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TEORIA-E-CRÍTICA-LITERÁRIA-I

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TEORIA E CRÍTICA 
LITERÁRIA I 
Sumário 
 
1. TEORIA E CRITICA LITERÁRIA .............................................................. 4 
1.1 Teoria .................................................................................................... 5 
1.2 Crítica .................................................................................................... 6 
1.3 Diferenças entre Teoria e Crítica Literárias ........................................... 7 
2. HISTÓRIA DA LITERÁRIA ..................................................................... 11 
2.1 O Grande Tempo ................................................................................ 12 
3 GÊNEROS LITERÁRIOS ....................................................................... 21 
3.1 Épico ................................................................................................... 21 
3.2 Lírico ................................................................................................... 22 
3.3 Dramático ............................................................................................ 24 
3.3 Gêneros literários atuais: poesia, romance e ensaio ........................... 25 
4 FUNÇÕES DA LITERATURA ................................................................. 29 
5 PERÍODOS E MOVIMENTOS DA LITERATURA ................................... 37 
5.1 Definições de períodos e movimentos ................................................ 40 
5.2 Períodos e movimentos no Brasil ........................................................ 44 
6. O MODERNO NA LITERATURA A PARTIR DO RENASCIMENTO ...... 47 
6.1 Humanismo na literatura da Idade Moderna ....................................... 52 
7. PAPEL DA MULHER NA PRODUÇÃO DE CULTURA ........................... 55 
7.1 Produções literárias femininas ............................................................ 58 
7.2 História da Dramaturgia Feminina ....................................................... 61 
8 POR QUE ADAPTAR UM TEXTO LITERÁRIO CLÁSSICO? ................. 63 
8.1 Poder de difusão da adaptação literária .............................................. 65 
8.2 Adaptações da literatura para os gêneros visuais ............................... 67 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................. 70 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
Prezado aluno, 
 
O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é 
semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – 
quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se 
ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida 
sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz 
alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a 
mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser 
direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo 
hábil. 
Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso 
da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base 
e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar 
o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. 
A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser 
seguida e prazos definidos para as atividades. 
 
Bons estudos! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
1. TEORIA E CRITICA LITERÁRIA 
 
A literatura pode ser vista como simples entretenimento ou como fonte de 
conhecimento e reflexão. Para que possamos entender de fato a literatura, são 
necessários certos conceitos ou ferramentas teóricas que tratam a linguagem literária 
de maneira ampla. A teoria literária apresenta esses conceitos e ferramentas, 
contribuindo para o entendimento da obra, do autor, do leitor e todo o processo que 
envolve as produções literárias e seus conteúdos. A teoria da literatura possui uma 
base de dados que permite elaborar um método de reflexão e análise, formando uma 
trajetória da produção literária de um determinado período, onde é possível constatar 
as mudanças sucedidas no processo histórico com relação ao homem e tudo que o 
envolve (NITRINI,2000). 
O caminho da teoria literária inicia-se entre os gregos dos séculos V e IV a. C., 
quando se preocuparam com as possibilidades oferecidas pela expressão linguística. 
O domínio da técnica de falar rendeu bons frutos profissionais e assim passou a se 
valorizar a eloquência e buscar estabelecer as regras para convencer o público 
ouvinte. Assim nasceu a oratória entre os atenienses do século V a.C. Tanto a oratória 
quanto a oralidade têm papel fundamental na origem da teoria literária e da literatura. 
Os estudos literários inicialmente são baseados em duas disciplinas: a retórica 
e a poética, que surgiram na Grécia clássica, no século V a.C. O objetivo da retórica 
era organizar de forma coerente os recursos capazes de atribuir eficiência à 
argumentação pela palavra, tornando o discurso mais atraente. A poética, ou arte 
poética, teve a célebre “Poética” de Aristóteles (1991), como seu primeiro tratado. 
O estudo da literatura era feito por meio da poética e da retórica num sentido 
formal, na Grécia Antiga, sem levar em conta a questão da natureza do conhecimento, 
pois consideravam esse problema como responsabilidade da filosofia. 
A teoria e crítica literárias, de um modo geral, são uma crítica do senso comum, 
de conceitos considerados como naturais, e uma reflexão sobre reflexão de 
mecanismos dos quais utilizamos para dar significado nas coisas, na literatura e em 
outras áreas do saber (COMPAGNON, 2006). 
Teoria e crítica são dois conceitos distintos que se engajam nos estudos 
literários, com definições amplas e geradoras de problemáticas. Vamos entender 
agora, o conceito de cada uma delas? O que é teoria? O que é crítica? 
1.1 Teoria 
 
