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TUTORIAL 1 - Síndrome metabólica

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Síndrome metabólica
1. Definição, epidemiologia e fisiopatologia da síndrome metabólica.
2. Quadro clínico e Diagnóstico (os 5 critérios diagnósticos)
3. Diagnósticos diferenciais 
3.1 Obesidade (classificar a obesidade de acordo com o IMC)
3.2 Alta nos níveis glicêmicos
3.3 Dislipidemias (classificar os tipos de dislipidemias; cálculo do LDL pela fórmula de Friedewald
4. Complicações
5. Tratamento (Observar quando iniciar e qual o melhor para cada tipo.)
5.1 Não farmacológico
5.2 Farmacológico (Dislipidemias e Obesidade)
1- Definição, epidemio e fisiopato
Definições 
Diversas definições já foram propostas para a SM. Cada qual tem suas par ticularidades, com grupos de autores defendendo uma ou outra, de acordo com o conceito em que acreditam. Existem, atualmente, 3 definições amplamente utilizadas para SM: a da Organização Mundial da Saú de (World Health Organization – WHO),3 a do Third Report of the National Cholesterol Education Program Expert Panel on Detection, Evaluation and Treatment of High Blood Cholesterol in Adults (Adults Treatment Panel III [ATP III])4 e da International Diabetes Federation (IDF) (Quadro 68.1).5 
Embora as classificações adotem aspectos comuns da síndrome, elas têm especificidades a serem contempladas. A classificação da WHO,3 de 1998, considera a resistência à insulina (RI) e/ou as alterações no metabolismo glicídico como fatores essenciais ao diagnóstico da SM. Entretanto, em pacientes com níveis normais de glicemia, essa definição exige a rea li zação de clamp para definir a RI nesses casos, o que torna seu uso inviá vel na prática clínica. Algumas modificações nesse critério já foram estudadas e validadas, como a utilização do Homeostasis Model of Assessment (HOMA) ou a medida da insulinemia de jejum na definição da RI. Nessa definição, os valores de corte para hipertensão arterial sistêmica (HAS) são muito elevados, uma vez que risco cardiovascular está presente em pacientes com valores pressóricos mais baixos 
Além disso, o emprego apenas da medida da relação cintura-quadril, e não apenas da medida da cintura isoladamente, é passível de críticas e seu papel será mais bem discutido posteriormente. Ademais, existem cada vez mais evidências de que mesmo pessoas com índice de massa corporal (IMC) < 30 kg/m2 já podem apresentar um risco aumentado para eventos cardiovasculares. Finalmente, a inclusão de microalbuminúria como critério diagnóstico é um fator limitante, já que ela está presente em apenas um pequeno número de pacientes e sua pesquisa é dispendiosa.3 A classificação proposta pelo ATP III4 em 2001 durante muito tempo foi a mais utilizada na prática clínica diá ria. Alguns pontos, entretanto, merecem ser discutidos. Primeiro, apenas a medida isolada da cintura é empregada na avaliação de tecido adiposo abdominal. Do mesmo modo, o papel da cintura e da relação cintura-quadril será discutido posteriormente. Segundo, os limites de pressão arterial são mais rígidos e correlacionam-se melhor com o risco cardiovascular. Além disso, apenas pacientes com intolerância glicídica e/ou diabetes mellitus (DM) são incluí dos nessa classificação, descartando-se o critério de RI. A ausência de um marcador de RI (p. ex., insulinemia de jejum, HOMA) exclui um importante grupo de pacientes.4 Diversas alterações às classificações foram igualmente propostas. Alguns autores incluí ram o teste oral de sobrecarga com glicose (TOTG) e a dosagem da insulina plasmática de jejum como indicadores de resistência insulínica, enquanto outros sugeriram alterações nos valores de cintura, cintura-quadril e IMC, conforme diferentes grupos étnicos. Não existe, entretanto, nenhum consenso ou estudo dessas classificações em uma população brasileira. A última classificação publicada foi proposta pela IDF5 em 2005 e tornou-se rapidamente uma das definições mais utilizadas no mundo. Ela se baseia no conceito de que a presença de gordura visceral (estimada pela medida da cintura) é o fator essencial e determinante de todos os outros componentes da SM (Figura 68.1). Mais do que isso, ao estratificar os valores por etnias, a IDF fortalece o conceito de que as diferentes populações mundiais apresentam diferentes proporções corporais. Além de considerar a cintura como fator essencial ao diagnóstico, a IDF já incorpora níveis de glicemia ≥ 100 mg/dL como anormais e considera referências também à existência de tratamento para as condições associadas. Embora tenha sido, provavelmente, a mais precisa definição da SM, essa classificação também não leva em conta a presença de tecido adiposo subcutâneo periférico (avaliada pela relação cintura-quadril).
A Síndrome Metabólica (SM) caracteriza-se por alterações metabólicas complexas e tem sido amplamente estudada no mundo por suas repercussões negativas à saúde dos indivíduos, e também por sua forte associação com as doenças cardiovasculares1 e diabetes tipo 21,2. Esta síndrome envolve a agregação de condições tais como hipertensão arterial, obesidade abdominal, dislipidemias e alteração no metabolismo da glicose3 . 
Em geral, os estudos estimam a prevalência de SM com base no consenso definido pelo Adult Treatment Panel III (ATP III)4 , apesar de já existir recomendação para a padronização dos critérios e melhor comparação dos estudos3 . O fenótipo da SM permite identificar facilmente indivíduos em risco para a ocorrência de doenças crônicas não transmissíveis5,6, que no Brasil constituem a maior causa de morbimortalidade da população, sendo responsável por 76% das mortes em 2017 no país7 . Além disso, sabe-se que o risco a desfechos negativos relacionado à SM é sinergicamente maior que se estimado seus fatores componentes separadamente6 . No Brasil, foi registrada uma prevalência de SM na população adulta de 29,6%6 , podendo alcançar mais de 40% nas faixas etárias maiores que 60 anos8 . Uma coorte brasileira também mostrou prevalência de 44% de SM9 . A mais baixa prevalência (9%) foi estimada em inquérito com representatividade nacional, muito aquém do observado na maioria das publicações10. Nesses estudos, alguns dos componentes foram autorreferidos, podendo levar a uma subestimação da prevalência da SM e de seus componentes individuais10,11. As medidas da pressão arterial, circunferência da cintura (CC) e três outros fatores (triglicérides, colesterol HDL e glicemia de jejum) requerem medições diretas para a obtenção de estimativas mais precisas e confíáveis. Estudos com medidas diretas foram realizados apenas em populações restritas e com pequenas amostras, com ou sem amostragem aleatória8,12. Outro aspecto relevante encontrado foi que subgrupos populacionais mais vulneráveis do ponto de vista sociodemográfico e com inadequados estilos de vida apresentaram maior ocorrência da SM10,11,13. A obteção de estimativas mais confiáveis da prevalência da SM na população adulta brasileira depende da utilização de dados bioquímicos e antropométricos com representatividade nacional. Contudo, são poucos os estudos populacionais que utilizam esses tipos de dados. Além da escassez de estudos, observa-se a utilização de diferentes critérios para a definição da SM encontrada na literatura científica, o que dificulta a comparabilidade entre diferentes populações. Outro aspecto que deve ser considerado nesse contexo é a alta carga global estimada de DCNT no país14, sendo necessário o dimensionamento da magnitude da SM e sua distribuição segundo fatores sociodemográficos, como sexo, idade, escolaridade e situação do domicílio para avaliar possíveis desigualdades da ocorrência desse agravo. Dessa forma, o objetivo do presente estudo foi estimar a prevalência de Síndrome Metabólica na população brasileira de acordo com fatores sociodemográficos, utilizando um consenso padronizado por diversos comitês e aceito internacionalmente3 .
Prevalência da síndrome metabólica 
Conforme já mencionado, existem grandes questionamentos sobre qual é a melhor definição da SM. Deste modo, os estudos de prevalência apresentam controvérsias, variando de acordo com a população e os critériosutilizados. Entretanto, independentemente do critério adotado, é consenso que a prevalência da SM vem aumentando. Dados do NHANES (utilizando a definição do ATP adaptada) mostram um aumento da prevalência de 29,2% (1988-1994) para 34,6% (1999-2002) em adultos de meia-idade nos EUA. Usando os mesmos dados de 1999-2002, porém com os critérios da IDF, essa prevalência chega a 39,1%.11 O comportamento da SM no restante do mundo parece variar amplamente conforme o país. Em alguns países europeus (França, Hungria, Suécia), essa prevalência situa-se entre 10 e 15% na população adulta.11 No Brasil, há poucos dados disponíveis. Um dos estudos aponta uma prevalência de 25,9% em homens e 40,9% em mulheres entre 40 e 74 anos.12 Dados mais recentes, obtidos no interior do estado de São Paulo, apontam resultados semelhantes na população entre 30 e 79 anos: 38% no sexo feminino e 36% no sexo masculino.13 Já em Vitória, os dados indicam uma prevalência de 30% na população entre 25 e 64 anos.14 É interessante observar que a maioria dos estudos de prevalência utilizou o critério do ATP III, o qual considera valores mais elevados de cintura. Estudos mais recentes, utilizando os critérios da IDF, apontam para uma prevalência ainda maior da SM, com elevação de 10 a 15% em relação aos mesmos valores observados sob os critérios do ATP III (p. ex., a prevalência de SM em mulheres da Tunísia com mais de 40 anos foi estimada em 55,8%).11
Fisiopatologia 
Hoje em dia, o conceito mais importante para o entendimento da fisiopatologia da SM é de que ela está diretamente relacionada não apenas com o excesso de peso per se, mas também com uma alteração em sua distribuição no corpo. A SM parece ser decorrente diretamente de um excesso de (TECIDO ADIPOSO VISCERAL) TAV e de uma diminuição do tecido adiposo subcutâneo (TECIDO ADIPOSO SUBCUTÂNEO ), o que levaria a alterações significativas no metabolismo de ácidos graxos livres ácidos graxos livres , hiperinsulinemia e inflamação, entre outros achados.2,7,11,15 
De maneira geral, parecem existir dois tipos principais de adipócitos no corpo humano: um adipócito grande, com baixa capacidade de armazenamento de ÁCIDOS GRAXOS LIVRES , e outro menor, consequentemente com maior lipólise.15 Até pouco tempo atrás, acreditava-se que o adipócito grande também tivesse uma grande capacidade de secreção de citocinas inflamatórias. Entretanto, sabe-se que hoje não são os adipócitos que produzem diretamente tais citocinas, mas uma grande quantidade de macrófagos que circundam esse grupamento celular. O outro tipo de adipócito é pequeno, mostra-se capaz de armazenar grandes capacidades de ÁCIDOS GRAXOS LIVRES sob a forma de triacilglicerol e produz poucas citocinas inflamatórias (já que, praticamente, não há infiltração de células inflamatórias). Esse seria o adipócito realmente funcional e necessário para o corpo humano (adipócito subcutâ neo). 
