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UNIDADE 1 Conhecendo o campo da teoria literária Você já assistiu a alguma adaptação cinematográfica que tenha surgido de algum livro literário? Já teve a experiência de ler o livro do filme a que assistiu, ele já se deparou com pessoas que disseram “ah, mas eu li o livro e é diferente, tem mais detalhes”? Há quem diga preferir ler o livro antes de assistir ao filme, inclusive, por acreditar que a visão do cinema influenciará na imaginação leitora… todos esses elementos, de modo geral, configuram nosso objeto de estudo, a literatura comparada. Já sabemos que a literatura, em linhas gerais, é uma forma de arte que utiliza a palavra como seu elemento fundamental. O pesquisador Massaud Moisés, em seu Dicionário de Termos Literários (Editora Cultrix, São Paulo, 2004, p. 264), define a literatura como a arte da escrita, porém, ao longo das várias páginas seguintes, problematiza esse conceito, uma vez que a palavra literatura é polissêmica, e seu significado depende de seu contexto de uso. Apesar da multiplicidade de significados - já que as palavras têm história – vamos delimitar a literatura àquele trabalho técnico e artístico, que não possui compromisso direto com a realidade, e que se constitui como obra a partir do campo da ficção, sendo formada por arranjos estéticos que exploram diferentes dimensões das palavras. É essa forma de literatura que atravessa épocas, que se cria e se recria ao longo dos séculos, e que, por meio de diferentes linguagens (dentre as quais está o cinema), produz efeitos de sentido sobre nossos modos de ser e de viver, possibilitando-nos ver a realidade sob diferentes ângulos. É como diz o poema de Carlos Drummond de Andrade: Não faças versos sobre acontecimentos. Não há criação nem morte perante a poesia. Diante dela, a vida é um sol estático, não aquece nem ilumina. As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam. Não faças poesia com o corpo, esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica. […] Penetra surdamente no reino das palavras. Lá estão os poemas que esperam ser escrito. Estão paralisados, mas não há desespero, há calma e frescura na superfície intata. Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário. Convive com teus poemas, antes de escrevê-los. Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam. Espera que cada um se realize e consume com seu poder de palavra e seu poder de silêncio. (ANDRADE, 1945, p. 6) Em linhas gerais, entende-se que o poema nos aconselha a fecharmos os sentidos para os significados tradicionais, dicionarizados das palavras que nos cercam, para que possamos deixar fluir a arte da escrita literária, transformando e reinventando o significado das palavras. Esse mundo à parte, o mundo que o poema afirma ser o dos versos, não é um mundo em movimento, mas um lugar estático, que está lá para ser descoberto, sem pressa. Da mesma forma, a literatura não existe para cumprir uma função objetiva, mas para explorar as palavras, criar novas e outras formas de linguagem e de compreensão, e para possibilitar que cheguemos à compreensão de que enquanto a humanidade existir, a arte será produzida, como forma de registrar nossa passagem por esse mundo e como modo de registrar nossas angústias, anseios e nossa qualidade humana. Mas qual seria a natureza do texto literário? Sabemos que, em linhas gerais, todo sistema que foi criado pelo homem serve para a comunicação humana, e pode ser denominado como uma linguagem. A linguagem por sua vez, pode ser entendida como um grande sistema de signos, dos quais uma de suas materialidades é a língua. As regras que regem os sistemas de signos representam e constituem visões de mundo e possibilidades semânticas, que podem ser possíveis em determinadas culturas e em outras não. Nesse sentido, a literatura pode ser considerada como um sistema linguístico secundário dentro da cultura, pois ela é uma forma de expressão da linguagem, criada com um fim específico. Uma das diferenças entre a literatura e as demais linguagens, como será abordado mais adiante, está no significado das palavras, que adquirem outro sentido, o conotativo. Isso significa que a linguagem literária não possui a mesma forma que ela adquire em contextos e situações reais de uso. Por isso, essa linguagem possibilita múltiplas interpretações, tornando-se subjetiva. A linguagem literária Você conhece o mito da torre de Babel? Esse mito perpassa a consolidação da Babilônia na Antiguidade, onde hoje se localiza o Iraque. Vamos à leitura? Naquele tempo, toda a humanidade falava uma só língua. Deslocando-se e espalhando-se em direção ao oriente, os homens descobriram uma planície na terra de Sinar e depressa a povoaram. E começaram a falar em construir uma grande cidade, para o que fizeram tijolos de terra bem cozida, para servir de pedra de construção e usaram alcatrão em vez de argamassa. Depois eles disseram: “Vamos construir uma cidade com uma torre altíssima, que chegue até aos céus; dessa forma, o nosso nome será honrado por todos e jamais seremos dispersos pela face da Terra!” O Senhor desceu para ver a cidade e a torre que estavam a levantar. “Vejamos se isto é o que eles são capazes de fazer; sendo um só povo, com uma só língua, não haverá limites para tudo o que ousarem fazer. Vamos descer e fazer com que a língua deles comece a diferenciar-se, de forma que uns não entendam os outros.” E foi dessa forma que o Senhor os espalhou sobre toda a face da Terra, tendo cessado a construção daquela cidade. Por isso, ficou a chamar-se Babel, porque ali foi que o Senhor confundiu a língua dos homens e a espalhou sobre a Terra. (GÊNESIS, s/d, 11:1-8.) Como o texto é mais antigo, uma figura dessa torre demonstra a interpretação literária de um leitor do texto sobre a lenda da torre de Babel. Ilustramos dessa forma para mostrar que o código escrito, mesmo sendo único, não garante que todos tenham a mesma interpretação dos fatos. Observe atentamente o texto. O que você vê? Há uma progressão narrativa, que pode ser percebida pelo uso dos verbos no pretérito perfeito do modo indicativo, o que significa que para o narrador, a história tem caráter verídico. Temos, como referência a personagens “os homens”, o que nos traz a noção de grupo, de vários seres humanos. Nesse sentido, “os homens” pode ser compreendido como a raça humana, por se tratar de uma denominação ampla. Eles (os homens) estavam em um determinado lugar, no tempo em que todos falavam uma só língua (situação inicial). Descobriram, então, uma planície na terra de Sinar, onde começaram a construir uma grande cidade, na qual tiveram a ideia de construir uma grande torre para chegar até o céu, e para que não se espalhassem sobre a Terra (nó). Foi a partir daí que, segundo o texto, Deus resolveu visitar a cidade para ver o que ocorria e, então, vendo a construção da torre, decidiu confundir a língua dos homens, para que esses se espalhassem sobre a Terra (clímax) e, com a separação dos homens pelas diferentes línguas, a cidade parou de ser construída (desfecho). Temos, no texto, uma sequência narrativa completa, rica em detalhes. Na pintura de Bruegel, por sua vez, percebemos uma parte dessa história, mais focada na construção da torre. Observa-se que as proporções do monumento em relação à cidade são gigantescas. Nuvens, inclusive, estão mais baixas do que a torre. No lado esquerdo da torre, que ocupa o centro e o primeiro plano da pintura, vemos a fabricação de tijolos sendo interrompida pela visita de uma figura masculina que, acompanhada de uma comitiva e tendo causado a parada da produção, revela ser alguém muito importante, o que pode ser percebido tanto pelas roupas como pela coroa que usa. A arquitetura da torre, imponente, não remonta técnicas orientais de construção, mas remete à cultura romana, símbolo de perseguição aos cristãos, num formato que chega a assemelharse ao Coliseu romano, um dos grandes símbolos do orgulho e da opulência de Roma. Com isso, chegamos à conclusão de que o artista, ao retratar a obra, quis enfatizar a arrogânciade seus construtores, considerando merecido o castigo divino que os acometeu. Usaremos a torre de Babel como metáfora para explicarmos que a literatura comparada pressupõe analisar a obra literária sob a perspectiva de diferentes línguas, ou seja, analisar uma obra literária comparando-a com as formas como os outros a apresentam por meio de outras linguagens. Caso você tenha notado, o que já realizamos aqui foi um exercício de literatura comparada: partimos do texto para uma de suas releituras, buscando, ao analisar essa releitura, realizar conexões com o texto original. Observemos, a seguir, mais um exemplo: Ainda que eu falasse a língua dos homens E falasse a língua dos anjos sem amor eu nada seria É só o amor, é só o amor Que conhece o que é verdade O amor é bom, não quer o mal Não sente inveja ou se envaidesse O amor é o fogo que arde sem se ver É ferida que dói e não se sente É um contentamento descontente É dor que desatina sem doer Ainda que eu falasse a língua dos homens E falasse a língua dos anjos, sem amor eu nada seria É um não querer mais que bem querer É solitário andar por entre a gente É um não contentar-se de contente É cuidar que se ganha em se perder É um estar-se preso por vontade É servir a quem vence, o vencedor É ter com quem nos mata lealdade Tão contrário a si é o mesmo amor Estou acordado e todos dormem, todos dormem, todos dormem Agora vejo em parte, mas não vejo face a face É só o amor, é só o amor Que conhece o que é verdade Ainda que eu falasse a língua dos homens E falasse a língua dos anjos, sem amor nada seria (Legião Urbana, 1989) Ninguém pode discordar do lirismo da canção de Renato Russo. O tema do texto é a descrição do amor. Percebemos o tom descritivo do texto pela ampla utilização do verbo de ligação “ser”, flexionado na forma “é”. Ao mesmo tempo, o amor, no texto, não é vinculado à noção de amor sexual, mas de amor fraternal, como algo que deve ser naturalizado e universal. Outro detalhe