 
De acordo com a Universidade Católica de Brasilia (2006, p.13), a palavra teoria 
advém do grego theoría, que significa “conhecimento especulativo, meramente 
racional; conjunto de princípios fundamentais de uma arte ou ciência; opiniões 
sistematizadas”, enquanto Lima (1983, p.451) afirma que, “a teoria poderia ainda 
ser vista não como uma caixa de ferramentas, mas como uma sistematização 
aprofundada a respeito da literatura”. 
Fazendo uma análise das duas ideias, pode entender-se, de certo modo, que 
elas partilham a mesma ideia, e acabam naquilo que é a sua essência, a 
sistematização de ideias. Por outro lado, os dois autores parecem ter os mesmos 
princípios teóricos, e consideram o termo teoria não somente como uma gama de 
instrumentos, mas como uma série de axiomas, ou, conhecimentos aprofundados 
e sistematizados a respeito de um campo de saber. 
Culler (1999, p.12-13) por sua vez, declara que teoria é “um conjunto de 
reflexão e escrita cujos limites são excessivamente difíceis de definir”. O mesmo 
autor, citando o filósofo Richard Rorty, faz referência de um novo gênero misto, 
que começou no século XIX e foi apelidado teoria. Passou a denominar obras que 
conseguem contestar e reorientar a reflexão em outros campos que não aqueles 
aos quais supostamente pertencem. 
Percebe-se então, que teoria é um conceito superior, conceito que atravessa 
outros campos de saber científico, não se limitando apenas ao campo de estudo 
de uma única área do saber. De outro modo, o conceito de teoria para o autor tem 
uma definição ilimitada que, por um lado, pode ser analisada do ponto de vista 
restrito e, por outro, dilatado, englobando diversas e distintas dimensões do 
homem. De um outro ponto de vista, Culler (1999) explica o seguinte: 
 
A teoria é muitas vezes uma crítica belicosa de noções de senso comum; 
mais ainda, uma tentativa de mostrar que o que aceitamos sem discussão 
como “senso comum” é, de facto, uma construção histórica […], a teoria 
envolve um questionamento das premissasou pressupostos mais básicos do 
estudo literário, a perturbação de qualquer coisa que pudesse ter sido aceita 
sem discussão (CULLER, 1999, p.14). 
 
Considerando esse pensamento do autor, percebe-se que ele olha para a teoria 
como uma ferramenta de reformulação do conhecimento popular, um veículo de 
ascensão de reflexões que se considera indiscutível e aceite como eficiente 
superficialmente. 
 
1.2 Crítica 
 
Segundo Coutinho (s/d, p.136), o termo “crítica” origina-se do grego designando 
“a ação de julgar; discriminar, encerra em si a noção de “avaliação”. Wellek e Warren 
(1966), porém, compreendem: 
 
a palavra “crítica” em termos largos para significar não só os juízos sobre 
livros e autores, individualmente considerados, a crítica “de juízo”, a crítica 
prática, demonstrações de gosto literário, mas também e principalmente o 
que se tem pensado a respeito dos princípios e da Teoria da Literatura, da 
sua natureza, criação, função, efeitos e relações com as outras actividades 
do homem, os seus géneros, artifícios e técnicas, as suas origens e a sua 
história. (WELLEK E WARREN, 1966, p.48) 
 
Todavia, se olharmos para os postulados referidos, pode-se entender, que o 
autor chama atenção quanto à aplicabilidade ou uso do termo crítica no seu sentido 
reduzido, tornando-o amplo a todos os âmbitos, derivando da sua gênese, função, 
efeitos e as relações que mantém com as atividades intelectuais do homem, mas 
também se leve em consideração a natureza e a história do termo, no campo do seu 
uso. 
Atkins (1934), por outro lado, entende que o conceito de crítica é apresentado 
como “uma atividade de tipo multifacetado; podendo consistir em teorizar ou julgar, 
legislar ou apreciar”. Fazendo uma consideração do texto exposto, se pode perceber 
que o autor considera a crítica como um conceito cujas tarefas são diversas e distintas, 
podendo, todavia, ser usada para construir teoria ou princípios, leis ou analisar certos 
fatos ou ideias propostas. Portanto, das várias posições relacionadas sobre o termo 
crítica, consideramos, ou melhor, tomamos como satisfatória a posição de Wellek e 
Warren, visto que ela é envolvente de vários aspectos, isto é, esses autores, do ponto 
de vista hermenêutico, definem a crítica tendo em conta a origem, a história, a função, 
a natureza e a sua relação com as atividades do homem no seu dia-a-dia. 
1.3 Diferenças entre Teoria e Crítica Literárias 
 
