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PROPOSTAS DE MELHORIA NO PLANEJAMENTO DA ORLA DA CIDADE DE SÃO VICENTE, BRASIL. PROPOSALS IN SHORE PLANNING IMPROVEMENT FOR THE CITY OF SÃO VICENTE, BRAZIL. Luna Guimarães Fernandes1, Tan Tjui-Yeuw1, Lucas Gonçalves Morais1, Kleber Baraldo Barrionuevo1, Felipe Aló Nesrallah1, Marcus Polette2 – lunagfernandes@yahoo.com.br 1: UNESP Campus do Litoral Paulista – Faculdade de Ciências Biológicas – Gerenciamento Costeiro; 2: UNIVALI – CTTMar – Laboratório de Conservação e Gestão Costeira - mpolette@univali.br RESUMO A orla da cidade de São Vicente foi continuamente alterada ao longo do seu processo temporal de tal forma que a falta de planejamento levou a deterioração ambiental e da paisagem. Neste trabalho, são apresentadas propostas para a melhoria das condições básicas de qualidade para a orla da cidade de São Vicente. Foram identificados três principais problemas na área de estudo: a falta de fiscalização pública, a deficiência no saneamento, e a ocupação desordenada. Foi então proposta uma série de programas e projetos que visam a melhoria na qualidade de vida na região tendo como base a utilização do Caderno de Gestão Costeira Integrada a fim de entender os processos necessários para o diagnóstico, planejamento, adoção, implementação e avaliação tendo como base a gestão costeira integrada. Concluiu-se que para garantir a efetividade dos processos, a participação de todos os setores envolvidos no setor da orla é fundamental. Observou-se ainda que será necessário, além de mais iniciativas do poder público, uma maior participação do setor privado e a melhor organização da sociedade civil para viabilizar um quadro funcional de boa governança na região. Palavras-chave: zona costeira, gerenciamento costeiro, governança, planejamento estratégico. 1. INTRODUÇÃO A zona costeira representa grande importância visto que cerca de 60% da população mundial se concentra a menos de 100 km de distância da costa (Vitousek et al., 1997). Em diversos países é comum deparar-se com disputa de espaço e recursos terrestres e marinhos nesta faixa (Andruiguetto Filho, 2004). Os problemas se agravam quando tratamos das cidades costeiras localizadas em países em desenvolvimento onde a densidade populacional geralmente é elevada. O planejamento da urbanização litorânea é essencial visto que são regiões economicamente importantes por apresentar atividades portuárias, industriais, turísticas e pesqueiras (Andriguetto Filho, 2004). A cidade de São Vicente não é uma exceção. Localizada na Baixada Santista, uma das regiões mais economicamente importantes do estado de São Paulo, a cidade está a cerca de 70 km da metrópole de São Paulo, além de ser vizinha da cidade portuária de Santos e do complexo industrial de Cubatão. Apesar desta proximidade, a realidade de São Vicente é bastante diferente de seus vizinhos. Em comparação, no ano de 2004 a receita orçamentaria total de São Vicente foi de R$ 239 milhões, enquanto Santos obtinha o maior valor com R$ 623 milhões. A receita orçamentaria por habitante mailto:lunagfernandes@yahoo.com.br de São Vicente foi a menor da Baixada Santista em 2004 com cerca de R$ 754,00, enquanto Santos apresentava R$ 1.479,00 e Cubatão liderava com R$ 2.889,00 (São Paulo, 2005). São Vicente se enquadra como uma cidade dormitório mantendo-se majoritariamente de empregos nos setores de comércio, serviços (diretamente ligados ao turismo e beneficiando durante as épocas de temporada) e administração pública (São Paulo, 2005). As reformas na orla de São Vicente sempre visaram atender as necessidades pontuais da cidade. O processo de parcelamento do solo e expansão da rede rodoviária na Baixada Santista iniciados na década de 50 transformou o trecho central do litoral de São Paulo em um contínuo urbano linear (Afonso, 2006). O crescimento populacional gerou sobrecarga na infraestrutura de saneamento e a problemas de circulação urbana. O presente trabalho busca apresentar propostas para a melhoria das condições básicas de qualidade para a orla da cidade de São Vicente tendo como referência trabalhos sobre técnicas de gestão realizadas na disciplina de Introdução ao Gerenciamento Costeiro da UNESP – Campus Experimental do Litoral Paulista. A contribuição da presente proposta está em buscar entender os desafios do processo de gestão costeira de forma integrada e setorial. 