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1 Júlia Morbeck – @med.morbeck Objetivos 1- Rever morfofisiologia da pele; 2- Discutir sobre erisipela, impetigo e celulite infeciosa: agentes etiológicos, fatores de risco, fisiopatologia, sintomas, diagnóstico clínico e complementar (laboratorial) e tratamento. Morfofisiologia da pele A pele e seus anexos (glândulas sudorífera e sebácea, pêlos e unhas) formam um complexo conjunto de órgãos que realizam muitas funções, principalmente de proteção. Juntos, esses órgãos formam o sistema tegumentar (MARIEB, 3ª ed.). Pele ↠ A pele, também conhecida como cútis, cobre a superfície externa do corpo e é o maior órgão do corpo em peso (TORTORA, 14ª ed.). ↠ A pele cobre o corpo inteiro, tem uma área de superfície de 1,2 a 2,2 metros quadrados, pesa 4 a 5 quilogramas e representa cerca de 7% do peso corporal de um adulto médio. Ela é flexível, mas resistente, o que permite que enfrente o constante ataque dos agentes externos (MARIEB, 3ª ed.). A pele recobre a superfície do corpo e é constituída por um tecido epitelial de origem ectodérmica, a epiderme, e um tecido conjuntivo de origem mesodérmica, a derme. Dependendo da espessura da epiderme, distinguem-se a pele espessa e a fina (JUNQUEIRA, 13ª ed.). A pele espessa é encontrada na palma das mãos, na planta dos pés e recobrindo algumas articulações. O restante do corpo é protegido por pele fina. (JUNQUEIRA, 13ª ed.). ↠ A pele, que possui uma espessura variável de 1,5 a 4,0 milímetros (mm) ou mais nas diferentes partes do corpo, é formada por duas porções distintas, a epiderme e a derme (MARIEB, 3ª ed.). A epiderme (epi = em cima), formada por células epiteliais, é o escudo protetor mais externo do corpo. A derme, subjacente, que constitui a maior parte da pele, é uma camada resistente, semelhante ao couro, formada por tecido conjuntivo fibroso. Apenas a derme é vascularizada. Os nutrientes chegam à epiderme a partir dos vasos sanguíneos da derme, por difusão nos líquidos teciduais (MARIEB, 3ª ed.). Abaixo da derme, mas sem fazer parte da pele, encontra-se a tela subcutânea. Também chamada de hipoderme, essa camada consiste nos tecidos areolar e adiposo (TORTORA, 14ª ed.). A hipoderme, também chamada de tela subcutânea ou fáscia superficial, por estar localizada superficialmente ao tecido conjuntivo resistente que reveste os músculos esqueléticos (fáscia), consiste principalmente de tecido adiposo. Além de estocar gordura, a hipoderme ancora a pele às estruturas subjacentes (principalmente aos músculos), mas de uma maneira frouxa o suficiente para que a pele possa deslizar livremente sobre as demais estruturas (MARIEB, 3ª ed.). EPIDERME ↠ Estruturalmente, a epiderme é constituída por um epitélio estratificado pavimentoso queratinizado, formado por quatro tipos diferentes de células e quatro ou cinco camadas distintas (MARIEB, 3ª ed.). CÉLULAS DA EPIDERME ↠ As células que povoam a epiderme incluem os queratinócitos, os melanócitos, as células de Merkel e as células de Langerhans (MARIEB, 3ª ed.). APG 23 2 Júlia Morbeck – @med.morbeck QUERATINÓCITOS ↠ As células mais abundantes da epiderme são os queratinócitos, A função principal dos queratinócitos ("células de queratina") é produzir queratina, a proteína fibrosa que ajuda a fornecer as propriedades protetoras da epiderme (do grego = córneo) (MARIEB, 3ª ed.). Os queratinócitos também produzem grânulos lamelares, que liberam uma substância que repele a água, diminuindo a entrada e a perda de água e inibindo a entrada de material estranho (TORTORA, 14ª ed.). ↠ Os queratinócitos, firmemente conectados entre si por desmossomos, se originam a partir de uma camada de células (o estrato basal) presentes na porção mais profunda da epiderme e que sofrem mitoses quase continuamente. Quando essas células são empurradas para cima pela produção de novas células abaixo delas, elas começam a produzir a queratina que por fim domina o conteúdo celular. No momento em que atingem a superfície livre da pele, os queratinócitos estão mortos, tornando-se estruturas escamosas que nada mais são do que envoltórios de membrana plasmática preenchidos por queratina (MARIEB, 3ª ed.). Milhões dessas células mortas descamam diariamente, fornecendo-nos uma epiderme totalmente nova a cada 25 a 45 dias (MARIEB, 3ª ed.). MELANÓCITOS ↠ Os melanócitos, células epiteliais com formato de aranha que sintetizam o pigmento melanina (melan=escuro), são encontrados na camada mais profunda da epiderme (MARIEB, 3ª ed.). ↠ Quando produzida, a melanina acumula-se em vesículas (grânulos envolvidos por membrana) chamadas de melanossomos, que pela ação de proteínas motoras movem-se ao longo dos filamentos de actina até os processos terminais dos melanócitos (as "pernas da aranha"), de onde são captados pelos queratinócitos mais próximos. Os grânulos de melanina acumulam-se sobre a superfície nuclear dos queratinócitos, que fica "voltada para o sol", formando uma barreira de pigmento que protege o núcleo dos efeitos prejudiciais da radiação solar ultravioleta (UV) (MARIEB, 3ª ed.). Desse modo, eles protegem o DNA nuclear do dano causado pelos raios UV. Embora seus grânulos de melanina protejam efetivamente os queratinócitos, os melanócitos em si são particularmente suscetíveis aos danos causados pelos raios UV (TORTORA, 14ª ed.). CÉLULAS DE LANGERHANS ↠ As células de Langerhans, de formato estrelado, originam-se na medula óssea e migram para a epiderme. Também chamadas de células dendríticas da epiderme, elas são fagócitos que fagocitam substâncias