Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Beatriz Machado de Almeida Internato – 10º semestre 1 INTRODUÇÃO • Inflamação do apêndice cecal. • Importante causa de abdome agudo. FISIOPATOLOGIA O quadro é originado devido à obstrução do apêndice cecal por: • Fecalitos/apendicolitos. • Hiperplasia de folículos linfoides (principalmente em crianças). • Neoplasia apendicular ou cecal (carcinoide, adenocarcinoma, cistoadenoma mucinoso, mucocele de apêndice). • Parasitas. • Corpos estranhos. Segue com aumento da produção de muco intraluminal, distensão e proliferação bacteriana, inflamação intensa com aumento da tensão transmural, gerando congestão vascular com risco de necrose e perfuração. ❖ Microbiologia: aeróbios e anaeróbios, principalmente E.coli, Bacterioides spp. APRESENTAÇÃO CLÍNICA ANAMNESE EPIDEMIOLOGIA: • Causa mais comum de abdome agudo. • Mais comum nas 2º e 3º décadas de vida. • Discreta predileção pelo sexo masculino. • Risco ao longo da vida de 8,6% para o sexo masculino e 6,7% para o sexo feminino. • Emergência cirúrgica não obstétrica mais comum durante a gestação. • Risco aumentado em 3x em membros de família que tem história positiva. • Risco de malignidade associada é 1%. QUADRO CLÍNICO: • Dor abdominal difusa, mal localizada, com posterior migração para a fossa ilíaca direita. • Devido a sua localização variada, o apêndice pode gerar padrões variados de dor: irradiação lombar, hipocôndrio direito, hipogástrica. • Anorexia (sinal mais precoce). • Náuseas e/ou vômitos. • Febre. • Queda do estado geral. EXAME FÍSICO • Dor à palpação no ponto de McBurney. • Sinal de Blumberg: dor à descompressão súbita no ponto de McBurney (FID). • Sinal de Rovsing: dor na FID à palpação da FIE. A palpação do cólon descendente desloca os gases atingindo o apêndice inflamado hipersensível, provocando dor. • Sinal de Lenander: temperatura retal maior que a temperatura axilar em mais de 1ºC. • Sinal de Dunphy: dor na FID que piora com tosse. • Sinal de Aaron: dor epigástrica referida à palpação do ponto de McBurney. • Sinal de iliopsoas: dor na hiperextensão passiva ou flexão ativa do membro inferior direito com o paciente em decúbito lateral esquerdo. Presente no apêndice retrocecal. • Sinal de Lapinsky: dor à compressão da FID enquanto se eleva o membro inferior direito esticado. Presente no apêndice retrocecal. • Sinal do obturador: dor hipogástrica à flexão e rotação interna do quadril. Presente no apêndice pélvico. • Sinais de peritonite: dor abdominal difusa, localizada, descompressão dolorosa, abdome em tábua. • Dor à percussão, soluços ou tosse: mais comum em crianças. • Massa abdominal: suspeita de abcesso ou plastrão apendicular. APENDICITE AGUDA Beatriz Machado de Almeida Internato – 10º semestre 2 • Plastrão abdominal localizado. • Redução do peristaltismo ou até mesmo ausência. ABORDAGEM DIAGNÓSTICA O diagnóstico de apendicite aguda é clínico, dispensando exames complementares confirmatórios. EXAMES LABORATORIAIS Estão indicados para avaliação de gravidade, do comprometimento sistêmico e sepse. Achados: ❖ Leucocitose com ou sem desvio à esquerda. ❖ Elevação da proteína C reativa (PCR). ❖ Piúria. Atenção: importante solicitar teste de gravidez (B- HCG) em mulher em idade reprodutiva para diagnóstico diferencial. EXAMES COMPLEMENTARES ULTRASSONOGRAFIA DE ABDOME: • Exame de eleição em gestantes e crianças. • Sensibilidade (86%), especificidade (81%). • Pode confirmar o diagnóstico, porém, dada sua baixa sensibilidade, não exclui o mesmo. • Achados: ❖ Sinal do alvo. ❖ Líquido livre em pelve. ❖ Estrutura tubular não compressível >6mm. • Limitações: operador dependente, obesos, grande distensão de alças. • USG pélvica/transvaginal são relevantes na avaliação de mulheres dependendo da suspeita clínica. Descrição: apêndice espessado (0,9cm), não compressível, com aumento da vascularização parietal. TOMOGRAFIA DE ABDOME: • Indicada em caso de dúvida no diagnóstico clínico (principalmente em crianças, adultos mais velhos, mulheres em idade fértil, pacientes com diabetes, obesidade e imunossupressão). • Considerar em quadros de risco intermediário. • 15% apresentam diagnóstico alternativo. • Melhor avaliação em pacientes obesos, pela limitação da USG. • Inicialmente, solicita-se TC de abdome total sem contraste, sendo o exame com contraste oral e venoso considerado em casos duvidosos. • Não realizar TC de abdome em crianças antes da realização de USG abdominal. • Importante papel em idosos por conta de quadros neoplásicos simulando apendicite aguda. • Principais achados: ❖ Diâmetro >6mm, com oclusão do lúmem. ❖ Espessamento da parede do apêndice (>2mm). ❖ Densificação da gordura periapendicular. ❖ Apendicolito (visto em aprox. 25% dos pacientes). Descrição: plano coronal evidenciando apêndice cecal de calibre aumentado (1,9cm). Observa-se ainda, tênue densificação dos planos adiposos de permeio. RESSONÂNCIA MAGNÉTICA DE ABDOME: • Pode ser utilizada como alternativa à TC em gestantes ou crianças. • Pouco se sabe sobre seu uso e acurácia no diagnóstico de abdome agudo. • Não possui maior acurácia que o USG na discriminação de apendicite perfurada. • Achados: ❖ Líquido pélvico. ❖ Linfadenopatia. ❖ Edema do íleo terminal. Beatriz Machado de Almeida Internato – 10º semestre 3 ESCORE DE ALVARADO MODIFICADO Define a probabilidade diagnóstica de apendicite aguda a partir da análise da soma de parâmetros clínico-laboratoriais, com pontuação máxima de 9: • 3 sintomas: ❖ Anorexia (1 ponto); ❖ Náuseas e/ou vômitos (1 ponto); ❖ Dor típica migratória (1 ponto). • 3 sinais: ❖ Dor em fossa ilíaca direita (2 pontos). ❖ Defesa à descompressão (1 ponto). ❖ Temperatura >37,5ºC (1 ponto). • Achado laboratorial: ❖ Leucocitose >10.000 mm³ (2 pontos). Atenção: o escore original de Alvarado inclui desvio à esquerda (1 ponto), totalizando 10 pontos. CLASSIFICAÇÃO E CONDUTA • 0-3: Baixo risco: ❖ Orientação para retorno, se não melhora ou piora clínica. ❖ Investigar outras causas de dor. ❖ Probabilidade de apendicite aguda: 3,7% em adultos e 1,9% em crianças. • 4-6: Risco moderado: ❖ Admissão para observação e reavaliação. ❖ Se a pontuação continua a ser a mesma em 12 horas, indica-se cirurgia. ❖ Se paciente do sexo feminino, considerar TC de abdome. ❖ Probabilidade de apendicite aguda: 45% em adultos e 12% em crianças. • >= 7: Alto risco: ❖ Se paciente do sexo masculino, proceder à apendicectomia. ❖ Se paciente do sexo feminino não grávida, indica- se laparoscopia diagnóstica ou TC de abdome. ❖ Probabilidade de apendicite aguda: 87% em adultos e 67% em crianças. • Limitações: não considera comorbidades e estado de imunossupressão. • Boa sensibilidade, especialmente em homens, porém baixa especificidade. AIR SCORE O AIR score (appendicits inflammatory response) avalia menos sintomas clínicos, porém adiciona parâmetros inflamatórios como PCR e permite avaliar diferentes graus de descompressão dolorosa, PCR, leucocitose, leucograma. • Parâmetros: ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO • 0-4 pontos: Baixo risco: ❖ Acompanhamento ambulatorial, se condição inalterada. ❖ Probabilidade de apendicite: 5%. • 5-8 pontos: Indeterminado. ❖ Observação hospitalar, exames seriados, imagem ou laparoscopia diagnóstica. ❖ Probabilidade de apendicite: 50%. • 9-12 pontos: Alto risco: ❖ Exploração cirúrgica. ❖ Probabilidade de apendicite: 88%. Parece sobrepor o escore de Alvarado em acurácia. Beatriz Machado de Almeida Internato – 10º semestre 4 CLASSIFICAÇÃO APENDICITE SIMPLES (NÃO COMPLICADA) EDEMATOSA/FLEGMATOSA: • Forma reversível. • Aspecto macroscópico: congestão, alteração de coloração, aumento