos já realizados em épocas tão antigas! Abordaremos a Matemática na Mesopotâmia, no Egito Antigo, na Grécia Antiga, colocando em destaque o contexto sócio político cultural em que se deram essas primeiras manifestações, a relevância das criações e dos procedimentos matemáticos realizados na época e que temos conhecimento por meio dos estudos históricos feitos por especialistas de posse da documentação já existente e fragmentos de obras que sobreviveram ao tempo. Quero ressaltar a importância do trabalho de historiadores, antropólogos e paleontólogos no processo de busca, descoberta, análise e/ou tradução de toda espécie de objetos, fragmentos de textos, documentos encontrados ou já disponíveis, lembrando que é um processo dinâmico de análise, discussão e construção, que a cada nova descoberta provoca novas reflexões, discussões e, muitas vezes, novos olhares. ORIENTAÇÕES A Matemática na Antiguidade Alerto, então, que poderão encontrar dados díspares ou visões distintas sobre um mesmo tema, vez que estamos tratando de fatos ocorridos há muitos milênios. Será, então, mais um relato dos contextos e principais feitos da época antiga, do que um estudo aprofundado das Matemáticas desses povos antigos. Mesmo assim, trataremos dos primeiros sistemas de numeração desses povos e da Geometria já realizada à época, principalmente pelos antigos gregos, como Tales de Mileto, Pitágoras, Euclides. Por motivos de espaço e tempo, não podemos fazer um estudo aprofundado dessas Matemáticas ancestrais, mas disponibilizamos diversos artigos e links no Material Complementar, para que você possa explorar mais sobre alguns desses temas e seus principais teóricos. Muito importante é notar o contexto em que se deram essas criações matemáticas e o tipo de pensamento matemático da época em cada região, bem como as possíveis propagações para outros povos daquelas regiões. Leia com atenção todo o material disponível para se preparar e realizar as atividades da Unidade. Você encontrará muita informação no texto teórico e muitas sugestões como material complementar. Aproveite! E para além do material, quanto mais você puder pesquisar, explorar, de acordo com a sua necessidade, melhor será o seu aproveitamento. Seja curioso(a)! 7 Contextualização Quando surgiu a Matemática ? Quais foram suas primeiras manifestações? Essas são questões que sempre nos intrigam. Segundo Almeida (2005), devemos procurar estabelecer uma conceituação operacional que nos permita distinguir o que é matematizar das outras atividades cotidianas do ser humano, tais como comer, caçar, plantar, construir, fabricar etc. Lembra que Hermann Weyl, em 1944, já dizia que matematizar pode bem ser uma atividade criativa do homem, como Linguagem ou Música. D’ Ambrósio aponta que o conhecimento, que é gerado pela necessidade de uma resposta a problemas e situações distintas está subordinado a um contexto natural, social e cultural, e resume magistralmente: De fato, em todas as culturas encontramos manifestações relacionadas, e mesmo identificadas, com o que hoje se chama Matemática (isto é, processos de organização, de classificação, de contagem, de medição, de inferência), geralmente mescladas ou dificilmente distinguíveis de outras formas [de conhecimento], que hoje são identificadas como Arte, Religião, Música, Técnica, Ciências. Em todos os tempos e em todas as culturas, Matemática, Artes, Religião, Música, Técnicas, Ciências foram desenvolvidas com a finalidade de explicar, de conhecer, de aprender, de saber/fazer e de predizer (artes divinatórias) o futuro. Todas aparecem mescladas e indistinguíveis como formas de conhecimento, num primeiro estágio da história da humanidade e na vida pessoal de cada um de nós (D’AMBROSIO, 2001, p.60-1.). Ainda segundo D’AMBROSIO, a História da Matemática, assim como a História da Ciência, insere-se na História Geral. Ao nos referimos a uma época ou a uma região, o leitor deve estar sempre atento ao que está se passando nessa época, na região e no mundo. Portanto, ao estudar História da Matemática, o leitor deve ter sempre disponível um Atlas Histórico e um livro de História Geral. Além disso, vamos procurar conceituar Matemática como a Ciência que emprega entes ou objetos (como retas, curvas, figuras e sólidos geométricos, números etc.), conceitos (que exprimem relações entre esses entes ou objetos) e processos racionais (como contagem, cálculo, construção, indução, dedução, etc.). A esses entes, conceitos e processos chamaremos de matemáticos. Por outro lado, segundo Almeida (2005), a partir de 2001, divulgações científicas passaram a considerar representações abstratas ou naturalísticas, bem como ornamentos pessoais, como expressões arqueológicas de habilidades cognitivas 7 UNIDADE A Matemática na Antiguidade modernas, bem como evidências da aquisição de uma linguagem oral articulada. O uso de símbolos, bem como o de linguagens e rituais, constituem mecanismos reconhecidos para a criação e manutenção de identidades grupais. Os homens modernos parecem ter evoluído na África há cerca de 100.000 anos e, aproximadamente há 50.000 anos, eles se espalharam pela Europa, deslocando os neandertais, que parecem ter constituído uma subespécie humana diferente, que não seria de ancestrais diretos do homem atual, segundo estudos arqueológicos recentes. Deixando essas análises para pesquisadores da área específica, o fato é que artefatos muito antigos já parecem revelar manifestações matemáticas. Objetos como a mais antiga forma de arte humana, o bloco de pedra encontrado na Caverna de Blombos, na África do Sul, com 77 mil anos (imagem a seguir), datados com ajuda da técnica de termoluminescência (alternativa à técnica da datação do carbono, quando não há “objetos vivos” para comparação). Observe os padrões geométricos: Fonte: nsf.gov A datação de artefatos encontrados em uma caverna nas encostas das montanhas Lebombo, também na África do Sul, revelou que o uso de pigmentos, miçangas, ferramentas de pedra e ossos é muito mais antigo que se supunha. De acordo com os arqueólogos, esses materiais já eram confeccionados há 44 mil anos, 20 mil anos antes do que os cientistas estimavam. A constatação foi publicada em dois artigos na versão online do periódico científico PNAS (Proceedings of the National Academy of Sciences). Eles fazem parte de um estudo conjunto dos materiais retirados da caverna Border, cuja escavação foi feita por Peter Beamount em dois períodos: em 1970/1971 e em 1987. 8 9 A seguir, imagem das escavações na Caverna Border: Fonte: historia.ro “Nosso estudo mostra que a Idade da Pedra Tardia começou na África do Sul muito antes do que se sabia, ao mesmo tempo em que o homem moderno chegava à Europa”, diz Paola Villa, coordenadora de um dos estudos e curadora do Museu de HistóriaNatural da Universidade do Colorado, nos Estados Unidos. “No entanto, as diferenças em tecnologia e cultura nestas duas áreas são muito diferentes, evidência de que essas populações evoluíram por caminhos distintos” (VILLA) Veja informações mais antigas ainda no artigo de Manoel de Campos Almeida. https://goo.gl/iUIgHbEx pl or No Vale do Nilo, foram encontrados ossos de perônio de babuíno com inscrições, denominados Ossos de Ishango, datados de cerca de 20 mil anos atrás, nos quais parece haver referências mais antigas (até agora) de multiplicção egípcia e ocorrência de números primos (sobre estes últimos, há controvérsias). Desta forma, este pequeno objeto, encontrado no coração da África, 15 mil anos antes dos primeiros cálculos dos faraós e 18 mil anos antes do surgimento da Matemática na Grécia, espantou a comunidade científica, vez que os traços agrupados representavam uma lógica que resultava da necessidade de pensar numericamente e fez com que estes agrupamentos humanos criassem métodos e instrumentos matemáticos. Na Mesopotâmia os sumérios inventam, talvez o primeiro sistema de numeração e um sistema de pesos e medidas, por volta de 3400 a. C. No Egito, temos por escrito talvez o conhecimento mais antigo, por volta de 3100 a. C., sobre o sistema de numeração decimal, com o qual se pode contar indefinidamente, introduzindo, se necessários, novos símbolos. 9 UNIDADE A Matemática na Antiguidade Fonte: culturamix.com Também no Egito, por volta de 2700 a. C., já se trabalhava com a agrimensura de precisão e, por volta de 2400 a. C., baseado no calendário caldeu, inventou-se o calendário astronômico (imagem a seguir) egípcio, bastante preciso e que, por sua regularidade Matemática, foi usado até a Idade Média. Fonte: sobreegipto.com No Papiro de Moscou (no Museu de Belas Artes de Moscou), datado de 1890 a. C., aparece calculado o volume de una pirâmide truncada. Fonte: arts-museum.ru 10 11 Na Índia, matemáticos yainas escrevem o Suria-prajinapti (390 a. C.), um texto matemático que classifica os números em três grandes grupos: enumeráveis, não enumeráveis e infinitos. Também recomenda cinco tipos diferentes de infinito: infinito em uma ou duas direções, infinito na área, infinito em todo lugar e infinito perpétuo. Desenhos tradicionais dos tchokwé Fonte: africafederation.net A tradição Sona (lusona no singular), desenhos dos Tchokwé (Cokwe), Angola, foi estudada por Paulo Gerdes, que a comparou com as tradições de outros tempos e outros povos que tinham alguma semelhança com essa tradição angolana, como algumas tradições do Egito Antigo, da Mesopotâmia Antiga, de mulheres Tamil no Sul da Índia, dos Celtas, entre outros. A exploração do potencial matemático dos (lu)sona levou Gerdes a escrever o livro Geometria Lunda (1996), e hoje vários matemáticos se dedicam ao estudo de ideias matemáticas que têm sua origem na reflexão sobre a Geometria por trás dos (lu)sona. A Matemática na Grécia Antiga A civilização antiga que desempenhou o papel mais significativo na construção da Matemática, tal como a conhecemos, foi a civilização grega. Seu florescimento, a partir do século VIII a. C., representou uma mudança no centro de gravidade do mundo civilizado dos vales dos grandes rios – Tigres e Eufrates (Mesopotâmia), e Nilo (Egito) – para as margens do mar Mediterrâneo. 