estranhas e auxiliam na ativação do nosso sistema imunológico (MARIEB, 3ª ed.). CÉLULAS DE MERKEL ↠ As células de Merkel ocasionalmente estão presentes na junção entre a derme e a epiderme. Com o formato de um hemisfério espinhoso, cada célula de Merkel está intimamente associada com uma terminação nervosa sensorial em forma de disco. Esta combinação, chamada de disco de Merkel, funciona como um receptor sensorial para o tato (MARIEB, 3ª ed.). CAMADAS DA EPIDERME ↠ As variações na espessura da epiderme determinam se a pele é grossa ou fina. Na pele grossa, a qual reveste a palma das mãos, a ponta dos dedos e a planta dos pés, a epiderme consiste de cinco camadas, ou estratos ("bainhas, lâminas"). Da mais profunda para a mais superficial, essas camadas são os estratos basal, espinhoso, granuloso, lúcido e córneo. Na pele fina, a qual reveste o restante do corpo, o estrato lúcido não é evidente e os demais estratos são mais delgados (MARIEB, 3ª ed.). ESTRATO (CAMADA) BASAL ↠ O estrato basal, a camada mais profunda da epiderme, está preso à derme subjacente ao longo de uma borda ondulada irregular. Na sua maior parte, é formado por uma única camada de células - uma população celular continuamente em renovação - representada pelos queratinócitos mais jovens. Os muitos núcleos mitóticos observados nessa camada refletem a rápida divisão dessas células e são os responsáveis por seu nome alternativo de estrato germinativo ("camada de germinação") (MARIEB, 3ª ed.). ↠ Cerca de 10 a 25% das células do estrato basal são melanócitos, e seus processos ramificados estendem-se entre as células circundantes, alcançando as células da camada mais superficial do estrato espinhoso. Ocasionalmente, as células de Merkel também são vistas neste estrato (MARIEB, 3ª ed.). 3 Júlia Morbeck – @med.morbeck ESTRATO (CAMADA) ESPINHOSO Nessa camada os queratinócitos estão unidos entre si por inúmeras junções intercelulares do tipo desmossomo. Em preparações histológicas, essas junções aparecem como pequenas projeções celulares, o que confere a cada célula um aspecto espinhoso (JUNQUEIRA, 13ª ed.). Os espinhos não existem nas células vivas; eles são um artefato produzido durante a preparação do tecido, quandoas células murcham mas seus numerosos desmossomos permanecem unidos (MARIEB, 3ª ed.). ↠ O estrato espinhoso possui muitas camadas de células de espessura. Estas células contêm um sistema de filamentos intermediários que forma uma rede, constituída principalmente por feixes de filamentos de pré-queratina resistentes à tensão, os quais atravessam toda a célula e se prendem aos desmossomos (MARIEB, 3ª ed.). OBS.: Dispersos entre os queratinócitos, encontram-se grânulos de melanina e células de Langerhans, as quais são mais abundantes nessa camada epidérmica (MARIEB, 3ª ed.). ESTRATO (CAMADA) GRANULOSO ↠ O delgado estrato granuloso consiste de três a cinco camadas de células nas quais a aparência dos queratinócitos muda drasticamente (MARIEB, 3ª ed.). ↠ Estas células tornam-se achatadas, seus núcleos e organelas começam a desintegrar-se e elas acumulam dois tipos de grânulos. Os grânulos de querato-hialina ajudam a formar a queratina das camadas superficiais. Os grânulos lamelares ("discos") contêm um glicolipídeo impermeável que é expelido para o espaço extracelular, tomando-se um dos principais fatores envolvidos na redução da perda de água através da epiderme (MARIEB, 3ª ed.). Como todos os epitélios, a epiderme conta com os capilares do tecido conjuntivo subjacente (neste caso, a derme) para sua nutrição. Acima do estrato granuloso, as células estão tão afastadas dos capilares dérmicos que acabam morrendo. Essa é uma sequência de eventos completamente normal (MARIEB, 3ª ed.). Desse modo, a camada granulosa marca a transição entre as camadas mais profundas e metabolicamente ativas e as células mortas das camadas mais superficiais (TORTORA, 14ª ed.). ESTRATO (CAMADA) LÚCIDO ↠ A camada lúcida, mais evidente na pele espessa, é constituída por uma delgada camada de células achatadas, eosinófilas e translúcidas, cujos núcleos e organelas citoplasmáticas foram digeridos por enzimas dos lisossomos e desapareceram (TORTORA, 14ª ed.). ↠ O estrato lúcido consiste de umas poucas camadas de queratinócitos translúcidos, achatados e mortos, com limites indistintos. Somente está visível na pele grossa (MARIEB, 3ª ed.). ESTRATO (CAMADA) CÓRNEO ↠ A camada córnea tem espessura muito variável e é constituída por células achatadas, mortas e sem núcleo, cujo citoplasma se apresenta repleto de queratina (JUNQUEIRA, 13ª ed.). ↠ A camada mais externa, o estrato córneo, é uma ampla zona contendo de 20 a 30 camadas de células, o que representa até três quartos da espessura da epiderme. A queratina e as membranas plasmáticas espessadas das células deste estrato protegem a pele contra a abrasão e a penetração, e o glicolipídeo presente entre as células impermeabiliza esta camada (MARIEB, 3ª ed.). QUERATINIZAÇÃO Células recém-formadas na camada basal são empurradas lentamente para a superfície. Conforme as células se movem de uma camada epidérmica para a outra, elas acumulam cada vez mais queratina, um processo chamado de queratinização. Elas, então, sofrem apoptose. Eventualmente, as células queratinizadas se soltam e são substituídas pelas células subjacentes que, por sua vez, se queratinizam. O processo completo através do qual as células se formam na camada basal, ascendem à superfície, se tornam queratinizadas e se soltam 4 Júlia Morbeck – @med.morbeck dura cerca de 4 a 6 semanas em uma epiderme