importante que chama nossa atenção nesse texto é que ele dialoga com outros dois textos mais antigos. Vejamos: Texto 1: Ainda que eu falasse a língua dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o sino que tine. […] O amor é sofredor, é benigno; o amor não é invejoso; o amor não trata com leviandade, não se ensoberbece. Não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal; Não folga com a injustiça, mas folga com a verdade; Tudo sobre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. […] (I CORÍNTIOS, s/d, 13:1) Texto 2: Amor é um fogo que arde sem se ver; É ferida que dói, e não se sente; É um contentamento descontente; É dor que desatina sem doer. É um não querer mais que bem querer; É um andar solitário entre a gente; É nunca contentar-se de contente; É um cuidar que se ganha em se perder; É querer estar preso por vontade; É servir a quem vence, o vencedor; É ter com quem nos mata, lealdade. Mas como causar pode seu favor Nos corações humanos, amizade, Se tão contrário a si é o mesmo Amor? (CAMÕES, p. 15) Observa as semelhanças temáticas? Um texto do século XX dialogando com dois textos, sendo que ambos, já possuem, no mínimo, cinco séculos! E o arranjo dos dois, juntos, constitui uma obra prima da música brasileira. O tema de ambos os textos é o amor. O texto de Luís Vaz de Camões busca descrevê-lo por meio de uma série de figuras de linguagem, de elementos marcados por contrastes, de uma atmosfera de tensão. A canção escrita por Renato Russo, por sua vez, é marcada por um tom descritivo acerca do amor, sendo que, em sua constituição, a mesma se utiliza de paráfrases e de citações do poema “amor é fogo que arde sem se ver”, de Camões, e também de elementos relacionados aos textos bíblicos, que abordam o mesmo tema. É possível perceber, na canção de Renato Russo, deste modo, uma relação intertextual com o poema de Camões e com o texto bíblico, uma vez que os textos mais atuais - no caso, a letra da canção – retomam os anteriores, citando-os, complementando-os, indo além daquilo que foi dito. Desde modo, a intertextualidade se manifesta como uma possibilidade de “conversar” com outros textos, de modo a atribuir-lhes determinados sentidos, ou mesmo, de “criar” novas possibilidades interpretativas e semânticas. No texto de Camões, por exemplo, o amor tratado é o amor romântico; já na canção de Renato Russo, sua citação complementa o sentido da definição de um amor mais fraternal. Com isso, modifica-se também o sentido do texto de origem, reforçando ainda mais sua literariedade. Perceba que a intertextualidade só se torna possível quando o diálogo estabelecido entre os textos é um diálogo literário. Outros textos, do mundo real, com linguagem objetiva, talvez não tenham a mesma possibilidade. Nenhum texto surge do nada; antes, ele é o resultado das interações de mundo que seu autor foi realizando ao longo da vida. O filme “Somos tão jovens” (2013) retrata a biografia de Renato Russo, bem como suas produções de maior sucesso. Vale a pena conferir. Vimos até aqui que a literatura comparada trata das relações existentes entre uma obra literária e outras obras artísticas, sejam elas literárias ou não, além de outros campos do saber, aspectos culturais e históricos, dentre outros. A literatura da qual falamos até aqui remete àquela produção artística que utiliza a palavra como elemento principal, sendo caracterizada por um tipo de linguagem específico, que caracteriza a obra literária como objeto artístico. Neste capítulo, você aprendeu que o texto literário é, antes de tudo, uma produção humana, que utiliza a linguagem de um modo diferente do cotidiano. A literatura pode ser definida como a arte das palavras. As obras de arte (literatura, pintura, escultura, música etc.) conversam entre si. Essa conversa marca tanto formas de interpretação da obra anterior, quanto um elemento denominado “intertextualidade”. Identificando as marcas da linguagem literária Características da linguagem literária Para avançarmos em nossos estudos, precisamos definir alguns elementos que caracterizam a linguagem literária, possibilitando ao leitor diferenciar textos literários de nãoliterários. Domício Proença Filho (2004) nos ajuda a compreender esses elementos, vamos lá! Ambiguidade A ambiguidade, num texto literário, atinge uma dimensão de multiplicidade de sentidos, possibilitando diferentes interpretações de um dado texto, a partir da compreensão leitora e de mundo de quem lê. Um exemplo clássico dessa ambiguidade é a eterna dúvida que o narrador de “Dom Casmurro”, de autoria de Machado de Assis, deixa aos seus leitores: afinal de contas, Capitu traiu ou não traiu Bentinho? Não há evidências concretas, a não ser a desconfiança do personagem, por elementos que ele deduz de sua própria observação. Multissignificação A linguagem literária não tem obrigação de seguir à risca o pacto linguístico estabelecido entre os falantes de uma língua, o que permite que as palavras ganhem novos e outros sentidos, diferentes dos habituais. Na frase proferida por Brás Cubas, narrador da obra “Memórias póstumas de Brás Cubas”, de autoria de Machado de Assis, o narrador personagem, ao falar sobre sua experiência com Marcela, afirma que ela o amou “durante quinze meses e onze contos de réis”, tornando a lógica do amor sensual em interesse financeiro. Ficção Segundo o Dicionário Mini Aurélio (2008, p. 404) ficção é “1. Ato ou efeito de fingir. 2. Coisa imaginária, fantasia, criação.” Aqui, temos uma lição importantíssima: toda obra literária é uma obra de ficção, ou seja, a literatura, ainda que seja baseada em fatos reais, não tem absolutamente nenhum compromisso com a realidade. Certa vez, em 2011, no estado do Rio Grande do Sul, foi aberta, por tempo limitado, a exposição “Titanic: A Exposição – Objetos Reais, Histórias Reais”. Nessa exposição, uma das primeiras falas do guia era a de que os personagens Rose DeWitt Bukater e Jack Dawson, dirigido por James Cameron e Jon Landau, em 1997, não haviam existido.Com isso, percebemos que o cinema adaptou uma história real para transformá-la em arte, utilizando-se da liberdade artística e poética para criar uma história ficcional. Com isso, também se pode definir a ficção como uma imitação da realidade, nunca como a realidade. Conotação Essa é uma das características mais importantes do texto literário, pois remete à noção de que um texto literário não deve ser interpretado ao pé da letra, como se cada palavra ali existente tivesse o mesmo significado que está cristalizado em nossa cultura. A linguagem conotativa pode ser compreendida como figurada e, por conseguinte, como literária. Por isso, o código literário se constitui na dimensão da subjetividade, possibilitando que cada leitor dialogue com o texto de acordo com suas próprias habilidades leitoras. Isso não acontece, por exemplo, num manual de instruções ou numa bula de remédio, que deve ser utilizada como forma de orientação. Vejamos um exemplo: Receita Ingredientes: 2 conflitos de gerações 4 esperanças perdidas 3 litros de sangue fervido 5 sonhos eróticos 2 canções dos Beatles Modo de preparar dissolva os sonhos eróticos nos dois litros de sangue fervido e deixe gelar seu coração leve a mistura ao fogo adicionando dois conflitos de gerações às esperanças perdidas corte tudo em pedacinhos e repita com as canções dos Beatles o mesmo processo usado com os sonhos eróticos mas desta vez deixe ferver um pouco mais e mexa até dissolver parte do sangue pode ser substituído por suco de groselha mas os resultados não serão os mesmos sirva o poema simples ou com ilusões. (Behr, 1958, s/p.) O poema “Receita” pode ser interpretado ao pé da letra? Seus elementos (ou ingredientes) são palpáveis e do nosso cotidiano físico? Possivelmente, a receita não conseguiria ser “reproduzida”, uma vez que trata de aspectos denotativos e ficcionais. Criatividade Para que a linguagem literária se firme como tal, é imperativo que ela se caracterize pelo desvio da norma linguística tradicional. Poremos dizer que a linguagem literária “milita” contra a automatização do uso linguístico, trazendo de volta expressões em desuso, lançando mão de neologismos, criando metáforas, reorganizando o léxico e os sintagmas. O livro “Grande Sertão: Veredas”, de Graciliano Ramos, é um exemplo do uso criativo da linguagem literária, pois, o autor dá voz a um narrador-homem-do-sertão, com suas nuances de linguagem sem a maquiagem linguística dos grandes centros urbanos. Conforme D’Onofrio (2007, p. 19), [...] o poeta produz uma linguagem que, mesmo usando palavras comuns, recria essas palavras para tornar possíveis relações sempre novas com a realidade. Daí os efeitos surpreendentes, fascinantes, fantásticos da linguagem e da cosmovisão artísticas. A essa criatividade, também chamamos de liberdade poética e entendemos que, mesmo que uma obra literária se utilize da realidade para a criação, ela irá se desviar do curso sem que se atribuam juízos de valor a isso. Estruturação Na literatura, ao contrário de outros gêneros textuais, a estrutura da linguagem pode ser considerada intuitiva, personificada, individual e subjetiva. A utilização metafórica da linguagem possibilita desvios, tanto no campo da interpretação como da estruturação. Literaridade A literariedade pode ser entendida como um conjunto de características que, juntas, conferem a um texto a à sua linguagem a qualidade poética. Em linhas gerais, a um texto só será literário se apresentar marcas de literariedade. Verossimilhança Dizemos que a obra literária é verossímil porque se assemelha a elementos do mundo exterior, porém não é verdadeira; apenas possui a equivalência da verdade. Essa verossimilhança pode ocupar dois domínios dentro do texto, a do “poder ser” e a do “poder acontecer”. São elas que estabelecem a coerência interna e externa do texto. A verossimilhança interna refere-se à sua coerência estrutural, enquanto a verossimilhança externa remete à proximidade, fora do texto, com o mundo real. Deste modo, a obra literária pode não possuir