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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO 
INSTITUTO COPPEAD DE ADMINISTRAÇÃO 
 
 
RAFAEL PEREIRA DE ARAÚJO PEDROSA 
 
 
 
 
 
Desafios do crescimento de empresas diversificadas: 
Os casos Matarazzo e Votorantim 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2015 
 
 
 
 
 
 
Rafael Pereira de Araújo Pedrosa 
 
 
 
DESAFIOS DO CRESCIMENTO DE EMPRESAS DIVERSIFICADAS: 
OS CASOS MATARAZZO E VOTORANTIM 
 
 
 
 
Dissertação de Mestrado apresentada ao 
Programa de Pós-Graduação em 
Administração, Instituto Coppead de 
Administração, Universidade Federal do 
Rio de Janeiro, como parte dos requisitos 
necessários à obtenção do título de 
Mestre em Administração (M.Sc.) 
 
Orientadora: Denise Lima Fleck, Ph.D. 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2015
 
 
ii 
 
FICHA CATALOGRÁFICA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
PEDROSA, Rafael Pereira de Araújo 
Desafios do Crescimento de Empresas Diversificadas: Os 
Casos Matarazzo e Votorantim / Pedrosa, R. P. A. 
- 2015. 325f 
 
Dissertação (Mestrado em Administração) – Universidade 
Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, Instituto Coppead de 
Administração, 2015. 
 
Orientadora: Denise Lima Fleck 
 
 
1. Crescimento da Firma. 2. Declínio Organizacional. 3. 
Administração - Teses. I. Fleck, Denise Lima. (Orient.). II. 
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Instituto 
Coppead de Administração. Desafios do Crescimento de 
Empresas Diversificadas: Os Casos Matarazzo e 
Votorantim 
 
 
 
iii 
 
DESAFIOS DO CRESCIMENTO DE EMPRESAS 
DIVERSIFICADAS: OS CASOS MATARAZZO E VOTORANTIM 
 
 
Rafael Pereira de Araújo Pedrosa 
 
 
 
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em 
Administração, Instituto Coppead de Administração, Universidade Federal do Rio de 
Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em 
Administração (M.Sc.) 
 
 
Aprovado por: 
 
________________________________________ 
Profa. Denise Lima Fleck, Ph.D. (COPPEAD, UFRJ) - Orientadora 
 
 
________________________________________ 
Prof. José Vitor Bomtempo Martins, D.Sc. (Escola de Química, UFRJ) 
 
 
________________________________________ 
Profa Maribel Carvalho Suarez, D.Sc. (COPPEAD, UFRJ) 
 
Rio de Janeiro 
2015 
 
 
 
iv 
 
AGRADECIMENTOS 
À minha amada esposa Amanda Xavier, não só por todo o seu 
companheirismo e paciência durante esses longos meses, mas por ter sido a principal 
incentivadora para que eu seguisse essa fantástica jornada. 
A minha família, em especial aos meus pais, Lívia e Manoel, que não mediram 
esforços para que eu tivesse uma educação de qualidade. Ao meu irmão Luiz Felipe, 
desde sempre uma referência para mim e que sempre me deu suporte nas minhas 
decisões. E também aos meus sogros Márcia e Emílio, por todo o apoio que têm me 
dado. Sem a contribuição dos meus familiares, eu não teria chegado até aqui. 
À professora Denise Fleck, por todos os ensinamentos durante o Mestrado, e 
por ter me aceito como orientado, sendo extremamente dedicada e buscando sempre 
o melhor para o meu trabalho, incentivando e cobrando quando necessário. 
Aos professores Maribel Suarez e José Vitor Bomtempo por terem aceitado 
participar da banca de avaliação e por se dedicarem para avaliar e contribuir com a 
minha dissertação. 
A todos os entrevistados que cederem parte dos seus tempos para me contar 
grandes histórias, sem as quais eu não poderia ter concluído o presente estudo. 
Um agradecimento especial a toda a equipe do Centro de Memória da 
Votorantim, por fazerem um trabalho fantástico e por me receberem tão bem e 
estarem sempre abertos para contribuir para a pesquisa. 
Aos meus colegas de Mestrado, em especial aos parceiros de seminários, pelo 
companheirismo e contribuições oferecidas ao longo desses últimos meses. Vocês 
todos foram uma grande fonte de aprendizado. 
Aos professores do Coppead pelos valiosos ensinamentos, e a toda equipe de 
colaboradores do Coppead, exemplos de funcionários públicos, corretos, eficientes e 
sempre dispostos a ajudar. 
Aos meus grandes amigos de Itajubá e do Rio, que me propiciaram importantes 
momentos de refúgio e diversão. Ao Thor, que embora não possa ler nenhuma linha 
do que está escrito aqui, é um amigo fiel e leal. 
Ao CNPq pela concessão da bolsa a que tive acesso durante o meu segundo 
ano de curso. 
E, finalmente, agradeço ao meu país, que apesar de todas as suas 
dificuldades, me proporcionou a oportunidade de cursar de forma gratuita um 
programa de Mestrado de excelência em nível mundial. Compreendo que junto com o 
título de Mestre em Administração, carrego o dever de contribuir diretamente para o 
desenvolvimento do Brasil. 
 
 
v 
 
RESUMO 
Pedrosa, Rafael Pereira de Araújo. Desafios do Crescimento de Empresas 
Diversificadas: Os Casos Matarazzo e Votorantim. Orientadora: Denise Fleck. Rio 
de Janeiro: UFRJ/COPPEAD, 2014. Dissertação (Mestrado em Administração). 
 
Os grupos Matarazzo e Votorantim, possivelmente os dois principais grupos industriais 
da história do país, guardam certas similaridades em suas trajetórias. Protagonistas do 
processo de industrialização pelo qual o Brasil passou no início do século vinte, as 
organizações foram formadas por imigrantes europeus que se estabeleceram na 
cidade de Sorocaba e tiveram na indústria têxtil a base para a expansão e 
diversificação dos negócios. As semelhanças, no entanto, param por aí. Enquanto que 
a organização do Conde Matarazzo ampliou drasticamente o seu escopo de 
atividades, chegando a reunir mais de duas centenas de empresas que atuavam em 
diversos segmentos da economia, a Votorantim liderada por José Ermírio de Moraes 
foi uma das pioneiras na formação da indústria de base nacional, concentrando suas 
atividades principalmente nos setores de cimentos e metais. Assim, elas tiveram 
destinos distintos. As principais empresas que formavam a Indústrias Reunidas 
Fábricas Matarazzo (IRFM) declinaram e pediram concordata em 1983. A Votorantim, 
por sua vez, ainda se mantém como um dos principais conglomerados do país. Dessa 
forma, o objetivo deste trabalho foi compreender como essas organizações 
responderam aos desafios do crescimento propostos por Fleck (2009), buscando 
analisar se essas respostas contribuíram para o desenvolvimento de uma propensão à 
longevidade saudável ou à autodestruição em cada um dos casos. A análise sugere 
que a Matarazzo desenvolveu capacitações empreendedoras que contribuíram para o 
seu crescimento, mas não conseguiu gerir a complexidade e evitar a fragmentação em 
decorrência do intenso processo de expansão e diversificação. Além disso, 
dificuldades em se adaptar às mudanças do ambiente também contribuíram para a 
sua extinção. Respostas consistentes foram identificadas ao longo da trajetória da 
Votorantim, permitindo, ao mesmo tempo, o crescimento e a sustentação da 
integridade organizacional. Evidências apontam, no entanto, para respostas menos 
efetivas nos anos recentes, indicando que pode haver um risco para o futuro da 
organização. 
 
Palavras-chave: Crescimento da Firma; Declínio Organizacional; Longevidade 
Saudável; Diversificação 
 
 
 
vi 
 
ABSTRACT 
Pedrosa, Rafael Pereira de Araújo. Desafios do Crescimento de Empresas 
Diversificadas: Os Casos Matarazzo e Votorantim. Orientadora: Denise Fleck. Rio 
de Janeiro: UFRJ/COPPEAD, 2014. Dissertação (Mestrado em Administração). 
 
The Matarazzo and Votorantim groups, possibly the two major industrial groups in the 
country's history, hold certain similarities in their trajectories. First, they were both 
protagonists of the industrialization process by which Brazil went through in the early 
twentieth century. Second, the organizations were formed by European immigrants 
who settled in the city of Sorocaba and had in the textile industry the basis for the 
expansion and diversification of their business. The connections, however, end there.While the organization formed by Francesco Matarazzo dramatically expanded its 
scope of activities, encompassing more than two hundred companies in various 
segments of the economy, Votorantim, led by José Ermírio de Moraes, was a pioneer 
in Brazilian basic industry, focusing its activities mainly on cement and metals sectors. 
Thus, they had different destinations. The main companies that formed the Indústrias 
Reunidas Fábricas Matarazzo (IRFM) declined and filed for bankruptcy in 1983. 
Votorantim, in turn, still stands as one of the leading conglomerates in the country. 
Therefore, this study aims to understand how these organizations responded to the 
growth-related challenges proposed by Fleck (2009), seeking to analyze whether these 
responses contributed to the development of a propensity for self-destruction or healthy 
longevity in each case. The analysis suggests that Matarazzo developed 
entrepreneurial capabilities which contributed to its growth, but was not able to deal 
with complexity and avoid the fragmentation due to the intense process of growth and 
diversification. Furthermore, difficulties in adapting to environmental changes also 
contributed to its extinction. Consistent responses were identified along Votorantim´s 
trajectory, allowing, at the same time, the growth and the preservation of the 
organizational integrity. Evidence points, however, to less effective responses in recent 
years, indicating that there may be risk to the future of the organization. 
 
 
Keywords: Growth of the Firm; Organizational Decline; Healthy Longevity; 
Diversification. 
 
 
 
 
vii 
 
 
LISTA DE ABREVIATURAS 
BB Banco do Brasil 
BNDE Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico (depois BNDES) 
BNDES Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social 
CADE Conselho Administrativo de Defesa Econômica 
CBA Companhia Brasileira de Alumínio 
CMM Companhia Mineira de Metais 
CIESP Centro das Indústrias do Estado de São Paulo 
CIFTSP Centro da Indústria de Fiação e Tecelagem de Algodão de São Paulo 
CIP Conselho Interministerial de Preços 
CSN Companhia Siderúrgica Nacional 
EBITDA Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation And Amortization 
EUA Estados Unidos da América 
FAAP Fundação Armando Alvares Penteado 
FGV Fundação Getúlio Vargas 
FHC Fernando Henrique Cardoso 
FIESP Federação das Indústrias do Estado de São Paulo 
IBAR Indústria Brasileira de Artigos Refratários 
IME Indústria Matarazzo de Energia 
IRFM Indústrias Reunidas Fábricas Matarazzo 
JK Juscelino Kubitschek 
PIB Produto Interno Bruto 
PNDII Plano Nacional de Desenvolvimento 
SDV Sistema de Desenvolvimento Votorantim 
SGV Sistema de Gestão Votorantim 
VC Votorantim Cimentos 
VCP Votorantim Celulose e Papel 
VCPS Votorantim Cimentos Production System 
VID Votorantim Industrial 
VM Votorantim Metais 
VPAR Votorantim Participações 
 
 
 
viii 
 
 
LISTA DE TABELAS 
Tabela 2-1 - Cinco Desafios do Crescimento ...................................................................... 10 
Tabela 3-1 - Comparativo Cronológico Entre Matarazzo e Votorantim ........................... 20 
Tabela 3-2 – Relação dos Entrevistados .............................................................................. 24 
Tabela 3-3 – Relação dos relatos obtidos no Centro de Memória Votorantim ............... 24 
Tabela 3-4– Dimensões Utilizadas para a Análise ............................................................. 26 
Tabela 4-1 - Crescimento da Produção de Café e da População nas Zonas Cafeeiras
 ..................................................................................................................................................... 29 
Tabela 4-2 - Evolução da Produção Industrial de São Paulo ............................................ 32 
Tabela 4-3 - Importações Através do Porto de Santos, 1909-1918 (milhares de 
toneladas métricas) .................................................................................................................. 33 
Tabela 4-4 - Balança Comercial do Brasil, 1904 – 1918 .................................................... 33 
Tabela 4-5 - Distribuição por Idade das Máquinas da Indústria Têxtil em 1939 ............ 44 
Tabela 4-6- Aspectos Gerais da Indústria: 1928 – 1939 .................................................... 45 
Tabela 4-7 - Participação dos Itens Importados em Diversos Setores ............................ 51 
Tabela 4-8 - Mudanças na Estrutura Industrial Brasileira: 1939 - 1963 .......................... 52 
Tabela 4-9 - Crescimento da Indústria entre 1957 e 1977 ................................................ 54 
Tabela 4-10 - Taxas de Crescimento de Subsetores (1971-1989) .................................. 59 
Tabela 4-11 – Principais Privatizações Realizadas Durante a Década de 1990 ........... 60 
Tabela 4-12 -- Participação dos Setores da Atividade Econômica no PIB em Anos 
Selecionados ............................................................................................................................. 66 
Tabela 5-1- Patrimônio da IRFM em 1911 ........................................................................... 72 
Tabela 5-2 – Grupo Matarazzo em 1934 .............................................................................. 88 
Tabela 5-3 - Evolução do capital social da Matarazzo (em milhões de cruzeiros) ........ 91 
Tabela 5-4 - Divisão da Matarazzo em Empresas ............................................................ 103 
Tabela 5-5 Composição do Faturamento da IRFM por Setor (%) .................................. 105 
Tabela 5-6 – Perfil do Grupo Matarazzo em 1993 ............................................................ 108 
Tabela 6-1 - Evolução da Produção anual de Cimento em Toneladas ......................... 126 
Tabela 6-2 – Quarta Geração da Família Ermírio de Moraes ......................................... 139 
Tabela 6-3 – Unidades de Negócio da Votorantim em 2001 ........................................... 140 
Tabela 6-4 – Participação da Votorantim no Mercado Brasileiro, por Negócio ............ 140 
Tabela 7-1 - Importações Através do Porto de Santos, 1909-1918 (milhares de 
toneladas métricas) ................................................................................................................ 160 
Tabela 7-2 – Avanço das Unidades Têxteis do Grupo Matarazzo entre 1939 e 1952 162 
Tabela 7-3 – Relação de Unidades Descontinuadas ou Vendidas Entre as Décadas de 
1950 e 1970............................................................................................................................. 185 
Tabela 7-4 – Lucro Médio da Matarazzo Entre 1912 e 1929 .......................................... 188 
Tabela 7-5 – Resumo das Respostas da Matarazzo entre 1881 e 1911 ...................... 194 
Tabela 7-6 – Resumo das Respostas da Matarazzo entre 1911 e 1937 ...................... 196 
Tabela 7-7 – Resumo das Respostas da Matarazzo entre 1937 e 1955 ...................... 198 
Tabela 7-8 – Resumo das Respostas da Matarazzo entre 1955 e 1983 ...................... 200 
Tabela 7-9 – Evolução da produção brasileira de alumínio primário segundo entre 
2000 e 2009 (em mil t) ........................................................................................................... 223 
 
 
ix 
 
Tabela 7-10 – Divisão das operações da Votorantim entre os membros da terceira 
geração .................................................................................................................................... 232 
Tabela 7-11 – Resumo da capacidade e vendas da VM ................................................. 260 
Tabela 7-12 – Resumo das Respostas da Votorantim entre 1900 e 1918 ................... 267 
Tabela 7-13 – Resumo das Respostas da Votorantim entre 1918 e 1973 ................... 270 
Tabela 7-14 – Resumo das Respostas da Votorantim entre 1973 e 2000 ...................273 
Tabela 7-15 – Resumo das Respostas da Votorantim entre 2000 e 2014 ................... 275 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
x 
 
LISTA DE GRÁFICOS 
Gráfico 4-1 - Movimento Migratório no Estado de São Paulo (1871 – 1900) ................. 30 
Gráfico 4-2– Evolução da População Brasileira .................................................................. 46 
Gráfico 4-3 – Evolução das Populações Urbana e Rural no Brasil .................................. 47 
Gráfico 4-4 - Distribuição Setorial do PIB (1950 – 89) ....................................................... 48 
Gráfico 4-5 - Relação de Produção e Consumo de Energia Elétrica ............................... 54 
Gráfico 4-6 - Cotação Internacional do Petróleo (US$) ...................................................... 55 
Gráfico 4-7 - Saldo da Balança Comercial entre 1970 a 1989 (US$ milhões) ............... 56 
Gráfico 4-8 - Inflação - IPCA (% a.a.) .................................................................................... 61 
Gráfico 4-9 - Taxa de juros - Over / Selic - (% a.a.) ............................................................ 62 
Gráfico 4-10 - Saldo da Balança Comercial entre 1990 e 2013 (US$ milhões) ............. 63 
Gráfico 4-11 - Taxa de Câmbio (Real x Dólar) .................................................................... 64 
Gráfico 4-12 - PIB da China em US$ - 1960 – 2013........................................................... 65 
Gráfico 4-13 – Participação das vendas para a China no total das exportações do 
Brasil ........................................................................................................................................... 66 
Gráfico 5-1 - Distribuição do Capital da IRFM ..................................................................... 73 
Gráfico 5-2 - Distribuição do Capital da Indústrias Matarazzo do Paraná ...................... 78 
Gráfico 6-1 - Evolução Financeira do Grupo entre 1942 e 1951 (em milhões de 
cruzeiros) ................................................................................................................................. 122 
Gráfico 7-1 – Evolução do Tamanho da Matarazzo entre 1941 e 1980 ........................ 149 
Gráfico 7-2 - Composição de Faturamento da Matarazzo em 1980 .............................. 186 
Gráfico 7-3 – Margem líquida da IRFM entre 1943 e 1979 ............................................. 189 
Gráfico 7-4 – Capital Social em relação ao PIB brasileiro ............................................... 190 
Gráfico 7-5 – Percentual das Dívidas Sobre o Ativo Total ............................................... 190 
Gráfico 7-6 – Evolução do Tamanho da Votorantim entre 1952 e 2013 ....................... 201 
Gráfico 7-7 – Composição do EBITDA da VID em 2012 ................................................. 224 
Gráfico 7-8 – Evolução do endividamento da VID (em milhares de Reais) .................. 264 
Gráfico 7-9 – Evolução da Margem Líquida da Votorantim ............................................. 264 
Gráfico 7-10 – Evolução dos investimentos da Votorantim (em bilhões de Reais) ..... 265 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
xi 
 
LISTA DE FIGURAS 
Figura 2-1 – Motor do Crescimento Contínuo ........................................................................ 7 
Figura 2-2 - Modelo dos Requisitos para o Desenvolvimento de Propensão à 
Autoperpetuação ...................................................................................................................... 17 
Figura 5-1 - Composição da Diretoria da IRFM ................................................................... 74 
Figura 5-2 – Estrutura da Diretoria Executiva em 1976 ................................................... 100 
Figura - 6-1 – Mapa da Localização das Empresas da Votorantim, por Setor em 1984
 ................................................................................................................................................... 128 
Figura 7-1 – Processo de Diversificação da Matarazzo entre 1900 e 1903 ................. 152 
Figura 7-2 – Composição da IRFM em 1925 ..................................................................... 170 
Figura 7-3 – Legenda do resumo das respostas aos desafios do crescimento ........... 192 
Figura 7-4 – Respostas da Matarazzo entre 1881 e 1911 ............................................... 193 
Figura 7-5 - Respostas da Matarazzo entre 1911 e 1937 ............................................... 194 
Figura 7-6 – Respostas da Matarazzo entre 1937 e 1955 ............................................... 197 
Figura 7-7 – Respostas da Matarazzo entre 1955 e 1983 ............................................... 199 
Figura 7-8 – Estrutura industrial do grupo Votorantim na década de 1950 .................. 229 
Figura 7-9 – Estrutura Organizacional da Votorantim em 2010 ...................................... 255 
Figura 7-10 - Estrutura Organizacional da Votorantim em 2014 .................................... 256 
Figura 7-11 – Expansão da Votorantim através de mecanismos de auto reforço ....... 259 
Figura 7-12 – Respostas da Votorantim entre 1900 e 1918 ............................................ 266 
Figura 7-13 – Respostas da Votorantim entre 1918 e 1973 ............................................ 268 
Figura 7-14 – Respostas da Votorantim entre 1973 e 2000 ............................................ 271 
Figura 7-15 – Respostas da Votorantim entre 2000 e 2014 ............................................ 273 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
xii 
 
SUMÁRIO 
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 1 
2 REVISÃO DE LITERATURA ............................................................................................ 4 
2.1 Empresas Familiares ................................................................................................. 4 
2.2 Gestão de Empresas Diversificadas ....................................................................... 5 
2.3 Crescimento e Declínio Organizacional .................................................................. 7 
2.4 Arquétipos de Sucesso e Fracasso Organizacional ............................................. 9 
2.4.1 Desafio do Empreendedorismo ...................................................................... 11 
2.4.2 Desafio da Navegação no Ambiente ............................................................. 12 
2.4.3 Desafio da Gestão da Diversidade ................................................................ 13 
2.4.4 Desafio da Gestão de Recursos Humanos .................................................. 14 
2.4.5 Desafio da Gestão da Complexidade ............................................................ 15 
2.4.6 Desafio da Folga Organizacional ................................................................... 15 
2.4.7 Interação Entre os Desafios ............................................................................ 16 
3 MÉTODO DE PESQUISA ............................................................................................... 18 
3.1 Definição do Tema e dos Objetos de Estudo....................................................... 18 
3.2 Estratégia de Pesquisa ............................................................................................ 20 
3.3 Coleta de Dados ....................................................................................................... 21 
3.4 Processamento e Análise dos Dados ................................................................... 25 
4 DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E INDUSTRIAL DO BRASIL ........................ 28 
5 HISTÓRICO MATARAZZO ............................................................................................. 68 
6 HISTÓRICO VOTORANTIM .........................................................................................109 
7 ANÁLISE .......................................................................................................................... 148 
7.1 Análise das Respostas da Matarazzo aos Desafios do Crescimento ............ 148 
7.1.1 Desafio do Empreendedorismo .................................................................... 149 
7.1.2 Desafio da Navegação no Ambiente ........................................................... 159 
7.1.3 Desafio da Gestão da Diversidade .............................................................. 168 
7.1.4 Desafio da Provisão de Recursos Humanos ............................................. 177 
7.1.5 Desafio da Gestão da Complexidade .......................................................... 182 
7.1.6 Gestão da Folga Organizacional .................................................................. 187 
7.1.7 Resumo das Respostas da Matarazzo aos Desafios do Crescimento .. 191 
7.2 Análise das Respostas da Votorantim aos Desafios do Crescimento ........... 201 
7.2.1 Desafio do Empreendedorismo .................................................................... 202 
7.2.2 Desafio da Navegação no Ambiente ........................................................... 218 
 
 
xiii 
 
7.2.3 Desafio da Gestão da Diversidade .............................................................. 228 
7.2.4 Desafio da Provisão de Recursos Humanos ............................................. 241 
7.2.5 Desafio da Gestão da Complexidade .......................................................... 250 
7.2.6 Gestão da Folga Organizacional .................................................................. 257 
7.2.7 Resumo das Respostas da Votorantim aos Desafios do Crescimento . 265 
8 CONCLUSÃO ................................................................................................................. 276 
8.1 Considerações Finais Sobre a Matarazzo .......................................................... 276 
8.2 Considerações Finais Sobre a Votorantim ......................................................... 278 
8.3 Principais Diferenças Identificadas ...................................................................... 279 
8.4 Contribuições do Estudo ....................................................................................... 280 
8.5 Propostas Para Pesquisas Futuras ..................................................................... 282 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................... 283 
ANEXOS .................................................................................................................................. 300 
 
 
1 
 
 
 
1 INTRODUÇÃO 
O sucesso e fracasso organizacional é um tema que atrai grande interesse por 
parte dos gestores e pesquisadores (Chandler, 1977; Wheten, 1980, 1987; Fleck, 
2009). Entretanto, diante do vasto leque de teorias e ferramentas gerenciais 
desenvolvidas nas últimas décadas, pouca congruência tem sido encontrada sobre o 
que leva uma empresa a crescer e se perpetuar, enquanto outras declinam e 
fracassam. Segundo Fleck (2009), com certa frequência, os casos de sucesso 
empresariais atuais se transformam mais tarde em grandes pesadelos corporativos. 
Fleck (2009) destaca ainda que o sucesso organizacional não está relacionado 
a um estado final que possa ser alcançado, mas sim com a propensão à 
autoperpetuação que pode ser desenvolvida por uma empresa à medida que ela 
desenvolve respostas saudáveis aos desafios do crescimento. Por outro lado, o 
fracasso organizacional é definido como o estágio final de um processo de declínio. 
Assim, os gestores devem atuar constantemente com o objetivo de aproximar 
as organizações do polo da autoperpetuação, evitando que a organização seja 
lançada em um processo de declínio. Portanto, estudar e compreender as condições 
necessárias para que uma empresa desenvolva essa propensão à longevidade 
saudável torna-se um tema relevante para o estudo de gestão de organizações. 
No Brasil, verifica-se uma grande carência sobre dados econômicos e 
empresariais, assim como estudos corporativos de qualidade (BETHLEM, 1999). 
Sabe-se, no entanto, que há no país um alto nível de mortalidade empresarial, aliado a 
um ambiente econômico instável para a condução dos negócios. 
Entretanto, casos de empresas longevas como Souza Cruz (GRIGOROVSKI, 
2004), Gerdau (VIEIRA, 2007) e Klabin (BARBOSA, 2008) indicam que a capacidade 
de atuações dos gestores pode evitar o fracasso mesmo em situações adversas. Por 
outro lado, ser reconhecida como uma organização vencedora em seu mercado não 
garante a longevidade saudável e a autoperpetuação. Mesbla (RODRIGUES, 2005) e 
Varig (OLIVEIRA, 2011) são exemplos notáveis de empresas que foram líderes de 
seus setores, mas não conseguiram sustentar a sua posição e sucumbiram. 
Ao lançarmos um olhar sobre o processo de industrialização do Brasil, é 
possível encontrar duas características importantes. A primeira está relacionada ao 
protagonismo das empresas familiares na formação e desenvolvimento dos primeiros 
negócios de base industrial. A segunda aponta para uma tendência em se buscar a 
diversificação dos negócios como forma de proteção à instabilidade do ambiente. É 
possível apontar duas organizações com esse perfil que se destacaram e figuraram 
entre as maiores do país: Matarazzo e Votorantim. 
2 
 
 
 
Constituídas por imigrantes europeus que chegaram ao Brasil no fim do século 
XIX, foram pioneiras na formação das primeiras unidades fabris, no interior do Estado 
de São Paulo, além de terem sido fundadores das principais associações industriais 
do país. As semelhanças, no entanto, não se estendem por muito mais do que estes 
pontos. 
O complexo industrial formado por Francesco Matarazzo cresceu através de 
um intenso processo de diversificação e se transformou em uma das maiores 
corporações industriais do mundo em sua época, reunindo mais de duas centenas de 
empresas diferentes que atuavam em diversos setores da economia. Assim, se 
manteve por décadas como maior organização empresarial nacional até iniciar um 
processo de declínio, após a Segunda Guerra Mundial, que culminou com um pedido 
de concordata em 1983. Atualmente, pouco resta do império fundado há mais de um 
século. 
Com uma história também centenária, a Votorantim iniciou sua trajetória 
industrial no início do século XX atuando no setor têxtil. Embora com menos 
intensidade, passou a diversificar os seus negócios sob o comando de José Ermírio de 
Moraes entre os anos 30 e 50, tornando-se o maior grupo industrial do Brasil no início 
da década de 1980. Atualmente, a Votorantim se mantém como uma das principais 
empresas brasileiras com atuação principalmente orientada para commodities e 
presença em vários países do mundo. 
Sendo assim, constata-se que os grupos tiveram um histórico inicial similar, 
vivenciando os mesmos acontecimentos do ambiente econômico nacional, mas 
passaram a percorrer caminhos diferentes. Geralmente atribui-se a queda da 
Matarazzo à questão de sucessão familiar e destaca-se a Votorantim pela maneira 
como tratou essa questão. O processo sucessório é, naturalmente, uma questão 
crucial das empresas familiares. Segundo Bethlem (1990), menos de 15% dos 
negócios de família sobrevivem após a terceira geração. Entretanto, não é possível 
apontar esta questão como única. 
Por isso, a intenção desse trabalho foi reunir as principais informações desses 
“dois gigantes” com o intuito de compreender o que levou as organizações a 
desenvolverem trajetórias distintas ao longo dos anos. É importante destacar que a 
Matarazzo e a Votorantim foram organizações contemporâneas, vivenciaram e 
contribuíram para o desenvolvimento da indústria, permitindo que o estudo ofereça 
pontos de comparação entre as duas organizações. 
 
“Votorantim, maior do Brasil, cuja história tem pontosde contato com 
a da Matarazzo. Na origem, na época de início, na cor verde-amarela, 
no papel essencial do imigrante-empresário fundador, na 
3 
 
 
 
concorrência em mercado, na disputa de atividades e projetos” 
(COUTO
2
, 2004, p. 341). 
 
Portanto, utilizando os Arquétipos de Sucesso e Fracasso Organizacional 
propostos por Fleck (2009), a presente pesquisa buscou responder a seguinte 
pergunta: Como dois dos principais grupos industriais brasileiros responderam aos 
desafios do crescimento? 
Para atingir esse objetivo, o trabalho foi estruturado em oito capítulos. O 
presente capítulo introduz as considerações e proposta da pesquisa. 
O capítulo 2 discorre sobre o arcabouço teórico empregado no processo de 
análise, apresentando principalmente as teorias propostas por Fleck (2009), Penrose 
(1980), Chandler (1962 e 1977) e Selznick (1957). 
O capítulo 3 apresenta o método utilizado para a abordagem da pesquisa e 
para a coleta, classificação e análise dos dados. 
A descrição do ambiente o qual as empresas deste estudo fazem parte é 
exposta no capítulo 4. Nele apresenta-se uma narrativa do desenvolvimento 
econômico e industrial brasileiros desde o fim do século XIX até 2013. 
O histórico das empresas Matarazzo e Votorantim são apresentados nos 
capítulos 5 e 6, respectivamente, com um resumo dos fatos e eventos relevantes das 
suas trajetórias. 
O resultado da análise é discutido no capítulo 7, com a apresentação das 
respostas aos desafios do crescimento de cada uma das empresas. 
Finalmente, as considerações finais são desenvolvidas no capítulo 8, no qual 
são comentadas também as contribuições da pesquisa e as recomendações para 
trabalhos futuros. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
4 
 
 
 
2 REVISÃO DE LITERATURA 
O presente capítulo apresentará o arcabouço teórico que auxiliou a análise das 
trajetórias da Matarazzo e da Votorantim. Primeiro, serão discutidos aspectos 
referentes à gestão de empresas familiares e de empresas diversificadas. Em seguida, 
será realizada uma contextualização sobre as teorias do crescimento e de declínio 
organizacional. Finalmente, serão apresentados os Arquétipos do Sucesso e Fracasso 
Organizacional de Fleck, que serviram de base para o diagnóstico das organizações. 
 
2.1 Empresas Familiares 
De acordo com Gonçalves (2000), a caracterização de uma empresa como 
familiar está relacionada à existência de três condições: 
a) a empresa é propriedade de uma família, detentora da totalidade ou da maioria 
das ações ou cotas, de forma a ter o seu controle econômico; 
b) a família tem a gestão da empresa, cabendo a ela a definição dos objetivos, das 
diretrizes e das grandes políticas; 
c) a família é responsável pela administração do empreendimento, com a 
participação de um ou mais membros no nível executivo mais alto. 
Até a década de 1950, a empresa familiar brasileira esteve presente em quase 
todos os segmentos da economia nacional, desde a agricultura, passando pela 
indústria têxtil, de alimentação e de serviços (GONÇALVES, 2000). De acordo com 
Bethlem (2000), essa atuação diversificada sobrecarregou os recursos gerenciais e de 
capital das organizações familiares. Entretanto, o autor afirma que práticas 
protecionistas, assim como restrições a investimentos e, algumas vezes, também 
cambiais, tornaram a diversificação local a única maneira possível de crescer. 
As características de um negócio familiar foram responsáveis pelo seu sucesso 
relativo nesse processo de industrialização. Sua estrutura informal, por exemplo, 
facilitava decisões rápidas, o que era uma vantagem numa região sujeita a 
instabilidades políticas e econômicas. Além disso, essas empresas costumam ter 
valores fortes compartilhados, frequentemente originados a partir da visão do 
fundador, e tradições que ajudam a trazer a lealdade dos funcionários (BETHLEM, 
2000). 
Entretanto, com a abertura dos mercados da América Latina para concorrentes 
multinacionais, o cenário se alterou. Competidores locais, com negócios diversificados, 
passaram a ter dificuldades de competir com as empresas estrangeiras que entravam 
no mercado, pois elas traziam mais habilidades gerenciais, maior acesso ao capital e 
possibilidade de oferecer produtos e serviços melhores e a preços mais baixos. Como 
5 
 
 
 
consequência, as empresas familiares da América Latina passaram a correr o risco de 
saírem do mercado ou tornarem-se alvo de aquisições (BETHLEM, 2000). 
Vale ressaltar, ainda, a dificuldade das empresas familiares conseguirem se 
autoperpetuar ao longo das gerações. Segundo Bethlem (1999), evidências empíricas 
sugerem que a primeira geração geralmente constrói a empresa e a segunda a 
mantém, enquanto a terceira esbanja seus recursos. De acordo com o autor, menos 
de 15% dos negócios de família sobrevivem após a terceira geração. A Matarazzo 
contribuiu para as estatísticas ao pedir concordata sob o comando de Maria Pia, da 
terceira geração. A Votorantim, por sua vez, realizou três processos sucessórios e, 
após um processo de profissionalização, prepara a quinta geração para atuar no 
Conselho. 
 
2.2 Gestão de Empresas Diversificadas 
De acordo com Chandler (1990), os CEOs se tornaram aficionados por 
diversificações a partir da década de 1960. O número de aquisições e fusões triplicou 
em um período de quatro anos, chegando a seis mil em 1969. Segundo o autor, entre 
1963 e 1972, aproximadamente três quartos dos ativos adquiridos foram para a 
diversificação de produtos. 
Entretanto, Porter (1987) propõe que as organizações falharam em 
desenvolver estratégias corporativas eficazes em tornar os conglomerados em mais 
do que a simples soma das partes. Chandler (1990) afirma que isso levou à separação 
entre a gestão de topo das corporações e a gerência média responsável pelas 
unidades de negócio. Isso ocorreu devido a dois motivos principais. Primeiro, os 
executivos frequentemente não dispõem do conhecimento específico dos negócios 
que eles adquirem. Segundo, a diversificação gerou sobrecarregou a tomada de 
decisão na medida em que os grupos passaram a ter dezenas de negócios para 
gerenciar. 
Ghoshal e Mintzberg (1994) afirmam que não existem métodos formais para 
gerenciar empresas com negócios diversificados. Por isso, destacam a dificuldade de 
esses grupos desenvolverem uma estrutura adequada. Segundo os autores, é comum 
enxergar movimentos de pêndulos nos quais as organizações vão da centralização 
para a descentralização e depois acabam retornando para a condição inicial, sem 
conseguir encontrar a fórmula correta. 
Assim, Ghoshal e Mintzberg (1994) afirmam que a estruturação de uma 
organização diversificada envolve mais do que as tradicionais modelos de divisões 
(por produtos, regiões, etc) e tipos de controle (financeiro, estratégico, etc). Para eles, 
6 
 
 
 
uma questão central na gestão de empresas diversificadas está no trade off entre 
autonomia e sinergia. Para isso, propõem que as organizações devem desenvolver 
métodos que sustentem o planejamento de sistemas e recursos visando a 
formalização e geração de controles. Ao mesmo tempo, devem manter a capacidade 
adaptativa, fomentando a renovação e o aprendizado dos diversos negócios. Para 
tudo isso funcionar, os negócios devem ser sólidos e a gerência de topo deve fornecer 
o impulso necessário para a criação dos empreendimentos e continuar fornecendo a 
energia para sustentar a viabilidade e evitar o colapso das unidades. Além disso, a 
cultura passa a ser o fator necessário para unir todos os elementos e manter a solidez 
entre as partes. 
Organizações diversificadas podem ser formados através de expansões 
orgânicas e, principalmente como resultados de processos de fusões e aquisições. 
Segundo Penrose (1980), as aquisições podem ser consideradas o caminho mais 
curto para o crescimento quando criam novas organizações maiores e que forneçam 
as condições necessárias parapermitir a continuidade do crescimento. Porter (1987), 
por sua vez, afirma que a iniciativa de uma organização de se lançar em novos 
negócios pode ser freada pelas barreiras de entrada de uma indústria, fazendo com 
que a aquisição passe a ser uma opção para a expansão. 
Dessa forma, Penrose (1980) afirma que sempre que as aquisições forem 
visualizadas como uma possibilidade mais rentável para a expansão haverá uma 
tendência dos gestores seguirem este caminho. 
Entretanto, processos de aquisição são complexos e exigem um conjunto de 
condições necessárias para o seu sucesso. De acordo com Ashkenas et al (1998), as 
aquisições são experiências dolorosas e que geram grande ansiedade nas pessoas, 
pois envolvem demissões, reestruturação de responsabilidades e mudança de poder. 
Além disso, de acordo com Penrose (1980), se por um lado as aquisições podem ser a 
maneira mais rápida e eficiente para uma firma se expandir, também é um caminho 
pelo qual empreendedores ambiciosos conseguem atingir resultados notáveis e criar 
um grande império. 
Nesse sentido, muitas vezes não geram resultados satisfatórios de longo 
prazo. Os estudos de Porter (1987) indicaram, por exemplo, que trinta e três grandes 
corporações norte americanas mantiveram menos da metade dos negócios adquiridos 
entre 1950 e 1986. Segundo o autor, as organizações que foram consideradas bem 
sucedidas nos processos de aquisição demonstraram que o reconhecimento da inter-
relação entre as partes e da manutenção de uma identidade corporativa forte foram 
fatores tão importantes quanto os resultados financeiros esperados após as 
operações. 
7 
 
 
 
2.3 Crescimento e Declínio Organizacional 
Segundo Fleck (2009), o sucesso da firma está atrelado à sua capacidade de 
criar e estimular capacitações que garantam a sua existência. Por outro lado, o 
declínio ocorre quando há o enfraquecimento ou a falta de habilidade de adaptar 
essas capacitações diante dos desafios do crescimento. 
Chandler (1977) destaca duas motivações principais para a expansão de uma 
organização: a defensiva e a produtiva. A primeira é um movimento de segurança, 
com o objetivo de limitar o potencial de entrada de novos competidores e de perda de 
participação no mercado. A segunda é mais positiva e visa a utilização mais intensiva 
e eficiente dos recursos disponíveis, gerando aumento de produção e ganhos de 
escala e escopo. 
Penrose (1980) complementa essa visão e propõe que mais do que as 
oportunidades oferecidas pelo ambiente, os recursos internos de uma organização 
fornecem o principal impulso para direcionar os esforços para o crescimento. Vale 
destacar que, segundo a autora, uma organização não consegue atingir uma posição 
de equilíbrio que não gere incentivos para o crescimento devido a três motivos 
principais: a indivisibilidade dos recursos, o uso especializado dos recursos e a 
heterogeneidade dos recursos. 
Fleck (2003) corroborou as visões de Chandler e Penrose e apresentou o 
motor do crescimento (figura 2.1) contínuo o qual é constituído de três blocos 
principais: desequilíbrio – algum tipo de desequilíbrio ocorrendo dentro ou ao redor da 
firma; expansão – algum tipo de expansão resultante da percepção de oportunidades 
de crescimento associadas ao desequilíbrio; e mecanismo de reforço – algum tipo de 
mudança produzido durante o processo de expansão, podendo intensificar o 
desequilíbrio. 
 
Figura 2-1 – Motor do Crescimento Contínuo 
 
Fleck (2003) 
8 
 
 
 
Dessa forma, os recursos são fundamentais tanto por permitir, quanto por 
direcionar o crescimento saudável das organizações. Entretanto, mesmo empresas 
que atuam em uma mesma indústria e detém recursos similares poderão não aplica-
los da mesma forma. 
March (1991) destaca a importância de se manter um equilíbrio dinâmico entre 
o esforço da empresa na exploração de novas competências centrais e o 
aperfeiçoamento das competências centrais já estabelecidas dentro da empresa. 
Dessa forma, o autor afirma que a exploração de novas alternativas (exploration) 
normalmente implica em retornos incertos. Por outro lado, o desenvolvimento das 
competências existentes (exploitation) normalmente resulta em retornos rápidos que 
reforçam o desempenho da organização no curto prazo, trazendo ainda menos 
incerteza em comparação à experimentação de novas iniciativas. 
Outra questão que envolve o crescimento está relacionada à estrutura 
organizacional. Chandler (1962) concluiu a partir de seus estudos sobre o crescimento 
de grandes corporações norte-americanas que na medida em que as empresas 
crescem, a estrutura organizacional tende a migrar para um modelo multifuncional 
dividido em departamentos especializados. O autor ainda destaca que o crescimento 
da firma envolve, inicialmente, a concepção de uma estratégia que, por sua vez, exige 
a adaptação da estrutura organizacional para uma forma mais adequada para o 
gerenciamento dos recursos da empresa. Dessa forma, o autor afirma que o 
crescimento sem os ajustes necessários na estrutura leva somente à ineficiência 
econômica. A adaptação da estrutura apresentada por Chandler é, portanto, o primeiro 
grande desafio decorrente do processo de crescimento. 
Greiner (1998) oferece uma visão complementar à de Chandler e discute que o 
processo de crescimento das empresas apresenta períodos de evolução e revolução. 
O primeiro se caracteriza por uma fase tranquila de crescimento, enquanto o segundo 
envolve crise. Assim, na visão do autor, a adaptação da estrutura não é apenas um 
processo reativo à estratégia, mas um gatilho que direciona novas estratégias e, por 
consequência, o processo de crescimento. 
De forma geral, o crescimento organizacional se tornou uma suposição 
implícita nos estudos organizacionais, uma vez que empresas grandes passaram a ser 
vistas como eficientes, além de haver um aspecto cultural relacionado ao “quanto 
maior, melhor” e pela correlação entre a longevidade e o tamanho das organizações 
(WHETTEN, 1980). De acordo com Penrose (1980), as grandes firmas detém uma 
série de vantagens competitivas em relação às pequenas empresas. Entre elas é 
possível destacar o acesso a montantes maiores de crédito com juros mais baixos, 
que aumentam o leque de oportunidades para a expansão. 
9 
 
 
 
Por outro lado, as ideias de autoperpetuação de uma organização também são 
confrontadas com as teorias que propõem que as empresas naturalmente passam por 
um processo de declínio, uma vez que grandes organizações se tornam muito 
complexas, rígidas, ineficientes e impessoais para se administrar (WHETTEN, 1987). 
Whetten (1980) apontou duas formas de declínio. O primeiro é o declínio pela 
estagnação relacionado a empresas com gestão ineficiente que sofrem com perda de 
participação no mercado. O segundo é o declínio pelo encolhimento quando todo o 
mercado é reduzido. 
Sull (1999) afirma que o maior problema das organizações quando enfrentam 
desafios e mudanças no ambiente é a inércia ativa. Segundo o autor, depois de 
encontrarem as fórmulas do sucesso, os gestores direcionam os seus esforços para 
melhorar e estender o seu sistema vencedor. Isto faz com que eles parem de analisar 
outras questões importantes e encontrar alternativas e soluções mais adequadas para 
os novos desafios organizacionais. Dessa forma, sem as capacitações necessárias 
para atuar diante de competidores armados com novos produtos e tecnologias, essas 
empresas veem suas receitas e lucros declinarem. Sull ainda discute que quando as 
condições do ambiente mudam, as empresas de maior sucesso são geralmente as 
mais lentas a se adaptar. 
Por isso, Chandler (1962) propõe que os desafios de uma grande empresa 
exigem do gestor a capacidade de equilibrar os objetivos de longo prazo com uma 
operação rotineira eficiente. Segundo o autor, isto leva a uma mudança no papel dos 
gestores que evolui da execução de atividades operacionaispara o planejamento, 
coordenação e alocação de recursos. Este delicado desafio torna-se mais complexo 
de acordo com o porte da organização, uma vez que esta se torna mais suscetível à 
existência de conflitos políticos por recursos e poder. 
 
2.4 Arquétipos de Sucesso e Fracasso Organizacional 
Para Fleck (2003), a teoria do crescimento das organizações deveria buscar 
sistematicamente identificar e se basear nas condições necessárias, porém, 
insuficientes em detrimento das relações causais. Para a autora, embora tenham 
menor poder de realizar previsões se comparadas às relações causais, as relações de 
condições necessárias descrevem e explicam mais adequadamente os complexos 
processos associados ao crescimento da empresa. A melhor compreensão dos 
processos de crescimento permite um melhor gerenciamento do mesmo. 
Assim, o presente tópico apresenta o modelo de arquétipos utilizado como eixo 
central deste estudo e que busca identificar a propensão das empresas à 
10 
 
 
 
autoperpetuação ou à autodestruição. Entretanto, destaca-se que a organização não 
está necessariamente localizada em um polo ou outro e sim em algum ponto entre 
eles. A tabela 2.1 apresenta um resumo dos cinco desafios que compõem o modelo. 
 
Tabela 2-1 - Cinco Desafios do Crescimento 
Desafio Descrição Autodestruição Autoperpetuação 
Empreendedorismo 
Promoção de contínuo 
empreendedorismo a 
partir da disposição da 
empresa de realizar 
expansões com 
mecanismos de reforço 
e criação de valor sem 
expô-los a riscos 
desnecessários 
Baixo 
Baixos níveis de 
ambição, versatilidade, 
imaginação, visão, 
capacidade de levantar 
recursos financeiros e 
realização de expansões 
nulas ou defensivas 
Alto 
Altos níveis de 
ambição, versatilidade, 
imaginação, visão, 
capacidade de levantar 
recursos financeiros e 
realização de 
expansões produtivas 
ou híbridas 
Navegação no 
Ambiente 
Tratar com múltiplas 
partes interessadas para 
assegurar captura de 
valor e legitimidade 
Passivo 
Monitoramento ruim, mau 
uso de estratégias de 
navegação 
Ativo 
Monitoramento regular, 
uso correto de 
estratégias de 
navegação 
Gestão da 
Diversidade 
Manter integridade da 
firma diante do aumento 
de conflitos e rivalidades 
Fragmentação 
Fracasso no 
estabelecimento de 
relacionamentos de 
integração e de 
capacitações em 
coordenação 
Integração 
Estabelecimento bem 
sucedido de 
relacionamentos de 
integração e 
capacitações em 
coordenação 
Gestão de Recursos 
Humanos 
Prover a firma com 
recursos humanos 
qualificados de forma 
estável 
Tardia 
Ações no momento que 
existe necessidade ou 
depois dela 
Planejado 
Ações planejadas com 
antecedência 
Gestão da 
Complexidade 
Gerenciar problemas 
complexos e solucioná-
los diante de aumento 
de complexidade 
Ad hoc 
Baixa capacitação para 
solução de problemas, 
utilizando rápida análise e 
sem aprendizado 
Sistemático 
Capacitação para 
solução de problemas 
promovendo a busca 
correta por soluções e 
aprendizado 
Fonte: Adaptado de Fleck (2009) 
11 
 
 
 
2.4.1 Desafio do Empreendedorismo 
Penrose (1980) afirma que a busca por novas oportunidades de negócios que 
propiciem o crescimento exigem uma postura empreendedora dos gestores e uma 
propensão para assumir novos riscos e gerar inovação. Dessa forma, propõe quatro 
dimensões que compõem os serviços empreendedores: ambição, versatilidade, 
capacidade para levantar recursos e julgamento. 
 
a) Ambição 
Está relacionada com a recorrente insatisfação com o status quo e, portanto, é 
a mola propulsora para o crescimento. Penrose (1980) classifica a ambição 
empreendedora em dois tipos: product-minded e empirebuilder. 
Os primeiros são empreendedores que orientam o crescimento organizacional 
através da melhoria da qualidade de seus produtos, mediante redução de custos, 
desenvolvimento de novas tecnologias, ampliação de mercados através da introdução 
de novos serviços para os clientes, ou pela introdução de novos produtos nos quais a 
firma tenha vantagens de produção ou distribuição. Esses empreendedores, portanto, 
buscam obter lucros através da melhoria e ampliação das atividades da organização. 
Para Penrose, contudo, existe outro grupo de empreendedores que é motivado 
por uma visão de formar uma grande e poderosa organização, se preocupando em 
obter lucros através da ampliação do escopo da organização. O empreendedor neste 
caso pode manter uma posição dominante em um ou mais mercados, ou, então, 
ampliar os seus negócios em quaisquer oportunidades que se mostrarem lucrativas. 
 
b) Versatilidade 
De acordo com Penrose (1980), a versatilidade empreendedora está 
relacionada com a capacidade de imaginação e visão de novas oportunidades que têm 
o potencial de impulsionar o crescimento da firma. Para isso, não podem ser 
impraticáveis e nem míopes. A autora ainda completa que um empreendedor que se 
mantém em sua zona de conforto, pode não ter as condições necessárias para 
considerar possibilidades mais amplas em relação à sua própria área de atuação. 
Dessa forma, a versatilidade está diretamente relacionada com a criação de 
valor. Segundo Lepak et al. (2007), a criação de valor é a diferença entre o valor do 
uso e o valor monetário de um bem. No nível organizacional, a criação de valor se dá 
a partir de inovação, com a introdução de novos produtos, serviços, métodos e 
tecnologias. 
12 
 
 
 
Penrose (1980) ainda propõe que expansões que envolvem a incursão em 
novos mercados exigem versatilidade para identificar o timing correto de entrada e 
uma capacidade de imaginação sobre o comportamento do ambiente. 
 
c) Capacidade de Levantar Recursos 
Segundo Penrose (1980), apesar de as pequenas firmas terem maior 
dificuldade de conseguir recursos financeiros em relação às grandes, algumas 
apresentam maior facilidade em levantar o capital necessário para o seu crescimento. 
Essa capacidade está relacionada a uma habilidade empreendedora específica capaz 
de gerar confiança e garantir os recursos para manter o nível de investimento exigido 
para o estabelecimento e crescimento da organização. 
 
d) Julgamento 
Penrose (1980) destaca que ao contrário das capacidades citadas 
anteriormente, o julgamento está apenas em parte relacionado às características do 
indivíduo. Para a autora, o problema do julgamento empreendedor envolve mais do 
que uma capacidade de imaginação, bom senso, autoconfiança e outras qualidades 
pessoais. Está, na verdade, intimamente relacionado com a coleta e a consulta de 
informações para avaliação dos riscos e das incertezas do ambiente, em face da 
expectativa de crescimento da organização, buscando evitar a superexposição ao 
risco. 
 