média de 0,1 mm de espessura (TORTORA, 14ª ed.). DERME ↠ A derme (derm = pele), a segunda maior região da pele, é um tecido conjuntivo resistente e flexível. As células da derme são as células tipicamente encontradas em qualquer tecido conjuntivo propriamente dito: os fibroblastos, os macrófagos e, ocasionalmente, os mastócitos e os leucócitos. Sua matriz semifluida é densamente preenchida com fibras. A derme mantém o corpo inteiro unido, como uma malha justa (ou uma meia-calça). A derme é seu "couro", pois corresponde exatamente à porção da pele animal utilizada na confecção dos produtos de couro (MARIEB, 3ª ed.). ↠ A derme recebe um rico suprimento de fibras nervosas, vasos sanguíneos e vasos linfáticos. As principais porções dos folículos pilosos, assim como das glândulas sebáceas e sudoríferas são derivadas do tecido epidérmico, mas residem na derme (MARIEB, 3ª ed.). ↠ A derme apresenta duas camadas: a derme papilar e a derme reticular (MARIEB, 3ª ed.). ↠ A camada superficial delgada da derme chamada de camada papilar é constituída por tecido conjuntivo frouxo (areolar), no qual as fibras colágenas e elásticas formam um arranjo frouxo e complicado que apresenta vasos sanguíneos em abundância. A superfície superior forma projeções pregueadas conhecidas como papilas dérmicas (papila = mamilo) que se interdigitam com a epiderme sobrejacente Muitas das papilas dérmicas contêm alças capilares (do plexo subcapil.ar); outras contêm terminações nervosas livres (receptores de dor) e receptores táteis chamados de corpúsculos de Meissner (MARIEB, 3ª ed.). ↠ A camada reticular, mais profunda, é responsável por cerca de 50% da espessura da derme, sendo constituída por tecido conjuntivo denso não-modelado (irregular). A rede de vasos sanguíneos responsável pela nutrição dessa camada, o plexo cutâneo, localiza-se no limite com a hipoderme (MARIEB, 3ª ed.). ↠ As fibras colágenas na região reticular são organizadas de maneira semelhante a uma rede e exibem organização mais regular do que aquelas encontradas na região papilar. A orientação mais regular das fibras colágenas ajuda a pele a resistir ao estiramento. Vasos sanguíneos, nervos, folículos pilosos, glândulas sebáceas e sudoríferas ocupam os espaços entre as fibras (TORTORA, 14ª ed.). ANEXOS DA PELE: os anexos da pele incluem as unhas, as glândulas sudoríferas, as glândulas sebáceas, os folículos pilosos e os pêlos. Cada um desses anexos exerce um papel único na manutenção da homeostase corporal (MARIEB, 3ª ed.). FUNÇÕES DO SISTEMA TEGUMENTAR ↠ A pele e seus anexos executam uma diversidade de funções que influenciam o metabolismo corporal e evitam que os fatores externos perturbem a homeostase. Devido a sua localização superficial, ela é o sistema orgânico mais vulnerável, exposto às bactérias, à abrasão, a temperaturas extremas e substâncias químicas nocivas (MARIEB, 3ª ed.). PROTEÇÃO ↠ A pele constitui pelo menos três tipos de barreiras: química, física e biológica (MARIEB, 3ª ed.). ↠ As barreiras químicas incluem as secreções da pele e a melanina. Apesar das bactérias serem abundantes na superfície da pele, o baixo pH das secreções desse órgão, chamado de manto ácido, retarda sua proliferação. Além disso, muitas bactérias são completamente eliminadas pelas substâncias bactericidas do sebo. As células da pele também secretam um antibiótico natural chamado de defensina humana, o qual literalmente abre poros na bactéria fazendo-a parecer uma peneira. A melanina fornece um pigmento químico protetor que previne danos das radiações UV às células vivas da pele (MARIEB, 3ª ed.). ↠ As barreiras físicas ou mecânicas são fornecidas pela continuidade da pele e pela resistência de suas células queratinizadas (MARIEB, 3ª ed.). ↠ As barreiras biológicas incluem as células de Langerhans (dendríticas) da epiderme, os macrófagos da derme e o próprio DNA. As células de Langerhans são elementos ativos do sistema imunológico. Para a resposta imunológica tornar-se ativada, as substâncias estranhas, ou antígenos, devem ser 5 Júlia Morbeck – @med.morbeck apresentadas para os leucócitos chamados de linfócitos. Na epiderme, esta função é desempenhada pelas células de Langerhans. Os macrófagos da derme constituem uma segunda linha de defesa para eliminar vírus e bactérias que tenham conseguido penetrar a epiderme. Eles também atuam como células "apresentadoras" de antígenos. Apesar da melanina fornecerum protetor solar químico muito bom, o próprio DNA pode ser considerado biologicamente efetivo no que diz respeito à proteção solar. Os elétrons das moléculas de DNA absorvem a radiação, UV, transferindo-a para o núcleo atômico, o que provoca seu aquecimento, fazendo-o vibrar vigorosamente. Entretanto, como o calor dissipa-se instantaneamente para as moléculas de água circundantes, o DNA converte a radiação potencialmente destrutiva em calor inofensivo (MARIEB, 3ª ed.). REGULAÇÃO DA TEMPERATURA CORPORAL ↠ Lembre-se de que a termorregulação é a regulação homeostática da temperatura corporal. A pele contribui para a termorregulação de dois modos: liberando suor em sua superfície e ajustando o fluxo de sangue na derme. Em resposta a uma elevada temperatura ambiental ou ao calor produzido pelo exercício, a produção de suor pelas glândulas sudoríferas écrinas aumenta; a evaporação do suor na superfície da pele ajuda a diminuir a temperatura corporal. Além disso, os vasos sanguíneos na derme dilatam; consequentemente, mais sangue flui pela derme, aumentando o calor perdido pelo corpo. Em resposta a temperatura ambiental baixa, a