verossimilhança externa, porém, sempre deverá ter verossimilhança interna, para estabelecer a relação coesiva. Vejamos: [...] Quando a noite caiu – morna, estrelada, pingada de vaga-lumes e rascada de grilos – o alto da colina estava completamente deserto de humanidade viva. Numerosas turmas de formigas faziam serão. Lagartos corriam por entre macegas e caraguatás. Aves noturnas, frechavam o ar em voos curtos, acomodavam-se nas árvores ou nos túmulos, eventualmente bicavam insetos ou vermes. Cerca de três da madrugada, um vulto humano saiu do seu esconderijo – um valo encoberto pela copa de árvores – e caminhou meio agachado na direção do cemitério. O seu nome? Nem ele mesmo se lembrava, direito, pois tinha usado muitos em sua vida, uma para cada cidade onde operava. Estava sendo procurado pela polícia de muitos municípios por delitos de furto e roubo. Soubera à tardinha que o mais fino dos sete esquifes insepultos continha uma defunta ricaça, coberta de joias valiosas. Fizera o seu plano e metera-se no valo, antes do sol sumir-se. Agora, se conseguisse fazer o “serviço” rapidamente e fugir para o estrangeiro, poderia ir vendendo as joias aos poucos, com a maior precaução. Um cúmplice o esperava com um cavalo encilhado, numa das muitas encruzilhadas nas vizinhanças de Antares. Ele tentaria cruzar o rio perto da divisa com o Estado de Santa Catarina e tentar a sorte na Argentina ou mesmo no Paraguai. Continuou a andar com toda a cautela, parando de quando em quando para olhar em torno e ficar atento aos ruídos da noite. Levava no bolso do casaco uma lanterna elétrica e no das calças um pé-de-cabra. Era a primeira vez que ia espoliar um cadáver. O principal não era chamar a atenção dos operários que guardavam as entradas das ruas, a uns duzentos metros do cemitério. Só acenderia a lanterna quando o caixão estivesse já aberto e ele precisasse localizar as joias no corpo da defunta. Seu coração batia sereno. Tinha bons nervos. Se não tivesse, não poderia exercer aquela profissão. Chegou a uma das esquinas do cemitério e sondou com o olhar a entrada das ruas fronteiras. A cidade estava às escuras. À fraca luz da lua não divisou nenhum vulto humano. Felizmente a uns dez metros à frente do muro principal, do cemitério estendia-se um longo renque de cinamomos copados, que produziam uma zona de sombra onde ele poderia trabalhar sem ser percebido. Teria o cuidado de esconder a luz da lanterna com o próprio corpo. Sempre colado ao muro (boa ideia, ter vestido a roupa clara) o ladrão aproximou-se dos sete esquifes. O primeiro deles, bem à frente do portão de entrada, era preto e havia sido trazido às cinco horas da tarde. O seguinte – o claro e pequeno – era o que procurava. Ajoelhou-se ao pé dele, desatarraxou-lhe a tampa e, contendo a respiração, ergueu-a, fazendo-a depois escorregar de mansinho para um lado. Tirou a lanterna do bolso e acendeu-a. focou primeiro as mãos da morta, pois ouvira falar no famoso solitário de brilhante. Opa! Naqueles dedos cor de cera de abelha não viu nenhum anel. Os pulsos estavam sem pulseiras. Iluminou o peito da defunta e não viu nenhum broche. No pescoço, nenhum colar... numa relutância supersticiosa focou o rosto do cadáver da dama e estremeceu. Os olhos dela estavam abertos, seus lábios começaram a mover-se e deles saiu primeiro um ronco e depois estas palavras, nítidas: “Senhor, em vossas mãos eu entrego a minha alma.” O ladrão soltou um grito abafado, ergueu-se rápido, deixou cair a lanterna acesa e o pé-de-cabra, e rompeu a correr na direção dos campos desertos... (Érico Veríssimo. Incidente em Antares, cap. XVIII). Observe que a estrutura do enredo narrativo nos leva a viajarmos até a cena do ladrão, pronto para arrombar o esquife de dona Quitéria Campolargo. Até o momento da abertura do caixão, não há nada que não esteja no campo do “pode acontecer”, e não há dúvidas de que, ao longo do texto, a verossimilhança interna funciona perfeitamente. O que nos chama atenção, entretanto,é a morta falar, elemento que não condiz mais com a noção do “pode acontecer”. O texto extrapola a verossimilhança externa, porém sua estrutura e coesão interna continuam perfeitos. O “acordar” de dona Quitéria faz com que a estrutura da narrativa ficcional se torne fantástica. A narrativa fantástica é uma forma de literatura cuja estrutura narrativa apresenta todos os elementos convencionais, porém, seu conteúdo é algo que não existe, ou que não pode ser reconhecido em nossa realidade. Neste capítulo, você aprendeu que a linguagem literária, mesmo que se utilize do mesmo sistema linguístico da linguagem não-literária, é constituída por regras próprias, as quais fogem da objetividade. O texto literário, embora seja semelhante à realidade, não deve ser compreendido como tal, haja vista sua possibilidade de ser interpretado a partir das visões de mundo do leitor. Para se reconhecer a linguagem literária, há algumas características que, resumidas, podem ser: múltiplos sentidos, ambiguidade semântica e liberdade de criação. Essas três características abrem-se para todas as demais estudadas ao longo dessa seção. Conceituando literatura comparada É comum que as pessoas representem a noção de literatura a partir da leitura de um determinado livro. Aceitemos ou não, os livros são a representação idealizada da literatura e, em se tratando de uma análise literária, um grande volume de livros sobre uma mesa pode ser uma das representações iniciais que se tem. Em termos gerais, pode-se dizer que a Literatura Comparada é um campo de estudos oriundo da Teoria Literária que compara diferentes textos, buscando elementos transversais que se aproximam ou se afastam entre essas obras. Um pouco de história A literatura comparada, como campo do saber, tem sua origem histórica a partir do século XVI, sendo uma ciência que se desenvolveu paralelamente ao desenvolvimento dos estudos comparados realizados pelo campo das Ciências Naturais. Na virada dos séculos XVI e XVII, Francis Meres escreveu seu “Discurso comparado de nossos poetas ingleses com os poetas gregos, latinos e italianos.” Mais tarde, em 1602, William Fulbecke escreveu “Um discurso comparado das leis” e, John Gregory publicou “Anatomia comparada dos animais selvagens”. A expressão “literatura comparada” surgiu a partir da corrente cosmopolita de pensamento do século XIX, quando o campo das Ciências Naturais utilizava o método comparativo para extrair leis gerais. Nesse período, obras como “Lições de anatomia comparada”, escrita por Cuvier (1800), “História comparada dos sistemas de filosofia”, de autoria de Degérand (1804) e “Fisiologia Comparada”, de Blainville (1833) estabeleceram alguns marcos para o desenvolvimento da literatura comparada. Nesse mesmo século, na França, o termo “literatura comparada” possui terreno fértil, já que o conceito de literatura para designar um grupo de obras já estava sendo cunhado, publicado – inclusive – no Dictionnaire philosophique de Voltaire. É em 1816 que Noël e Laplace publicam várias antologias literárias, sob o título de “Curso de literatura comparada”, ainda que não houvesse em seu conteúdo, necessariamente, um confrontamento entre as obras. A expressão ganhou popularidade na França a partir do curso “Panorama da literatura francesa do século XVII”, ministrado por Abel-François Villemain na Sorbonne, entre 1828 e 1829. Nessa época, os termos usados pelo autor eram, além de “literatura comparada”, “panoramas comparados” e “história comparada”. Mais tarde, em 1830, J.-J. Ampère, aborda o que chama de “história comparativa das artes e da literatura”, nas obras “Discurso sobre a história da poesia (1830) e “História da literatura francesa na Idade Média comparada às literaturas estrangeiras” (1841). Foi por meio desse autor que a literatura comparada adentrou o campo da crítica literária, por meio de um elogio feito por Sainte-Beuve, na Revue des Deux Mondes, nomeando Ampère como uma espécie de fundador da história literária comparada. Além disso, no âmbito francês, em 1835 Philarète Chasles fórmula alguns dos princípios básicos da história literária comparada, que abrange não só a história da literatura isoladamente, mas também a filosofia e a política. Esses fundamentos foram divulgados por Chasles em seus cursos ministrados no Collège de France, uma das instituições de ensino mais tradicionais da França, pela qual já passaram inúmeros pensadores franceses, em 1841. Em 1887, surge em Lyon a primeira cátedra de literatura comparada, e, em 1910, na Sorbonne, tendo à sua frente nomes como Joseph Texte, Fernand Baldensperger e J.