2.4.2 Desafio da Navegação no Ambiente 
A navegação em um ambiente dinâmico está relacionada à capacidade de 
lidar, com sucesso, com os diversos stakeholders de uma organização com o objetivo 
de se garantir a captura de valor e a legitimidade organizacional. Dessa forma, 
enquanto o empreendedorismo está relacionado com a criação de valor, a navegação 
no ambiente, busca a captura de valor (FLECK, 2009). 
Para Lepak et al. (2007), a criação de valor não garante necessariamente a 
captura de valor. Isto ocorre, principalmente, devido à força dos competidores. Sendo 
assim, os autores afirmam que é possível apontar dois conceitos chave através dos 
quais se busca determinar qual parte consegue capturar o valor que é criado: 
competição e mecanismos de isolamento. A competição demonstra como o valor 
criado pode ser compartilhado com outros participantes do mercado, não ficando 
limitado com aquele que o crie. Já os mecanismos de isolamento, atuam como forma 
de limitar a perda deste potencial valor. Isso pode ocorrer através de qualquer barreira 
13 
 
 
 
intelectual, física ou legal que restrinja a capacidade dos competidores de replicar o 
valor criado. 
Ascondições de captura de valor podem, portanto, variar entre as indústrias. 
Chandler (1990), por exemplo, apresenta a lógica do first mover em indústrias 
intensivas em capital nas quais as pioneiras em investir em produção e distribuição, 
conseguindo obter economias de escopo e escala, se tornam as empresas líderes em 
seus setores. 
Segundo Barney (1986), as empresas que buscam altos retornos dos seus 
investimentos estratégicos devem se esforçar para criar ou modificar as características 
estruturais da indústria para favorecer os seus altos retornos. Nesse sentido, Porter 
(1979) aponta para a importância em se pensar na estratégia da empresa 
considerando o ambiente competitivo de toda a indústria, que englobam fornecedores, 
compradores, concorrentes diretos, produtos substitutos e novos entrantes da 
indústria, o qual pode ser caracterizado como o ambiente organizacional. 
Barney (1991) propõe que as firmas devem desenvolver vantagens 
competitivas sustentáveis desenvolvendo e implementando estratégias que exploram 
as suas forças através das oportunidades do ambiente, enquanto neutralizam as 
ameaças externas e minimizam as suas fraquezas. O autor destaca que para uma 
vantagem competitiva ser sustentável, os recursos utilizados pela empresa devem ser 
valiosos, raros, insubstituíveis e impossíveis de serem imitados perfeitamente. 
Vale destacar que a empresa não sofre pressões apenas dos atuantes diretos 
do mercado em que atuam, mas de todo o ambiente institucional que engloba 
questões políticas e sociais. Dessa maneira, para manter a legitimidade no ambiente, 
as organizações não devem se manter passivas às circunstâncias a que são 
submetidas. Pelo contrário, a empresa deve buscar responder às pressões externas 
de forma participativa, concebendo estratégias que tragam maior equilíbrio com os 
interesses da empresa (OLIVER, 1991). 
 
2.4.3 Desafio da Gestão da Diversidade 
A heterogeneidade entre as diferentes partes de uma organização fomentam a 
formação de rivalidade e conflitos, ameaçando a integridade organizacional. Dessa 
forma, a gestão da diversidade envolve a sustentação da integridade organizacional 
em face do crescimento da diversidade de negócios, produtos, pessoas e tecnologias. 
Vale destacar que o uso de mecanismos de coordenação não extingue a 
heterogeneidade da organização. Pelo contrário, propicia a manipulação construtiva 
desses elementos estimulando a integridade organizacional (FLECK, 2009). 
14 
 
 
 
Selznick (1957) alerta que a rivalidade organizacional pode ser um dos 
principais desafios enfrentados por uma empresa. Na visão do autor a disputa de egos 
pode ir de encontro aos objetivos do grupo e trazer uma poderosa força que 
compromete a integridade do grupo. Mintzberg (1985) descreve essas arenas políticas 
e afirmar que podem repercutir em conflitos duradouros ou passageiros que, de 
acordo com a sua intensidade, têm o potencial de reforçar o processo de declínio 
organizacional, uma vez que a união dos esforços em busca de um propósito único 
torna-se praticamente impossível de se atingir. Por outro lado, Mintzberg destaca que 
essas forças opostas são naturais e, também, importantes para as organizações. 
Portanto, os gestores não tem opção senão abrigar as forças divergentes utilizá-las 
com o intuito de transformá-las em funcionais no cumprimento dos objetivos. 
O líder, portanto, tem um papel fundamental na proteção da integridade 
organizacional. Selznick (1957) afirma a liderança deve ter a capacidade de realizar a 
infusão de valores, objetivos e práticas na organização para que se tornem 
institucionalizados e tragam um caráter para a organização. Esses compromissos não 
podem ser feitos verbalmente, nem conscientemente. Eles são construídos dentro da 
estrutura social da organização. O autor ainda preconiza que a institucionalização de 
uma empresa é um processo formado pela sua história, as pessoas que fazem de sua 
estrutura e o modo no qual ela se adapta ao ambiente. 
Conforme já discutido anteriormente, as empresas diversificadas enfrentam 
uma forte tendência de fragmentação devido à diversidade dos negócios, pessoas e 
tecnologias. Portanto, o desafio para a coordenação e integração se fazem ainda mais 
presentes na gestão dessas organizações. 
 
2.4.4 Desafio da Gestão de Recursos Humanos 
Para Penrose (1980), a principal restrição ao crescimento da empresa está 
relacionada à limitação do seu corpo gerencial. A autora aponta que a expansão no 
quadro de gestores através do recrutamento de pessoas externas não soluciona a 
carência de serviços gerenciais necessários ao crescimento. Isso ocorre porque esses 
serviços também decorrem da experiência construída ao longo do tempo pela equipe. 
Dessa forma, a formação, retenção e renovação de recursos humanos são 
condições necessárias para o crescimento contínuo das empresas. Se uma 
organização expande mais rapidamente do que a capacidade dos indivíduos de obter 
conhecimento e a experiência necessária para uma operação eficiente, o crescimento 
não será completo, podendo resultar, ainda, em estagnação (PENROSE, 1980). 
15 
 
 
 
Esse desafio, portanto, lida com a capacidade de antecipar necessidades e 
equipar a organização com recursos humanos qualificados de forma consistente. A 
dificuldade em prover a firma de profissionais capacitados no tempo adequado pode 
não só impedir o crescimento como também enfraquecer a integridade organizacional, 
como nos casos de recrutamento em massa de serviços gerenciais (FLECK, 2009). 
 
2.4.5 Desafio da Gestão da Complexidade 
Segundo Fleck (2009), quanto maior uma organização, mais complexa ela 
tende a se tornar. Sendo assim, de acordo com a autora, o desafio da gestão da 
complexidade lida com o gerenciamento de questões complexas e a resolução de 
problemas que envolvem uma grande quantidade de variáveis com o intuito de evitar 
que a existência da organização seja colocada em risco em decorrência de avaliações 
insatisfatórias da situação. A solução de problemas complexos requer processos 
sistemáticos de coleta de dados, análise, tomada de decisão e implementação. Esse 
desafio, portanto, afeta a qualidade das respostas dos demais desafios. 
Segundo a autora, é possível classificar as respostas organizacionais a esse 
desafio como sistemáticas ou ad hoc. Lidar com problemas de forma sistemática 
envolve a busca contínua por soluções e o aprendizado organizacional. Soluções ad 
hoc, por sua vez, favorecem buscas rápidas por soluções, gerando práticas de “apagar 
incêndio” e inibindo o aprendizado. 
 
2.4.6 Desafio da Folga Organizacional 
De acordo com Penrose (1980), a expansão exige que a empresa tenha 
recursos suficientes para cobrir os serviços distintos que irão surgir com o movimento 
de crescimento. Assim, para não fracassar, a organização deve garantir que os 
recursos sejam suficientes para sustentar o nível de investimento necessário para 
sobrepor as inovações e expansões dos concorrentes. 
Fleck (2009) propõe que a capacidade de auto renovação da organização é 
originada da folga da folga de recursos, isto é, de recursos gerados pelo processo de 
expansão. Essa folga pode ser gerada a partir de todos os tipos de recursos que 
excedam a necessidade operacional da organização em determinado nível de 
desempenho. Esses recursos incluem, portanto: pessoas, equipamentos, capital, 
reputação, etc. Segundo a autora, enquanto a expansão gerar folga, o crescimento 
continua a estimular mais crescimento, fomentando a expansão relacionada que 
aumenta a eficiência operacional. 
16 
 
 
 
Dessa maneira, a folga gera não só o impulso necessário para os movimentos 
de expansão, como também atua como um pulmão de recursos, oferecendo 
segurança para a empresa diante da imprevisibilidade do ambiente. 
 
2.4.7 Interação Entre os Desafios 
Esses desafios estão interconectados entre si e operam como engrenagens,movimentando a empresa no sentido da autoperpetuação ou da autodestruição. A 
figura 2-2 apresenta essas inter-relações na forma de condições necessárias à 
condução da empresa ao sucesso de longo prazo. As respostas aos desafios do 
empreendedorismo e da navegação determinarão a capacidade da empresa de 
crescer e se renovar. Os desafios da diversidade e da gestão de recursos humanos 
estão relacionados com a manutenção da integridade organizacional. A folga de 
recursos contribui para o crescimento, como também para a integridade através dos 
mecanismos de integração e coordenação. O desafio da complexidade, por sua vez, 
influencia os demais. 
 
 
17 
 
 
 
Figura 2-2 - Modelo dos Requisitos para o Desenvolvimento de Propensão à Autoperpetuação 
 
18 
 
 
 
3 MÉTODO DE PESQUISA 
Segundo Fleck (2013), o processo de pesquisa é formado por quatro pilares: 
pergunta de pesquisa, referencial teórico, objeto de pesquisa e método. Assim, o 
primeiro passo para a elaboração deste trabalho foi a escolha do objeto a ser 
pesquisado. Em seguida, definiu-se a pergunta da pesquisa que levou ao arcabouço 
teórico e ao método utilizado para o desenvolvimento do estudo. Os tópicos a seguir 
apresentam o processo metodológico utilizado no trabalho. 
 
3.1 Definição do Tema e dos Objetos de Estudo 
A motivação pelo tema foi despertada durante o Mestrado, especificamente na 
disciplina de Crescimento e Estratégia da Firma, quando o autor foi apresentado às 
teorias de crescimento e declínio das organizações, além de estudos de caso 
relacionados ao tema. Durante o curso, foi despertada no pesquisador uma 
curiosidade sobre o porquê algumas empresas declinam e morrem, enquanto que 
outras conseguem crescer e se manter perenes. 
Ao longo dos últimos anos, o Coppead vem concebendo a realização de 
diversos estudos sobre empresas brasileiras com o intuito de compreender esta 
questão. Assim, foram feitas pesquisas sobre empresas longevas como Gerdau, 
Klabin, Lojas Americanas, WEG, Souza Cruz, Marcopolo, Embraer, entre outras. 
Dissertações foram desenvolvidas, ainda, incluindo empresas que fracassaram. Entre 
elas, pode-se destacar a Mesbla, a Varig e a Engesa. 
Dessa forma, o interesse do pesquisador foi em contribuir para esse campo de 
pesquisa e estudar duas empresas longevas que exibissem certas similaridades, mas 
que tivessem apresentados destinos diferentes. Portanto, buscou-se escolher uma 
empresa que tenha declinado e fracassado e outra ainda ativa, para que fosse 
possível compreender como as respostas de cada uma das organizações, dentro de 
um contexto semelhante, podem ter contribuído para esses caminhos distintos. 
 Sendo assim, foi realizada uma pesquisa prévia para elencar potenciais 
objetos de estudo. De acordo com Bethlem (1999), há uma grande carência sobre 
dados econômicos e empresariais no Brasil, o que gera dificuldade no 
desenvolvimento de estudos de qualidade. Por isso, havia uma preocupação de 
encontrar indústrias e empresas que poderiam oferecer informações em quantidade e 
qualidade o suficiente para o desenvolvimento da pesquisa. 
Inicialmente, o setor têxtil foi identificado como uma possibilidade de estudo por 
reunir algumas das empresas brasileiras mais longevas: Cedro e Cachoeira (1872), 
19 
 
 
 
Hering (1880), Karsten (1882) e Santanense (1891). Ao aprofundar o estudo sobre 
essa indústria, no entanto, surgiram informações sobre os grupos Matarazzo e 
Votorantim, que estiveram entre os principais produtores têxteis no início do século XX 
e, nas décadas seguintes, se diversificaram e se transformaram em dois dos maiores 
grupos industriais do Brasil. 
Apesar da longevidade e importância desses dois grupos, uma pesquisa inicial 
mostrou que ainda assim se tratavam de empresas pouco estudadas de forma 
longitudinal. Isso contribuiu para que o pesquisador considerasse a escolha preliminar 
dessas organizações como objetos de estudo. Nesse caso, o trabalho poderia trazer 
também uma nova contribuição à linha de pesquisa proposta por Fleck (2009) ao 
apresentar uma análise de empresas diversificadas brasileiras. 
Para que fosse possível prosseguir o estudo era importante responder duas 
questões. Primeiro, buscou-se verificar se eram empresas de certa forma 
comparáveis. Em segundo, por serem empresas familiares e de capital fechado, havia 
um receio quanto à disponibilidade de informações, principalmente em relação à 
Matarazzo, pois havia se completado trinta anos desde o pedido de concordata do 
grupo. 
 Apesar disso, foi possível encontrar livros e reportagens sobre ambas as 
organizações. Verificou-se, ainda, que apesar de ser uma empresa de capital fechado, 
a Votorantim vinha divulgando os seus relatórios anuais há algumas décadas. Por 
isso, julgou-se que seria plausível coletar e organizar informações que permitissem 
uma análise robusta. Além disso, foi possível constatar que diferentemente do que se 
imaginava, as organizações foram de certa maneira contemporâneas. Apesar de a 
data de fundação da Votorantim ser oficialmente em 1918, constatou-se que antes 
disso já havia unidades industriais importantes na composição do grupo, além do 
desenvolvimento de traços organizacionais que tiveram um papel crucial na trajetória 
de crescimento da organização. A tabela 3-1 apresenta o ano de acontecimentos 
decisivos na história dos grupos. 
Assim, é possível verificar que a formação e o desenvolvimento das 
organizações Matarazzo e Votorantim ocorreram em períodos muito próximos e que, 
dessa maneira, ambas vivenciaram momentos históricos do país, como o processo de 
industrialização nacional. Portanto, julgou-se que seria pertinente compreender como 
as duas organizações responderam aos desafios do crescimento. 
 
 
20 
 
 
 
Tabela 3-1 - Comparativo Cronológico Entre Matarazzo e Votorantim 
Marco Matarazzo Votorantim 
Dif. 
(anos) 
Nascimento do fundador 1854 1874 20 
Chegada ao Brasil 1881 1884 3 
Abertura do primeiro negócio 1882 1892 10 
Migração para a indústria 1900
1
 1905
3
 5 
Formalização do grupo principal 1911
2
 1918
4
 7 
1 
Fundação da Moinho Matarazzo 
2
 Fundação das Indústrias Reunidas Fábricas Matarazzo 
3 
Fundação da Fábrica de Óleos Santa Helena 
4 
Aquisição da fábrica têxtil Votorantim 
 
A partir da escolha dos objetos de estudo, estabeleceu-se para a pesquisa a 
seguinte questão: Como dois dos principais grupos industriais brasileiros 
responderam aos desafios do crescimento? 
 
Para responder a essa pergunta, utilizou o arcabouço teórico de Fleck (2009), 
já discutido anteriormente. 
 
3.2 Estratégia de Pesquisa 
A presente pesquisa compreende o estudo de caso de duas organizações 
industriais brasileiras. De acordo com Yin (2001), a investigação de estudo de caso 
baseia-se em várias fontes de evidências, beneficiando-se do desenvolvimento prévio 
de proposições teóricas para conduzir a coleta e a análise de dados. Segundo o autor, 
o método é apropriado para casos onde a questão da pesquisa é do tipo “como e 
porque”. Vale destacar que a utilização de mais casos acrescenta robustez ao estudo. 
Para isso, utilizou-se uma abordagem qualitativa na qual o pesquisador deve 
fazer observações e, sempre que possível, coletar evidências sobre os objetos de 
estudo (MARTINS, 2010). 
A abordagem longitudinal de análise deu-se a partir da decomposição histórica 
das organizações em eventos cronológicos. Assim, foram levantados e analisados 
eventos referentes aos diversos negócios de cada uma das corporações, desde os 
primeiros movimentos profissionais dos empreendedores até os dias atuais. Ao 
mesmo tempo, foi necessário levantar as informações do ambiente relevante, 
referente ao mesmo período, para que fosse possível contextualizar os movimentos de 
cada organização de acordo com as condições externas. 
 
21 
 
 
 
3.3 Coleta de Dados 
A busca de dados secundários foi iniciada através de sebos,onde se esperava 
encontrar livros e revistas sobre as empresas e a industrialização brasileira a preços 
acessíveis. Primeiramente, foi utilizado o sistema de buscas integrado Estante Virtual 
(http://www.estantevirtual.com.br) que oferece acesso a um grande acervo de títulos 
em estabelecimentos por todo o país. A partir dessa busca, identificou-se uma grande 
concentração de sebos na região da Praça da Sé em São Paulo. Dessa forma, foi 
realizada uma visita ao local onde foram encontrados novos títulos que poderiam 
contribuir com a pesquisa. Assim, foram adquiridos os seguintes livros que serviram 
como base para o levantamento de dados e organização das informações sobre as 
empresas e o ambiente: 
a) A Industrialização de São Paulo de Warren Dean; 
b) A Industrialização e o Desenvolvimento Econômico do Brasil de Werner Baer; 
c) A Economia Brasileira de Werner Baer; 
d) Matarazzo: Travessia e Colosso Brasileiro de Ronaldo Costa Couto; 
e) Matarazzo: 100 anos, livro comemorativo da empresa; 
f) Conde Matarazzo: O Empresário e a Empresa de José de Souza Martins; 
g) José Ermírio de Moraes: O Homem, a Obra de João de Scantimburgo; 
h) Votorantim 90 Anos: Uma História de Trabalho e Superação de Jorge Caldeira; 
 
Paralelamente a esta atividade, realizou-se buscas em bancos de dados 
acadêmicos. Foram identificadas três dissertações, artigos, além de uma tese de 
doutorado que complementaram as informações anteriores. 
Durante a pesquisa preliminar, verificou-se também que a Votorantim mantém 
um Centro de Memória no bairro de Jaguaré, em São Paulo. Assim, em outubro de 
2013 foi realizada uma visita ao local, onde foram levantados relatórios anuais, vídeos 
e outros documentos sobre a empresa. Mais uma visita seria realizada em janeiro de 
2014 para que todo o material considerado pertinente pudesse ser coletado. 
Outra importante fonte de informação foi o Acervo Digital mantido pelo jornal O 
Estado de São Paulo (http://acervo.estadao.com.br), reunindo edições digitalizadas 
desde 1880. Foi realizada uma grande varredura por todo o período para as duas 
empresas. 
A pesquisa do termo Matarazzo no acervo do Estadão gerou cerca de 45 mil 
registros, muitos deles relacionados a pessoas que não remetiam às atividades do 
grupo. Apesar do número alto, decidiu-se prosseguir com esse termo, pois aumentaria 
as chances de encontrar informações sobre qualquer empresa do grupo ou sobre os 
Condes Francesco e Chiquinho. No acervo, foram encontrados relatórios anuais da 
22 
 
 
 
Matarazzo entre 1942 e 1983 que permitiram o desenvolvimento da curva de 
crescimento do grupo para este período. Além disso, foram identificadas reportagens 
sobre o grupo, embora grande parte do material, principalmente do começo do século 
XX, fosse referente a propaganda. 
O termo Votorantim gerou bem menos registros, cerca de doze mil. Alguns 
deles, no entanto, remetiam à cidade paulista homônima. Foram encontradas 
reportagens sobre a organização, entrevistas com os líderes do grupo, além de alguns 
relatórios anuais que complementaram aqueles já coletados no Centro de Memória. 
Assim, foi possível traçar a curva de crescimento entre 1952 e 2013. 
Finalmente, buscou-se realizar entrevistas com funcionários e ex-funcionários 
das organizações com o intuito de coletar informações não encontradas nas fontes 
secundárias, além de esclarecer e detalhar questões críticas identificadas ao longo da 
pesquisa. O critério para a escolha dos entrevistados foi a disponibilidade, uma vez 
que esperava-se uma dificuldade em conseguir contatos principalmente da Matarazzo, 
já que as principais empresas do grupo decretaram falência ainda na década de 1980. 
No caso desta empresa, foram feitas pesquisas na internet, principalmente 
através das mídias sociais para a identificação de antigos trabalhadores. Foram 
realizados diversos contatos, mas houve apenas um retorno que acabou gerando a 
única entrevista sobre a empresa. Essa dificuldade foi percebida não só na busca por 
possível entrevistados, mas pelo possível receio das pessoas contatadas em falar 
sobre o assunto. Uma reportagem do Estadão na ocasião do lançamento da biografia 
do Conde Francesco Matarazzo, escrita por Ronaldo Costa Couto, já destacava a 
dificuldade em obter informações sobre o grupo Matarazzo: 
 
“Fides Honor Labor [...] Na antiga e última sede das Indústrias 
Reunidas Fábricas Matarazzo na Rua Joli, no Brás, uma placa de 
madeira envelhecida exibe o slogan em latim conhecido no passado e 
hoje ignorado dos paulistanos. Mas não perca seu tempo por lá: tudo 
o que ouvirá é um sonoro não dos funcionários que cuidam dos 
negócios da família e não permitam que o turista incauto conheça o 
interior do prédio dos famosos tijolos aparentes. [...] Não espere por 
informações sobre os Matarazzo. A metrópole, moderna e que só 
pensa no futuro, não tem tempo para relembrar o passado” (O 
ESTADÃO, 2004). 
 
O único depoente da pesquisa permaneceu por trinta e um anos no grupo e 
atuou diretamente com os membros da alta diretoria, tendo contribuído com 
informações valiosas para a pesquisa. Cabe uma ressalva, no entanto, ao fato de ter 
se passado quarenta anos entre sua saída da IRFM e a realização da entrevista. Esse 
considerável período acarreta em uma limitação à quantidade e qualidade das 
informações. Um fator atenuante em relação a isso se encontra no fato de o 
23 
 
 
 
entrevistado ter se utilizado de um acervo próprio de anotações e documentos da 
época em que trabalhou na IRFM, o que contribuiu para as suas lembranças e relatos. 
Portanto, a carência de fontes primárias trouxe uma limitação para o estudo da 
Matarazzo. Apesar disso, julgou-se que o amplo material secundário acessado, 
permitiu a obtenção de dados em quantidade e qualidade satisfatórias para o trabalho. 
As entrevistas da Votorantim foram conseguidas através de contatos pessoais 
que indicaram potenciais depoentes para a dissertação. Realizaram-se doze 
entrevistas que abrangeram os principais negócios do grupo. Como os entrevistados 
estavam alocados na região de São Paulo e Curitiba, parte das entrevistas foi feita 
através de Skype. 
Ressalta-se também que onze dos entrevistados eram funcionários da 
Votorantim no momento da entrevista. Foi constatada ao longo dos depoimentos uma 
grande satisfação e orgulho dos depoentes em trabalhar no grupo. Dessa forma, é 
possível que isso tenha gerado um filtro sobre o que foi relatado e como as 
informações foram transmitidas durante as entrevistas. Embora isso acarrete em uma 
limitação da pesquisa sobre a Votorantim, os relatos foram confrontados entre si e 
com outras informações secundárias para que se obtivesse uma visão dos fatos em si 
e não dos pontos de vista dos entrevistados. 
As entrevistas não seguiram um roteiro rígido, embora houvesse uma 
preparação prévia para cada contato com o intuito de se identificar questões chave 
que, de acordo com o perfil do entrevistado, poderiam ser abordadas. No início de 
cada entrevista, o autor fazia uma breve explanação sobre a pesquisa e depois se 
solicitava que o depoente relatasse sua trajetória no grupo, os cargos que percorreu e 
principais experiências. A partir daí, os pontos que se mostrassem interessantes e 
pertinentes ao estudo poderiam ser explorados com maiores detalhes. Ao final de 
cada contato, era solicitado que o entrevistado destacasse um ponto extremamente 
positivo que destacasse a sua empresa das demais e outro que, em sua opinião, 
poderia ter sido feito de maneira diferente. 
Todas as entrevistas foram transcritas na íntegra pelo autor, sendo que trechos 
identificados como importantes eram separados para posterior análise, conforme será 
descrito adiante. A tabela 3-2 apresenta a relação dos entrevistados. Para garantir a 
confidencialidade dos depoentes, não foram listados nomes e nem cargos. 
Além das entrevistas, foram utilizados relatos de funcionários e ex-funcionáriosdo grupo Votorantim que estão disponíveis na página na internet do Centro de 
Memória da empresa, na seção “Estórias que fazem histórias”. Essas entrevistas 
estão transcritas integralmente e forneceram informações valiosas para este estudo. A 
tabela 3-3 apresenta a relação das estórias que foram utilizadas no trabalho. 
24 
 
 
 
Tabela 3-2 – Relação dos Entrevistados 
# Empresa Período Área de Atuação Data Duração Meio 
1 Matarazzo 1943-1974 Alta Gerência 21/01/14 02:43:34 Pessoalmente 
2 
Votorantim 
Siderurgia 
2006-2014 Suprimentos 22/01/14 00:51:56 Pessoalmente 
3 
Votorantim 
Siderurgia 
2007-2014 
Engenharia de 
Manutenção 
08/03/14 00:36:06 Pessoalmente 
4 
Votorantim 
Cimentos 
1977-2014 Expansão 10/03/14 00:57:20 Skype 
5 
Votorantim 
Cimentos 
2003-2014 
Engenharia de 
Produção 
10/03/14 00:22:58 Skype 
6 
Votorantim 
Cimentos 
1979-2014 
Pesquisa e 
Desenvolvimento 
11/03/14 00:54:00 Pessoalmente 
7 
Votorantim 
Metais (CBA) 
1982-1990 
Engenharia de 
Manutenção 
12/03/14 01:03:31 Skype 
8 
Votorantim 
Cimentos 
1993-2014 
Engenharia de 
Mineração 
15/03/14 01:07:17 Skype 
9 
Votorantim 
Metais (CBA) 
2012-2014 
Inteligência de 
Mercado 
01/04/14 00:30:00 Skype 
10 
Votorantim 
Cimentos 
1973-2014 Alta Gerência 02/04/14 00:53:00 Skype 
11 
Votorantim – 
Fibria 
2003-2014 Controladoria 07/04/14 00:46:01 Pessoalmente 
12 
Votorantim – 
Fibria 
2000-2014 
Governança e 
Risco 
08/04/14 00:42:30 Pessoalmente 
13 
Votorantim 
Cimentos 
2010-2014 
Riscos 
Estratégicos 
08/04/14 00:51:42 Pessoalmente 
 
Tabela 3-3 – Relação dos relatos obtidos no Centro de Memória Votorantim 
Nome Principal Ocupação 
Entrada no 
Grupo 
Data da 
entrevista 
Anker Hoffman Chefe do Dep. de Eletricidade 1945 2004 
Carlos Conforte Analista Financeiro – Vpar 1981 2003 
David Canassa Gerente de Sustentabilidade 1992 2005 
Henrique Silveira Diretor Grupo Votorantim Nordeste 1962 2003 
João Bosco Silva Presidente Votorantim Metais 2002 2007 
Nelson Teixeira Diretor da CBA 1942 2003 
Nildo Benedetti Diretor Técnico 1967 2003 
Sérgio Picazio Assessor de diretoria 1955 2003 
Valdemar Martinez Assessor de diretoria 1957 2003 
Walter Schalka Presidente Votorantim Cimentos 2005 2006 
25 
 
 
 
3.4 Processamento e Análise dos Dados 
Os dados coletados que eram considerados relevantes foram compilados em 
uma planilha Excel a qual se denominou Tabela de Fatos e Dados, cujo modelo é 
apresentado no Anexo 1. Foram lançadas ao todo 1.341 linhas referentes aos 
principais fatos e eventos sobre as organizações e o ambiente, sendo 630 
relacionados à Votorantim e 521 sobre a Matarazzo. 
Para organizar as informações de forma que elas fizessem sentido e 
auxiliassem o entendimento longitudinal dos objetos de estudo foram utilizadas as 
seguintes estratégias propostas por Langley (1999): 
 
a) Narrativa: As informações coletadas foram compiladas com o intuito de gerar uma 
história detalhada sobre o objeto de estudo que neste caso incluíam não só as 
organizações, como também, o ambiente em que estavam inseridas. Dessa forma, 
seria possível obter uma compreensão longitudinal e evitar que ocorresse um 
reducionismo durante a análise. Como se tratam de organizações diversificadas 
que atuam em diversos setores e em grande parte do país optou-se por descrever 
o desenvolvimento econômico e industrial do Brasil como o ambiente relevante. A 
narrativa do ambiente constitui-se como uma etapa fundamental do trabalho, pois 
gera uma contextualização histórica, permitindo compreender como as forças do 
ambiente afetaram o desempenho das organizações e como estas reagiram a 
essas pressões. 
 
b) Mapeamento visual das ideias: A manipulação de palavras e números em formas 
gráficas permite oferecer uma grande quantidade de informações em um espaço 
relativamente pequeno, auxiliando na compreensão do todo. Sendo assim, como a 
pesquisa envolvia dois grandes grupos industriais com muitos anos de atuação, 
foram elaborados mapas com o propósito de ilustrar os movimentos mais 
relevantes dos principais negócios das empresas. Os mapas visuais da Matarazzo 
e da Votorantim são apresentados no Anexo 2 e no Anexo 3, respectivamente. 
 
Além disso, buscou-se um parâmetro para avaliar a trajetória de crescimento 
das organizações. Para isso, foram utilizados os indicadores propostos por Fleck 
(2009) e apresentados a seguir, que indicam o tamanho e o desempenho de cada 
empresa em relação à economia relevante. Como se tratam de empresas 
diversificadas com atuação principalmente em território nacional, utilizou-se o Produto 
Interno Bruto brasileiro como base. Os valores do PIB utilizados para o cálculo são 
apresentados no Anexo 7. 
26 
 
 
 
Cabe destacar que o cálculo desses indicadores ficou restrito aos anos em que 
foi possível ter acesso aos balanços financeiros de cada organização. 
 
𝑇𝑎𝑚𝑎𝑛ℎ𝑜 𝑎𝑛𝑜 𝑖 = 
𝑅𝑒𝑐𝑒𝑖𝑡𝑎 𝐵𝑟𝑢𝑡𝑎 𝑎𝑛𝑜 𝑖
𝑃𝐼𝐵 𝐵𝑟𝑎𝑠𝑖𝑙 𝑎𝑛𝑜 𝑖
 x 100 
 
𝐷𝑒𝑠𝑒𝑚𝑝𝑒𝑛ℎ𝑜 𝑎𝑛𝑜 𝑖 = 
𝐿𝑢𝑐𝑟𝑜 𝐿í𝑞𝑢𝑖𝑑𝑜 𝑎𝑛𝑜 𝑖 
𝑃𝐼𝐵 𝐵𝑟𝑎𝑠𝑖𝑙 𝑎𝑛𝑜 𝑖
 x 100 
 
Com o material coletado e organizado partiu-se, então, para a análise das 
informações. Para isso adicionou-se novas colunas à Tabela de Fatos e Dados de 
acordo com o Referencial Teórico de Fleck (2009), seguindo as dimensões 
apresentadas na tabela 3-4. 
 
Tabela 3-4– Dimensões Utilizadas para a Análise 
Desafio Dimensão 
Empreendedorismo 
Ambição 
Versatilidade 
Recursos Financeiros 
Julgamento 
Navegação no Ambiente 
Legitimidade 
Captura de Valor 
Gestão da Diversidade 
Coordenação e Integração 
Compartilhamento de Recursos 
Diversificação 
Gestão de Recursos Humanos 
Antecipação da necessidade 
Formação 
Retenção 
Gestão da Complexidade Gestão da Complexidade 
Gestão da Folga 
Recursos Produtivos 
Recursos Humanos 
Recursos Financeiros 
 
Durante a análise, cada um dos fatos e eventos identificados foi reavaliado com 
o objetivo de descartar linhas que poderiam estar repetidas ou, então, que não eram 
relevantes para a análise. Os fatos que passavam por esse filtro eram classificados de 
acordo com o indicativo de propensão a uma resposta saudável ou não saudável. 
27 
 
 
 
Como não era possível graduar ou quantificar cada um desses fatos, utilizou-se uma 
classificação binária, indicando uma resposta positiva ou, então, negativa. Para isso, 
foram utilizados os sinais “+” e “-”. 
No processo de análise, realizou-se uma checagem dupla. Inicialmente, cada 
linha era lida de forma individual e classificada de acordo com cada uma das 
dimensões. O segundo passo consistia em isolar cada um dos dezesseis fatores de 
análise e verificar cada linha para classificar se aquele fato estava relacionado àquela 
dimensão ou não. Vale destacar que cada um poderia ser categorizado em mais de 
uma dimensão de análise. 
Após esse processo de categorização, cada dimensão era avaliada 
isoladamente com o objetivo de se identificar tendências de respostas da empresa que 
poderiam indicar se em cada uma delas havia uma propensão saudável, não saudável 
ou neutra para o sucesso de longo prazo da organização. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
28 
 
 
 
4 DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E INDUSTRIAL DO 
BRASIL 
O período que compreende o final do século XIX e o início do século XX foi 
marcado por mudanças políticas, sociais e econômicas que mudaram a história do 
Brasil e, principalmente, de São Paulo. No Estado, a população, impulsionada pela 
leva de imigrantes (foram cerca de 3,3 milhões em todo o Brasil entre 1870 a 1920), 
subiu de 837 mil pessoas em 1872 para quase quatro milhões no início da Primeira 
Guerra Mundial. A capital, que era uma pequena vila de apenas 23 mil habitantes em 
1872, atingiu 580 mil moradores em 1920. Indústrias se formaram e os paulistas 
tomaram do Rio de Janeiro o posto de principal centro econômico do país. Essa 
evoluçãoestá diretamente relacionada ao crescente mercado do café (DEAN, 1971, p. 
9; REISS, 1980, p. 23) 
Décadas após os primeiros cultivos realizados no Rio de Janeiro ainda no início 
do século XIX, os plantadores de café migraram para o lado paulista do Vale do 
Paraíba, até que essa penetração alcançou o oeste do Estado de São Paulo, onde 
seriam encontrados os solos mais adequados para os cafeeiros. Nos anos que se 
seguiram, o mercado de café se expandiu mais depressa e a região experimentou um 
desenvolvimento eufórico. Cabe citar que certas circunstâncias ajudaram a acelerar 
este crescimento. Primeiro, a praga que devastou os cafezais do Ceilão (atual Sri 
Lanka), o então maior rival de São Paulo no mercado internacional. Segundo, a 
abolição da escravatura (1888), que abriu caminho para uma mão de obra mais 
eficiente, incentivou a imigração europeia para a região e difundiu o uso do dinheiro 
pela massa da população. Terceiro, a Proclamação da República (1889) – a relação 
dos Presidentes da República é apresentada no Anexo 8 -, que gerou uma estrutura 
econômica e política mais descentralizada, possibilitando aos Estados estimular o 
comércio e reter os lucros dele gerados (DEAN, 1971, p. 9). Nessa nova divisão, à 
União caberiam os impostos da importação e os Estados recolheriam as taxações 
sobre a exportação (MARTINS, 1976, p. 71). 
O plantio paulista aumentou substancialmente nos últimos anos do século XIX, 
passando de 16% em 1881 para 40% da produção nacional na virada do século 
(COUTO1, 2004, p. 134). A tabela 4-1 apresenta a evolução da produção nacional do 
café em arrobas, no qual é possível verificar essa evolução. 
 
 
 
29 
 
 
 
Tabela 4-1 - Crescimento da Produção de Café e da População nas Zonas Cafeeiras 
Ano 
Produção de Café 
(em arrobas) 
População 
1836 590.066 231.517 
1854 3.534.2556 321.918 
1886 10.374.350 1.036.639 
1920 22.098.861 3.652.774 
Fonte: Martins, 1976, p.77 
 
Uma característica importante das fazendas de café também colaborou para 
criar esse ciclo de desenvolvimento. Como é menos autossuficiente que a fazenda 
canavieira, que também teve um ciclo econômico muito relevante para o país, ela 
exige a aquisição de bens e serviços, transferindo rendimentos para outros setores e 
induzindo o desenvolvimento econômico (COUTO1, 2004, p. 131). 
Nesse contexto, surgiu um grupo de novos consumidores que estimularam a 
atividade dos produtores e dos comerciantes, incentivando o consumo de bens e 
novos investimentos. Portanto, o comércio se fortaleceu e impulsionou o fluxo de 
importações, criando a oportunidade para o surgimento das primeiras fábricas. 
Vale destacar que o comércio do café custeou, também, o desenvolvimento de 
uma infraestrutura que mais tarde seria necessária para a evolução da indústria 
paulista. A partir dos dividendos das plantações, os próprios plantadores construíram 
as primeiras estradas de ferro. De acordo com Bardese (2011), a ferrovia teve um 
papel importante na orientação e organização dos conjuntos industriais, atraindo a 
ocupação dos terrenos aos seus arredores e contribuindo para o povoamento e 
valorização dessas regiões. Além disso, empresas europeias e norte americanas, 
atraídas pelo lucro das plantações, instalaram usinas elétricas nas cidades de São 
Paulo e Sorocaba. 
Ainda, o movimento das plantações induziu a vinda de técnicos e 
contramestres europeus que atuaram na superintendência das plantações e na 
construção das estradas de ferro, sendo mais tarde, absorvidos pelas fábricas (DEAN, 
1971, p. 14). Somente nos últimos vinte anos do século XIX, mais de novecentos mil 
imigrantes entraram em São Paulo, conforme é apresentado no gráfico 4-1. 
 
 
 
 
 
 
30 
 
 
 
Gráfico 4-1 - Movimento Migratório no Estado de São Paulo (1871 – 1900) 
 
Fonte: Martins, 1976, p. 76 
 
 
Além disso, iniciativas econômicas do primeiro governo da República 
fomentaram a criação de novos negócios. O ministro Rui Barbosa, com o intuito de 
aumentar a circulação de capital e estimular a economia do país, lançou mão da 
política de concessão de crédito que ficou conhecida como Encilhamento. Couto 
(20041, p. 216) afirma que essa política fomentou a circulação de capital e contribuiu 
para o desenvolvimento da indústria, embora também tenha gerado muita 
especulação financeira e índices de inflação elevados (COUTO1, 2004, p.216). Por 
outro lado, Reiss (1980, p.55) propõe que grande parte das empresas formalmente 
constituídas durante o período de encilhamento não eram de novos negócios, e sim de 
negócios já existentes que se reorganizaram para se lançarem no mercado de ações e 
vender os seus negócios a um preço alto. 
Dean (1971, p. 92 e 93) também destaca o papel dos impostos na criação de 
um ambiente favorável ao desenvolvimento industrial paulista. Para o historiador, os 
tributos aduaneiros, que representaram 70% da arrecadação do governo federal entre 
1900 e 1920, ajudaram a criar uma base protecionista para as fábricas nacionais, pois 
a alta carga tributária sobre as importações reduziam a competitividade dos produtos 
de fora. Por outro lado, os industriais não enfrentavam muitas dificuldades para 
conseguir adquirir máquinas importadas por um preço reduzido. 
Além disso, Dean afirma que como se beneficiou das taxas sobre a exportação 
do café, São Paulo, ao contrário dos demais Estados, não lançou mão de nenhum 
outro imposto estadual entre 1893 e 1904. Finalmente, a reformulação da Lei de 
Similares em 1911 proibiu a isenção de impostos para os produtos que poderiam 
0
50.000
100.000
150.000
200.000
250.000
300.000
350.000
400.000
450.000
1871-75 1876-80 1881-85 1886-90 1891-95 1896-00
31 
 
 
 
competir com itens fabricados no Brasil, trazendo ainda mais proteção para os 
produtos nacionais. 
Assim, São Paulo, no início do século XX, já era o principal centro industrial do 
país, conforme foi destacado em reportagem da época: 
 
“Ao se lançar um olhar para outros Estados, com exceção do Rio 
Grande do Sul, imediatamente se verificará que eles não 
conquistaram o rápido progresso e o desenvolvimento industrial que 
colocaram os paulistas num plano superior [...] A capital federal é 
quase tão fabril quanto São Paulo, mas a sua indústria não se 
apresenta nos seus ramos, tão variada como a nossa” (ESTADÃO, 
1911). 
 
A formação dos industriais foi realizada principalmente por dois grupos 
principais. O primeiro era composto dos importadores que, vislumbrando novas 
oportunidades de lucro, foram migrando gradativamente para a manufatura ao longo 
dos anos. Entretanto, é importante notar que nas décadas seguintes eles não 
abandonariam a atividade de importação, uma vez que boa parte dos insumos 
utilizados nas fábricas era adquirida de outros países. A segunda parte era constituída 
justamente pelos fazendeiros que perceberam uma nova oportunidade de 
reinvestimentos dos lucros do café. De 1906 até o início da Primeira Guerra Mundial, 
os plantadores tiveram lucros excelentes, mas foram impedidos de formar novas 
fazendas devido às leis estaduais que procuravam limitar a oferta. Dessa forma, 
muitos fazendeiros aplicaram parte dos lucros na manufatura (DEAN, 1971, p. 51). 
Durante essa primeira fase de industrialização os produtos fabricados em São 
Paulo eram rudimentares. Procurava-se produzir apenas aqueles itens que devido à 
relação entre peso e custo, tinham a manufatura em solo nacional vantajosa em 
relação à importação (DEAN, 1971, p. 16). 
Outra característica que marcou esse período de expansão da indústria foi o 
movimento dos empresários para a verticalização dos seus negócios, como um 
método de expansão defensiva, conforme aponta o historiador Warren Dean: 
 
“Não se creia que a integração vertical fosse principalmente o 
resultado do desejo de absorver os lucros dos intermediários. 
Operando numa economia de fronteira, Matarazzo e os outros 
industriais ansiavam, sobretudo,por diminuir as incertezas do 
suprimento de matéria-prima, do transporte e da energia” (DEAN, 
1971, p. 72). 
 
 
 
 
 
32 
 
 
 
Reiss (1980, p. 286) corrobora esta visão: 
 
“Até mesmo as pequenas firmas tenderiam a diversificar suas 
atividades industriais, fazendo a integração com comércio, 
agricultura, etc., além de, especialmente, formar uma reserva 
financeira que serviria como um seguro pessoal [...] para lidar com as 
recorrentes crises”. 
 
De acordo com Reis (1980, p. 66), a verticalização levou os industriais a 
fortalecerem seus papéis como importadores. Assim, a comercialização de máquinas 
e insumos para as suas fábricas os aproximaram de fontes de crédito internacionais. 
Dessa forma, fomentou-se uma integração entre as atividades comerciais e industriais 
que criavam um ciclo virtuoso reduzindo o risco e aumentando a lucratividade dos 
negócios. 
Reiss (1980, p. 76) ainda afirma que apesar da verticalização e diversificação 
dos negócios, as estruturas das empresas eram predominantemente “horizontais”, 
sem integração entre os negócios, embora a gestão estivesse concentrada em apenas 
um homem, o fundador. 
Dessa forma, a indústria paulista cresceu substituindo produtos anteriormente 
importados, enquanto o equilíbrio da balança comercial era mantido com o capital 
resultante das exportações agrícolas, com destaque para o café. Um comparativo da 
evolução da indústria paulista entre 1907 e 1920 pode ser verificado na tabela 4-2. 
 
Tabela 4-2 - Evolução da Produção Industrial de São Paulo 
Ano 
Número de 
Firmas 
Capital 
(Contos de Réis) 
Valor da 
Produção 
(Contos de Réis) 
Número de 
Operários 
1907 326 127.702 118.087 24.186 
1920 4.154 537.817 986.110 83.998 
Fonte: Dean (1971, p. 99) 
 
A eclosão da Primeira Guerra Mundial em 1914 trouxe mudanças expressivas 
para a indústria nacional. O preço dos produtos importados da Europa aumentou 
significativamente. Além disso, o transporte que representava 14,7% do custo dos 
produtos adquiridos do exterior passou para 21,3%. Vale destacar que a importação 
de matéria prima e de bens de capital foi mais drasticamente reduzida do que a 
importação de bens de consumo, fazendo com que os investimentos e expansão das 
fábricas ficassem estagnados durante o período de conflito (DEAN, 1971, p. 98). A 
redução das importações pelo porto de Santos pode ser constatada na tabela 4-3, com 
destaque na queda de máquinas e produtos de ferro e aço. 
 
33 
 
 
 
Tabela 4-3 - Importações Através do Porto de Santos, 1909-1918 (milhares de 
toneladas métricas) 
Itens 1909-1913 1914-1918 Variação 
Produtos alimentícios 1.008 943 - 6% 
Papel e produtos do papel 48 45 - 6% 
Substâncias químicas e farmacêuticas 58 33 - 43% 
Tecidos de algodão 13 5 - 62% 
Ferro e aço 98 33 - 66% 
Produtos de ferro e aço 536 148 - 70% 
Máquinas 136 37 - 73% 
Fonte: Dean (1971, p. 98) 
 
Entretanto, parte da indústria conseguiu encontrar oportunidades para 
continuar crescendo. À medida que os países europeus reduziram o consumo de itens 
não essenciais como o café, aumentaram as compras de alimentos industrializados. A 
indústria têxtil, por sua vez, passou a exportar para a Argentina e África do Sul, 
suprindo a demanda que até então era atendida pelas fábricas europeias. Finalmente, 
o crescimento da produção para atender o mercado interno foi obtido através do 
aumento dos turnos de trabalho (DEAN, 1971, p. 104 e 105). 
Assim, conforme tabela 4-4, verifica-se que não houve queda do nível de 
exportações durante o período de guerra. Pelo contrário, o ligeiro aumento das vendas 
para o exterior, aliado à redução de importações levou a um aumento no saldo da 
balança comercial. 
 
Tabela 4-4 - Balança Comercial do Brasil, 1904 – 1918 
Período 
Exportações 
(milhões de 
contos) 
Importações 
(milhões de contos) 
Saldo 
(milhões de contos) 
1904-1908 3.827 2.678 1.149 
1909-1913 5.058 4.056 1.002 
1914-1918 5.262 3.779 1.583 
Fonte: Dean (1971, p. 96) 
 
O período do final da Guerra também marcou a Revolução Bolchevique na 
Rússia que fomentou a sindicalização dos operários e aumentou as suas 
reinvindicações. Como resultado desse engajamento, a indústria paulista vivenciou 
duas grandes greves em um período de dois anos. Segundo Dean (1971, p. 174) a 
greve geral de 1917 envolveu mais de cem fábricas na capital e no interior. Esse 
número seria ainda maior na segunda greve geral realizada em 1919. Entre as 
principais reclamações dos trabalhadores estavam o aumento de salários de acordo 
34 
 
 
 
com o custo de vida, limitação de oito horas de trabalho, abolição do sistema de 
multas e proibição do trabalho para menores de doze anos. Todavia, como os 
sindicatos ainda não eram reconhecidos pelo Governo, os acordos não tendiam a 
durar por longo tempo e dificilmente prejudicavam os empresários. 
Apesar da evolução da indústria no início do século XX, a manufatura ainda era 
vista como uma atividade marginal em relação à agricultura. Assim, se por um lado os 
Governos não lançavam mão, de forma intencional, de políticas que visassem o 
desenvolvimento e fortalecimento do complexo produtivo, por outro, havia poucas 
pressões sobre os empresários. Dean (1971, p. 72) apresenta um relato sobre o 
ambiente industrial da época: 
 
“Os empresários paulistas operavam num ambiente de quase perfeito 
laissez faire. Tirante os impostos sobre importações e exportações, 
nem o governo estadual nem o federal se preocupavam com as 
atividades dos homens de negócios particulares até os tumultos das 
classes operárias de 1917. Organizavam-se monopólios, as 
condições de trabalho em muitas fábricas eram abomináveis, a 
qualidade dos produtos alimentícios não obedecia a nenhuma 
regulamentação. As indústrias locais estavam sujeitas a poucos 
impostos e estes eram geralmente sonegados”. 
 
Baer (19851, p. 262) corrobora a posição de laissez faire do Estado ao destacar 
que este mantinha uma atuação esporádica em relação à indústria através da 
concessão de favores especiais a determinados setores por meio de alterações de 
tarifas alfandegárias e empréstimos. 
Além disso, a incipiência de escolas técnicas prejudicava o desenvolvimento e 
adoção de novas tecnologias e implementação de processos eficientes de produção. 
Scantimburgo (1986, p. 77) destaca alguns poucos centros de ensino que formavam 
engenheiros na época como a Escola Politécnica do Rio de Janeiro fundada em 1874 
e a Escola de Minas de Ouro Preto fundada em 1876. 
De acordo com Reiss (1980, p. 44), durante esse período também havia pouca 
competição entre as empresas. Dessa forma, a principal fonte de instabilidade era 
oriunda da produção e das vendas do café. Para o autor (p. 64), como o empresário 
praticamente não tinha acesso ao crédito bancário e estava sujeito às oscilações do 
mercado de café, este preferia se manter em uma posição cômoda no mercado, 
trabalhando com os preços correntes e sem agir de forma agressiva perante os outros 
competidores. Assim, um caminho óbvio para o reinvestimento dos lucros seria em 
direção a produtos relacionados (ou não relacionados) que poderiam, eventualmente, 
vir a ser uma fonte lucrativa ao mesmo tempo em que poderiam reduzir de algum 
modo o risco a que estavam expostos. 
35 
 
 
 
Ainda segundo Reiss (p. 392), a chegada de empresas estrangeiras era 
esporádica e ocorria em setores muito específicos da economia. O autor destaca as 
seguintes empresas que se instalaram no Brasil no período: Fiat Lux (fósforos – 1895); 
Singer Bewing Machines (máquinas de costura – 1905); Cotonniere Belge-Bresilienne 
(têxtil – 1907); Crown Cork Co. (cortiça – 1907); British American Tobacco (tabaco -
1909); Societe de Abatoir de Para (carne – 1910); Bunge y Born (moagem de grãos – 
1910); Gasmotoren Fabrik (máquinas e motores – 1913); Otis Elevator (elevadores – 
1913); Armour (carne - 1915); Swift (carne – 1917). 
Reiss (1980, p. 23) ainda aponta que comoo crescimento industrial neste 
período se caracterizou demasiadamente como um reflexo do aquecido mercado 
cafeeiro, ele ficou carente de uma dinâmica própria de acumulação de capital. 
Apesar desses problemas, de forma geral, as condições do ambiente 
favoreceram o surgimento de grandes empresários e indústrias: 
 
“Assim não havia concorrência significativa e o país era um terreno 
aberto e fértil para o crescimento. Era mesmo vez e hora dos grandes 
empreendedores, dos construtores de impérios. A ambiência 
favorecia a multiplicação de investimentos, a expansão multinegocial 
sem preocupação com concentração ou especialização. Diversidade 
em vez de especialização. Multiplicidade em vez de foco” (COUTO
1
, 
2004, p. 248). 
 
