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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA "JÚLIO DE MESQUITA FILHO" 
FACULDADE DE ARQUITETURA, ARTES E COMUNICAÇÃO 
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO 
LINHA DE PESQUISA: PRODUÇÃO DE SENTIDO NA COMUNICAÇÃO 
MIDIÁTICA 
 
 
 
 
 
 
 
CARLOS ALBERTO GARCIA BIERNATH 
 
 
 
 
 MARCAS DA IDENTIDADE DISCURSIVA NO JORNALISMO 
POPULARESCO: ANÁLISE DO ETHOS NOS TELEVISIVOS DOCUMENTO 
ESPECIAL, AQUI AGORA E BALANÇO GERAL 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
BAURU 
2016 
 
 
 
 
 
CARLOS ALBERTO GARCIA BIERNATH 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
MARCAS DA IDENTIDADE DISCURSIVA NO JORNALISMO POPULARESCO: 
ANÁLISE DO ETHOS NOS TELEVISIVOS DOCUMENTO ESPECIAL, AQUI 
AGORA E BALANÇO GERAL 
 
 
 
Dissertação apresentada ao programa de Pós-
Graduação em Comunicação da Faculdade de 
Arquitetura, Artes e Comunicação da 
Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita 
Filho", campus Bauru/SP, como requisito parcial 
para a obtenção do título de Mestre em 
Comunicação, sob orientação da Prof.ª. Dra. Eliza 
Bachega Casadei. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
BAURU 
2016 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Biernath, Carlos Alberto Garcia. 
 Marcas da identidade discursiva no jornalismo 
popularesco: análise do ethos nos televisivos 
Documento Especial, Aqui Agora e Balanço Geral / 
Carlos Alberto Garcia Biernath, 2016 
 141 f. 
 
 Orientador: Eliza Bachega Casadei 
 
 Dissertação (Mestrado)– Universidade Estadual 
Paulista. Faculdade de Arquitetura, Artes e 
Comunicação, Bauru, 2016 
 
1. Documento Especial. 2. Aqui Agora. 3. Balanço 
Geral. I. Universidade Estadual Paulista. Faculdade de 
Arquitetura, Artes e Comunicação. II. Título. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
 Inicialmente, meu mais profundo agradecimento à Fundação de Amparo à Pesquisa do 
Estado e São Paulo, por acreditar e financiar meu projeto de pesquisa, sob o nº 2014/10866-8. 
O investimento me permitiu dedicação exclusiva ao projeto, o que amplificou ainda mais em 
mim a motivação em transmitir à sociedade todos os conhecimentos e ensinamentos adquiridos, 
sobretudo através do estímulo em seguir nesse ciclo de aprendizado. 
 Tornar-se mestre não significa dominar os segmentos da comunicação que estudei. 
Muito pelo contrário. Em meu entendimento, a titulação favorece a uma vontade ainda maior 
de seguir trilhando o caminho, sempre com vistas ao outro, à alteridade. Por isso mesmo, abro 
meus agradecimentos citando grandes mestres com as quais tive o mais absoluto prazer de 
conviver, e que nessa coexistência, mesmo que em um singelo cumprimento, já emanavam 
aprendizado. Identificá-los não é tarefa fácil, uma vez que o discurso de todos os professores 
que tive se entrecortam ao meu. Começo por mencionar o meu mestre, amigo e oxalá 
companheiro de profissão Prof. Dr. Marcelo da Silva. Seus ensinamentos extrapolaram o 
âmbito acadêmico e inferiram diretamente em meus caminhos. Minha motivação para o olhar 
ao próximo e seguir em frente vem muito de você. Todos os dias comemoro a amizade contigo. 
 Agradeço muito aos professores que transmitiram valiosas discussões e aprendizados ao 
longo destes 2 anos e meio de mestrado. Também aos professores que me deram aula ontem e 
hoje se tornaram amigos. Tive a satisfação única de conviver com professores que tiveram toda 
a atenção em analisar meu trabalho e me trazer apontamentos valiosíssimos, com a sensibilidade 
de quem se preocupa em ajudar seu aluno a desenvolver seu potencial: Prof.ª. Ma. Daniela 
Bochembuzo, uma líder, exemplo de jornalista correta e competente, além de grande 
incentivadora; Profª. Dra. Lígia Carvalho, uma guerreira; Prof.ª. Dra. Roseane Andrelo, tão 
cortês e gentil; Prof. Dr. Maximiliano Martin Vicente, que com suas visões e experiências 
ensina que comunicar é enxergar ao próximo; Prof.ª. Dra. Érika de Moraes, sempre muito 
atenciosa, que dedicou seu tempo a conduzir um curso de extensão que tão importante foi para 
a minha pesquisa; Prof. Dr. Antônio Francisco Magnoni, com quem não cheguei a ter aulas, 
infelizmente, mas que com sua garra em lutar ensina mesmo em conversas informais; Prof. Dr. 
Arlindo Rebechi Junior, que, com seus sábios olhares, me permitiu enxergar aspectos 
importantes para o desenvolvimento da minha pesquisa; Prof.ª. Dra. Rosana de Lima Soares, 
de excelente trajetória acadêmica, que cordialmente aceitou nosso convite e nos honrará com a 
participação na banca de defesa da pesquisa. 
 
 
 
 
 Não poderia deixar de mencionar também minha orientadora, a querida e 
competentíssima Prof.ª. Dra. Eliza Bachega Casadei. Meus agradecimentos mais sinceros pela 
confiança em mim e em um projeto que só ganhou corpo e se tornou pesquisa por sua 
participação através de ensinamentos e estímulos. Agradeço também por sempre ser tão 
atenciosa e prestativa nos momentos em que mais precisei, pelas conversas tão produtivas, pela 
valiosa amizade e por todo o aprendizado. Aprendizado este que, aliás, se desenvolveu por meio 
da simplicidade e de uma didática tão apurada na sensibilidade ao tratar com o próximo. 
 Direciono meus agradecimentos também aos colegas de mestrado, que boas discussões 
geraram em aulas, me permitindo assimilar olhares que não faziam parte de mim, mas que me 
ajudaram e ajudarão nos estudos sobre comunicação. 
 Agradeço aos amigos que tanta diferença fazem em minha vida. Victor, Bruno e Felipe, 
que fazem parte do meu discurso e sempre estão comigo – apesar da distância –, e me trazem a 
certeza de um convívio baseado em respeito, lealdade e admiração mútua. Também menciono 
meu amigo e companheiro de jornada Fernando Strongren, que mantém sua trajetória 
influenciando seus colegas a seguir firme na jornada, tal como me influenciou durante a 
graduação. 
 Aos sempre atenciosos e prestativos funcionários do setor de pós-graduação da 
Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação da Unesp, Hélder e Sílvio. Muito obrigado 
pelas conversas prazerosas, ao mesmo tempo descontraídas, de ajuda e ensinamentos. 
 À minha família, epicentro do meu desenvolvimento como ser humano. Obrigado pela 
confiança em meu trabalho, por acreditarem e apoiarem um propósito de vida que se desenvolve 
a partir do bem que vocês fazem a mim e que tanto quero repassar à sociedade. Honradez, 
honestidade e garra, para mim, são significados a partir da existência de vocês. 
 Por fim, e não menos importante, quero agradecer ao destino por uma herança muito 
especial desse período de mestrado: meu amor, minha companheira, namorada, amiga e 
confidente, Kelly De Conti Rodrigues. Tão logo o caminho demandou uma entrega ao 
crescimento proporcionado pelo aprendizado, tão logo nos identificamos e nos apaixonamos. 
A trajetória se tornou muito mais doce e sensível ao seu lado. Uma pessoa que exala compaixão 
a cada palavra, cada gesto, cada discurso. Conviver com você é como enxergar a alma das 
pessoas que nos rodeiam. Abraçá-la é sentir o lampejo da ternura; sentir suas mãos junto às 
minhas é sentir uma injeção de alteridade que toma conta de mim. Sem você, o caminho não 
seria de tanta esperança como é. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“A televisão serve para entreter, serve para 
informar. Mas ela é, sobretudo, um meio de 
expressão incrivelmente nobre” (Nelson Hoineff). 
 
 
 
 
RESUMO 
 
Em virtude das buscas por novas e ávidas informações, além da desenfreada luta pela audiência, 
novos modelos de ‘fazer jornalismo’ aparecem nos veículos televisivos e alternam o discurso 
identitário jornalístico. De tal modo, algumas produções, que conquistaram bons índices de 
audiência, têm feito uso de algumas estratégias a fim de atingir seus objetivos, que vão desde a 
utilização de diferentes discursos baseados em “verdadesmidiáticas” até os chamados “efeitos 
de verdade”, que demarcam seu ethos discursivo. Em vista de tais apontamentos, esta pesquisa 
pretende revisitar alguns modelos de jornalísticos popularescos significativos – em termos de 
inovação no fazer noticioso e na representação discursiva – das décadas de 80, 90 e 2000/10 do 
século XX: Documento Especial – Televisão Verdade (década de 80); Aqui Agora (década de 
90); e Balanço Geral (surgido na primeira década dos anos 2000 e ainda no ar), à luz da análise 
de discurso de tradição francesa, da análise retórica e da análise de elementos que compõe a 
narrativa sonoro-imagética. Esse entrecruzamento metodológico nos possibilitou trabalhar com 
o ethos projetado na enunciação de cada uma das atrações supracitadas, no qual procuramos 
depreender como a identidade jornalística era construída em seu conteúdo discursivo através de 
projeções ethópicas. 
 