11 UNIDADE A Matemática na Antiguidade A cidade de Mileto, na Ásia Menor (atual Turquia), foi a principal cidade grega até o século VI a. C. Porém, o apogeu da civilização grega ocorreu nos séculos V e IV a. C., quando Atenas passou a ser a capital da Grécia. Após as conquistas de Alexandre, o Grande, entre 334 e 327 a. C., Atenas perdeu progressivamente seu poder e Alexandria, no Egito, passou a ocupar o lugar de cidade mais importante do mundo grego. Teve início, nesse momento, o que é conhecido como período helenista da história grega, em oposição ao período anterior, chamado de helênico. A Grécia peninsular foi conquistada pelos romanos em 146 a. C., mas a civilização grega ainda teve sobrevida em Alexandria, que passou ao poder romano somente em 30 a. C. Alexandria ainda cumpriria o papel de guardiã da cultura grega até sua tomada pelos muçulmanos, em 641 d.C. Fonte: Adaptado de iStock/Getty Images, Wikimedia Commons Tales de Mileto (~625-547 a. C.) costuma ser considerado o primeiro matemático grego, nascido em Mileto, cidade da Ásia Menor, descendente de uma família oriunda da Fenícia ou Beócia. Incluído entre os grandes sábios da Antiguidade, acredita-se que durante suas viagens Tales aprendeu Geometria com os egípcios e Astronomia com os babilônios. Ao voltar de novo a Mileto, passado algum tempo, Tales abandonou os negócios e a vida pública para se dedicar inteiramente às especulações filosóficas, às observações astronômicas e às Matemáticas. Fundou a mais antiga escola filosófica que se conhece, a Escola Jônica e sua fama estendeu-se a todo o mundo heleno, graças especialmente à predição de um eclipse do sol, cuja data não se sabe bem ao certo se foi a de 28 de maio de 585 ou a de 30 de setembro de 609 a. C. – predição resultante do uso de uma das tábuas compostas pelos Caldeus, que anunciavam os períodos de 18 anos e 11 dias dos eclipses solares. 12 13 Proclo, Laércio e Plutano atribuem a Tales não só a transplantação de co- nhecimentos matemáticos do Egito para a Grécia, mas, ainda, a descoberta de várias proposições isoladas relativas às paralelas, aos triângulos e às pro- priedades do círculo, não apresentando nenhuma sequência lógica, mas com demonstrações dedutivas. Sobre a vida de Pitágoras pouco se sabe ao certo. Acredita-se que nasceu por volta de 580 a. C., em Samos, uma ilha no mar Egeu. Após ter viajado pelo Egito, regressou à sua terra natal e fundou uma escola quando contava já perto de 50 anos de idade. Esta escola tinha fins políticos, religiosos e filosóficos. Era uma associação muito exigente, com normas de conduta que incluíam a partilha dos bens terrenos entre os seus membros, preconizavam educação comum, bem como regras sobre a alimentação (eram vegetarianos). Os pitagóricos concentravam-se sobre quatro temas: a Aritmética, a Música, a Geometria e a Astronomia, que mais tarde deram origem ao quadrivium medieval. A Aritmética tratava do estudo dos números naturais, suas classificações e propriedades. A Música abordava as relações entre os números; a Astronomia estava para a Geometria um pouco como a Música estava para a Aritmética: enquanto uma estudava a relações entre objetos, a outra se dedicava aos objetos em si. O símbolo que utilizavam para se reconhecerem era o pentagrama. A Escola pitagórica estudava as relações entre as médias aritmética, geométrica e harmônica, por volta de 530 a. C. O teorema de Pitágoras é considerado, por vários estudiosos, um dos teoremas mais importantes e atraentes da história antiga da Matemática, por possibilitar vários resultados em Geometria e na solução de problemas práticos relacionados a medidas descobertas por meio dele. Entretanto, segundo Gaspar (2015), a associação de tão conhecido teorema relativo a triângulos retângulos com o nome do grego Pitágoras, de Samos, embora bastante difundida, é questionável a atribuição a ele da descoberta e demonstração do teorema. Evidências indicam que os antigos babilônios conheciam o teorema cerca de mil anos antes da época de Pitágoras. De fato, até 1930, o teorema de Pitágoras era considerado como sendo “de Pitágoras”. Em 1928, Neugebauer publicou evidências mostrando que os antigos babilônios, por volta de 1700 a. C., já conheciam o teorema e, em 1943, após a descoberta de um texto cuneiforme sobre “ternas pitagóricas”, Neugebauer considera sua conjectura validada. 13 UNIDADE A Matemática na Antiguidade Encontra-se utilização desse teorema em registro matemáticos das civilizações egípcia, indiana e chinesa, datando do tempo de Pitágoras ou anterior a ele. Tudo isto, não tira o mérito dos estudosda escola pitagórica, nem tampouco a utilidade do dito Teorema de Pitágoras. Pouco se sabe sobre a vida e a personalidade de Euclides e não se tem com certeza a data de seu nascimento. É provável que sua formação Matemática tenha se dado na escola platônica de Atenas. Ele foi professor do Museu, em Alexandria. Podemos inferir, por meio de Proclus, que Euclides foi intermediário entre os primeiros alunos de Platão e Arquimedes. Atualmente, as datas mais concordes para o nascimento e morte de Euclides são 325-265 a. C. Fonte: Wikimedia Commons Euclides escreveu cerca de uma dúzia de tratados, cobrindo tópicos desde Óptica, Astronomia, Música e Mecânica até um livro sobre secções cônicas; porém, mais da metade do que ele escreveu se perdeu. Entre as obras que sobreviveram até hoje temos: Os elementos, Os dados, Divisão de figuras, Os fenômenos e Óptica. Os elementos de Euclides não tratam apenas de Geometria, mas também de Teoria dos Números e Álgebra Elementar (geométrica). 14 15 Introdução Os objetivos da História são descrever, analisar, entender e explicar o processo de evolução da Humanidade ou de seus setores específicos, caso da História da Matemática, em que focalizamos reflexões acerca do conhecimento matemático. Entretanto, é bom lembrar que a abordagem do conhecimento matemático, segundo D’ Ambrósio (1999), é tomada tendo por referência a Ciência acadêmica e, assim, privilegia uma determinada região e momento na evolução da Humanidade. De fato, ao nos referirmos à Matemática identificamos o conhecimento que se originou nas regiões que costeiam o Mar Mediterrâneo; sua organização intelectual e social é devida aos povos dessas regiões, particularmente à Grécia Antiga, mesmo reconhecendo que outras culturas tiveram influência na evolução dessa forma de conhecimento. Por várias razões, a civilização ocidental que resultou dessas culturas veio a se impor a todo Planeta, deixando algumas populações excluídas, em consequência desse tipo de processo colonial. Além disso, o domínio de padrões acadêmicos rígidos, amparados por uma História e Filosofia das Ciências que sugere um progresso científico e tecnológico único, linear e cumulativo, não oferece possibilidade de escapar da atual desvantagem das culturas excluídas. D’ Ambrósio enfatiza: A busca de alternativas historiográficas que conduza a uma história que não venha embebida de um determinismo eurocêntrico, favorecendo a manutenção do status quo e desencorajando a superação da desvantagem atual, é essencial neste momento de questionamento da atual ordem internacional (D’ AMBRÓSIO, 1999, p.115). É importante, portanto, frisar logo de início que entendemos a Matemática como uma construção social humana e, nesse sentido, o olhar para a história da Matemática procura ter o viés sócio histórico cultural. Segundo Radford (2011), pesquisadores vêm discutindo que o conhecimento está profundamente enraizado e é moldado por seu contexto social e cultural. Uma inspeção na História em diferentes culturas permite verificar que cada cultura teve seus próprios interesses culturais, científicos, políticos ou ideológicos. Mais que isso, cada cultura teve sua própria maneira de definir e delimitar a forma e o conteúdo dos objetos de sua investigação. Nesse ponto, cita o trabalho de Richard McKeon, A Organização das Ciências e das Relações de culturas no décimo segundo e décimo terceiro séculos, de 1975, sobre um estudo comparativo entre enciclopédias medievais – muçulmanas, gregas, latinas e hebraicas – mostrando o quanto elas são diferentes e como essas diferenças são sustentadas por fatores intelectuais específicos de suas respectivas culturas. 