Primariamente, a SM parece ser decorrente de uma desproporção na distribuição desses dois tipos de adipócitos.15 Existem várias teorias para explicar como os diferentes adipócitos modulam a RI. De maneira geral, a própria RI levaria a um aumento da lipólise nos adipócitos viscerais, ocasionando um aumento do aporte de ÁCIDOS GRAXOS LIVRES para o fígado (lipotoxicidade), inibindo a ação da insulina nesse órgão.15,16 A resistência insulínica no fígado levaria a um aumento da gliconeogênese hepática (hiperglicemia), da produção de citocinas inflamatórias (inflamação) e da produção excessiva de VLDL colesterol, com consequente hipertrigliceridemia e redução nos níveis de HDL-colesterol (HDL-c).16,17 
O fígado não é o único órgão que participa da RI. O tecido muscular também tem um papel importante. Mais especificamente, o excesso de ÁCIDOS GRAXOS LIVRES atua diretamente na célula muscular, inibindo o transporte de glicose mediado pela insulina.17 Além disso, o depósito de gordura no músculo, em particular o conteúdo intramiocelular de triglicérides, relaciona-se inversamente com a RI e é proposto como um mecanismo importante para a RI no músculo.18 Por outro lado, o excesso de citocinas inflamatórias (principalmente o fator de necrose tumoral-alfa [TNF-] e a interleucina-6 [IL-6]) parece inibir diretamente a ativação do receptor da insulina, dificultando, assim, o transporte intracelular da glicose.10,16–18 Conforme já mencionado, não apenas o excesso de ÁCIDOS GRAXOS LIVRES parece determinar a RI. O excesso de moléculas inflamatórias produzidas pelos adipócitos (adipocinas) também participa do processo. Duas das mais importantes citocinas envolvidas na SM são a IL-6 e o TNF-, com vários estudos demonstrando efeitos deletérios sobre diversos órgãos. Outro marcador inflamatório comumente alterado na SM é a proteí na C reativa, a qual costuma ser indicador indireto de inflamação generalizada, na prática clínica. Por fim, duas adipocinas específicas vêm se revelando cada vez mais importantes: a resistina e a adiponectina. A resistina já se mostrou diretamente associada a TAV, pressão arterial sistólica, hipertrigliceridemia e HDL colesterol baixo.20,21 A adiponectina, por outro lado, tem características inversas, isto é, se associa inversamente a peso corporal, TAV, pressão arterial, hipertrigliceridemia, inflamação e RI. Godoy-Matos et al.19 estudaram pacientes não diabéticos com SM e descobriram que aqueles com SM tinham níveis mais baixos de adiponectina do que o grupo-controle. Curiosamente, o teor de gordura intramiocelular, avaliado por espectroscopia de prótons com ressonância magnética, correlacionava-se inversamente com a adiponectina. A adiponectina aumenta a oxidação de gordura no músculo e isto sugere que os baixos níveis desta adipocina diminuiriam a oxidação de lipídios, levando à sua acumu lação na célula muscular. Por isso, a SM pode ser, eventualmente, chamada de síndrome hipoadiponectínica. Assim, outras ações desta adipocina (antiinflamatória e antiaterosclerótica) sugerem que a adiponectina parece ser um hormônio com propriedades anti-SM.21,22 Finalmente, um dos grandes aspectos a serem discutidos é por que algumas pessoas apresentam maior quantidade de adipócitos viscerais, enquanto outras formam mais adipócitos subcutâ neos. Já existem evidências de que alterações genéticas podem determinar a distribuição do tecido adiposo. Diversos polimorfismos já foram identificados em populações específicas, indicando maior propensão para uma ou mais características da SM.11
2- Quadro clínico e critérios diagnósticos 
A síndrome metabólica é caracterizada por adiposidade de distribuição central (obesidade visceral), resistência à insulina, diabetes melito ou intolerância à glicose, hipertensão (HAS), dislipidemia e estado pró-trombótico e pró-inflamatório. 
Ao longo do tempo, alguns critérios foram definidos para estabelecer o diagnóstico de síndrome metabólica. 
O National Cholesterol Education Program Adult Treatment Panel III (NCEP ATP-III) sugere o uso de cinco variáveis clínicas como critérios diagnósticos para a síndrome metabólica, sendo necessários pelo menos três dos cinco critérios para diagnóstico da síndrome:
· Circunferência da cintura aumentada > 102 cm em homens e > 88 cm em mulheres 
· Pressão arterial (PA) elevada ≥ 130/85 mmHg ou tratamento medicamentoso para hipertensão 
· Níveis plasmáticos aumentados de triglicerídios ≥ 150 mg/dℓ ou tratamento medicamentoso para hipertrigliceridemia 
· Níveis plasmáticos diminuídos de colesterol da lipoproteína de alta densidade (HDLc): < 50 mg/dℓ (mulheres) ou < 40 mg/dℓ (homens) ou tratamento medicamentoso para HDL-c baixo 
· Glicemia de jejum ≥ 110 mg/dℓ ou tratamento medicamentoso para hiperglicemia. 
Já de acordo com a International Diabetes Federation (IDF), os melhores critérios para o diagnóstico da síndrome metabólica seriam: 
· Obesidade central (circunferência abdominal > 90 cm para homens asiáticos, > 94 cm para homens europeus e > 80 cm para mulheres) associada a dois ou mais dos seguintes critérios: 
· PA elevada caracterizada por pressão arterial sistólica ≥ 130 mmHg, diastólica≥ 85 mmHg ou tratamento medicamentoso para hipertensão 
· Níveis plasmáticos aumentados de triglicerídios ≥ 150 mg/dℓ ou tratamento medicamentoso para hipertrigliceridemia 
· Níveis plasmáticos diminuídos de HDL-c: < 50 mg/dℓ (mulheres) ou < 40 mg/dℓ (homens) ou tratamento medicamentoso para HDL-c baixo 
· Glicemia de jejum ≥ 100 mg/dℓ ou diagnóstico prévio de diabetes melito tipo 2.
Por fim, para a Organização Mundial da Saúde (OMS), caracteriza-se a síndrome metabólica na presença de pelo menos dois dos seguintes critérios (Tabela 100.1):
· Relação cintura/quadril > 0,85 para mulheres ou > 0,9 para homens ou IMC > 30 kg/m 
· Diabetes melito tipo 2, intolerância à glicose ou resistência à insulina comprovada pelo clamp 
· Triglicerídios ≥ 150 mg/dℓ ou HDL-c < 35 mg/dℓ para homens ou HDL-c < 39 mg/dℓ para mulheres 
· PA ≥ 140 × 90 mmHg ou tratamento medicamentoso para HAS 
· Microalbuminúria ≥ 20 μg/24 h ou 30 mg/g de creatinina. 
Mais recentemente, um consenso diagnóstico foi publicado conjuntamente pela IDF, National Lung, Heart and Blood Institute, American Heart Association (AHA), World Heart Federation, International Atherosclerosis Society e International Association for the Study of Obesity. Nesse consenso, o diagnóstico de síndrome metabólica é feito pelos critérios da IDF, porém a obesidade central não é mais obrigatória.
3- Diagnósticos diferenciais 
Obesidade 
Definição 
Define-se obesidade como excesso de gordura corporal relacionado à massa magra. 
Distingue-se desde já obesidade de excesso de peso (aumento do peso corporal relacionado à altura), nem sempre coincidentes, como no caso de excesso de massa muscular e conseqüente excesso de peso, na ausência de obesidade (taxa normal de gordura corporal)
Métodos de avaliação 
O limite de peso normal (peso da população associado à menor mortalidade para altura) é arbitrário, podendo haver diferenças entre as populações estudadas. Podem-se estabelecer basicamente dois tipos de diagnósticos diante de um paciente obeso: diagnóstico quantitativo, referente à massa corporal ou à massa de tecido adiposo total (Tabela I) e diagnóstico qualitativo, quanto à distribuição de gordura corporal ou à presença de adiposidade visceral (Tabela II).
Diagnóstico quantitativo 
Definido há um século pelo astrônomo belga Quetelet, o índice de massa corpórea (IMC, outrora conhecidocomo Índice de Quetelet), é calculado por peso (em kg) dividido pelo quadrado da altura (em metros), eainda considerado o método quantitativo mais utilizado na rotina clínica. De cálculo simples e rápido, o IMC tem boa correlação com a adiposidade corporal total.
Sendo, porém, exclusivamente quantitativo, o IMC não distingue gordura visceral de gordura subcu- tânea, tampouco, massa gordurosa de massa magra. Nesse último caso, o cálculo do IMC superestima o grau de obesidade em indivíduos musculosos4. Por outro lado, em termos populacionais, esse índice permanece com alto valor preditivo positivo quanto ao risco de doenças associadas à obesidade (Tabela III). 
Em crianças, além do peso, o IMC também varia com a altura ao longo dos anos e com a idade, não sendo o seu uso satisfatório como valor absoluto. Preferimos o uso do IMC percentual (%IMC), que independe da altura e da idade da criança e se apóia em tabelas de percentis de peso e de altura (Tabela II)5. Alternativamente, os gráficos de peso e altura por idade e sexo e/ou de índice de massa corporal por idade e sexo podem ser utilizados (www.cdc.gov). 