-M. Carré. No contexto alemão, Moriz Carrière adota a expressão vergleichende Literaturgeschichte (história comparativa da literartura), como forma de estudar a evolução da poesia para integrar a literatura comparada à História Geral da Civilização. Entre 1887 e 1810, Max Koch edita o primeiro períodico comparativista, intitulado Zeitschrift der vergleichenden. Em 1886, na Inglaterra, Hutcheson Macaulay Posnett publica o livro Comparative Literature e, na Itália, De Sanctis lecionará, em 1836, a disciplina de literatura comparada em Nápoles. Nos Estados Unidos, são criados Departamentos de Literatura Comparada em Columbia (1899) e em Harvard (1904), sendo ambos bastante influenciados pelos estudos de Irving Babbitt. Em Portugal, a literatura comparada foi introduzida por Teófilo Braga, mas o estudo de Fidelino de Figueiredo, intitulado “Literatura comparada”, como parte de seu livro “A crítica literária como ciência” (1912), é considerado seu pioneiro metodológico. Cabe lembrarmos que a Universidade de Harvard, na atualidade, é uma das principais universidades do mundo, tendo alguns dos mais brilhantes e importantes cientistas de nossa época. Nas primeiras décadas do século XX, a literatura comparada, como disciplina, foi ganhando forma, sendo introduzida nas universidades europeias e norte-americanas. Em 1921, o primeiro número da Revue de Littérature Comparée, de autoria de Fernand Baldensperger e Paul Hazard, orientavam a validação das comparações literárias pelo contato real e comprovado dos autores com as obras, ou dos autores com países, o que abria espaço para que se estudasse fontes e influências, ao passo que também começaram a surgir estudos que se ocupavam com o destino das obras literárias fora de seu país de origem. Também nessa época se considerava importante filiar os estudos literários comparados a uma perspectiva histórica, tornando essa forma de literatura uma ramificação da história literária. Mas não se pode afirmar que essas formas de analisar a literatura comparada foram unânimes. Elas faziam parte do que se pode chamar de “escola francesa” de literatura comparada que, mais tarde, foi questionada por outros pesquisadores, como no caso de René Wllek, cuja oposição ao historicismo francês levou à divisão da literatura comparada, naquele momento, em escolas francesa e norte-americana. Isso não significa, porém, que os norte-americanos não seguissem orientações historicistas, porém, não com a mesma ênfase francesa. Ao lado das escolas europeia e norte-americana, destacase também, como um dos “clássicos” da literatura comparada a escola soviética. Essa escola, que teve como principal representante Victor Zhirmunsky, procurou buscar compreender a literatura como um produto social, procurando diferenciar analogias tipológicas e influências culturais, que para eles seriam marcadores de evolução social. Destacamos como especialistas nessas formas de análise o tcheco Dionýz Durisin. Contribuições teóricas para a área – parte I Manuais franceses Da contribuição dos autores franceses para a literatura comparada, podemos destacar o trabalho de Paul Van Tieghem (1931), que considerava a literatura comparada uma preparação para a literatura geral. Além desses, destacam-se os trabalhos de Marius-François Guyard (“A literatura comparada”, traduzida em 1956), Claude Pichois e André-Michel Rousseau (La littérature comparée, 1968) e Etiemble (Comparaison n’estpas raison, 1963; Essais de littérature (vraiment) générale, 1974). Manual brasileiro No Brasil, os primeiros estudos de literatura comparada, iniciados por Tasso da Silveira, no livro “Literatura Comparada”, seguiram os traços de Van Tieghen, além de autores como F. Baldensperger, Fr Loliée e A. Doupoy. Há uma grande insistência na busca de fontes e de influências. Na prática, considera-se o trabalho de Tasso da Silveira como uma repetição dos manuais franceses, porém, cabe destacar que seu trabalho foi importante para a introdução da literatura comparada no Brasil, na Faculdade de Filosofia do Instituto Lafayette. Outro brasileiro, João Ribeiro, anteriormente, em 1905, havia escrito o livro “Páginas de Estética”, onde traz ideias importantes para a literatura comparada, propondo que se explore os aspectos históricos, críticos, linguísticos e literários nas análises. Diferentemente de Silveira, João Ribeiro seguia uma linha mais germânica em seus estudos. Além desses nomes, destacam-se os pesquisadores Otto Maria Carpeaux, Eugênio Gomes e Augusto Meyer. Função da literatura comparada Em si, o termo “literatura comparada” não é, a grosso modo, de difícil interpretação, por remeter a comparação entre obras literárias. Se literatura, como já vimos antes, é a arte construída por palavras, comparação significa estabelecer elos e confrontos entre objetos, literaturas, obras etc. Porém, […] quando começamos a tomar contato com trabalhos classificados como “estudos literários comparados”, percebemos que essa denominação acaba por rotular investigações bem variadas, que adotam diferentes metodologias e que, pela diversificação dos objetos de análise, concedem à literatura comparada um vasto campo de atuação. (CARVALHAL, 2009, p. 5). A literatura comparada (ou literaturas comparadas) consiste numa análise literária que estabelece um diálogo entre duas ou mais obras. Dada sua diversidade de metodologias de análise, ela se constitui como um campo bastante eclético, tanto em termos de metodologias como de materiais a serem comparados. Porém, não se pode reduzi-la a um comparativismo livre. Segundo Carvalhal (2009, p. 7, grifos da autora), Pode-se dizer, então, que a literatura comparada compara não pelo procedimento em si, mas porque, como recurso analítico e interpretativo, a comparação possibilita a esse tipo de estudo literário uma exploração adequada de seus campos de trabalho e o alcance dos objetivos a que se propõe. Desse modo, pode-se entender que a literatura comparada não tem um fim em si mesma, mas pode e deve ser usada como um recurso investigativo para se atingir um determinado fim. Isso não significa dizer que não existem divergências em relação à compreensão do que é literatura comparada, principalmente porque esse é um estudo de natureza ambígua. Também, como já abordamos na seção anterior, essa dificuldade se caracteriza pela diferenciação das vertentes e dos manuais que a estudam, que partem de concepções mais tradicionais ou mais generalizadas. Divergências de entendimentos à parte, há uma questão na qual se tem concordado: a literatura comparada abrange mais uma pluralidade de procedimentos de análise literária do que propriamente um único método ou teoria; estaria mais perto do que denomina Carvalhal (2006): seria um “procedimento mental” e, como tal, generaliza ou diferencia. O ato de comparação faz parte da natureza humana e consiste em colocar “lado a lado” mais de um elemento, estabelecendo potencialidades e limites entre eles, sendo estabelecidos, inclusive, padrões e juízos de valor. Deste modo, a comparação existe para diferenciar ou para igualar elementos. Quando a comparação ocupa lugar central num estudo literário, podemos dizer que estamos falando de um estudo comparado, pois: […] a literatura comparada compara não pelo procedimento em si, mas porque, como recurso analítico e interpretativo, a comparação possibilita a esse tipo de estudo literário uma exploração adequada de seus campos de trabalho e o alcance dos objetivos a que se propõe. Em síntese, a comparação, mesmos nos estudos comparados, é um meio, não um fim. (CARVALHAL, 2006, p. 7, grifos da autora). Podemos entender que a literatura comparada trabalha não apenas com temas históricos e nacionais, mas com temas sociais, filosóficos, sociológicos e abrange diferentes vertentes, sejam literárias ou não. Tudo a que o pesquisador se propuser a estabelecer semelhanças e diferenças com uma obra literária, desde que a obra literária seja o ponto de partida, pode ser compreendido como uma forma de procedimento comparativo. […] os estudos literários comparados não estão a serviço das literaturas nacionais, pois o comparativismo deve colaborar decisivamente para uma história das formas literárias, para um traçado de sua evolução, situando crítica e historicamente os fenômenos literários. (CARVALHAL, 2006, p. 85). Pode-se perceber, deste modo, que literatura comparada designa não apenas a comparação despretensiosa entre as obras, mas, mais do que isso, trata-se de um procedimento plural e sério, que contribui significativamente para o campo de estudos da crítica literária. Para Guyard (1994), um dos pensadores clássicos do tema, a Literatura Comparada é a história das relações literárias internacionais. Afirma o autor que: O comparatista se encontra nas fronteiras, linguísticas ou nacionais, e acompanha as mudanças de temas, de ideias, de livros ou de sentimentos entre duas ou mais literaturas. Seu método de trabalho deve se adaptar à diversidade de suas pesquisas. (GUYARD, 1994, p. 97). Assim, verifica-se que a literatura comparada auxilia e é auxiliada pelo campo da Teoria Literária, realizando o trabalho de, durante a análise de textos literários oriundos de diferentes culturas e nacionalidades, estabelecer relações das mais diversas entre eles. Na prática, embora bastante calcada na História da Literatura, os livros didáticos de Língua Portuguesa, por exemplo, realizam exercícios de comparação quando estabelecem, para um determinado período literário, comparações entre obras francesas, portuguesas e brasileiras, por exemplo. Crises teóricas Ainda que os estudos comparados florescessem em outros lugares longe da França, por décadas os manuais franceses obtiveram certa hegemonia na orientação do campo teórico. Porém, esse terreno exclusivo sofreu seu primeiro abalo no ano de 1958, durante o 2º Congresso da Associação Internacional de Literatura Comparada, durante a conferência “A crise da literatura comparada”, proferida por René Wellek. Nessa conferência, Wellek aborda as fragilidades da disciplina, bem como sua dificuldade em estabelecer um objeto de estudo e uma metodologia, opondo-se à literatura comparada e à literatura geral. Segundo Wellek, a literatura comparada estaria reduzida à seleção de fragmentos para análise, deixando de lado aspectos mais integrais das obras. Além disso, a investigação dos aspectos internacionais das obras levaria o pesquisador a se ocupar somente com aspectos externos às obras. Ainda, Wellek rejeita o princípio causalista dos estudos clássicos, considerando-os ineficientes. Wellek propôs um modelo de análise inspirado nos princípios do estruturalismo de Praga, o que foi algo inovador na época, divididos em relações de solidariedade tipológica e em contatos externos. A partir daí, embora o modelo proposto por Wellek, apesar de inovador ainda possuísse fragilidades, durante a continuidade do século XX, os estudos literários ganharam maior caráter científico, impulsionando a teoria literária. Neste capítulo, você aprendeu que a Literatura Comparada é um campo de conhecimentos que busca analisar e estabelecer proximidades e distanciamentos entre diferentes textos literários. O estudo comparado da literatura começa a ser desenvolvido a partir do século XIX. Desde seu surgimento, a literatura comparada é palco de diferentes ênfases teóricas que, mesmo discordantes, são importantes para sua constituição e consolidação como campo científico. Relacionando literaturacomparada e tradução literária Nem sempre, ao comprarmos