produção de suor pelas glândulas sudoríferas écrinas diminui, ajudando a conservar o calor. Além disso, o calibre dos vasos sanguíneos na derme da pele diminui, reduzindo assim o fluxo de sangue pela pele e a perda de calor do corpo. Além disso, as contrações no músculo esquelético geram calor corporal (TORTORA, 14ª ed.). RESERVATÓRIO DE SANGUE ↠ O suprimento vascular da derme é vasto e pode armazenar grandes volumes de sangue (cerca de 5°/o do volume de sangue de todo o corpo). Quando outros órgãos, como os músculos em atividade vigorosa, necessitam de um suprimento sanguíneo maior, o sistema nervoso causa constrição dos vasos sanguíneos da derme. Isso desvia mais sangue para dentro da circulação geral, tornando-o disponível para os músculos e outros órgãos (MARIEB, 3ª ed.). EXCREÇÃO E ABSORÇÃO ↠ A pele normalmente desempenha um papel pequeno na excreção, a eliminação de substâncias do corpo, e na absorção, a passagem de material do ambiente externo para as células do corpo (TORTORA, 14ª ed.). ↠ Além de remover água e calor do corpo, o suor também é o veículo para a excreção de pequenas quantidades de sais, dióxido de carbono e duas moléculas orgânicas resultantes do metabolismo de proteínas – amônia e ureia (TORTORA, 14ª ed.). ↠ A absorção de substâncias hidrossolúveis através da pele é negligenciável, porém determinados materiais lipossolúveis penetram na pele. Eles incluem vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K), alguns fármacos e os gases oxigênio e dióxido de carbono (TORTORA, 14ª ed.). SENSIBILIDADE CUTÂNEA ↠ A pele é suprida abundantemente por receptores sensoriais cutâneos, os quais são, na realidade, parte do sistema nervoso (MARIEB, 3ª ed.). ↠ Uma das funções mais importantes da pele, graças à sua grande extensão e à sua abundante inervação sensorial, é receber estímulos do meio ambiente, já que ela é o receptor sensorial mais extenso do organismo. Além das numerosas terminações nervosas livres localizadas na epiderme, nos folículos pilosos e nas glândulas, existem receptores encapsulados e não encapsulados na derme e na hipoderme, sendo mais frequentes nas papilas dérmicas. As terminações nervosas livres são sensíveis ao toque e à pressão (receptores táteis), bem como a variações de temperatura, e estão associadas a dor, coceira e outras sensações (JUNQUEIRA, 13ª ed.). OBS.: Os receptores encapsulados são os corpúsculos de Ruffini, Vater- Pacini, Meissner e Krause. Há evidências que mostram que os corpúsculos mencionados não são necessários para a sensibilidade cutânea. Muitas áreas da pele são desprovidas desses corpúsculos, porém têm sensibilidade. No entanto, quando são encontrados, eles funcionam como mecanorreceptores. (JUNQUEIRA, 13ª ed.). 6 Júlia Morbeck – @med.morbeck SÍNTESE DE VITAMINA D ↠ Quando os raios solares atingem a pele, moléculas de colesterol modificadas que circulam pelos vasos sanguíneos dérmicos são convertidas no precursor da vitamina D e transportadas pelo sangue para outras partes do corpo, onde exercem vários papéis no metabolismo do cálcio. Por exemplo, o cálcio não pode ser absorvido pelo trato digestório sem a vitamina D (MARIEB, 3ª ed.). Infecções bacterianas da pele PIODERMITES: São processos infecciosos, classificados primariamente como cutâneos e por impetiginização ou por infecção secundária, quando a pele estiver previamente lesada. São mediados por toxinas (endo ou exotoxinas). Podem ser classificadas por duas formas: (AZULAY, 7ª ed.). Etiologia: ➢ estafilococcias (Staphylococcus aureus); ➢ estreptococcias (Streptococcus pyogenes). Profundidade da infecção na pele: ➢ infecção superficial da pele: impetigo e síndrome da pele escaldada estafilocócica (SSSS) ➢ infecção da epiderme e derme: ectima ➢ infecção mais profunda: erisipela e celulite Erisipela ↠ Erisipela é uma variante superficial da celulite, causada principalmente por estreptococos do grupo A que afetam a derme, com um envolvimento linfático proeminente; por outro lado, a celulite clássica é centralizada na derme profunda e nos tecidos subcutâneos (BOLOGNIA, 2015). EPIDEMIOLOGIA ↠ Erisipela é uma doença das crianças, idosos, debilitados e portadores de linfedema ou úlceras cutâneas crônicas (BOLOGNIA, 2015). ↠ As mulheres são mais numerosas que os homens, mas os meninos são mais comumente afetados que as meninas na faixa etária pediátrica. Existe uma frequência elevada durante os meses do verão (BOLOGNIA, 2015). ↠ A incidência de erisipela aumentou desde o final da década de 1980 (BOLOGNIA, 2015). ↠ No Brasil, acomete, mais frequentemente, a parte distal de um membro inferior, em função de intertrigo interpododáctilo. Já nos EUA e na Europa ocorre com maior frequência na face, por ser a dermatite seborreica mais prevalente em países frios (AZULAY, 7ª ed.). ETIOLOGIA/AGENTES ETIOLÓGICOS ↠ A erisipela é normalmente causada por estreptococos do grupo A; estreptococos dos grupos G, B, C e D são ocasionalmente implicados. S. aureus, Pneumococcus spp., Klebsiella pneumoniae, Yersinia enterocolitica e Haemophilus influenzae do tipo B também podem causar uma infecção semelhante à erisipela (BOLOGNIA, 2015). FATORES DE RISCO ↠ Fatores de risco incluem tinea pedis, insuficiência venosa, diabetes, tromboflebite, trauma, desnutrição, abuso de álcool ou drogas ilícitas e infecções respiratórias nos casos de erisipela na face (AZULAY, 7ª ed.). OBS.: Os fatores predisponentes mais importantes para o desenvolvimento dessas infecções são o rompimento da barreira cutânea devido a trauma (mordida de inseto, abrasão, cortes), inflamação (eczema, radioterapia), infecção de pele preexistente (impetigo, tinea pedis), varicela ou insuficiência venosa. FISIOPATOLOGIA ↠ Na maioria das vezes, assim como na celulite, a bactéria penetra através de um trauma na pele, porém, ocasionalmente, a origem pode ser hematogênica (PEDIATRIA, 2017). MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS ↠ O período de incubação é de poucos dias (2 a 5 dias). Manifesta-se por eritema vivo e intenso edema doloroso, com bordas bem delimitadas, que avançam rapidamente sobre a pele circunvizinha (AZULAY, 7ª ed.). ↠ Quando o processo é intenso, surgem bolhas e, até mesmo, necrose com ulceração posterior (AZULAY, 7ª ed.). ↠ É acompanhada de linfangite e linfadenopatia regional aguda, seguida de fenômenos gerais (febre, mal-estar, calafrios e outros) (AZULAY, 7ª ed.). OBS.: Característica relevante é sua capacidade de recorrência e, após cada uma delas, permanece certo grau de edema duro (linfedema) que acaba levando à elefantíase (elefantíase nostra), o que, por sua vez, favorece novos surtos (AZULAY, 7ª ed.). ↠ Quando esse processo é exuberante, a pele torna-severrucosa e com aspecto musgoso. Essa complicação ocorre tipicamente em obesos ou em pessoas interessadas em lucro secundário. Como complicações, podem-se citar nefrite e septicemia. A mortalidade é rara, mas pode ocorrer sobretudo em crianças ou quando a doença acomete a face. A apresentação bolhosa confere 7 Júlia Morbeck – @med.morbeck gravidade ao processo, assim como a localização facial (AZULAY, 7ª ed.). DIAGNÓSTICO ↠ O diagnóstico é baseado principalmente nos achados clínicos (BOLOGNIA, 2015). Erisipela bolhosa. Erisipela com algumas áreas de necrose. Erisipela bilateral já com certo grau de linfedema. Elefantíase nostra. 8 Júlia Morbeck – @med.morbeck DIAGNÓSTICO CLÍNICO EXAME FÍSICO (NETO ET. AL., 2019). ➢ Área eritematoedematosa com aumento de temperatura e dor local. ➢ Na erisipela, as lesões são mais bem delimitadas e podem apresentar bolhas. ➢ Linfadenopatia regional e linfangite são frequentes. DIAGNÓSTICO LABORATORIAL ↠ A avaliação do laboratório mostra uma contagem elevada de leucócitos, com um desvio para a esquerda (BOLOGNIA, 2015). ↠ As hemoculturas são positivas em apenas ∼5% dos casos. Embora as culturas de pústulas ou bolhas possam ser úteis, a sensibilidade das culturas dos espécimes da biopsia da pele é baixa, principalmente em hospedeiros imunocompetentes (BOLOGNIA, 2015). ↠ Os títulos de anti-DNase B e ASLO são indicadores úteis da etiologia estreptocócica. Os testes de imunofluorescência direta e aglutinação do látex podem ser usados para detectar estreptococos em biopsias cutâneas (BOLOGNIA, 2015). IMPORTANTE: Deve-se diferenciar de trombose venosa profunda e tromboflebite (AZULAY, 7ª ed.). TRATAMENTO ↠ A maioria dos pacientes não necessita de internação, exceto nos casos de comorbidade (AZULAY, 7ª ed.). ↠ Utiliza-se a penicilina-procaína na dose de 400 a 600.000 U, IM, de 12 em 12 h em função de seu baixo custo e extrema eficácia, ou, nos casos mais graves, penicilina cristalina na dose de 3.000.000 U, IV, de 4 em 4 h (AZULAY, 7ª ed.). ↠ Outras substâncias alternativas e de igual benefício são as cefalosporinas de primeira geração – ampicilina, eritromicina e clavulanato + amoxicilina (AZULAY, 7ª ed.). ↠ Também de extrema importância para o tratamento são as medidas gerais, que incluem repouso com membros elevados, compressas frias e desbridamento, caso necessário (AZULAY, 7ª ed.). OBS.: Nos casos recorrentes de erisipela, indica-se o uso de penicilina benzatina, 1.200.000 U de 3 em 3 semanas por muitos meses. Nesses pacientes é importante combater o intertrigo interpododáctilo e a obesidade frequentemente associados (AZULAY, 7ª ed.). OBS.: Na maioria das vezes, não há separação nítida entra celulite e erisipela, existindo alternância entre as duas formas de infecção (NETO et. a., 2019). Celulite Infecciosa ↠ É a denominação para o mesmo processo da erisipela quando atinge fundamentalmente a hipoderme. Devido a essa localização, as bordas da lesão são geralmente mal definidas, em contraste com as bordas bem definidas da erisipela, e o eritema menos vivo (AZULAY, 7ª ed.). Celulite é uma infecção da derme profunda e do tecido subcutâneo, que se manifesta como áreas de eritema, inchaço, calor e dor à palpação (BOLOGNIA, 2015). EPIDEMIOLOGIA ↠ A celulite é observada com mais frequência entre adultos de meia-idade e idosos. A incidência de celulite é de cerca de 200 casos por 100.000 pacientes-ano. Em regiões não tropicais, tem uma predileção sazonal por meses mais quentes (SANAR). ETIOLOGIA/AGENTES ETIOLÓGICOS ↠ A celulite em adultos imunocompetentes é frequentemente causada pelos estreptococos do grupo A ou S. aureus, e este último organismo é a etiologia mais frequente em crianças (BOLOGNIA, 2015). OBS.: Embora H. influenzae já tenha sido uma causa comum de celulite em pacientes pediátricos, agora ele é raro em razão da vacinação de rotina contra H. influenzae do tipo B (BOLOGNIA, 2015). ↠ Uma mistura de cocos Gram-positivos e aeróbios e anaeróbios Gram-negativos é frequentemente implicada na celulite ao redor de úlceras diabéticas e de decúbito (BOLOGNIA, 2015). FATORES DE RISCO ↠ Linfedema, alcoolismo, diabetes melito, abuso de drogas intravenosas e doença vascular periférica são fatores de risco para a celulite (BOLOGNIA, 2015). OBS.: Episódios recorrentes de celulite podem resultar de um dano ao sistema linfático (p. ex., linfadenectomia, safenectomia ou episódios anteriores de celulite) (BOLOGNIA, 2015). 