15 UNIDADE A Matemática na Antiguidade No caso da Matemática , um bom exemplo é fornecido pela emergência da Matemática grega dedutiva, frequentemente relacionada à organização política das cidades-Estado gregas, baseadas na lei, como algo que incentivou os cidadãos a debater e discutir. Entretanto, essa tendência não dizia respeito só à Matemática ; tinha a ver com um fenômeno que abarcava todas as atividades de cultura da época. O estilo grego de debater e argumentar fazia parte de uma tendência intelectual social que floresceu por volta do século V a. C. nos círculos filosóficos gregos. Este estilo de argumentação pode ter sido incentivado pela oposição eleata ao ponto de vista materialista do pitagóricos. Sabemos que o materialismo pitagórico foi desafiado pelo que pode ser apreendido por meio da percepção (pelos sentidos) e por meio da razão pura. Por exemplo, Parmênides, no poema Sobre a Natureza, diz que o sentido nos conduz a opiniões, enquanto a razão, à verdade. E esta distinção era um ponto central para Platão, que insistiu que o conhecimento verdadeiro (episteme) é o conhecimento das formas e não pode ser alcançado por meio dos sentidos. Em A República, Platão diz (diálogo entre Sócrates e Glauco): Um graveto parecerá torto se você colocá-lo na água, em linha reta quando você tirá-lo de lá, e as diferenças de sombreamento podem fazer a mesma superfície parecer côncava ou convexa ao olho, e nossas mentes são claramente suscetíveis a todo tipo de confusão como essa. Platão acabou acomodando o insensível com o sensível, ao dizer que os fenômenos menos sensíveis (aestheta) participam das Formas (o eide). Nesse contexto, um dos problemas era explicar a existência de coisas em termos de alguns princípios, como o vento e o fogo. Dessa forma, os objetos matemáticos eram vistos como fazendo parte do mundo insensível atingível apenas pelo pensamento e organizados por meio dos esquemas gerais de princípios como encontrados em Os Elementos, de Euclides. Radford (2011) traz ainda outro exemplo de como a cultura influencia o modo de pensar, referindo-se ao relato de Emmanuel Lizcano (1993) sobre números negativos em três culturas diferentes, a grega clássica, a alexandrina e a chinesa, no qual Lizcano mostra como o conceito dos números negativos está relacionado aos preconceitos culturais, tabus, imaginários coletivos e simbolismos que demarcam as maneiras de criar diferentes tipos de “ negatividade”. Para concluir o teor da visão sócio histórica, tomo de Radford (2011, p. 281), a citação de Luria: Mudanças sócio-históricas não apenas introduzem novos conteúdos no mundo mental dos seres humanos; elas também criam novas formas de atividade e novas estruturas de funcionamento cognitivo. Elas avançam a consciência humana a novos níveis (LURIA, 1976, p. 163). 16 17 Segundo Lizcano (1993), na China, o complexo simbólico do qual brotaram os números negativos é a oposição ying/yang cuja infl uência chega a tocar âmbitos tão diversos como a linguagem e o conceito de espaço. Por outro lado, a episteme grega impediu precisamente que um fenômeno similar se desse na Grécia, vez que a episteme grega situa seus objetos num espaço de representação amplo com o pré-requisito de percepção sensível para objetos, o que bloqueou qualquer “ encontro” com os negativos no âmbito, por exemplo, dos problemas de aplicação de áreas, denominado, álgebra geométrica. Também a concepção Aristotélica de abstração – subtrair ou tirar algo de onde havia mais – impediu de início no campo numérico, de onde se subtrai magnitudes quando se abstrai o gênero da espécie, de “topar” com os números negativos. Com a função do diorismo (determinação de quando um problema tem solução) de Platão efetivamente o conceito grego de razão (racionalidade) encontra um teto, bloqueando implicitamente qualquer sentido de negatividade. Se de certa forma de número negativo aparece em Diofanto, é nas “ formas ausentes” (o que hoje chamamos de subtraendo). Esta é a causa da fratura que sofre o ideal grego clássico ao fi m da Antiguidade, na época da decadência alexandrina, caracterizada, entre outras coisas, por uma “ irracionali- dade” – a aparição de outras formas de racionalidade –, como o trabalho negativo do ceticismo contra o paradigma matemáticovigente, de onde emergem as novas signifi - cações imaginárias de “falta de rigor” , como as que levaram às novas manipulações numéricas, entre elas, as das “for- mas ausentes” que Diofanto descreve em sua obra Arith- mética e a emergência de uma “imaginação delirante” que traz à luz outras possibilidades de construção simbólica, a álgebra sincopada. Fonte: Wikimedia Commons Na imagem temos capa do trabalho de Diofanto (que morreu em 280 d. C.) traduzido do grego para o latim por Claude Gaspard Bachet de Méziriac, cuja edição foi publicada em 1670 e contém adições de Pierre de Fermat. Ex pl or Vale ressaltar também, segundo Roque (2012), que nas narrativas convencionais, a Matemática europeia originou-se com os gregos, entre as épocas de Tales de Mileto e Euclides, sendo preservada e traduzida pelos árabes no início da Idade Média e levada de volta ao seu lugar de origem, a Europa, entre os séculos XIII e XV, quando chegou à Itália por fugitivos de Constantinopla, dando a ideia de que a Matemática é um saber único, que teve os mesopotâmios e egípcios como precursores, mas com origem grega. Entretanto, devemos ter em mente que sequer é possível estabelecer uma continuidade entre as Matemáticas mesopotâmica e grega, indicando que talvez não possamos falar de evolução de uma única Matemática ao longo da História, mas a presença de diferentes práticas que chamamos de “Matemáticas”, segundo critérios que variam. Roque levanta ainda outros questionamentos na introdução do seu livro História da Matemática: uma visão crítica desfazendo mitos e lendas, entre eles, a imagem da Matemática como um saber superior, acessível a poucos, ainda usado para distinguir as classes dominantes das subalternas, e que foi responsável tanto 17 UNIDADE A Matemática na Antiguidade por eleger os europeus como herdeiros privilegiados da Matemática grega, como a Ciência a ser vista como uma criação do mundo greco-ocidental. Essa reconstrução tem dois aspectos: por um lado exaltar o caráter teórico da Matemática grega, cuja expressão mais perfeita é o método axiomático empregado por Euclides e, por outro lado, depreciar as Matemáticas da Antiguidade tardia e da Idade Média, mais associadas às demandas da vida comum dos homens, consideradas por isso, relacionadas a problemas menores. Com essas considerações em mente é que faremos a abordagem de alguns tópicos relevantes de cada período, baseando-nos em grande parte nas obras de Roque (2012) e Roque e Carvalho (2012). Matemática na Mesopotâmia e no Antigo Egito Não é difícil imaginar que sociedades muito antigas tenham tido a noção de quantidade. Registros de contagem como marcas em ossos foram encontrados em Lebombo, na atual Suazilândia, ao sul da África, datando de 35 mil a. C., e em Ishango, no norte da África, entre Uganda e Congo, datando entre 20 mil e 18 mil a. C. que, devido aos grupos de traços, foram interpretados como dispositivos de cálculo de divisões e multiplicações, embora essas interpretações suscitem ainda discussões entre especialistas. Ossos de Ishango Fonte: Roque e Carvalho, 2012 A palavra Mesopotâmia, que em grego significa “entre rios”, designa mais uma extensão geográfica do que um povo ou unidade política. Entre os rios Tigre e Eufrates, destacavam-se várias cidades, constituindo pequenos centros de poder, mas por ali passavam diversos nômades. Entre os que habitavam a Mesopotâmia, estão os sumérios e os acadianos, hegemônicos até o segundo milênio a. C. As primeiras evidências de escrita foram do período sumério, por volta de quarto milênio a. C. Essa região depois foi dominada por um império, cujo centro administrativo era a cidade de Babilônia, habitada no primeiro império por semitas, conhecidos por antigos babilônicos e, no segundo império, por neobabilônicos. 18 19 São do primeiro império (2000-1600 a. C.) a maioria dos tabletes de argila mencionados na história da Matemática. Outro momento importante dessa região é o Selêucida, império que se estabeleceu na Babilônia por volta de 312 a. C., depois da morte de Alexandre, o Grande. Os tabletes que nos permitem conhecer a Matemática mesopotâmica encontram- se em museus e universidades, como o YBC 7289 da Universidade de Yale, ou o Plimpton, da Universidade de Columbia. Por volta do quarto milênio a. C., os egípcios registravam nomes de pessoas, deidades, lugares, bens materiais e quantidades. Provavelmente havia algum contato com outras culturas, o que não quer dizer que não sejam originais o surgimento da escrita e sistema de numeração egípcios. Os registros mais numerosos para a Matemática são os mesopotâmicos, talvez pela maior facilidade de preservação da argila usada pelos mesopotâmicos do que do papiro usado pelos egípcios. Fontes indicam que a Matemática no Egito começou associada sobretudo às necessidades administrativas. A quantificação e registros de bens levaram ao desenvolvimento de sistemas de medida, aperfeiçoados pelos escribas, responsáveis para assegurar a coleta e distribuição de insumos, mas também de formação de novos escribas, tanto que nos papiros encontramos problemas e soluções, numa tradição, digamos, pedagógica. A escrita nos períodos faraônicos era de dois formatos: hieroglífico – nas inscrições monumentais em pedra – e hierático – em escrita cursiva nos papiros e vasos ornamentais. Um dos papiros mais famosos é o de Rhind, em hierático, datado de 1650 a. C. Leva esse nome em homenagem a Alexander Henry Rhind, que o comprou em 1850 em Luxor, Egito; mas é conhecido também por papiro de Ahmes, por ser este o nome do escriba que o copiou e hoje se encontra no British Museum. Tabletes e papiros indicam como os cálculos eram realizados em cada cultura e dependiam da natureza dos sistemas de numeração adotados. E o desenvolvimento do conceito de número, apesar de motivado por situações concretas, implica um tipo de abstração. Quando falamos isto, é bom distinguir: contar é concreto, mas usar um mes- mo número para indicar quantidades iguais de coisas distintas é um procedi- mento abstrato. Além disso, ao se falar de Matemática babilônica ou egípcia há de se ter em mente que são distintas do conhecimento que temos hoje, inclusive para o uso de termos algébricos ou geométricos. Por exemplo, por volta de 1990, Hoyrup (1990) mostrou que “álgebra babilônica” estava relacionada ao procedimento de “cortar e colar”. 