um livro literário, podemos ater acesso ao original, especialmente no que se refere às barreiras linguísticas. Diante disso, ou o leitor compra uma obra em língua estrangeira e se torna uma espécie de autodidata, ou opta por uma tradução. Neste segundo caso, há que se considerar uma série de elementos, já que, nem sempre, as traduções, ou mesmo as adaptações literárias, são fiéis ao original. Isso pode acontecer por diversos fatores, entre eles, a fluência do tradutor – um tradutor que conhece a cultura da língua que está traduzindo pode possuir uma visão diferente de um tradutor técnico -, a existência de expressões “intraduzíveis” em nossa língua, dentre outros fatores. Algo que chama atenção, também, no que se refere à tradução, é o contexto, já que a obra literária, como uma imitação da realidade, pode remeter a situações típicas de uma região e de uma cultura, o que nem sempre pode ser “legível” em outro espaço. Daí, nesse caso, entra o trabalho da Literatura Comparada: oferecer uma forma de tradução que seja capaz de traduzir não apenas a língua, mas suas nuances e desdobramentos culturais, que nem sempre se aprende nos manuais de estudo. Para esclarecer o que queremos refletir nesse espaço, trazemos uma reflexão a partir do texto “Entenda o perigo de uma tradução literária ao pé da letra!”, disponibilizado pelo site 2tr e que, embora fale apenas sobre a tradução, também pode ser pensado no contexto da tradução literária: Traduzir um texto de forma automática tem facilitado o dia a dia de muita gente que necessita entender ou se fazer entender em outro idioma de forma rápida e prática. No entanto, quem já se utilizou de um software de tradução pelo menos uma vez sabe que sua tendência é traduzir as palavras e expressões ao pé da letra, tornando os textos - por vezes – sem sentido e engraçados. Mesmo que seja relativamente inofensivo nas comunicações informais do dia a dia, a tradução de uma palavra de forma literal pode ser perigosa, especialmente para quem precisa empregá-las em contextos mais complexos. Historicamente, a chamada “tradução ao pé da letra” ser perigosa não é nenhuma novidade para quem conhece ou necessita conhecer uma segunda língua, especialmente para quem trabalha com tradução. Os perigos da tradução literal – diga-se de passagem – são conhecidos desde os primórdios da história da tradução. Durante a Antiguidade, Cícero – que foi um dos primeiros tradutores da história -, defendia que era necessário buscar repassar de uma língua para outra o peso das palavras no lugar, apenas, de seu número, ou seja, seu sentido geral no lugar da análise dos termos de forma separada. Alguns séculos depois, São Jerônimo, que foi o primeiro tradutor da Bíblia, considerado atualmente o patrono dos tradutores, procurou trabalhar numa tradução por ideias ao invés de por palavras, com o objetivo de preservar ao máximo o sentido original. E no período do Iluminismo, o filósofo alemão Voltaire tencionou o mito de Babel, pela sugestão que nele ficava implícita, de que todas as línguas teriam a mesma origem, o que corresponderia também que todas tinham correspondência perfeita entre elas e, por isso, poderiam ser traduzidas literalmente, sem nenhum cuidado. Seu pensamento levou os estudiosos a perceberem a impossibilidade de uma tradução sempre literal, especialmente, por poder apresentar alguns perigos, tais como: ● Compreensão com estranhamento: É óbvio que existe a possibilidade – mesmo que remota – de uma frase ou expressão de um determinado idioma ter o mesmo sentido em outro, porém, isso é bem raro de acontecer, e o melhor que pode ocorrer, numa tradução literal, quando não há correspondência linguística, é que o falante da língua-alvo (isto é, do idioma para o qual se está traduzindo) tenha um entendimento parcial ou total do texto, ainda que haja alguma confusão. Isso ocorre, por exemplo, quando se traduz a expressão inglesa “seat belt” ao pé da letra, que significa “cinto de assento”, ao invés de “cinto de segurança”, em português. Conforme o contexto, o falante de português possivelmente entenderia a expressão, mas a estranharia. ● Total incompreensão: Quando a tradução ao pé da letra não tem nenhuma relação com o correspondente da língua-alvo, o falante pode simplesmente não compreender nada do que está sendo dito. Isso pode acontecer, por exemplo, quando se traduz uma expressão idiomática de maneira literal, como no exemplo da frase francesa “les carrores sont cuites” que, embora signifique “as cenouras estão cozidas, na realidade, expressa uma situação que não é passível de ser mudada. ● Inadequação na compreensão: Além disso, o maior perigo da tradução literal é a criação de uma frase ou expressão que na língua-alvo pode até fazer sentido, porém, possuindo um significado completamente diferente do que se pretende dizer, soando – por vezes – até como ofensivo ao falante da línguaalvo, levando-o inclusive a construir um significado exatamente oposto àquele que se pretendeu ter. Um bom exemplo é a palavra alemã “Schwarzfahrer”, muito encontrada nos trens e metrôs na forma do aviso “Schwarzfahrer zahlen €40”. Se a traduzirmos ao pé da letra para o português, a placa diz que “passageiros negros pagam 40 euros”, o que, inclusive, pode soar como uma afirmação completamente racista. Porém, “Schwarzfahrer” usa o adjetivo “negro” para se referir a algo ilegal — isto é, pessoas que usam o transporte sem pagar passagem —, da mesma forma como, em português, usamos a expressão “mercado negro”. ● Evitando a tradução literal equivocada: Para se fugir desses perigos, antes de qualquer coisa, é necessário verificar se o trecho que foi traduzido ao pé da letra faz sentido na línguaalvo, e ainda se esse sentido se esse sentido é igual ou pelo menos equivalente ao do original. Exemplificamos com a expressão “falando do diabo” que, em inglês, significa “speaking of the devil”, cuja tradução – nesse caso – tem realmente o mesmo significado em ambas as línguas. No entanto, o melhor a se fazer é buscar um correspondente que seja usado, na língua-alvo, mais ou menos no mesmo contexto que aquele da língua-fonte. Para a expressão francesa “les carrotes sont cuites”, abordada anteriormente, poderíamos usar a expressão “não adianta chorar sobre o leite derramado”, indicando que agora é tarde para tentar mudar algo que ocorreu no passado. Do mesmo modo, o aviso “Schwarzfahrer zahlen €40” deve ser traduzido para outras línguas com a mesma expressão usada no transporte público do país. No Brasil, como esse tipo de aviso não é comum, seria possível dizer simplesmente algo como “proibido viajar sem passagem” ou “viajar sem passagem acarreta multa de 40 euros”.De qualquer forma, o melhor é procurar saber qual é a expressão exata usada pelos nativos da língua-alvo em um contexto semelhante ao da língua-fonte. ● Traduções literais aceitáveis: Mesmo com todos esses perigos, há situações em que a tradução literal é a melhor escolha. Isso acontece especialmente em textos de alto valor literário, de preferência com comentários ou com notas explicativas do tradutor, ou ainda em textos nos quais se pretende tratar exatamente das diferenças entre dois ou mais idiomas. Nesses casos, a tradução literal pode ajudar para que o leitor que possui pouco ou nenhum conhecimento da língua estrangeira possa se familiarizar com sua construção e também com sua forma de expressão de certos significados. Em textos com funções mais práticas e objetivas, entretanto, permanece a regra de fugir da tradução ao pé da letra sempre que isso for possível. Compreende, caro aluno, porque a tradução literária (especialmente a literal) pode ser um problema? É importante que prestemos atenção a isso, a fim de que optemos sempre pela melhor escolha em se tratando de obra literária, seja original, traduzida ou adaptada. Das relações entre literatura comparada e tradução literária: algumas considerações Na seção anterior, a partir da explanação do desenvolvimento da LiteraturaComparada, abordamos de forma breve algumas observações em relação à relação entre LC e tradução literária. Considerar a relevância do papel da tradução literária na história da literatura e cultural reflete levar em conta o papel transformador da obra literária. Conforme Sandra Bermann (2010, s/p) À medida que o papel da tradução no contexto póscolonial, pós-estruturalista e pós-, sub- e internacional se lança no cenário mundial hoje, sua capacidade tanto de estender a vida dos textos literários e culturais, mas também de intervir em seus efeitos globais vem à tona. Para a autora, é importante que se leia da mesma forma como se traduz, estando-se atento aos níveis linguísticos do texto (fonemático, semântico etc.), como também uma tradução requer atenção ao contexto de produção da obra, reconhecendo na obra os aspectos que formaram sua cultura. Em parte, dizer que considerar os aspectos culturais de produção de uma obra literária é importante no momento da tradução, significa ter mais do que uma versão traduzida do texto. Alguns autores brasileiros do século passado já haviam atentado para essa importância, chegando a afirmar – inclusive – que há uma diferença entre os processos denominados “escritura” e “tradução”, sendo a primeira uma reescrita decodificada, e a segunda, considerada uma tradução também do contexto. Também, cabe mencionar que questão da tradução se refere ao fato de que a residência “oficial” da arte literária é a língua nacional, sendo a forma linguística original um dos elementos artísticos do texto. Porém, isso não significa que seja o único elemento a ser considerado. Deste modo, a grande discussão em torno da utilização de traduções para a comparação está no fato de que se acredita que elementos linguísticos e até mesmo contextuais importantes podem ser perdidos com as traduções. Porém, a utilização dos originais linguísticos também apresenta seus obstáculos, dentre os quais está o conhecimento das línguas e um domínio muito maior das literaturas. Sara Rodrigues (s/d) salienta a importância de que se leia