Quando o resultado é > 110%, considera-se presença de sobrepeso e quando > 120%, de obesidade. Mais recentemente, sugere-se o uso das curvas de IMC ajustados para idade e sexo, segundo o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (disponível em: http://www.cdc.gov), podendo ser calculado o escore Z do IMC, mais detalhes no site http://www.growthanalyser.org. Resumidos, na Tabela I, estão os demais métodos quantitativos, dentre os quais, destaca-se a impedância bioelétrica ou bioimpedância de freqüência única (Figura 1). A princípio, exclusiva para análises experimentais, abioimpedância apresenta crescente importância na prática clínica, pelo desenvolvimento de aparelhos menores e mais baratos, de alta precisão e fácil utilização, permitindo avaliar porcentagens de massa adiposa e de tecidos magros6.A impedância bioelétrica substituiu com vantagem o método da somatória da medida da espessura das pregas cutâneas (Figura 2) cujas variabilidades inter e intra-examinador são inaceitáveis. São considerados valores normais:< 25% de tecido adiposo para homens e < 33% de tecido adiposo para mulheres7. A absorciometria dual de raios X (DXA) fundamenta-se nas diferentes capacidades dos tecidos em absorver energia, medidas pela quantidade de fótons que emergem da massa magra (músculo, água e osso) e da massa gorda, possibilitando, assim, determinar quantidade e também distribuição de cada uma, constituindo, dessa forma, um método quantitativo e qualitativo8.
Diagnóstico qualitativo 
A notória correlação entre citocinas inflamatórias (adipocitoquinas) (Figura 3) e gordura visceral, com conseqüentes riscos cardiovascular e metabólico, tornou necessária a identificação de métodos qualitativos que indiquem a distribuição da gordura corporal.
A utilização desses métodos permite a identificação de dois tipos principais de obesidade: obesidade visceral*, caracterizada pela maior concentração acima da cicatriz umbilical,à frente e acima de L4-L5,mais freqüente, porém não exclusiva no sexo masculino; e obesidade subcutânea**, mais concentrada na região dos quadris, infra-umbilical, característica da mulher na pré-menopausa (Tabela IV)7,9. 
Dos métodos qualitativos (Tabela V), a tomografia computadorizada (Figura 4) é o que melhor discrimina a distribuição de gordura corporal subcutânea (parte A) e visceral (parte B), sendo considerada padrão de referência entre todos os métodos. O valor total normal de gordura visceral é < 130 cm2, para ambos os sexos, medida pela área de gordura no nível de L4-L5 ou por avaliação volumétrica por múltiplos cortes abdominais em tomografia espiral10.Além de extremamente oneroso para uso rotineiro na prática clínica, há um impeditivo adicional importante, já que grande parte dos indivíduos obesos não consegue ser acomodada em tomógrafos convencionais11. 
Cada vez mais, a medida isolada da circunferência abdominal se comprova suficiente para estabelecer riscos cardiovascular e metabólico (Tabela VI), com seus valores idealmente ajustados para etnia e sexo, conforme dita o último Consenso de Síndrome Metabólica do International Diabetes Federation (IDF) (Tabela IX)12. Esse consenso contribuiu para a valorização da obesidade visceral no espectro da síndrome metabólica (SM), exigindo sua presença, por meio da circunferência abdominal,somada a mais dois critérios para o diagnóstico dessa síndrome (Tabela VII). Até então, a obesidade visceral representava apenas um entre os cinco critérios do consenso do NCEP – ATPIII (Tabela VIII), de 2001, não estando necessariamente entre os três necessários para o diagnóstico da Síndrome Metabólica13. 
O Consenso doIDF significou ainda grande aumento na prevalência da SM devido aos menores valores de circunferência abdominal estabelecidos como normais, possibilitando, dessa maneira, um diagnóstico mais precoce de SM e a conseqüente prevenção primária de importantes doenças associadas a esse padrão de adiposidade. A relação cintura-quadril é obtida pela divisão do maior perímetro abdominal (entre a última costela e a crista ilíaca), pelo perímetro do quadril (> distância entreostrocânteres femorais). Índices superiores a 0,8 em mulheres e 0,9 em homens definem distribuição central de gordura com boa correlação com os métodos de imagem: tomografia ou ressonância magnética e complicações metabólicas (Tabela X).
Alta nos níveis glicêmicos 
Introdução 
Diabetes mellitus (DM) é um grupo de doenças metabólicas caracterizado por hiperglicemia resultante de defeitos na secreção ou ação da insulina, ou, o que é mais comum, em ambos.1 Os valoresde corte para o diagnóstico DM baseiam-se na associação observada entre níveis glicêmicos e grande aumento na prevalência de complicações microvasculares, consideradas específicas do DM, especialmente a retinopatia e a nefropatia.2 Em 1979, a principal entidade do governo norte-americano para coleta, análise e disseminação de dados relacionados ao DM e suas complicações, o National Diabetes Data Group (NDDG), apresentou, pela primeira vez, o conceito de um estado metabólico in ter mediá rio entre a homeostase normal da glicose (euglicemia) e o DM, denominado intolerância à glicose.3 Em 1997, o Comitê de Especialistas no Diagnóstico e Classificação do Diabetes da Associação Americana de Diabetes (ADA) ampliou esse conceito, definindo a glicemia de jejum alterada (impaired fasting glucose – IFG) e a tolerância diminuída à glicose (impaired glucose tolerance – IGT).4 Ambas as categorias foram referidas como prédiabetes e são consideradas condições de alto risco para o desenvolvimento de DM tipo 2.4 Além disso, complicações micro e macrovasculares, como retinopatia, nefropatia, neuropatia e doen ça cardiovascular, já podem estar presentes em casos de pré-diabetes.1,2,4 
O critério de classificação de pré-diabetes evoluiu ao longo do tempo. Em 1979, o NDDG estabelecia que intolerância à glicose se caracterizava pela presença concomitante das 3 condições a seguir: 
a) glicemia de jejum (GJ) < 140 mg/dL; 
b) glicemia entre 140 e 199, 2 h após o teste oral de tolerância à glicose (TOTG); 
c) pelo menos 1 valor de glicemia > 200 mg/dL, 30, 60 ou 90 min durante o TOTG. 
Em 1980, a Organização Mundial da Saúde (OMS) simplificou, estabelecendo dois critérios, em vez dos 3 antes citados, ou seja, GJ < 140 mg/dL e glicemia de 2 h no TOTG (após a administração oral de 75 g de glicose anidra) entre 140 e 199 mg/dL.5 
Observações epidemiológicas indicavam, contudo, que o valor de corte da glicemia de jejum para o diagnóstico de DM selecionava in di ví duos com grau de hiperglicemia mais acen tuado do que o critério de 200 mg/dL para a glicemia de 2 h no TOTG. Além disso, alguns dados apontavam aumento na incidência de retinopatia já com glicemia em torno de 126 mg/dL. Assim, a ADA (em 1997) e a OMS (em 1998) alteraram o critério diagnóstico do DM, diminuindo o valor da GJ de 140 mg/dL para 126 mg/dL. Ambas as entidades definiram também dois estados in ter me diá rios da homeostase glicêmica, caracterizados por hiperglicemia em nível inferior àquele que caracterizava o diagnóstico de DM, a tolerância diminuí da à glicose (IGT), caracterizada por glicemia de 2 h no TOTG entre 140 e 199 e a glicemia de jejum alterada (IFG), caracterizada por glicemia de jejum entre 110 e 125 mg/dL. 
O uso dos valores in ter me diá rios foi abandonado a fim de simplificar os critérios e também em função da boa correlação da glicemia de 2 h com a retinopatia. IGT e IFG podem ser observados em estágio in ter me diá rio de qualquer das doen ças hiperglicemiantes que levam ao DM, conforme caracterização da ADA.1 Pré-diabetes aumenta em 3 a 10 vezes o risco absoluto a curto prazo de desenvolver diabetes, dependendo da população estudada.1 Em 2003, o critério de normalidade para a GJ foi diminuí do de < 110 mg/dL para < 100 mg/dL.5 Essa medida aumentou em 2 a 3 vezes a prevalência de pré-diabetes. 
O teste preferencial para o diagnóstico do DM é a glicemia de jejum, em razão de praticidade e custo, ao passo que o TOTG deve ser rea li zado naqueles com IFG, ou naqueles em que, mesmo com GJ normal, exista a suspeita de diabetes.1 Em 2010, o valor de hemoglobina glicada (HbA1c ou A1C) ≥ 6,5% passou a ser considerado critério diagnóstico de diabetes, desde que confirmado em, pelo menos, duas ocasiões.7 Essa decisão foi corroborada por dados que mostraram aumento na incidência de retinopatia com níveis de HbA1c a partir de 6,5%.4,8 A partir de então, in di ví duos com HbA1c entre 5,7 e 6,4% passaram a ser considerados portadores de pré-diabetes.7,9 É importante salientar que, para todos os 3 testes, o risco é contínuo, estendendo-se inclusive abaixo do limite inferior da faixa e tornando-se desproporcionalmente maior nos limites superiores desses intervalos (Quadro 53.1).7,9 Em relação à adoção da HbA1c, é preciso ressaltar, entretanto, que há diversas condições que podem influenciar a relação entre glicemia e os níveis da A1C. Por exemplo, nos casos de algumas hemoglobinopatias, quando a presença de hemoglobina (Hb) fetal falsamente aumenta os níveis de A1C, enquanto a anemia falciforme e a hemoglobina C os diminuem. Doenças com alterações no turnover dos eritrócitos, como hemólise, cirrose hepática, perdas agudas ou crônicas de sangue ou transfusões, podem levar a níveis anormalmente baixos da A1C, diminuindo a sensibilidade do teste nesses casos.9–11 Resultados falso-positivos podem ocorrer em idosos, pessoas com deficiên cia de ferro ou naquelas geneticamente predispostas a apresentar maior glicação da Hb, como é o caso dos in di ví duos da raça negra. Estes últimos têm níveis mais elevados de HbA1c do que os brancos, em relação à glicemia, sendo que as diferenças tendem a ser maiores com níveis mais elevados de intolerância à glicose.12 Portanto, nos casos mencionados, deve-se optar pelos testes tradicionais de diagnóstico.9
Dislipidemias 
5. Classificação das Dislipidemias 
As dislipidemias podem ser classificadas em hiperlipidemias (níveis elevados de lipoproteínas) e hipolipidemias (níveis plasmáticos de lipoproteínas baixos). Várias são as classificações propostas, dentre as mais importantes temos as que se seguem. 
5.1. Classificação etiológica 
Tanto as hiper quanto as hipolipidemias podem ter causas primárias ou secundárias: 
• Causas primárias: são aquelas nas quais o distúrbio lipídico é de origem genética. 
• Causas secundárias: a dislipidemia é decorrente de estilo de vida inadequado, de certas condições mórbidas, ou de medicamentos (Quadros 2 e 3). 