 
Em referência aos termos teoria e crítica literárias, Wellek e Warren (1966) 
apontam que as diferenças mais importantes são as determinadas entre a teoria 
literária, o criticismo literário e a história literária. Contudo, é somente com Platão que 
surge pela primeira vez a teoria da literatura. No primeiro momento, a teoria literária 
não aparece como uma disciplina autônoma, mas vincula-se com as doutrinas morais, 
éticas, filosóficas e políticas do filósofo. Ela retrata o primeiro esforço de 
sistematização e de conceitualização de valores, que vinham sendo desenvolvidos na 
literatura grega. 
Conhecedor disso, Atkins (1934), ratifica dizendo que podemos notar em 
Górgias traços da existência de uma teoria literária já no séc. V a.C., porém, apenas 
com Platão começa-se de fato um criticismo mais filosófico, o que o transforma em o 
precursor na teoria literária. Vendo sua obra como um todo, pode-se dizer com justiça 
que com ele inicia-se a teoria literária. Ele reforça que a teoria literária antiga era como 
um tipo de crítica teórica baseada na filosofia. Contudo, Aguiar e Silva (1976), 
explicam que a teoria literária ficaria no domínio dos modelos, princípios e categorias, 
sem conexão com as obras concretas, podendo constituir-se como uma disciplina de 
especulação apriorística. 
À vista disso, ela cumpriria o papel de estabelecer os métodos para que a 
crítica analisasse os fenômenos literários. Entretanto, partindo das propostas 
apresentadas anteriormente, entende-se que o termo teoria literária, apesar de ter os 
traços da sua existência no séc. V a. C, deu início com o grande filósofo Platão, como 
fundamento de sistematização e criação de conceitos de valores, que se faziam sentir 
na literatura antiga. 
Sendo assim, a teoria literária tinha como foco os modelos, princípios e 
categorias, não relacionados as obras verdadeiramente literárias, com a finalidade de 
assumir-se como uma disciplina de reflexão, fundamentada nos princípios filosóficos 
e com o papel de estabelecer as regras de estudo dos fatos literários. Mais uma vez, 
Wellek e Warren (1966, p.48-49), voltam seus olhares para a teoria literária como “o 
estudo dos princípios, categorias e critérios da literatura, à medida que descrevem o 
criticismo literário e a história literária como forma de estudar as obras de arte 
concretas. ” 
“A teoria literária agrega um conjunto de ciências que alguns tratam por “teoria 
da literatura”, outros de “teoria literária”. Segundo Samuel (2002, p.7), a Teoria literária 
trata da “teoria que nasce da prática literária da obra, da leitura”. Ademais, a primeira 
tarefa da teoria literária equivale em saber o que é literatura. A UCB (2006, p.13) define 
teoria literária como “ciência que possibilita a análise e interpretação das camadas 
visíveis e invisíveis do texto literário”. Com efeito, a teoria literária estabelece a 
maneira como os estudos literários podem se organizar. Pode-se dizer, contudo, que 
a teoria literária instrui os estudos literários ou os estudos da literatura. 
Na visão de Oliveira (2009, p.16), teoria literária é “um discurso, ou melhor, uma 
construção discursiva da qual participam muitos agentes, entre eles se destacam os 
autores e os leitores”. No entanto, se identifica como uma sugestão de apresentação 
do feito literário. Diversos movimentos teóricos importantes buscam dar conta da 
produção literária. Portanto, é comum dizer que a teoria literária “corre atrás” da 
produção literária para compreender seus mecanismos de realização, do modo mais 
eficiente possível. 
Analisando as posições de Aguiar e Silva, UCB, Wellek e Warren e Oliviera, 
com relação ao termo em discussão, podemos perceber que existe uma ligação entre 
elas. Percebe-se uma conformidade nas ideias com relação ao conceito de teoria 
literária. Esses autores conceituam teoria literária como um meio legislativo, 
mecanismo de censura dos princípios condutores, que estabelecem critérios de 
análise de uma obra literária. 
Em contrapartida, para eles, teoria literária é um catalisador que define o que 
deve ou não ser considerado como literatura. No que se refere ao termo “crítica 
literária”, considerando a etimologia da palavra “crítica”, entendemos como crítica 
literária qualquer pensamento ou juízo de valor a respeito da literatura. Dessa forma, 
a teoria literária baseia-se no julgamento das obras concretas e por isso deve ser 
apontada como um tipo de crítica, assim como os valores literários apresentados em 
determinado poema (WELLEK, R, 2006). 
Atkins (1934) afrma que a crítica literária passa a ser, um subproduto de outras 
atividades intelectuais, como a filosofia, a retórica e a gramática. Adepto à essa ideia, 
Samuel (2002), diz que a teoria literária toma como base um tipo de atividade 
intelectual chamada crítica literária. Enquanto Welleke Warren (1966, p.41) afirmam 
que a crítica literária “ora é entendida como uma atividade generalizante, capaz de 
incluir, sob a sua denominação, diversas formas de pensar a literatura, ora é entendida 
como uma atividade restrita ao estudo particular das obras concretas de literatura” 