PALAVRAS-CHAVE: Análise do Discurso; Ethos; Documento Especial; Aqui Agora; 
Balanço Geral. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
Because of the search for new and eager information, and the unbridled struggle for the hearing, 
new models of 'journalism' appear on television vehicles and alternate journalistic identity 
discourse. In this way, some productions that have won good audience ratings, have made use 
of some strategies in order to achieve their goals, ranging from the use of different discourses 
based on "media truth" to the so-called "real effects" that demarcate its discursive ethos. In view 
of such notes, this research aims to revisit some models of significant popularescos journalism 
- in terms of innovation in news making and discursive representation - of the 80, 90 and 
2000/10 of the twentieth century: Documento Especial – Televisão Verdade (decade 80); Aqui 
Agora (90s); and Balanço Geral (emerged in the first decade of the 2000s and still in the air) in 
the light of discourse analysis of French tradition, rhetorical analysis and analysis of elements 
that compose the sound-imagistic narrative. This methodological lathing enabled us to work 
with the ethos designed in the enunciation of each of the above attractions, in which we try to 
infer how the journalistic identity was built in its discursive content through ethopics 
projections. 
 
KEYWORDS: Discourse Analysis; Ethos; Documento Especial; Aqui Agora; Balanço Geral. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
 
 
RESUMO ................................................................................................................................. 07 
 
ABSTRACT ............................................................................................................................ 08 
 
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 11 
 
CAPÍTULO 1 – OS ESTUDOS DA COMUNICAÇÃO EM DIFERENTES MOMENTOS 
E A NOTÍCIA COMO ACONTECIMENTO DISCURSIVO ........................................... 15 
1.1 OS PRIMEIROS MOMENTOS DOS ESTUDOS DA COMUNICAÇÃO ....................... 15 
1.2. OS TRÊS PONTOS DA CONFIGURAÇÃO DISCURSIVA .......................................... 17 
1.3 A MECÂNICA DAS CONSTRUÇÕES DE SENTIDO DA NOTÍCIA ........................... 17 
1.4 O ACONTECIMENTO E A NOTÍCIA ............................................................................. 19 
1.5 O ‘REAL’ E AS CONSTRUÇÕES DE VERDADE NA PRODUÇÃO NOTICIOSA ..... 21 
1.6 EFEITO DE VERDADE E VALORES DE VERDADE ................................................... 22 
1.7 CONSIDERAÇÕES SOBRE CULTURA POPULARESCA NA TELEVISÃO .............. 25 
1.8 O LEITOR EMPÍRICO E O LEITOR-MODELO ............................................................. 26 
 
CAPÍTULO 2 – ETHOS E DISCURSO JORNALÍSTICO ................................................ 31 
2.1 A RETÓRICA ARISTOTÉLICA ....................................................................................... 32 
2.2 A TRÍADE DISCURSIVA QUE MOBILIZA A PERSUASÃO: ETHOS, PATHOS E 
LOGOS ..................................................................................................................................... 33 
2.3 O ETHOS NA RETÓRICA ARISTOTÉLICA .................................................................. 35 
 2.3.1 Ethos retórico e ethos a partir da análise do discurso .............................................. 37 
2.4 POR UM ETHOS CRÍVEL ................................................................................................ 38 
2.5 A CONFORMAÇÃO IDENTITÁRIA DO SUJEITO-JORNALISTA ............................. 41 
2.6 O ETHOS POPULARESCO .............................................................................................. 43 
2.7 PROBLEMAS INERENTES AO ETHOS ......................................................................... 44 
 
CAPÍTULO 3 – A TELEVISÃO BRASILEIRA E SUAS IMBRICAÇÕES AOS 
PROGRAMAS POPULARES ............................................................................................... 46 
3.1 O SURGIMENTO DA TELEVISÃO ................................................................................ 46 
 3.1.1 Transmissões televisivas .............................................................................................. 46 
 3.1.2 O fazer-televisão .......................................................................................................... 47 
3.2 OS PRIMÓRDIOS DA TELEVISÃO BRASILEIRA ....................................................... 49 
 3.2.1 Fase do surgimento ...................................................................................................... 51 
 3.2.2 Quando o popularesco assume formato nos programas televisivos ........................ 52 
3.2.2.1 Os fait divers ......................................................................................................... 54 
3.2.2.2 O primeiro programa “mundo cão” e o aumento da audiência televisiva .......... 58 
 3.2.3 Fase do autocentramento ............................................................................................ 59 
 3.2.4 O Povo na TV ................................................................................................................ 60 
 
 
 
 
3.3 A AMPLIAÇÃO DO “POPULARESCO” E O SURGIMENTO DE NOVAS ATRAÇÕES
 .................................................................................................................................................. 61 
 3.3.1 O Documento Especial – Televisão Verdade ............................................................... 61 
 3.3.2 O Aqui Agora ................................................................................................................ 64 
 3.3.3 O momento atual da televisão no Brasil e o início do Balanço Geral ...................... 67 
 
CAPÍTULO 4 – A ANÁLISE DO DISCURSO DE TRADIÇÃO FRANCESA COMO 
CAMPO TÉORICO-METODOLÓGICO ........................................................................... 69 
4.1 O DISCURSO .................................................................................................................... 69 
4.2 A ANÁLISE DO DISCURSO COMO METODOLOGIA ................................................ 72 
 4.2.1 A AD enquanto instrumento para análise ethópica .................................................. 72 
4.3 ELEMENTOS ATUANTES NA FORMAÇÃO DO SENTIDO DISCURSIVO .............. 73 
 4.3.1 Pressuposições e subjetividades: o dito e o não-dito ................................................. 74 
 4.3.2 Condições de produção do discurso ........................................................................... 75 
 4.3.3 Interdiscuro .................................................................................................................. 76 
 4.3.4 Polissemia e Paráfrase .................................................................................................78 
4.4 ELEMENTOS TÉCNICOS DE COMPOSIÇÃO IMAGÉTICA ....................................... 80 
 4.4.1 Ponto de vista e ponto de escuta na narrativa audiovisual ...................................... 80 
 4.4.2 O enquadramento ........................................................................................................ 81 
 4.4.3 Planos de câmera ......................................................................................................... 81 
 4.4.4 A trilha sonora ............................................................................................................. 83 
4.5 RECORRÊNCIAS DISCURSIVAS .................................................................................. 83 
4.6 RETÓRICAS ...................................................................................................................... 84 
 4.6.1 Argumento de autoridade ........................................................................................... 84 
 4.6.2 Elementos pathéticos .................................................................................................... 85 
4.7 CORPUS DE ANÁLISE .................................................................................................... 86 
 4.7.1 Documento Especial – 1ª edição: A pungente “Guerra Social” ............................... 86 
 4.7.2 Documento Especial – 2ª edição: A ‘invasão’ de espaço em “Os Pobres vão à Praia”
 .................................................................................................................................................. 88 
 4.7.3 Documento Especial – 3ª edição: As violentas “Noites Cariocas” ........................... 89 
 4.7.4 Aqui Agora – 1ª edição: A “gangue” que caçou o carro-forte em uma perseguição 
“infernal” ................................................................................................................................. 90 
 4.7.5 Aqui Agora – 2ª edição: A chacina e o policial “covardemente” assassinado......... 92 
 4.7.6 Aqui Agora – 3ª edição: A “implacável” perseguição aos “matadores da 
policial” .................................................................................................................................... 93 
 4.7.7 Balanço Geral – 1ª edição: A troca de tiros entre bandidos e polícia...................... 94 
 4.7.8 Balanço Geral – 2ª edição: O professor morto .......................................................... 95 
 4.7.9 Balanço Geral – 3ª edição: O “suspeito” que invadiu salão e matou a mulher ...... 96 
 
CAPÍTULO 5 – ANÁLISES DOS OBJETOS EMPÍRICOS ............................................. 99 
5.1 IMAGEM, SOM E RETÓRICA ........................................................................................ 99 
 5.1.1 Enquadramentos e tomadas de câmera ..................................................................... 99 
5.1.1.1 Plano geral ......................................................................................................... 100 
5.1.1.2 Plano médio ........................................................................................................ 101 
5.1.1.3 Primeiro plano .................................................................................................... 102 
5.1.1.4 Plano-sequência e câmera nervosa .................................................................... 104 
 5.1.2 Os efeitos sonoros ...................................................................................................... 110 
 5.1.3 Argumentos e provas retóricas na projeção de uma ‘verdade’ discursiva .......... 112 
 
 
 
 
5.2 RECORRÊNCIAS DISCURSIVAS BASEADAS EM PARÁFRASES ......................... 123 
 5.2.1 A projeção ethópica a partir de termos compartilhados ........................................ 123 
 5.2.2 Paráfrases discursivas ............................................................................................... 126 
5.3 A IDENTIDADE ETHÓPICA NO DISCURSO DAS ATRAÇÕES ............................... 130 
 5.3.1 Ethos crível e de violência ......................................................................................... 131 
 5.3.2 Ethos de indignação e impunidade ........................................................................... 132 
 5.3.3 Ethos de justiceiro e ethos policial ............................................................................ 133 
 
À GUISA DE CONSIDERAÇÕES ..................................................................................... 134 
 
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 138 
 
 
 