9 Júlia Morbeck – @med.morbeck FISIOPATOLOGIA ↠ Normalmente, as bactérias têm acesso à derme através de uma quebra na barreira da pele em indivíduos imunocompetentes, mas uma rota sanguínea é comum nos pacientes imunocomprometidos (BOLOGNIA, 2015). MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS ↠ A evolução é semelhante à da erisipela, sendo o eritema menos vivo, as bordas mal delimitadas, acompanhadas de sinais flogísticos. A presença de vesículas, bolhas, pústulas ou tecido necrótico caracteriza infecção grave. Febre, calafrios, mal-estar e linfadenopatia regional podem estar associados (AZULAY, 7ª ed.). ↠ A área afetada exibe todos os quatro sinais cardeais da inflamação: rubor (eritema), calor, dor e tumor (edema). As bordas geralmente são mal definidas e não palpáveis. Nas infecções graves, as vesículas, bolhas, pústulas ou o tecido necrótico podem estar presentes (BOLOGNIA, 2015). OBS.: A linfangite ascendente e o envolvimento regional do linfonodo podem ocorrer. Em crianças, a celulite afeta frequentemente a cabeça e pescoço, enquanto nos adultos tende a envolver as extremidades. Os usuários de drogas intravenosas normalmente desenvolvem celulite nas extremidades superiores (os locais usuais de injeção) (BOLOGNIA, 2015). A celulite facial é mais comum em crianças, porém pode ser observada em adultos. A celulite pré-septal atinge de forma aguda os tecidos palpebrais na região anterior ao septo orbitário. Quando o processo ultrapassa os limites desse septo, passa a ser considerada celulite orbitária, que constitui uma situação aguda, extremamente grave, pelo risco de trombose séptica do seio cavernoso. Como fatores predisponentes citam-se trauma na região orbitária, sinusite, e menos comuns, como dacriocistite, infecção dentária, infecção de pele, amigdalite, conjuntivite, estado gripal, varicela e disseminação hematogênica (AZULAY, 7ª ed.). Nos casos de celulite facial significativa, é mandatória uma avaliação oftalmológica para descartar diplopia, defeito pupilar aferente e redução da motilidade ocular. Exames de imagem como radiografia dos seios da face, ultrassonografia orbitária (pouco sensível) e tomografia de globo ocular são complementares ao diagnóstico (AZULAY, 7ª ed.). OBS.: Complicações como glomerulonefrite pós- estreptocócica, linfadenite, endocardite bacteriana subaguda e sepse são raras e mais comuns em crianças e imunodeprimidos (AZULAY, 7ª ed.). IMPORTNATE: A celulite hemorrágica, que é rara, é, sobretudo, descrita em pacientes com diabetes e imunodeprimidos e em uso de terapia anticoagulante. Caracteriza-se por área de hemorragia dérmica e bolhas; o fator de necrose tumoral alfa (TNF-α) parece ser responsável pelo dano vascular (AZULAY, 7ª ed.). DIAGNÓSTICO ↠ O diagnóstico da celulite é geralmente clínico (BOLOGNIA, 2015). 10 Júlia Morbeck – @med.morbeck ↠ A contagem de leucócitos é frequentemente normal ou apenas ligeiramente elevada (BOLOGNIA, 2015). ↠ As hemoculturas são quase sempre negativas em hospedeiros imunocompetentes. Uma exceção é a celulite por H. influenzae, onde normalmente existe uma contagem elevada de leucócitos com um desvio para a esquerda e hemoculturas positivas (BOLOGNIA, 2015). ↠ Micro-organismos atípicos são mais comuns em crianças e pacientes imunocomprometidos,e a aspiração ou as biopsias cutâneas podem ajudar a identificar a etiologia infecciosa (BOLOGNIA, 2015). OBS.: O diagnóstico diferencial da celulite da extremidade inferior inclui: trombose venosa profunda e doenças inflamatórias como dermatite de estase, tromboflebite superficial e paniculite (principalmente a lipodermatosclerose). Enquanto a tromboflebite superficial frequentemente se apresenta com rubor e dor à palpação, a ausência de febre e a presença de um cordão palpável auxiliam no diagnóstico. O diagnóstico incorreto de lipodermatosclerose, como celulite, frequentemente leva a hospitalizações desnecessárias (BOLOGNIA, 2015). TRATAMENTO ↠ O tratamento inclui repouso com elevação do membro, analgesia e antibioticoterapia sistêmica, que deve ser parenteral nos casos intensos ou localizados na face, devendo-se considerar as possibilidades etiológicas na escolha do tratamento (AZULAY, 7ª ed.). ↠ Quando a etiologia for estreptocócica, a recomendação já foi descrita no tratamento da erisipela. Nos casos em que se suspeita da etiologia estafilocócica (desde que não seja Staphylococcus aureus resistente à meticilina – MRSA), utiliza-se a oxacilina, na dose de 100 a 150 mg/kg/dia IV, de 4/4 h, ou cefalotina, 100 a 150 mg/kg/dia IV, de 4/4 h ou de 6/6 h (AZULAY, 7ª ed.). ↠ Nos casos de celulite hemorrágica, é indicado, ainda, o uso de corticosteroide sistêmico (AZULAY, 7ª ed.). ↠ Em crianças menores de 5 anos, o H. influenzae é frequentemente o causador de celulite pré-septal e orbitária não relacionada com traumatismo. O tratamento é intravenoso e pode ser feito com ampicilina, cloranfenicol ou ceftriaxona. O uso de prednisona na dose de 0,5 mg/kg/dia é preconizado por alguns autores como terapia coadjuvante nos casos mais exuberantes ou com pouca resposta à antibioticoterapia (AZULAY, 7ª ed.). Impetigo ↠ São infecções piogênicas primárias da pele, contagiosas, superficiais, produzidas por estafilococos e estreptococos (AZULAY, 7ª ed.). ↠ Acometem preferencialmente a face e os membros superiores, embora, com disseminação por autoinoculação, possam comprometer qualquer região. Utiliza-se o termo impetiginização quando o impetigo complica uma dermatose preexistente (p. ex., pediculose, escabiose, eczema etc.); nesse caso, em