Schwarz (1998) mencionado por Holanda (2012, p.9) sustenta que “a crítica 
literária pode oferecer um espaço correspondente ao da criação – uma prática de 
liberdade. Ela é a reassociação imaginante dos recursos de linguagem; de e sobre um 
dado autor.” Holanda (2012, p.5) entende que a crítica literária “não é nenhuma liturgia 
que necessite de um espaço consagrado para validar-se.Há crítica onde há uma 
paixão exigente pelo texto e se adequa a forma interrogante de quem procura ver seus 
fundamentos para compreendê-lo mais.” Contudo, a crítica literária vem no sentido 
contrário desse discurso associado de valores e certezas – e aqui se configura a 
função crítica, bem como a idealiza a modernidade: Seu propósito principal é, através 
da investigação da linguagem, do jogo do imaginário, do alargamento das 
possibilidades do real, encontrar outra inteligência do acontecimento literário. 
Remunerar o sentido que está por baixo das palavras é conduzi-las a uma 
possibilidade de liberdade – responsabilidade do crítico. Além disso, a função da 
crítica literária traz a esperança de poder retificar, abrir a leitura. (Medeiros). (Não 
utilizamos os termos op cit ou ibi . Por favor, colocar os nomes dos autores) 
Medeiros (2015, p.15-16) apontando Schlegel requer que a crítica literária 
auxilie a obra de arte a conceder a possibilidade de autocrítica, de reflexão, de 
aperfeiçoamento e crescimento espirituais, uma vez que, segundo o filósofo da 
doutrina-da-ciência, “a liberdade não significa mais do que tornar-se consciente de si 
mesmo”. 
A crítica literária, que observa a literatura em sua dimensão estética e histórica, 
busca apoiar a atividade do crítico de literatura com critérios universais, apontando a 
necessidade de se encontrar três elementos na obra de arte literária: a impressão 
absoluta, o ideal individual da obra e a tendência. Por meio desses aspectos, o crítico 
busca ultrapassar a questão advinda de Kant sobre a incapacidade de um juízo de 
gosto universal sobre a arte. 
A crítica literária, no que lhe diz respeito, vê-se entreposta perante 
manifestações propriamente ligadas ao fazer artístico, principalmente, pelas ligações 
entre objetos e discursos, até então “inéditos” em busca de sistematização, como 
realiza-se sempre que a tendência se evidencia na arte ou uma nova manifestação 
artística acontece (CARVALHAL,1994). 
A cerca dessas relações envolvendo fenômenos e objetos ligados à teoria 
literária, na década de 1970, Barthes (2003), retratou que: a finalidade da crítica é 
muito diferente; não é “o mundo”, é uma narrativa, a narrativa de um outro: a crítica é 
narrativa sobre um discurso... daí transcorre que a atividade crítica deve apresentar 
duas espécies de relações: a relação dessa linguagem-objeto com o mundo e a 
relação da linguagem crítica com a linguagem do autor observado. 
Samuel (2002) aponta que a crítica literária fala do valor da obra literária, a 
aplicação das leis poéticas, a procura dos sentidos íntimos e a relação entre a 
imaginação e a verdade. Ela investiga fatos internos (personagens, estruturas), 
interpreta-os, apura seu grau de verdade, seu valor e confere fatos “externos”, como 
a história e sociedade. 
Conforme os principios acima, do entendimento analítico, a crítica literária seria, 
certamente, um comentário, uma observação, em outras palavras, uma censura de 
obras, abrangendo a retórica, com o objetivo de perceber e interpretar os fatos 
intrínsecos aos valores culturais, políticos, sociais e até morais, aprimorando os seus 
fatos externos e internos, como se refere Atkins (1934): a crítica literária é um 
subproduto de outras atividades intelectuais, como a retórica, a filosofia e a gramática. 
Nota-se, entretanto, uma dificuldade de se definir limites entre teoria e crítica 
literárias. Ainda assim, Welleke Warren (1966), embora tenham definido, de forma 
clara, os dois termos, defendem uma fusão da teoria e da prática, isto é, da teoria e 
da crítica. Assim sendo, se torna difícil evidenciar uma da outra, visto que se 
interessam nos critérios e princípios que definem a obra literária. 
Levando em consideração os conceitos de teoria e críticas literárias 
apresentados pelos diferentes autores, devemos, de certa forma, determinar uma 
diferença entre eles. Vemos então, que a diferença entre eles é o propósito, isto 
significa que, enquanto a teoria literária se empenha em formar os critérios, princípios 
e categorias das obras literárias, conforme afirma Wellek e Warren (1966, p. 48-49), a 
teoria literária é “o estudo dos princípios, categorias e critérios da literatura [..]”; a 
crítica literária investiga os fatos internos e externos das obras literárias, buscando 
trazer à superfície a sua realidade, como afirma Machado de Assis (1865) mencionado 
por Samuel (1966, p.9), “a crítica literária traz a importância da obra literária, a procura 
pelos sentidos íntimos, a eficácia das leis poéticas, a ligação entre a imaginação e a 
verdade”. Wellek e Warren (1966, p. 48) também falam que “podemos entender como 
crítica literária qualquer julgamento ou juízo de valor a respeito da literatura”. 
 