11 
 
INTRODUÇÃO 
 Desde 1950, quando a primeira emissora surgiu no Brasil (FEDERICO, 1982), o veículo 
televisivo participou alternâncias significativas em seus produtos, logo após assumir produções 
semelhantes aos do rádio. De início, a televisão era mais restrita a um nicho elitista da população 
brasileira, por conta dos altos preços cobrados pelos aparelhos. Contudo, em 1964, com a queda 
destes preços, a televisão se tornou mais acessível, chegando a um momento em que atingia um 
público mais massivo. A partir de então, programas de auditório e mesmo aqueles tidos como 
sensacionalistas assumem um bom espaço nas produções televisivas (MATTOS, 2010). Com 
isso, produções de semelhante teor conquistaram espaço junto ao veículo televisivo pois, 
embora para alguns tais programas aparentem esse “baixo nível”, há produções e escolhas 
linguísticas e composicionais sofisticadas, que desenham um discurso muito bem trabalhado e 
disposto. 
 Tais técnicas de produção podem ser reveladas através do ethos discursivo dos 
programas. Quando enuncia um discurso, o orador externa uma imagem de si próprio ao seu 
público. Essa imagem, quando bem trabalhada, remonta à persuasão, cumprindo o objetivo de 
bem suceder o discurso – no caso dos objetos desta pesquisa, os telespectadores. 
 De tal modo, essas produções revelam também o que seria pertencente à cultura 
popularesca. O entendimento sobre popularesco, que parece não deter uma definição exata, 
perpassa o que alguns autores percebem ser uma tentativa de representar a cultura popular, mas 
produzida por pessoas que não fazem parte dessa cultura. Disso decorre o entendimento de que 
o popularesco se assenta como fragmentos de cultura popular, que na verdade representam a 
visão dos produtores sobre esta cultura. 
 Dentre os programas que representam esse formato jornalístico peculiar, selecionamos 
aqueles que entendemos terem sido relevantes em termos de inovação no fazer-jornalismo e nas 
representações identitárias projetadas. Para isso, selecionamos o Documento Especial – 
Televisão Verdade, exibido na Rede Manchete entre o final da década de 1980 e final da década 
de 1990; o Aqui Agora, transmitido pelo SBT desde o início da década de 1990 até o final da 
mesma década; e o Balanço Geral, veiculado pela Rede Record e televisionado desde o início 
da década de 2000 até os dias atuais. 
 Pensar nestes programas significar entender como tais projeções discursivas se deram 
no caráter jornalístico destas atrações. Se é a linguagem que demarca sentidos, “os processos 
discursivos constituem a fonte da produção dos efeitos de sentido no discurso e a língua é o 
lugar material em que se realizam os efeitos de sentido” (BRANDÃO, 2002, p. 35). Por isso, 
 
 
12 
 
enquanto discurso, a linguagem não deve ser considerada natural ou inocente. “Ela (a 
linguagem) é o ‘sistema-suporte das representações ideológicas (...) é o ‘medium’ social em 
que se articulam e defrontam agentes coletivos e se consubstanciam relações individuais” 
(BRAGA 1980 apud BRANDÃO 2002). 
 Ainda sobre o suporte metodológico, a retórica assume uma função importante para 
quem proclama este discurso. Constituir os elementos apresentados na retórica aristotélica pode 
significar buscar a persuasão, pormeio de um envolvimento com a plateia através da emoção 
(pathos), da própria imagem de si (ethos), conforme apontamos anteriormente, e da 
argumentação lógica (logos). Essas representações de ethos influenciam no sucesso do discurso. 
Elas podem revelar as intenções do orador quando este participa sua enunciação. 
 Por se tratar de produtos audiovisuais, uma vez que são veiculados na televisão, os 
programas popularescos mencionados também criam suas narrativas a partir de estratégias de 
composição imagética, mais precisamente em enquadramentos e em planos de tomada. Cada 
tipo de enquadramento indica uma forma diferente de contar uma história. Enquadramentos 
mais aproximados revelam um favorecimento aos detalhes, enquanto os mais distantes visam o 
contexto da cena. Os planos-sequência são empregados no sentido de aproximar o telespectador 
ao fato retratado. Os expedientes sonoros, por sua vez, também auxiliam na produção de efeitos 
de sentido do produto audiovisual. Uma trilha mais dramática, por exemplo, pode indicar um 
efeito mais chocante ao conteúdo mostrado. 
 Em vista dos apontamentos citados acima, a presente pesquisa objetivará, 
fundamentalmente, identificar a identidade discursiva dos programas selecionados, com base 
nas diferenças e semelhanças ethópicas sobre como cada objeto empírico trabalhou a linguagem 
e a retórica imagética. O estudo será desenvolvido tomando por base as metodologias da análise 
do discurso de tradição francesa, da análise retórica e da análise de composição dos elementos 
imagéticos-sonoro. 
Assim, para as análises definimos o campo temático da violência social como critério 
de escolha, centrando nosso foco em reportagens que versem sobre crimes de variados tipos de 
violência, como assaltos, assassinatos e conflitos que envolvam, na cobertura popularesca 
(re)tratada por nossos objetos empíricos, a sociedade. Decidimos explorar tal temática por esta 
ser, em nosso entender, uma das que melhor representa a essência dos programas popularescos 
através de um discurso comumente compartilhado entre os programas – apesar de alternância 
no modo de fazer jornalismo –; de estereótipos engendrados entre o ‘bem’ X o ‘mal’; de 
 
 
13 
 
recorrentes premências duais de teor classista, alocadas em argumentos que se estruturam com 
base na ‘impunidade’; e na emergência de levar tais pautas ao telespectador. 
 Nesse caminho, no primeiro capítulo discutiremos a questão discursiva como emergente 
nos estudos da comunicação mais atuais. Também nos debruçaremos sobre os conceitos que 
envolvem a criação e transformação do acontecimento em notícia. Discutiremos também 
algumas estratégias que visam conferir uma “verdade” discursiva nos produtos jornalísticos, 
reveladas através de opiniões e argumentos que envolvam o emocional da audiência. Na 
discussão sobre popularesco, abordaremos algumas definições de autores clássicos, no 
propósito de engendrarmos uma base teórica sobe o assunto. Por fim, comentaremos sobre 
algumas disposições colocadas através de um leitor modelo – suposto no discurso – que pode 
ser visado na constituição discursiva dos nossos objetos. 
 A partir do segundo capítulo entraremos no conceito de ethos sob o viés discursivo e 
retórico. Por se tratar do conceito-chave de nossa pesquisa, exploraremos nossas observações 
sobre o ethos na retórica aristotélica, sobre como o conceito pode criar uma identidade ao 
sujeito-jornalista, como poderá ser trabalhado a fim de criar efeitos de credibilidade e as sutis 
diferenças entre o ethos trabalhado na retórica por Aristóteles e como o conceito é entendido 
nos quadros da análise de discurso de tradição francesa. Encerraremos a discussão relacionando 
os problemas que um ethos pré-discursivo pode ocasionar. 
 Na sequência, no terceiro capítulo revisitaremos um breve histórico da televisão 
brasileira a partir dos eventos que marcaram sua existência e o fazer-televisão por parte dos 
produtores. Ainda no trajeto histórico, relembraremos alguns programas de cunho popularesco 
que foram relevantes nessa trajetória. Discutiremos também como esse popularesco pode ser 
colocado nos programas, ao analisarmos a cultura popular e seus vieses no veículo televisivo. 
Por fim, discutiremos nossos objetos em um percurso histórico e conceitual. 
 No quarto capítulo, apresentaremos as metodologias que entrecruzarão este trabalho, 
ressaltando a análise de discurso de tradição francesa e a análise da composição sonora e 
imagética, ancoradas em preceitos linguísticos, argumento de autoridade, termos e estratégias 
que visam representar os efeitos de verdade almejados pelos programas na busca da 
identificação junto à audiência, e mesmo elementos que auxiliam no relato da narrativa 
audiovisual, como planos de tomada da imagem, enquadramentos de câmera e trilhas sonoras. 
 Munidos do conteúdo teórico, no quinto capítulo analisaremos os objetos em função de 
nossas observações sobre cada edição escolhida como corpus. Pretendemos assim discernir 
 
 
14 
 
sobre a configuração ethópica e sobre os pressupostos discursivos inerente aos programas de 
cunho popularesco que delimitamos como nossos objetos empíricos. 
 Observar a constituição ethópica dos programas popularescos pode nos levar a entender 
como estas produções conseguiram, de maneira tão bem sucedida, conquistar a audiência 
através de traços do que seria o cotidiano da cultura popular – o que, conforme alocamos acima, 
pertence ao popularesco. Nas conflituosas colocações em que os atores das reportagens são 
dispostos, o discurso dos programas guarda em seu bojo intencionalidades quando da 
divulgação de um fato. Quando estes conflitos se desdobram entre questões sociais e de 
segurança pública, cada ‘lado’ parece assentar um lugar específico nessas narrativas: compõe-
se infindáveis cenários em que essas batalhas dicotômicas ganham a atenção das câmeras. Aos 
produtores dos programas jornalísticos, a televisão reserva recursos que permitem captar, por 
excelência, imagens e sons do que estaria em ruptura com a normalidade. Cabe a estes 
operadores da notícia decidir sobre o nível de detalhamento que darão ao retratado, bem como 
a oportunidade de estreitar laços com o telespectador na aproximação que uma sequência 
imagética, sem cortes, pode representar. Como se não bastasse, trilhas sonoras são mobilizadas 
em todo esse discurso, com fins de exaltar verdadeiros momentos de clímax nos programas. De 
perseguições policiais a um tour por um cenário de violência; de nomeações simbólicas aos 
atores das reportagens por parte dos produtores televisivos a comentários que reforçam 
essencializações – que podem ser opacas –, o telespectador se entretém enquanto visita lugares 
e situações que nunca poderia visitar se não estivesse assistindo televisão. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
15 
 
CAPÍTULO 1 – OS ESTUDOS DA COMUNICAÇÃO EM DIFERENTES MOMENTOS 
E A NOTÍCIA COMO ACONTECIMENTO DISCURSIVO 
 A fim de cravarmos as bases de sustentação da presente pesquisa, inicialmente 
elucidaremos a forma como os estudos da comunicação entenderam a produção noticiosa ao 
longo do tempo. Em um primeiro momento, explicaremos a estruturação discursiva da notícia 
– em comparação às fases primárias que estudavam os efeitos da comunicação a curto, a médio 
e a longo prazo na audiência – e a questão de que toda reportagem se constitui sempre como 
um acontecimento discursivo, oriundo de um olhar do sujeito-jornalista, mas que também sofre 
transformações ao longo de todo o processo de produção. Por esse motivo, as construções de 
verdade do fazer-noticioso são também edificadas em torno de um saber narrar característico. 
Por fim, essas construções de verdade devem se apoiar em materializações específicas na 
própria construção da notícia, de forma que o ethos discursivo se torna um conceito útil para 
delimitarmos uma dessas materializações. Tais discussõesserão esmiuçados a seguir. 
 