Dessa forma, de um Estado com pouca participação na economia nacional e 
dependente do Rio de Janeiro, em um período de trinta anos São Paulo deu um 
grande salto rumo à industrialização, sendo possível verificar o surgimento dos 
primeiros grandes grupos industriais. É nesse contexto que desembarcam no país dois 
dos maiores empreendedores da nossa história do capitalismo nacional: Francesco 
Matarazzo e Antônio Pereira Ignácio. 
Curiosamente, os dois imigrantes se estabelecem em Sorocaba, município que 
tinha apenas 12,9 mil habitantes em 1881, sendo 3 mil escravos. Apesar do pequeno 
porte, era um local de terras férteis e cidade pioneira na indústria paulista, recebendo 
as primeiras unidades de preparação e tecelagem de algodão, de seda e de confecção 
de chapéus. Com esses atributos, chegou a ser apelidada de “Manchester Paulista” 
(COUTO1, 2004, p. 138). 
No período que sucedeu a primeira fase da industrialização de São Paulo, o 
crescimento foi menos vigoroso. Segundo Dean (1971, p. 115), a expansão do parque 
industrial paulista entre 1920 e 1940 se deu a uma taxa 50% menor do que a realizada 
nos primeiros anos do século XX, algo em torno de 4% ao ano. Para o historiador, 
essa evolução mais tímida pode ser atribuída à queda do preço do café, à depressão 
36 
 
 
 
de 1929, às dificuldades do Governo em saldar as suas dívidas e às próprias 
deficiências das empresas nacionais. 
Apesar do menor crescimento da indústria, Reiss (1980, p. 392) afirma que os 
investimentos de empresas estrangeiras se intensificaram durante a década de 1920 
e, além disso, começaram a ter um grau de sofisticação maior. Entre as companhias 
que se instalaram no Brasil durante este período, destacam-se: Ford (1920); General 
Motors (1920); Nestle (1921); General Electric (1921); Philips (1924); Pirelli (1930); 
Lone Star Cement (1931). 
O início da década de 1920 apresentou um ambiente extremamente 
conturbado. Scantimburgo (1986, p. 124) apresenta um relato da situação econômica 
do país na época: 
 
“Se o Brasil é pobre ainda hoje, muito mais era na década de 20. 
Vivia de empréstimos, preso a credores estrangeiros que sugavam 
nossa magra economia. Submetido à política da valorização, o café 
sustentava o nosso edifício econômico, graças, porém, a 
empréstimos externos, um dos quais, em 1925, foi de dez milhões de 
libras esterlinas. Dependendo dos mercados estrangeiros para a 
colocação de suas safras de café e de maquinário para o seu 
desenvolvimento industrial, o Brasil debatia-se em crises periódicas, 
as crises de desenvolvimento; para vencê-las dependia 
exclusivamente, de uma reduzida elite de empresários, poucos 
dotados de diplomas de cursos superiores”. 
 
Nesse cenário, a República do Café com Leite, sensível aos anseios dos 
fazendeiros, adotou uma política forte de concessão de crédito, fazendo com que a 
emissão de papel moeda aumentasse significativamente, gerando inflação. Entre 1920 
e 1923, a quantidade de capital em circulação e o custo de vida duplicaram. Todavia, 
pressionado pela classe média, em 1926 o presidente Arthur Bernardes retirou papel 
moeda de circulação queimando 316 mil contos (50 milhões de dólares), o que fez 
com que o dólar se desvalorizasse em 30%, impactando seriamente as exportações 
dos fazendeiros. Nesse período, a principal reclamação dos industriais e dos 
fazendeiros passou a ser justamente a instabilidade do câmbio (DEAN, 1971, p. 147). 
Essa situação seria contornada apenas com a eleição do paulista Washington 
Luís ao Governo Federal. Cedendo à pressão desses grupos, o presidente assegurou 
uma taxa de câmbio firme e aumentou novamente a política de crédito (DEAN, 1971, 
p. 148). 
Apesar do índice menor de crescimento, houve uma continuidade na 
diversificação dos negócios no período, com destaque para as novas fábricas de ferro 
gusa, cimento, motores elétricos, máquinas têxteis e peças de automóveis. Por outro 
lado, a construção de estradas de ferro foi muito lenta durante toda a década de 1920, 
37 
 
 
 
prejudicando o transporte dos produtos e o comércio interestadual. (DEAN, 1971, p. 
120). 
De acordo com Dean (1971, p. 121), parte dos agricultores continuou a 
direcionar os investimentos para a indústria quando houve uma baixa nos preços do 
café em 1930, reduzindo substancialmente a plantação de novos cafeeiros nos anos 
seguintes. 
Contudo, as recorrentes baixas do preço do café e o reduzido nível de 
desenvolvimento dos agricultores fizeram com que gradativamente o patamar de 
investimento e o fluxo de capital para as fábricas minguassem. Segundo Dean (1971, 
p. 141), houve pouca evolução de produtividade agrícola nas décadas de 1920 e 1930. 
Apesar do aumento de 35% da área cultivada, os estoques de máquinas agrícolas se 
mantiveram inalterados durante o período. 
Outro problema para a indústria que se originou do campo foi o declínio da 
produção de algodão entre 1926 e 1932, obrigando as indústrias de tecelagem a 
procurar insumos importados (DEAN, 1971, p. 143). 
Os importadores, por sua vez, se envolveram menos no crescimento da 
indústria durante essa fase, o que é explicado pelas divergências que serão 
constatadas entre estes e os industriais. Vale destacar, no entanto, que a despeito dos 
conflitos entre esses grupos, a parceria nos negócios correntes continuaria sendo 
mantida por grande parte dos empresários. 
 
“Até os maiores fabricantes continuavam a vender seus produtos no 
mercado através dos importadores que, em seguida, os vendiam aos 
atacadistas. Esse arranjo, sem dúvida alguma, aumentava os custos 
de distribuição, mas era necessário porque os importadores 
continuavam a oferecer crédito a curto prazo aos manufatores. No 
ramo dos tecidos, somente umas poucas fábricas haviam conseguido 
livrar-se dos importadores por volta da década de 1940 [...]. Existem 
alguns indícios de que Matarazzo não fizera movimento algum nesse 
sentido até o meado da década de 1930, mas que a Votorantim 
rompera com Affonso Vizeu, o importador do Rio de Janeiro” (DEAN, 
1971, p. 123). 
 
Apesar da parceria, conforme já citado anteriormente, gerou-se uma tensão 
entre esses grupos devido ao desaquecimento da economia e ao movimento 
protecionista dos industriais. Os fabricantes de tecidos, por exemplo, que haviam 
vivenciado bons resultados após a Primeira Guerra, viram as vendas declinarem a 
partir de 1924, enquanto que as importações do produto aumentaram 
substancialmente. Assim, após pressões políticas dos industriais, o Governo reviu as 
tarifas sobre o algodão no final da década, protegendo a manufatura nacional. Com 
isso, o algodão importado quase desapareceu do mercado (DEAN, 1971, p. 153). 
38 
 
 
 
Nas décadas seguintes, a indústria continuaria a defender tarifas 
protecionistas, principalmente sob a voz de Roberto Simonsen, industrial casado com 
uma representante da elite fazendeira que atuaria em favor dos industriais junto ao 
Governo até o final da década de 1940 (DEAN, 1971, p. 154). 
Esses desentendimentos acabaram criando uma dissidência dentro da 
Associação Comercial de São Paulo, que até então representava ambos os grupos, 
mas era gerida pelos importadores. 
Assim, os industriais decidiram fundaruma associação separada do comércio 
em 1928, criando o Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (CIESP). Na 
primeira eleição, o Conde Francesco Matarazzo foi o primeiro presidente e Roberto 
Simonsen, o vice (DEAN, 1971, p. 152). Era uma organização aberta e voluntária, com 
o objetivo de defender as ideias e os interesses dos industriais, dando ênfase ao papel 
da indústria como um motor para o crescimento econômico do Brasil. Além disso, 
buscava aumentar o poder de barganha junto ao governo. Tinha entre os seus 
associados, empresas como IRFM, Votorantim e Klabin (COUTO2, 2004, p. 144). 
Dessa forma, a grande parte do capital financiador da indústria passou a advir 
dos reinvestimentos feitos pelos próprios industriais que buscaram fortalecer os seus 
empreendimentos, acentuando o fenômeno de integração e verticalização dos 
negócios (DEAN, 1971, p. 123). 
Entretanto, apesar do salto dado pela indústria durante as duas primeiras 
décadas do século XX, Dean (1971, p. 126) destaca duas características específicas 
da indústria paulista que ajudam a explicar o baixo crescimento durante o período: A 
inexistência de qualquer direcionamento para a concentração dos negócios e a 
formação de cartéis que controlavam os preços e a produção. 
Com relação à ausência de concentração, Dean (1971, p. 129) aponta a falta 
de capacidade das empresas de realizar fusões, possivelmente devido à intenção de 
perpetuação da propriedade familiar. Poucas empresas recorriam ao mercado de 
ações - a primeira grande oferta de uma empresa particular ocorreu apenas em 1944 
com a Panair do Brasil (DEAN, 1971, p. 191) - e quando o faziam, muitas vezes a 
venda de títulos assinalava apenas uma transferência de cotas dentro da própria 
família. Apesar de essa ser uma característica habitual dos primórdios do capitalismo, 
o historiador destaca que até a década de 1950 a inexistência de um grande mercado 
de consumo brasileiro colaborou para que não houvesse um alto nível de 
especialização da indústria, ao contrário do que ocorreu nos Estados Unidos ainda no 
século XIX. Dean explica, ainda, que o transporte oneroso e deficiente, e os impostos 
interestaduais atrapalharam esse desenvolvimento. 
39 
 
 
 
Se por um lado não houve um processo relevante de fusões e aquisições 
durante essas décadas, os grandes industriais frequentemente se uniam para formar 
novos empreendimentos e costurar acordos para manter a hegemonia nos seus 
negócios, criando barreiras de entrada significativas: 
 
“Havia, em meados da década de 1920, associações comerciais que 
provavelmente se empenharam na fixação de preços para os 
produtos de metalurgia, calçados, couro e peles, madeira de 
construção e drogas. Houve, sem dúvida alguma, cartéis, em 
diversas ocasiões, da moagem da farinha, do papel, dos chapéus, da 
sacaria de juta e da cerveja. [...] 80% ou mais da capacidade 
produtora de fósforos, lâminas de vidro, óleo de caroço de algodão, 
linha para coser, cerveja, enlatamento de carne, cimento, ferro gusa e 
rayon pertenciam a três firmas apenas [...]. Só no campo dos tecidos 
de algodão, dentre todas as principais linhas de produção, não se 
estabeleceram cartéis [...]. Sugeriu-se aos seus membros (Centro das 
Indústrias de Fiação e Tecelagem de São Paulo) em 1926, 1928 e 
1930 que se limitasse a produção ou se mantivessem artificialmente 
os preços; em 1926 a moção fracassou, porque a ela se opôs 
Matarazzo, que, em sinal de protesto, renunciou à presidência do 
Centro. É possível que no seu entender, sua fábrica fosse mais 
eficiente do que a maioria das outras; nada indica que ele se 
opusesse, por princípio, à restrição do comércio” (DEAN, 1971, p. 
131). 
 
Além disso, segundo Dean (1971, p. 159), a implantação da indústria de bens 
de consumo talvez tenha retardado o desenvolvimento de indústrias mais básicas, 
pois o interesse dos empresários para os novos investimentos passou a estar 
relacionado a tudo que pudesse reduzir os custos dos seus produtos e não com a 
criação de indústrias de petróleo, siderurgia e química, etc. O autor prossegue com 
sua afirmação (p. 253): 
 
“A indústria nacional antes de 45 sempre pareceu um negócio de 
carregação ao consumidor. O fabricante de bens de consumo 
relutava tanto quanto os seus fregueses em comprar localmente suas 
próprias matérias-primas, dificultando, dessa maneira, a instalação de 
uma indústria básica.” 
 
Outra questão importante sobre o desempenho da indústria nacional está 
relacionada à carência de uma mão de obra qualificada. Até os meados da Segunda 
Guerra Mundial, os empresários não demonstraram quase nenhum interesse pelo 
desenvolvimento e treinamento técnico dos trabalhadores. Para os industriais e 
também para o Governo, era mais barato importar os técnicos europeus do que 
capacitá-los no Brasil (DEAN, 1971, p. 189). Esse problema era agravado pela má 
qualidade e baixa regulação do ambiente de trabalho na época. 
Em 1920, o operário paulista trabalhava por pelo menos dez horas diárias 
durante seis dias por semana, para ganhar cerca de quatro mil-réis diários – valor que 
40 
 
 
 
não era suficiente para comprar meio quilo de arroz. As mulheres representavam 
cerca de 1/3 da força de trabalho, que ainda incluía muitas crianças. Os acidentes se 
acumulavam e funcionários poderiam ser multados em caso de desobediência ou até 
mesmo surrados no caso das crianças (DEAN, 1971, p. 163). 
Isso não parecia ser um fator de preocupação para os industriais, pois o 
trabalho braçal não era um recurso escasso. Durante a década de 1920, entraram 
mais imigrantes em São Paulo do que nos quinze anos anteriores. Nas fábricas da 
Matarazzo, por exemplo, “chegou-se a encontrar máquinas com metade do tamanho 
das máquinas normais para uso das crianças operárias” (DEAN, 1971, p. 180). 
Em 1922, o presidente Arthur Bernardes, receoso com a insatisfação de parte 
dos militares (em julho deu-se o Levante do Forte de Copacabana), buscou obter o 
apoio dos grupos trabalhistas e criou o Conselho Nacional do Trabalho, órgão 
encarregado em assessorar o governo em assuntos trabalhistas. Assim, foi 
promulgada a Lei das Férias que concedia duas semanas de férias pagas a todos os 
empregados - todavia, essa lei só viria a ser efetivamente posta em prática durante o 
regime de Getúlio Vargas (DEAN, 1971, p. 172) 
 Essa época também apresentou muitos escândalos e acusações que 
prejudicaram a imagem dos industriais perante a sociedade. Os empresários 
enfrentaram denúncias da imprensa por contrabando, calote no pagamento de 
dividendos, cópia de produtos patenteados, prática de dumping e até falsificação de 
rótulos (DEAN, 1971 p. 134). Para o historiador, embora houvesse indícios de verdade 
nessas alegações, havia dificuldade de os empresários paulistas conseguirem passar 
uma visão favorável de suas atividades. 
Para Bethlem (1999, p. 81), ao contrário da cultura norte americana que 
valoriza a riqueza em virtude de um encargo conferido por Deus, a cultura nacional, 
influenciada pelas crenças católicas, não enxergava a questão dessa maneira, 
tornando a riqueza quase que em um pecado. 
Em 1929, a depressão econômica que se iniciou nos Estados Unidos e se 
alastrou pelo mundo fez o mercado internacional do café desmoronar – queda de 
quase 30% (SCANTIMBURGO, 1986, p. 139). Em 1930, o valor dos embarques do 
produto diminuiu 40% em relação ao ano anterior. Devido à importância do café para a 
economia paulista, a indústria foi igualmente comprometida. Fábricas de tecido, de 
papel e metalurgia passaram a operar com menos de 40% da capacidade instalada 
(DEAN, 1971, p. 194). Segundo Scantimburgo (1986, p. 140), a queda do preço do 
café reduziu os salários dos trabalhadores do campo em até 50%. Esse baixo poder 
aquisitivo se refletiu no comércio e, portanto, na indústria. 
41 
 
 
 
Segundo Suzigan (1971), os gêneros da indústria que mais foram afetados 
pela depressão foram: Têxtil,calçados, química, metalúrgica, bebidas, mobiliário e 
minerais não metálicos. Por outro lado, alguns setores pareciam não ter sentido os 
efeitos da crise. Pelo contrário, viram a sua produção entre 1928 a 1932 aumentar. 
Este foi o caso das indústrias de produtos alimentares, papel, couros e peles e fumo. 
Portanto, antes de 1930, as atividades industriais eram praticamente uma 
extensão das exportações de café. Isto é, o crescimento industrial interno não tinha 
uma autonomia. Com a crise do café e a grande depressão, o setor exportador teve 
sua importância enfraquecida no crescimento da renda, ao passo que os 
investimentos destinados às atividades econômicas e produtivas voltadas para o 
mercado interno assumiriam a condição de principais determinantes no crescimento 
da renda no país (SANTOS, 2008). 
Assim, em 1933, pela primeira vez na história do país, o valor da produção 
industrial supera o da produção agrícola – embora mais pela queda da última do que 
pelo crescimento da primeira (CALDEIRA, 2008, p. 64). 
Além da crise econômica, outro fator do ambiente impactou profundamente a 
industrialização de São Paulo: A queda da República Velha e a ascensão de Getúlio 
Vargas ao poder. O novo Governo trouxe mudanças políticas e econômicas 
significativas, uma vez que o Brasil vivia um momento de dificuldades para saldar suas 
dívidas após a grave crise global. O presidente gaúcho adotou uma política 
nacionalista com o intuito de fortalecer as exportações do setor agrícola e reduzir as 
importações. Além disso, como a indústria do Rio Grande do Sul (Estado de origem do 
novo presidente) era incipiente, Vargas via o setor manufatureiro como secundário 
(DEAN, 1971, p. 195): 
 
“Vargas poucas vezes mencionou a indústria nos discursos públicos 
que proferiu durante esse período, e os escritos dos seus consultores 
revelam escasso interesse pela manufatura nacional” (DEAN, 1971, 
p. 217). 
 
Dessa forma, Vargas aumentou o crédito para os cafeicultores ao comprar 
estoques do produto, além de lançar mão de políticas para restringir a importação de 
insumos para as fábricas. Ainda, criou um tributo de 8% sobre os lucros remetidos 
para o exterior (DEAN, 1971, p. 199). 
Assim, boa parte da indústria foi penalizada. As importações de ferro e aço 
caíram de uma média de 59 mil toneladas anuais entre 1927 e 1929 para 9 mil 
toneladas em 1932 e a aquisição de novas máquinas se tornou extremamente difícil 
(DEAN, 1971, p. 207). 
42 
 
 
 
As medidas trabalhistas instituídas pelo Governo Vargas também teriam um 
impacto direto para os industriais a partir da criação do Ministério do Trabalho em 
1930. No mesmo ano, o presidente sancionou uma lei limitando a mão de obra 
estrangeira em 1/3 dos trabalhadores das fábricas. Em 1931, criou um decreto que 
passou a reconhecer oficialmente os sindicatos. No ano seguinte, regulamentou o 
emprego das mulheres na indústria e limitou a jornada de trabalho em oito horas 
diárias. Todavia, se por um lado estas mudanças não deixaram de afetar a indústria, 
por outro, também não houve um grande prejuízo para os empresários que chegaram 
a se beneficiar com a criação da carteira de trabalho, por exemplo, que era fornecida 
gratuitamente pelo Estado e permitia um maior controle sobre os operários. O 
problema da limitação da jornada de oito horas também foi contornado pela 
possibilidade de duas horas extras de trabalho por dia (DEAN, 1971, p. 202). 
A insatisfação dos paulistas com o governo provisório levou o Estado à guerra 
na Revolução Constitucionalista de 1932. De acordo com Dean (1971, p. 208) os 
industriais participaram ativamente do levante, fornecendo materiais para as tropas. 
Nos anos que se seguiram, Vargas empreendeu ações visando equilibrar a 
balança comercial. Assim, com o objetivo de persuadir os norte americanos e 
europeus a reduzir as tarifas aduaneiras sobre o café e outros produtos brasileiros, 
aumentou as tarifas de importação. Todavia, a medida protecionista do presidente não 
foi eficiente. Era mais fácil que os países desenvolvidos vivessem sem café do que os 
brasileiros sem máquinas e combustíveis (DEAN, 1971, p. 210). 
Alguns industriais aproveitaram essa estratégia de Vargas para proteger os 
seus negócios. Convenceram o Governo de que havia superprodução nos mercados 
de papel, tecidos e calçados e fizeram com que fosse proibida a importação de 
máquinas para esses setores entre 1931 e 1934. Todavia, os esforços do presidente 
não fizeram com que o Governo conseguisse saldar os problemas das dívidas nem da 
balança comercial. Assim, em 1934 Vargas anunciou que os juros seriam pagos de 
forma parcelada. Além disso, houve, no período, um grande aumento no fluxo de 
importações, principalmente de produtos de gêneros alimentícios e outros bens de 
consumo. Entre 1932 e 1936, o volume de entrada de mercadorias em Santos quase 
quadruplicou. Dessa forma, em 1937, pela primeira vez desde 1920, o Brasil 
apresentava um balanço comercial negativo (DEAN, 1971, p. 214). 
 
“A mudança mais notável no ambiente econômico da década de 1930 
foi a crescente intervenção do governo. Mas essa intervenção não se 
propunha acelerar o processo da industrialização; as alternativas da 
economia e exportação ainda não se haviam se esgotado” (DEAN, 
1971, p. 219). 
 
43 
 
 
 
Apesar dos problemas econômicos do país, de 1933 em diante a 
industrialização tomaria um novo impulso, com destaque para os setores não 
tradicionais, com o estabelecimento de novas indústrias destinadas à produção de 
matérias-primas básicas (cimento e aço, principalmente), e indústria de máquinas e 
equipamentos (SUZIGAN, 1971). 
Um dos motores dessa evolução foi o desenvolvimento da base energética do 
Estado que duplicou entre 1930 e 1945, sendo que em 1940 a potência instalada de 
energia elétrica de origem hidráulica em São Paulo representava 55,4% do total do 
país. Assim, de 1932 a 1937, o capital aplicado nas principais indústrias paulistas 
cresceu 118%, enquanto o número de operários empregados aumentou 63% 
(SUZIGAN, 1971). 
De acordo com Suzigan (1971), as indústrias tradicionais foram as que tiveram 
menor crescimento no período: Produtos alimentares (2,9%), têxtil (6,5%) e vestuário e 
calçados (8,0%). Num grupo intermediário, outras indústrias tradicionais, mas de 
menor produção no total da indústria, registraram crescimento da produção a taxas 
mais elevadas como: Bebidas (17,9%), fumo (18,2%), mobiliário (13,1%), madeira 
(10,5), papel (7,3%), couros e peles (18,4%). Enquanto isso, as indústrias básicas 
cresceram a taxas anuais muito elevadas: indústria metalúrgica (24%), química e 
farmacêutica (29,9%), automotivo (39%) ao ano e minerais não metálicos (16%). 
Todavia, enquanto alguns setores puderam se desenvolver modernizando e 
aumentando sua capacidade produtiva, como foi o caso das indústrias do cimento e de 
produtos metalúrgicos, outros setores, principalmente o têxtil, aumentavam a sua 
produção através da utilização intensiva do equipamento existente, sem preocupação 
quanto à necessidade de renovação e modernização que a intensa utilização tornava 
ainda mais necessária (SUZIGAN, 1971). Reiss (1980, p. 135) reforça essa hipótese 
em seu relato: 
 
“Na ausência de uma competição intensa com outras firmas na 
produção de produtos similares, a vida econômica das instalações 
industriais se estendia através de longos períodos de tempo, 
especialmente no caso dos segmentos tradicionais da indústria [...]. 
Isto era uma consequência da própria competição industrial, 
principalmente com a reduzida competição de preços e pelo fato das 
firmas estarem diante de oportunidades abundantes de investimento 
para expansão, integração vertical e diversificação.” 
 
Portanto, verifica-se na época a necessidade primordial da indústria paulista 
pela renovação do parque fabril. No entanto, a eclosão da 2a Guerra Mundial e suas 
consequências sobre a economia brasileirafariam esquecer, por algum tempo, os 
problemas de eficiência das fábricas, principalmente as têxteis, que passaria à sua 
fase áurea conquistando mercados externos perdidos pelos países em guerra 
44 
 
 
 
(SUZIGAN, 1971). A tabela 4-5 traz uma luz a esse problema, ao indicar que pelo 
menos 42% das máquinas da indústria têxtil em 1939 tinha no mínimo dez anos de 
uso. 
 
Tabela 4-5 - Distribuição por Idade das Máquinas da Indústria Têxtil em 1939 
Subgrupos da indústria 
Número de máquinas segundo a idade 
Menos 
de 5 
anos 
5 a 10 
anos 
Mais de 
10 anos 
Idade 
descon
hecida 
Total 
Fiação de algodão 199 1.037 873 573 2.682 
Tecelagem de algodão 2.348 1.447 59.039 66.969 129.803 
Fiação de seda natural 50 - - 67 117 
Fiação de seda artificial 15 12 3 - 30 
Tecelagem de seda natural e artificial 3.797 2.262 1.346 1.600 9.005 
Fiação de lã 151 76 331 5 563 
Tecelagem de lã 580 326 814 5.277 6.997 
Fiação de juta - - - 80 80 
Tecelagem de juta 267 40 1.809 1.153 3.269 
Totais 7.407 5.200 64.215 75.724 152.546 
(%) 4,9 3,4 42,1 49,6 100,0 
Fonte: Suzigan (1971) 
 
Reiss (1980, p. 85) também afirma que o crescimento da indústria também 
ocorreu de maneira muito mais diversificada e integrada durante as décadas de 1930 
e 1940, sendo que grande parte da diversificação se deu em face da substituição das 
importações. Além disso, de acordo com o autor, o crescimento industrial nesta fase 
se tornou mais independente do café, tendo uma dinâmica própria de acumulação de 
capital, quando a principal fonte de crescimento das empresas se deu através do 
reinvestimento dos lucros. O autor ainda afirma que ao contrário do período pré-crise 
de 29, quando o principal fator de risco para a indústria era o mercado de café, a partir 
da década de 30 a competição entre as fábricas se tornou mais intensa, se tornando 
uma fonte de instabilidade relevante para os negócios. 
Constata-se, portanto, que essa diversificação da estrutura de produção da 
indústria paulista teve grande participação no desenvolvimento econômico e industrial 
durante o período pré-Guerra. A tabela 4-6 apresenta alguns números da indústria 
paulista desde o período da crise de 1929 até 1937. É possível constatar uma 
evolução substancial durante os anos do Governo Vargas. 
 
45 
 
 
 
Tabela 4-6- Aspectos Gerais da Indústria: 1928 – 1939 
 1928 1930 1932 1933 1937 1939 
Número de fábricas 6.923 5.388 6.070 6.555 9.051 12.850 
Capital aplicado 
(contos de réis) 
1.101.824 1.477.490 1.589.750 1.906.482 3.460.452 4.679.371 
Operários 148.376 119.296 130.808 171.667 245.715 254.721 
Força Motriz 
Instalada (HP) 
171.076 189.499 192.159 212.108 279.573 432.650 
Valor da Produção 
(contos de réis) 
2.216.732 1.834.293 1.944.988 2.060.363 3.851.878 7.107.547 
Fonte: Suzigan (1971) 
 
 Em 1937, o golpe de Vargas que originou o Estado Novo trouxe uma nova 
dinâmica para a indústria paulista. Diante do decréscimo das exportações e de uma 
economia problemática, o presidente deu uma guinada na política de desenvolvimento 
do país e decidiu fortalecer a indústria nacional com o intuito de substituir as 
importações por produtos nacionais. Dessa forma, abriu novas fontes de 
financiamento para a indústria. (DEAN, 1971, p. 222). 
Em 1939, as indústrias leves que correspondiam a cerca de 70% da produção 
vinte anos antes, viram este percentual declinar para 58%, perdendo espaço para 
setores como metalurgia, mecânica e material elétrico. Sendo assim, com o maior 
balanceamento dos setores industriais a partir dos anos de 1930, a indústria se tornou 
o setor líder de crescimento da economia (BAER1, 1985, p. 298). 
Logo após o início da Segunda Guerra Mundial, o Brasil passou a ser 
procurado como fonte de matérias primas estratégicas e de produtos manufaturados, 
em particular os têxteis e vestuários, o que evidentemente representou um novo 
impulso à industrialização paulista (SUZIGAN, 1971). Mais importante, ainda, foram os 
acordos com os Estados Unidos para a implantação da Companhia Siderúrgica 
Nacional (CSN) em Volta Redonda e o envio de máquinas para as fábricas nacionais 
durante a guerra (DEAN, 1971, p. 236). 
 Todavia, para Dean (1971, p. 238), os industriais confiaram em demasiado 
nesse período de forte demanda que era tão manifestamente temporária. Os 
compradores queixavam-se constantemente que os preços dos produtos eram o dobro 
dos que anteriormente eram fornecidos por Europa e Estados Unidos. 
 Já o Estado Novo, por sua vez, ia perdendo força com o fim da guerra. A 
aproximação fascista de Getúlio e a perda de apoio político acabaram levando à 
deposição do presidente. De acordo com Dean (1971, p. 248), com a queda de Vargas 
caíram também os industriais. 
46 
 
 
 
O período que se inicia após no pós-guerra carrega mudanças demográficas 
significativas que afetaram a dinâmica do desenvolvimento econômico e industrial do 
país. Entre elas, destaca-se o aumento da população que se expandiu em mais de 
200% no período, ultrapassando a marca de 144 milhões de habitantes. O gráfico 4-2 
apresenta a evolução da população brasileira, no qual é possível verificar uma 
acentuação da taxa de crescimento a partir da década de 1950. 
 
Gráfico 4-2– Evolução da População Brasileira 
 
Fonte: Ipeadata (2014) 
 
Aliado a isso, houve um forte processo de urbanização que contribuiu para o 
surgimento de um novo mercado consumidor, além do aumento da oferta de mão de 
obra. Enquanto que em 1940 pouco mais de 30% da população brasileira vivia nas 
cidades, em 1970 essa taxa chegou a 55,9%. No Estado de São Paulo, os percentuais 
eram de 44,1% e 80,3%, respectivamente (REISS, 1980, p. 159). O gráfico 4-3 
apresenta a evolução das populações urbana e rural do Brasil. 
Nos primeiros anos pós-guerra, o governo Dutra procurou combater os altos 
índices de inflação através de uma forte política de importação e de uma taxa fixa de 
câmbio. Entretanto, essas medidas além de não conseguirem segurar o aumento dos 
preços, acabaram consumindo as divisas cambiais acumuladas durante o período da 
Guerra (MATARAZZO, 1982, p. 115). 
 
 
0
40.000.000
80.000.000
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160.000.000
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2
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0
5
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1
0
47 
 
 
 
Gráfico 4-3 – Evolução das Populações Urbana e Rural no Brasil 
 
Fonte: Ipeadata (2014) 
 
De acordo com Baer (1985, p. 39), a redução das importações aliada ao 
crescimento das exportações durante os conflitos haviam elevado as reservas de 
divisas do país de US$ 71 milhões em 1939 para US$ 708 milhões em 1945. Todavia, 
em 1947 essas reservas já tinham sido consumidas em decorrência de um forte 
movimento de importações que ficaram restritas durante a Guerra (BAER, 2002, p. 
71). 
Baer (1985, p. 38) ainda destaca que os anos pós Guerra marcaram uma fase 
na qual a participação dos principais produtos agrícolas nacionais nas exportações 
mundiais declinou. Dessa forma, o país passaria a ter ainda mais dificuldades de gerar 
renda para sustentar um rápido crescimento demográfico. 
Por outro lado, ao longo de toda a década de 1940, a indústria continuou o 
movimento de crescimento iniciado no Estado Novo de Vargas. Scantimburgo (1986, 
p. 197) apresenta alguns dados sobre a evolução industrial na década de 1940. De 
acordo com o autor, em 1940 havia no país 49.784 estabelecimentos industriais. Dez 
anos depois, eles passaram a 89.086. O número de operários ocupados na indústria 
também aumentou significativamente – de 787.185 para 1.286.807. 
Assim, o governo brasileiro buscou medidas com o intuito de equalizar o 
balanço de pagamentos e fomentar a indústria nacional que poderia surgir como uma 
nova fonte de crescimento econômico. Para isso, em1953, o governo lançou um 
sistema de taxas múltiplas de câmbio. Assim, poderia incentivar as exportações dos 
0
20.000.000
40.000.000
60.000.000
80.000.000
100.000.000
120.000.000
140.000.000
160.000.000
180.000.000
1940 1950 1960 1970 1980 1990 2000 2010
População Rural População Urbana
48 
 
 
 
mercados que considerava estratégicos e proteger indústrias nacionais com base em 
elevação do câmbio para importações (BAER, 1985, p. 44). 
 Além disso, assim como havia feito na primeira fase de industrialização no 
início do século, o país lançou mão da Lei de Similares, incentivando a substituição de 
importações e a integração vertical das indústrias (BAER, 2002, p. 78). 
Assim, a partir deste momento, começa a haver uma transição do motor 
econômico brasileiro. A agricultura, que chegou a representar 27% do PIB nacional 
após a Guerra, verá sua participação declinar gradativamente nas próximas duas 
décadas, enquanto a indústria ganha fôlego, alcançando em 1966, o patamar que a 
agricultura tinha vinte anos antes. Enquanto que o produto real da agricultura cresceu 
87% entre 1947 e 1961, o da indústria ampliou-se em 262%. O gráfico 4-4 apresenta 
esta variação da composição do PIB nacional entre as décadas de 1950 e 1980. 
 
Gráfico 4-4 - Distribuição Setorial do PIB (1950 – 89) 
 
Fonte: Adaptado de Baer, 2002, p. 481 
 
Ainda, esse movimento acompanhou uma maior proporção da indústria 
pesada, principalmente com o crescimento de setores como metalurgia, material 
elétrico, material de transporte e indústria química (BAER, 1985, p. 60). 
Entretanto, é importante destacar que no final da década de 1950, a economia 
brasileira não era totalmente imune às oscilações do café que teve uma 
desvalorização de 31% em 1959 e obrigou o governo a lançar mão de incentivos aos 
exportadores. Essa persistente importância do produto agrícola foi destacado no 
Relatório Anual da Matarazzo de 1959: 
-10,0%
10,0%
30,0%
50,0%
70,0%
90,0%
Agricultura Indústria Serviços Taxa de Crescimento Anual do PIB
49 
 
 
 
 
“No entanto, a nossa economia continua dependendo do café em 
medida considerável e é, portanto, nesse setor, especialmente nesse 
setor, que nós temos a obrigação de atuar com imaginação e 
tenacidade visando reunir agricultura e indústria sob um denominador 
comum.” 
 
No ano de 1956, o presidente Juscelino Kubitschek (JK) lançou o Plano de 
Metas e o famoso “cinquenta anos em cinco”, que articulou uma série de 
investimentos públicos e privados visando o desenvolvimento do país e o 
aprimoramento da infraestrutura brasileira. 
Em especial, buscou-se desenvolver a indústria de bens de consumo durável, 
na qual destaca-se o setor automotivo. Vale destacar, no entanto, que diferentemente 
de Vargas, que direcionou o crescimento, principalmente, com fontes de capital 
nacional e estatal, o novo governo utilizou-se de diversos instrumentos visando atrair 
investimentos estrangeiros (SANTOS, 2008). 
Dessa forma, o governo lançou mão de uma série de incentivos para empresas 
nacionais e estrangeiras, sendo que estas últimas passaram a ter uma participação 
mais relevante na economia (REISS, 1980, p. 161). Segundo Baer (1985, p. 56), em 
relação à indústria, os objetivos do governo eram estimular os seguintes setores: 
siderúrgico, alumínio, cimento, celulose, automobilístico, químico e de mecânica 
pesada. 
Sendo assim, as empresas nacionais que surgiram durante o primeiro ciclo de 
industrialização nas décadas anteriores, ganharam a concorrência de grandes 
empresas estrangeiras. De acordo com Dean (1971, p. 252), em 1960, metade do 
capital industrial do setor privado de São Paulo se achava sob o domínio ou controle 
de estrangeiro. O autor completa: 
 
 “Nesse ínterim, a industrialização no setor privado tomara uma 
direção inteiramente nova. Atraídas pelo tamanho do mercado 
brasileiro, companhias estrangeiras começaram a transformar suas 
agências de vendas em filiais de operações manufatureiras. Em 
muitos casos, estavam respondendo a decretos governamentais, que 
pretendiam solucionar o problema do balanço dos pagamentos 
aumentando o fluxo de capital estrangeiro”. 
 
Sobre o aumento da competição na indústria, Reiss (1980, p. 181) afirma que a 
partir da década de 1950, com a entrada de grandes firmas estrangeiras, a competição 
na indústria se tornou bem mais acirrada. Grandes organizações introduziram novas 
tecnologias, modernizaram as instalações e equipamentos, criando barreiras de 
entrada em diversos segmentos. Junto a isso, houve uma pressão nos custos, com 
aumento de salários e dos insumos. Durante esse processo, as empresas dos ramos 
tradicionais foram as que mais sofreram com a redução das margens de lucro. Essas 
50 
 
 
 
companhias, como não faziam parte do grupo prioritário do plano de metas, tiveram 
mais problemas para captar recursos, tendo que obter créditos mais caros no 
mercado. 
Entre esses setores estava o têxtil, que tinha na Matarazzo e na Votorantim, 
dois dos seus principais players. As dificuldades enfrentadas pelo setor diante de um 
novo movimento de industrialização do país e da chegada de novos competidores 
foram destacadas Relatório Anual da Votorantim de 1958: 
 
“Está se tornando cada vez mais difícil para o industrial brasileiro em 
lidar com a situação desigual – talvez única no mundo – enfrentada 
por investimentos nacionais e estrangeiros [...]. Existem algumas 
indústrias como a automotiva que parece que estão se 
desenvolvendo mais que o necessário, criando problemas de salário 
para outras indústrias que não podem lidar com isso. E por que isso? 
Porque elas nasceram debaixo de uma generosa proteção do 
governo [...] enquanto outras indústrias tradicionais como a têxtil 
continuam sem ajuda, sem direitos e sem nenhuma cooperação do 
governo” Reiss (1980, p. 242). 
 
Baer (1985, p. 453), por outro lado, afirma que embora as multinacionais 
tenham trazido novas tecnologias e métodos de produção que ajudaram a acelerar o 
desenvolvimento industrial do Brasil, grande parte da produção era de semiacabados, 
voltado para atender o comércio internacional entre subsidiárias das mesmas 
multinacionais. Um trecho do Relatório Anual de 1977 da Votorantim corrobora esta 
visão: 
 
“Já é tempo do Brasil, através do seu órgão capacitado, não mais dar 
isenções de impostos aduaneiros de toda a espécie para a 
implantação de pseudo-indústrias, que nada mais são do que 
verdadeiros corredores de importação a serviço de algumas 
multinacionais. [...] Todos sabemos que muitas empresas que se 
instalaram no Brasil com a finalidade precípua de montar 
componentes, estes vindos do estrangeiro, geralmente da própria 
matriz”. 
 
Portanto, é possível constatar que não havia no país uma presença maciça de 
multinacionais com tecnologias de última geração e com ações de pesquisa e 
desenvolvimento local. Ou seja, houve um movimento claro de substituição de 
importações, no qual firmas estrangeiras passaram a produzir em terras nacionais, os 
produtos que já eram revendidos aqui. Esse processo pode ser evidenciado a partir da 
visualização da tabela 4-7. Destaca-se a variação ocorrida no setor de cimento e de 
metais não ferrosos, no qual a Votorantim viria a ter papel de destaque. Já nos 
produtos têxteis e alimentícios, nos quais a Matarazzo continuaria a manter sua base 
industrial, percebe-se que já não havia concorrência significativa de produtos 
importados. 
51 
 
 
 
Tabela 4-7 - Participação dos Itens Importados em Diversos Setores 
Itens 1949 1959 
Minerais não metálicos 8,6 2,1 
Cimento 23,7 0,9 
Siderurgia e metalurgia 22,5 11,6 
Ferro e aço 24,9 15,3 
Metais não ferrosos 80,1 37,0 
Máquinas 63,0 41,4 
Máquinas para trabalhar metais 68,9 56,9 
Outras máquinas 58,3 23,0 
Máquinas e equipamentos elétricos 47,6 13,3 
Equipamento de transportes 56,1 18,6 
Veículos automotores 54,2 13,7 
Papel e artefatos de papel 18,6 12,1 
Produtos químicose semelhantes 39,3 18,2 
Produtos têxteis 4,4 0,1 
Gêneros alimentícios elaborados 1,2 1,0 
Bebidas 2,3 0,8 
Obras impressas 2,3 2,6 
Fonte: Baer, 1985, p. 6
4 
 
Reiss (1980, p. 269) afirma que poucas empresas não enfrentaram uma 
competição mais acirrada nos seus respectivos mercados. Por isso, houve um 
movimento comum, entre as organizações, de declínio de capital e uma nova 
estratégia orientada à redução da diversificação construída nas décadas anteriores 
que culminou com a realização de desinvestimentos. 
O Brasil passou por um crescimento econômico substancial na segunda 
metade da década de 1950. Durante o Governo de JK, o Produto Nacional Bruto subiu 
de 15 bilhões de dólares, para 20,8 bilhões. Um crescimento de quase 40% 
(SCANTIMBURGO, 1986, p. 232). 
Entre as indústrias que se desenvolveram neste período, Reiss (1980, p. 162) 
aponta a de autopeças. O setor que em 1955 contava com 600 fábricas, viu esse 
número dobrar em cinco anos. Na tabela 4-8 é possível verificar o resultado dessas 
variações, no qual o setor têxtil viu sua participação na indústria cair pela metade, 
enquanto outros setores mais pesados ganharam relevância. 
 
52 
 
 
 
Tabela 4-8 - Mudanças na Estrutura Industrial Brasileira: 1939 - 1963 
Setor 1939 1949 1953 1963 
Minerais não metálicos 5,2 7,4 7,4 5,2 
Produtos de metal 7,6 9,4 9,6 12,0 
Maquinário 3,8 2,2 2,4 3,2 
Equipamento elétrico 1,2 1,7 3,0 6,1 
Equipamento de transportes 0,6 2,3 2,0 10,5 
Produtos de madeira 5,3 6,1 6,6 4,0 
Produtos de papel 1,5 2,1 2,7 2,9 
Produtos de borracha 0,7 2,0 2,2 1,9 
Produtos de couro 1,7 1,3 1,3 0,7 
Produtos químicos, farmacêuticos 9,8 9,4 11,0 15,5 
Têxteis 22,2 20,1 17,6 11,6 
Roupas e calçados 4,9 4,3 4,9 3,6 
Produtos alimentícios 24,2 19,7 17,6 14,1 
Bebidas 4,4 4,3 3,5 3,2 
Fumo 2,3 1,6 2,3 1,6 
Impressão e produtos gráficos 3,6 4,2 3,5 2,5 
Diversos 1,0 1,9 2,4 1,4 
Total 100 100 100 100 
Fonte: Baer, 2002, p. 87 
 
Após seis anos de forte expansão econômica e desenvolvimento da indústria, o 
país começou a perder fôlego no início da década de 1960. Essa desaceleração 
ocorreu em um ambiente politicamente conturbado que envolveu a eleição e renúncia 
de Jânio Quadros, em 1961,e a ausência de liderança do governo de João Goulart que 
foi deposto pelos militares três anos depois (BAER, 2002, p. 92). 
Assim, após o golpe de 1964, os militares assumem o poder, elegendo como 
Presidente o Marechal Castelo Branco (SCANTIMBURGO, 196, p. 271). Neste 
momento, a economia nacional já havia perdido todo impulso de crescimento do 
governo JK, tendo ficado estagnada em 1963. 
Com o intuito de desenvolver a economia, o novo governou realizou grandes 
investimentos em infraestrutura, com grandes obras em geração de energia, 
telecomunicações e transportes. Além disso, ampliou o papel do Estado na economia 
através da criação e fortalecimento de empresas públicas nos mais diversos setores 
(nos dez anos seguintes à instalação do regime militar foram criadas 121 estatais). Em 
1964, o Estado respondia por 28% dos recursos de investimento do Brasil. Cinco anos 
depois, essa fatia havia aumentado para 51% do total (CALDEIRA 2008, p. 175). 
53 
 
 
 
Santos (2008) destaca que a criação das estatais teve um papel importante no 
processo de industrialização e desenvolvimento econômico do Brasil, uma vez que 
envolveu grandes projetos, nos quais os empresários não tinham interesses, devido 
aos elevados investimentos, à falta de demanda inicial, aos prazos longos de 
maturação, aos riscos e à complexidade tecnológica. 
Finalmente, através do BNDE, o governo ampliou a sua participação bancária e 
se tornou a principal fonte de crédito para a indústria no país (REISS, 1980, p. 172). 
Em 1968, o Estado ampliaria ainda mais a sua participação na economia 
através da criação do Conselho Interministerial de Preços (CIP) que aumentou o 
controle estatal na definição dos preços a na alocação de recursos na economia. 
Legalmente, o Conselho não podia fixar preços, mas tinha poderes indiretos em 
questionar o reajuste de preços de empresas privadas, influenciando a dinâmica de 
competição dos mercados (BAER, 1985, p. 242). 
Dessa forma, as indústrias brasileiras passaram a ter concorrência tanto de 
empresas estrangeiras, como também, de companhias estatais. Na lista das maiores 
empresas do Brasil em 1980, por exemplo, estavam treze estatais, contra apenas 
quatro multinacionais e três grupos brasileiros (CALDEIRA, 2008, p. 210). 
Após um período de altas taxas de inflação no final da década de 1950 e no 
início da década de 1960, o governo militar também procurou combater a elevação de 
preços. Apesar disso, o país ainda conviveria com altas taxas de inflação durante toda 
a década (BAER, 1985, p. 180). 
Os resultados no campo do crescimento econômico também levariam alguns 
anos para aparecer. Entre 1962 e 1967, a economia cresceu em um ritmo médio de 
3,7% ao ano, bem inferior aos 6,7% obtidos no período entre 1956 e 1962. Somente a 
partir do final da década o país volta a ter um ritmo forte de crescimento e com maior 
estabilidade da inflação. Entre 1968 e 1974, o país viveu um boom econômico, 
alcançando uma média anual de crescimento de 11,3%. Esse período ficaria 
conhecido como “milagre econômico”. O índice de preços que beirou os 100% em 
1964, despencou para 20% no final dos anos de 1960 (BAER, 1985, p. 227). 
Neste período, as indústrias mais pesadas continuavam a ganhar mais espaço, 
enquanto setores tradicionais como o têxtil apresentavam resultados muito mais 
modestos. Destaca-se, ainda, a evolução da infraestrutura do país: a capacidade 
instalada de energia elétrica subiu de 6,8 milhões megawatts para 21,7 milhões no 
mesmo período; a taxa média anual de construção de estradas foi de 25% (BAER, 
2002, p. 95). 
O gráfico 4-5 mostra a evolução da produção e consumo de energia elétrica no 
Brasil. É possível verificar, ao final da década de 1960, o aumento significativo da 
54 
 
 
 
demanda que também é acompanhado da expansão da oferta. Vale destacar que 
durante a década de 1970 há uma redução do excedente de energia disponível para 
consumo, justamente no período no qual ocorrem os choques do petróleo. 
 
Gráfico 4-5 - Relação de Produção e Consumo de Energia Elétrica 
 
Fonte: Ipeadata 
 
Durante o milagre econômico, a indústria teve um crescimento ainda mais 
notável do que no período de JK (ver tabela 4-9). Isso foi possível graças a um 
excesso de capacidade alcançado no período de baixo crescimento entre 1962 e 
1967, quando a capacidade ociosa da indústria beirou 25%. Por outro lado, em 1972, 
a utilização da capacidade instalada já havia alcançado 100% (BAER, 2002, p. 96). 
 
Tabela 4-9 - Crescimento da Indústria entre 1957 e 1977 
Período Taxa Anual de Crescimento 
1957 – 1962 11,2% 
1963 – 1967 2,9% 
1968 – 1974 13,6% 
1975 - 1977 7,6% 
Fonte: Reiss (1980, p. 163) 
 
Outro fator apontado por Baer (2002, p. 102) como fundamental para o 
crescimento econômico foi o aumento do nível de poupança do país que subiu de 
0%
5%
10%
15%
20%
25%
0
50.000
100.000
150.000
200.000
250.000
300.000
350.000
400.000
450.000
500.000
1
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5
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1
9
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2
0
0
0
2
0
0
2
2
0
0
4
2
0
0
6
Produção (GWh) Consumo (GWh) % Disponível para Consumo
55 
 
 
 
17,5% do PIB em 1959 para 21% em 1973. No nível governamental, a variação deste 
percentual foi de 5,1% em 1959 para 8,4% em 1973. 
Esse crescimento ainda foi acompanhado de um aumento substancial dos 
investimentos diretos estrangeiros que subiram de uma média anual de US$ 84 
milhões entre 1965-69 para US$ 1 bilhão no período de 1973-76 (BAER, 2002, p. 97). 
Em 1973, no entanto, com o primeiro choquedo petróleo, o Brasil viu sua 
dinâmica de crescimento se alterar. O preço do produto quadriplicou e como o país 
importava 80% do petróleo que consumia, a manutenção do mesmo patamar de 
crescimento econômico exigiria o sacrifício das reservas cambiais e o aumento do 
endividamento do país (BAER, 2002, p. 109). 
O gráfico 4-6 apresenta o histórico da cotação internacional do Petróleo, no 
qual é possível identificar o grande aumento do preço da commotity durante os dois 
choques do petróleo da década de 1970. 
 
Gráfico 4-6 - Cotação Internacional do Petróleo (US$) 
 
Fonte: Ipeadata 
 
Com o objetivo de retomar a dinâmica de crescimento, o governo instituiu, em 
1975, o Segundo Plano Nacional de Desenvolvimento (PND II, 1975-79), cujos 
objetivos relativos à indústria eram a substituição das importações de produtos 
industriais básicos e de bens de capital (BAER, 2002, p. 110). 
Mesmo com a criação do PND II, o Brasil começou a enfrentar uma situação de 
crise a partir do final da década de 1970. Em 1979, o segundo choque do petróleo 
prejudicou novamente a balança de pagamentos brasileira. Além disso, o crédito 
internacional se tornou mais restrito, o que aumentou ainda mais o já crescente nível 
0,00
20,00
40,00
60,00
80,00
100,00
120,00
1
9
5
2
1
9
5
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0
1
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3
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6
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2
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1
9
8
8
1
9
9
1
1
9
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4
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9
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0
0
0
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0
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2
0
0
6
2
0
0
9
2
0
1
2
56 
 
 
 
de endividamento do país, levando a novas pressões por austeridade econômica 
(BAER, 2002, p. 114). 
A deterioração da economia brasileira acarretou na mudança do ministro da 
fazenda, com o retorno de Delfim Neto, que havia comandado a pasta na época do 
milagre econômico. Quando assume o ministério, Delfim institui algumas medidas de 
grande impacto na indústria, entre elas: Desvalorização do Cruzeiro em 30%; 
eliminação dos subsídios à exportação; e extinção da Lei dos Similares (BAER, 2002, 
p. 117). Se as duas últimas medidas tinham impactos aparentemente negativos para a 
indústria, por outro, o Cruzeiro mais fraco tornava o produto nacional mais competitivo 
no mercado internacional. O reflexo dessa política de câmbio pode ser visualizado no 
gráfico 4-7 que apresenta a evolução da balança comercial brasileira, no qual se 
verifica o aumento do saldo a partir da década de 1980. 
 