 
2. HISTÓRIA DA LITERÁRIA 
 
Refletindo a literatura como arte ou representação do belo, compreendemos 
sua beleza ao reproduzir a linguagem por meio do uso de efeito estéticos e sugestões 
reflexivas na expressão dos ideiais e da cultura relativa a um país e a uma época, 
abrangendo suas demandas sociais, históricas e politicas. Ao idealizar a literatura 
como forma de arte que expressa, ideiais, sonhos, sentimentos e fantasias por meio 
de palavras, podemos projetar sua perpetuação por discorrer de valores universais 
que ultrapassam o momento em que foram apresentados e permanecem ao longo do 
tempo. 
Quando lemos uma obra literária revivemos esses valores e os posicionamos 
no tempo presente, recordando-os e travando com eles um diálogo atemporal, onde 
as dúvidas sobre a natureza das coisas e do homem, apresentam respostas que 
trazem prazer e conforto, introduzindo-nos em um mundo no qual notamos que o 
sentido da vida tem sido buscado há muito tempo, por outras pessoas que vieram 
antes de nós (CARVALHAL, 2010). 
Reconhecer a literatura como coleção de obras que permanecem ao longo do 
tempo, auxilia para a formação cultural de modo geral e para nos ensinar sobre as 
caracteristicas que constroem a cultura e os valores de um povo ou de uma época, 
além de contribuir para o entendimento de nosso lugar no mundo e o 
autoconhecimento, pois, é através de narrativas que constatamos experiências e 
pensamentos com os quais nos identificamos ou rejeitamos, de forma que firmemos 
nosso lugar no mundo e construamos nossa identidade, de forma crítica, mas também 
de forma prazerosa, uma vez que a leitura é também um tipo de entretenimento. 
Assim, a literatura é uma ação que reúne despertar e deleite, apresenta-nos 
faces e fatos que poderão nos evidenciar aquilo que buscamos durante toda nossa 
existência e pode nos ajudar a melhor administrar nossas escolhas e opiniões, além 
de ser considerada “recreação de alto nível” (CARVALHAL,2010). 
A satisfação que a literatura desperta está relacionado ao efeito de beleza 
criado pelo uso primoroso da linguagem e pela capacidade de entender a experiência 
de vida em vários niveis (social, político, cultural ideológico... ), que resultam na 
epifania e na catarse. 
A epifania (do grego epiphánea, que significa “aparição”, “manifestação”) é 
uma brusca sensação de entendimento da essência de algo. Esse termo ficou 
conhecido na literatura por ter sido usado por James Joyce em seu romance Retrato 
do artista quando jovem para tentar explanar os efeitos da linguagem. É também 
usado no sentido filosófico para expressar que alguém finalmente conseguiu entender 
todos os sinais e atingiu o conceito completo; é quando um pensamento único, 
iluminado e inspirado acontece, aparentando ter uma força divina, quase sobrenatural. 
Já a catarse tem um poder purificador e arrebatador. Quando observamos a 
história da literatura, percebemos que vários temas são usual e buscam responder a 
inquietações próprias de cada período, mas que, de forma Hegeliana, repetem-se ao 
longo do tempo, estabelecendo um diálogo atemporal, sendo que os próprios autores 
não predizem, no momento em que escrevem,o alcance que sua obra chegaria. 
Mikhail Bakhtin (2003), filósofo e linguista russo, afirma que: 
 
 
As obras dissolvem as fronteiras da sua época, vivem nos séculos, isto é, no 
grande tempo, e além disso levam frequentemente (as grandes obras, 
sempre) uma vida mais intensiva e plena que em sua atualidade. (BAKHTIN, 
2003, p.362). 
 
Shakespeare, por exemplo, não sabia em seu tempo, que se tornaria o que é 
hoje e que as leituras e interpretações de sua obra se renovariam a cada época. 
 
2.1 O Grande Tempo 
 
 
O estudo da história da literatura permite a visualização de um panorama de 
idéias que já foram pensadas e de fatos que já ocorreram, além da identificação de 
personagens impares que afirmam a peculiaridade de cada ser humano. A experiência 
literária torna-se arte e prazer porque esses elementos, ideias, fatos e personagens 
são narrados em uma linguagem única, que explora sons e sentidos por meio de 
palavras que cantam, contam e encantam (COUTINHO,2013). 
A literatura que resiste ao tempo é a que está registrada na forma escrita. 
Entretanto, as primeiras histórias foram repassadas oralmente e assim permaneceram 
durante muito tempo, tornando mais clara a dimensão e a abstração do que é o grande 
tempo na perspectiva bakhtiniana. Não sabemos exatamente quando elas surgiram, 
mas estudos arqueológicos têm ajudado a reconstruir esse percurso. 
Nos próprios materiais descobertos (tabuletas em argila, óstracos, papiros e 
pergaminhos) com inscrições em línguas primitivas, como a escrita cuneiforme ou os 
hiéroglifos egípcios, há indícios de que as histórias narradas são muito mais antigas 
do que os objetos encontrados. Essas descobertas indicam que as primeiras histórias 
já eram contadas / cantadas havia rimas e ritmo para facilitar a memorização há muito 
tempo, desde o período Neolítico, bem antes do surgimento da escrita, que ocorreu 
na idade do bronze. 
Possivelmente, mais anteriormente ainda, no período Paleolítico, os primeiros 
registros de narrativas seriam as inscrições em pintura rupestre, que reproduziam, nas 
paredes das cavernas, histórias de calçadas ou outras aventuras, além de 
representações de manifestações religiosas. Como pode-se ver abaixo, na figura 1. 
 