1.1 OS PRIMEIROS MOMENTOS DOS ESTUDOS DA COMUNICAÇÃO 
 Na história das teorias da comunicação, muitos teóricos já tentaram estipular por que as 
notícias são como são (TRAQUINA, 2005). Nesses estudos, as diversas teorias apresentadas 
podem ser classificadas em dois períodos, de acordo com Wolf (2012): a fase inicial, que 
contemplava as primeiras teorias, e nela as pesquisas indicavam uma maior preocupação nos 
efeitos a curto-médio prazo1, e a segunda fase, composta por teorias que detinham uma 
preocupação com os efeitos da mídia a longo praz. Essa fase inicial abarcou estudos que tiveram 
início entre os anos 20 e 30 do século XX, com a teoria hipodérmica. Posteriormente, novos 
modelos de superação da teoria surgiam e mostravam uma preocupação que extrapolava o 
limite do efeito da mensagem na audiência. 
 Outra importante teoria desse período foi a teoria crítica, originária da Escola de 
Frankfurt, que surge, de fato, no período pós-guerra, uma vez que o Instituto (então conhecido 
como Escola de Frankfurt) fora fechado com o advento do nazismo. Assim, a teoria se 
desenvolve partir de parâmetros marxistas e de uma crítica à racionalidade instrumental. Para 
isso, utilizava o conceito de indústria cultural para explicar, essencialmente, conforme assevera 
Wolf (2012, p 73), a “separação e (...) a oposição entre indivíduo e sociedade (como) o resultado 
histórico da divisão de classe”. Dela surgiu o conceito de indústria cultural. 
 
1 Não pretendemos entrar em pormenores das teorias da comunicação uma vez que o objetivo deste trabalho reside 
na questão discursiva do jornalismo, que entendemos ser uma fase mais recente dos estudos da comunicação. 
 
 
16 
 
 Já na segunda fase, as teorias mais recentes – estabelecida por Wolf (2012) como teorias 
do jornalismo – enfatizam uma preocupação a longo prazo no estudo dos efeitos de 
comunicação, conforme colocamos. A primeira destas linhas é representada pela hipótese2 da 
agenda-setting ou hipótese do agendamento. Nela, há a ideia de que a mídia é a instância 
responsável por impor os assuntos que irão ao conhecimento das pessoas, algumas vezes 
destacando um determinado fato, mas, em contrapartida, omitindo outros, ao sabor de seus 
interesses pré-estabelecidos. 
 A teoria do newsmaking é a segunda teoria que faz parte dessa fase mais atual dos 
estudos da comunicação. Essencialmente, duas perguntas definem bem seu âmbito: “Qual 
imagem do mundo passam os noticiários radiotelevisivos? Como essa imagem se correlaciona 
com as exigências cotidianas da produção de notícias nas organizações radiotelevisivas?” 
(GOLDING-ELLIOTT, 1979, p.1 apud WOLF, 2012, p. 193). Assim, na “criação da notícia” 
(tradução do termo que dá nome a teoria), torna-se importante entender o contexto que envolve 
a produção da informação. Para esse quadro teórico, também é preciso considerar as condições 
e restrições ligadas à organização do trabalho, pois são elas “que determinam a definição de 
notícia, legitimam o processo de produção e contribuem para prevenir as críticas do público” 
(GARBARINO, 1982, p. 12 apud WOLF, 2012, p. 195). Essas condições é que determinaram 
a noticiabilidade de cada informação, julgando assim se estas são aptas ou não a serem 
publicadas. Estas mesmas condições são denominadas por alguns autores como ‘valores-
notícia’. Portanto, são eles que valorarão um fato que poderá ser publicado ou não. 
Tais linhas explicam porque as notícias são como são a partir de óticas bastante 
específicas que, de uma maneira geral, podem ter sido revistas pelos estudos mais recentes – 
contudo, não nos debruçaremos sobre estes dois primeiros momentos dos estudos da 
comunicação uma vez que consideramos mais adequado à nossa pesquisa abordarmos o terceiro 
momento, de acordo com os objetos empíricos selecionados. 
Uma terceira linha, que emerge a partir da década de 1960, pode ser destacada nos 
estudos de comunicação por, diferentemente das anteriores, levar em consideração a 
estruturação discursiva da notícia e dos processos noticiosos. Tal abordagem direciona o estudo 
para o campo específico de como um evento se transforma em um acontecimento após uma 
série de mecanismos de semantização específicos da prática jornalística. Portanto, é nesse 
raciocínio que este trabalho pretende desenvolver seu percurso teórico-metodológico: a partir 
 
2 Embora conste como teoria em alguns livros, trataremos essa ideia do agendamento como hipótese, uma vez que 
Hohlfeldt (1997) assim a coloca por não ser um paradigma fechado e envolto à concretudes metodológicas. 
 
 
17 
 
da estruturação do discurso jornalístico. Aqui, a notícia se assenta em determinadas bases que 
a conformarão. 
 
1.2. OS TRÊS PONTOS DA CONFIGURAÇÃO DISCURSIVA 
 Este procedimento discursivo – por nós percebido como fulcral para o entendimento da 
comunicação como um processo –, de acordo com Charaudeau (2012), pode ser percebido 
como uma sequência de bases cruciais: a mecânica de construção dos sentidos; a natureza do 
saber que é transmitido pelo acontecimento; e o efeito de verdade – assim interpretado pelo 
receptor. O presente trabalho se insere nessa linha de estudos da comunicação: mais 
especificamente, remeteremos ao uso dos estudos do discurso para aprofundarmo-nos no ethos 
discursivo, a fim de entendermos como se constrói a informação jornalística nos programas 
estudados, a partir da configuração de um discurso que constrói um enunciador jornalístico 
bastante específico e historicamente marcado. 
 
1.3 A MECÂNICA DAS CONSTRUÇÕES DE SENTIDO DA NOTÍCIA 
 Se é no discurso que buscaremos aprofundar nosso estudo, visando entender os 
meandros que caracterizam a informação jornalística, é preciso compreender como a notícia se 
constitui, desde sua observação por parte do sujeito-jornalista. De acordo com Rodrigues (1990, 
p. 2), a notícia em si é “uma espécie de acontecimento segundo, provocado pela própria 
existência do discurso jornalístico”. Com tal entendimento, é possível afirmar que o 
‘acontecimento jornalístico’ será conformado por parte do sujeito-jornalista que o produziu e 
do veículo midiático que o divulgou. Aqui, cabe ressaltar, a notícia será um tipo de produto 
final composto pelo relato do observador de um acontecimento jornalístico somado aos critérios 
do veículo que ao produz, podendo ser moldado de acordo com circunstâncias que envolvam 
linha editorial do veículo, por exemplo. Portanto, após constituída, a notícia trará consigo um 
outro acontecimento em sua própria narrativa. 
 É justamente nesse caminho que a mecânica de construção do sentido da notícia se 
compõe por um duplo processo, segundo Charaudeau (2012): transformação e transação. 
 No processo de transformação, aponta Charaudeau (2012, p. 41), “há o movimento de 
“transformar o ‘mundo a significar’ em ‘mundo significado’, estruturando-o segundo um certo 
número de categorias que são, elas próprias, expressas por formas”. Nisso, tais categorias agirão 
na identificação dos seres do mundo “nomeando-os”, “qualificando-os” com determinada 
propriedades, “narrando” as ações destes seres, “argumentando” o motivo dessas ações e 
 
 
18 
 
“modalizando-os” conforme suas atitudes e ações (CHARAUDEAU, 2012). Pensando nos 
programas jornalísticos de cunho popularesco, vislumbramos a participação dos personagens 
retratados como algo fulcral na transformação da notícia: um crime – talvez a temática mais 
abordada em tais programas –, por exemplo, envolverá a vítima, o criminoso e, possivelmente, 
a polícia, daí prosseguindo com a narrativa do ocorrido a partir da identificação destes três 
personagens. Em síntese, o processo de transformação deve: “descrever (identificar-qualificar 
fatos), contar (reportar acontecimentos), explicar (fornecer as causas desses fatos e 
acontecimentos)”(CHARAUDEAU, 2012, p. 41). 
 No processo de transação, o sujeito produtor do ato linguístico dará uma significação 
psicossocial a seu discurso, conferindo a este um determinado objetivo. Retomando o exemplo 
que trouxemos acima, de uma reportagem sobre um crime, é no processo de transação que os 
seres identificados – representados por nossos personagens – tomarão o significado psicossocial 
que o sujeito-jornalista lhes imporá. Disso decorre a base da reportagem: o ‘sofrimento’ da 
vítima, a ‘audácia’ do criminoso e a busca pela justiça por parte da instituição que deve manter 
a ordem. Aqui se coloca, portanto: 
 
as hipóteses sobre a identidade do outro, o destinatário-receptor, quanto a seu 
saber, sua posição social, seu estado psicológico, suas aptidões, seus interesses 
etc.; o efeito que pretende produzir nesse outro; o tipo de relação que pretende 
instaurar com esse outro e o tipo de regulação que prevê em função dos 
parâmetros precedentes (CHARAUDEAU, 2012, p. 41). 
 