19 UNIDADE A Matemática na Antiguidade Fonte: Wikimedia Commons Normalmente, associa-se à história dos números a necessidade de contagem, relacionada a fatores de subsistência; o exemplo frequente que temos é o de pastores tendo de controlar seus rebanhos de ovelhas e, para tal, fazendo uma relação biunívoca entre pedrinhas e animais. Depois, associar marcas de escrita em argila talvez seja o que estaria na origem dos números. Entretanto, não é possível dizer com certeza, pois as fontes para estudos de civilizações antigas são muito difíceis e fragmentadas; ainda mais quando se referem às práticas orais. Então, se falarmos de registros, temos de abordar o nascimento da escrita. A invenção da escrita não seguiu um percurso linear e sua história vem sendo reescrita desde 1930, com as novas descobertas de tabletes de Uruk, no Iraque, datando cerca de 3.000 a. C., cujos estudos revelaram que os sinais não traziam desenhos de ovelha, mas um círculo e uma cruz. Novas escavações mostraram uma escrita arcaica em pequenos tokens em argila em forma de cunhas, círculos, ovais e triângulos. Estudos revelaram que estes objetos serviam às necessidades da economia e puderam ser armazenados de diferentes maneiras, como colocados dentro de invólucros, ficando assim invisíveis. Mas eram instrumentos para indicar quantidades particulares, como jarras de óleo por ovoides ou pequenas quantidades de grãos por esferas. Fonte: Wikimedia Commons 20 21 A substituição desses tokens por sinais foi o primeiro passo para a escrita. Mas os primeiros numerais não indicavamnúmeros abstratos, mas certa medida, por exemplo, medidas de grãos. Num segundo momento, as marcas representando as quantidades passaram a ser acompanhadas de ideogramas que se referiam aos objetos que estavam sendo contados. Esse foi mais um passo em direção à abstração, pois o registro pode ser usado para quantidades iguais de coisas de naturezas distintas. Os sistemas de numeração, portanto, dependiam do contexto, como pode ser visto nas figuras da imagem a seguir, cujos registros são conhecidos como “protocuneiforme”. Os símbolos não eram números no sentido estrito (abstrato), mas representavam relações numéricas dependendo do que estava sendo contado. 10 3 10 6 5 10 6 10 2 ou 10 610 “36000” “3600” “600” “60” “10” “1” “½” ou “1⁄10” Sistema usado para medir a capacidade de grãos, como cevada. Sistema usado para contar objetos discretos: homens, animais etc. Fonte: Roque, 2012 Pelos estudos, supõe-se que a passagem para a escrita cuneiforme se deu de forma gradual e guardou alguma relação com os símbolos anteriores, conforme figura seguinte. Valor 1 10 60 600 3.600 36.000 Sinal Sinais com mesmos valores de meados do terceiro milênio a. C. Valor 1 10 60 600 3.600 36.000 Sinal Sinais estabilizados no final do terceiro milênio a. C. Fonte: Adaptado de Wikimedia Commons O Sistema Sexagesimal Posicional na Antiga Babilônia O sistema de numeração sexagesimal utilizado pelos escribas babilônios, por volta de 2.000 a 1600 a. C., pode ser visto na figura seguinte, em que os símbolos de “um” se agrupam até chegar a dez e daí há uma troca por outro símbolo; esse processo adi- tivo prossegue até sessenta, que volta a ser representado pelo símbolo do “um”. Então podemos dizer que os antigos babilônios usavam um sistema posicio- nal sexagesimal. 21 UNIDADE A Matemática na Antiguidade Na verdade usavam uma combinação de sistema decimal e sexagesimal. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49 50 51 52 53 54 55 56 57 58 59 60 Fonte: Wikimedia Commons Para os babilônios, os números 1, 60, 3600 e todas as potência de 60 eram representadas pelo mesmo símbolo, como pode ser conferido na tabela a seguir: Cuneiforme Leitura dos símbolos em nosso sistema Valor decimal 1;15 = 1 ⋅ 60 = 15 75 1;40 = 1 ⋅ 60 + 40 100 16;43 = 16 ⋅ 60 + 43 1.003 44;26;40 = 44 ⋅ 3.600 + 26 ⋅ 60 + 40 160.000 1;24;51;10 = 1 ⋅ 216.000 + 24 ⋅ 3.600 + 51 ⋅ 60 + 10 305.470 Fonte: Adaptado de Wikimedia Commons Às vezes, parece que representavam o 60 com o símbolo um pouco maior do que para o 1. Mesmo assim, isto pode dar margem a interpretações dúbias. Por exemplo, o símbolo pode ser lido como (1+1) ou como (1;1), ou seja, como 2 ou 61. No primeiro caso o resultado é obtido de modo aditivo (1+1), no segundo, posicional (1x 60 +1). O mesmo símbolo também pode representar 3.601 (60 x 60 +1) ou 7.200 (60 x 60 + 60 x 60). Bom, algumas vezes era deixado um espaço entre esses símbolos para marcar como se tivesse uma coluna vazia entre eles, o que permitiria distinguir 2 de 3.600, mas não resolveria para o número 7.200. Essa ambiguidade era gerada pela falta de um símbolo para representar o zero, ou uma casa vazia. A diferença podia ser analisada pelo contexto em que apareciam. O período babilônio com mais testemunhos foi do Império Selêucida (300-63 a. C.), que em sua maior expansão incluiu a Anatólia Central, a Mesopotâmia, a Pérsia, o Turquemenistão, o Pamir e algumas partes do Paquistão. Foi grande irradiador da cultura helenística. A astronomia nessa época era muito desenvolvida e empregava técnicas matemáticas sofisticadas. Os astrônomos selêucidas, talvez por necessidade de usar números muito grandes, chegaram a introduzir um símbolo para designar o “ zero” ou coluna vazia. 22 23 No caso de representar o número 3.601, escrevia-se “1; separador; 1”, em que o “separador, era representado por dois traços inclinados”. No entanto, o “ separador” não era utilizado para diferenciar 1, 60 e 3.600, ou seja, não podia ser utilizado como último algarismo, nem como resultado de um cálculo. Portanto, não era exatamente um número. Vale lembrar que o nosso sistema decimal é posicional e também usamos o sistema sexagesimal como unidade de tempo e de grau. Para representar horas, minutos e segundos, por exemplo: 2 horas, 25 minutos e 34 segundos = 2 x 60 x 60 + 25 x 60 + 34 = 8734 segundos. Uma vantagem do sistema sexagesimal é a divisibilidade por inteiros pequenos. A base 12 é presente até hoje no comércio, quando usamos a dúzia, justamente pelo fato de 12 ser divisível por 2, 3 e 4. Outra vantagem é que o número 60 é divisível por todos os inteiros entre 1 e 6, o que facilita o cálculo com seus inversos multiplicativos nessa base. Aliás, todos os divisores de 60, a saber, 2, 3, 4, 5, 6, 10, 12, 15, 20 e 30 têm, na base sexagesimal, seus inversos multiplicativos com representação finita. Uma grande vantagem de sistema posicional em nosso sistema decimal é que poucos símbolos – 0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 – são suficientes para escrever quaisquer números, da massa de um próton até a quantidade de partículas atômicas do universo. Os egípcios e os gregos não adotavam sistemas posicionais. Além disso, podemos representar um número natural qualquer N na base decimal, para a i n e ai n∈{ } ≤ ≤ ≠0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 0 0, , , , , , , , , , N a a a a an n n n n n= + + + + +− − − −10 10 10 10 101 1 2 2 1 1 0 0 Mas isto pode ser feito em qualquer base posicional. Por exemplo: ( ) . . .125 1 60 2 60 5 60 3600 120 5 372560 2 1 0= + + = + + = (base 10) Também podemos ter a representação de um número qualquer N, na base 10, assim representado: N a a a a an n n n m m= + + + + + + +− − − − − −10 10 10 10 101 1 0 0 1 1 parte inteira parte inteira As reticências finais indicam que ele pode não ter representação finita, como no caso das dízimas periódicas, que são infinitas e com período, ou no caso da representação decimal de números irracionais, com representação decimal infinita e sem período. 23 UNIDADE A Matemática na Antiguidade Assim, em nossa notação atual, podemos ter um número N numa base genérica b: N a b a b a b a b a bn n n n m m= + + + + + + +− − − − − − 1 1 0 0 1 1 Os babilônios sabiam fazer contas, como somar, subtrair, multiplicar e dividir. Eles dispunham de tabletes com a mesma função de nossas tabuadas e realizavam as operações nos tabletes que, na multiplicação, incluíam até 59 x 59. Pode acontecer em uma tabela de múltiplos de p ocorrer 1 x p, até 20 x p e depois, 30 x p, 40 x p e 50 x p, daí 37 x p seria calculado como 30 x p + 7 x p. Uma dos mais famosos tabletes é o de Plimptom, que por se encontrar um pouco danificado, implicou interpretações bastante distintas de seus registros, desde sua descoberta. Fonte: Adaptado de Wikimedia Commons Além das operações já citadas, há indícios de que os babilônios também calculavam potências e extração de raízes quadradas, registradas em tabletes. O exemplo mais conhecido encontra-se no tablete YBC 7289, produzido entre 2.000 e 1.600 a. C., em um contexto escolar. O método utilizado era bastante interessante por obter valores bastante aproximados para raízes que hoje sabemos serem números irracionais. Seguem a imagem e o desenho para visualizar os números inscritos nessa tableta. Fonte: Roque & Carvalho, 2012 24 25 O número escrito ao longo da diagonal do quadrado, em notação sexagesimal, é: 1 24 60 51 60 10 60 1 4142129632 3+ + + ≈ , As duas primeiras parcelas já dão uma boa aproximação para a 2 , e diferentes interpretações geométricas foram realizadas por pesquisadores para tentar explicar a aproximação obtida pelos babilônios. Aprofunde seus conhecimentos sobre raiz quadrada ao longo dos séculos. https://goo.gl/vwqODMEx pl or Números e Operações no Antigo Egito Segundo estudiosos,os egípcios desenvolveram um sistema de numeração e uma escrita mais ou menos na mesma época dos babilônios, por volta de 3.000 a. C. Como nós, os egípcios empregavam um sistema decimal, mas, diferente dos babilônios, não era posicional, era aditivo. Veja: 10 100 1.000 100.000 1.000.00010.000 1 2 3 4 5 6 7 8 9 Fonte: Roque & Carvalho, 2012 O sistema de numeração egípcio não é prático para escrever números muito grandes. Por exemplo, o número representado na figura a seguir é: 1.000 + 1.000 + 1.000 + 100 + 100 + 10 + 10 + 10 + 10 + 1 + 1 + 1 + 1 = 3244 Imagine se tivéssemos de representar 1024? Precisaríamos de 10 mil “ deuses”, pois cada “deus” é e 106 e 10 10 10 24 4 6 = . 