Gráfico 4-7 - Saldo da Balança Comercial entre 1970 a 1989 (US$ milhões) 
 
Fonte: Ipeadata 
 
Entretanto, as ações não foram suficientes para melhorar o cenário nacional. 
Após anos de forte atividade econômica, o Brasil teve crescimento negativo em 1981. 
Em 1983, o país já se encontrava oficialmente em recessão, com queda de 5,1% no 
PIB e de 11,7% no PIB per capita em relação ao início da década (BAER, 2002, p. 
125). A inflação que havia estado em patamares historicamente baixos para o padrão 
brasileiro sofreu uma disparada, superando a barreira dos 100% ao ano em 1980 e 
atingindo 224% em 1984 (BAER, 2002, p. 139). 
-10.000
-5.000
0
5.000
10.000
15.000
20.000
25.000
57 
 
 
 
Em 1984, após vinte anos de ditadura militar, o Brasil passava por um processo 
de democratização com a saída do último presidente militar, João Figueiredo. Todavia, 
com a morte de Tancredo Neves, o país seria governado pelo vice, José Sarney. 
Em relação ao aumento geral dos preços iniciado no final da década de 1970, 
Baer (2002, p. 150) afirma que houve dois mecanismos propagadores deste processo 
inflacionário. O primeiro era a existência de instrumentos financeiros (principalmente 
de obrigações do governo) que permitiam a indexação de preços e, assim, geravam 
um sistema de retroalimentação do processo inflacionário. O segundo decorria da 
capacidade de indústrias oligopolistas de repassar os preços para os seus 
consumidores. O autor destaca que na indústria têxtil, que era uma das mais 
pulverizadas, o reajuste de preços se deu com menor intensidade. Dessa forma, o 
autor propõe que nestes setores as empresas não sofreram com a alta dos custos. 
Pelo contrário, poderiam melhorar a sua lucratividade sem aumentar a produtividade. 
A ideia de uma inflação com um crescimento inercial levou à criação de um 
novo plano econômico e de uma nova moeda pelo governo Sarney em 1986, o Plano 
Cruzado, que previa um controle rígido sobre os preços. Nos primeiros meses houve 
reduções significativas na inflação que fechou o ano em 65% ao ano. Ao mesmo 
tempo, a indústria voltou a crescer acima de 10% (BAER, 2002, p. 171). 
Entretanto, o congelamento de preços gerou um desequilíbrio entre setores e, 
em pouco tempo, começou a haver uma escassez de oferta, devido à falta de 
investimentos e ao reajuste automático de salários que continuavam a ocorrer. Assim, 
a utilização da capacidade industrial que era de apenas 72% em 1984, subiu para 82% 
no segundo semestre de 1986 (BAER, 2002, p. 1978). 
Já no ano seguinte ao seu lançamento, houve uma derrocada geral do plano, 
com a inflação atingindo mais de 1.000% ao ano e com o governo declarando 
moratória após as reservas internacionais do Banco Central minguarem (BAER, 2002, 
p. 189). Após o fracasso do Plano Cruzado, o Governo Sarney ainda teria outros dois 
ministros da fazenda que realizaram novas tentativas de redução da inflação (Plano 
Bresser de 1987 e Plano Verão em 1989) e que incluíram novamente o lançamento de 
uma nova moeda, o Cruzado Novo. Contudo, as ações do governo tornaram a falhar e 
o país entraria em um período de hiperinflação e estagnação econômica que durou de 
1987 a 1992, com a economia crescendo a uma taxa anual média de 0,6% e a inflação 
alternando números de três a quatro dígitos (BAER, 2002, p. 195). 
Diante desse novo cenário, a retração da indústria foi evidente. O cenário só 
não foi pior, pois algumas empresas viram na desvalorização do Cruzeiro uma 
oportunidade para exportar os seus produtos. Houve um forte aumento na alocação de 
recursos em instrumentos financeiros em detrimento do setor produtivo durante a 
58 
 
 
 
década de 1980. Isto contribuiu para o declínio na atividade econômica e elevou a 
participação do setor financeiro no PIB de 8,5% para 19% (BAER, 2002, p. 198). 
Santos (2008) corrobora as constatações de Baer ao destacar que o 
investimento em bancos e em instituições financeiras foi uma estratégia empregada 
por grupos industriais como forma de proteção do patrimônio em meio à crise 
econômica. Surgiram nessa época bancos dos grupos Vicunha, Votorantim, Globo, 
Volks, Fiat, entre outros. 
A tabela 4-10 apresenta o crescimento industrial entre 1971 e 1989. É possível 
constatar que a indústria como um todo cresceu a altas taxas durante o início da 
década, atingindo o pico de crescimento em 1973. Nos anos seguintes, entretanto, 
verifica-se uma desaceleração substancial, apesar da recuperação pontual de 1976. 
Entre 1981 e 1983, o nível de atividade industrial declinou significativamente. Destaca-
se, entre os subsetores, o fraco desempenho das indústrias pesadas, que 
representavam o cerne dos negócios da Votorantim. Esse cenário negativo se 
estenderia por toda a década de 1980, com um longo período de estagnação 
econômica e altos índices de inflação. 
59 
 
 
 
 Tabela 4-10 - Taxas de Crescimento de Subsetores (1971-1989) 
Subsetor 1971 1972 1973 1974 1975 1976 1977 1978 1979 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 
Agricultura 10,2 4,0 0,1 1,3 6,6 2,4 12,1 -2,7 4,7 9,5 8,0 -0,2 -0,5 2,6 9,6 -8,2 15,2 1,5 2,9 
Indústria 11,8 14,2 17,0 8,5 4,9 11,7 3,1 6,4 6,8 9,3 -8,8 0,2 -5,9 6,4 9,0 11,7 1,1 -2,6 2,9 
Extrativa 3,6 2,4 - 23,2 3,0 2,8 -3,5 7,5 12,1 12,8 -2,5 6,9 15,5 30,5 11,6 3,7 -0,3 0,4 4,0 
Manufatureira 11,9 14,0 16,6 7,8 3,8 12,1 2,3 6,1 6,9 9,1 -10,4 -0,2 -5,9 6,2 8,3 11,3 1,0 -3,4 2,9 
Minerais não metálicos 4,4 13,8 16,3 14,8 9,0 12,4 7,1 5,6 5,9 7,7 -5,2 -2,8 -16,3 -0,2 8,0 17,2 2,3 -4,1 3,8 
Produtos de metal 12,8 12,39,4 5,2 9,2 9,6 6,6 5,4 8,2 12,5 -17,0 -3,7 -2,6 13,8 7,3 12,0 0,4 -3,3 5,0 
Maquinário 20,7 19,9 28,5 11,7 15,1 9,2 -6,7 1,7 7,7 14,5 -19,7 -17,3 -13,4 18,8 10,4 22,0 4,0 -8,6 5,0 
Equipamento elétrico 12,9 22,1 27,9 10,2 0,5 17,7 0,3 17,0 7,7 12,3 -15,4 2,8 -11,2 2,0 19,0 22,6 -2,2 -4,4 5,7 
Equipamento de transportes 24,8 22,5 27,6 18,9 0,5 8,7 -0,3 10,4 6,7 4,5 -22,9 -3,0 -6,7 4,6 11,7 12,5 -10,2 9,1 -2,8 
Produtos de papel 7,0 7,5 9,4 4,3 -14,8 21,0 2,4 11,2 13,2 11,2 -6,9 7,2 1,7 6,8 6,5 10,5 3,6 -1,6 5,6 
Produtos de borracha 12,9 13,0 22,3 18,2 4,7 11,1 -2,0 7,6 7,2 9,4 -14,6 -5,9 3,8 7,8 8,5 13,6 3,6 2,1 -1,9 
Produtos químico 12,1 17,0 23,4 5,4 2,5 16,2 5,3 7,5 9,4 5,0 -1,2 8,1 -1,5 9,6 6,2 1,5 5,5 -3,0 -0,3 
Perfumes, sabonetes e velas 19,8 9,1 6,6 11,5 3,7 15,2 -3,3 11,4 15,1 9,1 1,4 3,6 1,3 -1,1 15,9 20,0 12,3 -7,9 11,5 
Produtos plásticos 10,1 18,3 28,2 23,2 5,1 20,7 0,3 9,3 6,5 14,5 -20,9 9,1 -10,2 4,3 11,5 21,6 -4,2 -7,2 12,4 
Têxteis 16,6 3,8 6,9 -3,5 2,3 4,9 2,1 6,5 8,5 6,5 -13,7 5,0 -10,6 -3,6 13,5 13,5 -0,6 -6,1 0,5 
Vesturário e calçados -7,7 5,0 14,1 2,1 7,2 10,5 -0,6 7,7 5,1 10,7 -0,7 3,0 -15,1 2,2 6,4 7,3 -9,6 -6,9 1,9 
Produtos alimentícios 2,5 16,2 9,6 5,5 -0,1 12,8 6,6 -1,1 -0,4 8,4 2,7 1,3 3,3 -0,7 0,2 0,4 6,8 -2,4 1,3 
Bebidas 11,3 4,8 17,8 8,3 5,5 13,2 13,0 7,1 4,6 2,0 -7,6 -2,4 -5,1 -0,5 11,0 23,2 -3,4 2,2 14,7 
Fumo 4,9 6,0 6,4 12,8 7,9 9,2 8,2 5,8 7,5 -3,3 4,1 4,2 -1,7 3,3 11,7 7,5 2,1 1,0 5,1 
Construção 11,2 17,9 20,9 9,1 8,1 10,2 5,2 6,2 3,7 9,0 -6,0 -1,3 -14,2 0,6 10,9 17,5 1,1 -2,9 3,3 
Serviços 11,2 12,4 15,6 10,6 5,0 11,6 5,0 6,2 7,8 9,0 -2,2 2,0 -0,8 4,1 6,5 8,2 3,3 2,4 3,8 
Fonte: Baer, 2002, 482
60 
 
 
 
Em 1990, Fernando Collor de Mello assumiu a presidência enfrentando uma 
inflação com taxas mensais de 81%. Para contornar a “estagflação” que já durava 
desde 1987, o novo governo instituiu o Plano Collor I que tinha entre suas principais 
medidas: 80% de todos os depósitos de conta corrente, poupança e overnight que 
excedessem US$ 1.300,00 foram congelados por 18 meses, recebendo uma correção 
de 6% ao ano; introdução de uma nova moeda, o Cruzeiro; eliminação de incentivos 
fiscais para importação e exportação; liberação do câmbio e adoção de medidas para 
promover a abertura da economia brasileira; e criação de medidas para iniciar um 
processo de privatização. Como consequência, houve uma redução drástica da 
liquidez do país e a inflação baixou para uma taxa mensal de um dígito (BAER, 2002, 
p. 201). 
Entretanto, a brusca diminuição da liquidez reduziu ainda mais o já fraco 
desempenho econômico. Em decorrência disso, o governo começou a liberar muitos 
ativos financeiros bloqueados, sem, no entanto, ter uma norma estabelecida para isso. 
Assim, em pouco tempo a inflação começou a subir novamente (BAER, 2002, p. 203). 
Foi no governo do presidente Fernando Collor que foi concebido e executado o 
primeiro programa de privatizações, através do Programa Nacional de Desestatização. 
Esse plano foi replicado durante a década de 1990, quando várias estatais de diversos 
foram à leilão. A tabela 4-11 apresenta a relação das principais empresas privatizadas 
durante os anos 90. 
 
Tabela 4-11 – Principais Privatizações Realizadas Durante a Década de 1990 
Empresa Indústria Ano Governo 
Usiminas Siderurgia 1991 
Collor 
Acesita Siderurgia 1992 
Companhia 
Siderúrgica Nacional 
Siderurgia 1993 
Itamar Franco Cosipa Siderurgia 1993 
Açominas Siderurgia 1993 
Embraer Aviação 1994 
Light Energia 1996 
Fernando 
Henrique 
Vale do Rio Doce Mineração 1997 
Embratel Telefonia 1998 
Fonte: Russo (2013) 
 
Outros dois planos econômicos foram empreendidos durante o governo Collor, 
sem sucesso. Em 1992, envolvido em escândalos de corrupção e em crise política, o 
61 
 
 
 
congresso aprovou o impeachment do presidente, quando assumiu o vice-presidente 
Itamar Franco, que trocou de ministro da fazenda três vezes nos seus seis primeiros 
meses de mandato. O quarto ocupante do cargo foi Fernando Henrique Cardoso 
(FHC) que lançou um plano de austeridade chamado de “Plano de Ação Imediata”, 
cujo ponto básico era um corte nos gastos em todas as esferas do governo. Foi o 
primeiro movimento rumo a um novo plano de estabilização da moeda (BAER, 2002, 
p. 209). 
Nesta época, o Brasil completava seis anos de estagnação econômica (entre 
1987 e 1993 a taxa de crescimento média do PIB foi de 0,5%) com hiperinflação. Em 
1992, o PIB per capita real era 8% menor do que em 1980. Durante o período, o setor 
manufatureiro foi o q ue mais sofreu. A indústria de bens de capital teve a maior 
retração com média de -8,4% ao ano, seguido pelo setor de bens não duráveis (-
5,1%). O setor de construção civil, por sua vez, apresentou um desempenho médio 
anual de -1,1%. Já os investimentos fixos brutos que somaram 25% durante a década 
de 1970 declinaram para 14,5% em 1992. Por outro lado, com a política cambial 
favorável para as exportações, as vendas para o exterior cresceram a uma taxa média 
anual de 7,6% entre 1987 e 1992 (BAER, 2002, p. 211). 
No final de 1993, o ministro Fernando Henrique Cardoso propôs um novo 
programa de estabilização que consistia em dois pontos fundamentais: um ajuste fiscal 
e um novo sistema de indexação que levaria progressivamente a uma nova moeda. 
Assim, em julho de 1994, o governo introduziu oficialmente o Real. Vale destacar que, 
diferentemente dos planos econômicos lançados nos últimos anos, não houve no 
Plano Real um congelamento geral de preços. Os impactos iniciais da nova moeda 
foram positivos. A inflação caiu de 50,7% ao mês em junho, para 0,96% em setembro. 
Em 1996, a taxa anualizada chegou ao patamar de um dígito (BAER, 2002, p. 222). O 
gráfico 4-8 apresenta as taxas de inflação após o lançamento do Plano Real. 
Gráfico 4-8 - Inflação - IPCA (% a.a.) 
 
Fonte: Ipeadata, 2014 
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62 
 
 
 
O controle da inflação foi acompanhado por uma recuperação da economia que 
cresceu mais de 5% no ano de lançamento da nova moeda. A indústria que vinha 
sofrendo desde a década de 1980 com um baixo ritmo de crescimento, também teve 
um aumento anualizado, crescendo mais de 9% em 1994. Assim, a utilização da 
capacidade industrial pulou de 80% em julho de 1994 para 86% em abril do ano 
seguinte (BAER, 2002, p. 223). 
 Os primeiros anos do Plano Real ainda foram marcados por elevadas taxas de 
juro que tinham o intuito de atrair fluxos externos de capital para o Brasil. Essas altas 
taxas passaram a comprometer diretamente o desempenho industrial, na medida em 
que encareceram o crédito e reduziram o consumo e o investimento (SIQUEIRA, 
2000). Para Cano (2012), os elevados valores da taxa de juros oficial brasileira (Selic) 
fizeram com que os ganhos financeiros fossem mais atrativos do que os obtidos 
através da indústria, fazendo minguar o investimento produtivo, deixando, assim, a 
indústria brasileira vulnerável. O gráfico 4-9 apresenta a evolução das taxas Selic 
desde a implantação do Plano Real, no qual fica evidenciado que durante os cinco 
primeiros anos da nova moeda, o juro esteve recorrentemente a taxas superiores de 
20%, passando de 50% nos primeiros anos do Real. 
 
Gráfico 4-9 - Taxa de juros - Over / Selic - (% a.a.) 
 
Fonte: Ipeadata, 2014 
 
Além disso, as empresas exportadoras foram prejudicadas durante o período 
de câmbio fixo que vigorou de 1994 a 1999. A valorização artificial do Real reduziu a 
competitividade dos produtos brasileiros. Como resultado, a participação do Brasil nas 
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exportações mundiais caiu de cerca de 1,5% no início da década de 1980 para 0,8% 
no finalda década de 1990 (BAER, 2002, p. 226). O gráfico 4-10 apresenta o saldo da 
balança comercial entre 1990 e 2013, indicando a deterioração das exportações com o 
início do Plano Real. 
 
Gráfico 4-10 - Saldo da Balança Comercial entre 1990 e 2013 (US$ milhões) 
 
Fonte: Ipeadata 
 
No final da década, o país sofreu seriamente com as crises da Ásia (1997) e da 
Rússia (1998). Houve uma intensa fuga de capitais do Brasil e as reservas cambiais 
brasileiras minguaram em poucos meses. Em consequência desses problemas, a 
economia voltou a ficar estacionada, tendo crescimento nulo em 1998. (BAER, 2002, 
p. 237). 
Para evitar uma nova derrocada de um plano de estabilização, o Brasil recorreu 
ao Fundo Monetário Internacional (FMI) que lançou um pacote de auxílio econômico 
ao país. O Real, por sua vez, foi descolado do dólar, o que gerou uma desvalorização 
imediata de 40% da moeda nacional (BAER, 2002, p. 231). Os setores importadores 
tiveram perdas significativas, pois passaram a ter que lidar com preços bem mais 
elevados. Além disso, a inflação que vinha em uma trajetória decrescente voltou a 
subir em 1999. 
Baer (2002, p. 471) afirma, porém, que a desvalorização do Real em janeiro de 
1999 trouxe mais consequências positivas do que negativas para o Brasil. Os produtos 
brasileiros voltaram a ser mais competitivos, principalmente no Mercosul ,e a balança 
comercial que havia sido negativa em US$ 8,4 bilhões em 1997 teve um déficit de 
apenas US$ 0,7 bilhões em 2000. O autor ainda destaca o reaquecimento da 
economia que voltou a crescer (4,4% em 2000). 
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A partir de 1999, a política econômica brasileira passou a ser direcionada 
através de três pilares básicos: Regime de flutuação cambial; metas de inflação; e 
compromisso de manutenção de superávits primários (NASSIF & PUGA, 2004). 
Durante o ano de 2001, quando o país já apresentava sinais de melhora das 
turbulências enfrentadas no final do século, o Brasil se viu diante de uma crise de 
escassez energética. Para evitar um apagão geral, o governo lançou mão de um plano 
de racionamento de energia elétrica que, por sua vez, exerceu uma pressão negativa 
sobre o crescimento econômico e da indústria. Ao mesmo tempo, a Argentina, um dos 
principais destinos das exportações brasileiras, enfrentou uma grave depressão 
econômica. Além disso, houve os ataques terroristas de 11 de setembro que geraram 
impactos no cenário global como um todo. Como resultado, o país voltou a ter um 
crescimento modesto, de apenas 1,5% (BAER, 2002, p. 475). 
Em 2002, após oito anos de governo FHC, o Brasil passa por nova campanha 
presidencial. Durante as eleições, a tendência de que o candidato Luiz Inácio Lula da 
Silva, do Partido dos Trabalhadores, pudesse sair vitorioso ainda no primeiro turno 
gerou um temor no mercado que ficou conhecido como “risco Lula”. Havia um grande 
receio de que o candidato não honrasse os compromissos assumidos com o FMI e 
desse um calote na dívida (BENEVIDES, 2002). 
O reflexo disso foi uma disparada na taxa do dólar, conforme é observado no 
gráfico 4-11. Em 2001, a cotação que era de 1,97 em janeiro de 2001, chegou a 3,89 
às vésperas das eleições em setembro de 2002. Além disso, o risco-país, medido 
pelos C-Bonds, atingiu mais de 2.000 pontos-base em outubro de 2002, depois de 
estar em pouco mais de 700 pontos em março daquele ano (GIAMBIAGI et al, 2011). 
Gráfico 4-11 - Taxa de Câmbio (Real x Dólar) 
 
Fonte: Ipeadata 
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Apesar dos temores do mercado, Lula nomeou Henrique Meirelles, um 
banqueiro de carreira com prestígio internacional, para ocupar o cargo do Banco 
Central. Além disso, honrou os acordos realizados pelo governo anterior e tomou 
medidas de austeridade, acalmando o mercado financeiro (GIAMBIAGI et al, 2011). 
Os cinco primeiros anos do Governo petista, entre 2003 e 2008 foram 
marcados pelo crescimento econômico. Nesse período, a taxa média de expansão do 
PIB foi de 4,2%. Outro avanço se deu na relação investimentos/PIB que saltou de 
16,23% no primeiro trimestre de 2003, para 20,1% no terceiro trimestre de 2008 
(CURADO, 2011). 
Essa recuperação da economia brasileira ocorria na mesma época em que o 
mundo vivia o seu maior pico de crescimento desde a década de 1970, crescendo a 
uma taxa média de 4,9% entre 2003 e 2006. O forte movimento econômico levou a 
uma alta do preço das commodities. Entre as médias anuais de 2002 e 2008, os 
preços em dólar dos produtos básicos e semimanufaturados exportados pelo país 
crescerem 164% e 134%, respectivamente (GIAMBIAGI et al, 2011). 
À frente desse bom momento global estava a China que vinha apresentando 
uma taxa de expansão em torno de 10% ao ano (UOL, 2006), conforme apresentado 
no gráfico 4-12. 
 
Gráfico 4-12 - PIB da China em US$ - 1960 – 2013 
 
Fonte: Banco Mundial 
 
Com um grande apetite por commodities, a China viria a se tornar o maior 
parceiro comercial do Brasil em 2009, posição que era ocupada pelos EUA desde a 
década de 1930, atingindo 15,2% da pauta de exportações brasileiras em 2010, 
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conforme gráfico 4-13. As exportações cresceram a uma taxa média anual de 30% 
entre 2003 e 2008, saltando de R$ 48 para R$ 173 bilhões (RIBEIRO, 2009). 
 
Gráfico 4-13 – Participação das vendas para a China no total das exportações do 
Brasil 
 
Fonte: Giambiagi et al, 2011 
Com o reaquecimento da economia nacional, junto com um cenário mais 
positivo para as exportações, a composição do PIB brasileiro sofre algumas 
alterações, conforme pode ser observado na tabela 4-12. A agropecuária que vinha 
perdendo participação nas últimas décadas volta a ganhar fôlego. Destaca-se, 
também, o aumento do setor de extração mineral. 
 
Tabela 4-12 -- Participação dos Setores da Atividade Econômica no PIB em Anos 
Selecionados 
Setor 1980 1990 2000 2004 
Agropecuária 10,1 6,9 7,7 9,7 
Extrativa mineral 1,0 1,5 2,5 4,0 
Indústria de transformação 31,3 22,7 21,6 23,0 
Serviços Ind. de Util. Públ. 1,8 2,3 3,3 3,3 
Construção Civil 6,8 6,6 8,7 7,0 
Serviços 49,0 60,1 56,3 53,1 
Total 100,0 100,0 100,0 100,0 
Fonte: Nassif, 2006 
 
Os anos de forte crescimento da economia mundial foram interrompidos pela 
crise econômica que se iniciou no mercado imobiliário dos Estados Unidos e foi 
deflagrada para o mundo na quebra do Banco Lehman Brothers, em setembro de 
2008. 
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67 
 
 
 
Como reflexo da crise, houve congelamento dos mercados interbancários e 
financeiros internacionais, fuga dos investidores estrangeiros e, ainda, desmontagem 
das operações com derivativos cambiais realizadas pelas empresas que conduziram à 
rápida deterioração das expectativas dos bancos (FREITAS, 2009). Assim, em 2009, a 
economia brasileira teve retração de 0,33%. 
Freitas (2009) destaca, ainda, que como a crise atingiu a economia brasileira 
num momento de auge, no qualo país vinha passando por seis trimestres de contínuo 
crescimento, as empresas, em geral, planejavam investimentos para aumentar a 
capacidade produtiva. A escassez de crédito causada pela reversão das expectativas 
dos bancos gerou uma rápida desaceleração econômica e o aumento dos custos do 
crédito. Além disso, houve diminuição do comércio e das demanda mundiais, afetando 
significativamente as exportações das empresas brasileiras. 
Portanto, o colapso financeiro de 2008 impactou as empresas brasileiras em 
diversas frentes. Por um lado, reduziu a demanda interna, gerando excesso de 
capacidade e derrubando o nível de produção industrial. Por outro, a desvalorização 
do Real afetou as dívidas atreladas ao dólar, aumentando as despesas financeiras 
(FUNDAP, 2009). 
Apesar de apenas 20% dos produtos industrializados brasileiros serem 
direcionados para o mercado externo, a retração do comércio internacional respondeu 
pela metade dessa redução. Na indústria de transformação, esse valor chegou a 55% 
de retração. Em março de 2009, as exportações de produtos industrializados eram 
22% menor do que o patamar de setembro do ano anterior (BNDES, 2009). Já o preço 
das principais commodities, que representam cerca de 60% na pauta de exportação 
nacional, chegaram a ter uma queda de 20% durante o principal período de 
turbulência (BNDES, 2008). Nos últimos meses de 2008, a produção da indústria 
despencou e, em dezembro, registrou a maior queda histórica da série desde 1991: A 
produção caiu 12,4 % em relação ao mês anterior e 14,5% em relação a Dezembro de 
2007. 
Apesar de enfrentar a maior crise mundial desde 1929, o Brasil conseguiu 
superar rapidamente a recessão. Com uma política de estímulo à demanda e de 
expansão de crédito por parte dos bancos públicos, o país cresceu 7,5% em 2010 
(PASTORE et al, 2012). 
Entretanto, o país não conseguiu manter esse ritmo, crescendo a uma média 
de 2% nos anos seguintes. Já a indústria, também patinou nos últimos anos. Em 2011, 
a produção do setor teve um ligeiro avanço de apenas 0,3%. Em 2012, recuou 2,5% e, 
em 2013, não conseguiu recuperar as perdas do ano anterior, crescendo 1,2% 
(TERRA, 2014). 
68 
 
 
 
5 HISTÓRICO MATARAZZO 
Francesco Matarazzo nasceu em 1854 na cidade de Castellabate, na Sicília. 
Descendente de uma ilustre família italiana, o jovem Francesco teve que abandonar os 
estudos em Letras e Ciências no Liceu de Salerno para se dedicar ao trabalho, após a 
morte de seu pai (RUST, 1934, p. 1934). Na época, a Itália passava por uma série de 
problemas sociais e econômicos e, por isso, o italiano resolveu procurar por 
oportunidades no Brasil, onde compatriotas já haviam se estabelecido e começavam a 
fazer fortunas (ESTADÃO, 1937). Assim, aportou no Brasil em 1882 carregando uma 
experiência comercial na Itália, a instrução secundária completa, além de habilidade 
com números e na escrita. (COUTO1, 2004, p. 157). 
Ainda, trouxe consigo uma quantia em dinheiro e uma carga de banha de porco 
que seria vendida em terras nacionais. Entretanto, a mercadoria afundou quando a 
embarcação fazia uma parada na Baia de Guanabara, causando o primeiro grande 
prejuízo para o italiano. Após o incidente, Francesco se fixa em Sorocaba (que já 
vinha recebendo muitos imigrantes italianos) e estabelece um pequeno comércio. Em 
pouco tempo, o empresário percebe que o país importava uma grande quantidade de 
banha de porco. Assim, utilizando-se de sua experiência anterior no ramo, abre uma 
fabriqueta para produzir o produto e, logo depois, outras duas. Além disso, Matarazzo 
passa a percorrer toda a região comprando e vendendo os mais variados produtos 
(MARTINS, 1976, p. 18). 
Para Francesco, o sucesso do negócio estava em comprar os produtos o mais 
barato possível para poder revendê-los a um bom preço depois, sempre com uma 
margem superior à de seus concorrentes (MATARAZZO, 1982, p. 24). Outro motivo 
que contribuiu para o rápido sucesso do seu empreendimento nesse período está 
relacionado à introdução do sistema de compra e venda a prazo, até então uma 
inovação na região de Sorocaba (COUTO1, 2004, p. 161). 
Assim, obtendo escala cada vez maior, o empreendedor conseguia adquirir 
animais a preços mais baixos, revendendo, inclusive, para os seus concorrentes. 
Matarazzo também aprimorou o seu processo produtivo, ao desenvolver ele 
mesmo uma prensa para a fabricação da banha. Além disso, decidiu vender o produto 
enlatado (até aquele momento a comercialização era feita em caixas de madeira 
importada e, invariavelmente, se tornavam escassas). Com isso, deu mais um passo 
para se sobressair em relação à concorrência. A lata, além de conservar e proteger 
melhor o produto, possibilitava a comercialização a preços menores e de acordo com 
uma quantidade compatível ao consumo familiar (COUTO1, 2004, p. 181 e 183). 
69 
 
 
 
Nessa época, o empresário já dá os primeiros sinais do que viria a ser duas 
características marcantes dos seus negócios: A verticalização e o investimento em 
produtos de consumo. Assim, comprava os suínos, fabricava a banha e fazia a 
comercialização em seu armazém. Dessa maneira, se mantinha à frente de todas as 
etapas do negócio, reduzindo a dependência de fornecedores (COUTO1, 2004, p. 194). 
Em 1890, após a abolição da escravatura e já sob o regime da República, 
Francesco Matarazzo parte para São Paulo, que começava a se tornar uma cidade 
mais importante e que poderia lhe proporcionar mais possiblidades de crescimento. 
Indo na contramão da tendência dos investidores da capital que, incentivados pela 
política do Encilhamento, aplicavam o dinheiro em estabelecimentos industriais e 
bancários, Francesco decide migrar novamente para a importação e o comércio 
(COUTO1, 2014, p. 225). 
Vende, portanto, parte das unidades fabris de banha à nova Companhia 
Matarazzo, uma sociedade anônima composta por 43 acionistas, incluindo o próprio 
Francesco e seu irmão José. Francesco recebeu cerca de 70 contos de réis pelos 
seus ativos, precisando, assim, empatar apenas 28 contos pela participação de 10% 
na nova sociedade. Com o lucro obtido na operação, fundou com seu irmão André a F. 
Matarazzo & Cia Ltda., com sede na Rua 25 de Março, se destacando na importação 
de bens de consumo (MARTINS, 1976, p. 25). 
Quando Francesco Matarazzo chegou a São Paulo, a cidade era apenas a 
quinta capital brasileira em população (atrás do Rio de Janeiro, Salvador, Recife e 
Belém). Todavia, o momento para a migração não poderia ser mais propício. Nos dez 
anos seguintes a população iria quadruplicar, atingindo cerca de 240 mil habitantes 
(COUTO1, 2004, p. 243). 
Nesse período, ele se destaca no comércio paulistano, importando trigo e 
algodão dos Estados Unidos, além de comercializar arroz, massas, banhas, óleos, 
bacalhau e outros alimentos. Assim, ganha porte e reputação, e constrói o famoso 
palacete da família na recém-inaugurada Avenida Paulista (COUTO1, 2004, p. 263). 
Mas, é em 1900, quando funda a Moinho Matarazzo, que ele dá o importante 
salto de comerciante e importador para grande industrial. Na época, sua empresa 
importava farinha de trigo americana com a ajuda de crédito do banco British Bank of 
South America (VICHNEWSKI, 2004). Entretanto, a grande distância da viagem fazia 
com que muitas vezes o produto chegasse ao Brasil em más condições de consumo, o 
que fez o empresário cogitar a possibilidade de produzir a farinha em terras nacionais 
(ESTADÂO, 1937). 
Assim, seu objetivo era importar o trigo e moê-lo, substituindo a importação da 
farinha pela do cereal. Esse foi o pontapé inicial para expansão do grupo. Para isso, 
70 
 
 
 
Francesco Matarazzo conseguiu um crédito junto aos banqueiros ingleses que era alto 
até mesmo para os seus padrões. (COUTO1, 2004, p. 268). Com maquinários 
adquiridos na Inglaterra e ajuda de técnicos ingleses, rapidamente o Moinho 
Matarazzo passou a ser o líder no mercado de SãoPaulo, superando os moinhos 
Gamba e Santista (BARDESE, 2011). 
A escolha do local para a construção da primeira unidade industrial da 
Matarazzo levou em conta a proximidade com a ferrovia Santos–Jundiaí, que facilitaria 
o transporte do trigo entre o porto de Santos e seus depósitos. Além disso, havia 
energia abundante provida pelo rio Tamanduateí. Finalmente, a região era um reduto 
da imigração italiana, o que garantiria uma grande oferta de mão de obra (BARDESE, 
2011). Rodrigues e Vilela (2013) destacam que no início do século XX os estrangeiros 
chegaram a compor 80% de toda a mão de obra das fábricas Matarazzo. 
Foi a partir do moinho que se deu o desdobramento das atividades industriais 
da organização. Inicialmente, a partir dos negócios já existentes, através da integração 
vertical. O moinho dispunha de uma unidade de fabricação de sacaria para 
acondicionamento da farinha. Em 1901, o excesso de capacidade de produção de 
sacos fez com que a Matarazzo transformasse a seção na Tecelagem de Algodão 
Mariângela para produzir, inicialmente, produtos mais toscos como sacos de aniagem 
para revenda. Porém, logo a unidade começaria a fabricar tecidos para vestuário 
(COUTO1, p. 286). 
Esse desdobramento das atividades produtivas e a consequente abertura de 
novas fábricas denotaria uma característica muito forte do modelo de crescimento da 
Matarazzo. Anos mais tarde, ele destacaria para o seu biógrafo sobre a importância da 
produção para a sua organização: 
 
“Capital grande só serve para enganar a humanidade. O que é 
preciso é crédito e trabalho. Não se deve preocupar com o dinheiro: a 
produção é que importa. Produzir para as necessidades do país. No 
Brasil toda a indústria tem que ser produtiva e será, por isso, 
rendosa” (RUST, 1934). 
 
No final da década, Francesco Matarazzo iria aprimorar a fábrica de tecelagem 
e instalar um equipamento de fiação, além de uma seção de tinturaria e outra de 
estamparia. De acordo com Dean (1971, p. 70) a estamparia da Matarazzo foi a única 
paulista que operou lucrativamente antes da Primeira Guerra Mundial. Dessa forma, 
apesar do desenvolvimento do grupo industrial ter se iniciado com o moinho de trigo, a 
tecelagem se tornaria o seu principal negócio (REISS, 1980, p. 28). 
Uma reportagem do jornal O Estado de São Paulo (1909) demonstra a 
dimensão da fábrica Mariângela: 
71 
 
 
 
 
“Às 11 horas da noite, mais ou menos, estava funcionando com toda 
a regularidade uma seção da fiação dirigida pelo sr. Maffei, com cerca 
de 400 operários, entre homens mulheres e crianças [...] A fábrica de 
tecidos funciona com 1.300 teares, movidos por um motor de 150 
cavalos, e com cerca de dois mil funcionários, está segurada em 
várias companhias em elevadíssima quantia”. 
 
O texto do Estadão destaca a presença de crianças na fábrica, o que não era 
incomum para a época. Chegou-se a encontrar máquinas têxteis com a metade do 
tamanho para que elas pudessem utilizá-las. Vale destacar, ainda, que acidentes eram 
frequentes na época, o que fez a empresa contratar um seguro contra acidentes para 
os operários do moinho em 1910 (ESTADÃO, 1910). 
Além da sacaria, o moinho ainda tinha uma seção para conserto de peças e 
estoque de sobressalentes da unidade fabril. Em 1902, essa oficina de manutenção é 
ampliada e transformada em metalúrgica com o objetivo de fabricar latas para as 
embalagens de seus produtos. Posteriormente, a unidade começaria a produzir 
brinquedos, artigos de alumínio e utensílios de cozinha (ESTADÃO, 1937). 
No mesmo ano, para depender menos do algodão, montou a própria 
descaroçadora para abastecer a fábrica têxtil. As sobras de caroços, por sua vez, 
levam à produção de óleo de algodão. Assim, em pouco tempo, a Matarazzo 
consegue o monopólio do processo de desodorização do óleo e começa a produzir 
óleos vegetais e glicerina. A partir disso, migra para a indústria do sabão. Esse 
produto, demanda a soda cáustica e, por consequência, Francesco começa a vender 
este item em pequenas latas (MARTINS, 1976, p. 31). 
Dessa forma, estão prontos os alicerces dos três primeiros pilares industriais 
do grupo Matarazzo: Moagem de trigo, tecelagem e fabricação de óleos. Estes seriam 
o referencial básico da expansão e diversificação do grupo, mediante verticalização 
das atividades. Para cima e para baixo. Isto é, no sentido dos insumos e, também, dos 
produtos (COUTO1, 2004, p. 287). 
O empreendedor enfrentou, por outro lado, um revés durante esse período. Em 
1906, Francesco comprou uma fábrica de fósforos. Entretanto, ao contrário dos outros 
setores, este já contava com uma concorrência mais acentuada, com vinte e oito 
empresas, entre elas uma estrangeira, a Fiat Lux, que se recusou a participar de 
várias tentativas de cartelização do setor. Assim, a empresa sueca acabou comprando 
diversas empresas, entre elas, a de Matarazzo. (REISS, 1980, p. 28). 
Ainda no início do século, Francesco Matarazzo participou da sociedade de 
instituições financeiras que lhe adicionaram fontes de capital expressivas para sua 
expansão. Primeiro, entrou como sócio do Banco Commerciale Italiano di São Paulo, 
72 
 
 
 
fundado em 1900, e encerrado dois anos mais tarde. Depois, abriu o Banco Italiano 
del Brasile, fundado em 1905, e que teve seus ativos incorporados pelo Banco 
Commerciali Italo-Brasiliano, fundado por Francesco Matarazzo em 1907 (MARTINS, 
1976, p. 32). Através do banco, o empresário conseguiu se tornar o responsável pelas 
remessas de dinheiro dos italianos para o seu país. Assim, passou a controlar uma 
grande quantia de dinheiro que se tornou uma importante fonte de financiamento para 
a expansão dos seus negócios (REISS, 1980, p. 30). 
Em 1911, a F. Matarazzo & Cia é transformada em sociedade anônima, criando 
oficialmente a Indústrias Reunidas Fábricas Matarazzo (IRFM). A criação da IRFM 
também instituiu oficialmente o lema da empresa: Fides, Honor, Labor - Fé, Honra e 
Trabalho (MATARAZZO, 1982, p. 33). 
É possível verificar pelos dados patrimoniais do Grupo, apresentados na tabela 
5-1, a importância das unidades de trigo e de tecelagem que juntas representavam 
mais de 80% do patrimônio da IRFM na época. 
 
Tabela 5-1- Patrimônio da IRFM em 1911 
Fábrica 
Patrimônio 
(em Réis) 
% do Total 
Fábrica de fiação, tecelagem, malharia e tinturaria 4.900:000$ 57,6% 
Moinho de trigo (com depósitos e armazéns) 2.000:000$ 23,6% 
Fábrica de óleos e sabão 700:000$ 8,2% 
Prédio da administração central 400:000$ 4,7% 
Engenho de beneficiar arroz 160:000$ 1,9% 
Armazéns para inflamáveis 140:000$ 1,6% 
Estamparia de tecidos (em construção) 100:000$ 1,2% 
Cocheiras 50:000$ 0,6% 
Depósitos e armazéns 40:000$ 0,5% 
Fábrica de banha em Itapetininga 10:000$ 0,1% 
Total 8.500:000$ 
Fonte: Martins, 1976, p. 35 
 
Apesar de ser uma sociedade anônima, a IRFM tinha o capital totalmente 
concentrado entre Francesco e seu irmão Andrea, conforme pode ser observado no 
gráfico 5-1. 
 
 
 
 
73 
 
 
 
Gráfico 5-1 - Distribuição do Capital da IRFM 
 
Fonte: Vilela e Rodrigues (2013) 
 
O estatuto estabelecido para a nova companhia ainda previa a destinação dos 
lucros da seguinte forma (RODRIGUES & VILELA, 2013): 
 
“Dos lucros líquidos apurados nos balanços anuais, seriam deduzidas as 
seguintes verbas, sendo que o saldo remanescente era distribuído como dividendos 
aos acionistas:” 
 5% para a conta do fundo de reserva; 
 7% calculada sobre o valor dos imóveis, móveis e máquinas para ser levada à 
conta de depreciação dos mesmos; 
 5% destinado à conservação e aumento de fábricas; 
 10% para a diretoria a título de pró-labore, sendo 6% para o presidente e 2% 
para cada um dos diretores; 
 0,5% para ser levada a um fundo de auxílios e previdência destinado à 
beneficiar os empregados da companhia e suas famílias, em caso de 
enfermidade ou morte.” 
 
A Diretoria da IRFM era composta por Francesco, seu irmão e seu filhoErmelino, conforme é mostrado na figura 5-2. O Grupo ainda contava com um 
Conselho Fiscal composto por três pessoas. 
 
 
Andrea 
Matarazzo; 
19,94% 
Outros 
(familiares e 
funcionários); 
0,30% 
Francesco 
Matarazzo; 
79,76% 
74 
 
 
 
Figura 5-1 - Composição da Diretoria da IRFM 
 
Fonte: Vilela e Rodrigues (2013) 
 
As atribuições dos diretores estavam assim divididas (VILELA & RODRIGUES, 2013): 
 
“Diretor Presidente 
a) Presidir as sessões da diretoria, executar e fazer executar as suas 
deliberações e as da assembleia geral; 
b) Convocar a diretoria e o conselho fiscal, quando julgar conveniente; 
c) Rubricar, abrir e encerrar os livros das atas da assembleia geral, da diretoria e 
do conselho fiscal; 
d) Nomear procuradores, que poderão gerir a sociedade, cada um de por si ou 
coletivamente, a juízo do mesmo diretor presidente. 
e) Representar a sociedade em juízo em todas as ações por ela intentadas ou 
contra ela movidas; 
f) Celebrar contratos e assumir encargos e obrigações pela sociedade, inclusive 
títulos de crédito e de comércio, pela forma e condições que as operações 
exigirem e o interesse da sociedade aconselhar; 
g) Delegar todos estes poderes ao diretor-gerente, quando tiver de se ausentar. 
 
Diretor Gerente 
a) Dirigir e inspecionar os trabalhos de construção do edifício e montagem dos 
necessários equipamentos, até sua completa instalação e funcionamento 
(assim como os aumentos e melhoramentos que a diretoria resolver fazer), 
estando sempre à testa das obras; e, depois delas concluídas, transferir para lá 
a sua residência efetiva, e assumir a gerência da empresa, dirigindo-a 
conforme for deliberado pela diretoria; 
b) Nomear e demitir empregados auxiliares, de acordo com os outros diretores; 
Francesco 
Matarazzo 
Diretor Presidente 
Ermelino 
Matarazzo 
Diretor Gerente 
Andrea 
Matarazzo 
Diretor Secretário 
75 
 
 
 
c) Dirigir o escritório e todas as operações comerciais e industriais de interesse 
da sociedade, deliberadas pela diretoria; 
d) Intervir nas questões de administração na ausência do presidente, ou por 
determinação deste; 
e) Mandar, quinzenalmente, à sede administrativa em S. Paulo, relatório do 
movimento da empresa, conforme a diretoria determinar; não podendo ocupar-
se em negócios estranhos ao interesse da sociedade.” 
 
Vale ressaltar que a criação de um grupo unificado demarcou mais uma vez o 
perfil de verticalização e centralização da Matarazzo, conforme foi destacado por 
MARTINS (1976, p. 56): 
 
“A constituição das Indústrias Reunidas Fábricas Matarazzo, em 
1911, denotava a burocratização dos serviços e a centralização do 
poder num escritório central, o que implicava num estilo de 
dominação interna marcada pela diluição de poder nos diversos 
cargos hierárquicos mediante regulamentação. Porém, o poder não 
só foi centralizado, mas também concentrado na pessoa de 
Francisco, que, ao invés de especializar-se no exercício da 
autoridade, procurou manter o mesmo estilo de controle inerente à 
pequena empresa e à dominação familiar”. 
 
Na época da criação da IRFM, Francesco Matarazzo já era o principal industrial 
brasileiro. Uma matéria do Estadão sobre a evolução da indústria de São Paulo 
dedicou duas páginas às unidades do seu grupo, na qual destacava a importância dos 
produtos Matarazzo para o cotidiano das pessoas na época. 
 
“O seu feliz sucesso não tem sido talvez devido senão ao fato de 
todas as indústrias, por ele exploradas, fazerem parte integrante de 
nossas necessidades imediatas” (Estadão, 1911). 
 
No mesmo ano em que criou a IRFM, a Matarazzo instalou a sua primeira 
grande usina de açúcar. Além disso, o alto consumo de madeira para a construção e 
instalação de suas unidades levou à criação de serrarias e carpintarias próprias. Em 
1912, pelo mesmo motivo, passou a fabricar pregos. Ainda, inaugurou a Tecelagem e 
a Amideria Belenzinho, que levou às plantações de mandioca e abertura de uma 
fecularia (COUTO2, 2004, p. 22). 
A partir daí, o crescimento foi marcado pela ampliação das atividades e 
expansão geográfica principalmente nos setores onde o grupo já atuava, com exceção 
de uns poucos negócios como a Sociedade de Navegação Paulista Matarazzo Ltda, 
que detinha uma frota própria de navios que transportava trigo da Argentina para 
Santos (COUTO2, 2004, p. 4). Anos depois, a Matarazzo também expandiria sua 
76 
 
 
 
atuação no transporte a partir da compra de vagões e locomotivas próprias, como 
pode ser observado no relato de um funcionário para a Revista Síntese (1949, p. 122): 
 
“Exportávamos madeiras para a Argentina, de Antonina, e 
mandávamos boa parte a São Paulo para o uso das próprias 
Indústrias. O transporte era feito com locomotivas e vagões próprios 
da firma. Começamos com cerca de 10 vagões, empregando, em 
seguida, mais de uma centena de vagões (170) e locomotivas 
próprias. Tínhamos um contrato para circulação nos trilhos da 
Sorocabana e da São Paulo – Rio Grande. Alcançamos, em média, 
um movimento de 200 vagões por mês. Os nossos vagões frigoríficos 
faziam cerca de 260 viagens, anualmente, entre o Sul e São Paulo, 
somente para o transporte de produtos resfriados”. 
 
Segundo Dean (1971, p. 72), apesar do crescimento, o grupo Matarazzo 
mantinha uma política de revender os seus produtos diretamente para os varejistas. 
De acordo com o historiador, a organização tinha durante a década de 1930 cerca de 
45.000 contas, sendo que ainda havia uma preferência por se trabalhar com as 
pequenas companhias ao invés das grandes. Para Francesco, além de serem mais 
leais, as perdas que acarretavam quando falhavam eram insignificantes. 
Apesar do elevado número de contas e de empresas, a gestão do grupo 
parecia ocorrer de maneira informal e centralizada, conforme relatos do próprio 
Francesco Matarazzo: 
 
“Eu conservo o hábito de receber a todos os chefes dos diversos 
departamentos, diariamente neste gabinete, examinando lhes as 
pastas e emitindo minha opinião sobre diferentes negócios. Tenho 
uma vantagem sobre eles: minha memória continua a mesma amiga 
fiel de cinquenta anos atrás. Enquanto os auxiliares fazem cálculos 
com o auxílio do lápis ou da pena, eu os realizo mentalmente” 
(MARTINS, 1976, p. 57). 
 
Décadas depois, Maria Pia Matarazzo, neta do fundador e quarta pessoa a 
comandar o grupo endossaria o método de administração estabelecido pelo patriarca. 
 
“Controle exige olho! Por exemplo: meu pai dizia que nas unidades se 
controlava o gasto por intermédio do vapor. Excesso de vapor no ar, 
perda de dinheiro. A caldeira era a base do controle econômico da 
unidade” (COUTO
2
, 2004, p. 240). 
 
Pouco antes da eclosão da Primeira Guerra Mundial, Francesco já havia 
começado a transferir gradativamente a gestão do grupo para o seu filho Ermelino. 
Assim, em 1914, ele foi para a Itália descansar e passou o comando da IRFM para 
Ermelino, então com 31 anos. Ele não era o filho mais velho, mas foi o primeiro 
nascido no Brasil e, assim, foi escolhido para prosseguir com os negócios da família - 
o Anexo 4 apresenta a árvore genealógica da família de Francesco Matarazzo. Dessa 
77 
 
 
 
forma, foi enviado pelo pai para a Suíça onde estudou dos sete aos dezoito anos, além 
de ter realizado estágios na Alemanha, Inglaterra e França (Martins, 1972). 
Durante o período da Guerra, a IRFM estava em posição privilegiada. O seu 
ponto forte, produtos básicos e essenciais ao consumidor, continuaram a ter alta 
demanda. Além disso, apesar dos conflitos, o grupo conseguiu manter o acesso aos 
seus principais insumos. Boa parte das matérias primas utilizadas eram de 
procedência nacional e quando não eram, como era o caso dos moinhos, havia a 
opção de comprar de outros países que não estavam em guerra, como a Argentina 
(COUTO2, 2004, p. 38). Vale destacar que foi durante guerra que Francesco 
Matarazzo recebeu o título de Conde pelos serviços prestados à Itáliadurante o 
período de conflito (COUTO2, 2004, p. 34). 
Em 1916, a Matarazzo compra a Companhia de Fábricas Pamplona que tinha 
linhas de produção de sal, graxa, óleos e velas. Na mesma época, investe em novos 
moinhos de trigo, usinas de açúcar e refinarias de sal (REIS, 1980, p. 31). 
Nesses anos, Ermelino, que estava à frente do Grupo, também realizou um 
grande investimento no Sul do país, criando as Indústrias Matarazzo do Paraná. Em 
1904, seu pai havia adquirido terras na cidade litorânea de Antonina, situada a 90 km 
de Curitiba. Assim, dez anos depois, Ermelino anunciou a criação da nova empresa e 
a subscrição de ações com o objetivo de construir um moinho de trigo no local. O 
moinho foi inaugurado em 1917 com capacidade de produção de mil sacos de farinha 
por dia e uma estrada de ferro ligando a unidade à cidade (ESTADÃO, 1917). 
Diferentemente da IRFM na qual havia total concentração de capital, a 
Indústrias Matarazzo do Paraná tinha diversos sócios, cuja divisão de capital, é 
apresentada no gráfico 5-2. 
É importante frisar que durante essas décadas a indústria nacional era 
incipiente e, com uma população crescente, a Matarazzo se aproveitou de uma 
demanda crescente por produtos de consumo. 
 
“(Cláudio) Bardella lembra que Matarazzo entrou principalmente em 
consumo de massa: banha, tecidos, farinha de trigo, óleos 
comestíveis, sabonetes, etc. Isto é, em “non tradeables”. Assim, 
praticamente não tinha de enfrentar a competição internacional. 
Geralmente, o próprio custo do frete internacional bastava para 
proteger a produção interna” (COUTO
2
, 2004, p. 335). 
 
 
 
 
78 
 
 
 
Gráfico 5-2 - Distribuição do Capital da Indústrias Matarazzo do Paraná 
 
Fonte: Vilela e Rodrigues (2013) 
 
Outro ponto importante sobre essa fase da IRFM é destacado por Reiss (1980, 
p. 41) que afirma que conforme o Conde investia em novas indústrias, ele não 
abdicava de seus estabelecimentos comerciais. Pelo contrário, o comércio se tornava 
ainda mais importante, aumentando as redes de negociação do grupo e criando novas 
oportunidades para produção de novos produtos. 
Na visão de Francesco Matarazzo, as oportunidades existentes no país eram 
grandes o bastante para que fosse possível criar uma organização tão extensa: 
 
“A fantástica extensão do Brasil é imensamente favorecida pela 
natureza. Seu destino está ligado à riqueza do seu solo. Os campos 
estão à espera de serem cultivados e as matérias-primas de serem 
exploradas e transportadas para as fábricas. O país deve ser agrícola 
e industrial; deve não apenas emancipar-se do exterior, mas também 
exportar o excesso de suas necessidades de consumo; nenhum 
produto deve pesar na balança como débito com os países 
estrangeiros, porque tudo o Brasil pode produzir” Francesco 
Matarazzo (COUTO
1
, 2004). 
 
 
De acordo com Reiss (1980, p. 32), apesar de serem imprecisos, os lucros 
obtidos pela IRFM foram: em média 4.800 contos entre 1912 e 1913 e 7.300 contos 
entre 1914 e 1919. 
Ermelino 
Matarazzo; 
58,50% 
Francesco 
Matarazzo; 
9,30% 
Andrea 
Matarazzo; 4,70% 
Irmãos Nicola e 
Costabile 
Matarazzo; 3% 
A. Monesi; 13,30% 
Funcionários; 
1,90% 
Outros; 
9,30% 
79 
 
 
 
No início da década de 20, Francesco Matarazzo era o maior industrial 
brasileiro. Poderoso e reconhecido, comandava um grande conglomerado com mais 
de uma centena de empresas que atuavam em setores diversos. O empresário 
também era o presidente do Centro da Indústria de Fiação e Tecelagem de Algodão 
de São Paulo (CIFTSP), posição que assumiu na fundação da instituição em 1919 e 
iria ocupar até 1926. 
Nos últimos anos, Ermelino, o primeiro filho brasileiro de Francesco, já vinha 
comandando o grupo. Porém, um trágico acidente automobilístico ocorrido na Itália em 
1920 interrompeu o plano de sucessão e exigiu que o fundador retomasse as rédeas 
dos negócios. Assim, Francesco começa a preparar o seu filho Francisco Matarazzo Jr 
(o Chiquinho), então com dezenove anos, para assumir a direção. Quatro anos mais 
tarde, ele seria eleito diretor-geral da IRFM, se tornando o segundo homem no poder 
(COUTO2, 2004, p. 195). 
De acordo com relato de Ferdinando Matarazzo, neto de Francesco e número 
três na escala de poder da IRFM na época, após a morte de Ermelino o conde não 
tinha muitas opções para a sucessão: 
 
“Meu avô se apoiou muito no Ermelino. A morte do filho foi para ele 
uma tragédia total. Meu pai (Giuseppe) morava em Nápoles. O Attilio 
não gostava muito de indústria, era mais de vender, de comércio. O 
Andrea tinha preparo relativamente modesto. O Luiz Eduardo era 
muito novo, estudava. O Chiquinho tinha vinte anos. Estava lá e tinha 
interesse em trabalhar na indústria. Então começou a trabalhar com 
meu avô e ficou” (COUTO
2
, 2004, p. 194). 
 