Figura 1 – Figura Rupestre nos Abrigos na Rocha de Bhimbetka, India. 
Fonte: Luis Pellegrini, 2018. 
 
 
As primeiras narrativas têm muitos aspectos em comum, temas recorrentes 
(mitos sobre a criação do mundo e dos homens, medo da morte e desejo de viver 
eternamente, entre outros); meios para auxiliar a memória (frases repetidas, 
“fórmulas”, rimas); tradição oral transmitida de gerações para gerações ao longo de 
séculos, etc. (COMPAGNON, 2006). 
 
2.1.1 As primeiras narrativas 
 
A narrativa, ponto de partida da literatura, já era empregada no inicio do que 
podemos chamar de humanidade, quando o homem primitivo vivia em tribos nômades, 
à mercê das forças da natureza, a qual ele tentava compreender e controlar. Suas 
primeiras formas de compreensão estavam baseadas no mito e na religiosidade, 
precisando, dessa forma, evocar os deuses para obter deles favores e proteção. 
Para se aproximar dos deuses, o homem primitivo criou rituais sagrados e os 
executava acompanhados de rezas ou evocações, lendas e cantigas, que eram 
transmitidas oralmente ao longo das gerações. Assim, as primeiras narrativas 
conhecidas são os registros escritos tardiamente de composições que vieram da 
antiga tradição oral. Vamos retomar essas primeiras obras em ordem cronológica, 
embora as datas de composição dos textos sejam aproximadas por não haver meios 
de comprová-las (COUTINHO,2013). 
Ainda que a maior parte das primeiras narrativas tenha sido perdida, algumas 
culturas deixaram rastros de suas “produções textuais”, como as gravações em tábuas 
de argila quebradas na civilização assírio-babilônica, os rolos de papiro na egípcia e 
as cascas e folhas que se perderam na indiana. Na Babilônia produziu-se o primeiro 
compêndio de leis do qual tomamos conhecimento (o código de Hamurabi) e dois 
poemas épicos: a Epopeia de Gilgamesh e o Enuma Elish, que reverberaram em 
locais e tempos muito remotos, especialmente entre os judeus, na época em que 
foram exilados de Judá, deportados pelo rei Nabucodonosor; é por isso que 
encontramos intersecções entre as narrativas dessas civilizações. 
Da Índia temos o Rigveda, uma longa coleção de hinos curtos dedicada 
principalmente a louvar os deuses. O Egito, por sua vez, inspirou gregos e romanos e 
deixou como primeiro legado o livro dos mortos. Da cultura hebraica, com os primeiros 
manuscritos, veio uma importante herança literária para o Ocidente, o Pentateuco, que 
faz parte do Antigo Testamento da Biblia.Essa obra influenciou profundamente a 
consciência ocidental ao ser trazida para as línguas vernáculas e para o latim. Vamos 
analisar brevemente cada um desses textos, considerando sua estrutura, linguagem 
e conteúdo temático (AUERBACH,1987). 
Analisando essas obras consideradas como inaugurais, um dos temas centrais, 
que preocupava os primeiros pensadores ou artistas, era de compreender a criação 
do mundo ou saber quem somos nós e de onde viemos. Sendo assim, as primeiras 
narrativas tinham como tema a criação do mundo e eram textos lonos, possivelmente 
escritos em versos como falamos anteriormente para contribuir com a memorização, 
em uma época anterior à criação da escrita, em que se reproduziam histórias orais e 
misturavam homens e deuses. Alguns tinham o papel de determinar o contato com a 
divindade através de cânticos, hinos e rituais, fortalecendo uma visão mítica do 
mundo, ou uma cosmogonia, pois os deuses eram os responsáveis e a eles 
deveríamos temer, respeitar e implorar por proteção. 
Outros assuntos arquetípicos percorriam essas narrativas, originados dos 
quatro elementos da natureza considerados como primordiais: o fogo (luz, 
representada pelo sol), a terra (fertilidade), a água (purificação) e o ar (vento que traz 
as mudanças). Havia também informações de aventuras, como a separação da figura 
humana da divina, tornando aquela mais autônoma, mas ainda dependente dos 
deuses, que propiciava o momento de construção do herói (salvador, messias, etc), 
cujo dever era superar obstáculos e passar pelos processos de purificação e 
ascensão, vencendo até a morte. Outro assunto comum é a capacidade do homem 
de dar nomes às coisas, que comprova, no contexto literário, o poder criador da 
palavra (AUERBACH, 1987). 
Tradicionalmente atribui-se a A Epopeia de Gilgamesh o símbolo inicial da 
literatura por ser o mais antigo “texto” encontrado. Como pode-se ver abaixo, na figura 
2. 
 