25 UNIDADE A Matemática na Antiguidade As Frações Egípcias Os egípcios interpretavam a fração somente como uma parte da unidade. Portanto, só frações com “ numerador” 1 (à exceção do 2/3). Mas o sentido não é como o nosso numerador. 1 3 1 12 1 21 Escrita Egípcia Nossa Egípcia Na escrita egípcia, o símbolo oval exprime a palavra “parte”, com sentido ordinal, ou seja, indica que, numa distribuição em “n” partes iguais, tomamos a enésima parte, aquela que conclui a divisão. Por que será que os egípcios teriam restringido as frações deste tipo? Uma limitação ou alguma razão de ser? A fração tem a ver com o procedimento utilizado na divisão. Vejamos no exemplo a seguir: Como expressar 3 7 como uma soma de frações com numerador 1? Vejamos: a) Inverter 3 7 obtendo 7 3 ; b) Tomar o menor inteiro maior do que a fração obtida. Como 2 < 7 3 < 3, o menor inteiro maior que 7 3 é 3; c) 1 3 < 3 7 é a maior fração com numerador 1 menor do que 3 7 ; d) Encontrar a diferença 3 7 1 3 2 21 − = , logo, 3 7 1 3 2 21 = + ; e) Repetir o processo para (Faça você mesmo!); f) O resultado será: 3 7 1 3 1 11 1 231 = + + . Grande parte do conhecimento matemático do antigo Egito é proveniente de antigos hieróglifos, contendo problemas matemáticos com suas resoluções. Entre eles, encontra-se o Papiro de Rhind (ou papiro de Ahmes). Escrito em hierático (escrita sacerdotal), o papiro contém 87 problemas matemáticos, na sua maioria, que dizem respeito a problemas do cotidiano dos egípcios. Os primeiros problemas eram do tipo: Problema 3: Reparta seis pães por 10 homens, cuja solução dada é 1 2 1 10 + (que pode ser resolvido pelos método que acabamos de ver). 26 27 Já os problemas 24 ao 29 são diferentes destes e se tratam de problemas hoje dito algébricos, relacionados à resolução de equações lineares da forma x + ax = b ou x + ax + bx = c, com a, b, c conhecidos e a incógnita, chamada pelo escriba de aha. Vejamos um exemplo: Problema 24 Uma quantidade mais um sétimo dela resultam em 19. Qual a quantidade? Solução Na forma atual, o problema pode ser descrito como x x + = 7 19 . Mas a solução do escriba é da forma que hoje denominamos método da falsa posição, cujo procedimento é aritmético, como segue: Suponha x = ⇒ + = = =7 7 7 7 7 1 8 (onde representa o aha egípcio e o valor assumido inicialmente é qualquer, um “chute”, em geral usa-se, como nesse caso, o próprio denominador 7). Agora, divide-se o valor do enunciado à direita da igualdade pelo valor encontrado pelo método da falsa posição, obtendo 19 8 . Reduzindo a fração encontrada em frações unitárias, tem-se: 19 8 2 1 4 1 8 = + + . Depois disso, multiplica-se o valor encontrado pelo “falso valor” atribuído ao problema: 7 2 1 4 1 8 14 7 4 7 8 16 1 2 1 4 + + = + + = + + . Portanto, aha é igual a 16 1 2 1 4 + + que, em notação atual vale 133 8 . Conferindo, em notação atual: 133 8 1 7 133 8 7 133 1 133 7 8 8 133 7 8 133 7 19+ ⋅ = + = = = . . . . . . Vale observar que as técnicas para uma mesma operação na Mesopotâmia e no Egito eram diferentes e devem ter sido motivadas por necessidades práticas de cada povo. Ao passo que os mesopotâmios empregavam tabelas de produtos, de inversos e de raízes, os egípcios usavam sequências de duplicações ou divisões por 2, e inversões. Mas em ambos os casos, as tabelas estavam presentes, para auxiliar na memorização ou facilitar os cálculos. Assim, as contas não são fáceis ou difíceis por si mesmas: o que pode ser considerado fácil ou difícil depende do que pode ou não ser realizado por certa técnica. De toda forma, o contexto prático, ligado à adminis- tração de bens, foi uma das motivações para a invenção da Matemática e os sistemas de numeração, bem como suas técnicas, transformaram-se por diversas razões. As ferramentas e técnicas operatórias podem corresponder às necessidades cotidianas ou inerentes às próprias práti- cas matemáticas. Veja mais sobre sistemas de numeração no Material Complementar. 27 UNIDADE A Matemática na Antiguidade Uma Observação Acerca da Geometria para esses Povos A “Geometria” dos babilônios e egípcios era essencialmente uma Geometria métrica, preocupada em calcular comprimentos, áreas e volumes. Ainda assim, uma Geometria métrica diferente da que temos hoje, pois usavam alguns conceitos de outra maneira. Por exemplo, os babilônios, que sempre escreviam no sistema sexagesimal, para encontrar a área de um círculo, mesmo conhecendo o diâmetro, utilizavam no cálculo o comprimento da circunferência (que limita o círculo); algo como, em notação usual, A S= 1 4 2 π e tomavam “p = 3”, cujos resultados são bem aproximados, mas o que não significa que tinham o mesmo conceito atual, em que é uma constante de proporcionalidade, mas para os babilônios significava “triplica”. Mesmo assim, faziam cálculos bastante sofisticados. No Egito, a Geometria também significava o cálculo de áreas e volumes. Por exemplo, a área de um retângulo era calculada multiplicando sua base pela altura (há exemplos disso no papiro de Moscou), mas há divergências entre os estudiosos sobre a maneira como os egípcios calculavam a área de um triângulo. Mais precisamente, a dúvida é se eles calculavam a área do triângulo tomando a metade da base pela altura ou a metade da base pelo lado, o que dessa última maneira, só estaria correto se o triângulo fosse retângulo. De toda forma, os problemas babilônios e egípcios são muitas vezes artificiais, modelos simplificados de situações reais, propostos para exercitar ou verificar a habilidade dos escribas. A Matemática na Grécia Antiga Costumamos ler que a geometria surgiu às margens do Nilo, devido à necessidade de medir a área das terras a serem redistribuídas, após as enchentes do rio, entre os que haviam sofrido prejuízos. Essa hipótese talvez tenha sua origem nos escritos de Heródoto, datados do século V a. C.: Quando das inundações do Nilo, o rei Sesóstris enviava pessoas para inspecionar o terreno e medir a diminuição dos mesmos para atribuir ao homem uma redução proporcional de impostos. Aí está, creio eu, a origem da geometria, que migrou, mais tarde, para a Grécia (Heródoto, 109, apud ROQUE, p.183, 2012). Por outro lado, em sua obra Metafísica, Aristóteles afirma que a Matemática surgiu em lugares onde as pessoas dispunham de lazer e essa seria a razão de ela ter surgido no Egito, pois lá a casta de sacerdotes tinha permissão de desfrutar o lazer. 28 29 No entanto, a História tradicional relata que um dos primeiros matemáticos gregos foi Tales de Mileto, que teria vivido nos séculos VII e VI a. C. e sido influenciado pelos mesopotâmicos e egípcios. Um de seus feitos teria sido o cálculo da altura de uma das pirâmides do Egito, a partir da semelhança entre a relação da altura desta e sua sombra. E a Matemática pitagórica, desenvolvida na primeira metade do século V a. C., teria feito a transição entre as épocas de Tales e Euclides. A verdade é que os me- sopotâmios e egípcios realizavam cálculos com medidas de comprimento, áreas e volumes; contudo, essas práticas eram bem diferentes da Geometria grega nas prá- ticas de medidas, bastando eleger uma unidade e elas se transformam em números. Era assim também queos gregos faziam. Portanto, não há comprovação clara de que a geometria grega era teórica e fundada em argumentações e demonstrações. O tipo de pensamento matemático por volta do século V a. C. tem relação com o contexto grego da época. Como já vimos na Unidade anterior, por volta do século VII a. C., o crescimento populacional e a dispersão dos gregos pela bacia do Mediterrâneo deram origem a mais importante instituição da antiguidade grega – a pólis – a cidade-Estado grega, que foi determinante para a organização política, administrativa, religiosa e militar da Grécia durantes os séculos V e VI a. C. Nesse período, a vida pública adquiriu suma importância para os gregos, o que refletiu no debate político na Ágora, nas trocas comerciais, na laicização e consequente expansão da religiosidade para o espaço externo, até então assunto tido como privado e restrito ao interior dos templos, e na organização racional e geométrica do território. Assim, o pensamento racional foi se constituindo e ganhou impulso nesse ambiente. Surgiu a Grécia que aprendeu a persuadir, a argumentar. Por outro lado, o ceticismo deu origem a um esforço em mostrar que verdade e verossimilhança são coisas diversas. Platão e Aristóteles, ao final do século V, buscaram propor maneiras de selecionar afirmações que alguém poderia fazer, distinguindo os raciocínios falsos dos corretos e estabelecendo critérios de verdade. Platão afirmou que o novo tipo de pensamento permitia distinguir os seres inteligíveis de suas cópias no mundo sensível. No discurso de Sócrates estava presente a dialética, modo de argumentação que se servia das ideias para ultrapassar opiniões; a distinção entre retórica e dialética marcou a educação do cidadão livre. Mais tarde, Aristóteles desenvolveu uma lógica na qual os critérios de verdade estão ligados à pura coerência, ao rigor e à demonstração. Platão e Aristóteles se serviram da Matemática para constituir esse novo ideal de pensamento. O conhecimento que temos da Matemática grega dessa época é, em grande parte, indireto, oriundo dos escritos de Platão e Aristóteles, algumas evidências de fragmentos atribuídos a Eudemo de Rhodes e de outras fontes tardias, como Pappus e Proclus. 