Nessa época, duas estratégias aparentemente antagônicas passam a ser 
empreendidas pelo grupo. A primeira é a desconcentração espacial. As fábricas 
estavam concentradas principalmente na região metropolitana da capital. Dessa 
forma, Francesco perseguiu uma estratégia de expandir suas operações para o resto 
do Brasil, intensificando o processo iniciado com a criação das Indústrias Matarazzo 
do Paraná. Segundo Couto2 (2004, p. 63), um importante passo desta vertente é dado 
com a instalação, em 1920, de um frigorífico modelo para o abate de suínos na cidade 
de Jaguariaíva, no Paraná. Esta passou a ser a maior operação desse tipo no Brasil e 
uma resposta clara à entrada das americanas Swift e Armour no mercado nacional e 
que há dois anos estavam exportando carne brasileira. 
A unidade tinha localização estratégica próxima a uma ferrovia a ao principal 
centro de criação de porcos da região. Todo o maquinário foi importado da Europa e 
dos Estados Unidos com total isenção de impostos. Além disso, a energia elétrica era 
produzida em uma usina própria. 
80 
 
 
 
Além da expansão para o Sul, a Matarazzo também adquire a Fazenda Amália, 
em Santa Rosa do Viterbo no interior de São Paulo, local que proporcionou a 
expansão do grupo para a agroindústria (VILELA & RODRIGUES, 2013). De acordo 
com o entrevistado 1, a propriedade tinha aproximadamente vinte mil alqueires e 
abrangia cinco municípios. 
Todavia, ao mesmo tempo em que buscava a expansão geográfica do seu 
grupo, Francesco Matarazzo reconhecia a importância da integração, além dos 
ganhos de sinergia e escala originários desse processo. Diante de um sistema de 
transporte tão precário, a concentração das unidades fabris em um único local 
aumentaria a eficiência e reduziria os custos logísticos. Dessa forma, o empresário faz 
uma prospecção de terras e encontra um vasto terreno localizado no bairro da Água 
Branca, sede da antiga fábrica de cerveja da Companhia Antarctica Paulista e que era 
servida com estradas de ferro (ESTADÃO, 1937). 
Assim, adquire todo o terreno e, ainda em 1920, transfere para lá as fábricas 
de sabão, velas, glicerina, pregos, uma refinadora de açúcar e duas fábricas de óleos. 
Três anos depois, conclui a construção de um sistema ferroviário interno que 
interligaria as plantas. O local ficaria conhecido como Parque Industrial da Água 
Branca e nos anos seguintes reuniria ainda mais negócios da organização em um 
mesmo espaço. 
 
“Por algum tempo, terá espaço de sobra para fabricar fábricas [...] O 
núcleo industrial da Água Branca marca o auge da concentração 
pontual e da integração vertical de atividades das IRFM” (COUTO
2
, 
2004, p. 62). 
 
A partir daí, mais diversificação. Em 1922, é fundada a Fábrica de Licores e 
uma distribuidora de filmes. No mesmo ano, o grupo participa da Exposição 
Internacional do Centenário da Independência Nacional, no Rio de Janeiro, onde 
muitos produtos da IRFM ganham destaque, recebendo diplomas e medalhas. No ano 
seguinte, começa a produzir rícino e ácido sulfúrico que, por sua vez, passa a ser 
utilizado na fabricação de inseticidas. Em 1924, instala um curtume, comprauma 
fábrica de conservas de carne e outra de sabão e também começa a extrair e produzir 
diversos óleos comerciais (como o de babaçu e amendoim) e outros industriais para 
utilização em suas fábricas (COUTO2, 2004, p. 65). 
Em 1924, a Revolta Tenentista, um dos maiores conflitos bélicos da história da 
cidade de São Paulo afeta as operações da IRFM. Unidades são atingidas e sofrem 
com incêndios e saques. Por isso, novos investimentos são suspensos nesse ano e 
somente aqueles já iniciados são levados adiante (MATARAZZO, 1982, p. 49). 
81 
 
 
 
Um desses investimentos é a SA Industrial Matarazzo de Mato Grosso que foi 
criada com o objetivo de industrializar e comercializar pele e gordura de jacaré e de 
capivara. Contudo, o negócio gerou um prejuízo de 800 contos e foi encerrado em 
pouco tempo (COUTO2, 2004, p. 78). 
Além deste, duas grandes unidades industriais são concluídas. Uma laminação 
que é instalada dentro do Parque Industrial da Água Branca e uma metalúrgica que é 
criada no bairro do Brás, também em São Paulo. Vale ressaltar, no entanto, que essas 
empresas seriam desmembradas do grupo e entregues à Ciccillo Matarazzo, filho de 
Andrea, principal sócio e irmão de Francesco, que havia recusado uma oferta de atuar 
na direção do grupo após a morte de Ermelino. Andrea argumentara que como não 
poderia indicar seus filhos para lhe sucederem na presidência, não haveria porque 
assumir o comando da organização. A IRFM passaria, então, a ser cliente destas duas 
unidades (COUTO2, 2004, p. 81). 
Em 1925, o grupo já tinha diversas filiais espalhadas pelo Brasil, América do 
Sul e até nos Estados Unidos. As fábricas abrangiam o setor de alimentos, têxtil, 
metalurgia, serviços, entre outros. E mais: tinha fazendas, terrenos e prédios urbanos, 
estradas de ferro, navios a vapor, além de representar o Banco di Napoli e a Fiat 
(COUTO2, 2004, p. 98). Além disso, a IRFM ocupava uma área de 8.760.000m2 e 
empregava sete mil funcionários (MATARAZZO, 1982, p. 52). 
Em 1926, a Matarazzo consolida sua posição na indústria química ao fundar a 
Viscoseda para produzir seda artificial, mantendo o monopólio na produção do rayon, 
que tinham como principal objetivo suprir as fábricas têxteis de Água Branca. A IRFM 
solidifica, assim, o seu tripé alimentos, têxteis e químicos, que seriam a principal fonte 
de crescimento do grupo nas décadas seguintes. A nova fábrica empregava mais de 
1.500 funcionários em uma área de 60 mil metros quadrados (COUTO2, 2004, p. 104). 
A implantação da Viscoseda exigiu, ainda, avanços tecnológicos nos processos 
produtivos e laboratórios de maior precisão (ESTADÃO, 1937). 
Ainda em 1926, instala a Oficina Mecânica e Fundição na mesma rua do 
complexo da Água Branca com o objetivo de realizar manutenção nas máquinas 
existentes e construir novos equipamentos (MATARAZZO, 1982, p. 52). 
No ano seguinte, implanta uma rede de armazéns atacadistas para venda 
direta dos produtos Matarazzo: um em Juiz de Fora; três em São Paulo; um em 
Ribeirão Preto; um em Campinas; e um em São José do Rio Preto. Além disso, entra 
no ramo de minerais não metálicos ao comprar uma fábrica de louças domésticas de 
pó de pedra (COUTO2, 2004, p. 138). 
82 
 
 
 
Ainda em 1927, o Conde indica oficialmente Francisco Junior como seu 
sucessor pelos trinta anos seguintes, através de um testamento oficial lavrado em 
cartório de São Paulo, cujo trecho é destacado a seguir: 
 
“Se dispus de número maior de ações em seu favor, não o fiz 
para favorecê-lo. Pelo contrário, quis assim impor-lhe o pesado 
encargo de me suceder na direção daquele vasto e complexo 
organismo industrial e comercial que custou o esforço 
constante de mais de quarenta e cinco anos de minha 
existência e a que estão ligados, além da sorte do patrimônio 
que vos deixo, interesses de terceiros e os meios de vida de 
milhares de famílias e empregados. Evitar que as rivalidades, 
fatais entre os homens, possam um dia criar-lhe embaraços no 
cumprimento da difícil, foi a minha maior preocupação. 
Terminada essa tarefa, vosso irmão vos devolverá, sob forma 
de legado, as ações que tiver recebido a mais” (COUTO2, 
2004, p. 200). 
 
Verifica-se, então, que mais uma vez o Conde opta pela escolha de apenas um 
filho no dever de dar continuidade à gestão da IRFM. De acordo com Couto (2004, p. 
201), esta nomeação foi conturbada, uma vez que apenas Chiquinho, o décimo 
segundo dos treze filhos, foi escolhido para ocupar uma posição que, teoricamente, 
deveria ser igualmente distribuída entre doze irmãos. Além disso, dois dos irmão mais 
velhos (Giuseppe e Andrea) também haviam trabalhado na IRFM, o que tem certo 
peso na tradição italiana. Ainda, Attilio, que também era mais velho que Chiquinho 
tinha formação superior de engenharia na Suíça, diferente de Chiquinho que havia 
concluído apenas o segundo grau. 
Por outro lado, o sucessor trabalhava com o pai há vários anos e há três já era 
o segundo homem na hierarquia. Assim, já havia assumido a presidência em momento 
de viagens internacionais de Francesco. 
Para o testamento redigido por Francesco ser considerado válido, todos os 
filhos tinham de assiná-lo. No entanto, Andrea, Attilio e Luiz Eduardo, este último o 
irmão mais novo, se recusaram a ratificar o documento e resistiram à decisão do pai 
até 1931, quando finalmente todas as assinaturas foram colhidas e Chiquinho se 
tornou oficialmente o sucessor da IRFM. Sendo assim, ele assumiria o comando após 
a morte de Francesco. Vale destacar que, além do controle acionário da organização, 
Francesco garantiu a Chiquinho a posse do imóvel da família na Avenida Paulista, 
além de uma chácara em São Paulo e imóveis na Itália (COUTO, 2004, p. 203). 
Em 1929, três anos após ter deixado a presidência da CIFTSP, Francesco 
Matarazzo se torna um dos fundadores e primeiro presidente do Centro das Indústrias 
83 
 
 
 
do Estado de São Paulo (CIESP), cargo que ocupará até 1931 (COUTO2, 2004, p. 
142). Nesse mesmo ano, o mundo entrava em uma forte crise econômica. 
Segundo Couto (20082, p. 157), as indústrias Matarazzo conseguiram 
atravessar a crise sem grandes dificuldades, chegando inclusive a realizar 
investimentos no Brasil e na Argentina durante o período. De acordo com o autor, em 
1930, um ano após o início da Grande Depressão, o Conde recebeu a visita de dois 
funcionários do Banco de Londres que, preocupados com a situação da IRFM diante 
dos problemas econômicos, oferecem créditos ao empresário. Todavia, Matarazzo 
recusou a oferta, pois julgava que tinha os recursos necessários para enfrentar a crise, 
gerando uma grande surpresa para os banqueiros. Entretanto, de acordo com Reiss 
(1980, p. 32), no ano da crise, em 1929, a IRFM teria sofrido o seu primeiro prejuízo. 
Portanto, a IRFM conclui a década de 1920 com crescimento e resultados 
expressivos. De acordo com Reiss (1980, p. 32), apesar de serem imprecisos, os 
lucros obtidos pela IRFM foram: em média 6.800 contos entre 1922 e 1923 e 16.800 
contos entre 1924 e 1929. Segundo o mesmo autor, entre o período da criação da 
IRFM em 1911 até 1929, a organização distribuiu em média 50% dos lucros em 
dividendos. Rust (1934) que escreveu uma biografia sobre Francesco Matarazzo 
apresentou um relato sobre o desempenho financeiro do grupo: 
 
“Os negócios da firma são tão variados que, mesmo que uma ou 
outra fábrica dê resultados negativos, algum ano, o grupo, no total, 
sempre é infalivelmente lucrativo”. 
 
Já no início da década de 1930, a IRFM começa a produzir em seu núcleo de 
indústria química o Inseticida Kids, marcando presença na agroindústria 
(MATARAZZO, 1982, p. 54). Além disso, monta em São Paulo uma grande fábrica de 
massas e biscoitos e adquire a fábrica de tecidos Santa Celina SA, uma empresa 
tradicional que antes era sediada no Rio de Janeiro e, após uma reformulação, passou 
a produzir tecidos finos de algodão na capital paulista. Ainda, seguindo uma políticade 
expansão geográfica, instala uma fábrica de óleo de algodão e sabão em João 
Pessoa, na Paraíba. Para isso, desloca pessoal de confiança para a nova planta. 
Em 1932, diante a crise de desabastecimento causado pela Revolução 
Constitucionalista, a Matarazzo desenvolve pesquisas para a mistura de álcool na 
gasolina. Mas, com o fim da Revolução, o projeto é engavetado (COUTO2, 2004, p. 
163). Cabe destacar, no entanto, que o grupo chegou a anunciar a venda de álcool 
motor para ônibus e que dispensava o uso de gasolina. De acordo com anúncio 
publicado no jornal o Estado de São Paulo (1932), a empresa havia conduzido com 
sucesso um teste que envolveu dezoito meses de pesquisa que incluíram o uso em 
veículos que fizeram percursos entre São Paulo - Santos e São Paulo - Ribeirão Preto. 
84 
 
 
 
Com o país atravessando dificuldades econômicas e já com Getúlio Vargas no 
poder, Francesco Matarazzo concede uma entrevista a um jornal de Assis 
Chateaubriand onde destaca o papel da indústria nacional e da necessidade de 
substituição das importações (vale lembrar que na época a indústria ainda tinha 
pouquíssima relevância no cenário nacional em comparação ao café): 
 
“A meu ver, portanto, podemos diminuir consideravelmente o volume 
da nossa importação, não só dos artigos de uso suntuário, mas 
também necessário, como gasolina, trigo, etc. [...] Libertemos, 
portanto, o trabalho nacional, eliminando os impostos de exportação, 
suavizando o regime dos transportes e diminuindo outras despesas 
que o oprimem, e o Brasil passará a ser exportadores de quase tudo 
que hoje nós importamos com grave dano para as finanças e a 
economia do país” (Couto
2
, 2004, p. 176). 
 
Em 1933, faz uma expansão para o setor extrativista para abastecer a 
construção civil (principalmente a construção de suas próprias indústrias). Nesse 
momento, o grupo é composto de 170 propriedades. No ano seguinte, é pioneiro mais 
uma vez ao montar uma refinaria de petróleo através da fundação da Indústria 
Matarazzo de Energia (IME) em São Caetano. A refinaria entraria em operação quatro 
anos mais tarde. A unidade manteria um elo com as pesquisa e desenvolvimento de 
fontes alternativas de combustível, realizando estudos para produção de álcool a partir 
da mandioca na década de 1940. 
Ainda em 1934, aproveitando a crise da produção de algodão nos Estados 
Unidos, são instaladas máquinas de descaroçamento e beneficiamento em nove dos 
principais centros produtores de São Paulo (COUTO2, 2004, p. 236). 
Nesse ano, Francesco Matarazzo completa oitenta anos. Para celebrar a data, 
além de uma grande comemoração, decide presentear os funcionários da IRFM com 
500 mil contos para os funcionários com mais de trinta anos de casa e 250 mil contos 
para os com vinte e cinco anos, sendo que as pessoas com mais de sessenta anos 
receberiam a quantia em dobro (COUTO2, 2004, p. 264). Nessa época, o porte da 
IRFM já impressionava: a renda bruta anual das empresas do grupo equivalia ao 
dobro da receita de Minas Gerais e 7% da energia hidráulica produzida em São Paulo 
era consumida pelas empresas do grupo (VEJA, 1983). 
Um ano após o octogésimo aniversário do fundador, incomodado com as 
críticas dos irmãos, Francisco Jr. decide abandonar a empresa. Assim, Francesco 
busca efetuar mudanças no estatuto. Cria uma nova diretoria para ser ocupada por um 
profissional externo e convida para o cargo de Chiquinho o filho caçula Luis Eduardo, 
mas este acaba recusando. Assim, diante da falta de opções, Francesco consulta 
todos os filhos novamente para ratificar a decisão tomada anos antes e consegue a 
85 
 
 
 
confirmação de que Chiquinho continuará no comando. Por consequência, os irmãos 
Luís Eduardo, Attilio e Andrea decidem se retirar da sociedade (COUTO2, 2004, p. 
213). 
Ainda em 1935, a IRFM continua a passar por uma fase de grande expansão: 
Implanta uma fábrica de papel e papelão em São Paulo, expande as atividades 
extrativistas adquirindo jazidas de caulim, uma matéria-prima utilizada na fabricação 
de papel, porcelana e de outros artigos cerâmicos. Ainda, realiza o último investimento 
sob a gestão do fundador e começa a produzir sucos. Para isso, segue sua estratégia 
de verticalização instalando uma fábrica de essências cítricas e, posteriormente, 
produzindo óleo de casca e marmelada de laranja (COUTO, 2004, p. 328). Além disso, 
adquire uma jazida de gipsita (usada na produção de louças) no Ceará. Entretanto, 
após o início das atividades, verificou-se a inviabilidade de transporte dos produtos e, 
assim, o projeto foi abandonado (MATARAZZO, 1982, p. 57). 
Durante a década de 1930, conforme a indústria ganhava mais destaque junto 
ao governo, os industriais paulistas pressionavam as autoridades contra a incidência 
de impostos sobre a exportação. Em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo 
(1936), o Conde Francesco tratou sobre o assunto: 
 
“Precisamos aumentar a exportação. Contudo, a exportação continua 
a ser tributada cada vez mais. [...] Essa tributação encarece os 
produtos, diminuindo-lhes a as possibilidades de se manterem nos 
mercados conquistados ou conquistarem mercados novos, pois, uns 
e outros acabarão por ser tomados pelos produtos congêneres que 
saem do país de origem sem a carga de impostos de exportação”. 
 
Por consequência dessa pressão, o governo paulista eliminou, de forma 
pioneira, a incidência de impostos sobre exportação através de uma reforma tributária 
ocorrida em 1936, aumentando a competitividade das empresas de Matarazzo que 
começavam a buscar com mais intensidade os mercados externos. 
Francesco se manteve na liderança do grupo até 1937, quando morreu um mês 
antes de completar oitenta e três anos. Caracterizou-se por um estilo centralizador, 
com total controle do capital e da condução dos empreendimentos, conforme é 
apontado por Martins (1976, p.105): 
 
“Daí encontramos no grupo Matarazzo uma organização burocrática, 
mas de poder centralizado e pouco distribuído pelas escalas 
intermediárias. Daí, também, o empresário ter reservado para si, no 
interior da empresa, papéis que se referem às relações com o 
mercado (comprador, vendedor) e exercer sua autoridade na 
empresa para testar a viabilidade mercantil das inovações técnicas. 
Isto é, o empresário apresenta-se como comerciante”. 
 
86 
 
 
 
 A descrição do ritmo de trabalho feita pelo primeiro biógrafo de Matarazzo 
corrobora a imagem centralizadora e detalhista do empresário que ainda mantinha a 
rotina de executar ele mesmo funções operacionais no grupo (prática que foi replicada 
pelo sucessor): 
 
“Outro fato interessante, que aumenta consideravelmente os lucros 
anuais, é que o Conde Senior ou o Conde Junior, pessoalmente, 
fazem, praticamente, todas as compras de matéria prima necessárias 
nas fábricas. As compras que não podem fazer pessoalmente, são, 
pelo menos, feitas com seu inteiro conhecimento, e diariamente, dos 
preços e quantidades [...] A política da firma põe grande atenção em 
comprar bem, talvez mais do que tentar vender por preço maior 
possível [...] Com todas as suas atividades diárias, usa brevidade em 
negócios, mas é raro ditar uma carta e, raramente, usa o telefone. 
Deve se admirar que é difícil achar um estenógrafo em toda a 
indústria. Homens, ganhando mais de 100 contos de réis por ano, 
escrevem suas cartas de mão própria, para serem depois copiadas 
em máquinas de escrever e, muitas vezes, eles mesmo ocupam a 
máquina. A correspondência interna é reduzia a um mínimo, e tudo é 
expresso com o menor número de palavras possível, muitas vezes 
tratando-se de uma dúzia, ou mais tópicos, em uma mesma folha de 
papel” (RUST, 1934). 
 
Segundo Couto (2004, p. 296), outra característica dos negócios que marcou a 
gestão de Francesco Matarazzo foi a indiferença às propagandas. Apesar de trabalhar 
com produtos de consumo, ele via a qualidade dos produtos como suficientes para 
garantir a presença da marca namente dos consumidores. Entretanto, é possível 
encontrar diversos anúncios sobre os produtos da organização no jornal O Estado de 
São Paulo, em especial entre as décadas de 1910 e 1940. 
 De acordo com relato do empresário, a sua criação contemplava um propósito 
principal: 
 
“A preocupação de enriquecer nunca foi o escopo de nenhum ato da 
minha vida. Sempre considerei a riqueza como meio de atingir um 
ideal: ampliar, ampliar o máximo o organismo industrial, já vasto, ao 
qual liguei meu nome; intensificar todos os meus esforços no sentido 
de tornar mais eficiente a contribuição que a mim mesmo me impus 
como dever, para a emancipação do Brasil” Francesco Matarazzo 
(COUTO
1
, 2004, p. 14).
 
 
Uma reportagem publicada pelo jornal O Estado de São Paulo, na época da 
morte de Matarazzo descrevia a estrutura administrativa do grupo: 
 
“Esse grande mecanismo, por menos que pareça crível, era 
pessoalmente dirigido, do alto, por Francesco Matarazzo [...] que 
organizara de tal forma as engrenagens que com um esforço 
relativamente pequeno, através de relatórios parciais e pela voz de 
diretores dos departamentos, conhecia diariamente, as linhas 
dominantes de seus negócios. As suas fábricas têm 30 diretores, 600 
técnicos, e 15.000 operários” (ESTADÃO, 1937). 
87 
 
 
 
Após a morte de Francesco, Chiquinho Matarazzo assume formalmente o 
cargo de Diretor Presidente e seu sobrinho Ferdinando passa a ocupar posição de 
Diretor Gerente. Para o especialista em gestão de empresas familiares João Bosco 
Lodi, Chiquinho teria muitas dificuldades pela frente quando assumiu a direção do 
grupo: 
 
“Matarazzo teria entregue um grupo complicado demais ao conde 
Chiquinho. Um complexo com mais de vinte setores quase sem 
nenhuma sinergia. Por quê? Porque alimentos não têm a ver com 
metalurgia e assim por diante” (COUTO
2
, 2004, p. 217). 
 
O novo presidente do grupo implanta reformas administrativas que havia 
começado a desenhar quatro anos antes quando contratou um administrador 
profissional para estudar a viabilidade de reorganização administrativa da empresa. 
Assim, criou as secretarias da Diretoria Comercial, Técnico-industrial e Administrativa 
(MATARAZZO, 1982, p. 77). 
Na época da morte de seu fundador, a IRFM passava por um período de 
grande crescimento. Um relato de Chateaubriand (1934) oferece maiores contornos 
sobre o tamanho do grupo: 
 
“Enquanto São Paulo tem uma renda bruta de 400 mil contos, Minas 
de 140 mil, o Rio Grande do Sul, de 130 mil, a Prefeitura carioca, de 
270 mil, o parque das IRFM possui de receita bruta uma cifra que 
atinge ao algarismo de 350 mil contos [...] É fora de dúvida, portanto, 
que o Conde Matarazzo financeira e economicamente é o segundo 
Estado do Brasil. Somente o ultrapassam a União Federal, o 
Departamento Nacional do Café e São Paulo”. 
 
A tabela 5-2 apresenta a situação das principais unidades do grupo em 1934, 
quanto tinha 15 mil operários, 600 supervisores e técnicos e 30 diretores (RUST, 1934, 
p. 34). A IRFM ainda consumia cerca de 7% de toda a energia hidráulica produzida no 
Estado de São Paulo (VEJA, 1983). 
Até o final da década de 1940 a IRFM continuaria crescendo, com Chiquinho 
mantendo a estratégia de diversificação e redução da dependência de matérias-
primas, visão que se acentuou ainda mais com a iminência da guerra. 
Assim, temendo uma crise de desabastecimento, instala uma fábrica de ácido 
sulfúrico no ano em que tomou posse. Em 1938, compra a Tecelagem Brasileira de 
Seda, monta uma fábrica de celulose em São Caetano e instala uma unidade de 
fabricação de massas alimentícias junto ao moinho de trigo (MATARAZZO, 1982, p. 
111). 
 
 
88 
 
 
 
Tabela 5-2 – Grupo Matarazzo em 1934 
Estabelecimentos Localidades Produção Anual 
Moinhos São Paulo - Antonina 3.600.000 s/ farinha 
Mariângela (Fiação – Tecelagem – 
Alvejamento- Tinturaria) 
São Paulo 50.000.000 de mts 
Belenzinho (Mercerizarão – Estamparia – 
Acabamento) 
São Paulo - 
Seda Artificial Viscoseda São Caetano 400 tons. de fio 
Curtume (Sola- Peles – Correias) São Caetano 400 tons. de sola 
Sulfureto de Carbono São Caetano 400 tons. 
Destilação de Alcatrão (Naftalina – 
Asfalto) 
São Caetano 2.000 tons. 
Amido (Cerealina – Glucose – Dextrina) São Paulo - 
Féculas de Mandioca Caçapava 2.000 tons. 
Licores São Paulo 160.000 caixas 
Frigoríficos (Carnes suínas) Jaguariaíva 5.000 tons. 
Soda Cáustica Granulada São Paulo 50.000 caixas 
Engenhos de Arroz São Paulo - Iguape 450.000 sacos 
Moagem de Sal 
São Paulo – Mauá - 
Antonina 
12.000 tons. 
Refinação de Sal Água Branca 12.000 tons. 
Refinação de Açúcar Água Branca 375.000 sacos 
Refinação de Banha Água Branca 4.800 sacos 
Destilaria de Álcool e Aguardente Água Branca 8.200.000 litros 
Velas Água Branca 300.000 caixas 
Glicerina Água Branca 500 tons. 
Oleina Água Branca 2.000 tons. 
Óleo de Caroço de Algodão (Sol Levante) - - 
Óleo de Linhaça (cru e cozido) Água Branca - 
Óleo de Ricino (medicinal e industrial) Água Branca 16.000 tons. 
Óleo de Coco (comestível e industrial) - - 
Tortas de Sementes Água Branca 42.000 tons. 
Sabões Água Branca 20.000 tons. 
Sabonetes Água Branca 500.000 dúzias 
Perfumaria Água Branca - 
K.I.D. (inseticida) Água Branca 750.000 caixas 
Serraria Água Branca 1.200 tons. 
Pregos Água Branca 500 tons. 
Fundição Água Branca - 
Oficina Mecânica Água Branca - 
Laboratório Químico Água Branca - 
Almoxarifado Geral Água Branca - 
Fonte: Couto (2004) 
 
No entanto, apesar de toda a expansão industrial, talvez o principal ícone desta 
fase tenha sido a conclusão das obras do novo edifício sede do escritório central, que 
integrou as atividades administrativas da organização. A ideia havia sido lançada por 
Chiquinho em 1934, pois a sede de três andares já estava superada. O objetivo era 
89 
 
 
 
erguer um novo arranha céu na região do Vale do Anhangabaú onde o grupo tinha um 
prédio. Todavia, o mesmo estava alugado para o magnata da comunicação Assis 
Chateaubriand que ainda tinha três anos de contrato de aluguel e dificultou a 
desocupação do imóvel, tornando a negociação extremamente custosa para os 
Matarazzo. Não bastasse a negociação com o antigo inquilino, o novo edifício que 
atualmente é sede da Prefeitura de São Paulo, foi erguido com todo o luxo e pompa, 
conforme descrição de COUTO2 (2004, p. 316): 
 
“Monumental e sóbrio, simbolizava e ostentava a opulência da 
Matarazzo. O mais luxuoso da cidade, localizado na nata do polo 
comercial, é revestido de 170 mil placas de mármore. [...] Tem jardim 
suspenso no 14° andar, com rica variedade de plantas. [...] Recebe 
confortavelmente a administração central das IRFM. Inclusive a casa 
bancária do grupo, no andar térreo. A diretoria e a sala do trono 
funcionam no quinto andar”. 
 
Mas se as décadas de 1930 e 1940 foram de grande crescimento para a IRFM, 
de onde provinham os recursos financeiros para a realização desses investimentos? 
De acordo com Dean (1971, p. 182), o reinvestimento dos lucros parece ter 
proporcionado todo capital necessário para o desenvolvimento da organização nas 
décadas de 30 e 40 já que a IRFM não pôde contar com empréstimos do Governo. 
Segundo Reiss (1980, p. 107), o período da Segunda Guerra Mundial também 
ficou marcado pela forte expansão do braço têxtil do grupo. A Matarazzo já era a maior 
indústria têxtil do Brasil e as fábricas relacionadas ao setor correspondiam à metade 
da produção industrial da IRFM - 51% em 1942, ante uma participação de 39% em 
1939. Dessa forma, aproveitando a oportunidade aberta pela redução do nível de 
produção do mundo, o grupo aumentou sua taxa de exportação consideravelmente, 
enviando produtos têxteis principalmente para EUA e Argentina. Assim, entre 1943 e 
1944, as vendas para o exterior corresponderam a algo entre 15% e 20% do 
faturamento do grupo, (REISS, 1980, p. 108). 
Em 1941, inaugura a fábrica de papel celofane Celosul no recém-inaugurado 
NúcleoIndustrial Ermelino Matarazzo, erguido nos arredores da cidade de São Paulo. 
Para isso, como toda a Europa estava em guerra e o maquinário necessário para a 
operação era importado, Chiquinho contratou um técnico francês para desenhar as 
máquinas e fabricá-las aqui (MATARAZZO, 1982, p. 115). 
Ainda, com o intuito de reduzir a dependência das máquinas produtivas 
importadas da Europa, a Matarazzo aprimora sua oficina para montar as máquinas 
internamente (RELATÓRIO ANUAL, 1943). Na Revista Síntese (1949), verifica-se a 
produção de diversos itens para abastecer as empresas do grupo, principalmente para 
90 
 
 
 
as fábricas químicas: vaporizador a vácuo para indústrias químicas; mexedor de ferro 
fundido para produtos químicos, com 2,8 toneladas; retortas de ferro fundido com 4,5 
toneladas para fabricação de sulfureto de carbono; e até hélices de bronze e ferro 
fundido para os navios. 
A intenção de desenvolver a indústria química também se daria através da 
formação de pessoal qualificado e em projetos de pesquisa. Em 1944, foi montado um 
Laboratório Central, conectado aos laboratórios de diversas fábricas para atuar, entre 
outras frentes, na preparação de químicos-pesquisadores (RELATÓRIO ANUAL, 
1944). 
Apesar do forte crescimento apresentado desde a crise de 1929, o relatório 
anual de 1944 também destaca a limitação do mercado interno e faz uma relação 
dessa situação com a diversificação do grupo: 
 
“A limitada amplitude do mercado interno, punha, infelizmente, 
limites estreitos ao desenvolvimento de cada uma das nossas 
fábricas, impedindo-nos de dar curso a programas de larga 
produção. Daí o caráter multiforme da nossa atividade que, 
indubitavelmente, teria dado resultados bem mais amplos na 
formação do complexo do nosso aparelhamento econômico se 
o mercado interno tivesse comportado o desenvolvimento de 
nossa atividade produtiva em um número menor de setores ou 
em um único setor.” 
 
Para Reis (1980, p. 111), apesar da instalação de grandes plantas industriais 
não é possível identificar na IRFM a existência de uma base tecnológica própria. 
Assim, o autor propõe que a expansão do grupo se deu através de uma rede 
comercial robusta, na qual havia oportunidades para expansão, integração vertical e 
diversificação. Dessa forma, esse processo de integração acabou direcionando o 
grupo para outros segmentos a partir da utilização de insumos básicos que eram 
comuns a mais de uma indústria. 
Vale ressaltar, também, que o intenso processo de crescimento e a 
transformação do ambiente trouxeram novos desafios à nova gestão, conforme 
destacado em livro comemorativo do grupo: 
 
“O crescimento das empresas Matarazzo estava a exigir uma 
readaptação dos serviços de apoio administrativo, para que se 
ajustassem com eficiência às novas dimensões e à grande 
diversificação que as atividades industriais assumiam a cada dia” 
(MATARAZZO, 1982, p. 77). 
 
A IRFM chegou ao fim da Segunda Guerra Mundial com uma trajetória de 
grande crescimento, principalmente a partir da década de 1930. Em 1950, o grupo 
91 
 
 
 
tinha 37.000 funcionários. A evolução do capital social da companhia destacado na 
tabela 5-3 também evidencia esse crescimento. 
 
Tabela 5-3 - Evolução do capital social da Matarazzo (em milhões de cruzeiros) 
Ano Valor % do PIB 
1911 10,5 0,19% 
1942 100 0,16% 
1944 300 0,28% 
1947 600 0,34% 
1951 750 0,22% 
Fonte: O Estado de São Paulo (1954) e Ipea Data (2014) 
 
Durante a década de 1940, esse crescimento chegou a ser acompanhado de 
acusações de crime contra a economia. Ao menos em duas ocasiões, a Matarazzo foi 
acusada de estar retendo estoque de farinha e rayon, com o objetivo de forçar o 
aumento dos preços dos produtos. No segundo caso, após uma interpretação de que 
se tratava de artigo de luxo e não um bem essencial e de que a empresa não tinha 
mais do que 30% da produção nacional, o grupo foi absolvido (ESTADÃO, 1946). 
A partir do término do conflito mundial, a IRFM intensificou os investimentos 
principalmente nas indústrias alimentícias e de vestuário. Em 1945, entraram em 
funcionamento as unidades de fabricação de fios e tecidos de lã e de juta e de 
confecção de roupas. Além disso, a lista de gêneros alimentícios foi ampliada com o 
início da produção de margarina, pasta de amendoim e biscoito (SAES & NOZOE, 
2006). 
Entre os investimentos realizados pela IRFM, destaca-se um plano de 
expansão e modernização do complexo têxtil iniciado em 1945 e finalizado no início 
dos anos 50. Muitos dos novos teares automáticos foram montados pela própria 
Oficina Mecânica e Fundição da Matarazzo (RELATÓRIO ANUAL 1945). 
Como resultado desse programa, em 1952 a empresa havia realizado os 
seguintes avanços, utilizando uma base 100 no ano de 1939: 
I. Produção de fiações - 615; 
II. Produção de tecelagens - 144; e 
III. Total de empregados nos dois setores - 95. 
O Relatório Anual de 1947 destacou a ampliação dos investimentos e 
aperfeiçoamento das unidades produtivas. 
“A linha mestra da política econômico-comercial do nosso grupo tem 
sido e continua sendo a redução dos custos através do aumento das 
produções e o aperfeiçoamento dos sistemas de fabricação: 
Máquinas obsoletas são constantemente eliminadas e novos 
processos mais eficientes são adotados”. 
92 
 
 
 
Entre os principais investimentos em novas unidades, destaca-se: A 
inauguração de duas novas tecelagens de algodão em Bauru e Ribeirão Preto (1946), 
mesmo ano em que criou a Fiação Lydia, instalada em São Paulo e que foi pioneira no 
trabalho com algodão de fibras longas e fios especiais. 
Além disso, a IRFM firmou um acordo com firmas inglesas para aplicação 
exclusiva no Brasil de um novo processo produtivo denominado de "Nelson" para 
fiação contínua de rayon. Assim, se tornou a primeira empresa brasileira e uma das 
pioneiras do mundo na instalação deste processo (RELATÓRIO ANUAL 1949). 
Ao mesmo tempo em que buscava modernizar e expandir a produção do setor 
mais importante para o grupo, a IRFM enfrentava novos concorrentes que começavam 
a ampliar a sua presença no país. Respondendo a essa competição, a Matarazzo 
realizou um movimento de descentralização de algumas atividades ainda na década 
de 1940. A primeira foi a Tecelagem Brasileira de Seda, desmembrada em três 
unidades durante o ano de 1946 e que passaram a operar em plantas diferentes nas 
cidades de Campinas, Rio Claro e Ribeirão Preto (MATARAZZO, 1982, p. 123). 
Apesar das iniciativas de descentralização, o comando do grupo ficava 
concentrado entre o Conde Chiquinho e seu primo Ferdinando, o seu braço direito na 
época. Ambos eram diretores de várias das unidades da IRFM, exigindo uma 
participação constante em uma grande diversidade de negócios. Anúncios de 
assembleias com acionistas publicados no jornal Estadão, em 1954, mostram, por 
exemplo, que no dia 31 de agosto daquele ano, os dois diretores precisaram enfrentar 
a seguinte sequencia de assembleias: 
a) 10 hs - IME 
b) 11 hs - Santa Celina 
c) 14 hs- Salina 
d) 16 hs - IRFM 
Logo após a Guerra, Chiquinho também se lançou no ramo de comunicação, 
ao adquirir 50% das ações do grupo Folha (MATARAZZO, 1982, p. 130), 
possivelmente buscando ter um canal para rebater os ataques do magnata da mídia 
Assis Chateaubriand, que havia se tornado um inimigo pessoal desde o episódio 
envolvendo a construção da nova sede do grupo. Todavia, o negócio durou apenas 
um ano, com Chiquinho se retirando da sociedade após desentendimentos na 
condução dos negócios. 
No entanto, apesar dos novos investimentos, as décadas seguintes foram para 
a Matarazzo bem diferente dos anos anteriores. Isto porque já a partir do início da 
década de 1950, em consequência da internacionalização da economia e a chegada 
de novos competidores, a IRFM começou a enfrentar um longo período de declínio. 
93 
 
 
 
De acordo com Reiss, (1980, p. 196), a Matarazzo enfrentou grandes 
dificuldadesem lidar com os novos desafios do ambiente industrial. A organização 
enfrentou competidores mais bem preparados em vários segmentos que afetaram o 
grupo como um todo. Ou seja, para o autor, a grande diversificação da Matarazzo não 
impediu a diluição dos efeitos negativos de uma competição mais intensa. Na indústria 
de alimentos, por exemplo, firmas estrangeiras introduziram produtos diferenciados e 
com mais eficiência em custos. Além disso, o surgimento de supermercados alterou 
toda a dinâmica de distribuição do setor, exigindo a produção em volumes maiores e 
campanhas publicitárias agressivas para o suporte nas vendas. Na indústria têxtil, por 
sua vez, o algodão passou a concorrer com tecidos sintéticos fabricados por grandes 
empresas estrangeiras, além de passar a ter sua cotação atrelada ao mercado 
internacional, aumentando a complexidade do setor. 
O livro comemorativo da Matarazzo (1982, p. 151) destaca as dificuldades da 
empresa durante essa fase, corroborando as ideias de Reis. 
 
“Atuando em quase todos os setores do mercado, em função de uma 
diversificação tornada necessária no passado, devido às limitações 
de cada um dos mercados, as IRFM não têm condições de 
acompanhar a grande expansão do consumo. Cada uma de suas 
unidades passa, em consequência, a ser secundária no mercado em 
que atua e a segmentação que ocorre na comercialização diminui 
muito a importância do nome comum.” 
 
Segundo Reiss (1980, p. 199), a presença dos novos competidores forçou o 
fechamento de muitas instalações fabris, a realocação de outras, a absorção de custos 
de produção mais altos, a introdução de linhas de produto complementares e a 
integração vertical em uma tentativa anárquica de lidar com a decomposição de sua 
base de recursos. 
Conforme já apresentado na descrição do ambiente, os setores tradicionais 
foram os mais afetados pela chegada de empresas estrangeiras e o acirramento da 
competição. Na indústria de beneficiamento de algodão, por exemplo, a Matarazzo 
que em 1933 ficava apenas atrás da Votorantim em volume de produção, viu a 
americana Anderson, Clayton e Cia e a argentina Bunge y Born mudarem essa 
configuração já a partir da década de 1930. Assim, em 1951 a empresa tinha 10% do 
mercado enquanto as multinacionais lideravam com 20% do volume de produção cada 
uma (O ESTADO DE SÃO PAULO, 1952). 
Apesar da tentativa do grupo em fortalecer sua posição competitiva nos setores 
têxtil e alimentício, os resultados negativos começaram a aparecer. O desempenho 
94 
 
 
 
financeiro daqueles anos foi citado no livro comemorativo da empresa (MATARAZZO, 
1982, p. 148): 
 
“Apesar de seus resultados positivos nos balanços, a empresa já 
operava com baixo nível de lucratividade, cercada por competidores 
cada vez mais agressivos em setores especializados [...] Promoção 
de vendas, propaganda e marketing são setores que as empresas 
estrangeiras trazem ao Brasil num nível de sofisticação e 
desenvolvimento aqui desconhecidos”. 
 
Como consequência do surgimento dos primeiros resultados negativos, o grupo 
Matarazzo passou por grandes mudanças que envolveram iniciativas de expansão, 
mas também, de retração da organização. Por um lado, a IRFM realizou uma série de 
desinvestimentos e fechamento de fábricas. Reiss (1980, p. 200) destaca o 
encerramento das seguintes operações: usinas de açúcar (1953); fábricas de pregos e 
de conservas (1957); usina de álcool e fábrica de pães (1959); fábricas de desinfetante 
e de esponjas (1962); fábrica de manteiga de amendoim (1963); frigorífico (1964); e 
fábricas de cerâmicas (1964/1968). Com essa redução, o almoxarifado central 
localizado em São Paulo também foi extinto (RELATÓRIO ANUAL, 1959). 
Por outro lado, a IRFM continuou buscando o processo de integração vertical, 
absorvendo novas linhas de produtos em mercados que considerava promissores. A 
ressalva é que nessa nova fase a IRFM passou a desenvolver parcerias 
(principalmente com empresas estrangeiras) para a viabilização desses 
empreendimentos. Entre esses acordos, destaca-se a joint venture realizada com um 
grupo francês para a adoção de novidades no segmento de tecidos de alta qualidade. 
Ainda, para se destacar no segmento, a Matarazzo começa a participar, apoiar e 
divulgar desfiles de moda em São Paulo. Em 1956, por exemplo, organizou o Festival 
da Moda que ocorreu no Parque do Ibirapuera (O ESTADO DE SÃO PAULO, 1956). 
Além disso, com o objetivo de aumentar o uso dos produtos clorados, a IRFM 
desenvolveu um estudo para instalar uma fábrica de resinas plásticas vinilica (PVC). 
Assim, entrou como sócio minoritário com a empresa americana BF Goodrich 
Chemical Company, formando a Geon do Brasil, para a fabricação do composto 
(RELATÓRIO ANUAL 1955). 
Outros acordos foram realizados em 1959. Um deles envolveu uma joint 
venture com a Dow Chemical para criar a Cloroquim SA com a proposta de produzir 
tetracloreto de carbono – a unidade teria suas atividades encerradas dez anos depois. 
Além desta, foi realizada outra parceria com a Union Carbide International para formar 
a Visking do Brasil, que iria realizar acabamentos de invólucros sintéticos para carnes 
ensacadas (RELATÓRIO ANUAL, 1959). 
95 
 
 
 
Assim, em virtude das dificuldades enfrentadas e pretendendo manter sua 
política de crescimento, a Matarazzo enfatizou a necessidade de reter lucros para 
reinvestir nos seus negócios, conforme é apontado no Relatório Anual de 1955: 
 
“Hoje, mais do que no passado, cumpre às empresas capitalizar 
lucros, formar poupança destinada a incrementar a produção.” 
 
 No entanto, com a redução da lucratividade, a IRFM decidiu realizar o aumento 
de capital de 3,2 para 4,8 bilhões de cruzeiros, mediante a emissão de 320 mil ações 
preferenciais. De acordo com comunicado do grupo publicado no jornal O Estado de 
São Paulo (1960), as vantagens para os acionistas eram: 
1. Dividendo fixo e cumulativo de 12% ao ano pago semestralmente, acrescido 
da bonificação anual mínima de 5%, que garante às ações preferenciais uma 
remuneração mínima de 17% ao ano e a qual poderá ser posteriormente 
beneficiada por deliberação da Assembleia Geral Ordinária tendo em conta, em 
parte, eventual encarecimento do custo de vida; e 
2. Possibilidade de conversão, por sorteio, de até 50% das ações preferenciais 
em ações ordinárias a partir de 1967. 
Foi durante a conturbada década de 1950 que o Conde Chiquinho passou a 
contar com o apoio de dois dos seus cinco filhos na gestão do grupo. Em 1954, 
Ermelino e Eduardo já eram diretores da Fazenda Amália e, também, da IRFM, 
estando logo abaixo do presidente na hierarquia. Assim, com a chegada da nova 
geração, Ferdinando, o antigo braço direito do Conde, deixa suas atividades na 
direção da IRFM. O entrevistado 1 apresentou maiores detalhes sobre o comando do 
grupo na época: 
 
“Dom Ferdinando foi companheiro dele durante os primeiros anos em 
que ele dirigiu a empresa. Era primo dele, filho do Andrea Matarazzo, 
metalúrgico que entrou como parte da divisão da firma. Então, esse 
Ferdinando ficou só nos primeiros anos, depois se afastou. E ele era 
o braço direito do Conde. Aí o Conde ficou sozinho. Foi quando ele 
colocou o Ermelino. O Ermelino substituiu o Ferdinando. Depois veio 
o Eduardo. Aí ficou Conde Chiquinho, Ermelino e Eduardo como 
direção geral, só. E por baixo deles, tinha diretores, comerciais, 
tesoureiros, pessoas. Inclusive, tinha José Matarazzo que era o 
famoso Dom Pepino, que era um diretor também. Mas já era uma 
linha mais baixo um pouquinho. No prédio ele ouvia, como ele ouvia a 
mim. Muitas vezes eu era chamado para opinar sobre uma fábrica, 
sobre um diretor, sobre uma tomada de decisão de um produto. 
Muitas vezes eu era ouvido. Como eram ouvidas outras pessoas, 
naturalmente. Mas isso é quando ele estava lá. Quando ele estava 
em Amália, ele já vinha munido de uma ideia. E ali ele amadurecia, 
pensava, refletia e decidia.” 
 
96Mesmo em meio a uma situação de acentuação da competição, a IRFM decidiu 
reduzir a carga horária de seus funcionários. Assim, pela primeira vez a direção 
passou a conceder o sábado livre para todos os funcionários do escritório central. 
Além disso, introduziu o "sábado inglês" (trabalho até o meio dia) nos escritórios e 
fábricas, com revezamentos exigidos pelas necessidades técnicas e de produção 
(RELATÓRIO ANUAL 1954). 
Outro fator de destaque no período foi o investimento em usinas termoelétricas 
com o intuito de contornar a escassez de energia no país. Com isso, o grupo 
conseguiu atingir um nível de geração de 56% de toda a sua energia consumida 
(RELATÓRIO ANUAL, 1953). 
Outra estratégia buscada pela IRFM diante das dificuldades da concorrência no 
mercado interno foi a busca por oportunidades de exportar parte da produção que não 
era mais consumida no país, conforme explanado no Relatório Anual (1965): 
 
“As mesmas potencialidades do nosso mercado interno podem, de 
qualquer forma, tornar-se uma armadilha, aumentando a nossa 
dependência da importação de bens industriais ou de outra natureza, 
devido a níveis altos de produção e despesas de consumo, em 
prejuízo das buscas de novas saídas para a exportação. Temos que 
achar mercados no exterior, e mais ativamente, agora que no 
passado. [...] Isto, por sua vez, exige maior atenção, no 
desenvolvimento de novos produtos, na qualidade dos mesmos, e 
eficiência da produção”. 
 
Justamente com o objetivo de ampliar sua participação no mercado 
internacional, a Matarazzo fez uma aquisição em Barranquilla, Colômbia, de uma 
indústria têxtil completa, inclusive com rede comercial própria distribuída pelo país com 
filiais em Bogotá, Cali, Medellín, Pereira e Letícia. Era a Companhia Industrial 
Colombiana Marisol (ENTREVISTADO 1). 
Apesar das iniciativas, a organização parece não ter conseguido compreender 
as mudanças no ambiente competitivo e, assim, manteve a mesma dinâmica de 
crescimento que havia sido bem sucedida décadas antes, conforme é destacado por 
Reiss (1980, p. 202): 
 
“Muitos desses mercados foram de fato promissores quando o grupo 
entrou neles pela primeira vez, mas dificilmente eles podem continuar 
a serem considerados dessa forma nos anos de 1970. Principalmente 
porque em nenhum deles a IRFM comprometeu investimentos 
grandes o bastante para tomar uma posição de liderança no mercado 
ou reorientar significativamente o seu crescimento prévio”. 
 
Um dos negócios onde é possível destacar esta dinâmica de crescimento é o 
de alimentos e bens de consumo. Com a chegada dos supermercados no Brasil nos 
97 
 
 
 
anos de 1950, a Matarazzo decidiu transformar suas unidades de abastecimento 
exclusivas para funcionários no novo modelo de varejo durante os anos de 1960. Os 
postos de abastecimento eram montados junto às fábricas para atender os operários 
que faziam as suas compras e tinham os valores descontados do salário 
(ENTREVISTADO 1). 
Assim, a IRFM criou a rede Superbom, abrindo lojas em São Paulo e outras 
cidades, atingindo, em 1971, a marca de dezoito unidades. Para o grupo, o principal 
objetivo era continuar mantendo o controle sobre grande parte da cadeia, além de ter 
um canal de distribuição próprio para os seus produtos. Essa estratégia é evidenciada 
nas palavras de Ermelino Matarazzo em entrevista realizada em 1971: 
 
“Nós planejamos expandir ainda mais, pois este é um negócio muito 
interessante para o grupo, no qual é possível entrar com uma série de 
produtos próprios [...]. Daqui em diante, é só uma questão de abrir 
mais lojas” (REISS, 1980, p. 203). 
 