Figura 2 – Tabuleta de A Epopeia de Gilgamesh. 
Fonte:Robertson Frizero, 2021 
Na verdade, ele é uma inscrição em tabuletas de argila com escrita cuneiforme, 
escrito aproximadamente no ano de 2750 a. C, composta por 12 cantos com cerca de 
300 versos em cada. Conta as aventuras de Gilgamesh (cujo nome significa “o velho 
que rejuvenesce”), o mais ilustre rei da Suméria, responsável pela manutenção do seu 
reino e, graças à suas conquistas materiais e espirituais, considerado um herói e um 
deus. 
Gilgamesh era visto como um semideus, apresentado como dois terços deus e 
um terço humano, provido, portanto, de força sobre-humana, o que explicaria sua 
grandeza. Viveu muitas experiências até encontrar o sábio Ut-napishtim, que 
sobreviveu ao dilúvio e recebeu dos deuses o dom da imortalidade, também desejado 
por ele (AUERBACH,1987). 
O sábio lhe disse que a morte era uma realidade incontornável, a menos que 
passasse em um teste, o qual consistia em ficar acordado durante seis dias e sete 
noites.Gilgamesh não conseguiu superar a prova e voltou para sua terra, mantendo 
sua condição de mortal. Quando estava de partida, Ut-napishtim revelou-lhe o segredo 
a respeito de uma planta que vivia no fundo do oceano e que devolvia a juventude a 
quem se ferisse nos seus espinhos.Gilgamesh desceu ao fundo do oceano, colheu a planta e, temeroso de seus 
efeitos, guardou-a para experimentar seus poderes num velho de sua cidade; a planta, 
contudo, lhe foi roubada por uma serpente durante o regresso. Cansado, finalmente 
chegou a Uruk e reviveu as grandes muralhas que construiu, sua maior obra. As ruínas 
de Uruk situam-se no ao sul do atual Iraque. 
Encontramos no conteúdo de A Epopeia de Gilgamesh, muitas semelhanças 
com o texto da Bíblia judaíco-cristã, não apenas pela alusão ao dilúvio e pela menção 
arquetípica à água, mas também por outras passagens, como: 
- O número de dias do teste a que foi submetido Gilgamesh, que coincide com 
o tempo que Deus levou para criar o mundo e a planta roubada por uma serpente, o 
mesmo animal que incitou Eva e fez com que ela e Adão fossem castigados. Esses 
dois exemplos, são do primeiro diálogo no grande tempo. 
Observemos, por exemplo, a passagem de A Epopeia de Gilgamesh que trata 
da história do dilúviu: 
 
 
 
O vedismo, a mais antiga religião da Índia, reunia seus hinos em quatro 
coleções sagradas (Rigveda, Yajurveda, Samaveda e Atharvaveda), entre elas, o 
Rigveda é a mais importante. Pode-se ver abaixo, na figura 3, um exemplo da Rigveda: 
 
Figura 3 – Reprodução em sãnscrito do Rigveda. 
Fonte: Alamy Foto Stock, 2010. 
 
 
Conforme O livro das religiões (2014), os Brâmanas (instruções sobre os rituais 
védicos), os Aranyakas (com discussões sobre meditação) e os Upanishads (com 
interpretações filosóficas), fazem parte do Rigveda. Os hinos sagrados são parte da 
 
Oh, homem de Shuruppak, filho de Ubara-Tutu, põe abaixo tua casa e constrói um 
barco. Abandona tuas posses e busca tua vida preservar; despreza os bens 
materiais e busca tua alma salvar. Põe abaixo tua casa, eu te digo, e constrói um 
barco. Eis as medidas da embarcação que deverás construir: que a boca extrema 
da nave tenha o mesmo tamanho que seu comprimento, que seu convés seja 
coberto, tal como a abóboda celeste cobre o abismo; leva então para o barco a 
semente de todas as criaturas vivas. (A Epopeia... 2001) 
literatura hindu, que tinha o objetivo de ser ouvida por sacerdotes e estudiosos no 
processo de revelação da verdade canônica, transmitida pela tradição oral durante 
cerca de mil anos, desde o tempo da sua criação até a sua redação, que ocorreu entre 
1700 a.C e 1100 a. C. (NITRINI,2000) 
Alguns deuses e deusas mencionados no Rigveda são arquetípicos e podem 
ser encontrados em outras crenças, que são baseadas na religião protoindo-europeia: 
 
• Dyaus Pita, que seria o “deus pai”, semelhante ao Júpiter latino e ao nórdito 
Tyr e ao Zeus grego; 
• Ushas, a deusa do amanhecer, correspondente à Aurora latina e Eos grega; 
• Agni, o fogo sacrifical, pode ser relacionado ao ogon russo e ignis latino, 
ambos significando “fogo”. Como vemos há também um diálogo no grande 
tempo. 
 