29 UNIDADE A Matemática na Antiguidade Supõe-se que o “catálogo de geômetras” dos comentários de Proclus é proveniente dos escritos de Eudemo, pupilo de Aristóteles, que mencionava proposições e construções realizadas por Tales. Ao final do século VII a. C., realizações tecnológicas podem ter contribuído para o desenvolvimento da Matemática. Alguns termos de geometria apareciam na Arquitetura e também relacionados à Astronomia e calendário. Neles apareciam alguns conceitos geométricos como círculos e ângulos. Um exemplo de instrumento técnico que parece ter sido comum a partir do século V a. C. é o gnomon, dispositivo do relógio solar destinado a produzir sombras no chão. A variação de tamanho da sombra nos dias mais curtos e mais longos do ano sugeria o estudo de solstícios e equinócios. O gnomon pode ter tido um importante papel no início da Geometria grega. No entanto, é difícil estabelecer as bases factuais. O papel de Tales foi objeto de controvérsias. Parece que de fato por volta do século V seu nome era associado a resultados geométricos e o fato de Aristóteles ter afirmado que Tales é o fundador da Filosofia, pode ter ajudado a atribuir ao filósofo de Mileto importantes descobertas geométricas. Entre Tales e Euclides, a historiografia da Matemática costuma trazer as contribuições da escola pitagórica do século V a. C. Os ensinamentos dessa escola teriam influenciado outro matemático importante desse século, Hipócrates de Quios. Além disso, é frequente encontrar referências a Pitágoras como um dos primeiros matemáticos gregos, mas havia uma Matemática grega antes dele. Parecia haver construção de soluções de problemas geométricos e a comparação de grandezas geométricas por meio de razões. Das evidências, mesmo que poucas, podemos deduzir que havia uma intensa prática geométrica na primeira metade do século IV a. C. Presume-se que no século V a. C., em Atenas, a Geometria era ensinada, embora não saibamos como. Sabe-se que, por volta de 375 a. C., Platão começou a criticar os geômetras por não empregarem o rigor desejável nas práticas matemáticas, mas isto evidencia mais que Platão expressa o descontentamento dos filósofos com os métodos empregados, clamando que se dediquem a formalizar os conceitos e técnicas utilizadas indiscriminadamente na Matemática da época. No século V a. C., o pensamento geométrico e técnico estava desenvolvido, mas não dá para saber se os pitagóricos contribuíram com isso, pois há uma lacuna na análise crítica da Matemática da escola pitagórica. 30 31 Sabe-se que a Geometria grega começou antes e continuou depois, mas esta Escola não parece ter tido papel significativo na transformação da Matemática de seu tempo. Quanto à descoberta dos incomensuráveis ter criado uma crise propalada por alguns historiadores que só seria resolvida depois, com a definição rigorosa dos números reais proposta por Cantor e Dedekind no século XIX, parece ser um mito. A descoberta das grandezas incomensuráveis, frequentemente atribuída a um pitagórico, pode ter tido outras origens. De qualquer forma, essa descoberta contribuiu para a separação entre Geometria e Aritmética, a primeira dedicada a grandezas geométricas e a segunda aos números. Esta separação é um dos traços marcantes da Geometria grega, pelo menos da maneira como se disseminou com Euclides. Isto não significa minimizar a importância da descoberta de duas grandezas não terem medidas em comum, pois é um fato que desafia a intuição. Como consequência desse fato, identifica-se a busca em fundar uma Geometria com bases mais sólidas do que aquela fornecida pela intuição, sem desmerecer a importância desta na Geometria. Com Euclides, a Matemática grega parece ter adquirido uma configuração particular, empregando enunciados geométricos gerais que não envolvem somente procedimentos de medidas. Os Elementos de Euclides representam, nesse contexto o resultado dos esforços de formalização para apresentar uma Geometria consistente e unificada, válida para quaisquer grandezas, comensuráveis ou não. Os Pitagóricos Pitágoras é comumente tido como pai da Matemática grega, mas sua teoria de números era concreta, baseada em manipulações de números figurados. Sua Aritmética era indutiva e não continha provas, possibilitando obter grafica- mente generalização sobre sequências de números, mas as regras para obter essas sequências, como a de números quadrados, eram desenvolvidas para uso prático. O diferencial era a reverência dedicada aos números pelos pitagóricos. As propriedades dos números eram associadas a forças cósmicas e, portanto, não podiam ser consequências lógicas de sua estrutura, o que para eles banalizaria as propriedades. A concepção de Pitágoras sobre a natureza baseava-se na ideia de que há uma explicação global que permite simbolizar a totalidade do Cosmo, e essa explicação era devida aos números. Os números figurados dos pitagóricos eram constituídos de uma multiplicidade de pontos, que não eram pontos matemáticos, mas objetos concretos, como pedrinhas, por exemplo. 31 UNIDADE A Matemática na Antiguidade 1 3 6 10 Números triangulares 1 4 9 16 Números quadrados Números pentagonais Dessas configurações numéricas, os pitagóricos tiravam, de forma visual, diversas conclusões aritméticas, como, por exemplo: a) Todo número quadrado é a soma de dois números triangulares: Fonte: Em nossa linguagem matemática atual, teríamos: n n n n n2 1 2 1 2 = +( ) + −( ) ; b) É possível passar de um número quadrado ao número quadrado ime- diatamente maior adicionando-se a sequência de números ímpares, que na figura são dados pelos contornos em forma de L: 32 33 Em nossa linguagem matemática atual, teríamos: 12 + 3 = 22 22 + 5 = 32 ... n2+ (2n + 1) = (n + 1)2 O problema de encontrar as hoje denominadas “triplas pitagóricas” se resume em encontrar dois números quadrados cuja soma também seja um número quadrado. Provavelmente, os pitagóricos chegaram a essas triplas por meio do gnomon, que era o sinônimo dos números ímpares. Os gnomons eram representados pelas figuras em L. O exemplo clássico é para obter o 4, acrescentamos o gnomon 3, e para obter o 9, acrescentamos o gnomon 5. Continuando dessa maneira, chegamos a uma figura cujo gnomon também é um número quadrado, de 9 pontinhos, ou seja, a igualdade 16 + 9 = 25 corresponde à tripla pitagórica (3, 4, 5). Apesar do conhecido hoje “Teorema de Pitágoras”, não se conhece nenhuma prova desse teorema que tenha sido fornecida por algum pitagórico. Além disso, esse teorema, para os pitagóricos, não deveria ser um resultado geométrico. A Matemática atribuída a Pitágoras é a aritmética de pontinhos, mas não se sabe ao certo se ela é uma criação de um matemático chamado Pitágoras, de integrantes de uma escola antiga chamada pitagórica (mas não de Pitágoras), ou dos neoplatônicos e neopitagóricos da Antiguidade, como Jâmblico e Nicômaco. Os geômetras que melhor conhecemos antes de Euclides foram Hipócrates de Quios (470-410 a. C.) e Demócrito (460-370 a. C.). As chamadas lúnulas de Hipócrates, que fornecem o primeiro exemplo de linhas curvas cujas áreas limitadas foram encontradas, podem ter surgido do problema de encontrar a quadratura do círculo. Para os matemáticos gregos, fazer a quadratura de uma região do plano significa construir um quadrado “igual” ao círculo. A quadratura do círculo, bem como a duplicação do cubo e a trissecção do ângulo, são três problemas clássicos da Matemática que, aliás, teriam de ser realizadas com régua e compasso. Hipócrates tratou da quadratura do círculo tentando primeiro um caso mais simples: - A palavra lúnula tem a sua origem no termo latim lunar – com a forma da Lua. As lúnulas são regiões planas delimitadas por arcos de diferentes circunferências. Considera-se que o estudo de Hipócrates sobre a quadratura das “luas” foi, provavelmente, uma tentativa para chegar à quadratura do círculo. Hipócrates parece ter utilizado uma propriedade simples dos setores circulares: a razão entre as áreas de dois setores cujos ângulos centrais são congruentes é igual à razão entre os quadrados dos comprimentos de suas respectivas cordas. 33 UNIDADE A Matemática na Antiguidade O1 O2 D B O A C Fonte: Revista do Professor de Matemática, 2013 Se A1 e A2 são as áreas dos setores circulares OAB e OCD (como também dos triângulos AOB e COD, retos em O), então temos: A A AB CD 1 2 2 2= ( ) ( ) . Essa razão é também a razão entre as áreas dos correspondentes setores circulares de cordas e AB CDe . O primeiro exemplo estudado por Hipócrates trata da quadratura das lúnulas cons- truídas sobre os lados de um triângulo retângulo isósceles, como na figura a seguir: C F A D B E Fonte: Revista do Professor de Matemática, 2013 A hipotenusa e o lado do triângulo ABC são tais que AB2 = 2AC2. A estratégia de Hipócrates é simples e criativa: se juntarmos ao triângulo retângulo isósceles (de área At) as duas semicircunferências menores (de área A1 cada) e retirarmos a semicircunferência maior (de área A2), o que resulta são as duas lúnulas (de área AL cada). Portanto, temos: 2AL = At + 2A1 – A2. Mas, como de AB 2 = 2AC2, temos que A2 = 2A1, logo 2AL = At. E a área de uma lúnula AL será a metade da área do triângulo ABC, ou ainda igual à área do triângulo ACD. Segundo Estrada et al (2000), as quadraturas de Hipócrates são conhecidas por meio dos comentários de Simplício (século VI d. C.) à Física, de Aristóteles, que contém duas importantes citações de autores mais antigos, Eudemo de Rodes (século IV a. C.) e Alexandre de Afrodísia (século II-III d. C.). O relato de Simplício advém de ser o único texto hoje disponível, com conteúdo efetivamente matemático, anterior aos Elementos de Euclides. Simplício transcreve seis quadraturas da autoria de Hipócrates, duas no texto de Alexandre e as outras no de Eudemo, que se assentam no seguinte resultado: a razão entre as áreas de dois círculos é a razão entre as áreas dos dois quadrados, cujos lados são diâmetros desses círculos. 