5.2. Classificação laboratorial 
A classificação laboratorial das dislipidemias nesta atualização sofreu modificações, e os valores referenciais e os alvos terapêuticos foram determinados de acordo com o risco cardiovascular individual e com o estado alimentar (Tabela 3). As dislipidemias podem ser classificadas de acordo com a fração lipídica alterada em: 
• Hipercolesterolemia isolada: aumento isolado do LDL-c (LDL-c ≥ 160 mg/dL). 
• Hipertrigliceridemia isolada: aumento isolado dos triglicérides (TG ≥ 150 mg/dL ou ≥ 175 mg/dL, se a amostra for obtida sem jejum). 
• Hiperlipidemia mista: aumento do LDL-c (LDL-c ≥ 160 mg/dL) e dos TG (TG ≥ 150 mg/dL ou ≥ 175 mg/ dL, se a amostra for obtida sem jejum). Se TG ≥ 400 mg/dL, o cálculo do LDL-c pela fórmula de Friedewald é inadequado, devendo-se considerar a hiperlipidemia mista quando o não HDL-c ≥ 190 mg/dL. 
• HDL-c baixo: redução do HDL-c (homens < 40 mg/dL e mulheres < 50 mg/dL) isolada ou em associação ao aumento de LDL-c ou de TG. 
5.3. Classificação fenotípica (Fredrickson) 
A classificação proposta por Fredrickson é baseada nos padrões de lipoproteínas associados a concentrações elevadas de colesterol e/ou TG, não sendo considerado o HDL-c. 
A classificação de Fredrickson tem por base a separação eletroforética e/ou por ultracentrifugação das frações lipoproteicas, distinguindo-se seis tipos. Embora se reconheça a grande contribuição desta classificação, ela é hoje muito pouco utilizada, pois pouco colabora para o conhecimento da etiologia (exceto na disbetalipoproteinemia) ou da decisão terapêutica (Quadro 4).103 
5.4. Dislipidemias de forte componente genético 
A biologia molecular acrescentou um vasto campo de conhecimento no metabolismo lipídico. Atualmente, foi facilitada a compreensão da influência genética na interação entre lipoproteínas e receptores e na expressão de diversas enzimas. Os principais tipos de dislipidemias com forte componente genético serão apresentados em situações especiais.
Dislipidemias 
As dislipidemias são classificadas em primárias e secundárias, de acordo com sua etiologia – isoladas ou decorrentesde outras doenças ou intervenções medicamentosas, respectivamente.
Dislipidemias primárias 
Hipercolesterolemia, hipertrigliceridemia ou hiperlipidemia mista reflete concentração aumentada de colesterol ou TG isolada ou conjuntamente (Tabela I). A forma mais severa de hipercolesterolemia é a hipercolesterolemia familiar (HF), doença autossômica dominante. Elevação plasmática da concentração de colesterol em 2vezes acima do limite de normalidade é observada na forma heterozigótica, e de 3 a 6 vezes na homozigótica, sem aumento de TG. Defeitos na síntese, transporte pelo retículo endoplasmático e Golgi, ligação à partícula de LDL, internalização e dissociação da partícula de LDL foram descritos em conseqüência de cerca de 900 mutações no gene do receptor de LDL (receptor B/E). Hipercolesterolemia decorrente da diminuição da ligação de LDL ao receptor B/E,acarretando redução em 50% no clearance desta LP, advém do defeito familiar de apo B-100, com incidência de 1:1000 na Europa Central, e menor freqüência nas demais populações. 
Hipercolesterolemia autossômica recessiva, representada por mutações na proteína ARH, uma proteína adaptadora necessária para a internalização do complexo LDL-receptor14 é de menor incidência, acarretando elevação plasmática de LDL-C é em torno de 2 vezes o valor normal à semelhança do defeito familiar de apo B-10015. Mutações no gene da proteína PCSK9 (Proprotein convertase subtilisin-like kexin type 9) podem conferir ganho ou perda de função. No primeiro caso, observa-se maior degradação do receptor B/E, o que condiciona elevação plasmática no LDL-C. Em casos de perda de função da proteína valores séricos de LDL-C abaixo de 70 mg/dL podem ser encontrados16.
A forma mais freqüente de hiperlipidemia primária é a hiperlipidemia familiar cominada (HFC), caracterizada pelo aumento na produção de apo B e manifestada pela elevação de LDL e VLDL.A variabilidade de apresentação dos lípides plasmáticos dificulta a sua identificação clínica, podendo ocorrer hipercolesterolemia e/ou hipertrigliceridemia, redução de HDL e aumento de apo B19,20.A herança é autossômica dominante, com incidência de 1 a 2% na população geral e 10 a 20% nos portadores de doença coronariana, o que determina aumento de 2 a 5 vezes no risco de DCV17.A causa genética não está totalmente determinada, embora seja heterogênea e oligogênica, baseada na alteração do cluster apo AI/CIII/AIV/AV18 e no gene da LPL. As proteínas codificadas por este cluster são responsáveis pelo controle de síntese de proteínas presentes nas LP ricas em TG e HDL.
O aumento de apo CIII está associado à redução na atividade da LPL, diminuindo o catabolismo das VLDL. As alterações séricas da HFC não são manifestadas antes da terceira década de vida, também não são encontradas dislipidemias em crianças portadoras desta herança genética. A maior parte das hipercolesterolemias moderadas pode ser decorrente da hipercolesterolemia poligênica, que apresenta múltiplas alterações metabólicas que podem aumentar a concentração plasmática de LDL-C. Aumento dos TG plasmáticos entre 200-500 mg/dL e redução de HDL-C, porém com LDL-C e apo B normais, pode decorrer da hipertrigliceridemia familiar (HTGF), caracterizada por aumento de VLDL ricas em TG21.O defeito genético não é conhecido e pode estar associado com a mesma alteração da HFC.A HTGF possui herança autossômica dominante e o diagnóstico é feito somente após a puberdade e, na maioria das vezes, difícil de distinguir da HFC. 
Hipertrigliceridemias severas (> 1.000 mg/dL) ocorrendo desde a infância, cujas complicações mais freqüentes são pancreatite aguda e dor abdominal recorrentes caracterizam a hiperquilomicronemia. As causas primárias são a deficiência da lipoproteína lipase ou da apo CII, que é co-fator da LPL. Pela falta da LPL,os TG dos quilomícrons e das VLDL não são hidrolisados, dificultando a ligação das partículas aos receptores específicos, reduzindo o seu catabolismo22. 
Disbetalipoproteinemia familiar,também denominada hiperlipemia do tipo III de Fredrickson, é de freqüência rara na população. Manifesta-se por hipertrigliceridemia e hipercolesterolemia moderada a severa, cujos valores variam entre 300-400 mg/dL, determinados pelo acúmulo de partículas remanescentes com maior conteúdo de colesterol.A coexistência de obesidade, diabetes mellitus ou ingestão de álcool podem exacerbar as alterações metabólicas. A etiologia da disbetalipoproteinemia está associada com fenótipo apo E2/E2 ou com a presença de mutação no gene da apo E. Essas alterações levam à redução na remoção de LP remanescentes, por causa da menor ligação das partículas aos receptores específicos. Pelo fato de as LP permanecerem maior tempo em circulação, ocorre redução no conteúdo de TG, em razão da hidrólise promovida pela LPL, aumentando relativamente o conteúdo de TG, devido à hidrólise pela LPL,o que torna as LP mais enriquecidas em colesterol23. Aapo E ocorre na população em três genótipos, E2, E3 e E4, com freqüência em torno de 8, 77 e 15%, respectivamente. Esses três alelos manifestam-se em seis fenótipos: três homozigóticos (E2/E2, E3/E3 e E4/E4) e três heterozigóticos (E2/E3, E2/E4 e E3/E4), e cerca de 60% da população é E3/E3. As diferenças nos fenótipos de apo E alteram a afinidade das lipoproteínas pelos receptores de remanescentes e B/E. Sabe-se que a apo E2 apresenta menor afinidade pelos receptores, enquanto a apo E4, maior afinidade. Ahipoalfalipoproteinemia familiar, doença autossômica dominante, é caracterizada pela redução da concentração plasmática de HDL-C e pelo maior risco de doença cardiovascular24. Os defeitos genéticos e metabólicos que causam a diminuição de HDL-C não são conhecidos. A deficiência de apo AI pode ser causada por mutações no gene da apo AI ou no lócus apo A1/CIII/AIV e apresenta herança autossômica recessiva25.Além da reduzida concentração plasmática de HDL,as manifestações incluem a maior predisposição para doença cardiovascular,xantomas e opacidade da córnea.Uma mutação muito estudada é a apo AI Milão, causada pela substituição da arginina pela cisteína na posição 173, com herança autossômica dominante.Apesar de reduzir acentuadamente a concentração de HDL,não está associada com o desenvolvimento de doença cardiovascular prematura26.
Dislipidemias secundárias 
As causas secundárias mais comuns são apresentadas na Tabela II.
Diabetes mellitus 
A resistência à insulina está relacionada com aumento na concentração de triglicérides, redução de HDL-C e maior formação de LDL pequenas27.A hipertrigliceridemia, principal característica da dislipidemia da síndrome metabólica e do diabetes mellitus,é causada primariamente pelo aumento da produção de triglicérides e apo B-100 pelo fígado, levando à maior formação VLDL28.A secreção de apo B-100 é regulada pela disponibilidade de lípides nos hepatócitos. Se o conteúdo de lípides for escasso, a apo B-100 será degradada com menorquantidade de VLDL formada. 
A resistência à insulina está associada com o aumento da produção de lípides pelas três vias principais:fluxo de ácidos graxos para o fígado proveniente do tecido adiposo, captação hepática de VLDL,IDL e remanescentes de quilomícrons, e síntese hepática de ácidos graxos. Conseqüentemente, há elevação da formação das partículas ricas em triglicérides, maior aporte destas ao fígado e estímulo à produção de lipase lipoprotéica hepática. Dessa forma, o aumento da enzima lipase lipoprotéica hepática contribui ainda mais paraa formação de LDL e HDL pequenas29. Além disso, a elevação da concentração de ácidos graxos livres no plasma restringe a ação da lipoproteína lipase periférica, pelo fato de sua maior concentração na interface partícula-enzima bloquear a interação da lipoproteína lipase periférica com quilomícrons e VLDL.