como se traduz, dando-se atenção para todos os níveis textuais, desde o fonemático, ao semântico, considerando também os aspectos culturais e situacionais dos textos A grande questão da tradução para a Literatura Comparada encontra-se no reconhecimento do outro, no respeito às suas singularidades. Afirma a autora que: Ao tratar da (sempre presente) questão do papel da tradução em sua relação com a literatura e a cultura (essencial, no caso dos cursos superiores de tradução), […] pode-se concluir que a literatura e as demais áreas humanas, embora com fronteiras disciplinares delineadas, interpenetramse continuamente. O fator de definição desta relação é a tradução das teorias que enformam essa relação. A tradução (a mais disciplinar das atividades) vincula-se de maneira muito especial com a literatura, especialmente com a Literatura Comparada. A Literatura Comparada, em nosso ponto de vista, é um modo de ler. Na Literatura Comparada há a primazia do confronto, do estudo e da diferença. Este é o estudo que, sublinhando a diferença, faz o diferente ser respeitado: de mãos dadas com os Estudos de Tradução, foi uma das bases dos estudos pós-coloniais. Juntamente com os Estudos de Tradução, pode auxiliar a tornar nossos paradigmas e experiências no mundo contemporâneo inteligíveis, o que é condição primeira para transpor limites e avançar. (RODRIGUES, 2010, p. 25) Na visão da autora, os Estudos de Tradução, considerando a necessidade de que se realize uma tradução mais contextualizada das obras, podem contribuir de forma significativa para o aperfeiçoamento da Literatura Comparada. Os estudos de tradução são um campo de conhecimento que se ocupa do estudo de teorias relacionadas à tradução e interpretação, relacionando conhecimentos das Ciências Sociais e Humanas. A tradução literária é um movimento bastante complexo, que não pode ser simplificado, na atualidade, em se “jogar” trechos do texto num tradutor online. Para uma tradução literária de qualidade, primeiramente, o tradutor deve possuir um conhecimento avançado daquela língua estrangeira, com um entendimento de suas nuances, gírias, estigmas etc Você já parou para pensar que expressões do nosso dia a dia podem não ser entendidas tão facilmente por falantes de outras línguas? É o caso da expressão “morrer de rir”, que pode não existir ou não ser dita deste modo em outras línguas. De modo geral, a tradução literária é um elemento bastante importante no contexto da Literatura Comparada, porque uma análise qualitativa dependerá da qualidade da tradução. Por isso, é importante que o tradutor conheça não só a língua, mas – como já mencionado anteriormente – as nuances linguísticas, as construções culturais, as figuras de linguagem existentes naquela língua. Da mesma forma, a as línguas estrangeiras também têm suas marcas sociais, esses detalhes são importantes, tanto para a tradução, como para a análise comparada, uma vez que esses elementos que ficam “nas entrelinhas culturais” da língua possibilitam a construção de uma análise consistente. Além disso, é relevante conhecer o contexto social que a obra enfoca, assim como suas diferenças sociais, já que um determinado livro literário pode abordar essas diferenças. Livros que abordam relações entre personagens de diferentes classes sociais, por exemplo, necessitam desse enfoque. Para concluir nossa discussão, existem muitas reflexões acerca da constituição da tradução literária, e essa se tornou objeto de estudos da Literatura Comparada por considerar-se que, como um campo do saber que analisa obras de diferentes nacionalidades, para que se estabeleça relações de comparação e de diferenciação fidedignas entre as obras, é necessária uma tradução que seja profundamente conhecedora da língua original em que a obra for escrita. Se o pesquisador próprio a traduzirá, ou se utilizará um volume já traduzido, dele levar em conta que tipo de tradução foi realizada, para que as preciosidades daquela língua não se percam. Claro, isso também é complexo, pois se o pesquisador também não conhece aquela língua, em sua análise podem passar despercebidos elementos importantes daquela cultura. Claro, como mencionamos anteriormente, a linguagem do texto não é a única preciosidade que ele possui, mas é essencial para que, juntamente com outras características literárias que a obra possui, a Literatura Comparada possa estabelecer e exercer seu papel. Recomendamos os seguintes materiais complementares: PERISEÉ, Gabriel. Literatura & Educação. 1 ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2006. VEREDA LITERÁRIA – Tânia Franco Carvalhal fala sobre Literatura Comparada. Nessa unidade, você aprendeu que os principais elementos que constituem a linguagem literária, e que diferenciam textos literários de textos não-literários. A definição e o contexto histórico da Literatura Comparada, que como ciência, vem se desenvolvendo desde o século XIX. Os principais autores que contribuíram para o desenvolvimento da Literatura Comparada. Os pressupostos em relação à Literatura Comparada e à tradução. UNIDADE 2 Compreendendo os gêneros literários: conceito, história e características gerais A organização da literatura em gêneros: um pouco de história Podemos dizer que, talvez, o primeiro pensador da teoria literária tenha sido o filósofo Aristóteles (384-322 a.C.), que procurou classificar a literatura grega em três classificações distintas, organizadas a partir de características que o filósofo considerou comuns. Naquele momento, Aristóteles deu para essa classificação o nome de “gênero”, considerando nessa nomenclatura a noção de origem, e compreendendo que a cada gênero são conferidas diferentes ramificações, compreendidas como “espécies”. Essa definição fica mais clara se compreendermos que a palavra gênero, em sua origem latina genus-eris, significa origem, classe, espécie. E essa definição, desde a Antiguidade, não mudou: quando falamos nos gêneros literários, estamos, sim, dizendo que é possívelfiliar cada obra literária a uma determinada classe ou espécie. Quando isso não é possível de ser feito, diz ter uma nova modalidade literária. A filiação das obras, por sua vez, só se torna possível por meio de métodos comparativos e classificatórios. A junção desses elementos comparativos possibilita o estabelecimento de normas e regras gerais para cada gênero, que são observadas nos textos literários por meio de sua predominância ou totalidade. Há teóricos e estudiosos que, inclusive, defendem que a literatura apresente certa universalidade em relação aos gêneros, qualificando – inclusive – a natureza que os gêneros literários possuem não como um elemento descritivo, mas prescritivo e imutável. Isso cria uma divisão entre aqueles que defendem a imutabilidade da literatura e aqueles que acreditam na sua liberdade criadora. Se retomarmos os antigos gregos, veremos que a primeira referência sobre os gêneros literários, de autoria de Platão (cerca de 428 a.C. – cerca de 347 a. C.), atribuía às artes uma função moralizadora por meio da imitação. Aristóteles, por sua vez, recusava a hierarquia estabelecida por Platão, trazendo, em sua Poética o conceito de mímesis. O conceito de mímesis, embora não claramente formulado por Aristóteles, marca a diferença entre o modo de perceber arte e realidade, relacionando a arte ao fruir de um prazer que diferente do que se sente no mundo real. Essa diferenciação por meio do prazer possibilita a valorização do trabalho poético. A partir da concepção de mímesis, foi possível estabelecer algumas qualidades que, embrionárias, configuraram os gêneros literários: ● Conforme o meio em que se realiza a mímesis, era possível diferenciar a poesia ditirâmbica da trágica e da comédia, pois, ainda que todas utilizassem o verso e a métrica, o faziam de forma diferente; ● Conforme o objeto da mímesis, há possibilidade de distinguir, por exemplo, a tragédia (que apresentaria homens melhores para os padrões da Antiguidade) da comédia (que representaria os homens “piores”); ● Segundo o modo da mímesis, seria possível diferenciar o processo narrativo do processo dramático, pois no primeiro, o poeta narraria os fatos, enquanto no segundo, aparentemente não haveria intervenção direta do narrador. Aristóteles, diferentemente de Platão, via a diferença dos gêneros mais ligada ao conteúdo. Outro pensador da Antiguidade que auxilia a formulação dos gêneros literários é o romano Horácio (65 a.C. – 8 a.C.), que atribui à literatura as funções poética e didática, incluindo algumas reflexões sobre os gêneros, com foco na questão da adequação entre o assunto escolhido e o ritmo, o metro e o tom, considerando poeta aquele que consegue utilizar adequadamente esses aspectos. Nesse sentido, Horácio contribuiu fortemente para a eliminação do hibridismo entre os gêneros. Durante o medievo, novos conteúdos e novos gêneros foram surgindo, rompendo com algumas concepções clássicas. Dante Alighieri, na Divina Comédia, contribuiu para o hibridismo entre gêneros, alternando entre epopeia, tragédia, comédia e elegia. O Renascimento cultural, ocorrido a partir do século XV, retoma os preceitos da tradição greco-latina, retomando a noção da mímesis de Aristóteles não como recriação, mas como imitação da natureza. A partir disso, a teoria dos gêneros adquire um caráter bastante normativo e de imitação. No século XVII, o francês Nicolas Boileau-Despréaux, em sua Arte poética, fundamenta a arte na razão, defendendo o bom senso, o equilíbrio, a clareza e adequação como condições principais da poesia. A noção de gênero literário horaciana permanece como espécie fixa, de regras que devem ser obedecidas. Já na segunda metade do século XVIII, o movimento préromântico do “Sturm und Drang” alemão contribui para a noção de gênero por meio da noção de historicidade. É nesse período que a individualidade e a autonomia de cada obra são valorizadas, sendo priorizada a liberdade de criação e a autonomia do escritor. No século XIX, época em que as ciências naturais vigoraram, o professor universitário