nodiâmetro, exsudato, pus. • Aspecto microscópico: inflamação transmural, ulceração ou trombose com ou sem pus extramural. APENDICITE COMPLICADA/COMPLEXA GANGRENA: • Aspecto macroscópico: apêndice friável, arroxeado/esverdeado ou enegrecido. • Aspecto microscópico: inflamação transmural com necrose. • Perfuração iminente. PERFURAÇÃO: • Aspecto macroscópico: perfuração visível. • Maior risco de complicações pós-operatórias. • Ocorre em 13-20% dos casos. • Mais comum em homens e idosos. ABCESSOS (PÉLVICO/ABDOMINAIS): • Aspecto macroscópico: massa identificada durante o exame ou abcesso em imagem pré- operatória ou durante a cirurgia. • Aspecto microscópico: inflamação transmural com pus com ou sem perfuração. • Maior risco de complicações pós-operatórias. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL • Apendagite epiploica: torção ou trombose venosa espontânea das veias que drenam os apêndices epiploicos. Dor abdominal aguda localizada principalmente em QIE. • Apendicite crônica: incidência 14 a 30% dos casos de apendicite. Surtos recorrente de apendicite aguda ou dor crônica no QID. Sintomas com duração de 3 semanas ou mais. • Afecções ginecológicas: abcesso tubo-ovariano, doença inflamatória pélvica, cisto ovariano roto, síndrome de Mittelchmerz (dor no meio), torção da tuba, endometriose, gravidez ectópica. • Afecções urológicas. • Outras: Linfadenite mesentérica, diverticulite do lado direito, diverticulite de Meckel, doença de Crohn, ileíte aguda, urolitíase. COMPLICAÇÕES • Infecção de sítio cirúrgico (mais comum). • Perfuração; • Peritonite fecal; • Coleções intra-abdominais; • Abcesso hepático piogênico; • Abcesso retroperitoneal; • Pileflebite (trombose séptica); • Hérnia abdominal; • Obstrução intestinal; • Fístulas entéricas; • Apendicite de coto ou recorrência. • Sepse. • Óbito. ABORDAGEM TERAPÊUTICA ABORDAGEM GERAL • Monitorização dos sinais vitais. • Hidratação e correção de distúrbios hidroeletrolíticos. • Analgesia: Pode ser realizada com combinações de analgésicos comuns, AINES e opioides. TRATAMENTO CONSERVADOR Antibioticoterapia isolada pode ser considerada a primeira linha de tratamento em casos selecionados de apendicite não complicada, tanto em crianças quanto em adultos. • Antibioticoterapia: ❖ Cobertura para aeróbios e anaeróbios. ❖ Uso intravenoso por pelo menos 1-3 dias, depois seguir para via oral. Beatriz Machado de Almeida Internato – 10º semestre 5 ❖ Observação hospitalar. ❖ Total de terapia: 7-10 dias. • Resultados: ❖ Resposta adequada inicialmente em 90% dos casos. Os 10% restantes necessitam de cirurgia de resgaste. ❖ Cerca de 20-40% dos pacientes necessitam de apendicectomia durante o primeiro ano após o tratamento, tanto adultos quanto crianças. • Preditores de boa resposta: PCR<60mg/l; leucograma <12.000; idade <60 anos. Atenção: a presença de apendicolito no exame de imagem aumenta o risco de falha terapêutica e recorrência, por associação de até 40% com apendicite complicada. APENDICITE AGUDA NÃO COMPLICADA O tratamento para apendicite aguda simples é a apendicectomia realizada por via aberta ou laparoscópica. • Tempo: no paciente estável, pode ser realizada dentro de 12h. Postergar a realização do procedimento em mais de 48h aumenta o risco de infecção de sítio cirúrgico e outras complicações. • Fatores de risco para perfuração: idade avançada, 3 ou mais comorbidades, sexo masculino, longo período entre o início dos sintomas e o diagnóstico/cirurgia. ANTIBIÓTICOS: ❖ Antibioticoprofilaxia: deve ser aplicada antes de 60 minutos da incisão, porém pode ser iniciada assim que se programa o procedimento cirúrgico. ❖ Amplo espectro para gram negativos e anaeróbios. ❖ Opções: Cefoxitina, Cefazolina + metronidazol, Ciprofloxacino/Levofloxacino/Gentamicina + Clindamicina/Metronidazol. ❖ Metronidazol com cefalosporinas