Os SREBP (sterolregulatory element binding protein)– proteínas de ligação ao elemento responsivo ao esterol – são importantes ativadores da síntese lipídica no fígado e atuam como mediadores da ação da insulina nesse órgão. A ativação de SREBP-1c, por via insulino-sensívele IRS-2 independente, favorece a síntese de ácidos graxos. Outra característica da dislipidemia diabética é a maior concentração de LDL pequenas e mais densas. Essas partículas estão associadas à aterogenicidade. 
A formação de LDL pequenas e densas é dependente da proteína de transferência de colesterol éster, que promove a troca de colesterol éster da LDL por triglicérides de VLDL e quilomícrons. O maior conteúdo de triglicérides nas LDL favorece a atividade das enzimas lipoproteína lipase periférica e lipase hepática, gerando as LDL menores e mais densas. As concentrações de HDL-colesterol e apo AI estão caracteristicamente reduzidas nos indivíduos portadores de resistência à insulina. Essa alteração é decorrente da ação da proteína de transferência de colesterol éster, mediando a troca de colesterol éster da HDL por triglicérides das lipoproteínas VLDL e quilomícrons. O catabolismo da apo AI está aumentado no DM tipo 2. Um estudo demonstra que a apo AI dissocia-se da HDL enriquecida de triglicérides e é catabolizada pelos rins30.
Síndrome nefrótica 
A alteração mais freqüente na síndrome nefrótica é
A elevação na concentração plasmática de LDL-C, às vezes acompanhada por aumento na concentração de VLDL. As causas mais prováveis são aumento da produção hepática de VLDL e maior conversão em LDL.
Hipotireoidismo Ohipotireoidismo é uma causa comum de hiperlipidemia. A manifestação clássica é a elevação na concentração de LDL-C, mas também pode haver hipertrigliceridemia. A elevação de LDL-C está associada à diminuição da remoção de LDL por causa da menor síntese de receptor de LDL31.O hipotireoidismo também pode reduzir a atividade da lipoproteína lipase periférica, predispondo ao aumento da concentração plasmática de triglicérides32.
Consumo de álcool
A ingestão regular de bebidas alcoólicas pode alte- rar significativamente o metabolismo dos triglicérides. O álcool é metabolizado basicamente por meio de três vias: catalase, oxidação microssomal e álcool desidrogenase, sendo esta última a via preponderante. A álcool desidrogenase converte o álcool em acetaldeído, que sob ação da acetaldeído desidrogenase é convertido em CO2,H2Oeacetil CoA. O acetil CoA é o precursor da síntese de ácidos graxos. Por sua vez, o álcool provoca aumento na concentração de NADH, que inibe a oxidação de ácidos graxos no fígado, elevando a produção de triglicérides e VLDL. A hipertrigliceridemia é a alteração mais freqüente, mas geralmente associada ao aumento de HDL-C, decorrente da menor atividade da lipase hepática33.
Terapia estrogênica 
Os estrógenos estimulam a produção de triglicérides, de maneira dose-dependente. O uso de contraceptivos e aterapia de reposição hormonal podem provocar a hipertrigliceridemia. Os estrógenos atuam elevando a produção deVLDL, porém aumentam a remoção de LDL da circulação por maior síntese de receptores de LDL, podendo diminuir as concentrações plasmáticas de LDL-C.
Dosagem dos lipídios plasmáticos
O perfil lipídico é definido pelas determinações bioquímicas do colesterol total (CT), do colesterol ligado a HDL ou HDL-colesterol (HDL-c), do colesterol ligado a LDL ou LDLcolesterol (LDL-c) e dos TG após jejum de 12 a 14 h. O LDL-c pode ser calculado pela equação de Friedewald (LDL-c = CT – HDL-c – TG/5), com base no fato de que a relação normal TG/ colesterol na VLDL é de 5/1. 
Essa fórmula não é aplicável para in divíduos com níveis de TG > 400 mg/dL e é imprecisa no caso de hepatopatia colestática crônica ou síndrome nefrótica. Nesses casos, o valor do LDL-c pode ser obtido por dosagem direta no plasma, o que é um procedimento caro e não facilmente disponível.1,2,4
Em indivíduos com hipertrigliceridemia, o uso do não HDL-c (CT – HDL-c) estima melhor o volume total de lipoproteínas aterogênicas do que o LDL-c. No entanto, à luz das evidências clínicas atuais, o uso do não HDL-c somente é indispensável nas hipertrigliceridemias graves (TG > 400 mg/ dL), quando não se pode calcular o LDL-c pela equação de Friedewald.4 A rea li zação da eletroforese das lipoproteí nas só se justifica quando houver suspeita de formas raras de dislipidemias primárias (veja adiante). Do mesmo modo, como rotina, as determinações da apo-B, apo-AI e Lp(a) não são indicadas para avaliação ou estratificação do risco cardiovascular.1,2,4
Considerações e recomendações para determinação dos lipídios Alguns cuidados devem ser tomados para obtenção de uma análise mais confiá vel do perfil lipídico: 
■ Ter dieta habitual, estado metabólico e peso estáveis por, pelo menos, 2 semanas antes da rea li zação do exame Estar em jejum obrigatório de 10 a 12 h quando a determinação incluir os TG, mas para CT e HDL-c, não é necessário 
■ Evitar a ingestão de bebidas alcoó licas nas 72 h que antecedem a coleta 
■ Não exercer atividade física vigorosa 24 h antes do exame 
■ Permanecer sentado ou deitado por 5 min antes da coleta de sangue 
■ Evitar estase venosa prolongada (> 1 min) durante a coleta, pois pode causar hemoconcentração e elevação de todos os elementos do perfil lipídico Recomendar repetição dos exames após 8 a 15 dias, com manutenção do estilo de vida, quando houver resultados anormais iniciais ou discordantes na se quência de acompanhamento clínico. Caso se observe uma diferença percentual superior aos limites mencionados, deve-se fazer uma terceira dosagem e considerar a média aritmética dos dois valores mais próximos 
■ Considerar que queda nos níveis do colesterol pode ocorrer por 2 a 3 semanas após uma enfermidade leve e por até 3 meses após uma doen ça mais importante, como infarto agudo do miocárdio (IAM) ou cirurgia de grande porte. No caso do IAM, essa queda é em torno de 96 mg/dL e ocorre após as primeiras 24 h. Portanto, o perfil lipídico em infartados deve ser avaliado antes desse perío do 
■ Descon ti nuar medicações que afetem o metabolismo lipídico se possível, pelo menos, 3 semanas antes da coleta.4,6
Perfil lipídico | Em quem fazer? 
Indivíduo com DAC ou outras manifestações de doença aterosclerótica (cerebrovascular, carotídea e da aorta abdominal e/ou dos seus ramos terminais) torna obrigatória a determinação do perfil lipídico, independentemente de idade ou sexo.
Adultos O NCEP/ATP III recomenda que todos os adultos com idade acima de 20 anos tenham seu perfil lipídico determinado (CT, TG, HDL-c, LDL-c).7 Nos in di ví duos com perfil lipídico desejável e sem outros fatores de risco, as determinações laboratoriais devem ser repetidas a cada 5 anos, desde que as condições clínicas e os hábitos de vida permaneçam estáveis. Esse intervalo poderá ser reduzido a critério médico.
Crianças e adolescentes (2 a 19 anos) A determinação sistemática do perfil lipídico na infância e na adolescência não é recomendável. Deve ser rea li zada em crianças ou adolescentes cujos parentes em primeiro grau apresentem dislipidemia (CT > 300 mg/dL ou TG > 400 mg/ dL) ou doen ça aterosclerótica (DAC, AVC e/ou doen ça arterial periférica) antes dos 55 anos para homens e dos 65 anos para mulheres. É feita, também, quando há obesidade, pancreatite aguda, xantomatose ou outros fatores de risco para DAC.8,9
4- Complicações
Complicações da síndrome metabólica
Doença cardiovascular 
A dislipidemia encontrada em pacientes com SM é altamente aterogênica. Caracteriza-se por hipertrigliceridemia e níveis baixos do HLD-c, associados a um aumento no número de partículas de LDL pequenas e densas, que são mais aterogênicas.1,2,11 Um dos aspectos mais preocupantes com relação à SM é elevado risco cardiovascular que esses pacientes apresentam. A combinação de múltiplos fatores de risco (HDL-c baixo, hipertrigliceridemia, hipertensão arterial e hiperinsulinemia, hipoadiponectinemia, entre outros) faz dessa população um grupo de pacientes altamente suscetíveis a doen ças cardiovasculares (DCV).1,2 Embora existam diversos estudos avaliando o risco cardiovascular em pacientes com SM, uma metanálise publicada por Gami et al.24 determinou um risco de 1,78 (95% IC, 1,58 a 2,00) para morte ou evento cardiovascular nesses in di ví duos.Em 2010, uma nova metanálise reforçou esses achados: evidenciou-se o dobro de risco de um evento cardiovascular e de 1,5 vez na mortalidade por todas as causas.25 Esses achados foram também ratificados em outros estudos. Um estudo finlandês, por exemplo, revelou que homens entre 42 e 60 anos com SM apresentam 3,77 mais risco de morrer devido à doen ça coronariana (DAC), 3,55 mais risco de morte por doen ça cardiovascular e 2,43 mais risco de morte por qualquer causa.26 
Além disso, essa mortalidade parece ser independente de tabagismo, ingestão de ál cool e níveis plasmáticos de colesterol LDL (LDL-c).26 Na população americana acima de 50 anos, a prevalência de DAC está intimamente associada à SM.27 O risco atribuí vel à SM para a doen ça coronariana foi de 37,4% naqueles com SM sem DM2, porém subia para 54,7% naqueles com SM e DM2. Surpreendentemente, o risco nos in di ví duos com DM2 sem SM foi pequeno, sugerindo que a SM é determinante para o risco cardiovascular, mesmo em in di ví duos diabéticos.27 
Outros aspectos importantes já demonstrados também são: 
· indivíduos obesos e os com DM têm o dobro de risco de um evento cardiovascular quando há SM; 
· quanto mais componentes da SM o paciente tiver, maior seu risco de DCV; 
· a existência de SM em pacientes com DCV preexistente aumenta o risco de um novo evento nessas pessoas.1,2,11 
· Finalmente, convém observar que a SM é, hoje, um dos fatores agravantes considerados ao se estimar o risco cardiovascular com o escore de Framingham (veja o Capítulo 65, Tratamento da Hipercolesterolemia).