34 35 No entanto, embora Simplício não dê indicação do modo de demonstração de Hipócrates, cuja primeira prova que se tem registro aparece nos Elementos de Euclides, atribuída a Eudoxo de Cnido, no seu relato, Simplício faz supor que Hipócrates usa a relação pitagórica de proporcionalidade. Vejamos outro tipo de demonstração, usando essa proporcionalidade. Considere a representação da figura: A B E C D a1 a2 a3 Lembremos que a razão entre as áreas de dois setores cujos ângulos centrais são congruentes é igual à razão entre os quadrados dos comprimentos de suas respectivas cordas. Observe que ambos os ângulos centrais que compreendem os setores circulares a1 (= a2) e a4das duas circunferências, respectivamente a menor e a maior, são retos. Se o raio da circunferência menor é r, o raio da circunferência maior é R r= 2 . Logo, temos: a a R r r r a a1 4 2 2 2 2 4 1 2 2 4 1 2 2= ( ) = = ⇒ = Como a1 = a2, sendo AL a área da lúnula, temos: A a a a a a a a r r rl = + + = + = + ( ) =1 2 3 1 3 4 3 22 2 2 Logo, a área da lúnula é igual à área do quadrado de lado r. 35 UNIDADE A Matemática na Antiguidade Fonte: Wikimedia Commons Não confundir Hipócrates de Quios (ou Clios) com Hipócrates de Cós, considerado pai da Medicina, autor do juramento hipocrático. Ao longo de mais de dois mil anos, as lúnulas de Hipócrates foram as únicas “luas” cuas quadraturas eram conhecidas e podiam ser realizadas com conhecimentos de ensino médio. A expansão do mundo árabe, a partir do século VIII, permitiu o contato com o conhecimento dos períodos clássicos e helênicos, bem como o surgimento de importantes centros de estudos na península ibérica, no Oriente Médio e no Egito. Um dos nomes que se destacou no mundo árabe, segundo Galvão e Souza (2013), foi IbnAl-Haythan (965-1040) que, reproduzindo os argumentos de Hipócrates, exibiu a quadratura da reunião de lúnulas limitadas por semicircunferências construídas sobre os lados de um triângulo retângulo qualquer, como indica a figura a seguir: Fonte: Revista do Professor de Matemática, 2013 A soma das áreas de duas lúnulas construídas a partir de dois lados de um triângulo inscrito numa semicircunferência é igual à área do triângulo. 36 37 A relação entre as áreas, nesse caso, obedece ao que conhecemos por Teorema de Pitágoras. Afora essa pequena contribuição de IbnAl-Haythan, avanços na so- lução do problema de quadraturas de lúnulas só vieram a ocorrer no século XVIII, como os avanços da trigonometria e obtenção de fórmulas gerais para senos e cos- senos de arcos múltiplos, dados por Viète, ao final do século XVII, que permitiram a Wallenius, em 1766, e a Euler, em 1772, que exibissem dois novos exemplos. Para acessar a parte da Revista do Professor de Matemática, n. 82, que traz esse tema. https://goo.gl/irzXCLEx pl or Euclides e os Elementos Pouco se sabe sobre a vida de Euclides, nem é mesmo comprovado que tenha nascido em Alexandria, como se afirma com frequência. Há evidências, contudo, de que seja autor, além dos Elementos, de outras obras de Matemática, sobre lugares geométricos, cônicas e outros assuntos. Os Elementos são um conjunto de treze livros publicados por volta do ano 300 a. C., mas não se tem registros da obra original, somente versões e traduções tardias. Um dos fragmentos mais antigos, de uma dessas versões, foi encontrado entre diversos papiros gregos em Oxyrhynque, cidade às margens do Nilo, datado, provavelmente, dos anos 100 d. C. Para os gregos os elementos de uma ciência constituíam as proposições fundamentais, com as quais seria possível deduzir outras. Não tinham de ser enciclopédicos, mas mostrar uma escolha judiciosado que é demonstrado. A obra de Euclides tem sido estudada exaustivamente, tentando descobrir os teoremas que são devidos a Euclides e quais são de matemáticos anteriores a ele, analisando-se o encadeamento lógico das proposições, procurando reconstruir o texto original e cada época tem um ponto de vista predominante, o que faz com que nossa compreensão desse livro se transforme. Estudos atuais indicam que algumas interpolações foram inseridas depois de Euclides, em publicações posteriores. A obra se compõe de 13 “livros”, ou seja, 13 capítulos, que se dividem nos seguintes temas: Geometria Plana (Livros I-VI), Aritmética (Livros VII-IX) e Geometria Espacial (Livros XI-XIII). Aparentam não ser organizados de modo cronológico; acredita-se que os livros VII a IX – os livros aritméticos atribuídos aos pitagóricos – sejam os mais antigos. Os livros de I a IV não usam nenhuma ideia de proporção, ou seja, não empregam a versão de igualdade entre razões, o que poderia ser um indício de terem sido escritos depois da descoberta dos incomensuráveis, responsáveis por um divórcio entre o universo das grandezas e o universo dos números. 37 UNIDADE A Matemática na Antiguidade Logo, a possibilidade de existirem grandezas incomensuráveis tornou necessária uma nova teoria das razões e proporções e um novo conceito de proporcionalidade independente da igualdade de números. Alguns pesquisadores afirmam que o livro V trata de resultados mais recentes que os outros, contendo definições de razões e proporções válidas para todos os casos que evitam a identificação de grandezas com números. Euclides adota nos Elementos o método axiomático-dedutivo, no qual, partindo de alguns fatos aceitos como evidentes e intuitivos, chamados de definições, postulados e axiomas, demonstram-se as consequências, dita teoremas, ou se constroem figuras baseadas nos postulados, axiomas e resultados já demonstrados. Vejamos alguns exemplos: Proposição I-47 Nos triângulos retângulos, o quadrado sobre o lado que se estende sob o ângulo reto é igual aos quadrados sobre os lados que contêm o ângulo reto. Veja, a seguir, demonstração deste teorema, segundo Euclides: “Veja, a seguir, demonstração deste teorema, segundo Euclides: Teorema de Pitágoras, Elementos de Euclides, p. 349-350, v. 1 http://goo.gl/uyQH1q Ex pl or Teorema de Pitágoras, Elementos de Euclides PROPOSIÇÃO 47, Livro I dos Elementos de Euclides Proposição ou enunciado Em triângulos retângulos o quadrado sobre o lado que subentende o ângulo reto é igual aos quadrados sobre os lados contendo o ângulo reto. Exposição ou hipótese Seja ABC um triângulo retângulo tendo o ângulo BAC reto; Determinação ou explicação Eu digo que o quadrado sobre BC é igual aos quadrados sobre BA, AC. Construção ou preparação Pois sejam descritos sobre BC o quadrado BDEC, e sobre BA, AC os quadrados GB; [I.46] por A seja AL traçada paralela a BD ou CE, e sejam unidas AD,FC. Então, como cada um dos ângulos BAC e BAG é reto, segue que da linha reta BA e do ponto A sobre ela, as duas linhas retas AC, AG não ficam do mesmo lado, fazem os ângulos adjacentes iguais a dois ãngulos retos; portanto, CA está em linha reta com AG. [I.14] Por essa mesma razão, 38 39 PROPOSIÇÃO 47, Livro I dos Elementos de Euclides Demonstração Método da equivalência de áreas BA está também em linha reta com AH. E, como o ângulo DBC é igual ao ângulo FBA, pois cada um deles é reto, seja o ângulo ABC adicionado a cada um deles; portanto, o ângulo DBA é igual ao ângulo FBC. [N.C.2] E, como DB é igual a BC e FB à BA, os dois lados AB, BD são iguais aos dois lados FB, BC respectivamente, e o ângulo ABD é igual ao ângulo FBC; portanto a base AD é igual à base FC; e o triângulo ABD é igual ao triângulo FBC. [I.4] Mas o paralelogramo BL é o dobro do triângulo ABD, pois eles têm a mesma base BD e estão entre as mesmas paralelas BD e AL. [I.41] E o quadrado GB é o dobro do triângulo FBC, pois eles têm a mesma base FB e estão entre as mesmas paralelas FB e GC. [I.41] [Mas o dobro de iguais são iguais entre si.] Portanto o paralelogramo BL é também igual ao quadrado GB. Similarmente, se AE, BK forem unidos, pode também ser provado que o paralelogramo CL é igual ao quadrado HC; portanto, o quadrado BDEC é igual aos dois quadrados GB,HC. [C.N.2] Conclusão E o quadrado BDEC foi descrito sobre BC, e os quadrados GB, HC sobre BA, AC. Portanto o quadrado sobre o lado BC é igual aos quadrados sobre os lados BA, AC. Portanto, etc. Q.E.D Fonte: PUC-Rio Antifairese e a Incomensurabilidade A palavra antifairese, etimologicamente, seria uma aproximação de Antho- hypo-hairesis, que significa literalmente subtração recíproca. Uma das hipóteses mais confiáveis, defendida por alguns historiadores, é a de que o método da antifairese estava na base de uma teoria das razões e proporções que era praticada, pelo menos, durante o século IV a. C., e que teria sido desenvolvida por Teeteto, matemático contemporâneo de Platão e pertencente ao seu círculo. O conhecimento do procedimento de antifairese é dado como certo por vários historiadores, vez que no desenvolvimento dos Livros VII-IX dos Elementos esse processo é aplicado a números inteiros. Por exemplo, 28:6 significa que temos de subtrair 6 de 28 quatro vezes, restando 4; daí, subtraímos 4 de 6, uma vez, restando 2; por fim, subtraímos 2 de 4, exatamente duas vezes. A sequência: quatro vezes, uma vez e duas vezes representa o número de subtrações que se pode fazer a cada passo e pode ser assim indicada Ant(28:6) = [4,1,2]. Não se sabe, ao certo, quando a incomensurabilidade entre duas grandezas foi verificada pela primeira vez e parece improvável que o método da antifairese tenha sido o responsável por essa descoberta. 