francês Brunetière (1849- 1906) defendeu a noção de que os gêneros literários evoluíam e se diferenciavam historicamente, como ocorria com as espécies naturais. Nessa concepção, o gênero literário se assemelharia a um organismo vivo. Era mantida, dessa forma, a normatividade dos gêneros, porém essa normatividade, independentemente das criações literárias, seguiria uma ordem natural. Eram os gêneros também que determinariam as características da literatura, e não o contrário. Sua proposta era um estudo sobre a origem, a evolução e a dissolução dos gêneros. Ainda na esteira do século XIX, o italiano Benedetto Croce (1886 – 1952) se opôs à ideia de Brunetière, especialmente no que se referia às suas concepções dogmáticas. Segundo ele, o conhecimento era intuitivo, e lógico, produzindo imagens e conceitos, o que dispensaria a total submissão à rigidez das regras Dessa forma, Croce se aproximava mais das concepções românticas, avançando com o argumento de que as semelhanças entre as obras seriam elementos secundários na análise literária. Inicialmente, o autor chegou – inclusive – a abandonar a noção de gêneros, o que foi retomado em sua obra posteriormente. De modo geral, o pensamento croceano negava a substancialidade dos gêneros literários, mas considerava a importância de sua instrumentalidade. O século XX foi um momento de efervescência de teorias e de modos de compreender os gêneros literários, dentre os quais destacamos trabalhos como os de Vossler, que ajudou a criar a compreensão da estilística moderna, as proposições do New Cristicism do autor Allan Tade, o início do Formalismo Russo por meio da teoria do estranhamento, de Chklovski. Tynianov foi um autor que contribuiu, por meio do movimento formalista, para aproximar a série literária e a não literária, por meio dos princípios de função, sistema, e dominante, tornando a noção de gênero um fenômeno mais dinâmico e mutável. Tomachevski, também representante do grupo formalista, observava os traços dos gêneros como agrupamentos de procedimentos possíveis de se perceber, ressaltando a impossibilidade de se estabelecer uma classificação lógica ou mesmo fechada dos gêneros, já que eles são elementos históricos. Outro autor, Luiz Costa Lima, fundamentado em Bakhtin, se voltaria para a questão da percepção nos gêneros literários que, além dos traços linguísticos, consideraria também as expectativas do receptor, assim como a maneira como a obra literária capta a realidade. Com isso, o autor abandonava as propostas caracterizadoras do literário apenas pela linguagem. Roman Jakobson, a partir de sua teoria sobre a hierarquização das funções de linguagem no texto poético, afirma que o texto literário possui predominância na função poética de linguagem, e no que se refere aos gêneros, abaixo da função poética dominante dos textos estariam a função referencial no gênero épico, a função emotiva no gênero lírico e a função conotativa no gênero dramático. É também ao longo da primeira metade do século XX que floresce a ideia de “formas naturais” para o texto poético, herdadas do Romantismo de Goethe. Tais formas seriam o épos, a lírica e também o drama. André Jolles distingue nove formas simples do que considera serem “formas fundamentais” da literatura: chiste, conto, memorável, caso, ditado, adivinha, mito, saga e legenda. Emil Staiger, em seu livro Conceitos fundamentais da poética (1946) propõe que os traços estilísticos líricos, dramáticos ou épicos pode ou não se manifestar em qualquer texto, independentemente do gênero. Esses traços poderiam aparecer em maior ou menor quantidade, serem combinados, de forma que nenhuma obra, na visão do autor, seria predominantemente pertencente a um só gênero. No livro Anatomia da crítica (1957), Northop Frye traz a noção dos gêneros clássicos e acrescenta um quarto gênero: a ficção. Afirma o autor que cada um dos gêneros tem sua própria forma de mímesis. Hans Robert Jauss também se debruçou sobre o tema, afirmandoque toda obra se vincula a um conjunto de informações e a uma situação particular de apreensão, pertencendo a um gênero na medida em que admite determinadas expectativas. Desse modo, o gênero seria um elemento histórico, guiado pelo conhecimento das expectativas de recepção e de produção. De modo geral, podemos dizer que o estudo dos gêneros literários não é algo novo. Desde a Antiguidade, filósofos e estudiosos já discutiam acerca da natureza da linguagem literária. A partir disso, podemos resumir nossa breve incursão histórica pela história dos gêneros literários em cinco pontos: 1. Ainda que se leve em consideração as características genéricas do texto literário, não se deve descrever um gênero de forma desconectada de sua recepção, e das formas como o receptor atua sobre ele; 2. Os gêneros literários, como produtos históricos, têm suas características em constante transformação. Isso permite dizer que a disponibilidade para perceber a liberdade de criação deve ser maior do que a busca por elementos normativos e fixos; 3. Os receptores dos textos literários são diferentes; portanto, diferentes leituras de um mesmo texto podem ser feitas. E também, mesmo que a estrutura do texto busque desconstruir a noção de gênero, essa desconstrução só é possível porque há um conjunto de obras que possibilitam a formação de um horizonte de expectativas em relação à obra e ao próprio poeta; 4. Identificar isoladamente determinados traços numa obra não é tão importante quanto a observação de como cada traço se relaciona com outros da mesma obra, a fim de reconhecer o texto como pertencente a um campo semântico lírico, narrativo ou dramático; 5. É importante tomarmos a teoria dos gêneros literários como um meio para nos auxiliares em relação ao conhecimento literário necessário para reconhecimento, apreciação e julgamento de uma obra. Porém, as características dos gêneros, olhadas isoladamente, não nos ajudam a localizar uma obra dentro da literatura. É importante você compreender que os gêneros literários não são categorias fixas, imutáveis ou impossíveis de serem desconstruídas/ hibridizadas. Os gêneros existem porque, ao longo dos séculos, por meio da comparação literária, procurou-se estabelecer algumas características aparentemente fixas em determinados traços linguísticos e estruturais das obras. Porém, isso não quer dizer que essas características não possam ser redefinidas ou redesenhadas na constituição da pluralidade das formas literárias. Os gêneros literários funcionam como uma espécie de ferramenta que nos auxilia na compreensão e na recepção de um texto literário. Certo? A seguir, veremos algumas características comuns aos gêneros literários. Gêneros literários: algumas características gerais Embora, em nosso estudo, recusemos a noção de que as características dos gêneros literários sejam imutáveis e atemporais, isso não significa que não existam alguns conjuntos de regras gerais e particulares de cada gênero, que precisem ser conhecidas. É dessas regras mais gerais que trataremos nesta seção. Sabemos que, em linhas gerais, a linguagem poética se diferencia da linguagem do dia a dia porque estabelece uma relação entre significante e significado um pouco diferente da comunicação cotidiana, tornando-a uma linguagem distinta. A linguagem, de modo geral, pode ser compreendida como um conjunto de signos que obedecem a determinadas regras de combinação, a fim de expressarem um determinado modelo de mundo. Assim, a literatura poderia ser comparada a um modelo secundário, criado a partir de um sistema linguístico já existente – o do mundo real. A teoria dos signos linguísticos, na qual o signo seria constituído por um significante (o conjunto de sons que tornam a palavra acusticamente possível, trazendo-a para o mundo real) e aquilo que ela representa no mundo mental que constitui uma determinada cultura, o qual chamamos de significado. Ferdinand de Saussure, linguista do século XIX, é quem traz essa importante contribuição para o campo da linguagem. ● Exemplo: Se pensarmos em um livro, seu nome, ou seja, seu significante, é constituído de cinco sinais gráficos, a saber: l + i + v + r + o. Da mesma forma, o som da palavra é constituído pelos cinco fonemas que são representados por pelos sinais gráficos (letras) que o formam. Todos aqueles sujeitos imersos em nossa cultura compreendem, através de suas faculdades mentais, que um livro, independente das preferências particulares do sujeito, é um elemento que possibilita a leitura, independentemente, inclusive, se for um livro físico ou mesmo virtual. Essa imagem mental que cada um associa a palavra “livro” é o que podemos chamar de significado. Para Louis Hjelmslev, a linguagem literária é um sistema cujo plano de expressão pertence a um plano desenvolvido a partir do plano denotativo da linguagem natural. Dito de outros modos, a arte literária torna-se conotativa a partir da base da linguagem denotativa utilizada no mundo real. De modo geral, podemos afirmar que as características comuns aos gêneros literários são: ● Significado conotativo: o sentido da linguagem literária será sempre diferente daquele construído culturalmente, por meio da linguagem denotativa; ● Liberdade de criação: a linguagem literária permite o fruir da criatividade por não se prender ao sentido literal das palavras, nem a realidade. Isso possibilita diferentes criações e formas de apresentação da linguagem literária; ● Estruturas diferenciadas em relação a gêneros textuais cotidianos: não podemos nos esquecer de que a estrutura do texto literário, embora tenha algumas particularidades, não é cativa delas, mas pode ser inovada, tanto em termos históricos como por meio da individualidade de quem escreve. O mundo da literatura é aberto, não sendo necessária uma rigidez estrutural para que o emissor se faça entender pelos receptores; ● Imitação da realidade: independente da forma como se apresente, todo gênero literário (e consequentemente, todo texto literário) será uma imitação do real, não podendo e não devendo ser tomado no sentido