 Ainda neste processo de transação, podemos inferir que os sujeitos interagirão conforme 
suas contribuições enquanto participam do jogo comunicativo: haverá uma espécie de 
circulação de um objeto de saber que um pode possuir e o outro não, pois um deles será o 
responsável por transmitir, enquanto o outro ficará com a função de receber, compreender e 
interpretar, sofrendo assim uma alteração em seu estado inicial de conhecimento. De tal modo, 
é no ato de informar – processo em que a notícia se insere – que o processo de transação se 
insere. 
 O processo de transação comandará o processo de informação, ainda conforme 
Charaudeau (2012). Esquematizando a constituição da notícia, teremos: 
 
 
 
 
 
 
19 
 
 
 
Figura 1 – O esquema constitutivo da notícia 
 
Fonte: Charaudeau (2012, p. 42) 
 
 Assim, para entendermos as estruturações discursivas da notícia é preciso considerar, 
ainda, que há uma diferença fundamental entre o acontecimento e a notícia. Fatores como o 
olhar subjetivo do sujeito jornalista, as estratégias dos veículos para legitimar a notícia e até 
mesmo a linha editorial destes veículos influenciam o processo de transformação de 
acontecimentos à notícias, conforme apontamos acima. 
 
1.4 O ACONTECIMENTO E A NOTÍCIA 
 Partindo da premissa de que há jornalismo – ou deve(ria) haver – no momento em que 
ocorre a ruptura de um fato, ou seja, a ‘quebra’ da normalidade, entende-se que esse 
acontecimento interessa ao veículo de comunicação, pois ali está algo novo a ser publicado. 
Certeau (1994, p. 286) entende que “o grande silêncio das coisas muda-se no seu contrário 
através da mídia”. Contudo, há indagações acerca deste momento em que a notícia surge. 
Também é preciso considerar o posicionamento do jornalista enquanto profissional. 
 No processo de produção da notícia, as etapas de seleção dos assuntos que tornar-se-ão 
pautas, a metodologia empregada na apuração destes, o sujeito-jornalista que se insere no 
código deontológico de sua profissão, sua escrita e até mesmo a aceitação do seu grupo de 
colegas profissionais, acaba por caracterizar uma identidade profissional e, também, de um 
sistema de referências que compõe a definição de um saber de grupo. Essas ‘regras do meio’ 
denunciadas na produção noticiosa não denotam somente aquilo que os jornalistas estereotipam 
de si mesmos, mas também implica em uma correlação direta com o “fazer notícia”, graças a 
modos de produção inerentes à empresas jornalísticas e seus interesses. 
 Patrick Charaudeau (2012) assevera que algumas notícias podem extrapolar o ‘simples’ 
rompimento da normalidade, prolongando-se por mais tempo. É o caso de greves, conflitos, 
 
 
20 
 
casos de corrupção etc. Para ele, relacionar a origem da notícia à ruptura de algo, ou seja, a um 
acontecimento, seria como confundir o próprio acontecimento e o surgimento deste 
acontecimento. “Propomos chamar de ‘notícia’ a um conjunto de informações que se relaciona 
a um mesmo espaço temático, tendo um caráter de novidade, proveniente de uma determinada 
fonte e podendo ser diversamente tratado (CHARAUDEAU, 2012, p. 132). 
 Neste caminho, Traquina (2005) aponta o que, em sua opinião, poderia ser a essência 
do sistema noticioso: 
 
Podemos imaginar um sistema noticioso que desdenhasse o raro em favor do 
típico, que ignorasse o proeminente, que dedicasse tanta atenção ao datado 
quanto ao atual, ao legal como ao ilegal, à paz como à guerra, ao bem-estar 
como à calamidade e à morte (STEPHENS, 1988, p. 43 apud TRAQUINA, 
2005, p. 55). 
 
 Já para o teórico Rodrigo Alsina (2009, p. 133), há uma diferença básica entre o 
acontecimento e a notícia: “Poderíamos diferenciar o acontecimento da notícia dizendo que o 
acontecimento é uma mensagem recebida enquanto que a notícia é uma mensagem emitida”. 
Neste primeiro momento, o autor, basicamente, define que a notícia reside em um fenômeno de 
geração do sistema, enquanto o acontecimento faz parte da percepção desse sistema. Em outras 
palavras, o acontecimento observado passa pela questão da subjetividade do sujeito – em se 
tratando do sujeito-jornalista –, e a notícia é o relato da observação deste acontecimento. De tal 
modo que, segundo Charaudeau (2012, p. 131), “para que o acontecimento exista é necessário 
nomeá-lo”. E aí se constitui a práxis jornalística, uma vez que: 
 
o acontecimento só significa enquanto acontecimento em um discurso. O 
acontecimento significado nasce num processo evemencial que (...) se 
constrói ao término de uma mimese tripla. É daí que nasce o que se 
convencionou a chamar de “a notícia” (CHARAUDEAU, 2012, p. 131-132). 
 
 Ainda de acordo com Alsina (2009), o processo de produção da notícia é complexo 
desde o nascer do acontecimento e não será preciso entender esse próprio acontecimento como 
algo além da construção social da realidade do sujeito. Nesse ponto, Stuart Hall (1981, p. 364 
apud ALSINA, 2009, p. 134), ressalta que “dar sentido é nós mesmos nos localizarmos dentro 
dos discursos”. Dessa maneira, o próprio sujeito observador – nesse caso representado pelo 
receptor da notícia gerada por um acontecimento – é que irá conferir sentido ao que vê, lê ou 
ouve, significando a partir de seu retrato de mundo. 
 
 
21 
 
 O sentido desta notícia, portanto, residirá no processo de interpretação do receptor. Nele 
é que as notícias deterão efeitos e valores que a poderão ser entendida como ‘verdadeira’. 
Tuchman (1976, p. 94 apud TRAQUINA 2005, p. 17), aborda um meandro importante do 
discurso noticioso: “a notícia, através dos seus enquadramentos, oferece definições da realidade 
social; conta ‘estórias’”. É neste caminho que o discurso jornalístico entorna efeitos de real em 
sua essência. 
 
1.5 O ‘REAL’ E AS CONSTRUÇÕES DE VERDADE NA PRODUÇÃO NOTICIOSA 
 A partir dos motivos expostos anteriormente, entendemos que o próprio conceito de 
verdade no jornalismo não é, senão, uma construção discursiva, que tem como base um saber 
narrar específico, inscrito nas regras profissionais do meio. Este narrar que faz parte de um 
relato do acontecimento, não de uma narrativa criada a partir de um ponto de vista adotado pelo 
sujeito que presenciou o acontecimento, de acordo com Traquina (2005). Isto porque, 
assumindo essa proposição de que há uma narrativa criada, a legitimidade profissional dos 
jornalistas pode ser colocada em jogo, pois: “Estes (os jornalistas) resistem bastante à noção de 
que a notícia não é um relato mas uma construção” (HALL, 1984, p. 4 apud TRAQUINA, 2005, 
p. 17). 
 O discurso jornalístico da televisão – veículo de comunicação dos objetos que 
estudamos neste trabalho – engendra universos de sentidos ainda mais complexos do que as 
notícias do impresso, graças à capacidade de unir os sentidos da audição, da fala e da imagem 
– do visual em si. Essa estruturação de sentidos da televisão é, para Charaudeau (2012), 
altamente solidária entre fala e imagem,ao ponto de ser difícil apontar qual das duas é mais 
importante. A capacidade única da televisão envolve uma sequência temporal breve, que 
sobrepuja a instância dos que a observa, norteando este olhar para os dramas de mundo 
apresentados3. Portanto, “pode-se dizer que a televisão cumpre um papel social e psíquico de 
reconhecimento de si através de um mundo que se fez visível” (CHARAUDEAU, p. 112). 
 O contato da audiência com a construção midiática do real se dá a todo tempo. A 
instituição do real, por meio da informação, se dá “desde a manhã até a noite, sem pausa. (...) 
Articulam nossas existências ensinando-nos o que elas devem ser” (CERTEAU, 1994, p. 287). 
E isto é observado em reportagens televisivas, como nas exibidas pelo Documento Especial, 
Aqui Agora e Balanço Geral, por meio de uma expressão reflexiva. Através de um tipo de 
 
3 Os programas estudados por este trabalho, de cunho popularesco, parecem trabalhar bem com este método de 
definir o olhar da audiência aos dramas do mundo. Cenas explícitas de violência, como a exibição de cadáveres, 
por exemplo, atestam isso. 
 
 
22 
 
realismo, o relato do sujeito-jornalista contará com alguns elementos que imbricarão esse efeito 
de realidade quando: 
 
 
Passa ainda por uma nova definição do estatuto da personagem (que sai do 
anonimato e se torna protagonista num perfil intermédio entre o herói da 
tragédia e o da farsa, por vezes oscilando entre um e outro) e por uma 
representação do espaço por formas fechadas, puras e abstractas, pela criação 
de um “lugar fechado” onde a história contada se possa analisar como uma 
série de reviravoltas e manobras (PONTE, 2005, p. 45). 
 
 Desta forma o real passa a conferir uma certa legitimação junto ao telespectador. Porém, 
no discurso midiático também há estratégias que visam conferir ‘verdade’ ao seu conteúdo, de 
diferentes maneiras, conforme abordaremos a seguir. 
 
1.6 EFEITO DE VERDADE E VALORES DE VERDADE 
 Para entendermos a forma como as notícias são construídas discursivamente é 
importante esmiuçarmos a diferenciação entre valor de verdade e efeito de verdade. Para 
Charaudeau (2012), valor de verdade é o conceito que coloca a verdade como algo intrínseco à 
boa oratória e às técnicas de saber dizer e definir paradigmas do mundo, assim representando 
uma verdade. Desta forma, a verdade seria cunhada através de um conjunto de técnicas 
objetivas utilizadas para relatar algo que seja encarado como legítimo. Estratégias que visam 
valor de verdade a um discurso vão desde uma boa retórica até construções textuais rebuscadas, 
que soem como legítimas devido ao teor ‘erudito’. 
 Por outro lado, e ainda na coxia de Charaudeau (2012), efeito de verdade está mais 
ligado à subjetividade e a convicção do sujeito acerca de determinado assunto ou fato. O efeito 
de verdade tem sua essência ligada à credibilidade de seu conteúdo, pois poderá ser considerado 
como algo legítimo por seu teor crível. Assim, os tipos de discurso existentes afeiçoam seus 
efeitos de verdade ao sabor de suas intencionalidades. 
 