 Diabetes mellitus tipo 2 
Juntamente com as complicações cardiovasculares, o risco de desenvolvimento de DM2 faz parte das grandes complicações da SM. A incidência de DM2 é 5 vezes maior em pacientes com SM em comparação a um grupo de pacientes sem a síndrome.28,29 Além disso, o DM seria uma conse quência natural de um paciente com SM não tratado.11 Atualmente, uma das grandes discussões é se o estado de intolerância glicídica e a hiperinsulinemia observados na SM já não seriam uma franca evidência de perda de função pancreá tica e deveriam ser abordados com a mesma rigidez que se aborda um paciente com DM2.11 O risco de desenvolvimento de DM associado à SM já foi também relacionado com a gordura visceral. O INSPIRE ME IAA (The INternational Study of Prediction of Intra-abdominal adiposity and its RElationships with cardioMEtabolic risk/ Intra-Abdominal Adiposity), um estudo que avaliou cerca de 4000 pacientes com tomografia computadorizada de abdome, revelou que in di ví duos com gordura visceral no tercil superior apresentavam maior risco de DM, tanto homens (1,25) quanto mulheres (1,78).30 Vale lembrar que este estudo também confirmou a relação da gordura visceral com diversos fatores de risco cardiovascular.30 Foi também demonstrado que, entre pacientes com DM2, o risco de complicações microvasculares e macrovasculares (Figura 68.2), bem como a mortalidade cardiovascular, é significativamente maior na presença de SM.31,32
 Esteatose hepática não alcoó lica 
A SM pode trazer repercussões também para o fígado. A doen ça hepática gordurosa não alcoó lica (DHGNA) é resul- tado do excesso no aporte de ácidos graxos para o fígado (em conse quência da lipólise exagerada) e está diretamente associada à RI e ao acúmu lo de gordura visceral.32,33 A DHGNA envolve a esteatose e a esteato-hepatite (nonalcoholic steatohepatitis [NASH]). Os pacientes podem apresentar-se com discretos aumentos nos níveis das enzimas hepáticas (normais, na maioria dos casos), e exames de imagem, seja ultrassonografia abdominal (US), tomografia computadorizada (TC) ou ressonância magnética (RM) do abdome, sugerem esteatose hepática.17,33 Convém notar que, com o aumento da incidência da SM, é cada vez maior o número de pacientes identificados com DHGNA. Também existem evidências de que, quando há SM, é maior o risco de progressão de esteatose para a NASH. Estima-se que 3 a 5% dos casos da NASH evoluam para cirrose hepática e que a NASH responda por vários casos de cirrose rotulados no passado como cirrose criptogênica (veja o Capítulo 80, Doença Hepática Gordurosa Não Alcoó lica | Diagnóstico e Tratamento). 11,17,30,33
 Alterações nos diversos eixos endócrinos 
Embora não atuem diretamente como reguladores dos eixos endócrinos, a SM e, principalmente, o tecido adiposo, exercem importantes efeitos indiretos. Estes levam a alterações importantes em diversos hormônios (Quadro 68.3).1,11 A SM assemelha-se, em muitos aspectos, à síndrome de Cushing. Os pacientes com SM apresentam uma hiperativação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, que parece estar relacionada com um estado de hipercortisolismo subclínico. Baseando-se nisso, Godoy-Matos et al.34 analisaram o conteú do de gordura visceral e o volume das adrenais, por meio de TC, de mulheres com diferentes graus de compleição física. 
Demonstrou-se que havia uma relação direta entre o volume adrenal e a gordura visceral. Em um outro estudo demonstramos que o volume das adrenais era maior em mulheres diabéticas obesas do que em um grupo de obesas não diabéticas.35,36 Em conjunto, estes dados sugerem haver uma leve hiperatividade do eixo hipófise-adrenal, com discreto hipercortisolismo. Isto pode levar a uma piora da resistência insulínica (por ação do cortisol no receptor da insulina), dos lipídios e da pressão arterial. Além disso, o excesso de tecido adiposo abdominal está relacionado com um aumento da atividade da 11-hidroxiesteroide desidrogenase tipo 1 (11-HSD1), que converte cortisona em cortisol. A conversão aumentada de cortisol no tecido adiposo visceral levaria a um ciclo vicioso, contribuindo para o progressivo aumento da gordura visceral.34 Alguns autores vêm sugerindo que a hiperatividade do sistema nervoso simpático (SNS) teria importante papel na patogenia da SM. Essa ativação seria um mecanismo compensatório na tentativa de estabilizar o peso corporal pelo aumento da termogênese. Um dos principais ativadores do SNS é a hiperinsulinemia, principalmente pós-prandial (termogênese induzida pela alimentação). Essa hiperinsulinemia, associada a hiperleptinemia, levaria a uma vasoconstrição periférica importante e retenção de líquidos, reduzindo o fluxo sanguíneo para a musculatura esquelética e ocasionando a RI. 
Desta maneira, a hiperatividade do SNS perpetuaria um ciclo vicioso, com hiperinsulinemia, hipertensão arterial e aumento da frequência cardía ca, demonstrados na SM.1,2,11 A SM está associada, ainda, a alterações no eixo somatotrófico. A diminuição do hormônio do crescimento (GH) ocorre por diversos mecanismos: inibição direta da liberação de GH na hipófise pela insulina; inibição no fígado da produção das proteí nas de ligação do IGF-1 (IGFBP), o que levaria a um aumento da fração livre do IGF-1 (fator de crescimento semelhante à insulina tipo 1) e inibição da liberação do GH; (3) inibição direta da liberação do GH pelos níveis elevados dos ÁCIDOS GRAXOS LIVRES ; e aumento da somatostatina, relacionado com os níveis elevados de ÁCIDOS GRAXOS LIVRES .11,34 O discreto aumento dos níveis do IGF-1 livre, além de
responsável pelo crescimento normal dos pacientes com SM, parece relacionar-se com maior incidência de câncer, síndrome de ovários policísticos, aumento de volume adrenal e hiperplasia prostática. Ademais, os níveis reduzidos de GH contribuem para aumentar do depósito de tecido adiposo e dos ÁCIDOS GRAXOS LIVRES , além de inibir a produção dos IGFBP pelo fígado.11,28,34 A SM exerce importantes efeitos no eixo gonadal masculi no.
Há diminuição dos níveis plasmáticos de testosterona total e livre, redução da proteí na de ligação dos hormônios sexuais (SHBG), ate nua ção dos pulsos de LH e aumento dos níveis de estradiol.34 O excesso de tecido adiposo correlaciona-se diretamente com aumento da atividade das aromatases, elevando os níveis de estradiol e estrona e inibindo a liberação de LH pela hipófise. A hiperinsulinemia, por sua vez, diminui a produção hepática de SHBG, reduzindo a testosterona total, e parece inibirdiretamente a produção de testosterona. Deste modo, a SM pode ser descrita, nos homens, como um estado de hipogonadismo hipogonadotrófico.11,32,37 Uma incidência maior de disfunção erétil tem sido relatada em homens com SM.1,32,37 O eixo gonadal feminino também sofre alterações nos pacientes com SM. A característica mais marcante nessas mulheres é o hiperandrogenismo secundário à ação da hiperinsulinemia nos ovários.34 Tais alterações são abordadas detalhadamente no Capítulo 47, Síndrome dos Ovários Policísticos | Uma Visão Geral. Um resumo das alterações endócrinas relacionadas com a SM pode ser encontrada no Quadro 68.3.
 Síndrome metabólica associada ao tratamento do HIV 
Nos últimos anos, tem havido uma grande desenvolvimento no tratamento de pacientes infectados pelo HIV. A implementação da HAART (highly active anti-retroviral the- rapy, “terapia antirretroviral altamente ativa”) levou a uma diminuição da incidência das infecções oportunistas e a um aumento da sobrevida dos pacientes. Por outro lado, está também associada a um aumento da incidência da SM nesse
grupo de pacientes.34,38 Indivíduos infectados pelo HIV podem exibir diferentes
padrões e va riá veis graus de mudanças na gordura corporal. Dois tipos distintos de alterações na gordura corporal são a lipoatrofia (perda de gordura) e a lipo-hipertrofia (acúmu lo de gordura). É importante frisar que a perda de tecido adiposo na face, nos braços e nas pernas, com preservação da massa muscular, possibilita a diferenciação da lipodistrofia da síndrome consuntiva relacionada com o HIV, caracterizada pela perda generalizada de tecido adiposo e massa muscular (mais de 10% do peso inicial).38,39 A ausência de tecido adiposo periférico está associada a importante hiperinsulinemia (secundária à resistência insulínica), hipertrigliceridemia (geralmente > 500 mg/dL), HDL-c baixo e esteatose hepática.11,34 
A principal característica da SM nos pacientes em uso da HAART é a diminuição do tecido adiposo subcutâ neo periférico com aumento do tecido adiposo visceral.1,34 A perda de tecido adiposo é mais comum em homens, pacientes mais velhos e aqueles que iniciam tratamento com a HAART em estágio mais avançado. Embora tenha sido mais ligada aos inibidores de protease, alguns estudos recentes sugerem que os medicamentos mais ligados à lipodistrofia são os inibidores da transcriptase reversa, estavudina e zidovudina. Estes medicamentos inibem a síntese do DNA, preferencialmente nos adipócitos, levando a distúrbios mitocondriais e apoptose. Finalmente, outros mecanismos envolvidos na lipodistrofia: parece que existe, também, uma deficiên cia relativa de GH nesses pacientes, o que contribuiria, ainda, para o acúmu lo de gordura visceral; e o próprio HIV poderia, diretamente, interferir na replicação dos adipócitos.34,38,39 Conforme mostrado no Quadro 68.4, outros mecanismos estão relacionados com a SM associada à HAART. Um resumo das consequências bioquímicas e clínicas da SM é apresentado no Quadro 68.5.