A Matarazzo ainda iria expandir a rede, seguindo os planos de Ermelino. Em 
1975, foi inaugurado o Supercenter Superbom na Água Branca, um centro de compras 
com 48.000 m2 de área total e com estacionamento para 2.150 carros. Além do próprio 
supermercado, a unidade contava com espaços para aluguéis de lojas. O local vendia 
de alimentos a roupas e eletrodomésticos e tinha um sistema de crediário próprio, o 
Credibom. Além disso, oferecia um serviço automotivo completo enquanto os clientes 
faziam compras: troca de pneus, balanceamento, alinhamento (O ESTADO DE SÃO 
PAULO, 1975). No mesmo ano, outro supercenter ainda seria aberto em São José dos 
Campos. No ano seguinte, o Superbom chegaria a 25 unidades. 
Entretanto, devido à grande competição e aos conflitos de canais que se 
tornaram mais relevantes, a IRFM não conseguiu manter as margens e o ritmo de 
crescimento planejado. Assim, em 1978, as unidades do Superbom foram vendidas 
para o grupo Pão de Açúcar, com exceção do supercenter de Água Branca (REISS, 
1980, p. 203). Como resultado da operação, Abílio Diniz chegou a fazer parte do 
Conselho de Administração da IRFM na época. 
No início da década de 1970, a Matarazzo já passava por uma situação 
delicada, tendo obtido três anos seguidos de prejuízo entre 1967 e 1969. De acordo 
com a empresa, os resultados negativos eram consequência da adoção, por parte da 
empresa, da Portaria 71, criada pelo governo com o objetivo de estimular empresas a 
não reajustar os preços e, assim, contribuir para frear a inflação (RELATÓRIO ANUAL 
1969). 
98 
 
 
 
Foi nesse período, também, que a Matarazzo intensificou os investimentos no 
Nordeste através dos incentivos SUDENE (Superintendência do Desenvolvimento do 
Nordeste). A Companhia Paraíba de Cimento Portland - Cimepar, por exemplo, 
lançou um plano de expansão da produção de 400 para 1.400 toneladas diárias, com 
o volume excedente produzido sob o método de via seca, mais moderno. Além disso, 
criou a Polynor para a fabricação de poliéster e fibra sintética com o fornecimento de 
tecnologia por uma empresa japonesa. 
Todavia, como não mais dispunha do capital necessário para financiar projetos 
dessa magnitude, começou a buscar novos sócios para esses empreendimentos. Para 
obter recursos, além de conseguir um financiamento pela SUDENE, realizou 
subscrição de ações preferenciais com direito a dividendo fixo de 12% ao ano, além de 
títulos de dívida com juros de 12% ao ano e reembolso em um prazo de cinco anos. O 
trecho a seguir destaca a chamada de investimentos feita pelo grupo no jornal O 
Estado de São Paulo (1971): 
 
“Se você soubesse que Matarazzo estava começando a fazer fortuna, 
você se juntaria a ele? Então, está em tempo. Depois de formar, em 
quase um século de atividades, o maior grupo de empresas 
totalmente nacionais, Matarazzo está investindo no Nordeste. A 
explicação é simples. Por ser a região que mais cresce no Brasil, o 
Nordeste é o melhor negócio do momento. Essa nova história do 
Grupo Matarazzo já tem 22 anos. Foi quando ele implantou no 
Nordeste a Cimepar – Companhia Paraíba de Cimento Portland. E 
todos os que participaram do projeto, junto com Matarazzo, estão 
tendo lucros. Vai daí, o Grupo Matarazzo partiu para outro projeto, 
ainda mais arrojado: Polynor, um gigantesco parque industrial de fios 
sintéticos que está sendo construído em João Pessoa. Com todas as 
condições para dominar o mercado, na região que mais precisa de 
fibra no país. Localização ótima, facilidade de transporte e 
comunicação. Abundância de energia elétrica. Excelente mão de 
obra. Para realizar o projeto Polynor, num investimento de 112 
milhões de cruzeiros, é que Matarazzo precisa de sócios. Você está 
convocado. Aplique os incentivos fiscais de sua empresa na área da 
Sudene. E opte Cimepar ou Polynor. Olhe para o passado da 
Matarazzo. E veja seu futuro” (ESTADÃO, 1971). 
 
Além da obtenção de financiamentos e subscrição de ações, a organização 
buscou novas fontes de captação de recursos incluindo a venda de empresas, além de 
equipamentos, sucata, terrenos e prédios. Entretanto, como havia poucas empresas 
lucrativas, essas vendas não foram suficientes para equilibrar as finanças do grupo, 
deixando a empresa extremamente endividada (REISS, 1980, p. 208). Entre os 
desinvestimentos realizados no período,o mais impactante foi a venda do edifício 
sede do grupo em 1972, pelo valor de 73 milhões de cruzeiros (ESTADÃO, 1972). O 
Entrevistado 1, que estava no grupo nesse período, apresentou o seu relato: 
 
99 
 
 
 
“O prédio Matarazzo só foi vendido porque o Matarazzo estava 
endividado até a cabeça, na época. E o Estado pressionava. Uma 
das pressões era que ele vendesse tudo aquilo que não era produtivo 
ou economicamente favorável. Por isso que eu dei risada quando eu 
falava em fábrica de pregos, fábrica de velas, gesso, etc. Porque tudo 
isso era fruto daquela ideia inicial de ser autossuficiente. Mas que não 
se justificava mais na época. Então, a fábrica de gesso não dava 
lucro. A fábrica de velas não dava lucro. Mas obrigava a ter um 
controle, uma despesa. E o prédio Matarazzo era chamado de 
fantasma. Porque era muita coisa. Era muita despesa, para quem 
está muito endividado.” 
 
Durante esse período de turbulência, o Conde Chiquinho também lançou mão 
de iniciativas para reestruturar a gestão da organização. Dessa forma, inicialmente 
buscou centralizar questões técnicas e comerciais criando grupos de controle 
específicos para as diferentes linhas funcionais do grupo. 
Para aumentar a centralização das informações, em 1963, foi instalado no 
prédio do escritório central um sistema de computador IBM 1401 com memória de 
discos e unidades de fitas magnéticas, destinados à tarefa de executar serviços 
administrativos contábeis (RELATÓRIO ANUAL 1963). 
Ainda, com o intuito de alterar a estrutura administrativa da organização, 
Chiquinho contratou a consultoria Delloite, em 1967, que propôs uma nova estrutura 
divisional descentralizada que, de acordo com REISS (1980, p. 206), nunca chegou a 
se enraizar completamente, conforme seu relato apresentado: 
 
“Mesmo que todos os novos investimentos realizados pela Matarazzo 
durante esse período fossem bem sucedidos, o que provavelmente 
não é o caso, o fato principal é que a organização não modificou 
substancialmente o seu perfil de acordo com as novas condições 
dominantes da economia” (REISS 1980, p. 204). 
 
 Vale ressaltar, no entanto, que a reestruturação não deixou de trazer ganhos 
para a organização. Um faturamento, por exemplo, demorava em média oito dias para 
ser realizado antes da descentralização. Após a iniciativa, o tempo para efetuar o 
processo foi reduzido pela metade (EXAME, 1972). 
A intenção de implantar um modelo descentralizado já se mostrava aparente no 
Relatório Anual de 1965, no qual em um trecho destacado a seguir, constata-se uma 
crítica ao método de gestão da União Soviética: 
 
“A tendência de descentralização, cuja execução presentemente se 
nota na comunidade soviética, e a mesma eliminação de Nikita 
Krushchev, são indícios eloquentes da incapacidade da agricultura e 
indústria russa, encalhada devido às programações rígidas e 
centralizadas.” 
 
100 
 
 
 
O projeto de consultoria ainda gerou um novo sistema de remuneração por 
desempenho, no qual os funcionários tinham que atender metas específicas de 
produtividade. Esses incentivos poderiam atingir até 45% do salário base (EXAME, 
1972). 
Em 1976, a reforma da estrutura de gestão é finalizada com a criação de um 
Conselho de Administração e uma Diretoria Executiva que tinha o Conde Chiquinho na 
presidência e um superintende logo abaixo dele. Este posto foi ocupado por Sérgio 
Batista Zacarelli que era Diretor da FEA/USP e foi contratado para assumir o cargo. 
Subordinados a ele, estavam três diretores que já tinham carreira na Matarazzo, sendo 
que Renato Salles era marido de Maria Pia, filha de Chiquinho. A figura 5-4 apresenta 
essa configuração. Como é possível perceber, Ermelino e Eduardo não faziam mais 
parte da direção, pois tinham sido afastados do grupo pelo Conde Chiquinho. 
Paralelamente à reestruturação do organograma do grupo, também se 
importou novas tecnologias, além de técnicos e gestores para tentar recuperar as 
unidades do grupo. Raymond Baxter, químico inglês que chegou à IRFM em 1968 fez 
o seu relato sobre a situação em uma entrevista para a Exame (1972): 
 
“Eu vi o esforço que eles fizeram, comprando tecnologia em todo o 
mundo e colocando gente jovem em fábricas doentes”. 
 
Figura 5-2 – Estrutura da Diretoria Executiva em 1976 
Fonte: Vilela e Rodrigues (2013) 
 
Em 1969, com a proposta de profissionalizar a gestão, Francisco Jr. contratou 
um especialista de marketing da Procter & Gamble, para assessorá-lo por um período 
de três anos, por um salário mensal de US$ 5 mil. Por dois anos, o cubano Rene 
Picard enfrentou a estrutura conservadora das empresas. Numa luta muito difícil 
Francisco 
Matarazzo Jr 
Presidente 
Sérgio Baptista 
Zaccarelli 
Diretor Superintendente 
Milton Getúlio da 
Cunha 
Diretor 
Antônio de Abreu 
Coutinho 
Diretor Financeiro 
Renato Salles 
Cruz 
Diretor 
101 
 
 
 
contra a máquina administrativa do grupo (os homens de confiança temiam as suas 
decisões e retardavam as execuções), pouco pode fazer (REVISTA DE ECONOMIA E 
NEGÓCIOS, 1972). O entrevistado 1, que foi convidado pelo Conde para ocupar um 
cargo de chefia nessa mesma época e recusou, relatou o porque de sua decisão, 
corroborando as dificuldades enfrentadas por Picard: 
 
“Porque a podridão era muito grande. E eu sabia que aquele seria o 
meu túmulo. Que eu ia morrer ali do coração. Que eu ia querer fazer 
o que eu fiz em todas as unidades. Consertar. E ali seria muito difícil. 
Atrás da sujeira estavam os filhos, o tio, o genro, os parentes. E eu 
não ia conseguir. Eu ia morrer. Eu sabia que eu estava assinando a 
minha carta de demissão. Porque nunca ninguém se atreveu a 
desobedecer o Conde. Eu passei o meu cargo para o meu substituto.” 
 
O entrevistado 1 também relatou a importância dada por Chiquinho à 
contratação de técnicos estrangeiros: 
 
“Ele importava muitos técnicos estrangeiros. Era a preferência dele. 
Então, o melhor usineiro do Peru, ele trazia para o Brasil. O melhor 
diretor têxtil, ele trazia da Inglaterra. E assim por diante. Ele nunca ia 
procurar um dos melhores. O melhor. E pagava. Mas pagava de uma 
maneira brutal”. 
 
A década de 1970 também demarca a segunda transição no comando da 
IRFM. Chiquinho Matarazzo, assim como o seu pai havia feito quase meio século 
antes, definiu um único herdeiro para comandar de forma centralizada as atividades da 
organização. A escolhida foi sua filha mais nova, Maria Pia. (REISS, 1980, p. 214). 
O primeiro testamento que já apontava Maria Pia como sucessora datava de 
1954, quando ela tinha apena doze anos de idade (MATARAZZO, 1982, p. 160). 
Todavia, mesmo com a escolha sendo feita com grande antecedência, assim como 
ocorreu no primeiro processo, os outros filhos ficaram insatisfeitos. Ermelino e 
Eduardo entraram na justiça reivindicando seus direitos, mas perderam em decisão 
judicial no ano seguinte e acabaram entrando em acordo com a irmã (VEJA, 1983) 
Nas palavras do entrevistado 1 que trabalhou no grupo até 1974, Maria Pia era 
a menos preparada para assumir o comando do grupo. A própria herdeira do império 
afirmaria mais tarde que não foi devidamente preparada para ocupar a posição: 
 
“Fui treinada para ser mulher de alguém, não para ser o que sou. O 
homem tem outro tipo de preocupação. Acho o homem, também, 
fisicamente mais forte, ele se cansa menos” (O ESTADO DE SÃO 
PAULO, p. 81). 
 
Maria Pia começou a trabalhar no grupo apenas em 1976, primeiro nas 
divisões têxteis e, depois, nas áreas de propaganda e marketing, sua verdadeira 
102 
 
 
 
especialidade (ESTADÃO, 1983). A situação enfrentada por ela não seria fácil, como é 
possível perceber em um relatório redigido pelo BNDES, após uma avaliação técnica 
realizada na organização: 
 
“Quando do falecimento do conde, a situação era caótica. As 
avaliações de situações e decisões vinham sendo tomadas com base 
na sensibilidade do Conde, cujos padrões de referência, como é 
compreensível, revelavam-seabsolutamente inadequados às 
condições econômico-financeiras e sociais do Brasil dos anos 60 e 
70, principalmente” (VEJA, 1983). 
 
O primeiro direcionamento de Maria Pia foi de que a Matarazzo deveria 
profissionalizar-se e estruturar-se, deixando de ser uma empresa familiar (ESTADÃO, 
1981). Além disso, decidiu direcionar o grupo para as atividades fabris, principalmente 
para o setor de alimentos. Assim, foram vendidas diversas atividades comerciais e, 
também o Banco Matarazzo que em 1977 contava com apenas uma sucursal. 
Em 1978, realizou uma joint venture com a americana Hershey Foods com o 
objetivo de reorganizar o seu sistema de produção e distribuição de alimentos. Como 
resultado, a empresa recebeu know how e capital para fortalecer o seu negócio 
(REISS, 1980, p. 215). 
 Em 1979, uma ideia que acompanhava o Conde Chiquinho desde o início da 
década finalmente foi colocada em prática: a transformação da IRFM em uma holding, 
agrupando as unidades do grupo em empresas de acordo com as suas similaridades. 
A tabela 5-4 apresenta o resultado dessa nova configuração. 
Mesmo com essas iniciativas, entre 1980 e 1981, o grupo apresentou prejuízo. 
Em 1982, por sua vez, o faturamento da IRFM foi de 56,5 bilhões de cruzeiros e o 
lucro líquido atingiu 2,4 bilhões. Por outro lado, algumas unidades começavam a 
enfrentar atrasos de salários e greve de funcionários. 
Para recuperar parte das perdas e melhorar a saúde financeira da organização, 
a Matarazzo continuou vendendo empresas. Entre elas estavam: A fábrica de café 
solúvel instalada em joint venture com uma empresa americana; a Portland Cimepar, 
considerada a melhor das empresas do conglomerado; a fabricante de biscoitos 
Petybon que tinha participação da Hershey Foods; a Companhia de Navegação 
Matarazzo; e a fabricante de plásticos Plastvil (VEJA, 1983). 
 
 
 
103 
 
 
 
Tabela 5-4 - Divisão da Matarazzo em Empresas 
Novas 
empresas 
Unidades 
Valor do 
ativo fixo 
reavaliado 
(Cr$ mil) 
Previsão 
de 
vendas 
em 1980 
(Cr$ mil) 
Indústrias 
Matarazzo de 
Óleos e 
Derivados SA 
Descaroçador – Votuporanga (SP) 
Fábrica de Óleos e Derivados – Rancharia (SP) 
Descaroçador – Rancharia (SP) 
Fábrica de Óleos e Derivados – Campinas (SP) 
Fábrica de Óleos e Derivados – Umuarama (PR) 
Descaroçador – Presidente Wenceslau (SP) 
501.673 3.229.811 
Indústrias 
Matarazzo de 
Papéis AS 
Fábrica de Papéis Belenzinho – São Paulo (SP) 
Fábrica de Celulose – São Caetano do Sul (SP) 
Fábrica de Papéis – Santa Luzia (MG) 
Fábrica de Papéis – Cataguases (MG) 
630.311 2.448.708 
Indústrias 
Matarazzo de 
Embalagens 
Fábrica de Embalagens – Erm. Matarazzo (SP) 
Fábrica Celosul – Ermelino Matarazzo (SP) 
Fábrica de Papelão Mariângela – São Paulo (SP) 
Fábrica de Papel Miolo – Fazenda Amália (SP) 
1.233.971 4.233.402 
Indústrias 
Matarazzo de 
Cimento e 
Mineração SA 
Fábrica de Cimento – Morretes (RS) 161.778 428.811 
Indústrias de 
Artefatos de 
Cerâmica SA 
Fábrica de Azulejos Cláudia – São Caetano do 
Sul 
171.817 628.667 
Florestal 
Matarazzo AS 
Diversas Fazendas 722.447 32.739 
Indústrias 
Químicas 
Matarazzo SA 
Fábrica de Soda – São Caetano do Sul (SP) 
Oficina Mecânica – São Caetano do Sul (SP) 
340.965 982.328 
Indústrias 
Matarazzo de 
Fibras 
Sintéticas 
Fábrica de Nylon – São José dos Campos (SP) 497.013 1.061.942 
Indústrias 
Matarazzo de 
Óleos do 
Nordeste 
Fábrica de Óleos – João Pessoa (PB) 63.124 238.394 
Indústrias 
Matarazzo de 
Alimentos SA 
Fábrica de Óleos e Derivados – São Paulo (SP) 
Moinho de Trigo do Brás – São Paulo (SP) 
207.507 2.795.365 
Fonte: Relatório Anual 1979 
Apesar do forte movimento de venda de ativos e da deterioração nos 
resultados da IRFM, Maria Pia, respondendo uma matéria na Revista Veja, negou 
quaisquer dificuldades financeiras no grupo e ainda reafirmou o intuito de continuar 
crescendo: 
 
104 
 
 
 
“Nas atuais e gerais dificuldades do país, o Grupo Matarazzo, um dos 
mais representativos do capital nacional, inclui-se entre os que 
melhores condições têm para resistir às investidas 
desnacionalizantes que se iniciam invariavelmente, na faixa marginal 
do mercado de escândalo, onde os traficantes da difamação 
mercantilizam o abuso da liberdade de imprensa. É verdade que o 
Grupo Matarazzo, um dos maiores complexos industriais do Brasil, 
está empenhado em crescer com o país, em aumentar a produção, 
em ampliar o mercado de empregos, em contribuir para a 
redistribuição de rendas através do mais amplo processamento dos 
variadíssimos recursos nacionais” (ESTADÃO, 1981). 
 
Apesar de todos os desinvestimentos realizados que totalizaram 180 milhões 
de dólares, a organização não conseguiu contornar o seu grave problema financeiro. 
Assim, em 18 de julho de 1983, o grupo de onze empresas da IRFM que juntas 
acumulavam uma dívida de 160 milhões de dólares (94 bilhões de cruzeiros) pede 
concordata. Com um patrimônio de 80,7 bilhões de cruzeiros, o grupo tinha apenas um 
quarto do tamanho da Votorantim, o maior conglomerado empresarial brasileiro da 
época (VEJA, 1983). 
No pedido, a IRFM propunha pagar os credores em duas parcelas, sendo dois 
quintos do seu passivo no final do primeiro ano e o restante ao fim do segundo. A 
concordata ainda permitiu a conversão da dívida estrangeira em moeda nacional com 
juros de 12% ao ano e sem correção cambial (O ESTADO DE SÃO PAULO, 1983). 
O documento oficial da concordata incluiu uma série de acusações contra o 
governo pela política que privilegiava o capital externo e pela falta de ajuda oficial, 
embora os três maiores credores das empresas concordatárias fosses bancos 
estatais: BNDES (32 bilhões de cruzeiros), Badesp (7,5 bilhões) e o Banco do Estado 
de São Paulo (5,3 bilhões). 
Para o economista Luciano Coutinho, além da dependência do mercado de 
produtos tradicionais, cuja demanda estava diretamente ligada ao poder aquisitivo dos 
salários mais baixos que ficavam cada vez mais achatados devido à situação 
econômica do país, faltou também agilidade para escapar da recessão. Para Coutinho, 
se não fossem as elevadas taxas de juro e a retração da demanda, o grupo talvez 
tivesse tido condições de fazer uma reciclagem de sua estrutura. O pedido de 
concordata havia sucedido uma maxidesvalorização do cruzeiro em 30%, ocorrida em 
fevereiro daquele ano, e que teve um impacto muito forte sobre as empresas do grupo, 
que tinham um volume elevado de dívidas em moeda estrangeira. O economista ainda 
expôs que a situação que a Matarazzo chegou não difere muito das indústrias 
tradicionais do setor têxtil do Nordeste, que faliram em massa no início dos anos 80. 
As que sobreviveram, segundo Coutinho, detinham tecnologia moderna e exportavam 
grande parcela de sua produção (ESTADÃO, 1983). 
105 
 
 
 
A tabela 5-5 apresenta como era a composição de receitas da IRFM nos anos 
que precederam a concordata e logo após o pedido em 1983. 
 
Tabela 5-5 Composição do Faturamento da IRFM por Setor (%) 
Setores 80 81 82 83 
Produtos de Consumo 31,5 35,3 29,2 7,7 
Químico 10,2 8,2 13,0 17,4 
Plásticos 16,4 10,6 9,7 6,8 
Mineração 9,8 13,5 6,3 6,2 
Papel e Celulose 7,1 6,7 12,1 17,3 
Embalagens 10,1 11,5 18,1 27,9 
Açúcar e Álcool 4,8 7,7 10,1 15,0 
Serviços 1,3 1,2 1,5 1,7 
Têxtil 8,8 5,3 0,0 0,0 
Fonte: Relatório Anual 1983 
 
O período que sucedeu a falência no início dos anos 80 foi extremamente 
conturbado. Os irmãos de Maria Pia, que eram ex-diretores da IRFM, fizeram uma 
série de ataques à gestão do grupo, conforme pode ser evidenciado em entrevista de 
Ermelino à revista Veja (1983): 
 
“Os problemas que levaram à concordata derivam da má gestão do 
grupo [...] Basta conferir o currículo dos diretores do grupo para se 
concluir sobre a qualidade da gestão”. 
 
Em seu relato, Ermelino cita indiretamente o vice-presidente de coordenação 
geral, o segundo cargo mais importante da organização e que desde1978 era 
ocupado pelo quarto marido de Maria Pia, Roberto Calmon de Barros Barreto, que era 
ex-diretor do Unibanco. 
Em 1985, tentando se recuperar, a IRFM realiza um grande investimento em 
pessoal, principalmente na área comercial, "em que o grupo era fraco", de acordo com 
o vice-presidente Roberto Calmon (O ESTADO DE SÃO PAULO, 1985). No mesmo 
ano, anuncia um novo plano de investimento na indústria de papel. A proposta era 
aproveitar a infraestrutura de uma planta desativada localizada em São Roque, para 
instalar uma unidade para fabricação de 200 toneladas/dia de CTMP (produto 
intermediário entre a pasta mecânica e a celulose química). Tratava-se de um 
investimento relativamente baixo em um projeto de tecnologia moderna (ESTADÃO, 
1985). 
106 
 
 
 
Em 1987, a Matarazzo enfrentava grandes dificuldades para quitar as suas 
dívidas. Por isso, o BNDES entrou com uma ação judicial contra a empresa para a 
cobrança de duas prestações atrasadas, referente a um débito de Cz$ 4,7 bilhões. 
Como resultado, o grupo registrou um prejuízo de Cz$ 7,2 bilhões no ano, sendo que 
Cz$ 6,4 bilhões foram referentes ao pagamento da dívida (O ESTADO DE SÃO 
PAULO, 1987). 
Cinco anos depois do pedido de falência, em 1988, o grupo Matarazzo anuncia 
a saída da concordata. De acordo com a direção da IRFM, o último passo foi dado 
com o fechamento de um acordo para renegociação de uma dívida de 
aproximadamente US$ 70 milhões com o Banco do Brasil (BB). O pagamento foi 
prorrogado por um novo prazo de dez anos. No entanto, o jornal Estadão ainda 
ressaltava a existência de pendências com o BNDES que poderiam impedir a saída 
definitiva da concordata (O ESTADO DE SÃO PAULO, 1988). 
O fechamento do processo de falência era um passo necessário para a IRFM 
conseguir viabilizar um novo e grandioso empreendimento. Em 1986, o grupo havia se 
unido à canadense Brascan com o objetivo de construir o maior Shopping Center da 
América do Sul no complexo da Água Branca. O projeto ainda previa a construção de 
um hotel e outros dez edifícios comerciais. Para viabilizar o plano, no entanto, a IRFM 
deveria estar fora do processo de falência para conseguir captar mais recursos. Maria 
Pia forneceu um panorama sobre as dívidas com o BB e o BNDES, além do novo 
investimento: 
 
“A parte operacional não consegue pagar essa dívida no todo, 
apenas parte dela. Fizemos, inicialmente, uma desmobilização de 
US$ 180 milhões. Mas eu aprendi a não vender a qualquer preço. 
Todos sabiam que a Matarazzo estava endividada e ofereciam 
valores abaixo do mercado pelas propriedades. Preferi, então, ficar 
com o patrimônio e procurar outras saídas. Temos um terreno na 
Água Branca, por exemplo, que poderíamos vender por US$ 30 
milhões. Em vez de vendê-lo, contudo, tratamos de procurar uma 
atividade para ele. [...] O Shopping deve ficar pronto em 1991. Nos 
primeiros 12 anos, segundo a composição acertada, nós 
receberemos 75% da receita para pagar a dívida com o Banco do 
Brasil” (O ESTADO DE S. PAULO, 1989). 
 
Vale ressaltar, ainda, que como diversos prédios do complexo eram tombados, 
houve um grande imbróglio envolvendo a empresa e a prefeitura, que queria evitar a 
demolição dos edifícios. Devido a esse problema e, também, pela questão da 
necessidade de captação de recursos, a execução do projeto se arrastaria pelos anos 
seguintes. 
107 
 
 
 
Assim, de maior grupo empresarial do país durante várias décadas, a 
Matarazzo chegaria ao final da década de 1980 em uma situação muito diferente. Em 
1989, teve um faturamento pouco superior a US$ 400 milhões, com um pequeno lucro 
operacional. O patrimônio líquido era de US$ 600 milhões, incluindo a mansão na 
Avenida Paulista, avaliada em US$ 100 milhões (O ESTADO DE SÃO PAULO, 1990). 
Em 1990, Maria Pia deixa a presidência do grupo, mantendo-se como 
presidente do Conselho. Em seu lugar, assume Paulo Sérgio Portugal Graciano, que 
havia sido vice-presidente da IRFM entre 1981 e 1986. No mesmo ano, as oito 
principais empresas das vinte e nove do grupo entraram com um novo pedido de 
concordata. Entre elas, estava Indústria Matarazzo de Embalagens, a principal 
empresa, com 1.840 funcionários e um faturamento anual de US$ 100 milhões. Esse 
novo pedido adiou a construção do shopping em Água Branca (ESTADÃO, 1990). 
Em 1991, o Shopping West Plaza é inaugurado em frente ao complexo de 
Água Branca, praticamente eliminando as possibilidades de a IRFM seguir em frente 
com o seu projeto de construção do Shopping Matarazzo. Assim, passando por um 
novo processo de falência e com possibilidades limitadas de levantar recursos, o 
grupo vê a sua situação financeira se deteriorar rapidamente com dois anos seguidos 
de prejuízo. Em 1991, o déficit atinge Cr$ 67 bilhões e, no ano seguinte, Cr$ 1,1 trilhão 
(ESTADÃO, 1993). 
Assim, em 1992, várias unidades da Matarazzo atrasam os pagamentos de 
salários. Algumas, ainda, ficam paralisadas por falta de energia elétrica, cortadas por 
atraso no pagamento. Entre elas, estava a Indústria Matarazzo de Papel, em 
Cataguases (MG) e a Agro Industrial Amália. A situação se tornou tão caótica que, a 
empresa não tinha dinheiro para realizar a rescisão da unidade de produtos 
termoplásticos em Campinas, que tinha 165 funcionários e estava sendo desativada. 
Por isso, entrou em acordo com o sindicato para que parte do pagamento fosse feito 
com caixas de sabonete Francis que o grupo fabricava em São Paulo (ESTADÃO, 
1992). Além disso, a IRFM começou a sofrer processos pelo não recolhimento de 
FGTS e INSS e, também, pela poluição causada pelas fábricas de São Caetano e 
Belenzinho. 
Assim, a Matarazzo chega em 1994 com 5.000 funcionários e atuação em 
áreas como fibras sintéticas, azulejos, embalagem, papel, comércio, tecido e sabão. A 
tabela 5-6 apresenta a composição do grupo na época: 
 
 
108 
 
 
 
Tabela 5-6 – Perfil do Grupo Matarazzo em 1993 
Empresas 
Patrimônio Líquido 
(em bilhões de Cr$) 
Indústrias Matarazzo de Papéis 142 
Indústrias Matarazzo de Embalagens 144 
Agro Industrial Amália 663,6 
Indústrias Matarazzo de Cerâmica 24 
Indústrias Matarazzo de Óleos e Derivados 12,6 
Indústrias Matarazzo de Fibras Sintéticas 46,8 
Florestal Matarazzo 228 
Indústrias Matarazzo de Óleos do Nordeste 56 
Indústrias Matarazzo do Paraná 135,9 
Fonte: O Estado de São Paulo (1993) 
 
Em 1996, a mansão na Avenida Paulista é demolida e o grupo tenta vender o 
terreno de cinco mil metros quadrados por cerca de US$ 120 milhões. Entretanto, no 
local acaba sendo erguido um grande estacionamento. Em 2007, o ativo finalmente 
seria vendido para a Cyrela e uma empresa do grupo Camargo Corrêa pelo valor de 
R$ 125 milhões (FOLHA ONLINE, 2007). 
Em 1997, o Supercenter Matarazzo, na Água Branca, foi levado a leilão pelo 
Fórum das Execuções Fiscais para o pagamento de impostos atrasados. Avaliado em 
R$ 41,89 milhões, foi arrematado por apenas R$ 18,5 milhões pela Companhia Zaffari 
de Supermercados (ESTADÃO, 1997). 
 A partir dessa época, a Matarazzo passa a ter pouquíssimas operações, entre 
elas, a do sabonete Francis, que seria vendida para o grupo Bertin em 2007 e da 
Fazenda Amália que foi arrendada no mesmo ano (VILELA & RODRIGUES, 2013). 
 Após se desfazer dos negócios, o grupo industrial da Matarazzo deixa de 
existir, restando apenas propriedades arrendadas para terceiros. 
 
 
 
 
 
109 
 
 
 
6 HISTÓRICO VOTORANTIM 
Sorocaba, que chegou a ser chamada de a “Manchester Paulista” pela sua 
vocação industrial, pode ser considerada um berço de colossos brasileiros. Em 1890, 
no mesmo ano em que Francesco Matarazzo saiu da cidade e partiu para São Paulo 
em busca de novas oportunidades, o Banco União de São Paulo comprava as terras, 
instalações e equipamentos da Votorantim, uma companhia que atuava com serrarias 
de mármore na cidade do interior paulista. No ano seguinte, seria instalada na unidade 
uma fábrica de estampariae, em 1903, uma seção de fiação e tecelagem, marcando 
definitivamente sua atuação na indústria têxtil (SOUZA1, 2004, p. 225). ‘ 
Nessa mesma época, Antônio Pereira Ignácio, o empreendedor que daria início 
ao grupo ao incorporar a Votorantim anos mais tarde, já se destacava no comércio de 
algodão. Nascido em Baltar, em Portugal, o jovem Pereira Ignácio tinha apenas dez 
anos quando chegou a Sorocaba acompanhando o seu pai, João Pereira Ignacio, no 
ano de 1884. Ainda criança, começou auxiliando na sapataria que o pai montou, 
enquanto estudava à noite, até concluir o currículo ginasial. Entretanto, quatro anos 
depois de se estabeleceram no Brasil, eles recebem a notícia de que a mãe de 
Antônio que ficara em Portugal havia adoecido. Por esse motivo, João volta para a 
terra natal para ficar com a esposa, deixando o filho no Brasil (CALDEIRA, 2008, p. 
10). 
Assim, ainda adolescente, Antônio vai trabalhar em São Paulo e depois no Rio 
de Janeiro para adquirir experiência e juntar capital para criar o seu primeiro 
empreendimento. Feito que consegue atingir em poucos anos (SOUZA1, 2004, p. 226). 
Primeiro, abriu um pequeno comércio. Depois, um grande armazém de secos e 
molhados em Botucatu, e no início do século vinte, uma fábrica de descaroçamento de 
algodão em Boituva, marcando o movimento que o levaria do comércio para a 
indústria (SCANTIMBURGO, 1986, p. 109). 
Inicialmente, o seu objetivo era produzir óleo de algodão com o intuito de 
vendê-lo mais barato que o óleo da banha de porco. Entretanto, ele sofre uma 
retaliação de Matarazzo que já era um grande produtor de banha de porco da região. 
Por isso, passou a direcionar a sua produção para o setor têxtil (SCANTIMBURGO, 
1986, p. 110). 
Entre 1903 e 1904, ele abriria duas novas unidades de descaroçamento, uma 
na cidade de Tatuí e outra no recém-criado distrito de Conchas, à beira dos trilhos da 
ferrovia Sorocabana (CALDEIRA, 2008, p. 13). 
Nessa mesma época, outro fato importante para a história da Votorantim 
acontecia muito longe dali. Em 1900, nascia em Nazaré da Mata, Pernambuco, José 
110 
 
 
 
Ermírio de Moraes. Filho de uma família tradicional do Estado, o pernambucano 
perdeu o pai com apenas um ano de idade e, por isso, ainda criança começou a ajudar 
sua mãe nos trabalhos do engenho de açúcar da família (SCANTIMBURGO, 1986, p. 
75). 
Voltando para Pereira Ignácio, em 1905. É neste ano que o empreendedor dá 
um importante salto nos negócios quando decide montar uma grande fábrica de 
aproveitamento de algodão, levantando o capital junto a um amigo que tinha negócios 
no Rio de Janeiro. Para conhecer a fundo as técnicas de produção, vai para os 
Estados Unidos trabalhar como operário em uma fábrica sem, no entanto, revelar suas 
intenções para os seus empregadores. Quando, em decorrência de seu desempenho, 
foi convidado a se tornar gerente industrial da planta, contou os seus planos para os 
sócios, que ficaram impressionados e se tornaram importantes parceiros, lhe ajudando 
a comprar as máquinas necessárias para montar a sua própria fábrica no Brasil. Após 
essa experiência, Pereira Ignácio funda, assim, a Fábrica de Óleos Santa Helena 
(VOTORANTIM, 2008, p. 15). Scantimburgo (1986, p. 113), o autor da biografia de 
José Ermírio de Moraes, destaca a importância da viagem de Pereira Ignácio aos 
EUA: 
 
“Sua estada na América fora-lhe proveitosa mais do que se tivesse 
frequentado várias universidades. Aprendera no dia a dia do trabalho, 
na observação registrada com extremo cuidado, de todas as fases da 
produção na qual tinha interesse”. 
 
Assim como Matarazzo, Pereira Ignacio lançou mão de novos métodos de 
comercialização. Antes de inaugurar a fábrica, o empreendedor publicou anúncios nos 
jornais oferecendo aos plantadores um preço pré-fixado para a compra da próxima 
safra de algodão. O resultado lhe rendeu frutos e o empreendedor instalou outras 
quatorze fábricas na região nos dez anos seguintes, expandindo, também, suas 
atividades para o beneficiamento de arroz. Nessa época, começa um período de 
diversificação e crescimento. Adquire a fábrica de cimentos Rodovalho, monta uma 
usina hidrelétrica e compra uma empresa de telecomunicações (DEAN, 1976, p. 112). 
Em 1913, a fábrica de tecidos Votorantim, agora um importante cliente das 
empresas de Pereira Ignacio, já contava com 1.200 operários e um grande distrito que 
incluía casas, escritórios e escolas, além de estar ligada à Sorocaba por uma linha 
particular de bondes. Nessa época, a empresa começa a ter problemas financeiros e 
dificuldades para honrar os compromissos com seus fornecedores. Por isso, Pereira 
Ignacio decide conceder crédito para o seu cliente e, no mesmo ano, torna-se diretor 
do Banco União. Posteriormente, torna-se arrendatário de toda a divisão de algodão. 
Para reduzir sua dependência em relação à Votorantim, amplia sua participação no 
111 
 
 
 
setor, adquirindo, também, as fábricas de tecidos Bom Retiro e Paulistana, além da 
tecelagem São Bernardo. Em seguida, fundou sua mais importante unidade, a 
Lusitânia, que era capaz de produzir quatro milhões de metros de tecido por ano 
(CALDEIRA, 2008, p. 17). 
Como é possível perceber, o crescimento foi substancial. Em um período de 
dez anos, o empresário evoluiu de uma pequena unidade de descaroçamento de 
algodão para um conjunto de fábricas do setor têxtil. Para conseguir essa evolução em 
um curto espaço de tempo, Pereira Ignacio se beneficiou das dificuldades de 
importação de algodão durante a guerra: 
 
“Exemplos das mudanças provocadas na propriedade industrial pela 
escassez de certas matérias-primas são as súbitas fortunas de 
Antônio Pereira Ignácio e Nicolau Scarpa. Os tecidos de algodão só 
poderiam proporcionar ganhos inesperados aos fabricantes que 
dispusessem de uma provisão de algodão. Para as pequenas 
fábricas espalhadas pelo interior, muitas das quais possuíam seus 
próprios algodoais, isso não constituía problema. Mas as grandes 
fábricas das cidades eram presas aos descaroçadores de algodão, 
que, repentinamente, se colocaram em posição sumamente 
estratégica” (DEAN, 1971, p. 111). 
 
Em 1916, com dezesseis anos, José Ermírio de Moraes foi para os Estados 
Unidos estudar na Colorado School of Mines, em Golden, no Estado de Colorado. Lá 
permaneceu por cinco anos e para Scantimburgo (1986, p. 85) esse período foi 
fundamental para o jovem conhecer o dinamismo do empreendedorismo americano, a 
dedicação ao trabalho, a objetividade e a disposição para conduzir projetos até o fim. 
 
“O primeiro traço de americanismo em José Ermírio foi, passados 
alguns meses de sua estada em Colorado, escrever à mãe para não 
lhe mandar dinheiro, pois já havia arranjado um emprego fora das 
horas de estudo. [...] Daí por diante, até 1921, quando se graduou, 
José Ermírio sustentou-se nos Estados Unidos” (SCANTIMBURGO, 
1986, p. 82). 
 
Para Scantimburgo (1986, p. 97), José Ermírio de Moraes foi para o que havia 
de melhor em educação e preparação tecnológica. Numa fase em que predominavam 
as escolas humanísticas no Brasil, ele voltaria com uma forte capacitação, fonte de 
vantagem competitiva para os seus negócios. 
Em 1917, a Votorantim, que era a segunda maior fábrica de São Paulo, estava 
falindo e com os operários em greve devido ao atraso de três meses no pagamento 
dos salários. Assim, Pereira Ignacio e seu sócio Nicolau Scarpa compraram a fábrica 
em leilão público por apenas cinco mil contos, formando, assim, a Sociedade Anônima 
Fábrica Votorantim (DEAN, 1971, p. 113). 
112 
 
 
 
Pereira Ignacio tomou a frente da organização que teria três campos de 
atuação: fabricação de produtos têxteis, exploração de jazidas de minérios e 
exploração da via férrea Votorantim (CALDEIRA, 2008, p. 25). 
Dessa forma, em apenas um ano, o empreendedor português passou a deter 
17% da capacidade de fabricação de tecidos de algodão em todo o Estado, além de 
contar com 122 mil contos (30,5milhões de dólares) de capital circulante (DEAN, 
1976, p. 113). Assim, concentrando suas atividades principalmente no setor têxtil, 
Pereira Ignacio construiu um grupo com duas dezenas de unidades, tendo a 
Votorantim no centro dos seus negócios, além de um escritório central localizado na 
Rua São Bento, no Centro de São Paulo. Em 1919, o grupo tinha unidades de 
descaroçamento nas seguintes localidades: Sorocaba, Tatuí, Porto Feliz, Conchas, 
Itapetininga, Campo Largo, Boituva, Tietê, Avaré, Piracicaba, Monte Mor, Nova 
Odessa, Itu, Jundiaí, Inhaiba e Rebouças (ESTADÃO, 1919). 
Entretanto, ao final do primeiro ano da aquisição da Votorantim, o valor da 
fábrica havia chegado a 1.650 contos e as dívidas adquiridas para sanar a sangria 
eram superiores a três mil contos. Para encontrar soluções para o problema, Pereira 
Ignacio se licencia do cargo de presidente e vai para os EUA. Na sua volta, contrata 
um auditor para fazer o levantamento dos ativos da empresa e fixar o preço para 
execução de compra das partes dos demais acionistas. Assim, adquire a parte dos 
seus sócios, transfere a Rodovalho para o grupo Votorantim, moderniza os 
equipamentos da fábrica, realiza mudanças nos estatutos visando a estruturação da 
administração e vende ativos para se capitalizar (CALDEIRA, 2008, p. 29). 
Entre os desinvestimentos realizados, estavam os terrenos e edifícios onde 
estava instalada a Companhia Têxtil Paulistana que havia sido comprada anos antes. 
Além disso, a Votorantim tinha diversos terrenos em São Paulo, como no bairro do 
Brooklin Paulista, e em São Caetano, que passaram a ser vendidos em prestações 
para o público em geral (ESTADÃO, 1921). Entre 1920 e 1923, a empresa conseguiu 
captar 3.400 contos de réis com a venda de terrenos (ESTADÃO, 1923). 
Além disso, no segundo semestre de 1920 a diretoria toma uma decisão que 
viria a se tornar uma característica permanente do grupo: reaplicar os resultados 
obtidos de modo a aumentar as reservas da empresa (CALDEIRA, 2008, p. 29). Com 
as iniciativas empreendidas, a Votorantim começou a reverter a sua situação 
financeira já a partir de 1920. 
Portanto, apesar de não ter atingido um porte similar à Matarazzo, além de ser 
muito menos diversificada, a Votorantim havia se tornado um concorrente de peso da 
IRFM no setor têxtil e Pereira Ignacio já figurava entre os grandes industriais paulistas, 
113 
 
 
 
o que permite uma breve comparação feita por Antônio Ermírio de Moraes sobre as 
duas organizações: 
 
“A Matarazzo seguiu construindo mais e mais fábricas diferentes. Já a 
Votorantim preferiu fazer um processo muito seletivo” (COUTO, 2005, 
p. 342). 
 
No início da década de 20, Pereira Ignácio já era um grande empresário, 
conhecido como o “Rei do Algodão” e havia conseguido atenuar os problemas 
financeiros da fábrica têxtil Votorantim, da qual se tornara o único sócio. Isso lhe 
permitiu dar passos mais largos. Começou construindo uma ferrovia para escoar a 
produção e transportar os funcionários da Votorantim para o centro de Sorocaba. A 
infraestrutura ficou pronta em 1922 e se tornou a primeira ferrovia eletrificada 
particular do país. No mesmo ano, modernizou a fábrica comprando novos teares 
(CALDEIRA, 2008, p. 30). Um ano após a conclusão da ferrovia, a Fábrica Votorantim 
se mantinha como uma das maiores do país, com 3.400 operários (SAES & NOZOE, 
2006). 
Em 1923, Pereira Ignácio se licencia do cargo e vai para a Europa acompanhar 
a esposa que sofria de asma e iria fazer um tratamento na Suíça. Assim, Numa de 
Oliveira, diretor e acionista do Banco do Comércio e Indústria de São Paulo, assume a 
direção da empresa. Numa era um empresário experiente e conhecia bem a empresa, 
pois fazia investimentos nela. Nesta época, o filho mais velho de Pereira Ignácio, João 
Pereira Ignácio torna-se diretor tesoureiro da Sociedade Anônima Tecidos Votorantim 
(CALDEIRA, 2008, p. 31). 
No mesmo período, José Ermírio de Moraes regressara do seu período de 
estudos nos Estados Unidos. Em 1921, se empregou como funcionário público do 
Governo de Minas Gerais, mapeando as riquezas minerais do Estado. No ano 
seguinte, foi trabalhar na St. John Del Rey Mining Co. onde iria atuar como técnico de 
mineração. Em 1923, no entanto, José Ermírio recebe uma carta do cunhado que lhe 
informa que a usina de açúcar da família estava enfrentando problemas financeiros. 
Assim, com 23 anos, o jovem engenheiro deixa o emprego e vai para o Recife para se 
tornar gerente-geral da usina. Para salvar a empresa, decide que é necessário 
modernizá-la e, portanto, parte para a Inglaterra com o objetivo de comprar novos 
equipamentos (CALDEIRA, 2008, p. 48). 
José Ermírio aproveita a viagem para levar a sobrinha que estava doente para 
realizar um tratamento na Europa que, por coincidência, seria realizado na mesma 
clínica na Suíça onde já estavam Pereira Ignácio, sua mulher e sua filha Helena, pela 
qual José Ermírio viria a se apaixonar. Com a aproximação dos dois, Pereira Ignácio 
114 
 
 
 
percebe um grande potencial no pretendente de sua filha e, então, convida o jovem 
Pernambucano para trabalhar como executivo na Votorantim. 
Assim, em 1924, José Ermírio vai para Recife para coordenar a instalação dos 
equipamentos e de lá migra para São Paulo para iniciar uma nova jornada profissional. 
No ano seguinte, João Pereira Ignácio adoece e precisa se afastar da diretoria 
comercial da Votorantim, sendo o cargo preenchido por José Ermírio de Moraes 
(CALDEIRA, 2008, p. 53). 
A chegada do novo profissional com sua bagagem de conhecimentos técnicos 
gerava um diferencial ao grupo, conforme relato apresentado por Scantimburgo (1986, 
p. 123) sobre os industriais na década de 1920: 
 
“O industrial era guiado mais pelo instinto do que por segura 
informação técnica”. 
 
Em 1924, Pereira Ignácio chegou à conclusão que o custo das moradias dos 
seus funcionários já havia sido amortizado e, por isso, decidiu abolir a cobrança dos 
aluguéis das casas da vila da Votorantim. Além disso, os funcionários que não 
conseguiriam se alojar nas casas da companhia, recebiam compensações de dez mil-
réis mensais. Isso gerou uma retaliação dos outros donos de fábricas que exigiram 
através da CIFTSP que a Votorantim restaurasse os aluguéis. Em 1924, a vila operária 
da Votorantim já contava com 834 casas (ESTADÂO, 1935). 
Isso, contudo, não indica uma benevolência do empresário em relação aos 
empregados. Segundo Dean (1971, p. 180), no ano de 1928, Pereira Ignácio chegou a 
dispensar funcionários em massa devido à indisciplina e tumultos de trabalhadores. 
Embora a Votorantim tenha recuperado a sua saúde financeira, a Revolução 
Tenentista de 1924 afetou drasticamente a indústria de São Paulo. Assim, segundo 
Scantimburgo (1986, p. 125), quando José Ermírio de Moraes assume o seu posto na 
organização em 1925, a Votorantim ficou novamente em situação financeira crítica, o 
que viria a exigir novos esforços para tornar a empresa lucrativa novamente. 
Dessa forma, em 1926, Pereira Ignácio amplia o capital da Votorantim de cinco 
mil para vinte mil contos, utilizando, para isso, os recursos que havia obtido com a 
venda de ativos. Assim, reduziu ainda mais a dependência de créditos de terceiros e 
possibilitou a recuperação financeira da organização. Com o maior controle do capital 
da empresa, Pereira Ignácio também retoma o cargo de presidente de Numa de 
Oliveira e elege José Ermírio de Moraes como diretor-gerente. 
Ainda em 1926, João Pereira Ignácio, o filho mais velho do fundador do grupo, 
retorna à empresa como diretor tesoureiro e Paulo, o filho mais novo, assume o posto 
que estava com José Ermírio (CALDEIRA, 2008, p. 56). Nessa mesma época, o grupo 
115 
 
 
 
adquire a usina hidrelétrica Boa Vista localizada na bacia do rio Paranapanema (SAES 
& NOZOE, 2006). 
Em 1928, José Ermírio de Moraes assina, como representante da Votorantim, o 
manifesto "Votorantim,Matarazzo e Klabin", grupo que daria forma à fundação do 
CIESP. Matarazzo foi o primeiro presidente e José Ermírio foi um dos quatro diretores 
(CALDEIRA, 2008, p. 59). 
Em 1929, durante a grande crise, a Votorantim ainda era demasiadamente 
dependente da indústria têxtil, o que tornava o desafio de enfrentar a depressão ainda 
maior, uma vez que conforme já destacado na descrição do desenvolvimento 
econômico e industrial do Brasil, este setor foi um dos mais afetados no período. De 
acordo com os relatos de Scantimburgo (1986, p. 147), a indústria têxtil nessa época 
era pouco lucrativa, operando muito próxima do ponto de equilíbrio. José Ermírio de 
Moraes relatou as dificuldades da época: 
 
“Somente a segurança em mim mesmo, na empresa e no Brasil, e o 
apoio irrestrito de meu sogro, animavam-me a prosseguir sem 
desfalecimento. Foram anos sombrios para todos os industriais, como 
para os agricultores e comerciantes. O Brasil era economicamente 
muito fraco” (SCANTIMBURGO, 1986, p. 143). 
 
Nesse período, a Votorantim contava com uma estrutura relativamente enxuta 
composta de quarenta funcionários na administração. O comando, por sua vez, era 
centralizado principalmente na figura de José Ermírio de Moraes, que era o 
responsável pelas operações do grupo. Isso garantia a agilidade nas tomadas de 
decisão. Além disso, a política de reinvestimento dos lucros contribuiu para a empresa 
atravessar o período de turbulência (CALDEIRA, 2008, p. 62). 
Entretanto, devido às dificuldades enfrentadas pelo setor têxtil, José Ermírio e 
Pereira Ignacio entendem que era importante encontrar novas oportunidades de 
negócio que permitissem a empresa se tornar menos dependente de uma única 
indústria. Em 1933, ainda com uma economia sob o efeito da crise internacional, José 
Ermírio identifica o potencial das jazidas de calcário da fazenda Santo Antônio, sede 
da fábrica de cimentos Rodovalho. Assim, decide criar uma nova fábrica com um novo 
forno importado, mais moderno. São criadas, então, a fábrica Santa Helena e a marca 
de cimento Votoran, com uma capacidade para produzir 250 toneladas de cimento por 
dia (CALDEIRA, 2008, p. 72). Esse volume colocava a Votorantim como terceira maior 
produtora de cimento do país e a primeira com capital nacional (REISS, 1980, p. 117). 
A formação de uma equipe qualificada também foi uma preocupação dos 
empresários. Aproveitando a vinda de um técnico dinamarquês para acompanhar a 
instalação do novo forno importado, José Ermírio o convida para integrar o corpo 
116 
 
 
 
técnico da empresa. O novo funcionário não só aceitou como acabou trazendo outros 
colegas (CALDEIRA, 2008, p. 81). 
Em 1938, o cimento Votoran seria utilizado em uma das principais obras 
públicas de São Paulo, o Viaduto do Chá. Esse evento ajuda a fortalecer a percepção 
de qualidade do produto (CALDEIRA, 2008, p. 81). 
Vale ressaltar que a Votorantim entrou na indústria de cimentos em um 
momento favorável para o setor. Reiss (1980, p. 120) destaca que a produção 
nacional evoluiu de apenas 100 mil toneladas em 1930 para 745 mil toneladas em 
1940, sendo que a participação dos produtos importados no mercado nacional caiu de 
80% para 25% no período. Ainda segundo o mesmo autor (p. 242), uma das 
explicações para esse processo estava na alta relação peso/custo que tornava o 
transporte do produto extremamente caro, fazendo com que o item importado 
perdesse competitividade e abrisse espaço para a produção nacional. 
Na mesma época em que criava o braço de cimentos, a Votorantim passa por 
mudanças na sua administração. José Ermírio constrói uma nova sede para o grupo. 
Pereira Ignácio se afasta cada vez mais do dia a dia das empresas, se encarregando 
de analisar os resultados, enquanto a gestão da organização é transferida de vez para 
o seu genro. A administração da Votorantim passa a ser dividida em seções de acordo 
com a carteira de produtos comercializados (CALDEIRA, 2008, p. 82). 
É interessante destacar, no entanto, que apesar de a Votorantim ser 
usualmente destacada pelo seu processo de sucessão eficiente, a organização não 
passou ilesa por este comum desafio das empresas familiares, conforme destaca 
Dean (1971, p. 130): 
 
 “As brigas da família obstavam, às vezes, ao crescimento das firmas 
industriais. Sentindo-se esbulhados do legítimo controle da firma por 
José Ermírio de Moraes, genro de Pereira Ignácio, os filhos deste 
último decidiram, afinal, vender suas ações a um terceiro. A venda, 
aparentemente, foi maldosa; eles abriram mão de uma oferta mais 
elevada só para dar a Moraes, como novo sócio, um inimigo pessoal.” 
 