O discurso de informação modula-os segundo as supostas razões pelas quais 
uma informação é transmitida (por que informar?), segundo os traços 
psicológicos e sociais daquele que dá a informação (quem informa?) e 
segundo os meios que o informador aciona para provar sua veracidade (quais 
são as provas?) (CHARAUDEAU, 2012, p. 50). 
 
Neste contexto, ainda para Charaudeau (2012), emergem verdades midiáticas que 
sobrepujam o sentido através de especificações próprias. A verdade dos fatos coloca em riste a 
 
 
23 
 
questão do problema da autenticidade desses fatos; a verdade de origem, que questiona as 
origens do mundo, do homem e dos sistemas de valores; e a verdade dos atos que, completando 
essa tríade proposta pelo autor, emerge no momento de sua própria realização. 
Todavia, há outros dois tipos de verdades inerentes ao espaço social, que podem 
envolver a audiência através de estratégias predispostas no discurso dos veículos de 
comunicação. São elas: 
1. Verdade de opinião: Para Charaudeau (2012), esta verdade possui duas características 
básicas: ela encontra embasamento em um sistema de crenças e pode ser 
compartilhada pela maioria, o que confere um consenso quase que generalizado para seu valor. 
Nas entranhas desta verdade, há opiniões comuns: a mais compartilhada por trabalhar com 
enunciados simples de valor geral4, as opiniões relativas (discutíveis, mas geram convicção 
graças a termos modalizados)5 e a opinião coletiva (na qual há a denotação de um julgamento 
sobre os outros em uma categoria que os caracteriza)6. 
2. Verdade de emoção: Esta verdade é aquela que encanta, provoca forte emoção, 
podendo levar ao pranto do espectador. Ela é baseada na reação emocional que poderá provocar 
no receptor pelo (re)trato dado a uma notícia – tal verdade está intrinsicamente ligada ao ethos 
e ao pathos, que serão mais amplamente estudados7. 
A própria construção das verdades possíveis na estruturação noticiosa, contudo, ainda 
segundo Charaudeau (2012), se materializa em conteúdos narrativos específicos. Portanto, é na 
notícia que as marcas discursivas são deixadas ao sabor da intenção dos jornalistas. Tal acepção 
parece contravir aos ensejos da classe profissional jornalística. Conforme já mencionamos, os 
jornalistas, enquanto insertos em sua classe profissional, parecem não tratar as notícias tanto 
como narrativas, mas sim como relatos de acontecimentos (TRAQUINA, 2005). 
 
4 Por exemplo: na abertura de uma das edições do jornalístico Aqui Agora, em 1995, o apresentador Ivo Morganti 
diz, antes de anunciar os destaques daquela edição: “Daqui a pouquinho nós vamos começar o Aqui Agora, que 
traz reportagens que mostram a vida como ela é”. 
5 Um exemplo disso pode ser observado na edição “Perdidas na Noite” do programa Documento Especial, exibida 
em 1989, o apresentador Roberto Maya refere-se aos travestis da seguinte maneira: “Fazendo da noite o seu passeio 
público, os travestis desfilam a sua ambiguidade” 
6 Em outra atração estudada por este trabalho, o Balanço Geral, é comum encontrar afirmações que generalizam 
suspeitos como “vagabundos”, mesmo que não haja provas do crime (re)tratado. 
7 Na edição de setembro de 1991 do programa Aqui Agora (uma das atrações estudadas por este trabalho), quando 
são exibidas imagens de um sequestro de um ônibus em Apucarana-PR, durante a cobertura feita pelo programa o 
repórter César Tralli narra o momento em que um dos sequestrados é assassinado dentro do ônibus, sob a imagem 
do tiro destruindo os vidros frontais do veículo e da vítima sendo atingida. Ainda nesta reportagem, são exibidos 
os corpos das vítimas fatais: o sequestrado, um dos sequestradores e um ex-policial rodoviário, que assistia ao 
desenrolar do sequestro e fora atingido mortalmente. 
 
 
24 
 
Em vista das ricas contribuições teóricas de Charaudeau (2012), propomos a ampliação 
de algumas categorias de efeito de verdade prementes aos nossos objetos empíricos. 
Objetivamos, assim, adequar o escopo teórico à metodologia que percorrerá nossa pesquisa. 
Nas verdades de opinião parecem tangenciar determinadas estratégias discursivas. Em 
programas popularescos, as opiniões são quase sempre emitidas pelo apresentador e/ou pelo 
comentarista. No momento em que expressa sua opinião, quase sempre a imagem se volta para 
uma cena que ilustra o fato comentado: no caso de reportagens sobre crimes, a edição do 
programa exibe o momento em que a violência fora cometida. Essa estratégia editorial, já 
adotada desde nosso objeto empírico mais antigo, o Documento Especial, reforça ainda mais a 
identificação da audiência com a verdade. Ainda na verdade de opinião, também nos guarda 
atenção ao estado do apresentador/comentarista: ao proclamar seu comentário, quasesempre 
observamos um aumento no tom de voz, clarificando um estado nervoso por parte do sujeito-
jornalista, dando a entender sua indignação. Em reportagens do Aqui Agora, observamos isso 
no repórteres Wagner Montes e Gil Gomes; no programa mais recente, o Balanço Geral, é 
possível encontrar esse posicionamento mais rude nos apresentadores Geraldo Luís e Luiz 
Bacci, que elevam ou diminuem seu tom de voz conforme o assunto tratado no programa. 
 Na verdade de emoção, observamos recorrências discursivas que preenchem a estrutura 
televisiva: a fim de se obter um efeito de verdade baseado na emoção, os produtores dos 
programas popularescos trabalham com imagem visual, áudio e fala8. Em reportagens que 
versem sobre violência, é comum observar o posicionamento do sujeito-jornalista a partir de 
uma fala que preconiza ‘cenas fortes’ e ‘revoltantes aliado a uma trilha dramática e a uma 
aproximação da câmera nas cenas comentadas. Soma-se a isso o transcorrer do programa, em 
que uma reação humana de desespero, como um choro, uma súplica ou um surto de raiva, 
também é explorado por tais programas. Estratégias estas que, provavelmente, surtirão efeitos 
de verdade na audiência. 
 Isto posto, os conceitos de valor de verdade e efeito de verdade, mostram que há uma 
relação dialética entre esses dois ‘fenômenos’, e daí é que o ‘mundo’ nunca será transmitido 
como sua instância, pois ela passará por um trabalho de construção de sentido por um sujeito 
produtor, ao passo em que o sujeito observador é que conferirá os meandros dessa notícia. 
 Os programas que analisamos, de cunho popularesco, oferecem efeitos e valores de 
verdade à audiência, que se identifica com estes programas talvez até por conta do sabor de 
 
8 Adentraremos mais essas recorrências discursivas no capítulo 4 da presente pesquisa. 
 
 
25 
 
‘realidade’ que estes apresentam em sua constituição. Para entendermos mais disso, 
consideraremos a cultura popular. 
 
1.7 CONSIDERAÇÕES SOBRE CULTURA POPULARESCA NA TELEVISÃO 
Os programas analisados por este trabalho9 visavam transpassar à audiência 
representações do cotidiano social desta, talvez com o intuito de vislumbrar identificação. No 
final da década de 1980, o Documento Especial apresentava temáticas pouco exploradas pela 
televisão, como na edição em que exibia uma noite carioca violenta; o Aqui Agora exibia 
reportagens policiais, de conflitos e até mesmo de assuntos mais populares(cos), como briga de 
vizinhos; o Balanço Geral, por sua vez, também explora principalmente reportagens policiais, 
mas, de forma semelhante aos seus precursores, abre espaço para o inusitado. Essas temáticas 
parecem fazer parte de uma cultura popularesca (re)tratada por esses programas. 
Cabe ressaltar que parece haver uma confusão entre os termos ‘popular’ e ‘popularesco’, 
uma vez que ambos podem ser utilizados para indicar situações que talvez não lhes diz respeito. 
A fim de tentarmos trazer esse conflito às nossas discussões, buscaremos as definições de 
popularesco em termos semânticos, e também recorreremos ao que autores consagrados pensam 
sobre. 
O dicionário online Aulete10 define duplamente o termo popularesco, a saber: “1. Que 
é vulgar ou de baixa qualidade: programa de televisão popularesco; 2. Que imita o que é 
popular”. Em ambas definições, percebemos um certo sentido pejorativo ao termo, atrelando 
este à baixa qualidade e à uma imitação do popular. 
Nessa linha, França (2009) elucida diferentes significações ao termo, esclarecendo que 
daí provém relações com o povo, que se destina e ele e lhe é característico. Voltando o termo 
ao significado de cultura, “popular” representaria o que é produzido pelo povo, oriundo do 
próprio povo. 
Martín-Barbero (2001) analisa a cultura popular sob um viés histórico, investigando de 
seu surgimento à sua viabilidade enquanto cultura ‘própria’. Nesse caminho, o autor aborda a 
ideia de massa, destacando que esta não se trata de um processo isolável, mas uma forma recente 
de sociabilidade. Deste modo, propõe que: “pensar o popular a partir do massivo não significa 
(...) alienação e manipulação, e sim novas condições de existência e luta, um novo modo de 
funcionamento de hegemonia” (MARTÍN-BARBERO, 2001, p. 322). Todavia, França (2009, 
 
9 Discorreremos mais sobre nossos objetos empíricos no terceiro capítulo do nosso trabalho. 
10 Fonte: Aulete Digital. Disponível em: <http://www.aulete.com.br/popularesco>. Acesso em: 29 jul. 2016. 
 