5
Tratamento da obesidade 
Os resultados do tratamento clínico da obesidade freqüentemente não correspondem às expectativas do paciente obeso. Parte dessa frustração deve-se aos objetivos puramente cosméticos e de difícil aquisição para a maioria dos casos de grande excesso de peso. Assim, o primeiro passo diante de um paciente motivado a perder peso é estabelecer metas de peso final factíveis, enfatizando o quanto seria suficiente para mitigar a maior parte das doenças associadas à obesidade (5 a 10% de perda do peso atual)27. Não é raro o obeso determinar como sucesso terapêutico o retorno do peso corporal à faixa normal,muitas vezes, nunca antes atingido, o que desafia as leis da termodinâmica e do bom senso, mas que pode ser interpretado como falha. Resultados abaixo de 5% com recuperação do peso podem ser considerados insatisfatórios, e perdas maiores que 15% do peso com manutenção da perda são excepcionais28.
Dietoterapia 
O princípio fundamental do tratamento dietético da obesidade é promover um balanço energético negativo. Para isso, é fundamental adequar ingestão calórica com o padrão deatividade física estipulada individualmente. Autilização de diário alimentar,no qual o paciente registra a quantidade e a qualidade de alimento ingerido éútil tanto para avaliação dos hábitos alimentares antes do início do tratamento (identificando refeições irregulares, períodos de jejum e restrição alimentar, petiscar freqüente e binges ou compulsões), como paraavaliação da aderência ao esquema proposto. A escolha do melhor agente farmacológico, quando indicado, baseia-se fortemente nessas informações, assim como a aplicação da terapia cognitivo-comportamental por meio de informações adicionais, como estado de humor ou circunstâncias relacionadas à ingestão do alimento e monitorização da atividade física. O diário encoraja o envolvimento ativo do paciente no tratamento, que passa a sentir-se responsável pelo próprio sucesso, aumentando a motivação e as mudanças de estilo de vida. Associada ao diário alimentar uma tabela de contagem de calorias favorece o entendimento por parte dos pacientes do conteúdo energético e da composição dos alimentos, pois passam a controlar sua ingestão. Deve-se incentivar o consumo de alimentos pobres em gordura, uma vez que alimentos gordurosos mais facilmente se transformam em gordura armazenada. É importante manter a dieta hipocalórica balanceada (2030 Kcal/kg/dia), buscando o consumo de alimentos ricos em fibras, vitaminas, proteínas (10-20%), carboidratos (50-60%) e gorduras (20-30%) na maioria, poliinsaturadas.
Tratamento cognitivo-comportamental 
Baseia-se em avaliar e adequar a motivação do paciente (expondo custos e benefícios das mudanças propostas), desajustes do comportamento alimentar (como binges ou compulsões alimentares, “comedor noturno”, velocidade e estado de humor durante a alimentação, alimentação secundária a apelos emocionais) e mesmo transtornos do comportamento alimentar propriamente ditos (como binge eating disorder ou transtorno do comer compulsivo e bulimia nervosa), considerando também o grau de atividade física (redução do tempo sentado e do uso de automóvel,aumento das caminhadas, uso de escadas, estabelecimento de um programa de atividade física supervisionada)29. Em resumo, os elementos do tratamento cognitivo-comportamental objetivam controlar o estímulo à alimentação, ou os gatilhos que deflagram o início da ingestão de alimentos, eaumentar o autocontrole (Tabela XIV).
Exercício e atividade física 
A atividade física não programada e o exercício (atividade física programada) são recomendados como estratégias importantes para a prevenção da obesidade e também como métodos efetivos na manutenção da perda de peso, bem como no controle de todos componentes da síndrome metabólica, independentemente da perda de peso30.As bases paraessa afirmação são, principalmente, as evidências do benefício da atividade física no aumento da adesão, a longo prazo, do paciente a uma dieta menos restritiva. Além disso, o exercício físico, principalmente os de resistência, previnem a queda da taxa metabólica basal (esperada com a perda de peso), devido ao ganho ou à manutenção da massa magra. Vários estudos epidemiológicos dão suporte à noção de que o benefício do exercício físico é cumulativo, isto é, o resultado de caminhar 30 minutos contínuos é idêntico aos de caminhadas por 10 minutos em três períodos no dia. O exercício recomendado para perda de massa gorda é o aeróbico (andar de bicicleta, caminhar, correr, nadar), realizado por, no mínimo, 30 minutos e, idealmente, por 45-60 minutos na maioria dos dias na semana ou o equivalente a 10 mil passos ao dia (medidos por pedômetros*). A intensidade do exercício é diretamente proporcional à perda de gordura e indiretamente proporcional à manutenção do exercício em obesos e ao risco de lesões na população geral, principalmente quando se consideram os obesos. Dessa forma, apesar de mais efetivo na perda de gordura, a atividade física intensa oferece baixa adesão e alto riscode lesões no indivíduo obeso. A atividade física moderada é, portanto, a escolha para obesos, podendoser individualmente prescrita pela medida do VO2 máximo (volume de oxigênio máximo captado durante exercício físico em mL/kg/min; avalia aptidão cardiopulmonar e classifica a intensidade do exercício em: leve 40-60% do VO2 máximo do indivíduo; moderado 60-80% ou intenso > 80%) pelo teste ergoespirométrico, ou, em termos gerais, pela atividade de caminhar mantendo conversação (4,8 km/h), ou o equivalente a dois passos por segundo31. Exercícios de resistência (como musculação, ginástica localizada) têm efeito sobre o aumento da massa livre de gordura (músculo) e devem ser associados sempre que possível ao exercício aeróbico.
Tratamento farmacológico 
O tratamento farmacológico da obesidade está indicado na presença de índice de massa corpórea maior que 25 kg/m2 ou adiposidade central ou andróide, com outras doenças associadas à obesidade ou em pacientes com IMC maior que 30 kg/m2, quando da falência do tratamento não-farmacológico isoladamente (Tabela XV)32. Pode-se, didaticamente, dividir os fármacos regulamentados para o tratamento da obesidade em três grupos básicos: medicamentos anorexiantes catecolaminérgicos, sacietógenos adrenérgicos e serotoninérgicos e os redutores da absorção de gorduras (Tabela XVI). 
Os serotoninérgicos puros não são aceitos como medicações antiobesidade (Tabela XVII) assim como o Topiramato e a Bupropiona. 
Os medicamentos termogênicos (efedrina, iombina, metilxantinas, fenilpropanolamina, cafeína e aspirina) foram proscritos para esse fim. Importante enfatizar que à medida que caracterizamos obesidadecomo doença crônica, degenerativa e capaz de reduzir a sobrevida de um indivíduo da mesma forma que a hipertensão arterial e o diabetes,temos de expandir o conceito de tratamento farmacológico prolongado e regular também para obesidade, na ausência de sucesso com as mudanças isoladas de estilo de vida34. Já há evidências de segurança para o uso porquatro anos de orlistate e por dois anos para a sibutramina35.
Medicamentos anorexiantes catecolaminérgicos 
O uso de agentes catecolaminérgicos (dietilpropiona, fenproporex e mazindol) tem sido substituído pelo de agentes com menos efeitos secundários, melhor tolerabilidade e segurança verificados por estudos científi-cos prolongados. Esses agentes, porém, podem ser utilizados após a avaliação clínica criteriosa dependendo da relação risco/benefício, quando o tratamento clássico da obesidade com orientação nutricional e atividade física não atingir a resposta esperada36.
Medicamentos sacietógenos noradrenérgicos e serotoninérgicos 
A sibutramina é uma droga de ação mista (serotoninérgica e noradrenérgica), que age pela inibição da recaptação de noradrenalina e serotonina (Figura 6), levando à redução de peso por diminuição da ingestão de alimentos (aumento da saciedade) e aumento da ter-mogênese37. Estudos com obesos normotensos mostraram aumento discreto da freqüência cardíaca (da ordem de 4-6 bpm) e da pressão arterial (da ordem de 24mmHg), o que justifica monitorização desses parâmetros. Não obstante, em um estudo com pacientes hipertensos, a perda média de 4,7 kg em 12 semanas com sibutramina 10 mg levou a reduções na PA diastólica e sistólica supina, respectivamente, da ordem de 4 e 5,5 mmHg. Estudos com um e dois anos de duração mostraram que a sibutramina é útil para perda de peso emanutenção do novo peso. Os efeitos colaterais mais observados com esse fármaco são: boca seca, insônia, cefaléia e constipação intestinal, que, em geral, não levam à suspensão do tratamento. Outro estudo prospectivo de cinco anos sobre o impacto da sibutramina na prevenção de eventos cardiovasculares está previsto para publicação esse ano38.
Medicamentos inibidores da absorção de gordura 
O representante dessa classe de drogas é um inibidor de lipases intestinais (orlistate), capaz de reduzir 30% da absorção no intestino delgado de triglicérides ingeridos (Figura 7). Oestudo Xendos demonstrou perda média de 2,8 kg em obesos não-diabéticos após 4 anos, suficientes para prevenção primária do diabetes, o que caracteriza oorlistate como medicação antidiabesidade39. Os efeitos secundários do orlistate são inerentes ao seu próprio mecanismo de ação: fezes amolecidas e gordurosas ou gotículas oleosas nas evacuações. Maiores alterações do funcionamento intestinal,como diarréias, flatus com descarga e incontinência fecal são evidenciadas apenas em pacientes que apresentem ingestão maior de alimentos gordurosos, os quais acabam por reduzir a ingestão degorduras para evitar os efeitos colaterais desagradáveis. Quanto às vitaminas lipossolúveis, os estudos mostram discreta diminuição das vitaminas A, D e E, permanecendo, no entanto, em níveis séricos normais.
Medicamentos sacietógenos serotoninérgicos 
Os antigos agentes serotoninérgico de ação central: fenfluramina e dexfenfluramina foram proscritos por causar lesões valvulares cardíacas. Já os agentes antidepressivos inibidores seletivos da recaptação da serotonina, como a fluoxetina e a sertralina, apesar de muito utilizados para controle de peso, não são oficialmente autorizados pelo FDA para esse fim. Fundamentados, porém, no reconhecimento atual da serotonina como neurotransmissor de potente ação sacietógena central, a fluoxetina e a sertralina têm sido amplamente prescritas por endocrinologistas e psiquiatras como adjuvantes no tratamento de excesso de peso associado à depressão, síndromes do comer compulsivo e do comer noturno e na bulimia nervosa. Em pacientes obesos com síndrome da apnéia obstrutiva do sono, a fluoxetina mostra-se também de grande utilidade, reduzindo o índice de apnéia-hipopnéia, uma vez que suprime a fase do sono em que as apnéias mais ocorrem: a fase REM. Deve-se lembrar que os agentes serotoninérgicos prolongam a meia-vida dos benzodiazepínicos, potencializam os efeitos do álcool e dos depressores do SNC e da sibutramina devendo por esse motivo ser usados com cautela.