geral é de natureza estafilocócica (AZULAY, 7ª ed.). ↠ Existem duas formas, classicamente referidas como impetigo contagioso e impetigo bolhoso, que diferem entre si simplesmente pelo tamanho das pústulas (ROBBINS & COTRAN). EPIDEMIOLOGIA ↠ O impetigo frequentemente ocorre em crianças (principalmente < 6 anos de idade) e representa, em nível mundial, a infecção cutânea bacteriana mais comum nesse grupo (BOLOGNIA, 2015). ↠ Os adultos comumente adquirem o impetigo através do contato com crianças infectadas. O impetigo é 11 Júlia Morbeck – @med.morbeck extremamente contagioso, disseminando-se rapidamente por contato direto entre as pessoas ou através dos fômites (BOLOGNIA, 2015). ↠ Nos climas temperados, o pico da incidência ocorre nos meses do verão (BOLOGNIA, 2015). FATORES DE RISCO ↠ Os fatores de predisposição incluem: (BOLOGNIA, 2015). ➢ temperatura ambiente alta; ➢ alta umidade; ➢ má higiene; ➢ uma diátese atópica; ➢ trauma cutâneo; ➢ prática de esportes de contato (p. ex., lutas, futebol). OBS.: A colonização por S. aureus no nariz, faringe, axilas e/ou períneo envolve um risco elevado de desenvolvimento de impetigo e outras infecções estafilocócicas (BOLOGNIA, 2015). ETIOLOGIA/AGENTES ETIOLÓGICOS ↠ Staphylococcus aureus e, em menor grau, espécies de Streptococcus β-hemolítico do grupo A (Streptococcus pyogenes), são as principais causas do impetigo (BOLOGNIA, 2015). FISIOPATOLOGIA ↠ As espécies bacterianas na epiderme induzem uma resposta imune inata que apresenta uma tendência a destruir a epiderme, resultando na produção de exsudato seroso local com formação de uma crosta escamosa (casca de ferida) (ROBBINS & COTRAN). ↠ A patogenia da formação de bolhas no impetigo está relacionada à produção de uma toxina bacteriana que cliva especificamente a desmogleína 1, a proteína responsável pela adesão celular nas camadas superiores da epiderme. Como não há virtualmente qualquer envolvimento da derme, uma vez que as bactérias são eliminadas, as lesões são curadas sem cicatrização (ROBBINS & COTRAN). ↠ O impetigo não bolhoso é normalmente causado por S. aureus ou Streptococcus pyogenes (com menos frequência nos climas temperados). A infecção tipicamente ocorre nos locais de prurido (p. ex., picadas de insetos, dermatite atópica), traumas menores (p. ex., abrasão, laceração ou queimadura) ou outras infecções cutâneas (p. ex., varicela) (BOLOGNIA, 2015). ↠ A interrupção da barreira de pele permite a aderência, a invasão e o estabelecimento da infecção pelas bactérias (BOLOGNIA, 2015). A localização preferencial é em torno do nariz e da boca e nas extremidades, e a pele apresenta solução de continuidade para instalação do processo (exposição de receptores proteicos como a fibronectina, que possibilitam a aderência pelo ácido teicoico das bactérias). Ocorre no local de pequenos traumatismos como escoriações, queimaduras e picadas de insetos (AZULAY, 7ª ed.). ↠ O impetigo bolhoso resulta da produção local de toxinas esfoliantes (ETA, ETB) pelo grupo de fago tipo II S. aureus nos locais da infecção cutânea; a elaboração sistêmica das mesmas toxinas é a causa da síndrome da pele escaldada estafilocócica. Nas duas doenças, a formação das bolhas é mediada pela ligação da toxina esfoliativa à proteína desmossômica desmogleína 1 e pela clivagem de seu domínio extracelular, levando assim à acantólise dentro da camada granulosa epidérmica (BOLOGNIA, 2015). ↠ O impetigo bolhoso é mais provável de se desenvolver na pele clinicamente intacta (principalmente em locais intertriginosos) que o impetigo não bolhoso (BOLOGNIA, 2015). MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS ↠ Manifesta-se como uma mácula eritematosa, porém pequenas e múltiplas pústulas aparecem rapidamente a seguir. Quando as pústulas se rompem, formam-se erosões superficiais recobertas com soro seco, dando uma aparência clínica característica de crosta cor de mel. 12 Júlia Morbeck – @med.morbeck Se a crosta não é removida, novas lesões se formam sobre a periferia e, posteriormente, pode ocorrer uma extensa lesão epidérmica. A forma bolhosa do impetigo ocorre principalmente em crianças (ROBBINS & COTRAN). IMPORTANTE: O aspecto microscópico característico do impetigo é o acúmulo de neutrófilos sob o estrato córneo, frequentemente produzindo uma pústula subcórnea. As colorações especiais revelam a presença de bactérias nessas áreas. Alterações epidérmicas reacionais inespecíficas e inflamação dérmica superficial acompanham esses achados. A ruptura das pústulas libera líquido seroso, neutrófilos, e os restos celulares, que se depositam e ressecam, formando a crosta característica (ROBBINS & COTRAN). ↠ IMPETIGO NÃO BOLHOSO: Inicialmente ocorre mácula eritematosa que evolui rapidamente para bolha e/ou vesícula efêmeras de paredes finas, porém a crosta resultante é espessa e de coloração amarelada (lembra mel – melicérica). Pode lembrar a queimadura de cigarro; não há tendência à circinação. Sintomas gerais normalmente estão ausentes e pode ser acompanhado de linfadenite-satélite. Não há elevação de antiestreptolisina O (ASLO) (AZULAY, 7ª ed.). ↠ IMPETIGO BOLHOSO: Tem como características clínicas a formação de vesículas que rapidamente se transformam em bolhas grandes que sofrem processo de pustulização. As crostas resultantes são finas e acastanhadas e, por vezes, tomam aspecto circinado. As localizações preferenciais são face, períneo, nádegas e extremidades (AZULAY, 7ª ed.). CARACTERÍSTICAS DO IMPETIGO BOLHOSOE NÃO BOLHOSO IMPETIGO NÃO BOLHOSO IMPETIGO BOLHOSO EPIDEMIOLOGIA 70% de