2. OBJETIVOS Analisar a ocupação da orla da praia do Gonzaguinha e a relação entre as diversas atividades econômicas e sociais que ali ocorrem; Propor medidas para melhorar as condições básicas de moradia, trabalho, circulação e lazer na orla da cidade de São Vicente; e Fornecer informações para estabelecer diretrizes para o desenvolvimento ordenado da orla de São Vicente – SP. 3. MATERIAIS E MÉTODOS O estudo foi realizado na cidade de São Vicente–SP. Como base deste trabalho o Caderno de Gestão Costeira Integrada (Polette, 2011) onde foi possível utilizar dos diferentes ciclos de gestão, focando apenas nas fases de diagnóstico e planejamento. Na fase de diagnóstico identificamos os principais problemas da orla, tendo como sítio principal de amostragem a orla da praia de Gonzaguinha e da praia dos Milionários. Foi realizada uma análise complexa das condições de moradia, trabalho, circulação, lazer do local e os setores envolvidos. A partir desta análise foram elencados três grandes conflitos que abrangem os problemas observados mais detalhadamente. Foi utilizado ainda o modelo DPSIR (Kristensen, 2009) para contextualizar a situação de cada conflito, associando os atores envolvidos (Figura 1). Ao final do diagnóstico, foi possível levantar a visão geral de modo a obter uma visão transversal dos conflitos e a relação que cada um deles apresenta com os outros. Também foi estimada uma visão do potencial ideal do local, no intuito de nortear as propostas sobre a melhoria da qualidade de vida. Com base na visão geral, passamos para a fase de planejamento ondes são propostos programas gerais para atender aos conflitos. Figura 1: Diagrama DPSIR adaptado de Kristensen (2004). 4. RESULTADOS E DISCUSSÃO Avaliando os principais problemas na orla da praia do Gonzaguinha foram pontuados três grandes conflitos que irradiam e podem ser a origem de outros pequenos fatores. São eles a deficiência no saneamento, a ocupação desordenada e a falta de fiscalização pública,. Segundo o modelo DPSIR, para o problema, deficiência no saneamento, fica evidente que o lazer na orla está comprometido devido à contaminação da praia do Gonzaguinha e à falta de segurança. Durante quase o ano inteiro de 2005 as análises de água classificaram a praia do Gonzaguinha como imprópria ao contato humano (apresentando valores acima de 1000 NMP/100 ml de coliformes fecais em mais de 20% do tempo). Valores semelhantes foram encontrados para a praia dos Milionários e ambas apresentam valores bem distantes das outras cidades da Baixada Santista (São Paulo, 2005). Os cursos d’água que deságuam nas principais praias da cidade recebem material contaminado (não tratado) que contamina diretamente as praias tornando-as impróprias ao banho (CETESB, 2003). A rede de tratamento de esgoto em São Vicente ainda é insuficiente, considerando moradias de baixa renda onde não há conexão à rede coletora e também o aumento volume de esgoto devido à chegada de turistas (CETESB, 2003). Em relação à ocupação, há registros de cerca de 25% dos domicílios de São Vicente desocupados (São Paulo, 2005), visto que muitos imóveis funcionam como segundas residências. Além disso, é clara a verticalização exagerada dos prédios próximos à praia. Edifícios com aproximadamente 15 andares separados do calçadão da praia pela avenida do Gonzaguinha ou do outro lado da avenida, como no