 
26 
 
p. 40) aponta que a cultura popular pura, hoje, já está quase extinta, e que os representantes 
essências dessa cultura já não a produzem mais: “a ideia do popular enquanto produzido pelo 
povo se esvazia: nesta nova dinâmica cultural, a ele só cabe o papel de recepção”. Deste modo, 
o conteúdo midiático exibido não passa de algo investido de traços do popular: “Pode-se 
também chamar de popular aquilo que se dirige ao povo e que, buscando ativar o consumo 
pelos mecanismos de identificação, se parece com ele, assume algumas de suas características” 
(FRANÇA, 2009, p. 41). 
Buscando essa identificação do povo junto à TV, sobretudo aos tipos de programas que 
observamos, Vera França (2009) mergulha na questão ao resgatar conceitos de autores 
consagrados da comunicação. Citando Hall (2003a, 2003b), a autora relembra que, para os 
autores ligados aos cultural studies, essa ideia de “popular” não remete somente ao oposto da 
cultura elitista; na verdade, essa cultura popular seria uma segunda mão em comparação à 
cultura erudita. Ainda no escopo de Hall, a autora observa que este popular seria influência dos 
mídias na sociedade: “Não se trata de adotar o termo ‘cultura popular’ para designar o conjunto 
da produção cultural difundida pelos modernos meios de comunicação” (FRANÇA, 2009, p. 
225). Não seria delirante interpretar, portanto, que tal como fragmentos de cultura popular se 
misturam ao conteúdo produzido pela televisão nos programas estudados, a que entendemos 
como popularescos, projeções fragmentárias de personagens também são criadas nessas 
atrações. Ao colocarem a violência como integrante da cultura de sua audiência, o próprio 
veículo televisivo atua como agregadora de esterotipizações dos retratados. Isso posto, 
utilizaremos o termo popularesco não a partir de seu sentido pejorativo, nem tampouco 
relacionado a uma cultura popular mítica, mas sim, a partir das representações que os produtores 
televisivos fazem daquela que seria a cultura do povo, inerente ao espaço popular. 
A partir deste momento, nessa relação intersubjetiva entre o popular enquanto audiência 
e enquanto produtor de conteúdo é preciso considerar a relação entre o sujeito-jornalista – 
produtor da notícia – e o leitor. Há várias formas de abordar metodologicamente essa relação. 
No presente trabalho, adotaremos uma abordagem que considera o leitor modelo como conceito 
chave de análise para, em seguida, considerarmos o ethos discursivo. 
 
1.8 O LEITOR EMPÍRICO E O LEITOR-MODELO 
 Entre os estudos da comunicação e os estudos da linguagem há determinados limiares 
no que tange à constituição da notícia. Um deles refere-se justamente à relação discursiva 
estabelecida entre autor e leitor. Os produtores de um discurso podem tentar, antecipadamente, 
 
 
27 
 
agir para capturar a audiência – isso em discursos dos mais variados tipos: do publicitário ao 
informal. Nessa busca pelo que pode conquistar o leitor, o produtor do discurso irá vislumbrar 
o que Eco (1968) chama de leitor-modelo. 
 O já amplamente discutido esquema da comunicação, que envolvia, tão somente, um 
caminho linear entre emissor, mensagem e receptor, não é mais aceito nos estudos modernos 
da comunicação. Isto porque este esquema desconsidera outros efeitos, como o feedback e o 
ruído, por exemplo. Assim, podemos entender os componentes da comunicaçãonum esquema 
que envolva os elementos: 
 
A fonte (ou emissor) é a originadora da comunicação. 
A mensagem é o conteúdo da comunicação, a informação a ser trocada. 
O codificador traduz a mensagem para um formato que não pode ser 
diretamente interpretado pelos sentidos humanos. 
O canal é o meio ou sistema de transmissão utilizado para transferir a 
mensagem de um lugar a outro. 
O decodificador reverte o processo de codificação. 
O receptor é o destino final da comunicação. 
Um mecanismo de resposta (feedback) entre a fonte e o receptor pode ser 
utilizado para regular o fluxo da comunicação. 
Ruído é qualquer distorção indesejada ou erro que pode ser introduzido 
durante a troca de informação (SCHRAMM, 1982 apud STRAUBHAAR e 
LAROSE, 2004, p.5). 
 
 Portanto, há questões a serem elucubradas no relacionamento emissor-receptor. 
Umberto Eco (1968) modaliza a constituição da notícia justamente na relação entre o que ele 
chama de “Emitente” ou “Autor” – o sujeito-jornalista que produz a notícia – e “leitor” ou 
“destinatário” – o público desta notícia. Para ele, o texto “prevê o leitor”, pois os códigos 
trocados por emitente e destinatário podem diferenciar-se. A fim de adentrarmos nas definições 
de leitor-modelo, inicialmente resgatamos o entendimento acerca de um texto – o qual julgamos 
ser semelhante ao discurso televisivo. Para Eco (1968, p. 36): “um texto representa uma cadeia 
de artifícios de expressão que devem ser atualizados pelo destinatário”. Aqui está posta a 
complexidade do texto: sua relação íntima com o não-dito11, uma vez que determinadas cadeias 
serão preenchidas pela audiência através do subentendido. Ou seja, no que não está colocado, 
mas traz em seu bojo significância por representar sentido, é que o texto vai contornando 
interpretações ao leitor. 
 
11 Abordaremos mais sobre não-dito no capítulo 4 desta pesquisa, no qual discutiremos nossas metodologias 
norteadoras. 
 
 
28 
 
 É nesse ponto de previsão que o emitente irá produzir seu discurso buscando atingir seu 
leitor, mas também considerando as aptidões deste, conforme assevera Maingueneau (2004, p. 
47): 
 
Quando se trata de um texto impresso para um grande número de leitores, o 
destinatário, antes de ser um público empírico, ou seja, o conjunto de 
indivíduos que lerão efetivamente o texto, é apenas uma espécie de imagem à 
qual o sujeito que escreve deve atribuir algumas aptidões. 
 
 Seguindo este raciocínio, Eco (1968) aborda diferentes tipos de competências entre 
emitente e leitor. Serão elas as responsáveis por essa identificação buscada pelo autor. Nesse 
sentido, o autor relata uma situação em que quando o emitente escreve um determinado texto 
utilizando um vocábulo incomum, há a premissa de que o destinatário possui uma determinada 
competência gramatical que o permita entender o contexto da mensagem. “Dizemos então que 
toda mensagem postula uma competência gramatical da parte do destinatário, mesmo que seja 
emitida numa língua conhecida somente pelo emitente” (ECO, 1968, p. 36). 
 Maingueneau (2004, p. 41) elucida estas competências como integrantes das “’leis do 
discurso’ que regem a comunicação verbal”. A “competência genérica”, uma das competências 
apresentadas, faz menção ao domínio das leis do discurso e dos gêneros do discurso. Por sua 
vez, estas serão fundamentais para a “competência comunicativa” do indivíduo, pois será graças 
a ela que haverá discernimento necessário para produzir e interpretar enunciados. A 
“competência enciclopédica”, por si, será aquela responsável por trazer ao indivíduo um 
entendimento sobre o que está a sua volta. Por exemplo: em uma sala de cinema, o indivíduo 
sabe, graças à competência enciclopédica, que não deve fazer barulho para não atrapalhar os 
demais que assistem ao filme; sabe, também, que é proibido fumar, para não causar incêndio 
no cinema. 
 Outro ponto trazido por Eco (1968) faz menção ao ‘preenchimento’ semântico que o 
leitor faz em determinados trechos de um texto, conforme apontamos no início do presente 
item. Isso pode ser ilustrado quando uma situação é colocada através de um diálogo sem 
pormenorizações. Portanto, o leitor age configurando os espaços deixados no texto ao sabor das 
informações que lhe foram passadas anteriormente no texto. Outras considerações sobre o 
trecho textual por parte do leitor imbricam a competência enciclopédia destes, que será acionada 
quando houver tais espaços em brancos. Essa elucubração se entrelaça bem ao discurso 
jornalístico, pensado previamente pelo sujeito-jornalista que o produz. A relação entre o autor 
do discurso e sua audiência será decisiva em duplo sentido, conforme o pensamento de Ponte 
 
 
29 
 
(2005, p. 27), pois haverá “promotores e atores interessados e intervenientes na informação, por 
um lado, e leitores comuns sem acesso nem controle sobre a ação reportada, por outro”. 
 Investido nessa ideia, o eminente deve projetar, fazer um cálculo e uma aposta sobre 
quais são as competências partilhadas entre ele próprio e o seu leitor. Assim, estará prevendo o 
que Eco chama de “Leitor-Modelo”, que será capaz de movimentar-se no texto de acordo com 
o próprio autor. 
 No entanto, o autor também pode(rá) instituir a competência do “Leitor-Modelo”. Em 
um texto literário que narre uma história antiga, por exemplo, o autor deve imaginar que seu 
Leitor-Modelo não conhece a fundo os meandros da época narrada. Nesse caso, o autor propõe 
uma inserção de competência no leitor, de modo que este compreenda a história conforme o 
ensejo do autor. 
 
Portanto, prever o próprio Leitor-Modelo não significa somente “esperar” que 
exista, mas significa também mover o texto de modo a construí-lo. O texto 
não apenas repousa numa competência, mas contribui para produzi-la (ECO, 
1968, p. 40). 
 
 Outro aspecto importante a ser observado nesse processo é o da diferenciação entre 
“Leitores-Modelo” que podem existir. Maingueneau (2004, p. 50) exemplifica essa distinção 
ao citar textos jornalísticos que trabalham o “Leitor-Modelo” a partir da “exclusão (público 
‘temático)” e aquelas que “excluem um mínimo de categorias de leitores (públicos 
‘generalistas’). O título das reportagens televisivas12 – no caso dos objetos deste trabalho – é 
um bom exemplo desta distinção. 
 Neste jogo de visualização de um “Leitor-Modelo” pelo autor, há uma imbricação mútua 
entre a gênese do ‘empírico’ para o “Modelo”. 
 