denotativo, literal das palavras; ● Funções diferentes das dos textos não-ficcionais: a literatura pode estar conectada com a realidade, apresentando denúncias e críticas sobre essa. Porém, para além disso, a literatura também funciona como uma forma de desenvolvimento artístico e de entretenimento. Sua funcionalidade está mais para o fruir estético do que para uma utilização real. Por isso, trata-se de uma arte subjetiva. Ela é polifônica e autônoma em relação às suas funções, podendo ou não exercer algum papel intencional, mas sempre estando aberta para outras possibilidades de compreensão de suas funções; ● Linguagem em poesia ou em prosa: a noção de poesia, até o período do Neoclassicismo, havia sido considerada como um elemento exclusivamente inerente aos textos escritos em versos. Porém, do século XIX para cá, passou-se a compreender a poesia em um sentido mais amplo, abrangendo o fazer artístico. A poesia, dessa forma, seria o conjunto das atribuições que torna um objeto artístico, o que possibilita que qualquer forma de arte seja considerada poética, inclusive os textos literários em prosa; ● Possibilidade de interpretação por diferentes níveis de linguagem: o texto literário, independente do gênero, permite que o leitor analise em seis níveis, a saber: a) nível fabular: seria o nível da história ficcional, da interligação entre os fatos, bem como o estabelecimento de elementos que tornem possível a compreensão do que trata aquele texto; b) nível atorial: corresponde à análise do fazer e do ser, bem como das funções do personagem na narrativa; c) nível reflexivo: trata dos comentários tecidos pelos personagens, ou das considerações sobre a vida e a realidade, explanadas ao longo do texto; d) nível discursivo: possibilita a análise das figuras de linguagem que tornam o texto literário; e) nível descritivo: trata da análise do espaço onde se desenvolve a trama literária, que pode ser físico ou psicológico (ocorrendo no interiordas personagens); f) nível fônico: analisa os elementos sonoros que constituem o texto, sendo importante para o estabelecimento de relações entre os sons e os sentidos do texto. Esses seis elementos podem ser encontrados em qualquer texto literário, pois, de modo geral, compõem sua estrutura. O que os diferencia na classificação dos gêneros é que alguns elementos podem predominar mais do que os outros dentro do texto, o que não impede que eles existam. Por isso, de acordo com essas predominâncias, na teoria literária, se tem dividido o estudo dos textos literários em teoria da narrativa, teoria da lírica e teoria do drama. resumo bastante prático e interessante sobre os gêneros literários: Acesse o vídeo “Gêneros literários – quer que eu desenhe – descomplica”, Resumindo: A classificação e descrição dos gêneros literários é um estudo fundamentalmente comparativo, uma vez que pressupõe que se busque elementos comuns na linguagem e na estrutura de diferentes textos, não para estabelecer regras imutáveis, mas incidências repetitivas. Até aqui, você aprendeu que a noção de gênero literário surgiu como uma forma de agrupamento dos textos, tanto para fins de estudo e análise, como para fins didáticos. Os gêneros literários seriam os grupos de semelhanças que constituem uma determinada modalidade da linguagem literária. Estariam, talvez, mais preocupados em explicar o que não faz parte daquele gênero do que propriamente o que faz parte, não que isso também não apareça. Porém, o estudo dos gêneros literários parece ser tão eficiente em explicar por que um determinado texto pertence a um determinado gênero e não a outro do que em somente defender sua classificação sem comparar também suas diferenças, além das semelhanças com outros textos. Os gêneros literários têm sido discutidos desde a Antiguidade, porém, nos dias de hoje, o que se tem percebido é que, embora sejam caracterizados por elementos considerados “genéricos”, isso não significa que esses elementos sejam regras fixas e imutáveis, tanto pela história como pela liberdade de criação individual. Há um conjunto de características que distinguem o texto literário do texto não literário. E dessas características, podemos observar a liberdade em relação ao uso da linguagem, a possibilidade de criação poética, a subjetividade e os múltiplos sentidos. Além disso, o texto literário dificilmente apresentará uma função prática, mas será algo mais relacionado à possibilidade de diálogo entre o texto e seu receptor, de acordo com a visão de mundo que esse último apresenta. Identificando os gêneros lírico e dramático O gênero lírico Leia o poema a seguir, de autoria de Vinícius de Moraes: Um poema acentuadamente lírico Apavorado acordo, em treva. O luar É como o espectro do meu sonho em mim E sem destino, e louco, sou o mar Patético, sonâmbulo e sem fim. Desço da noite, envolto em sono; e os braços Como ímãs, atraio o firmamento Enquanto os bruxos, velhos e devassos Assoviam de mim na voz do vento. Sou o mar! Sou o mar! Meu corpo informe Sem dimensão e sem razão me leva Para o silêncio onde o Silêncio dorme Enorme. E como o mar dentro da treva Num constante arremesso largo e aflito Eu me despedaço em vão contra o infinito. (MORAES, 1985, p. 1) Visualmente, o poema de Vinícius de Moraes é um soneto, pois é formado por quatro estrofes, sendo que a primeira e a segunda possuem quatro versos cada; a terceira e a quarta estrofes possuem três versos cada. Há, também, o esquema de rimas externas, caracterizado por: A-B-A-B; C-D-C-D; E-F-E; F-G-G. As rimas externas são aquelas que aparecem no final dos versos, sendo que cada sílaba tônica da última palavra é indicada por uma letra do alfabeto, e ao repetir-se o som, repete-se a letra indicativa. No caso do poema, as letras “A”, por exemplo, correspondem a “luar” e “o mar”; as letras “B”, correspondem a “em mim” e “sem fim”, e assim, sucessivamente. No soneto de Vinícius de Moraes, a um eu, uma voz que fala no poema. Essa voz apresenta angústia, solidão, e um traço importante: fusão entre o sujeito e o objeto, o que se percebe em versos como “[...] sou o mar”. Percebemos a presença do sujeito lírico não apenas pela utilização do pronome “eu”, ou pela flexão dos verbos na 1ª pessoa do singular, mas também pela forma como ele se projeta nos arranjos linguísticos durante todo o poema. Além disso, a emoção lírica no texto é percebida pela repetição constante da conjunção coordenativa aditiva e, o que impede uma conexão lógica. O esquema de rimas externas, abordado anteriormente, confere ao poema um tom de musicalidade, caracterizando o caráter emocional do texto. Entre o quinto e o sexto versos, temos uma quebra da linearidade frasal, com o trecho “[...] e os braços”, o que torna as ideias incompletas, caracterizando o que se chama de enjambement, caracterizando, também, uma mímesis de um estado afetivo. Além disso, há a presença de uma disposição anímica eliminando os distanciamentos entre as coisas, por meio do estado afetivo, e os recursos sonoros criam uma unidade de significação difícil de ser alterada. Em poucas linhas fizemos a análise literária de um poema. Agora, passaremos a discutir alguns elementos fundamentais que constituem o gênero lírico. Antes de mais nada, um detalhe histórico: o gênero lírico surgiu na Grécia Antiga, como uma forma de manifestação em verso para expressar diferentes emoções da esfera humana. Seu nome está associado ao instrumento musical que acompanhava as declamações: a lira. Até boa parte da Idade Média, poesia e música não eram entendidos como elementos separados, sendo indissociável a utilização da melodia durante as declamações. Somente a partir do Renascimento Cultural, no período literário conhecido como Humanismo, começa haver uma separação maior entre essas duas artes. Ao gênero lírico, em grande medida, pertencem os poemas nas suas mais variadas formas, o que não impede – obviamente – a pertença de outros gêneros textuais, desde que apresentem a predominância das marcas do gênero. Da mesma forma, como vimos no capítulo anterior, há uma diferença entre poesia e poema. A poesia é um conjunto de características e técnicas de elaboração artística; o poema é uma das manifestações concretas da poesia. Um dos primeiros elementos a se observar na análise do poema é sua estrutura visual (número de estrofes e de versos, disposição visual etc). Essa observação é importante para que se estabeleça relações de sentido entre o texto e sua forma visual. Essa análise é também conhecida como a análise do nível gráfico do poema, ou seja, da forma como ele está escrito. Nessa análise, também é importante observar o título, pois ele serve como uma espécie de slogan do poema, interferindo em sua significação. Tanto a disposição das palavras quanto os espaços em branco são importantes para essa análise. Após a “leitura visual” do poema, passamos para a análise do nível fônico do poema, observando os elementos de versificação, as repetições, a acentuação, a entonação etc. Podemos dividir essa análise nas seguintes verificações: ● Construção métrica: de que forma os versos estão constituídos? Há quantas sílabas ortográficas em cada verso? ● Acentuação: de que forma está disposta a organização das sílabas tônicas nos versos? Lembre-se que as sílabas tônicas conferem a musicalidade ao poema, e nem sempre essas sílabas estão de acordo com a linguagem denotativa; ● Figuras sonoras: de que modos estão organizadas as rimas do poema? Estão no final dos versos (externas) ou aparecem em seu interior (internas)? São feitas por meio de consoantes (aliteração) ou de vogais (assonância)? ● Enjambements: há “quebras” de sentido na linearidade do texto? Como elas interferem na compreensão geral do poema? Outro nível relevante a ser considerado no poema é o nível lexical. De que forma o sentido denotativo das palavras constitui sua literariedade? Há a presença de metaplasmos (desvios morfológicos), metataxes (desvios sintáticos) ou metassememas (desvios semânticos) da linguagem poética
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