caso da praia dos Milionários e do bairro Boa Vista, com visão privilegiada da baía. Tendo em vista a verticalização que ilustra o adensamento populacional, o prejuízo na circulação urbana torna-se nítido, com sobrecarga das vias públicas e a falta de sincronia nos horários de atuação dos serviços públicos,que ocorre com frequência em horários críticos. A falta de fiscalização refere-se tanto à aplicação das leis de ocupação do solo e de descarte de efluentes contaminados, bem como nas atividades comerciárias. É possível identificar as condições de trabalho ao observar grande número de vendedores ambulantes, quiosques e comerciários no calçadão da praia do Gonzaguinha. O setor de comércio e serviços recebe grande contribuição do turismo e tais atividades precisam ser regularizadas, beneficiando os comerciantes e incentivando o consumo. Como visão geral do conflito, foi observado que os problemas de fiscalização são decorrentes, principalmente, da falta de interesse do Poder Público e de falta de organização da sociedade civil, levando a um quadro ineficiente de governança. O investimento na fiscalização obrigaria o Poder Público a melhorar a estrutura de saneamento e ampliar as redes de tratamento melhorando quase imediatamente a qualidade de vida. Da mesma forma, a fiscalização reforçaria a aplicação da lei e o planejamento para uso e ocupação do solo. O cenário ideal da área de estudo inclui minimizar os efeitos da erosão na faixa de praia e calçadão através de um sem barreiras que afetem a circulação da baía; o ordenamento da construção civil próximo às praias, limitando a altura máxima dos prédios; a fiscalização eficiente dos serviços urbanos, com a capacitação de profissionais aptos a ocupar estes cargos; a reforma estrutural no saneamento da cidade; a organização dos serviços de comércio local; a melhoria na segurança da área; e a aplicação de reformas nas regiões adjacentes que afetem o local, em especial à montante do estuário, com sua zona industrial. Com base nestas análises, é proposto um programa de capacitação para jovens e idosos na área de educação ambiental e gestão de resíduos, visando assim a formação de fiscais da sociedade civil. Paralelo a isto, a alocação de recursos municipais para a área de meio ambiente pode contribuir para a formação de agentes multiplicadores em todo o município a fim de organizar um processo de fiscalização e limpeza da orla. A adoção de um programa para melhorar a infraestrutura de saneamento da região é urgente, com tratamento de esgoto e redução da contaminação dos efluentes domésticos afetando positivamente a balneabilidade da praia. Uma medida eficiente seria oferecer o abatimento de impostos em residências e condomínios (IPTU) que possuam sistema de efluentes domésticos em acordo com a legislação, de modo a estimular seus moradores a exigir a adequação das estruturas de saneamento, pressionando as autoridades competentes. Maior investimento do Poder Público seria necessário para melhorar a coleta de resíduos sólidos, uma vez que a sua deficiência é fruto da falta de investimento por esse setor. Com o intuito de valorizar a paisagem da orla, sugere-se aqui um projeto de lei que limita a altura máxima dos futuros prédios a serem construídos em 35 metros, aproximadamente 10 andares, em uma faixa de um quilômetro de largura a partir da preamar. Também é proposto um projeto de revitalização paisagística da orla da praia, modificando as vias públicas criando espaços voltados ao lazer, aumentando o número de lixeiras e o investimento no transporte público de baixo impacto ambiental. Tendo em vista que todos os programas necessitam de investimentos, e que a cidade possui poucos recursos em relação a outros municípios da Baixada Santista, é preciso atrair investimentos. Para isso a atração de empresas com incentivos fiscais visando a instalação de centros