ou Piperacilina + tazobactam (principalmente se suspeita de apendicite complicada). ❖ Continuação do antibiótico com fim terapêutico deve ser guiada conforme a gravidade do quadro: não manter além de 24h em quadros simples; manter por 3-5 dias, por via venosa, em quadros complicados/perfuração. VIAS: • Laparoscópica: ❖ Menor taxa de infecção de sítio cirúrgico. ❖ Menor dor no pós-operatório imediato. ❖ Menor tempo de internação hospitalar. ❖ Menor formação de aderências. ❖ Preferência: dúvida diagnóstica, obesos, idosos. • Aberta: ❖ Menor taxa de abcessos intra-abdominais. ❖ Menor tempo cirúrgico: a depender da experiência do cirurgião. • Cuidados pós-operatórios: ❖ Iniciar com dieta leve dentro de 24-48 horas da cirurgia conforme aceitação. ❖ Em quadros não complicados, suspender o uso de antibióticos. ❖ Mobilização precoce. APENDICITE AGUDA COMPLICADA Embora normalmente seja suspeitada em casos de evolução mais prolongada, pode ocorrer em 20% dos casos dentro das primeiras 24 horas. O seu manejo depende da condição do paciente, natureza da perfuração (contida ou livre) ou se abcesso/flegmão estão presentes. PACIENTES INSTÁVEIS OU COM PERFURAÇÃO LIVRE: • Relacionada à peritonite difusa ou fecal. • Pacientes sépticos, necessitando de reanimação pré-operatória. • Indicada apendicectomia de emergência com drenagem e toalete da cavidade peritoneal. • O uso de dreno após a cirurgia é controverso. Beatriz Machado de Almeida Internato – 10º semestre 6 PACIENTES ESTÁVEIS (COM ABCESSOS OU FLEGMÃO): • Considerar conduta cirúrgica, tratamento conservador ou uso de radiologia intervencionista. • Idealmente, tratamento de forma conservadora com antibioticoterapia venosa, repouso intestinal e drenagem percutânea guiada por imagem de abcessos acessíveis, com monitorização intra- hospitalar. • Antibióticos: ❖ Ciprofloxacino ou Levofloxacino + Metronidazol. ❖ Ceftriaxona. ❖ Piperacilina + Tazobactam. ❖ Cefuroxima. ❖ Ertapeném. • Cirurgia imediata associada com aumento de morbidade e risco de ressecção ileocecal desnecessária. • Falha do tratamento conservador indica apendicectomia de imediato: obstrução intestinal, sepse, dor persistente, febre, leucocitose. • Taxa de recorrência de 7,4% com tratamento conservador. • Os pacientes com mais de 40 anos deverão ser submetidos à colonoscopia. Atenção: deve-se realizar apendicectomia de intervalo, após o quadro inicial tratado de forma conservadora, com o objetivo de diagnosticar neoplasia e evitar recorrência. ALGORITMO DE DECISÃO BAIXO RISCO (ALVARADO <4, AIR <=4) • Manejo extra-hospitalar. • Considerar diagnóstico alternativo. • Se possível, dar alta com revisão em 6-12 horas. • Eventualmente, considerar USG. RISCO INTERMEDIÁRIO (ALV 4-6, AIR 5-8) • Considerar exame de imagem: TC ou USG. Se normal, alta. Se dúvida, considerar observação. • Se apendicite simples: em paciente com sintomas moderados, há a possibilidade de tentativa inicial de tratamento conservador ou seguir diretamente para o tratamento padrão (apendicectomia). • Se apendicite complexa: Instabilidade/peritonite → apendicectomia de emergência. Estabilidade/abcesso/massa: antibióticos, monitorização, drenagem percutânea, repouso intestinal. Na falha, cirurgia. ALTO RISCO (ALVARADO >=7, AIR >=9) • Considerar TC para confirmação diagnóstica conforme protocolo local ou seguir diretamente para tratamento cirúrgico. • Avaliação cirúrgica precoce. • Apendicite aguda simples: se paciente com sintomas moderados, há possibilidade de tentativa inicial de tratamento conservador ou seguir diretamente para o tratamento padrão (apendicectomia). • Apendicite aguda complexa: Instabilidade/peritonite → apendicectomia de emergência. Estabilidade/abcesso/plastrão: antibióticos, monitorização, drenagem percutânea, repouso intestinal. Na falha, cirurgia.
Compartilhar