Em 1935, a Votorantim dá força ao seu projeto de expansão para a indústria de 
base. Primeiro, fecha um acordo com a Klabin para a construção da Nitro Química 
para a produção de fibra têxtil artificial. Essa empresa contava com sócios norte 
americanos que também trouxeram diretores e técnicos para a implantação no país. 
Isto foi fundamental para a viabilização do empreendimento uma vez que os 
empresários brasileiros compraram uma fábrica pronta dos Estados Unidos, que 
precisou ser desmontada para depois ser instalada no Brasil. Além disso, o processo 
de transporte foi extremamente delicado, exigindo o empréstimo de guindastes 
117 
 
 
 
especiais e o transporte por linhas férreas que só foi concluído no ano seguinte 
(CALDEIRA, 2008, p. 86). 
O desafio de colocar a empresa em funcionamento não se restringiu ao 
processo de instalação da fábrica, mas principalmente em relação à operação em si, 
que era inédita no país: 
 
“A formação de mil pessoas sem experiência prévia no setor, a 
maioria das quais com pouca educação formal, exigiu um cruzamento 
cultural peculiar. Não havia sido importada apenas uma fábrica: toda 
a estrutura administrativa veio junto com os equipamentos, desde os 
organogramas de pessoal até as planilhas de controle de custos, até 
então desconhecidas do universo empresarial brasileiro. Essa 
organização técnica era necessária numa planta complexa, que 
produzia simultaneamente raiom, ácido nítrico, ácido sulfúrico, sulfato 
de sódio, éter, colódio, e nitrocelulose – este com grande potencial 
explosivo” (CALDEIRA, 2008, p. 89). 
 
A nova unidade, localizada em São Miguel Paulista, na Grande São Paulo, era 
totalmente verticalizada, englobando desde a fabricação do ácido sulfúrico até a 
manufatura de derivados. Um relato do jornalista Assis Chateaubriand dá luz ao porte 
e importância do empreendimento na época: 
 
“A Nitro-Química é a maior fábrica do mundo para seda artificial pelo 
processo de intro-celulose. [...] Este parque não é uma fábrica, mas 
um complexo de fábricas. Estamos diante de um sistema industrial, e 
precisamente o mais amplo, o mais interessante que ainda se 
articulou no Brasil e no continente sul-americano. [...] Dagora em 
diante é possível pensar no desenvolvimento da indústria química do 
Brasil” (SCANTIMBURGO, 1986, p. 180). 
 
Entretanto, os custos de instalação somados aos prejuízos operacionais dos 
primeiros meses drenaram todo o capital empregado pelos sócios. Assim, a 
organização teve que recorrer a empréstimos que totalizavam sessenta mil contos de 
réis. Além disso, a iniciativa da Votorantim gerou uma disputa com a fábrica de rayon 
da Matarazzo, a Viscoseda. A Matarazzo havia arrendado uma técnica de produção 
com patente até 1934. Quando ela expirou, tentou ampliar o prazo sem sucesso. A 
Viscoseda, então, cortou o preço da seda artificial de quarenta para dez contos por 
tonelada para penalizar a Nitro Química. Entretanto, o governou ameaçou aplicar uma 
lei antitruste, obrigando a Viscoseda a retomar os preços originais. 
Essa fase turbulenta fez com que os sócios estrangeiros vendessem sua parte, 
tornando a Nitro Química uma empresa totalmente nacional. Porém, em 1939, a sorte 
mudaria de lado. A eclosão da 2a Guerra Mundial fez com que os insumos importados 
se tornassem escassos e carose como os principais competidores não eram 
verticalizados e importavam toda a matéria-prima, a Nitro Química se tornou 
competitiva e lucrativa (CALDEIRA, 2008, p. 94). 
118 
 
 
 
Além desse empreendimento, a Votorantim havia começado a avaliar a 
viabilidade de construção de uma siderúrgica, tendo recebido autorização para 
começar a prospectar jazidas de minério de ferro em Ipanema, região de Sorocaba. 
Todavia, diante das possibilidades limitadas da mina, a Votorantim decide implantar a 
nova usina na região de Barra Mansa. Profundo conhecedor do potencial do ferro de 
Minas Gerais, José Ermírio compreendeu que o município fluminense poderia ser 
abastecido com o minério de Minas e ainda estaria localizado em posição privilegiada 
para o abastecimento dos grandes centros do país. A nova fábrica foi concebida com a 
participação de outros sócios e começou a operar em 1938 com capacidade inicial de 
3.600 toneladas anuais. A empresa começaria fabricando apenas ferro-gusa, o mais 
simples produto siderúrgico. Com isso, seria possível montar altos-fornos com a 
tecnologia existente no Brasil, o que implicava um mínimo de importações 
(CALDEIRA, 2008, p. 84). 
Depois de colocar em prática esses dois projetos, José Ermírio começa a 
expandir as empresas geograficamente, dando um passo mais largo para perseguir 
sua visão de “industrializar o Brasil”. Assim, decide montar uma nova fábrica de 
cimentos em Pernambuco, criando uma segunda marca de cimento que teria forte 
significado local: a Poty. Em 1943, três anos após a inauguração da fábrica, um novo 
forno importado da Dinamarca possibilitou a unidade a atingir uma produção de 6,8 mil 
toneladas anuais de cimento. No mesmo ano, acontece a fundação da Companhia 
Catarinense de Cimento Portland, terceira fábrica de cimento do grupo (CALDEIRA, 
2008, p. 99). 
Em 1943, a Votorantim também adquire a Indústria Brasileira de Artigos 
Refratários (Ibar) que produziria elementos para os fornos de cimento e dos altos-
fornos da siderúrgica. Este era um ramo da atividade essencial às outras indústrias, 
dentre elas as de cimento, vidro, aço, petroquímica e cerâmica, por fornecer produtos 
resistentes à corrosão, à abrasão e ao choque térmico (SANTOS, 2008). 
Portanto, em menos de uma década a Votorantim deixava de ser uma empresa 
têxtil para se tornar um grupo diversificado de empresas. Em 1940, em uma ação 
simbólica que pode demarcar a ênfase que seria dada à indústria de base, a 
organização muda o nome de SA Fábrica Votorantim para SA Indústrias Votorantim. 
(CALDEIRA, 2008, p. 72). Santos (2008) apresenta uma descrição sobre a importância 
desse novo passo dado pela Votorantim. 
 
“A percepção em torno do avanço da urbanização e da necessidade 
de infraestruturas (estradas, hidrelétricas) conduziu à diversificação 
para aço, cimento, refratários. A partir de 1930 o foco privilegiado 
pelo grupo será a expansão na produção de cimento, negócio 
escolhido como âncora para a alavancagem das receitas. A escolha 
119 
 
 
 
dos novos ramos esteve ligada indissociavelmente às oportunidades 
oferecidas pelas substituições das importações e aos 
desdobramentos da industrialização do país”. 
 
Todavia, conforme destacado por Reiss (1980, p. 118), o setor têxtil ainda 
continuou rendendo bons lucros para a empresa, em especial durante a Segunda 
Guerra Mundial, quando os excedentes de capital vindos dessa indústria foram 
imprescindíveis para os investimentos em novos negócios. 
Em 1941, a escassez de recursos causados pela 2a Guerra Mundial iria levar a 
um novo grande empreendimento da indústria de base. Com a falta de combustível, 
uma vez que o Brasil ainda não produzia petróleo, os técnicos da Votorantim 
conseguiram transformar carvão vegetal em gás, que poderia ser utilizado nos 
motores a gasolina. Essa invenção seria o gatilho para a criação da Metalúrgica Atlas, 
que ficaria conhecida como “a fábrica das fábricas” e permitiria à Votorantim montar 
equipamentos industriais pesados, reduzindo, assim, os gargalos de produção 
(CALDEIRA, 2008, p. 100). Segundo Reiss (1980, p. 120), nos seus primórdios, a 
Atlas fabricaria principalmente equipamentos para as fábricas de cimento. 
Dessa forma, a Votorantim consolidava a sua capacidade de desenvolver 
soluções técnicas complexas internamente, o que aumentava sua competência de 
expansão dos empreendimentos. Essa nova capacidade permitiu à empresa 
modernizar e expandir a Siderúrgica Barra Mansa. Assim, na segunda metade da 
década de 1940, foram instalados dois novos altos-fornos na usina para a produção de 
noventa toneladas diárias de ferro-gusa cada um, bem como uma usina completa de 
sinterização com capacidade para seis mil toneladas mês. Ainda, projetou-se e 
instalaram-se dois fornos, possibilitando que a empresa começasse a produzir aço. 
Para garantir o abastecimento, a Votorantim também adquiriu uma jazida de ferro com 
reservas de quatro milhões de toneladas de minério (CALDEIRA, 2008, p. 101). 
Na década de 40, a Votorantim também deu início ao planejamento de um dos 
seus principais empreendimentos, a Companhia Brasileira de Alumínio (CBA). Rico em 
jazidas de bauxita, a matéria-prima do alumínio, o Brasil ainda não tinha uma fábrica 
para a produção do metal (SCANTIMBURGO, 1986, p. 200). 
O mercado internacional, por sua vez, era dominado por seis grandes 
empresas que atuavam como um cartel que controlava as jazidas, a tecnologia, 
produção e o comércio do alumínio. Dessa forma, as barreiras de entrada eram 
substanciais. 
Nessa época, haviam sido descobertas grandes reservas de bauxita em Poços 
de Caldas. Todavia, carências logísticas e escassez de combustível, energia elétrica e 
insumos para a construção da fábrica fizeram com que o local escolhido para a 
120 
 
 
 
construção da CBA fosse a fazenda Rodovalho, onde a empresa tinha sua mais antiga 
fábrica de cimentos. (CALDEIRA, 2008, p. 102). 
Contudo, a entrada dos Estados Unidos na 2a Guerra Mundial, em 1941, 
inviabilizaram a construção da fábrica que exigiria a transferência de tecnologia do 
país do norte. Assim, mais uma vez, diversos investidores desistiram do negócio, que 
teve que ser remodelado e só começaria a ser instalado sete anos mais tarde 
(CALDEIRA, 2008, p. 104). 
 Em 1945, os filhos mais velhos José Ermírio de Moraes Filho e Antônio Ermírio 
de Moraes seguem o mesmo caminho do pai e vão para os EUA estudar na Colorado 
School of Mines. Anos mais tarde, Antônio Ermírio de Moraes (1999) destacou uma 
das importâncias daquela experiência, quando conviveu com veteranos da guerra: 
 
“Uma grande lição de humanidade [...] Aprendi a ser responsável. 
Aprendi a amar o seu país”. 
 
Terminada a Segunda Guerra Mundial, a Votorantim buscou formas de 
viabilizar a instalação da fábrica de alumínio que havia sido interrompida em 1941. 
Todavia, com o término dos conflitos houve um excesso de oferta mundial que baixou 
os preços do produto e, também, restringiu as possibilidades de transferência de 
tecnologia. Após frustradas buscas no mercado americano, a Votorantim conseguiu 
encontrar um projeto de uma fábrica pronta na Itália, mas que não poderia ser 
instalada, pois seus donos haviam ficado sem os recursos financeiros necessários 
para completar o projeto. Assim, iniciaram-se as negociações para a instalação da 
unidade no Brasil que começaria em 1948 (CALDEIRA, 2008, p. 106). 
Na mesma época, a terceira geração voltava dos estudos nos EUA e 
começava a trabalhar no grupo. O primeiro foi José Ermírio de Moraes Filho, que 
começou a estagiar ainda na fase de construção da CBA. Depois, passou pelas outras 
fábricas do núcleo industrial principal em Sorocaba, até que, no ano seguinte, se 
tornou diretor-industrial das unidades têxteis e de cimento. 
Antônio Ermírio, por sua vez, fez estágio na usina de Barra Mansa e depois foi 
integrado à Companhia Brasileira de Alumínio (CBA) em um momento conturbadodas 
obras (CALDEIRA, 2008, p. 107). Nesse período, a Alcan havia decidido se instalar no 
Brasil para concorrer com a CBA. Além disso, a Votorantim estava tendo problemas 
com a Light para o suprimento de energia para a fábrica. Após diversas solicitações 
não atendidas para a ampliação do fornecimento, a Votorantim conclui que não teria 
energia elétrica necessária para colocar a fábrica em operação e, por isso, começou a 
construir usinas hidrelétricas próprias, pressionando ainda mais os recursos para 
investimentos (CALDEIRA, 2008, p. 108). 
121 
 
 
 
Para piorar, a empresa responsável pela construção da usina hidrelétrica 
acabou falindo, exigindo que a Votorantim assumisse as obras, sob o risco de não 
finalizá-las a tempo para colocar a fábrica em operação. Com esta nova 
responsabilidade e sem recursos suficientes, a empresa teve que recorrer a 
empréstimos e centralizar a gestão, já sob a responsabilidade do jovem Antônio 
Ermírio que havia acabado de se casar, em 1953 (CALDEIRA, 2008, p. 124). 
Antônio, que não era muito de viajar, acabou utilizando quase todo o tempo da 
sua lua de mel na Europa para conhecer empresas e fábricas. Na Áustria, visitou 
diversas unidades, pois tinha notícia de que o país inventara um processo 
revolucionário de fabricação de aço. De lá, visitou unidades na França, enquanto 
buscava solucionar os problemas da construção e da geração de energia elétrica no 
Brasil (PASTORE, 2013, p. 41). 
Durante essa fase de expansão e da chegada de uma nova geração, o grupo 
sofreu a perda de seu fundador, Antônio Pereira Ignacio, que faleceu em 1951. Assim, 
José Ermírio de Moraes tornou-se o presidente e seu filho mais velho, o diretor 
superintendente (CALDEIRA, 2008, p. 110). 
Enquanto seu irmão enfrentava dificuldades com a implantação da CBA, José 
Ermírio Filho comandava a unidade de cimentos rumo ao crescimento. Em 1951, 
adquiriu a Companhia de Cimento Brasileiro no município de Esteio, no Rio Grande do 
Sul, alterando o nome para Companhia de Cimento Portland Gaúcho. No ano 
seguinte, instala a Cia de Cimento Portland Rio Branco no Paraná (CALDEIRA, 2008, 
p. 112). 
Reiss (1980, p. 243) destaca que apesar de outros grupos industriais também 
terem transferido recursos financeiros das atividades têxteis para outras indústrias (a 
Matarazzo, inclusive), a Votorantim conseguiu obter vantagens por ser pioneira e 
conseguir economias de escala. O autor ainda afirma que já a partir dos anos de 1950, 
as fábricas de cimento começaram a gerar lucros em excesso que puderam ser 
utilizados em novos negócios, substituindo a posição que antes era representada 
pelas atividades têxteis. Assim, Reiss (1980, p. 256) relata como os lucros 
provenientes desse negócio foram primordiais para que a empresa ampliasse sua 
participação na indústria de base: 
 
“O tamanho do grupo e a concentração dos seus investimentos na 
produção de cimento tornaram possível para a Votorantim compensar 
a depreciação do capital na sua produção têxtil através da transição 
da atividade principal para um mercado industrial de rápido 
crescimento, no qual rapidamente se tornou a firma dominante [...] 
Apenas quando sua posição no mercado de cimento estava 
consolidada, é que o excedente dos lucros necessários para a 
122 
 
 
 
expansão da produção de cimento foi reorientado pela Votorantim 
para o investimento em outras indústrias”. 
 
Essa expansão produtiva e geográfica do grupo levou a uma descentralização 
da gestão das empresas de cimentos, diferentemente do que vinha ocorrendo na CBA, 
conforme é destacado no livro comemorativo da empresa (CALDEIRA, 2008, p. 112): 
 
“[...] Valia mais descentralizar as decisões para não se correr o risco 
de perda de eficiência. Os diretores de cada unidade tinham de se 
haver com os problemas e limites locais, cultivar uma rede local de 
fornecedores e cativar clientelas com características próprias”. 
 
 Assim, a Votorantim Cimentos foi dividida em diretorias regionais que atuavam 
praticamente como empresas distintas, conforme relato do Entrevistado 6: 
 
“Naquela ocasião, a Votorantim era segmentada em quatro diretorias 
na área de cimento. Tinha a diretoria do Sul, a diretoria do Centro-
oeste, Sudeste e Nordeste. Então eram quatro diretorias com quatro 
diretores e uma estrutura grande em cada regional.” 
 
Com a transição para a indústria de base, a organização evolui para um novo 
patamar de tamanho, conforme pode ser verificado no gráfico 6-1. 
 
Gráfico 6-1 - Evolução Financeira do Grupo entre 1942 e 1951 (em milhões de 
cruzeiros) 
 
Fonte: Adaptado de Scantimburgo, 1986, p. 199 
 
Embora deixasse de ser o principal negócio do grupo, as fábricas têxteis 
continuavam a ter relevância para a Votorantim. No final dos anos 40, a empresa ainda 
era a terceira maior descaroçadora de São Paulo (DEAN, 1971, p. 145). Por isso, ela 
128 
550 
654 
794 
879 
1.112 
1.313 
94 
159 
277 
362 400 
431 478 
24 
282 310 326 
366 
483 
741 
1942 1946 1947 1948 1949 1950 1951
Capital Mais Reservas Instalações
Capital Fixo
Investimentos em Companhias Associadas
123 
 
 
 
continuou realizando investimentos no setor, empregando um plano de modernização 
de suas unidades durante a década de 1950 (VOTORANTIM, 1953). 
Em 1955, quatorze anos depois dos primeiros movimentos, a CBA finalmente 
entra em operação. Todavia, o pioneirismo na produção de alumínio foi difícil. Os 
primeiros lotes produzidos tinham baixa qualidade. Além disso, a capacidade 
alcançada foi de apenas quatro mil toneladas por ano, ante uma previsão inicial de dez 
mil. 
Nesse mesmo ano, o terceiro filho, Ermírio Pereira de Moraes, que havia se 
formado como Engenheiro de Produção de Petróleo pela Universidade de Tulsa, em 
Oklahoma, começa a trabalhar no grupo prospectando terras para a produção de 
carvão vegetal e celulose com o objetivo de reduzir a dependência do petróleo. 
Entretanto, quatro anos mais tarde foi convocado para atuar na Nitro Química, a 
fábrica de mais de duas décadas de existência que vinha atravessando um período de 
divergência de estratégias entre os sócios Votorantim e Klabin (CALDEIRA, 2008, p. 
131). 
O conhecimento adquirido com a implantação da CBA possibilitou, ainda, que a 
Votorantim direcionasse mais investimentos para a produção de metais não ferrosos. 
A Companhia Mineira de Metais (CMM) foi criada em 1956 para produzir zinco no 
Estado de Minas Gerais. Para viabilizar o projeto, o grupo recorreu ao BNDE que 
recusou o empréstimo alegando dúvidas quanto à capacidade da Votorantim para 
desenvolver a tecnologia adequada ao processamento do minério oxidado. Assim, a 
organização teve, mais uma vez, que viabilizar o empreendimento com recursos 
próprios, estendendo o prazo de início de produção para mais de uma década. 
Em 1957, foi adquirida a Companhia Níquel Tocantins, que tinha uma mina 
inativa no Estado de Goiás. Entretanto, a extração do metal só se iniciaria de fato duas 
décadas depois, após uma fase de estudo e de novas dificuldades em levantar 
recursos junto ao BNDE. 
Nesse mesmo ano, a Votorantim, que tinha um crescente nível de 
endividamento em razão dos novos investimentos, enfrentou um grande embate com 
Assis Chateaubriand, que teve desavenças com a família. O magnata das 
comunicações publicou reportagens em seus jornais e usou a TV Tupi para apontar 
dificuldades financeiras do grupo. Isso gerou uma crise de confiança com os credores 
que começaram a protestar títulos da empresa. Para contornar a situação, os Ermírio 
de Moraes se dividiram em duas frentes. A primeira saiu em busca de crédito e a 
segunda começou a se reunir e convencer os credores sobre a capacidade de 
pagamento da empresa. Os esforços se mostraram eficazes e a Votorantim passou 
pela turbulência sem novos percalços (CALDEIRA, 2008, p. 127). 
124 
 
 
 
Com a instauração do governo militar e o boom de investimentos na construção 
civil houve umsubstancial aumento de demanda na indústria cimenteira. Assim, na 
década de 1960, a Votorantim seguiu investindo na ampliação do seu parque 
industrial, instalando novos fornos até chegar a um total de sete. O último a ser 
comprado era o maior do Brasil e tornou a fábrica de Santa Helena na líder em 
capacidade no país (CALDEIRA, 2008, p. 163). 
Sob a supervisão de Clóvis Scripilliti, genro de José Ermírio de Moraes, a 
unidade de cimentos da Votorantim também ampliou sua presença no Nordeste. Em 
1967, o grupo inaugura a Cimento Portland Sergipe em Aracaju e constrói depósitos 
nas cidades de Salvador, Feira de Santana, Itabuna e Vitória da Conquista. No ano 
seguinte, estabelece a Companhia Cearense de Cimento na cidade de Sobral para 
abastecer os Estados do Ceará, Piauí e Maranhão. Como a infraestrutura nessas 
regiões era muito precária, a Votorantim montou uma frota própria de quatrocentos 
caminhões. Ainda, intensificando um processo de verticalização, montou uma rede de 
loja de pneus para suprir a necessidade dos veículos. (CALDEIRA, 2008, p. 168). 
Assim, no final da década de 1960, a rede de produção e distribuição de 
cimentos montada pela Votorantim conseguia alcançar quase um terço do mercado 
nacional com uma produção de três milhões de toneladas anuais (VOTORANTIM, 
1968). 
Um ponto de destaque durante esse período foi a entrada de José Ermírio de 
Moraes na política, quando se candidatou e se elegeu Senador por Pernambuco em 
1962. Ele ficaria ausente das atividades da organização até 1971, quando reassumiria 
o posto de presidente do grupo. Foi durante esse mandato, em 1969, que o Senador 
escreveu uma carta (anexo 5) para os seus filhos, apresentando uma reflexão sobre 
os negócios da empresa e dando diretrizes para o futuro da organização. 
Em 1965, desentendimentos entre os sócios, aliados a uma deterioração do 
mercado, fizeram com que o faturamento da Nitro Química fosse o menor em vinte 
anos. Assim, em 1967, a Klabin vende sua participação de 17% à Votorantim. Dessa 
maneira, novamente com o controle total do negócio e do capital, Ermírio Pereira de 
Moraes lançou mão de uma série de iniciativas visando a reformulação do negócio. A 
produção foi reorganizada: algumas seções consideradas supérfluas ou 
economicamente inviáveis foram desativadas; uma nova política de vendas foi 
adotada, bem como critérios mais rigorosos para a concessão de crédito para os 
clientes. Ao longo da década de 1970, os resultados dessas iniciativas começaram a 
aparecer (CALDEIRA, 2008, p. 171). 
Se por um lado o setor de cimentos ia bem, no final da década de 1960 a CBA 
enfrentava muitos problemas. O consumo de energia pelos fornos eletrolíticos era 
125 
 
 
 
maior do que o dos concorrentes e, embora o problema fosse amenizado pela geração 
própria de energia, essa deficiência limitava as iniciativas de expansão. Além disso, 
Antônio Ermírio havia concluído que a fábrica já estava obsoleta. Sendo assim, abriu 
duas frentes de trabalho. A primeira foi a busca pelo aumento da capacidade 
energética na bacia hidrográfica onde estavam instaladas as usinas geradoras – com 
o mapeamento de informações hídricas e cartográficas, foi possível desenvolver um 
projeto para quintuplicar a capacidade elétrica. A segunda foi o início da modernização 
dos equipamentos (CALDEIRA, 2008, p. 164). A preocupação da Votorantim com o 
desenvolvimento tecnológico ficou explícito no Relatório Anual de 1968: 
 
“O hiato tecnológico entre o nosso país e os desenvolvidos é tão 
grande que não sabemos como, nem quando, vamos transpô-lo. É, 
no entanto, imperioso que cuidemos de nosso desenvolvimento 
tecnológico. O atraso tecnológico se constitui num dos mais 
importantes fatores no processo de desnacionalização [...] Somos da 
opinião que devemos marchar, decididamente, para a superação, no 
mais breve espaço de tempo possível, do hiato tecnológico, que nos 
mantém atrasados em relação a outras nações”. 
 
Para modernizar a fábrica, Antônio Ermírio não teve dúvida: decidiu desmontá-
la. Foram para o chão quinze mil metros cúbicos de concreto, 128 fornos e toda a 
infraestrutura da empresa. As obras ocorreram em ritmo acelerado em 1969 e a planta 
foi reinaugurada atingindo a marca de vinte mil toneladas por ano. Em 1972, já 
produzia quarenta mil toneladas por ano. Ao mesmo tempo, era construída a 
hidrelétrica que visava atender uma nova fase de expansão da unidade, conforme se 
verifica no Relatório Anual de 1970: 
 
“Gostaríamos de ressaltar que uma boa parcela dos trabalhos ora 
necessários para a construção dessa usina hidrelétrica já constitui 
parte de nossa terceira fase de expansão, na qual, a Cia pretende 
elevar sua produção ao nível de 60.000 toneladas anuais.” 
 
Anos mais tarde, Antônio Ermírio relataria o episódio para o seu biógrafo e 
grande amigo José Pastore (2013, p. 127): 
 
"Não tínhamos escolha. Era mudar ou fechar. Foi uma decisão 
acertada. Se não tivéssemos feito isso, teríamos hoje um grande 
museu do alumínio naquele local". 
 
 A decisão parece ter se mostrado acertada, pois, em 1970, a Alcoa instalou-se 
no Brasil, trazendo tecnologias avançadas e uma nova fonte de concorrência. 
Em 1969, a Votorantim finalmente conseguiria iniciar a produção de zinco 
através da CMM. Já no ano seguinte, a fábrica alcançaria toda a sua capacidade e, 
assim, iniciaria um processo de expansão (CALDEIRA, 2008, p. 166). 
126 
 
 
 
Reiss (1980, p. 256) destacou que os investimentos realizados pela Votorantim 
entre as décadas de 1950 e 1970 eram orientados para a substituição das 
importações, através de uma forma pela qual a organização conseguisse alcançar a 
autonomia tecnológica nos seus negócios. Assim, a empresa importou máquinas, 
equipamentos, tecnologia e técnicos para conseguir ter o controle total sobre a sua 
tecnologia produtiva. 
Sob o comando de José Ermírio Filho a unidade têxtil chegou ao início da 
década de 1970 com 10% do mercado nacional, o que a colocava entre as cinco 
maiores empresas do setor. Internamente, respondia por 18% do faturamento, mas 
por apenas 5% da geração de caixa, o que destaca a perda da relevância deste 
negócio para o conglomerado (CALDEIRA, 2008, p. 162). 
Em 1973, dois anos após retornar às atividades na Votorantim, José Ermírio 
morre aos 73 anos de idade, sendo 48 deles dedicados à organização. A presidência 
passa a ser exercida por José Ermírio Filho. Todavia, é Antônio Ermírio que se torna o 
principal porta-voz da organização, tanto nos bons como nos maus momentos 
(CALDEIRA, 2008, p. 174). 
Nos anos 70, o excesso de capital gerado através de suas operações no setor 
de cimentos também foi utilizado na aquisição de concorrentes. Em 1977, a 
Votorantim adquiriu a Cimento Itaú, a segunda maior empresa do setor. Dessa 
maneira, o grupo consolidou sua liderança com dezenove fábricas, que produziam 
sete milhões de toneladas anuais e atendiam 40% de participação no mercado, além 
de exportarem para países da África e da América do Sul. A Cimento Itau havia sido 
fundada em 1937 e tinha doze unidades fabris, sendo seis de cimentos (ESTADÃO, 
1977). A tabela 6-1 mostra a evolução da produção de cimentos do grupo durante os 
anos de 1970, na qual se pode verificar que o volume produzido pelas fábricas da 
Votorantim triplicou entre 1970 e 1978. 
 
Tabela 6-1 - Evolução da Produção anual de Cimento em Toneladas 
Ano Produção 
1970 2.159.783 
1971 2.813.311 
1972 3.168.044 
1973 3.473.520 
1974 3.759.759 
1975 3.787.354 
1976 4.176.436 
1977 5.030.000 
1978 6.040.000 
Fonte: Votorantim – Relatório Anual 1977 
127 
 
 
 
O processo de crescimento das fábricas do grupo impulsionou a demanda na 
Metalúrgica Atlas. Em 1974, foi concluída a construção de um novo prédio com 8.700 
metros quadrados, possibilitando que a empresa atendesse pedidos de fora do grupo. 
Em meados da década de 1970, a fábrica contava com mil funcionários e sua 
produçãoera direcionada para atender principalmente as metalúrgicas (50%) e as 
fábricas de cimento (40%) (CALDEIRA, 2008, p. 191). Entre os seus principais 
produtos, destacavam-se: fornos rotativos para cimento, moinhos de bolas, britadores 
de mandíbulas, correias transportadoras, cintas de lâminas, guilhotinas para 
laminados de metal e fornos eletrolíticos (VOTORANTIM, 1977). 
Por outro lado, a Siderúrgica Barra Mansa não apresentou o mesmo nível de 
crescimento, perdendo, portanto, participação no mercado nacional. De 1955 a 1975 a 
capacidade produtiva dobrou para 160.000 toneladas. Todavia, no final dos anos 70, a 
produção nacional já havia atingido oito milhões de toneladas (REISS, 1980, p. 250). 
Essa dificuldade no setor siderúrgico se deve em parte à forte participação do Estado, 
que atuava como grande concorrente, através, principalmente, da CSN e da Usiminas. 
Em 1979, após mais dois processos de expansão, a CBA chegou a uma 
capacidade de oitenta mil toneladas anuais, se tornando a maior produtora de alumínio 
do país. No mesmo ano, a CMM aumentou a produção de zinco para sessenta mil 
toneladas ano. Neste momento, a empresa dominava 85% do mercado nacional 
(REISS, 1980, p. 246). 
O processo de crescimento da Votorantim não alterou o modelo centralizado de 
gestão e de controle de capital do grupo. As decisões continuaram a serem tomadas 
por José Ermírio de Moraes e seus quatro herdeiros, ao passo que a empresa 
manteve o controle do capital, evitando o mercado de capitais, salvo em algumas 
poucas exceções, como em uma fábrica de cimentos no Nordeste (REISS, 1980, p. 
254). O Relatório Anual de 1970 ressaltava a estratégia do grupo em se manter como 
uma empresa de capital fechado: 
 
“A empresa fechada pode reinvestir a totalidade de seus lucros, 
contando com a valorização de seu patrimônio e a expansão 
empresarial”. 
 
Em 1979, o faturamento do grupo atingiu a marca de 1,3 bilhões de dólares, 
tendo 131 unidades industriais que empregavam cinquenta mil funcionários em dezoito 
estados brasileiros. A Votorantim era, assim, o segundo maior conglomerado do país 
sob controle de capital brasileiro, com uma presença em todo o território nacional 
(CALDEIRA, 2008, p. 209). A figura 6-1 apresenta a distribuição das unidades do 
grupo no início da década de 1980: 
 
128 
 
 
 
Figura - 6-1 – Mapa da Localização das Empresas da Votorantim, por Setor em 1984 
 
Fonte: CALDEIRA, 2008, p. 200 
 
A partir do final da década de 1970 a economia nacional começou a perder 
fôlego e vários setores começaram a apresentar declínio. Em 1980, a usina 
siderúrgica de Santo Amaro na Bahia, que o grupo havia adquirido em 1960, foi punida 
pelo CIP por cobrar preços acima da tabela. Com a medida, a Votorantim decidiu 
fechar a fábrica, deixando mais de duzentos operários desempregados. Na ocasião, a 
unidade produzia 550 toneladas por mês e dava um prejuízo mensal de Cr$ 500 mil. 
Após uma semana de impasse, Antônio Ermírio de Moraes foi até a unidade e reabriu 
a fábrica (ESTADÃO, 1980). 
A negociação para a reabertura da usina envolveu o governo da Bahia e Delfim 
Neto, que era Ministro da Fazenda na época. Mais tarde, Delfim falaria sobre o 
episódio e sua percepção sobre os Ermírio de Moraes: 
129 
 
 
 
“Os dois (os irmãos José e Antonio Ermírio) demonstravam 
permanente preocupação com o estado da arte de seus negócios no 
mundo, e não apenas em se comparar aos concorrentes locais. [...] 
Eles sabiam defender os interesses da empresa sem particularismos, 
não buscavam privilégios nem favores, e assim construíam um 
empreendimento com sólidas bases de futuro” (CALDEIRA, 2008, p. 
203). 
 
Contudo, apesar dos esforços para manter a fábrica aberta, o prejuízo mensal 
iria aumentar para Cr$ 5 milhões em 1981. Consequentemente, a Votorantim declara o 
fechamento oficial da unidade. Na carta de demissão entregue aos funcionários, a 
empresa ofereceu empregos na unidade de Barra Mansa (ESTADÃO, 1981). 
Apesar das dificuldades econômicas do país, o grupo seguiu realizando 
movimentos estratégicos. Em 1980, foram anunciados investimentos de US$ 1 bilhão 
a serem distribuídos entre as sessenta e oito empresas do conglomerado pelos cinco 
anos seguintes. No setor de cimento, os investimentos programados objetivavam 
ampliar a capacidade de produção de oito milhões para onze milhões de toneladas até 
1985 (ESTADÃO, 19801). Com os planos de expansão, a produção anual da 
Siderúrgica Barra Mansa iria superar a marca de duzentas mil toneladas anuais em 
1984, quando outro plano para dobrar a capacidade até o final da década ainda estaria 
em execução. Na CBA, a capacidade chegaria a 136.000 toneladas anuais em 1985 e 
170.000 no ano seguinte (VOTORANTIM, 1984). 
Para contornar a crise, a Votorantim também passou a buscar mercados 
externos para o seu crescimento. Em 1981, a CBA lançou um programa que reservava 
8% da sua produção para exportação. No ano seguinte, as vendas para o exterior 
atingiram 7,5 milhões de dólares. Já em 1984, saltaram para 61,7 milhões de dólares. 
Em meados da década, o mercado externo já representava 60% do faturamento da 
unidade (CALDEIRA, 2008, p. 214). O Relatório Anual de 1983 destaca a situação 
nacional e uma inclinação para a busca de novos mercados: 
 
“Está se tornando cada vez mais difícil depender de um mercado 
interno drasticamente afetado pela política recessiva implantada pelo 
Governo”. 
 
O setor de cimentos foi um dos mais afetados pela crise. Em 1984, foram 
absorvidas 19,4 milhões de toneladas, ante um consumo de 27,1 milhões de toneladas 
quatro anos antes. Com a redução dos projetos de construção civil, as fábricas da 
Votorantim chegaram a 55% de ociosidade (VOTORANTIM, 1984). O grupo, no 
entanto, não cessou com os investimentos. Em 1983, uma nova fábrica de cimentos 
começa a ser instalada, a Cimento Poty da Paraíba. Em 1986, foi adquirida a Cimento 
Santa Rita que tinha três fábricas no Estado de São Paulo (CALDEIRA, 2008, p. 226). 
130 
 
 
 
Além disso, para manter a rentabilidade no setor de cimentos, Bonelli (1998) aponta 
que os preços do produto foram frequentemente reajustados acima da inflação. 
Posteriormente a empresa enfrentaria acusações de cartelização no setor. 
Com o enfraquecimento da economia e a elevação dos preços do petróleo, 
uma estratégia de substituição da matriz energética foi levada adiante por todas as 
unidades do grupo, uma vez que o custo da energia tinha um peso substancial nos 
negócios da empresa, em especial na produção do cimento e do alumínio. De acordo 
com Reiss (1980, p. 249) a autossuficiência de 50% atingida no início da década de 80 
possibilitou uma maior independência das políticas do Estado, além de uma vantagem 
competitiva em face de um país com tantas carências em infraestrutura: 
 
“Mesmo depois de estes investimentos terem deixado de ser 
estritamente necessários devido à deficiência econômica da 
infraestrutura, a Votorantim continuou mantendo por todo o período 
com o intuito de manter algum controle sobre um fator crítico dos 
seus custos de produção, caso contrário, esse preço seria definido 
através de uma decisão política realizada pelo Estado.” 
 
Na unidade siderúrgica, a empresa atingiu a autossuficiência energética do 
carvão vegetal em 1981, permitindo que a fábrica conseguisse contornar as restrições 
de combustível e expandir sua capacidade de produção para 400.000 toneladas ao 
final da década de 1980 (CALDEIRA, 2008, p. 201). 
Nas unidades de cimento, a empresa também empregou um novo processo de 
fabricação através de fornos de via seca, conforme já destacado anteriormente. Além 
disso, a empresa reduziu substancialmente a sua dependência do óleo. Em 1975, a 
Votorantim consumia 1.566 milhões de quilowatts-hora de energia e 593 mil toneladas 
de óleo. Sete anos depois, o consumo de energia havia aumentado para 3.789 
milhões de quilowatts-hora. O consumo de óleo, entretanto,teve um crescimento bem 
menor, chegando a 773 mil toneladas (CALDEIRA, 2008, p. 214). 
As hidrelétricas construídas pela Votorantim também contribuíram para a 
competitividade dos negócios. No final da década de 1980, o custo do quilowatt-hora 
produzido pelas suas usinas era de oito centavos de dólar, enquanto que o fornecido 
pela Eletrobrás era de trinta e dois centavos de dólar (CALDEIRA, 2008, p. 227). 
Dessa forma, apesar da crise econômica que atingia o país, a Votorantim 
conseguiu obter resultados satisfatórios na primeira metade da década de 1980. Em 
1982, o grupo teve o vigésimo maior lucro do país. Dois anos depois a empresa estava 
em sétimo lugar, após um crescimento de 25% no resultado líquido entre 1983 e 1984. 
Além disso, a soma das estratégias permitiu à Votorantim superar o mau momento 
econômico sem demissões. Pelo contrário, entre 1980 e 1984 foram adicionados 
131 
 
 
 
5.735 postos de trabalho na organização (CALDEIRA, 2008, p. 216). Cabe destacar, 
no entanto, que nem todas as empresas passaram ilesas pela conturbado período. Em 
1981, as seguintes unidades reportaram prejuízo: Siderúrgica Barra Mansa, 
Metalúrgica Atlas, Nitro Química, Ibar, Cia de Papel e Papelão Pedras Brancas 
(VOTORANTIM, 1982). 
Durante a década de 1980, Antônio Ermírio também ganhava cada vez mais 
destaque como um importante crítico das políticas econômicas do governo e um dos 
empresários mais influentes do Brasil. Entre 1979 e 1988, por dez vezes ele foi 
escolhido como o maior líder empresarial do Brasil no balanço anual da Gazeta 
Mercantil (ESTADÃO, 1988). Além disso, em 1985, notícias nos veículos de 
comunicação informaram que o empresário havia sido convidado para presidir a 
Petrobrás no governo Tancredo Neves. (ESTADÃO, 1985). 
No ano seguinte, ele se candidatou a Governador do Estado de São Paulo, 
ficando em segundo lugar nas eleições, atrás de Orestes Quércia (CALDEIRA, 2008, 
p. 222). Durante as eleições, o grupo Votorantim recebeu diversos ataques de 
sindicatos que acusavam a empresa de péssimas condições de trabalho (ESTADÃO, 
19361). Um sindicato ligado à CUT (Central Única dos Trabalhadores) chegou a pedir 
a interdição da Nitro Química, alegando que 750 funcionários estariam contaminados 
por bissulfeto de carbono (ESTADÃO, 1986). 
Por outro lado, a postura de Antônio Ermírio e do grupo foi enérgica. Uma 
greve realizada por funcionários da Metalúrgica Atlas terminou com zero de aumento 
dos salários e 350 demitidos (ESTADÃO, 1991). Além disso, quarenta mil pessoas 
participaram da “passeata da dignidade”, para defender a empresa e seu líder dos 
ataques que vinham sofrendo (ESTADÃO, 19862). 
No final da década de 1980, uma nova geração de herdeiros já trabalhava no 
grupo. Eles instituíram um encontro periódico para discutir aspectos da gestão da 
Votorantim que ficou conhecido como “Reunião dos Primos”. Uma reportagem da 
Revista Exame destaca o perfil dessa nova geração: 
 
“Por anos, foram vizinhos no mesmo quadrilátero do Jardim América, 
bairro paulistano que abriga mansões de milionários. Quase todos 
cursaram o ginásio e o secundário no Rio Branco, colégio da elite 
paulistana que o avô [...] comprara em dificuldades doando à 
Fundação de Rotarioanos de São Paulo. [...] Diplomados, seguiram 
um percurso padrão: foram treinados em posições gerenciais até se 
tornarem diretores nas empresas da jurisdição de cada pai. [...] 
Tiveram cursos e longas conversas com renomados consultores 
especializados em estratégia e liderança” (BLECHER, 2000). 
 
A partir dessas discussões periódicas, a nova geração buscou desenvolver 
meios para a unificação dos processos de planejamento e gestão de todas as 
132 
 
 
 
empresas do conglomerado. Para isso, consultorias foram contratadas e objetivos 
foram fixados para proceder com a união progressiva do planejamento e da gestão de 
todas as empresas (CALDEIRA, 2008, p. 221). 
Durante esse processo, oito dos herdeiros se dividiram em dois grupos. Um 
seguiu para a Europa e outro rumou para os Estados Unidos. Eles eram 
acompanhados por consultores da McKinsey e foram conhecer corporações familiares 
que já estavam entre a quinta e a sétima geração no comando. Conversaram com o 
sueco Marcus Wallenberg, líder da família que, por meio de uma holding financeira, 
controla a ABB, a Ericsson e a SKF. Na Bélgica, o grupo foi recebido pelos 
Brenninkmeijer, os holandeses que há cinco gerações administravam a C&A. Entre as 
empresas americanas, estavam a rede hoteleira Hyatt e a Cargill (BLECHER, 2000). 
As visitas realizadas também influenciaram a estratégia de sucessão do grupo. 
Até então, a terceira geração acreditava que o melhor caminho para seus filhos seria 
construir carreiras fora do grupo. Os que se destacassem poderiam, eventualmente, 
voltar à Votorantim. O objetivo era evitar que a empresa virasse um cabide de 
empregos. Esse princípio foi reformulado, pois constataram que se um jovem herdeiro 
não atuasse na empresa logo cedo, dificilmente ele se envolveria com o negócio no 
futuro. Assim, foi estabelecido um programa de trainee especial para os familiares, 
para absorver os que tivessem vocação e talento, após um período de experiência no 
grupo e, também, no mercado (BLECHER, 2000). O processo de trainee dos 
familiares foi destacado pelo Entrevistado 2: 
 
“É um processo de trainee separado que esses caras são totalmente 
assessorados. E eles vêm aqui de vez em quando. Já vi um moleque 
de 17 anos ter uma reunião de uma hora e meia com diretor aqui. 
Assim, “quero que me explique tudo”. O cara estava no colégio, 
prestando vestibular. E esse cara fazia umas perguntas boas, 
entendeu, imagina no almoço “me passa o arroz”, “mas o que você 
acha da economia no mundo, a influência...”. Mas depois que esses 
caras rodam, tem uns que só vem nessas reuniões meio highlight e 
tem uns que ficam como trainee mas ele só pode ficar trainee três 
meses. E ele não pode se apegar ao negócio. Depois ele roda, vai 
para outra, roda, vai para outra, depois ele fica acho que um ano 
rodando, rodando vários negócios, vários departamentos, enxergando 
várias realidades diferentes e depois tem que sair. Eles não podem 
ficar. Nenhum, nenhum. E aí se esse cara for bem sucedido no 
negócio dele, ele pode voltar para o Conselho.” 
 
Além da busca pela centralização e formalização da gestão, a nova geração 
influenciou a busca da Votorantim por novos mercados. Assim, em 1987 teve o início o 
plantio de laranja em Itapetininga. Esta ação seria o primeiro passo para a criação da 
Citrovita, dois anos mais tarde (CALDEIRA, 2008, p. 223). Vale destacar, no entanto, 
133 
 
 
 
que a intenção de investir na agroindústria já era antiga, conforme pode ser observado 
em um trecho do Relatório Anual de 1977: 
 
“Parece-nos muito interessante vir o Brasil a ser um dos celeiros de 
alimentos para o nosso mundo e, para isto, pouco nos falta, pois 
temos abundância de terras, sol e água. Talvez seja esta a saída 
brasileira para as duas últimas décadas deste século.” 
 
No mesmo ano, o grupo vence um leilão de venda dos ativos da Celpav, uma 
empresa que tinha um plantio de vinte e cinco mil hectares de eucalipto, mas ainda 
não tinha uma fábrica instalada. Esta ação marcaria a entrada da Votorantim no ramo 
de papel e celulose. Na mesma época, o grupo entra pela primeira vez no setor de 
serviços. Aproveitando décadas de conhecimento financeiro e de aplicação de 
recursos, a organização abre uma corretora de títulos e valores mobiliários 
(CALDEIRA, 2008, p. 225). 
Apesar da incursão em novos negócios, os investimentos nos setores 
tradicionais do grupo não foram sacrificados. Ainda em 1987, a empresa investiu 300 
milhões de dólares nesses negócios, sendo 40% no setor de cimento (visando o 
aumento de 20% na produção total), 30% no de alumínio e 30% nos demais 
(CALDEIRA, 2008, p. 226). 
Em 1990, com o início do governo Collor, que congelou as poupanças 
nacionais,a Votorantim viu serem retidos 600 milhões de dólares que tinha em caixa, 
o que correspondia a 80% de seus ativos financeiros. Além disso, em fevereiro 
daquele ano, a empresa teve queda de 45% no faturamento. O volume das vendas 
naquele mês foi de US$ 190 milhões, ou US$ 252 milhões a menos do que em janeiro 
(ESTADÃO, 19902). 
Naquele momento, havia projetos em andamento cujo valor era de quase um 
bilhão de dólares. Entre eles, destacam-se: Uma nova fábrica de papel, a expansão da 
CBA e da CMM. Assim, a empresa se viu pressionada a recorrer a empréstimos para 
honrar os seus compromissos e planos, o que exigiu um controle centralizado das 
despesas. Além disso, com o mercado interno enfraquecido, a estratégia de 
exportação iniciada na década anterior, seria fortalecida. Dessa forma, rapidamente a 
empresa alterou um processo que vigorou por décadas. Acabou a descentralização 
financeira e inverteu-se a prioridade dos mercados (CALDEIRA, 2008, p. 229). Nildo 
Benedetti, então diretor técnico de cimentos, falou sobre o momento: 
 
"O que mais me marcou foi a postura da diretoria naquele dia de 
crise. Lembro, especialmente, da reação do doutor José Ermírio de 
Moraes Filho. Ele foi ouvindo o anúncio das medidas em silêncio. 
Perguntou apenas se seria possível pagar os salários. Quando teve 
134 
 
 
 
uma resposta positiva, ficou inteiramente tranquilo. Em momentos de 
crise como este ele crescia – e a gente ficava tranquilo e confiante." 
 
Diante das dificuldades em honrar os seus compromissos financeiros, Antônio 
Ermírio de Moraes busca tranquilizar os seus funcionários. Em março de 1990, faz 
uma visita à Metalúrgica Atlas, percorre as instalações, conversa com os chefes dos 
setores e informa: 
 
"Tranquilizem o pessoal. Não haverá demissões. A gente trabalha 
mais ainda e se aguenta, começando tudo de novo" (ESTADÃO, 
1990). 
 
Todavia, apesar das adaptações no plano e dos esforços da liderança, a 
Votorantim continuou sofrendo com a deterioração do cenário econômico. Assim, 
ainda em 1990 o grupo demitiu 5% dos seus sessenta mil funcionários. Esta foi a 
primeira demissão em massa em decorrência de problemas econômicos desde a 
fundação do grupo. Além disso, a organização interrompeu a construção da fábrica de 
papel (CALDEIRA, 2008, p. 231). 
No ano seguinte, a criação de mais um plano para a estabilização dos preços – 
o Plano Collor 2 – gerou o aumento de tarifas na produção do cimento, encarecendo 
os custos em torno de 25%, o que resultou em novas demissões (que somadas aos 
desligamentos anteriores alcançaram dez mil trabalhadores) e contenção de 
investimentos. Naquele ano, a empresa já tinha nas exportações uma importante base 
de sobrevivência. As vendas para o exterior representavam 75% da produção de 
alumínio, 55% do níquel e 30% do aço. Já a Metalúrgica Atlas, por outro lado, ficou 
sem nenhuma encomenda, passando a atuar apenas com serviços de manutenção 
(CALDEIRA, 2008, p. 232). 
Nessa época, começou-se a especular um novo afastamento de Antônio 
Ermírio de Moraes da Votorantim para uma candidatura à prefeitura de São Paulo. 
Todavia, o empresário descartou a possibilidade, alegando não convinha um industrial 
abandonar sua empresa num momento difícil como o que o país vivia. Segundo ele 
era o pior dos últimos quarenta anos (ESTADÃO, 1991). 
A crise enfrentada pelo grupo acelerou as mudanças na gestão da 
organização. Na cúpula da Votorantim, a nova geração convenceu os mais velhos e 
houve um entendimento geral de que a descentralização da gestão que havia sido 
benéfica durante décadas, não se encaixava mais na nova realidade do Brasil. Com as 
transformações encabeçadas pela nova geração da família, as diferentes unidades de 
negócio não seriam mais autônomas e passariam a se reportar para um Conselho de 
135 
 
 
 
Administração que teria José Ermírio Filho como primeiro presidente e Antônio Ermírio 
como vice. (CALDEIRA, 2008, p. 241). 
Dessa forma, foi criada uma nova holding, a VPar que controlaria o grupo a 
partir de então. As superintendências foram substituídas por unidades de negócio 
através do agrupamento de atividades. Esse processo começou pela Votorantim 
Cimentos (CALDEIRA, 2008, p. 256). 
Este setor ainda enfrentava muitas alegações sobre a cartelização. Para tentar 
provar o contrário, Antônio Ermírio de Moraes foi ao encontro da ministra da 
Economia, Zélia Cardoso de Mello, apresentar os preços do cimento: 
 
"Vim mostrar a ela os reais valores cobrados no mercado interno para 
que possa compará-los ao do exterior [...] A produção de cimento 
está sendo comercializada a US$ 70 a tonelada, enquanto na 
Argentina e no Uruguai, o similar custa US$ 110" (ESTADÃO, 1991). 
 