coorporativos no Gonzaguinha pode ser um fator interessante neste sentido, onde estas poderiam, inclusive, ter sua responsabilidade na manutenção da orla, como condição para sua instalação. Em longo prazo, o investimento em educação e qualificação capacitaria a população a dirigir as empresas eliminando a relação de dependência entre a cidade e o turismo. A profissionalização do setor hoteleiro pode também ser uma importante medida para alavancar a economia da região com a revitalização da orla. A circulação pode ser melhorada de maneira simples, transformando a avenida da praia em uma via unidirecional nos horários de pico, variando a sua direção de acordo com o fluxo. 5. CONCLUSÕES Como observado no histórico da cidade, decisões são frequentemente tomadas visando solucionar problemas pontuais. Para que as mudanças sejam efetivas, seria ideal a participação de todos os setores da sociedade nas tomadas de decisão do local. A dificuldade na formulação e a aplicação de políticas que atendem a melhoria das condições básicas de moradia, circulação, trabalho e lazer dentro das cidades são muitas vezes ocasionadas pela falta de profissionais aptos para a mediação dos conflitos de interesses e da falta diálogo entre os tomadores de decisão e outros setores da sociedade. No cenário estudado é fundamental iniciativas por parte do poder público para minimizar os problemas existentes, neste sentido o Projeto Orla, sendo uma referência do Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, poderia viabilizar uma discussão envolvendo os mais diversos atores sociais (setor privado, sociedade civil e governos) a fim de viabilizar um quadro funcional de boa governança. As ações julgadas necessárias para alteração das atuais condições buscam a mudança de comportamento tanto da sociedade quanto das autoridades competentes. As medidas envolvem investimento em educação estimulando o exercício efetivo de cidadania; capacitação e qualificação de mão-de-obra em paralelo ao investimento em pequenas empresas visando geração de emprego e distribuição de renda; adequação da utilização de recursos e ocupação do solo aplicando a legislação existente; investimento em pesquisa; e, finalmente, melhor organização da sociedade civil. 6. REFERÊNCIAS AFONSO, C.M. 2006 A paisagem da Baixada Santista: Urbanização, Transformação e Conservação. São Paulo, Editora da Universidade de São Paulo EDUSP, 309p. ANDRIGUETTO FILHO, J.M. 2004. Das “dinâmicas naturais” aos “usos e conflitos”: uma reflexão sobre a evolução epistemológica da linha do “costeiro”. Desenvolvimento e Meio Ambiente, n 10, pp. 187-192. COMPANHIA DE TECNOLOGIA DE SANEAMENTO AMBIENTAL. CETESB, 2003. Relatório de Qualidade das Águas Litorâneas do Estado de São Paulo – Balneabilidade das Praias, 72p. KRISTENSEN, P. 2004. The DPSIR framework. Disponível em < http://enviro.lclark.edu:8002/rid=1145949501662_742777852_522/DPSIR%20Overvie w.pdf> Acesso em 31 de maio de 2011. POLETTE, M. 2011. Caderno de Gestão Costeira integrada. Laboratório de Conservação e Gestão Costeira. 52p. Itajaí. SC. SÃO PAULO (ESTADO). 2005. Empresa Paulista de Planejamento Urbano SA (EMPLASA). Indicadores metropolitanos da Baixada Santista. Disponível em < http://www.emplasa.sp.gov.br/portalemplasa/produtos%20download/produtos_disponiv eis.asp>. Acesso em 31 de maio de 2011. VITOUSEK, P.M., MOONEY, H.A., LUBCHENCO, J., MELILO, J.M. 1997. Human Domination of Earth’s Ecosystems. Science, v. 277, n. 5325, pp. 494-499. http://enviro.lclark.edu:8002/rid=1145949501662_742777852_522/DPSIR25�20Overview.pdf http://enviro.lclark.edu:8002/rid=1145949501662_742777852_522/DPSIR25�20Overview.pdf http://www.emplasa.sp.gov.br/portalemplasa/produtos25�20download/produtos_disponiveis.asp http://www.emplasa.sp.gov.br/portalemplasa/produtos25�20download/produtos_disponiveis.asp
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