Medicamentos bloqueadores do receptor canabinóide tipo 1 
Recentemente, foi desenvolvida uma nova classe de medicamentos, inibidores dos receptores canabinóides tipo 1, com ação anorexigênica e lipolítica, além de benefícios em diversos fatores de risco metabólicos (redução detriglicerídeos, melhora de controle de diabetes, aumento de colesterol HDL e redução da pressão arte rial). Embora promissor no tratamento da obesidade e da síndrome metabólica41,o único representante dessa classe de medicamentos que chegou a ser lançado, o rimonabanto, foi retirado do mercado em 2008 devido a efeitos neuropsiquiátricos adversos (como ansiedade e depressão). 
Bupropiona: medicação conhecida como adjuvante no tratamento antitabagismo, vem sendo utilizada, ainda que sem autorização das entidades competentes, em casos individuais de obesidade, por ter ação catecolaminérgica (estrutura semelhante à da anfetamina), dopaminérgica e noradrenérgica. É contra-indicada em bulimia nervosa, traumatismo craniano e tumores cerebrais devido ao risco de convulsão. 
Topiramato: anticonvulsivante de ação gabaérgica e anti-receptores de glutamato, utilizado na psiquiatria como estabilizador de humor,tratamento da bulimia e transtorno compulsivo periódico (episódios compulsivos, no mínimo, 2x/semana por seis meses, na ausência de métodos compensatórios).42,43 
Tratamentos não regulamentados: são desprovidos de respaldo científico que assegurem eficácia e segurança para uso no tratamento da obesidade. São eles: acupuntura, auriculoterapia, cremes para celulite, massagens, endermologia, fitoterapia, mesoterapia ou enzimoterapia, terapia ortomolecular e, principalmente, formulações magistrais de múltiplas drogas.
Tratamento cirúrgico 
Otratamento cirúrgico é o único capaz de promo- ver perdas maiores e sustentadas de peso. São candidatos à cirurgia bariátrica obesos mórbidos resistentes ao tratamento clínico ou grau III com doenças concomitantes (Tabela XI)40. As principais técnicas utilizadas são as cirurgias restritivas gástricas: gastroplastiasou bandas gástricas; disabsortivas e mistas (Tabela XVIII). O Hospital das Clínicas é um dos pioneiros na rea-lização da cirurgia bariátrica, principalmente pela técnica proposta por Capela (Figura 8), que se caracteriza pela redução da câmara gástrica e bypass gástrico com anastomose gastrojejunal. Essa cirurgia leva à redução efetiva de perda de peso (40% do peso inicial em um ano) e à manutenção prolongada dessa perda, com baixos índices de complicações pós-operatórias e mortalidade geral,conforme sugerem alguns poucos estudos da literatura38,além da considerável redução do risco relativo de morte (89% em relação ao obeso não-operado, com perda do excesso de peso de 67% sustentada em cinco anos)39. Outra técnica aplicada em menor escala nos pacientes do Ambulatório de Obesidade Mórbida é a de bandagem gástrica (Figura 9), com menor resultado de perda de peso em um ano (20%) em relação ao bypass gástrico, mas com resultados semelhantes de perda de peso e controle de morbidades em cinco anos. Importante ressaltar o adequado ajuste da banda gástrica no pós-operatório, fundamental para o sucesso dessa técnica, devendo ser idealmente realizado por equipe multidisciplinar composta de: endocrinologistas, nutricionistas e cirurgiões gástricos experientes. A equipe deve sempre individualizar a magnitude e a freqüência de ajustes baseados no padrão alimentar do paciente, buscando restrições adequadas que não ofereçam risco ao paciente (obstruções, desnutrição, vômitos e distúrbios hidroeletrolíticos) ou favoreçam erros alimentares (substituição de alimentos sólidos por líquidos calóricos), o que dificultaria o controle de perda de peso de forma saudável. Estudos mostram melhora na qualidade de vida de obesos mórbidos após colocação de banda gástrica, a qual foi diretamente proporcional à associação de co-morbidezes pré-operatórias e independentes da perda de peso atingida (46 ± 16% de perda do excesso de peso)40. Éde suma importância, porém, a adequada avaliação prospectiva da população operada que apresenta aparente alto risco cardiovascular e metabólico, com o fim de buscar possíveis explicações para a paradoxal baixa mortalidade pós-operatória (0,68%). Outra questão que o nosso estudo espera responder écomo avaliar o risco cirúrgico deum obeso mórbido para cirurgia bariátrica já que os algoritmos pré-operatórios vigentes não são, na sua maioria, reprodutíveis nessa população, haja vista as dificuldades aqui expostas, desde a realização de exame físico até a interpretação de achados como dispnéia, restrição ao exercício e parâmetros clássicos dos exames complementares, especialmente no diagnóstico e na classificação de insuficiência cardíaca no obeso mórbido.
7. Tratamento Não Medicamentoso das Dislipidemias 
7.1. Medidas no controle da hipercolesterolemia
7.1.1. Terapia nutricional 
Nos últimos anos, o padrão alimentar e o estilo de vida saudável ganharam evidência em estudos epidemiológicos observacionais e de intervenção, como o DASH (Dietary Approachs to Stop Hypertension),121 o INTERHEART109 o PREDIMED (PREvención con DIeta MEDiterránea),122 e e reforçaram as diretrizes nutricionais que preconizam dieta isenta de ácidos graxos trans, o consumo de < 10% do valor calórico total de ácidos graxos saturados para indivíduos saudáveis e < 7% do valor calórico total para aqueles que apresentarem risco cardiovascular aumentado.25,106,123
O padrão alimentar deve ser resgatado por meio do incentivo à alimentação saudável, juntamente da orientação sobre a seleção dos alimentos, o modo de preparo, a quantidade e as possíveis substituições alimentares, sempre em sintonia com a mudança do estilo de vida. Na tabela 6, estão expostas as recomendações dietéticas para tratamento da hipercolesterolemia.
7.1.2. Substituição parcial de ácidos graxos saturados por mono e poli-insaturados 
Apesar de os ácidos graxos saturados apresentarem importantes funções biológicas, seu elevado consumo está associado a comprovados efeitos deletérios, tanto sob o 18 Arq Bras Cardiol 2017; 109(2Supl.1):1-76 ponto de vista metabólico124 quanto o cardiovascular,125,126 em razão de elevar o colesterol plasmático127 pró-inflamatória.128 e por sua ação Recente metanálise, com aproximadamente 59 mil indivíduos, realizada pela Biblioteca Cochrane, reafirmou que a substituição parcial de ácidos graxos saturados por poli-insaturados, por mais de 2 anos, reduziu em 17% o risco de eventos cardiovasculares. Nesta metanálise foram incluídos apenas estudos randomizados e controlados e com alto Grau de Evidência.129
A substituição na dieta de ácidos graxos saturados por carboidratos pode elevar o risco de eventos cardiovasculares.130 Neste sentido, a substituição de ácidos graxos saturados e carboidratos na alimentação por ácidos graxos poli-insaturados está associada ao baixo risco cardiovascular.131 Importante estudo epidemiológico, que avaliou a dieta da população de 20 países, mostrou que naqueles com alto consumo de óleos tropicais, a mortalidade por doença coronariana foi associada ao alto consumo de ácidos graxos saturados presentes nestas gorduras e também ao baixo consumo de ácidos graxos poli-insaturados da série ômega 6.132
No Brasil, mostrou-se associação com alto consumo de trans e com o baixo consumo de poli-insaturados, quando substituídos por saturados. Estabeleceram-se os pontos de corte de > 10% para ácidos graxos saturados, de < 12% para poli-insaturados e de > 0,5% para trans.132,133
Importante salientar que para o tratamento da hipercolesterolemia recomendam-se no máximo 7% das calorias na forma de ácidos graxos saturados e, segundo os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o consumo médio atual deste ácido é de 9%.
Estudo conduzido apenas no Brasil mostrou que a inadequação alimentar é a principal causa de mortalidade cardiovascular e reiterou que o baixo consumo de poli-insaturados, em substituição à gordura saturada, aumenta a mortalidade por cardiopatia isquêmica.134
O consumo de gorduras saturadas deve ser limitado, porém o mais importante é sua substituição parcial por insaturadas − principalmente por poli-insaturadas, que estão associadas a diminuição de CT e LDL-c, como também estão relacionadas à diminuição de eventos e morte cardiovasculares.135-137 (Grau de Recomendação: I; Nível de Evidência: A). Faltam dados conclusivos para a indicação de suplementação de ácidos graxos insaturados.138,139 (Grau de Recomendação: IIa; Nível de Evidência: B). É importante realçar que o modo de preparo de alguns
alimentos tem papel fundamental no teor de gorduras nos alimentos. No caso dos peixes, o teor de poli-insaturados pode variar até 220 vezes para uma mesma espécie.139,140 A substituição por gorduras monoinsaturadas, como azeite
de oliva e frutas oleaginosas, pode estar associada à redução do risco cardiovascular, porém as evidências são menos robustas do que em relação às poli-insaturadas136
(Grau de Recomendação: IIa; ; Nível de Evidência: B).
7.1.3. Ácidos graxos trans 
Os ácidos graxos trans devem ser excluídos da dieta por aumentarem a concentração plasmática de LDL-c e induzirem intensa lesão aterosclerótica,141 condições que culminam em
maior risco cardiovascular, conforme demonstrado em estudos experimentais, clínicos e epidemiológicos.131,133
(Grau de Recomendação: III; Nível de Evidência: A).
7.1.4. Colesterol alimentar 
Recente metanálise mostrou que o colesterol alimentar exerce pouca influência na mortalidade cardiovascular,135 embora neste estudo tenha sido demonstrada linearidade entre o consumo de colesterol alimentar e a concentração plasmática de LDL-c. Já o aumento do consumo de ovos, em um contexto de dieta com baixo teor de gordura, manteve a relação LDL-c/HDL-c, tanto entre indivíduos que absorvem mais colesterol da dieta quanto nos hiporresponsivos.142 Em razão destes estudos mais recentes da literatura, as atuais diretrizes internacionais sobre prevenção cardiovascular mostram que não há evidências suficientes para estabelecimento de um valor de corte para o consumo de colesterol.

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