39 UNIDADE A Matemática na Antiguidade Segundo Roque, Proclus afirmou que: A teoria das grandezas comensuráveis foi desenvolvida, primeiramente, pela aritmética e, depois, por imitação, pela geometria. Por essa razão, ambas as ciências definem grandezas comensuráveis como aquelas que estão uma para outra na razão de um número para outro número, o que implica que a comensurabilidade existiu primeiro entre os números (ROQUE, 2012, p.120). Isso indica que os matemáticos já tinham uma noção da incomensurabilidade para números, tendo a unidade como medida de todos os números. Teriam estendido tal noção para grandezas, mas não puderam encontrar uma medida comum entre elas. Teria sido necessário o uso da técnica da antifairese para que se fundasse uma nova teoria das razões, independente da igualdade entre números. O método da antifairese teria sido usado para desenvolver uma teoria de razão independente da noção de proporção. Três noções distintas estariam presentes na tradição grega: uma da Teoria Musical, outra da Astronomia (que teria servido de base para o livro V, cronologicamente posterior, e que apresenta a teoria de proporções de Eudoxo) e o método baseado na antifairese. A Proposição X-2 dos Elementos sugere que os incomensuráveis eram compreendidos a partir de um procedimento de antifairese: Caso sendo subtraída, de duas magnitudes [expostas] desiguais, sempre por sua vez a menor da maior, a que é deixada nunca meça exatamente a antes de si mesma, as magnitudes serão incomensuráveis. A possibilidade de existirem grandezas incomensuráveis não teria, assim, repre- sentado nenhum tipo de escândalo ou crise nos fundamentos da Matemática grega. Ao contrário, a existência da incomensurabilidade seria uma circunstância positiva, pois seria responsável pelo desenvolvimento de novas técnicas matemáticas para lidar com razões e proporções. Segundo algumas fontes, no período pré-euclidiano as grandezas eram classificadas como comensuráveis em comprimento ou em potência (mais especificamente, potências quadráticas). Isso significa que duas grandezas incomensuráveis, como o lado e diagonal do quadrado, apesar de não serem comensuráveis em comprimento,são comensuráveis em potência, pois seus quadrados são comensuráveis. Os matemáticos gregos que trabalhavam com Aritmética no final do século V a. C. conheciam o procedimento da antifairese e o modo de empregá-lo no tratamento de alguns segmentos incomensuráveis. No entanto, segundo Roque (2012), esses resultados não eram percebidos como uma prova de incomensurabilidade, vez que o objetivo da antifairese era o de aproximar razões entre segmentos incomensuráveis. 40 41 Um dos primeiros exemplos a apresentar a possibilidade de duas grandezas incomensuráveis teria sido o problema de usar o lado para medir diagonal de um quadrado, o que exige conhecimentos de Geometria. Autores do século IV a. C., como Platão e Aristóteles, tratam a incomensurabilidade no contexto de comparação entre o lado e a diagonal do quadrado e citam Teeteto e Teodoro, anteriores a eles, deixando aberta a possibilidade desse conhecimento ser anterior. Revisitando a descoberta dos incomensuráveis na Grécia Antiga. Matemática Universi- tária, nº.47. Disponível em: https://goo.gl/ozPqdYEx pl or A Teoria das Proporções de Eudoxo Euclides, nos Elementos, apresenta dois tipos de teoria das proporções. Uma versão no livro VII que pode ser aplicada somente à razão entre inteiros, que é atribuída aos pitagóricos e pode ser facilmente estendida para razões entre grandezas comensuráveis. E a segunda versão, presumidamente posterior à primeira, contida no livro V, atribuída ao matemático platônico Eudoxo de Cnido (408-355 a. C.). Esta teoria das proporções é bastante sofisticada e se aplica igualmente a grandezas comensuráveis e incomensuráveis. A teoria das proporções de Eudoxo torna desnecessário um desenvolvimento de uma teoria de razões, pois dadas quatro grandezas homogêneas, A, B, C e D, permite decidir se elas formam uma proporção, denotada por A : B :: C : D, mesmo sem dar nenhuma interpretação para as razões A : B e C : D. Desse modo, mesmo que na definição se tenha que são chamadas proporcionais as grandezas que tenham a mesma razão, o critério para comparação não consiste em calcular cada uma das razões e compará-las. Processos Infi nitos e Área do Círculo: O Método da Exaustão No estudo de áreas curvilíneas, em torno do problema da quadratura do círculo, os métodos usados por Arquimedes indicam uma influência de Eudoxo. O método de Eudoxo, do século V a. C., consistia em inscrever polígonos regulares em uma figura curvilínea, como um círculo, e ir dobrando o número de lados até que a diferença entre a área da figura e a do polígono inscrito se tornasse menor do que qualquer quantidade dada. 41 UNIDADE A Matemática na Antiguidade Arquimedes de Siracusa (287-212 a. C.) propôs um refinamento desse método, comprimindo a figura entre duas outras cujas áreas mudam e tendem para a da figura inicial, uma crescendo e outra decrescendo. A área de um círculo, por exemplo, era envolvida por polígonos inscritos e circunscritos, de modo que, aumentando-se o número de lados, suas áreas se aproximavam da área da circunferência. Por essa razão, afirma-se que Arquimedes usava um método indireto para a medida da área de figuras curvilíneas. No século XVII, esse tipo de procedimento ficou conhecido como “método da exaustão”. No entanto, essa nomenclatura não é a mais adequada, vez que o método se baseia justamente no fato de que o infinito não pode ser levado à exaustão, isto é, não admite ser exaurido – pois por mais que nos aproximemos, nunca chegamos até ele. O método de exaustão é também conhecido por Princípio de Eudoxo- Arquimedes, por ter na sua base a teoria das proporções apresentada por Eudoxo e por Arquimedes ter sido o matemático que maior visibilidade lhe deu. Método da Exaustão dos Antigos: o princípio de Eudoxo-Arquimedes. https://goo.gl/fLl3mHEx pl or Concluindo Vimos quais foram os indícios dos primeiros processos de contagem de povos ancestrais, os sistemas de numeração da Babilônia e do Antigo Egito, estabelecendo a relação com o nosso sistema decimal e sexagesimal. Da Antiga Grécia, falamos das evidências da prática geométrica como preponderante do pensamento matemático grego. Abordamos o pensamento dos pitagóricos, o trabalho com as lúnulas de Hipócrates, a importância da obra Os Elementos, de Euclides. Comentamos rapidamente sobre o método da antifairese, bem como o conceito de proporção de Eudoxo, para deixar uma noção de como os gregos contornavam o trabalho com os incomensuráveis, sem que isto fosse necessariamente um grande problema, como costuma ser retratado. Espero que tenham aproveitado bem lembrando que daremos continuidade a esse estudo nas próximas unidades. 42 43 Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Vídeos Tópicos de História da Matemática: Os elementos de Euclides João Bosco Pitombeira de Carvalho – PROFMAT. Tópicos de História da Matemática: Os elementos de Euclides. https://youtu.be/D0gE1PpS0BQ Tópicos de História da Matemática : Apolônio e as Cônicas https://youtu.be/SNaBitYMxhA Leitura As Origens da Matemática – Dos Processos de Contagem aos Sistemas de Numeração Texto professora Maria Elisa Esteves Lopes Galvão (IME-USP). https://goo.gl/X4HW9c As Mais Antigas Evidências Conhecidas do Emprego de Talhas Numéricas Associadas a Processos de Contagem Texto professor Manoel de Campos Almeida. https://goo.gl/82ciQI A Matemática no Egito e na Mesopotâmia https://goo.gl/gZfIHo Os Babilônios e a Equação de Terceiro Grau https://goo.gl/So2zvI Antigas Técnicas de Multiplicação https://goo.gl/IrLWjY Diálogo Sócrates, Menon e o Escravo https://goo.gl/y91A7F https://goo.gl/FS4vLg Elementos: Algumas Considerações https://goo.gl/HsQufq Sobre Pitágoras e o Teorema Hipertexto Pitágoras. https://goo.gl/t06jLB A Raiz Quadrada ao longo dos Séculos https://goo.gl/rL3d22 43 UNIDADE A Matemática na Antiguidade Referências BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Parâmetros Curriculares Nacionais PCN + Ensino Médio: ciências da natureza, Matemática. Brasília: MEC, s.d. Dis- ponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/CienciasNatureza.pdf>. D’AMBROSIO, Ubiratan. A História da Matemática: questões historiográficas e políticas e reflexões na Educação Matemática. In: BICUDO, Maria Aparecida Viggiani (Org.). Pesquisa em Educação Matemática: Concepções & Perspectivas. São Paulo: UNESP, 1999. p. 97-115. Disponível em: <http://cattai.mat.br/site/ files/ensino/uneb/pfreire/docs/HistoriaDaMatematica/Ubiratan_DAmbrosio_ doisTextos.pdf>. ROQUE, Tatiana. História da Matemática: uma visão crítica, desfazendo mitos e lendas. Rio de Janeiro: Zahar, 2012. ________. Contribuições para uma história da noção de modelo: aspectos metodológicos e direções de pesquisa. Revista Brasileira de História da Matemática, Campinas, v. 11, n. 23, p.53-62, 2011. Disponível em: <http:// www.rbhm.org.br/issues/RBHM%20-%20vol.11,no23/6%20-%20Tatiana.pdf>. SANTOS, Luciane Mulazani dos. Tópicos de história da Física e da Matemática. Curitiba: InterSaberes, 2013. (e-book) ZALESKI FILHO, Dirceu. Matemática e Arte. Belo Horizonte: Autêntica, 2013 ALMEIDA, M. C. A mais antiga manifestação de atividade Matemática. In: Revista Educação em Movimento. v. IV, nº 11, maio-agosto 2005. Curitiba, Champagnat, 2005. ________. Origens da Matemática: a pré-história da Matemática. v. 1. A Matemática paleolítica. Curitiba: Progressiva, 2009. D’ AMBRÓSIO, U. A História da Matemática: questões historiográficas e políticas e reflexos na Educação Matemática. In: BICUDO, M. A. V. (org.) Pesquisa em Educação Matemática: Concepções & Perspectivas. São Paulo: UNESP, 1999, p. 97-115. ________. EtnoMatemática: elo entre as tradições e a modernidade. Belo Horizonte: Autêntica, 2001. ESTRADA, M. F. et al.; M. J. História da Matemática. Portugal: Universidade Aberta, 2000. GALVÃO, M. E. E. L.; SOUZA, V. H. G. As Luas de Hipócrates: a longa história de um problema na História da Matemática. Revista do
Compartilhar