Com o novo modelo de tomada de decisão, foram mantidos apenas projetos 
cuja geração de receitas pudesse ser rápida. Assim, optou-se pela retomada da 
fábrica de papel e celulose que seria inaugurada ainda em 1991 e pelo fortalecimento 
da CBA. No setor de alumínio, a meta era aumentar a produção de 165 mil para 212 
mil toneladas anuais. Para isso, em 1992 foram concluídas as instalações de 
beneficiamento de bauxita das jazidas de Cataguases e Itamarati, localizadas em 
Minas Gerais. No setor de papel e celulose, além da fábrica de Luiz Antônio, que vinha 
sendo construída na região de Ribeirão Preto, foi adquirida a Papel Simão que tinha 
cinco unidades produtoras e uma distribuidora. Com isso, foi criada a holding 
Votorantim Celulose e Papel SA (VCP) de capital aberto, sinalizando mais uma 
mudança na estratégia da organização que raramente havia recorrido ao mercado de 
capitais. Dois anos depois, a capacidade instalada da VCP era de 530 mil toneladas 
de celulose e de 520 mil toneladas de papel (CALDEIRA, 2008, p. 245). 
Este movimento não estava atrelado somente à unidade de papel e celulose. 
Envolvia também mudanças na estrutura do grupo com o intuito de criar condições 
para que toda a organização pudesse ter acesso ao mercado internacional de crédito, 
uma vez que todo o grupo começava a adotar práticas mais modernas de governança. 
Além disso, com o objetivo de ampliar a sua presença global e ter uma divisão 
específica para representar as empresas do grupo junto a clientes estrangeiros, é 
criada a Votorantim Internacional (CALDEIRA, 2008, p. 246). 
O plano de reformulação ainda incluiu o encerramento das atividades no setor 
têxtil, em 1993. Apesar de ter sido o primeiro e principal negócio do grupo durante 
décadas, a rentabilidade da operação havia minguado, principalmente após a abertura 
136 
 
 
 
econômica que resultou na entrada de muitos produtos asiáticos que tinham preços 
mais competitivos (CALDEIRA, 2008, p. 250). 
As mudanças empreendidas pela organização ainda incluíram um novo 
processo de redução do quadro de funcionários, através de uma iniciativa de 
downsizing (CALDEIRA, 2008, p. 251). 
Por outro lado, outros setores recém-criados ganhavam espaço dentro do 
grupo. A Citrovita, criada em 1987, entrou em operação em 1991, respondendo por 
4% da produção nacional de suco concentrado (ESTADÃO, 19903). 
A Citrovita tinha uma fábrica localizada em Catanduva e três terminais de 
exportação: um em Santos, outro nos Estados Unidos e o último na Bélgica. Assim, 
em pouco tempo a Votorantim conseguiu obter uma presença global neste negócio. 
Nos dez anos seguintes a empresa iria inaugurar mais uma fábrica no estado de São 
Paulo e desenvolver contratos de fornecimento com produtores que garantiriam 80% 
do volume de produção do suco (CALDEIRA, 2008, p. 252). 
Durante a década de 1990 a Votorantim também ampliou sua participação no 
mercado financeiro. Com uma história industrial, a organização havia iniciado sua 
trajetória no setor de serviços ao abrir uma corretora ao final da década de 1980. Em 
1991, a unidade passou a operar como um banco, criando oficialmente o Banco 
Votorantim. A operação inicial era principalmente orientada paraserviços para 
empresas (banco de atacado). Em 1994, expandiu sua atuação ao oferecer 
financiamentos de bens e serviços através da BV Financeira (CALDEIRA, 2008, p. 
253). 
Para criar e desenvolver o banco, a Votorantim teve que recorrer à captação de 
capital, elevando o patamar de endividamento histórico do grupo (BONELLI, 1998). A 
criação de um banco foi o sinal mais claro do poder conquistado pela quarta geração. 
Durante a história da organização, fica claro o tino industrial de José Ermírio de 
Moraes e seus filhos, e como eram avessos ao mercado financeiro, principalmente de 
Antônio Ermírio de Moraes que dizia que “se não acreditasse no Brasil, seria um 
banqueiro”. 
No setor de alumínio, iniciou-se um plano para um novo aumento da 
capacidade instalada de 240 mil para 340 mil toneladas anuais. Para não afetar a 
autossuficiência energética, o investimento incluiu a construção de duas novas usinas 
hidrelétricas. Ao contrário do histórico da empresa, esses novos investimentos foram 
custeados através de financiamentos feitos no mercado internacional (CALDEIRA, 
2008, p. 248). 
Em meados da década de 1990, foi realizada a primeira tentativa de 
transferência do comando para a nova geração, através da divisão das unidades de 
137 
 
 
 
negócio entre os herdeiros dos quatro comandantes do grupo. Assim, cada “família” 
ficaria responsável diretamente por um segmento do grupo. Entretanto, conflitos 
internos começaram a aparecer e, por isso, deu-se início a um processo de 
profissionalização da gestão, com a contratação de executivos externos para 
comandar as unidades de negócio (CAVALVANTI, 2000). 
Assim, a família deu o primeiro passo para sair do dia a dia dos negócios, 
direcionando a sua atenção para uma visão estratégica do grupo. Nos anos seguintes, 
a Votorantim continuaria trabalhando no delicado processo de sucessão da terceira 
para a quarta geração. 
Em 1994, a supervalorização do Real frente ao dólar começa a gerar prejuízo 
para a Votorantim, que vinha exportando uma parte expressiva da sua produção. De 
acordo com Antônio Ermírio, o prejuízo com a desvalorização do dólar foi de US$ 2,5 
milhões somente em julho de 1994 (ESTADÃO, 1994). 
Em 1996, com a intensificação dos processos de privatização, a Votorantim 
vislumbrou a oportunidade de formar associações para participar dos leilões. Assim, 
com o objetivo de formar um colchão de liquidez a fim de evitar surpresas, a 
Votorantim vai ao exterior para captar US$ 600 milhões (ESTADÃO, 1997). 
Um dos principais alvos do grupo era o setor energético. Em 1996, foi criada a 
Votorantim Energia Ltda para participação em parceria com empresas nacionais e 
estrangeiras, da privatização e expansão do setor elétrico brasileiro (VOTORANTIM, 
1996). No ano seguinte, formou a VBC Energia em parceria com o banco Bradesco e 
a construtora Camargo Côrrea. Em 1998, foi inaugurado o primeiro empreendimento 
da associação, a usina de Serra da Mesa, construída em parceria com Furnas. A VBC 
também adquiriu em conjunto com outros sócios o controle da Rio Grande Energia, a 
Companhia Paulista de Força e Luz e a Empresa Bandeirante de Energia (CALDEIRA, 
2008, p. 257). Bonelli (1998) destacou o movimento da Votorantim no setor de energia 
durante o final da década de 1990: 
 
“O interesse na área energética demonstra cautela quanto à política 
energética, temendo-se elevação de preços que possa comprometer 
a competitividade dos segmentos de não ferrosos, intensivos em 
energia. Assim, a estratégia tem sido de verticalização para trás, 
buscando eficiência e mais autonomia energética, incluindo-se o 
interesse na participação dos programas de privatização das 
empresas do setor elétrico”. 
 
Além disso, a empresa buscou fortalecer a sua participação na indústria de 
metais. Assim, em associação com a japonesa Mitsui, a Anglo American e outras 
dezesseis empresas, formou o consórcio Valecon que participa, mas não vence o 
leilão de privatização da Vale do Rio Doce. Por quatro meses, Carlos Ermírio de 
138 
 
 
 
Moraes (filho de Antônio Ermírio) e sua equipe ficaram trancados na sala de dados da 
empresa estudando a situação e as perspectivas da Vale. Antônio Ermírio disse que o 
preço pago foi alto demais (a empresa foi avaliada em R$ 12,4 bilhões). Porém, nas 
conversas particulares, chegou a lamentar a perda do negócio (PASTORE, 2013, p. 
152). A Vale acabou sendo adquirido pelo consórcio formado por Benjamin Steinbruch 
que havia comprado e CSN antes e conseguiu reunir os principais fundos de pensão 
das estatais do país. 
Em 1997, foi criada a Votorantim Cimentos, holding que passaria a controlar as 
empresas que atuam na produção de cimento, cal, argamassa industrializada e 
concreto. Assim, as quatro diretorias que vigoravam desde os anos de 1960 seriam 
extintas. De acordo com Blecher (2000), até aquele momento não havia sinergia entre 
as fabricantes de cimento do grupo que chegavam até a concorrer entre si. Portanto, 
somente a partir deste ano é que um sistema informatizado passaria a decidir que 
unidade seria mobilizada para atender uma encomenda. 
Junto com a criação da Votorantim Cimentos, foi colocado em prática um novo 
plano para substituição do combustível utilizado na fabricação do cimento. No lugar do 
carvão que vinha sendo utilizado desde o final da década de 1970, passou-se a usar o 
coque do petróleo, um resíduo do processo de refino do petróleo. Esse processo de 
transição foi destacado nos depoimentos obtidos com funcionários do grupo: 
 
“Fomos até 1990 e pouco com o carvão mineral. Aí o governo cortou 
o subsídio do carvão mineral. Aí ele ficou mais caro que o coque. 
Mais caro do que o óleo. Aí a Petrobrás ofereceu, para a Votorantim, 
óleo pesado e depois super pesado. Óleo que você precisava de 
quase 200 graus para amolecer. Só que quanto mais difícil de utilizar 
– óleo que era sólido, em temperatura ambiente era sólido – mais 
barato. Então, a Petrobrás foi fornecendo esse óleo, cada vez de pior 
qualidade, de tal maneira que ele fosse mais barato para incentivar o 
uso. Bom, esse óleo custava muito caro para nós. Mesmo sendo 
difícil, ele custava muito caro. O combustível no Brasil é muito caro. 
Bom, onde está o nosso calcanhar de Aquiles? Energia térmica. O 
que nós fizemos? A gente verificou que o “petcoke”, de alto teor de 
enxofre custava 25% do custo do óleo que a gente usava. Como 40% 
do custo do nosso processo é combustível, eu tinha condições de 
reduzir esse custo. Veja, ¼ de 40% é 10%. Isso representa muitos 
milhões de dólares. Só que era um desafio, ninguém tinha feito. 
Como o estudo teórico estava feito. A gente acreditava que podia 
fazer” (ENTREVISTADO 6). 
 
 
Em 1998, a VCP lançou suas ações na bolsa de Nova York, ampliando o seu 
acesso a capitais de risco. As novas práticas de governança e gestão demandadas 
pela abertura de capital começaram a ser replicadas nas demais unidades (BLECHER, 
2000). 
139 
 
 
 
Em 2000, morre Clóvis Scripilliti. No ano seguinte, em uma coletiva de 
imprensa realizada na sede da Votorantim, Antônio Ermírio de Moraes passa 
oficialmente o comando do grupo para a quarta geração da família. O evento foi 
simbólico e rápido. Após uma breve conversa com os jornalistas, disse: “Agora vocês 
conversem com eles” apontando para os oito acionistas, todos membros da nova 
geração. (CALDEIRA, 2008, p. 259). 
No grupo dos novos comandantes, estavam presentes parte dos herdeiros dos 
três irmãos e de Clóvis Scripilliti. Essas pessoas tinham atuado em diversas áreas da 
organização e haviam ganhado o respaldo dos demais herdeiros. A identificação dos 
novos gestores do grupo é apresentada na tabela 6-2. Como é possível perceber, na 
nova divisão de, havia dois irmãos de cada um dos quatro “clãs” da família, de forma 
que houvesse equidade na condução dos negócios. 
 
Tabela 6-2 – Quarta Geração da Família Ermírio de Moraes 
Clã Herdeiros Formação 
José Ermíriode 
Moraes Filho 
José Ermírio de Moraes Neto 
Administrador de Empresas pela 
FGV 
José Roberto Ermírio de Moraes Engenheiro Metalúrgico pela FAAP 
Antônio Ermírio de 
Moraes 
Carlos Ermírio de Moraes 
Engenheiro Metalúrgico pela 
Colorado School of Mines 
Luís Ermírio de Moraes 
Engenheiro Químico pela Colorado 
School of Mines 
Ermírio Pereira de 
Moraes 
Fábio Ermírio de Moraes Engenheiro Mecânico pela FAAP 
Cláudio Ermírio de Moraes Engenheiro Químico pela FAAP 
Clóvis Scripilliti Clóvis Emírio de Moraes Scripilliti
1
 
Engenheiro Metalúrgico pelo 
Mackenzie (incompleto) 
1
 Carlos Eduardo de Moraes Scripilliti passou a ser representado no Conselho pelo seu irmão, Clóvis, não 
tendo atuação no grupo. 
Fontes: Pastore (2013); Fibria (2005). 
 
Duas semanas após o anúncio da nova estrutura, José Ermírio de Moraes Filho 
faleceu (CALDEIRA, 2008, p. 260). 
Para conseguir concluir o processo sucessório sem novos conflitos entre os 
sucessores, houve novas alterações na estrutura do grupo. Na mudança, foram 
criados dois conselhos (familiar e executivo) que estariam subordinados a um 
Conselho de Administração principal formado pelos comandantes da terceira geração. 
O Conselho Executivo, com participação dos oito primos, seria presidido por Carlos 
Ermírio de Moraes e teria José Ermírio de Moraes Neto na vice-presidência. Este 
conselho visava direcionar e monitorar estrategicamente os negócios (CALDEIRA, 
2008, p. 263). O Conselho Executivo exerceria suas funções a partir da relação com 
cinco áreas de negócios conforme é apresentado na tabela 6-3: 
140 
 
 
 
Tabela 6-3 – Unidades de Negócio da Votorantim em 2001 
Área Presidente 
Vice 
Presidente 
Negócios 
Votorantim 
Industrial 
(VID) 
José Roberto 
Ermírio de 
Moraes 
Fábio Ermírio de 
Moraes 
Passou a agrupar os negócios 
tradicionais do grupo: cimento, metais, 
papel e celulose, filmes flexíveis 
através da Votocel e, por último, a 
Votorantim Internacional. 
Votorantim 
Negócios 
José Ermírio de 
Moraes Neto 
Cláudio Ermírio 
de Moraes 
Estava relacionada aos negócios que 
ainda não tinham um desempenho 
maduro como as unidades dos setores 
químico e agroindústria. 
Votorantim 
Finanças 
José Ermírio de 
Moraes Neto 
- 
Era relacionada ao Banco Votorantim 
que já era o segundo maior banco de 
atacado do país e o décimo-primeiro no 
ranking de ativos totais. 
Votorantim 
Energia 
Carlos Ermírio 
de Moraes 
- 
Consolidava todas as unidades de 
geração de energia do grupo. 
Votorantim 
Novos 
Negócios 
Luís Ermírio de 
Moraes 
- 
Seu objetivo era encontrar negócios 
promissores a médio e longo prazo, 
principalmente nos segmentos de 
biotecnologia e tecnologia da 
informação. 
Fonte: CALDEIRA, 2008, p. 263 
 
Vale destacar que o Conselho Executivo da Votorantim tinha uma característica 
mais atuante, visando justamente, a condução compartilhada dos negócios. Esse 
modelo é destacado em trecho da reportagem da Época (2008): 
 
“Diferentemente do que ocorre em outros conselhos, não se reúne 
uma vez por mês. Trabalha em tempo integral. Seus membros batem 
ponto todos os dias no escritório e não há decisão de que não 
tenham conhecimento.” 
 
A tabela 6-4 mostra como estavam as participações dos principais negócios da 
Votorantim em 2000: 
 
Tabela 6-4 – Participação da Votorantim no Mercado Brasileiro, por Negócio 
Unidade % 
Cimento 42% 
Alumínio 20% 
Zinco 56% 
Níquel 24% 
Aço 7% 
Fonte: Votorantim, 2000 
141 
 
 
 
A transformação da estrutura foi acompanhada de mudanças na gestão da 
organização. Em 2002, o novo comando do grupo introduziu o Sistema de Gestão 
Votorantim (SGV). Entre outras práticas, o sistema visava: A disseminação de 
melhores práticas, compras conjuntas de materiais e serviços, integração de 
transportes e aumento da disponibilidade de linhas de produção (CALDEIRA, 2008, p. 
269). 
Além disso, o grupo lançou o Sistema de Liderança Votorantim, com o objetivo 
de desenvolver profissionais de destaque na organização e o projeto Integra que 
permitiu que doze mil funcionários em todo o mundo utilizassem o mesmo sistema de 
gestão (CALDEIRA, 2008, p. 273). Essa nova fase também alterou o perfil de 
funcionários do grupo, conforme foi ressaltado em reportagem da Revista Exame: 
 
“Foi-se o tempo em que leais funcionários, com mais de 70 anos, ali 
permaneciam mesmo após a aposentadoria. Uma leva de sangue 
novo, em grande parte vinda de multinacionais, chegou ao grupo em 
anos recentes” (BLECHER, 2000). 
 
Além disso, o novo comando adotou novas estratégias de expansão. Com 
baixas possibilidades de crescimento em seus negócios no país, a Votorantim 
intensificou o seu processo de internacionalização. O Relatório Anual de 2001 
destacava a importância de a Votorantim se tornar uma empresa internacional e iniciar 
uma nova fase de crescimento: 
 
“Uma das maiores conquistas do Grupo Votorantim em 2001 foi a 
definição clara de sua aspiração de crescimento, para tornar-se uma 
empresa “world class” em todas as funções que executa, reconhecida 
e respeitada por seus fortes valores. [...] Sustentada por um sistema 
de gestão empresarial focado em excelência operacional, 
organizacional e em pessoas, essa estratégia imprimiu uma dinâmica 
ao Grupo Votorantim em 2001, dando impulso às nossas decisões de 
crescimento”. 
 
Em 2001, foi dado o primeiro grande passo nesse sentido através da aquisição 
da St Mary´s Cement Inc, uma empresa que detinha 10% do mercado de cimento no 
Canadá. Dois anos depois, fortaleceria sua posição na região ao adquirir a Suwannee 
American Cement, conquistando a liderança do setor de cimento do Canadá e dos 
Grandes Lagos nos EUA. (CALDEIRA, 2008, p. 264). 
No segmento de metais, como consequência do projeto de expansão iniciado 
anos antes, a CBA tornou-se a maior fábrica integrada do mundo, com produção de 
340 mil toneladas anuais, sendo metade desse montante direcionado para o exterior. 
No ano seguinte, a Votorantim realizou a aquisição da Paraibuna Metais, que era a 
segunda maior produtora de zinco do país e da refinaria Cajamarquilla, no Peru, o que 
142 
 
 
 
fez a empresa se tornar a quinta maior produtora mundial de zinco. Assim, pela 
primeira vez na história, a unidade de metais foi a de maior faturamento no grupo 
(CALDEIRA, 2008, p. 271). 
Outras aquisições estratégicas foram realizadas, como a compra, ainda em 
2001, de 28% do capital votante da Aracruz Celulose, líder na produção de celulose de 
eucalipto (CALDEIRA, 2008, p. 265). 
Durante os anos de 1990, a empresa já havia mais que duplicado o seu 
faturamento, partindo de US$ 1,3 bilhão em 1990 para US$ 2,8 bilhões em 1999. 
Todavia, esta nova etapa empreendida pela nova geração se mostrava bem mais 
agressiva. Os investimentos que foram de US$ 0,5 bilhão em 2000, pularam para US$ 
1,7 bilhão no ano seguinte. Assim, em 2006, apenas cinco anos após a sucessão, a 
nova direção alcançou uma receita de US$ 13,3 bilhões, volume quase quatro vezes 
maior do que os US$ 3,5 obtidos em 2001. (CALDEIRA, 2008, p. 238). 
Vale ressaltar, no entanto, que a Votorantim também buscou crescer 
organicamente. Em 1999, foi lançado um projeto de modernização e expansão da 
fábrica de Barra Mansa para dobrar a capacidade para 800 mil toneladas anuais 
(VOTORANTIM, 1999). Já a CBA, começou a desenvolver um plano de uma nova 
elevação da produção para 400 mil t/ano a ser alcançada em 2005, que seria sucedida 
por uma expansão futura para 530 mil t/ano a partir de 2009 (VOTORANTIM, 2003). 
Acompanhando o plano de crescimento das unidades de negócio, um novo 
programa de construção de hidrelétricas visava elevar a capacidade de geração 
própria de energia de 35% para 60% do seu consumo total (VOTORANTIM, 2001). 
Em 2005, a organização recebeu o Prêmio IMD destinado a empresas de 
controle familiar com comprovado nível de desempenho, sustentabilidade, presença 
internacional e de grande responsabilidade social. Foi a primeirainstituição latino-
americana a receber a premiação. Além disso, obteve da agência de classificação de 
risco Standard & Poors o nível de investment grade, que oferecia novas perspectivas 
de financiamento para a empresa. 
Dois anos depois, a organização começou a enfrentar uma grande crise 
institucional. José Meneguel, ex-coordenador comercial da Votorantim Cimentos 
acusou seis das principais fabricantes de cimento do país (entre elas a Votorantim) de 
formar um cartel, com controle de preços e de participação de mercado. A denúncia 
motivou uma investigação da Secretaria de Direito Econômico. Em 2012, o órgão 
recomendou a condenação de todos os envolvidos, mas o caso ainda não foi julgado 
pelo CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica). De acordo com o 
relatório, as empresas teriam atuado de forma orquestrada por seis décadas. Dessa 
forma, elas teriam inflacionado o faturamento em pelo menos 10% desde 2004 
143 
 
 
 
(BRONZATTO, 2012). Em 2014, o CADE decidiu de maneira unanime pela 
condenação da Votorantim e mais cinco empresas do setor. A multa foi de R$ 3,1 
bilhões, sendo metade desse valor devido pela empresa da família Ermírio de Moraes. 
A decisão ainda incluiu a venda de ativos por parte das empresas para forçar a 
competição. As insinuações de cartelização do setor, no entanto, não são recentes, 
como é possível verificar no Relatório Anual de 1968: 
 
“Devido à escassez do produto, muitas críticas têm sido feitas aos 
fabricantes de cimento, no que diz respeito ao preço do produto. 
Sobre o assunto queremos frisar que, sendo o preço do cimento 
controlado pela CONEP, agimos rigorosamente dentro da conjuntura 
nacional. Não procede a afirmativa de que o cimento nacional é 
excessivamente mais caro do que o importado, embora pesem contra 
nós taxas e impostos, bem como preços de combustíveis, muito mais 
altos do que na maioria dos países latino-americanos e europeus”. 
 
Em 2006, a Votorantim continuou com o seu processo visando criar um Grupo 
Único. Assim, a Diretoria Geral da VID passou a desempenhar um papel mais direto 
na gestão dos negócios da empresa, com foco nas estratégias de crescimento, 
avaliação de desempenho das unidades e preparação de talentos (VOTORANTIM, 
2006). 
Em 2008, a crise financeira global deflagrada nos EUA, gerou grandes 
transformações no grupo. Primeiro, a redução da atividade econômica mundial 
resultou em queda dos preços de grande parte do portfólio de produtos da Votorantim 
durante o ano de 2009: aço (-13%), celulose (-15%), suco de laranja (-40%), níquel (-
36%), alumínio (-35%) e zinco (-12%). Segundo, o movimento deu início a uma série 
de grandes transações realizadas pelo grupo. 
O grupo vendeu, ainda em 2008, 49,99% das ações do Banco Votorantim para 
o Banco do Brasil. Assim, a administração passou a ser compartilhada, com a 
formação de um Conselho de Administração composto por três membros de cada 
parte (VOTORANTIM, 2009). 
Em 2011, a Votorantim também vendeu por um valor não revelado a Nitro 
Química, deixando, assim, o setor. O comprador foi um fundo de investimentos. A 
decisão fez parte da estratégia de vendas de ativos para concentração nos principais 
negócios do grupo. No mesmo ano, também se desfez de toda a participação que 
tinha na Siderúrgica Usiminas, em um negócio de R$ 2,4 bilhões (VOTORANTIM, 
2011). 
Por outro lado, foram realizadas importantes aquisições. No auge da crise, em 
2008, adquiriu o controle da Aracruz Celulose, assumindo a liderança global do setor. 
Após o anúncio do negócio, a Aracruz reconheceu R$ 1,95 bilhão em perdas 
financeiras por exposição a derivativos e a Votorantim R$ 2,2 bilhões pelo mesmo 
144 
 
 
 
motivo. Ainda assim, o negócio foi mantido, pois a desistência geraria uma multa de 
R$ 1 bilhão para a Votorantim. (VOTORANTIM, 2008). 
Como consequência das elevadas perdas financeiras com derivativos, foi 
criada uma Diretoria de Gestão de Riscos subordinada ao Conselho de Administração 
com o intuito de oferecer suporte na análise e gestão de riscos corporativos das 
diferentes unidades de negócio (VOTORANTIM, 2009). 
Cabe ressaltar que o episódio envolvendo o reconhecimento das perdas 
financeiras oferece uma exemplificação de como funcionava o Conselho Executivo do 
grupo. Embora o comando envolvesse decisões em conjunto, o caso parece indicar 
que as decisões eram tomadas de maneira rápida, conforme é apontado em trecho de 
reportagem da Revista Exame: 
 
“No Conselho Executivo da Votorantim, as decisões são tomadas por 
consenso. A necessidade de aprovação de todos não tem significado, 
até agora, lentidão no processo decisório [...] No começo de outubro, 
começaram a surgir rumores de mercado de que as perdas da 
Votorantim com derivativos chegariam a 10 bilhões de reais. Em 
menos de uma semana, o conselho decidiu liquidar sua exposição 
aos derivativos para acalmar o mercado e comunicar às agências de 
risco as reais perdas com as operações. (COSTA & MEYER, 
2009)”. 
 
No segmento de agroindústria, a Votorantim realizou uma fusão com a 
Citrosuco, em 2010, criando o maior produtor global de suco de laranja. Cada uma das 
fundadoras passou a ter 50% da nova empresa, compartilhando a gestão 
(VOTORANTIM, 2010). 
No setor de cimentos, a crise imobiliária americana fez as vendas naquele país 
declinarem 10% em relação a 2007. O mercado brasileiro, por sua vez, aquecido pela 
oferta de crédito, cresceu 15%. Esta mudança exigiu adaptações da empresa que 
estava intensificando os investimentos no exterior, em detrimento do mercado interno 
que vinha de muitos anos de baixo crescimento. Em consequência desses eventos, o 
cimento que havia representado apenas 19% das vendas em 2007, volta a ser o 
principal negócio da Votorantim com 26% de participação (VOTORANTIM, 2008). 
No setor de alumínio, após mais um plano de expansão, a CBA alcançou uma 
capacidade de produção de 465 mil toneladas ano, se consolidando como a maior 
fábrica integrada de alumínio no mundo. Esta elevação da capacidade foi 
acompanhada do aumento da produção interna de energia. Assim, a empresa 
conseguiu atingir um patamar de 70% de autossuficiência energética, enquanto que a 
média mundial girava em torno de 28% (VOTORANTIM, 2008). 
145 
 
 
 
A partir de 2008, com a aquisição de usinas na Argentina e na Colômbia, as 
atividades siderúrgicas foram desmembradas da unidade de Metais e se 
transformaram na Votorantim Siderurgia, com capacidade instalada de 1,45 milhão de 
toneladas, sendo 750 mil no Brasil, 250 mil na Argentina e 450 mil na Colômbia 
(VOTORANTIM, 2008). No ano seguinte, foi inaugurada uma nova siderúrgica em 
Resende (RJ) com capacidade de aciaria de um milhão de toneladas/ano e laminação 
de quinhentas mil toneladas/ano. A instalação ocorreu em paralelo às iniciativas de 
modernização da usina de Barra Mansa. Próximas geograficamente, as unidades 
passaram a atuar de maneira complementar (VOTORANTIM, 2009). 
Em 2012, a Votorantim deu mais um passo no fortalecimento de sua posição 
na siderurgia ao inaugurar uma nova usina na cidade de Três Lagoas (MS) em uma 
joint venture realizada com Alexandre Grendene. A usina produz aços longos para o 
mercado do Centro-Oeste, utilizando para isso, os aços brutos da unidade de 
Resende. A capacidade de produção era de 800 mil toneladas ano (VOTORANTIM, 
2012). 
Após essa série de movimentos, a organização fez mais uma adequação de 
sua estrutura. Assim, ficaria dividida em: Industrial - abrangendo negócios de 
cimentos, metais, energia, siderurgia, celulose e papel e agroindústria; Finanças; e 
Novos Negócios. 
Já o segmento financeiro viveu períodos antagônicos desde o estouro da crise. 
Em meio à crise financeira global, a unidade foi o principal negócio da Votorantim no 
ano, representando 30% das receitas do grupo em 2009. Por outro lado, os 
financiamentos de veículos que haviam sido uma importante fonte de crescimento, 
começavama ter um aumento considerável o nível de inadimplência. Assim, ainda em 
2009, o Banco Votorantim dobrou suas provisões para devedores duvidosos. 
(VOTORANTIM, 2009). Em 2011, o valor triplicou R$ 3,3 bilhões. Em 2012, a provisão 
para créditos de liquidação duvidosa subiu para R$ 5,4 bilhões (VOTORANTIM, 2012). 
Em 2013, o Banco do Brasil, chegou a realizar estudos para propor a compra 
de mais 25% da participação do Banco Votorantim. Entretanto, diante do ambiente 
instável, acabou cancelando a proposta (SCIARRETTA, 2013). No entanto, novas 
mudanças na composição societária ou mesmo a saída do setor pela Votorantim não 
estão descartadas. De acordo com Moreno (2013), o banqueiro André Esteves estaria 
interessado na compra da participação da família Ermírio de Moraes no banco, através 
do BTG Pactual, para se tornar sócio do BB. Esses movimentos acontecem em um 
período de dificuldades do grupo. Nos três últimos anos, o banco operou em prejuízo. 
Em 2012, obteve um resultado negativo de R$ 1,9 bilhão e, no ano seguinte, de R$ 
512 milhões. 
146 
 
 
 
Não deixa de ser interessante destacar a reticência de Antônio Ermírio de 
Moraes, quando questionado pelo seu biógrafo sobre a entrada da Votorantim no setor 
financeiro e dos bons resultados que vinham obtendo: 
 
“Ponderei aos meus irmãos que nós não somos do ramo. Podemos 
dar com os burros n´água" (PASTORE, 2013, p. 147). 
 
Em 2010, com problemas de saúde, Antônio Ermírio de Moraes, o último 
integrante da terceira geração no comando, deixa a presidência do Conselho de 
Administração do grupo que passa a ser ocupado por José Ermírio de Moraes Neto. 
No ano seguinte, a Votorantim realiza mais uma mudança em sua estrutura. As 
unidades de negócios (Industrial, Financeira e Novos Negócios) são desmembradas. 
O Conselho de Administração VPar presidido por José Roberto Ermírio de Moraes 
passa a ser o órgão máximo da Votorantim e José Ermírio de Moraes Neto passa a 
ser o presidente do Conselho de Administração do Banco Votorantim. Raul Calfat, 
executivo do segmento de papel e celulose (era funcionário da Papel Simão, adquirida 
em 1992), se torna o Diretor Presidente da Votorantim Industrial (VOTORANTIM, 
2011). 
Em 2012, a Votorantim vendeu a sua sede central no Centro da cidade de São 
Paulo para o Governo do Estado. Assim, os escritórios que ficavam nesta sede foram 
distribuídos entre as demais unidades do grupo. 
Nos últimos anos, os resultados do grupo passaram a ter uma grande 
dependência da Votorantim Cimentos - em 2010, por exemplo, o setor de cimentos 
respondia por 40% da Receita Líquida e por 60% do EBITDA da Votorantim 
(VOTORANTIM, 2010). 
Além da dependência da unidade de cimentos, a companhia passou a conviver 
com um nível de endividamento preocupante. Em 2012, a dívida bruta chegou a R$ 
25,2 bilhões, um aumento de R$ 3 bilhões em relação a 2011. Ou seja, a dívida da 
empresa pela primeira vez foi superior a sua receita líquida anual (R$ 24,8 bi em 
2012). Enquanto que em 2001 o valor da dívida não chegava a uma vez a geração de 
caixa, em 2012 ela foi de 3,6 vezes. Ainda, de um lucro líquido de R$ 1.2 bi em 2011, 
o segmento industrial do grupo teve um resultado de apenas R$ 87 milhões em 2012. 
(VOTORANTIM, 2012). Em 2013, o lucro da VID subiu para R$ 238 milhões 
(REUTERS, 2014). 
Ainda em 2013, a Votorantim Cimentos iniciou uma operação para abertura do 
seu capital em um negócio avaliado em cerca de R$ 10 bilhões. Todavia, em virtude 
do fraco desempenho do mercado de ações brasileiro naquele ano, o plano foi adiado 
(REUTERS, 2013). 
147 
 
 
 
No início de 2014, Raul Calfat, presidente da Votorantim Industrial, deixa o 
cargo para assumir a frente do Conselho de Administração. A alteração faz parte de 
uma nova estratégia da empresa, que pretende descentralizar funções, fazendo com 
que o braço industrial passe a atuar de forma integrada com o Conselho de 
Administração da VPAR. Com a saída de Calfat, a presidência da VID passa a ser 
ocupada pelo executivo João Miranda, que era o diretor financeiro (BEZERRA, 2014). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
148 
 
 
 
7 ANÁLISE 
7.1 Análise das Respostas da Matarazzo aos Desafios do Crescimento 
O grupo Matarazzo foi o maior conglomerado nacional durante décadas. A sua 
origem data de 1882, quando o italiano Francesco Matarazzo aportou no Brasil e 
fundou uma fabriqueta de banha de porco no interior do Estado de São Paulo. A partir 
daí, a organização seguiu por um processo de crescimento e diversificação que 
abrangeu negócios nas mais diversas indústrias, com destaque principalmente para os 
setores têxtil, alimentício e químico. Dessa forma, o conglomerado atingiu um porte 
colossal, de dimensão comparável apenas à organização desenvolvida pelo Barão de 
Mauá no século XIX. 
Apesar de não ter sido possível identificar balanços financeiros anteriores a 
1941, as leituras realizadas permitiram constatar que o auge da organização ocorreu 
entre as décadas de 1920 e 1940. O formato da curva de crescimento apresentada no 
gráfico 7-1 sugere realmente esse período de sucesso inicial. A partir do final da 
Segunda Guerra Mundial, a organização entrou num período de declínio irreversível, 
que culminou com o pedido de concordata de grande parte de suas empresas em 
1983. Desde então, a Matarazzo perdeu relevância no cenário industrial brasileiro, 
mantendo atualmente uma pequena parcela dos antigos ativos que estão, em sua 
maioria, arrendados para terceiros. 
A análise das respostas da Matarazzo aos desafios do crescimento, 
apresentada nesta seção, buscará identificar os traços organizacionais desenvolvidos 
pela organização e compará-los à teoria em questão, com o objetivo de verificar em 
que medida esses fatores contribuíram para que a empresa desenvolvesse uma 
propensão ao fracasso e seguisse um caminho de autodestruição. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
149 
 
 
 
Gráfico 7-1 – Evolução do Tamanho da Matarazzo entre 1941 e 1980 
 
 
7.1.1 Desafio do Empreendedorismo 
Os serviços empreendedores são condições necessárias para a criação de 
valor e o crescimento contínuo de uma organização. A análise do grupo Matarazzo à 
luz das dimensões do empreendedorismo propostos por Penrose (1980) indica que 
foram desenvolvidas capacitações empreendedoras que levaram a organização ao 
crescimento. Entretanto, identificou-se uma dificuldade em manter a capacidade de 
julgamento à medida que a organização foi crescendo e se tornando mais complexa. 
Além disso, com as transformações da economia ao longo do tempo, a organização 
também não conseguiu manter o mesmo nível de versatilidade para encontrar novas 
oportunidades lucrativas no timing adequado. 
 
a) Ambição 
Conforme discutido por Penrose (1980), a ambição empreendedora pode ser 
observada através da intenção de se criar um grande grupo empresarial 
(empirebuilder), ou de se buscar a melhoria da qualidade e dos produtos da 
organização (product-minded). Durante praticamente toda a trajetória da Matarazzo, 
percebe-se a recorrência de altos níveis de ambição, principalmente no sentido de se 
criar um grande império industrial, tendo um papel fundamental no processo de 
crescimento da organização. 
y = -2E-06x4 + 0,0124x3 - 36,423x2 + 47620x - 2E+07 
R² = 0,77 
-0,05
0,00
0,05
0,10
0,15
0,20
0,25
0,30
1
9
4
1
1
9
4
3
1
9
4
5
1
9
4
7
1
9
4
9
1
9
5
1
1
9
5
3
1
9
5
5
1
9
5
7
1
9
5
9
1
9
6
1
1
9
6
3
1
9
6
5
1
9
6
7
1
9
6
9
1
9
7
1
1
9
7
3
1
9
7
5
1
9
7
7
1
9
7
9
1
9
8
1
1
9
8
3
Tamanho = Faturamento/PIB Performance = Lucro Líquido/PIB
150 
 
 
 
Essa ambição empreendedora fica evidente desde os primeiros anos de 
atividade comercial de Francesco. A sua vinda ao Brasil já era resultado de uma 
ambição para empreender, uma vez que o jovem italiano trouxe consigo uma carga de 
banha de porco da Itália,que ele esperava comercializar no país. Após se estabelecer 
em Sorocaba e conseguir um relativo sucesso na comercialização de banha e outros 
produtos na região, o empresário decidiu se desfazer de seus negócios e ir para São 
Paulo, uma cidade que vinha crescendo por conta da leva de imigrantes e da 
economia do café e que, portanto, oferecia mais oportunidades lucrativas para o 
crescimento dos seus negócios. Já na nova cidade, ele faria a transição do comércio 
para a indústria, sendo um dos precursores do processo da industrialização brasileira. 
A partir daí, fica evidente uma ambição para criar mais e mais empresas com o 
objetivo de formar um grande grupo industrial. 
As histórias da industrialização brasileira e do surgimento da Matarazzo se 
confundem. A ambição empreendedora de Francesco levou à criação de fábricas em 
um país cujo motor econômico era exclusivamente agrícola e tudo o que consumia de 
produto industrializado era importado. 
Nas décadas seguintes, a organização seguiria gerando novos 
empreendimentos onde quer que fossem identificadas oportunidades de atuação, 
possibilitando a identificação de um espírito de empirebuilder do Conde Francesco. 
Embora os números costumem divergir, de acordo com Milton Getúlio da Cunha, que 
foi Diretor da IRFM durante a década de 1970, a Matarazzo chegou a reunir 170 
empresas, se mantendo como o maior grupo empresarial brasileiro por décadas. Essa 
ambição é observada no discurso do próprio empreendedor: 
 
“Sempre considerei a riqueza como meio de atingir um ideal: Ampliar, 
ampliar o máximo o organismo industrial, já vasto, ao qual liguei meu 
nome; intensificar todos os meus esforços no sentido de tornar mais 
eficiente a contribuição que a mim mesmo me impus como dever, para a 
emancipação do Brasil” Francesco Matarazzo (COUTO
1
, 2004, p. 14).
 
 
Ainda na gestão de Chiquinho e já com a empresa enfrentando dificuldades 
financeiras, essa continuaria a ser uma característica marcante do grupo. Ao mesmo 
tempo em que fechava alguns negócios, outros eram criados, de forma a evitar que o 
império Matarazzo fosse reduzido. Esse movimento fica evidente no final da década 
de 1950 e início dos anos de 1960 quando os seguintes negócios foram 
descontinuados: fábricas de pregos e de alimentos em conserva (1957), panificação 
(1959), fábrica de desinfetantes e esponjas (1962), pasta de amendoim (1963), 
frigoríficos (1964). Por outro lado, no mesmo período foram inaugurados novos 
negócios como a Trificel (1957), uma fábrica de embalagens (1958), a Cloroquim 
(1959) e os Supermercados Superbom (1960). 
151 
 
 
 
Outro episódio marcante que retrata essa visão foi identificado em depoimento 
do Entrevistado 1 que relatou a postura de Chiquinho quando ele decidiu vender o 
luxuoso edifício sede do grupo em 1972. De acordo com as palavras do depoente, 
apesar das dificuldades financeiras enfrentadas pelo grupo, o Conde “não queria ser 
diminuído”: 
 
“Eu estou vendendo o prédio, mas no lugar do prédio eu vou construir 
um shopping que vai deixar todo mundo de boca aberta. Lá no Largo 
Pompéia.” 
 
Mesmo durante a década de 1980, após o pedido de concordata e com o 
comando com Maria Pia, da terceira geração, é possível identificar características 
fortes de ambição. Com a desativação de diversas unidades industriais, a Matarazzo 
ambicionava destruir parte do complexo para construir, em parceria com uma empresa 
Canadense, o maior shopping da América Latina que, por falta de capital e entraves 
jurídicos, acabou nunca saindo do papel. 
b) Versatilidade 
A capacidade de imaginar e identificar novas oportunidades lucrativas é 
essencial para a organização crescer de forma saudável. No processo de formação e 
expansão do seu grupo industrial, Francesco Matarazzo demonstrou versatilidade e 
capacidade visionária para criar valor. 
Martins (1976, p. 55) destacou que o Conde sempre esteve atento às 
oportunidades econômicas de todas as fases de transformação dos produtos. Dessa 
forma, o seu crescimento não foi simplesmente defensivo. Pelo contrário, visava o 
aumento dos lucros. Reiss (1980, p. 33) afirma que o empreendedor detinha uma série 
de habilidades que o tornavam um “criador de impérios”. 
 Dois anos após ter se estabelecido em Sorocaba, ele percebeu que havia um 
grande consumo de banha de porco importada no Brasil, mas que devido às longas 
viagens e ao método de acondicionamento, parte significativa dos produtos estragava 
antes de chegar ao Brasil. Assim, montou uma prensa com base nos modelos que 
tinha visto na Itália e começou a fabricar óleo a partir da gordura animal. Em poucos 
anos, conseguiu abrir outras unidades, alcançando um novo patamar para o seu 
negócio. 
Quando já havia obtido certo porte, ao invés de se contentar com a posição 
alcançada, percebeu um grande movimento de compra e venda de empresas em 
decorrência da política do Encilhamento (descrita com maiores detalhes no Capítulo 
4). Assim, vendeu parte dos seus estabelecimentos e, com o excedente, montou um 
grande comércio na cidade de São Paulo. 
152 
 
 
 
Na nova cidade se tornou um importante comerciante, passando também a 
importar farinha de trigo. Percebendo que o produto comprado no exterior muitas 
vezes chegava ao país com baixa qualidade, Matarazzo vislumbrou a possibilidade de 
criar um grande moinho de trigo, o primeiro do país. Tratava-se de uma grande 
manobra, pois, envolvia a transição das atividades comerciais para a indústria. Assim, 
em 1900, se tornou um dos pioneiros da indústria nacional. 
Para reduzir sua vulnerabilidade em um ambiente em que a indústria era 
praticamente inexistente, começou a fabricar os próprios sacos para acondicionar o 
produto final. Desse processo, surgiu o braço têxtil do grupo que, por sua vez, levou a 
fabricação de óleos de algodão e, posteriormente, produtos químicos. Portanto, nota-
se como a Matarazzo usou o excesso de recursos gerados dentro de suas unidades 
para criar novos empreendimentos lucrativos. De unidades formadas para abastecer o 
próprio grupo e reduzir sua dependência em relação a terceiros, o empreendedor 
ampliou o escopo de suas atividades, ganhando escala para competir em diferentes 
mercados. Assim, a organização formava o seu tripé Alimentos, Têxteis e Químicos. 
Portanto, é possível identificar nessa fase inicial a existência do motor do 
crescimento contínuo proposto por Fleck (2003). A figura 7-2 apresenta esse processo 
de crescimento, baseado em mecanismos de reforço, no qual o desequilíbrio de 
recursos incentivou a ampliação do escopo de atividades do grupo. 
 
Figura 7-1 – Processo de Diversificação da Matarazzo entre 1900 e 1903 
 
153 
 
 
 
Durante as décadas de 1910 e 1920 a organização seguiu um intenso 
processo de diversificação não relacionada, ocupando tanto quanto pudesse os 
espaços existentes para a fabricação de produtos no Brasil. Assim, nesse período 
foram criados empreendimentos nos mais diversos negócios: Usina de açúcar (1910), 
fábrica de pregos (1912), amideria e fecularia (1914), fábrica de velas e graxas (1916), 
frigorífico (1920), fábrica de licores e seção cinematográfica (1922), fábrica de 
curtumes e extrato de tabaco (1924), fábrica de rayon (1926). 
Esses negócios ampliaram a extensão da organização, mas em grande parte 
não apresentavam grandes potenciais de lucratividade. Foram criadas, também, 
empresas fornecedoras de insumos e serviços para as demais companhias da IRFM, 
sem que esses negócios apresentassem um potencial de geração de lucros relevantes 
para a organização, como a companhia de seguros (1917) e a de navegação e 
transporte (1919). 
 Conforme destacado por Donald Rust em um relato escrito em 1934, a grande 
expansão da IRFM criava uma proteção às mudanças no ambiente. Assim, mesmo 
que algumas unidades apresentassem prejuízos na época, essas perdas eram 
compensadas pelos negócios lucrativos. Dessa forma, épossível identificar um perfil 
defensivo em parte das expansões do grupo durante essa fase. 
Apesar disso, é possível destacar a realização de pesquisas internamente, que 
indicavam uma capacitação na busca e identificação de novas oportunidades 
lucrativas. Em 1917, foram feitas experiências com farinha de milho para mistura à 
farinha de trigo para produção de pães, reduzindo a dependência do produto 
importado. Em 1924, identificou-se de forma pioneira o potencial econômico de 
extração e refino do óleo de babaçu. No início da década de 1930, a Matarazzo 
também desenvolveu pesquisas para a produção de álcool a partir de mandioca (a 
empresa tinha plantações e uma fecularia). Como consequência desses estudos, foi 
criada a IME. Já na década de 1950, foram desenvolvidos novos processos de 
produção de celulose e, também, para a extração de óleo de café que seria uma 
alternativa durante o período de entressafra do algodão. 
A partir da década de 1930, no entanto, o perfil da indústria brasileira começou 
a mudar (conforme discutido no Capítulo 4) e novas indústrias começaram a se 
formar. Diferentemente da Votorantim, a Matarazzo pouco tirou proveito desse 
processo. As expansões se mantinham diversificadas, mas baseada principalmente 
nos negócios tradicionais do grupo. 
Em 1937, quando o velho Conde falece e seu filho assume o comando, a IRFM 
tinha projetos em andamento em diversos negócios: Fábrica de louças e ladrilhos em 
São Caetano; Fábrica de ácido sulfúrico em São Caetano; Fábrica de papel em 
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Belenzinho; Hidrogenização de óleos na Água Branca; Fábrica de hidrogênio e 
oxigênio em São Caetano; Fábrica de macarrão em São Paulo; Fábrica de seda 
artificial com acetado em São Caetano; Processamento de algodão em Bauru e 
Catanduva. Nota-se, por exemplo, que os negócios tinham baixo nível de sofisticação, 
enquanto a Votorantim liderada por José Ermírio migrava para a indústria básica. 
Quando a IRFM migrou para a promissora indústria de cimentos (que 
atravessava um processo de nacionalização da produção) em 1947, inaugurando a 
Companhia Paraiba de Cimento, a Votorantim já estava há mais de dez anos no setor, 
com fábricas em São Paulo, Pernambuco, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. 
Portanto, seguindo a proposição de Chandler (1990) em relação às indústrias de 
capital intensivo, sem direcionar recursos significativos para o novo negócio, a 
Matarazzo teria dificuldades de atingir uma posição dominante no setor uma vez que a 
Votorantim já havia conseguido obter vantagens produtivas e de distribuição. 
Dentre os mercados em que a Matarazzo atuava, é possível destacar os 
investimentos na indústria química, que passou a apresentar um grande potencial de 
crescimento (entre 1939 e 1963 a sua participação na composição da indústria 
brasileira saltou de 9,8% para 15,5%, conforme discutido no Capítulo 4). 
Em 1950, a IRFM montou uma nova unidade de produção de soda cáustica 
para abastecer a produção de tecidos sintéticos. A fabricação em larga escala deste 
insumo contribuiu, por sua vez, para a formação de uma fábrica de PVC no ano 
seguinte. Três anos depois, era iniciada também a produção de bicarbonato de sódio 
que levou à produção de acetileno que também era usado na fabricação do PVC. No 
final da década, ainda faria uma parceria com a Dow Chemical para produzir 
tetracloreto de carbono. Ou seja, a partir de recursos existentes, a IRFM seguiu 
investindo e crescendo em uma indústria promissora, inclusive atraindo empresas 
parceiras e com experiências na indústria para formar os novos empreendimentos. 
Assim, com as mudanças na estrutura industrial brasileira, a indústria química passou 
a apresentar uma possibilidade de crescimento para o grupo. 
Apesar desse potencial, a Matarazzo seguiu durante as décadas de 60 e 70 
com a sua estratégia de expansão diversificada, caracterizando um movimento 
defensivo diante de um mercado que começava a ter presença de empresas 
multinacionais. As evidências apontaram para uma carência na capacidade de criar 
valor e expandir de forma versátil a partir deste período. 
Portanto, constata-se que a versatilidade de Francesco Matarazzo foi crucial 
para a formação do tripé industrial do grupo (Alimentos, Têxteis e Químicos) no início 
do século XX. Todavia, em parte dos movimentos de expansão nas décadas seguintes 
não foram encontradas evidências que sugerem a mesma consistência. Se por um 
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lado o investimento da indústria química e as pesquisas originárias das atividades 
industriais do grupo possibilitaram a criação de valor em determinados momentos, o 
processo de criação de valor da IRFM também se descolou muito dos recursos 
existentes e se mostrou por vezes defensivo e com um timing inadequado, diante das 
mudanças ocorridas no ambiente econômico e industrial brasileiro. 
 
c) Capacidade de Levantar Recursos 
A história do grupo mostra que a reputação construída por Francesco 
Matarazzo possibilitou à organização conseguir ter acesso aos recursos necessários 
para formar e expandir os negócios. 
Em 1891, um ano após montar a Matarazzo & Irmãos em São Paulo, 
Francesco viabilizou a criação de uma nova empresa com mais trinta e oito 
investidores. Esse empreendimento absorveu os ativos da Matarazzo & Irmãos e 
gerou lucro para Francesco que montou outra empresa com o irmão Andrea. Portanto, 
antes mesmo de se tornar um importante industrial, constata-se que o empresário já 
tinha a habilidade de atrair sócios e investidores para fomentar o crescimento dos seus 
negócios. 
Quando em 1900 o empreendedor vislumbrou a possibilidade de substituir a 
importação de farinha pela construção de um grande e pioneiro moinho na cidade de 
São Paulo, essa capacitação foi fundamental. Como a operação exigia o aporte de um 
considerável montante de recursos financeiros, o Conde negociou um financiamento 
com um banco inglês. Após a avaliação das principais oportunidades e riscos do 
negócio, veio a resposta positiva: 
 
“A proposta pode ser aceita, mas terá de ser o próprio Matarazzo a 
proceder à operação de venda que sugere. Matarazzo vale o que 
assina” (COUTO
1
, 2004, p. 268). 
 
Outra importante fonte de recursos financeiros no início da história da 
Matarazzo foi conquistada através da abertura de casas bancárias. Como um ícone da 
crescente colônia italiana no Brasil, as instituições criadas por Francesco em conjunto 
com outros sócios se tornaram o principal meio pelo qual os imigrantes enviavam 
dinheiro para a Itália. Assim, os bancos conseguiam movimentar valores significativos 
e, através deles, Matarazzo conseguia crédito barato para realizar os seus 
investimentos. 
Ao longo de sua trajetória, a capacidade de atrair acionistas para a IRFM 
também se manteve presente. No final de 1911, após a formação da holding, foram 
emitidas no mercado vinte mil ações ao preço de cem mil réis cada uma, permitindo a 
capitalização da empresa e a realização de novos investimentos. A mesma estratégia 
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foi utilizada para formar a Indústrias Matarazzo do Paraná quando, para viabilizar a 
construção do moinho na cidade de Antonina, em 1914, foi realizada uma grande 
subscrição de ações. 
Mesmo durante a fase de declínio, a Matarazzo continuaria conseguindo a 
captar recursos no mercado. Ao longo da década de 1950 foram realizadas sucessivas 
subscrições de novas ações. Assim, o capital que era de 750 milhões de cruzeiros em 
1952 saltou para 4,8 bilhões de cruzeiros em 1960. Em uma das emissões no qual 
foram subscritos 1,6 bilhões de cruzeiros em ações, o anúncio da empresa no jornal O 
Estado de São Paulo (1960) destacava: 
 
“Subscreva ações preferenciais da S/A Indústrias Reunidas F. 
Matarazzo e adquira segurança e tranquilidade. O Brasil ruma à 
estabilidade financeira e econômica, e as Ações Matarazzo, 
oferecendo uma renda anual garantida, nunca inferior a 17%.” 
 
Nesse período de maior

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