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Pesquisadora da Unicamp reaproveita o lixo e desenvolve quebra-mar flutuante sustentável 400 Fabiano Ormaneze ESPECIAL PARA A AGÊNCIA ANHANGUERA fabiano.ormaneze@rac.com.br A engenhei- ra civil e pes- q u i s a d o r a Luana Kann Kelch Vieira c o n s e g u i u agregar num mesmo projeto sustentabili- dade, atrativos comerciais e reaproveitamento do lixo. Durante o desenvolvimento de sua pesquisa de mestrado na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), ela de- senvolveu, sob a orientação do professor Tiago Zenker Gireli, um quebra-mar flu- tuante usando garrafas pet. Um quebra-mar é uma barreira utilizada para a pro- teção da costa e permite abri- gar áreas para a construção de píeres, marinas ou por- tos. Além disso, pode auxi- liar a evitar a erosão costei- ra, causada pelo aumento do nível do mar, o que tem sido observado como conse- quência do aquecimento glo- bal. O tipo mais conhecido de quebra-mar é chamado de talude e feito com concreto e pedras, fixado no fundo do mar. De acordo com Luana, sua pesquisa foi a primeira a testar o uso de garrafas pet — que parecem tão frágeis, comparadas ao concreto. “As obras fixas são muito mais caras. Nesse caso, de- senvolvemos um quebra- mar com garrafas pet, que são facilmente encontradas ou podem ser compradas em cooperativas de lixo reci- clável”, afirma a pesquisado- ra. Os resultados de Luana fo- ram tão positivos que a pes- quisa deverá dar continuida- de a ela em seu trabalho de doutorado. A diferença é que, no mestrado, tudo foi realizado em laboratório e, agora, será a vez de fazer tes- tes em campo. Os experi- mentos mostraram que o quebra-mar de pet consegue dissipar até 98% da energia da onda gerada artificialmen- te. O protótipo utilizado na pesquisa usou 1.260 garrafas de meio litro. Os recipientes, depois de vedados, foram presos com fita adesiva e agrupados em 21 blocos amarrados com arame e compactados com barras de aço de construção. O experi- mento ficou com 4,5 metros de comprimento, 90 centí- metros de largura e 24 centí- metros de altura. Respeitan- do a escala utilizada, no mar, o modelo chegaria a 112 metros de extensão, o su- ficiente para substituir os atuais modelos de concreto. Testes Os testes de Luana foram fei- tos no canal do Centro Tec- nológico de Hidráulica da Es- cola Politécnica da Universi- dade de São Paulo (USP), apoiadora do projeto. No la- boratório, o canal de ondas se movimenta de acordo com comandos em um pro- grama de computador, simu- lando o ambiente marítimo. Uma onda, tanto a natu- ral como a simulada, tem sua energia medida pela altu- ra, o que não significa, neces- sariamente, que, quanto mais alta, maior a força. Também influenciam o com- primento e o período da on- da, ou seja, a distância e o tempo necessários para uma nova onda surgir. Esses fato- res foram levados em considera- ção para me- dir a eficiência do quebra- mar. No laboratório, Luana simulou ondas que tinham entre três e cinco metros de altura. Percolação Uma diferença importante entre o modelo de concreto e o pesquisado por Luana atende por um nome pouco comum para ouvidos de não físicos, engenheiros ou quí- micos: a percolação. Grosso modo, ela pode ser entendi- da como uma filtragem. Co- mo o quebra-mar é constituí- do de garrafas pet agrupa- das, há espaço entre elas. A onda, então, passa justamen- te por esses buracos para atravessar a barreira. As tur- bulências e o atrito entre a água e as paredes da garrafa fazem a energia da onda di- minuir. Outro tipo sustentável de quebra-mar, feito com pneus, já foi testado nos Es- tados Unidos, mas fracassou justamente por causa da pouca eficiência nesse pro- cesso de filtragem. Cientista busca solução para barras de aço; protótipo está em fase de patente pela Agência de Inovação da Unicamp Garrafas pet são usadas para ‘brecar’ as ondas Engenheira civil e pesquisadora LUANA KANN KELCH VIEIRA “O atual modelo de quebra-mares acaba devastando também o fundo do mar, porque ele precisa ser preso, além de ser muito caro, por causa da construção na água e do uso de concreto.” A continuidade da pesquisa vai procurar corrigir tam- bém algumas falhas que apa- receram em laboratórios e que, quando levado para o espaço natural, poderia tor- nar a proposta com garrafas totalmente inviável. O pri- meiro ponto a ser remodela- do pela cientista Luana Kann Kelch Vieira é a troca das barras de aço a que as garrafas ficaram amarradas, por causa da corrosão. “A ideia, agora, é testar um mo- delo cujas barras de aço este- jam encapadas com tubos de PVC”, conta. O dispositi- vo criado por Luana precisa ficar preso, pois é necessá- rio que ele esteja parcial- mente submerso. Mesmo com alguns ajus- tes, a engenheira, que deci- diu desenvolver o projeto por causa de seu interesse por construções marítimas, está animada. “Os resulta- dos obtidos até o momento são extremamente animado- res, pois, com a adoção de um quebra-mar cerca de três vezes mais comprido que a onda, obtivemos uma redução de quase 100% da sua altura, o que é muito me- lhor do que qualquer resulta- do divulgado até hoje para estruturas desse tipo. Além disso, a perda de energia di- minui os impactos ambien- tais gerados.” Além do aproveitamento das garrafas PET e da dimi- nuição dos impactos causa- dos pelas ondas, outra vanta- gem do modelo criado du- rante a pesquisa é o fato de que ele pode ser produzido em terra e, depois, rebocado para o mar. No caso dos atuais obstáculos, que têm custo muito maior, é preciso produzi-los a partir de bar- cas. “O atual modelo de que- bra-mares acaba devastan- do também o fundo do mar, porque ele precisa ser preso, além de ser muito caro, por causa da construção na água e do uso de concreto”, explica a pesquisadora. O protótipo desenvolvido por Luana está em processo de patente pela Agência de Inovação da Unicamp (Ino- va). A dissertação de mestra- do produzida por ela em que são abordados todos os passos do dispositivo e os re- sultados, intitulada Desen- volvimento e Análise de De- sempenho de um Quebra- mar Construído a partir de Garrafas de Politereftalato de Etileno (PET), foi defendi- da e aprovada no dia 20 de abril deste ano. (FO/AAN) Modelo será aperfeiçoado em nova fase da pesquisa Fotos: Divulgação Quebra-mar tradicional feito com pedras na Foz do Rio Potengi, em Natal, no Rio Grande do Norte TECNOLOGIA VERDE ||| ALTERNATIVA É o período que uma garrafa pet pode levar para se degradar no meio ambiente Barreira ecológica dissipa 98% da energia marítima O quebra-mar feito com garrafas pet em teste no laboratório do Centro Tecnológico de Hidráulica da Escola Politécnica da USP: canal de ondas simula o ambiente marítimo ANOS A8 CORREIO POPULAR Campinas, quinta-feira, 19 de julho de 2012
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