todos os casos de impetigo; Crianças afetadas com mais frequência Menos comum; Frequentemente ocorre no período neonatal, mas as crianças também são afetadas. LESÕES CLÍNICAS Inicial: uma única mácula eritematosa de 2– 4 mm que evolui rapidamente para uma vesícula ou pústula de vida curta; Tardio: erosão superficial com uma crosta amarela “cor de mel” e extensão rápida e direta da infecção para a pele adjacente. Inicial: pequenas vesículas que aumentam e se transformam em bolhas superficiais de 1– 2 cm; Tardio: bolhas flácidas e transparentes que medem até 5 cm de diâmetro; depois do rompimento existe um colarete de escamas, mas não uma crosta grossa; normalmente, há um pouco de eritema ao redor. Impetigo bolhoso. A. Tendência à confluência das lesões e aspecto circinado. B. Tendência à confluência das lesões e à circinação; etiologia estafolocócica. 13 Júlia Morbeck – @med.morbeck DISTRIBUIÇÃO Face (ao redor do nariz e boca) e extremidades. Face, tronco, nádegas, períneo, axilas e extremidades. ACHADOS ASSOCIADOS Linfadenopatia leve pode estar presente. Normalmente não há sintomas sistêmicos, mas pode ser associado à fraqueza, febre e diarreia. CURSO CLÍNICO Geralmente um processo benigno e autolimitado; Geralmente se resolve dentro de 2 semanas sem formação de cicatriz, se não for tratado. Geralmente se resolve em 3–6 semanas sem formação de cicatriz, se não for tratado. COMPLICAÇÕES Em 5% dos casos, o impetigo não bolhoso causado pelo S. pyogenes (sorotipos 1, 4, 12, 25 e 49) resulta na glomerulonefrite pós-estreptocócica aguda (GPEA); O risco de GPEA não é alterado pelo tratamento com antibióticos; O impetigo não foi vinculado a um risco de febre reumática. Em lactentes/crianças pequenas e adultos com imunodeficiência ou insuficiência renal, a toxina esfoliante pode disseminar e causar a síndrome de pele escaldada estafilocócica. DIAGNÓSTICO ↠ O diagnóstico de impetigo em geral é feito clinicamente, baseado nos sinais/sintomas do exame físico com a história clínica colhida durante a anamnese (BOLOGNIA, 2015). DIAGNÓSTICO CLÍNICO ↠ O impetigo não bolhoso apresenta lesões vesiculosas e/ou pustulosas e placas eritematosas recobertas por crostas melicéricas, principalmente na face e nas extremidades. O impetigo bolhoso apresenta lesões vesicobolhosas e erosões circundadas por crostas. Pode apresentar lesões-satélite (NETO et. al., 2019). DIAGNÓSTICO LABORATORIAL ↠ Podem-se realizar exames bacterioscópicos e cultura para identificação do agente (AZULAY, 7ª ed.). ↠ O exsudato abaixo da crosta ou do fluido das bolhas intactas pode ser enviado para a cultura, a fim de confirmar o diagnóstico (principalmente nos casos mais extensos, que exigem terapia sistêmica) e determinar a suscetibilidade aos antibióticos (BOLOGNIA, 2015). ↠ A leucocitose é observada em aproximadamente metade dos pacientes com impetigo (BOLOGNIA, 2015). OBS.: Entre os diagnósticos diferenciais, destacam-se herpes simples, candidíase, dermatofitose, periporite e miliária (AZULAY, 7ª ed.). TRATAMENTO ↠ A extensão do envolvimento da pele, a presença de complicações (p. ex., celulite, linfangite), comorbidades (p. ex., dermatite atópica, varicela), status imune do paciente e padrões locais de resistência ao fármaco (p. ex., prevalência do S. aureus resistente à meticilina e associado à comunidade [CA-MRSA]) devem ser levados em consideração ao decidir se a terapia tópica, oral ou intravenosa é mais adequada (BOLOGNIA, 2015). ↠ Para pacientes saudáveis com poucas lesões superficiais e nenhum sintoma sistêmico, a pomada de mupirocina a 2% ou retapamulina a 1% pode ser prescrita. Com frequência, esses medicamentos tópicos são igualmente (quando não mais) efetivos que os antibióticos orais para a doença limitada (BOLOGNIA, 2015). ↠ O tratamento também deve incluir a limpeza da área afetada e a remoção de crostas (que pode ser facilitada por curativos úmidos) (BOLOGNIA, 2015). ↠ Nos casos mais extensos, antibioticoterapia sistêmica é mandatória, pode ser utilizado cefalexina ou amoxicilina + ácido clavulânico (AZULAY, 7ª ed.). São indicações para tratamento com antibiótico sistêmico: (PEDIATRIA, 2017). ➢ acometimento de estruturas mais profundas (tecido subcutâneo e fáscia muscular); ➢ febre; ➢ linfadenomegalia; ➢ faringite associada a infecções próximas à cavidade oral, uma vez que a criança pode retirar a medicação tópica com a boca; ➢ infecções no couro cabeludo causadas pela dificuldade do uso de cremes ou pomadas no local; ➢ lesões numerosas (acima de 5) ou mais que dois locais topográficos. IMPORTANTE: Deve-se considerar o risco de glomerulonefrite pós- estreptocócica, complicação que ocorre três semanas após o início do quadro cutâneo (NETO et. al., 2019). 14 Júlia Morbeck – @med.morbeck Referências JUNQUEIRA, L. C.; CARNEIRO, J. Histologia básica: texto e atlas. 13. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018 MARIEB, E. N.; HOEHN, K. Anatomia e Fisiologia, 3ª ed., Porto Alegra: Artmed, 2008 TORTORA. Princípios de Anatomia e Fisiologia. Disponível em: Minha Biblioteca, (14th edição). Grupo GEN, 2016. KUMAR, Vinay; ABBAS, Abul; ASTER, Jon. Robbins & Cotran Patologia - Bases Patológicas das Doenças. Grupo GEN, 2016. AZULAY, Rubem D. Dermatologia, 7ª edição. Grupo GEN, 2017. BOLOGNIA, Jean. Dermatologia. Grupo GEN, 2015. DOS NETO, Cyro F.; CUCÉ, Luiz C.; REIS, Vitor Manoel Silva. Manual de dermatologia Editora Manole, 2019. PEDIATRIA, Sociedade Brasileira D. Tratado de Pediatria, Volume 1. Editora Manole, 2017.
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