Se o Autor e o Leitor-Modelo constituem duas estratégias textuais, então nos 
encontramos diante de uma dupla situação. De um lado, conforme dissemos 
até aqui, o autor empírico, enquanto sujeito da enunciação textual, formula 
uma hipótese de Leitor-Modelo e, ao traduzi-la em termos da própria 
estratégia, configura a si mesmo autor na qualidade de sujeito do enunciado, 
em termos igualmente “estratégicos”, como modo de operação textual (ECO, 
1968, p. 47). 
 
 
12 Uma das edições do Documento Especial trazia o título de Delírio na madrugada, por fazer referência à vida de 
uma travesti, que dava aulas pela manhã, caracterizado como professor, e vestia-se como mulher em seus shows 
noturnos. 
 
 
30 
 
Por consequência, para a construção do leitor-modelo será necessário a construção de 
um ethos por parte do Emitente, que passa a ser trabalhado como uma noção da imagem de si 
no próprio discurso. Isto é, ao tentar entender o “Leitor-Modelo”, o Emitente estará fazendo 
uma imagem dele, buscando seu ethos. 
Em suma, a partir do momento em que a comunicação passou a ser estudada sob a égide 
da configuração discursiva, a estruturação da notícia recebeu uma maior atenção dos teóricos 
da comunicação. Desde o acontecimento, que passa por uma série de olhares até virar notícia. 
Os processos de transformação e transação irão contemplar o que partiu da observação do 
sujeito-jornalistaaté que se torne notícia, efetivamente. Este ‘produto final’ será veiculado 
investido de valores que confiram a ele “verdade”, sob os olhos da audiência, a partir de um 
“efeito de real” discursivo. Neste procedimento, os veículos de comunicação fazem um certo 
exercício de projeção de sua audiência, através de um modelo de leitor. Com isso, busca-se 
projetar o ethos do leitor – telespectador, no caso de nossos objetos –, a partir de um ethos 
próprio das peças jornalísticas – Documento Especial, Aqui Agora e Balanço Geral – que 
observamos para esta pesquisa. 
Partindo dessas premissas, iremos discutir, no próximo capítulo, o modo como o ethos 
(principal conceito operatório desse trabalho) se constitui discursivamente. Abordaremos, a 
princípio, sua teorização geral a partir da retórica Aristotélica, ao lado do logos e do pathos. A 
seguir, trabalharemos com a noção de credibilidade do sujeito produtor do discurso, através de 
seu ethos, e com os problemas que um ethos prévio pode trazer à audiência. Também 
discutiremos a configuração do ethos jornalístico, a partir das características que envolvem o 
exercício da profissão. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
31 
 
CAPÍTULO 2 – ETHOS E DISCURSO JORNALÍSTICO 
Neste capítulo abordaremos, primordialmente, o conceito de ethos – mote do nosso 
estudo. Para tal, inicialmente elencaremos o estudo da tríade discursiva oferecida por 
Aristóteles, a fim de abordarmos a constituição da retórica clássica e, posteriormente, as 
atualizações do conceito trazidas por teóricos que observam a retórica a partir da vertente da 
análise do discurso. 
No longínquo período da antiguidade, alguns filósofos estudavam o ‘outro’ e suas 
relações com o mundo e com os demais seres. Na Grécia, determinados estudos eram 
direcionados a questões que envolvessem a eficácia de um discurso através do convencimento, 
por meio da retórica. Em suma, é através de uma boa retórica que o orador de um determinado 
discurso poderá persuadir sua audiência. Assim, com esse objetivo de buscar a persuasão, o 
orador poderá se utilizar de uma retórica adequada com o fim de projetar um ethos que 
conquiste a audiência. 
Todavia, ressalvamos que o ethos se constituirá de acordo com a enunciação empregada 
pelo orador, não somente no enunciado em si. Ou seja, a carga ethópica desejada será 
viabilizada a partir do movimento em que o proclamador do discurso mobiliza determinados 
aspectos em sua fala – como a retórica, por exemplo –, e consegue ‘prová-los’ ao longo do 
tempo. Recorrendo aos nossos objetos empíricos, citamos uma reportagem constante na edição 
do Aqui Agora de 13 de fevereiro de 1995. Nela, o programa relata as mortes de um policial e 
de um assaltante em confronto. Já na chamada, os apresentadores Ivo Morganti e Christina 
Rocha demarcam a posição entre “bandido” e “o policial morto” ao chamarem a notícia 
afirmando que bandidos matam covardemente um policial da ROTA. Na sequência, com a 
entrada da reportagem, a viúva do policial é exibida por alguns minutos, enquanto chora em 
decorrência de sua perda, ao passo em que não há qualquer menção ao nome do assaltante 
também morto. Desse modo, o programa parece ter convencido a audiência a partir do ato de 
enunciação; após enunciar o teor da reportagem na chamada, a edição se municiou de elementos 
que comprovassem o enunciado. Tal constatação encontra base em Ducrot (1984, p. 201 APUD 
MAINGUENEAU, 2001, p. 13), que coloca: “o ethos se mostra no ato de enunciação, ele não 
é dito no enunciado”. Portanto, na observação desse ethos, premências subjetivas não 
congregam valia, pois essa análise “trata-se de apreender um sujeito construído pelo discurso e 
não uma subjetividade que seria a fonte de onde emanaria o enunciado” (FIORIN, 2016, p. 70). 
Muito embora aponte que não é fácil conferir uma única definição à retórica, Júnior 
(2005) asserta que esta consiste em uma forma de comunicação com fins persuasivos, 
 
 
32 
 
fundamentalmente. Aristóteles (2005, p. 123) também a define de maneira semelhante, quando 
coloca que a retórica é “a capacidade de descobrir o que é adequado a cada caso com o fim de 
persuadir”. 
 
2.1 A RETÓRICA ARISTOTÉLICA 
Anteriormente ensinada e exercida pelos sofistas13, a retórica ganhou novas designações 
após ser estudada e publicada por Aristóteles. Essencialmente, o filósofo baseou sua obra como 
um estudo sobre as técnicas de um discurso proclamado em público com fins persuasivos. 
Junior (2005) ainda aponta que Aristóteles centra suas críticas aos teorizadores da retórica – os 
sofistas – em alguns pontos, a saber: seus precedentes (os sofistas) voltaram suas atenções ao 
discurso judicial em detrimento aos demais gêneros; também deram mais ênfase à emoção – 
elementos pathéticos – do que à argumentação lógica – logos –; e a demasiada importância à 
estrutura formal do discurso. Deste modo, a retórica aristotélica pode ser considerada uma teoria 
da argumentação persuasiva, utilizável para a interpretação de qualquer forma de discurso. 
Como forma de argumentação, a retórica equivale à dialética, no sentido de que fora 
reconhecida como conhecimento prático por Aristóteles. Isso implica que, com ela, um debate 
pode ocorrer em ambos os lados: aquele que dominar melhor a arte, sairá ‘vencedor’. Ao 
apontar diferenças em relação à retórica sofista, Aristóteles (2005) argumenta que a arte retórica 
funda-se em provas, que podem ser inartísticas e artísticas. A primeira, que não será trabalhada 
pelo orador, reside na evidência de contratos escritos de testemunhos, confissões sob tortura 
etc; a segunda – esta sim técnica –, se baseia em argumentos de persuasão criados pelo autor 
do discurso. 
Outrossim, estas provas de persuasão fornecidas pelo discurso podem ser de três 
espécies, a saber: algumas residem no caráter moral do orador; outras, na disposição em que o 
ouvinte se coloca; e as seguintes naquilo que o discurso demonstra ou parece demonstrar. No 
primeiro caso, das provas de caráter, o discurso do orador será colocado de tal maneira que 
imprimirá credibilidade à audiência, por conta da ‘honestidade’ do autor do discurso – prova 
comum aos três objetos desta pesquisa, representados pelos apresentadores. As provas que se 
relacionam à disposição dos ouvintes são aquelas que conferem um teor crível ao orador graças 
às emoções que a audiência sente em seu discurso. Aristóteles (2005, p. 97) assevera que “os 
 
13 Intelectuais, pensadores e cientistas residentes na Grécia antiga, nos séculos IV e V a.C., que ensinavam por 
meio de uma designação geral em áreas que não eram abordadas pelas escolas, como física, geometria, medicina 
e retórica. Detinham técnicas avançadas do discurso, a ponto de convencer rapidamente sua audiência. Fonte: 
InfoEscola. Disponível em: <http://www.infoescola.com/filosofia/sofistas/>. Acesso em: 01 dez. 2015. 
 
 
33 
 
juízos que emitimos variam conforme sentimos tristeza ou alegria, amor ou ódio”. Essa prova 
é bem corriqueira aos programas popularescos que analisamos aqui: em todos há o uso de drama 
nas reportagens, através de alguns que choram por seus familiares mortos, cidadãos revoltados 
com a violência etc. Por fim, a prova do discurso é aquela constituída através de um discurso 
que mostre – ou pareça mostrar – a verdade. Relacionamos tal prova aos valores e efeitos de 
verdade colocadas por Charaudeau (2012) no capítulo anterior – no qual descrevemos algumas 
estratégias usadas pela mídia para obter esta prova de verdade do discurso. 
Transcorrendo seu estudo sobre retórica, Aristóteles explica a persuasão através de uma 
tríade que buscava dividir os meios discursivos que entusiasmam o auditório: ethos, pathos e 
logos. 
 
2.2 A TRÍADE DISCURSIVA QUE MOBILIZA A PERSUASÃO: ETHOS, PATHOS E 
LOGOS 
Como em um triângulo isósceles, podemos entender o ethos e o pathos de um lado,

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