O livro dos mortos é uma antiguidade egípcia, com o objetivo de guiar os mortos 
para o além, através de orações e rituais. O livro, feito em rolos de papiro, era colocado 
nos sárcofagos, para que as almas pudessem consultá-lo, nos momentos de 
dificuldades diante dos deuses. Originalmente era chamado de “Livro de sair para a 
Luz”, e foi escrito aproximadamente em 1600 a.C. As versões mais refinadas do livro 
dos mortos traziam ricos ornamentos tipográficos, conhecidos como vinhetas, como a 
ilustrada na figura 4. 
 
Figura 4 – Livro dos mortos no papiro de Ani 
Fonte: Vinicius Cabral, 2018. 
As edições mais sofisticadas do Livro dos Mortos apresentam cerca de 200 
“capítulos”, nome que os egiptólogos dão às fórmulas encontradas nos papiros 
preservados ao longo dos séculos. O papiro de Ani (figura 4) é o mais conhecido, tem 
24 m e se encontra atualmente no British Museum, em Londres. Na verdade, não de 
acordo com seu conceito atual, não se trata de um “livro”, que presume a existência 
de um autor que propositalmente escreve um texto com um começo, meio e fim. Ao 
invés disso, os textos que fazem parte do que hoje entendemos por Livro dos mortos, 
não foram escritos por um único autor, tampouco são todos da mesma época histórica; 
certamente foram todos compilados (COMPAGNON,2006). 
Dentro do nosso diálogo no grande tempo, podemos ver que, a idéia de 
julgamento final também é encontrada na Bíblia. Em várias passagens, mas, 
principalmente no livro do Apocalipse, que compõe o Novo Testamento, parte que 
narra os acontecimentos depois da vinda de Jesus Cristo: 
 
 
 
 
 
O Enuma Elish (“canto do alto”), mito de criação babilônico, é composto por 
sete cantos gravados em sete tábuas de argila com cerca de 1.100 versos. Apesar de 
a composição do texto referir-se, provavelmente, a Idade do Bronze, nos tempos de 
Hamurabi [ca. 1810 a.C. – 1750 a.C], considerou-se a data de 1.100 a.C como a data 
de seu surgimento, fruto de compilações sacerdóticas babilônicas que concederam a 
Marduque (deus protetor da Babilônia) o papel de protagonista e levantaram a ideia 
de que os homens foram criados para servirem aos deuses (COMPAGNON, 2006). 
A obra se estrutura em torno de cinco temas: a origem dos deuses; o mito de 
Eva e Apsu; o mito de Tiamat; o mito de criação humana; e o hino a Marduque. Na 
primeira tábua, é narrada a criação dos deuses feita por Apsu, o deus primevo das 
 
Depois vi um grande trono branco e aquele que está sentado nele. A terra e o céu 
fugiram da sua presença e não foram vistos mais.Vi também os mortos, tanto os 
importantes quanto os humildes, que estavam de pé diante do trono.Foram abertos 
livros, e também foi aberto outro livro, o Livro da Vida. Os mortos foram julgados de 
acordo com o que cada um havia feito, conforme estava escrito nos livros. (Bíblia. 
Apocalipse,2011,20:n-13, gripo nosso). 
águas doces, e Tiamat, a deusa do mar. Ambos se arrependem desse ato, mas os 
novos deuses, liderados por Ea (que posteriormente se tornou o deus das águas 
doces), defendem-se matando Apsu e atacando Tiamat, que cria um exército de 
monstros para contra-atacar. Nas tábuas seguintes, há o relato do nascimento de 
Marduque, filho de Ea, que passa por provações para poder convencer o conselho 
dos deuses de sua capacidade de luta. 
Ao ser nomeado rei, Marduque tem a permissão para lutar e então mata Tiamat, 
dividindo o corpo da deusa: uma metade é utilizada para criar a terra e a outra para 
criar o céu. Marduque é responsável por definir as atribuições a serem realizadas 
pelos outros deuses e, criar os dias, os meses e as estações do ano. Produz também 
os homens a partir do sangue de Kingu, principal ajudante de Tiamat, e oferece-os 
como criados aos deuses. Em retribuição, estes constroem um palácio par Marduque 
na Babilônia e consagram-no como rei, dando-lhe o poder sobre todas as coisas 
(WELLEK, 2013). 
Há várias semelhanças entre a história da criação contada pelo Enuma Elish e 
pela Bíblia no livro dos Gêneses, como a ordem em que ocorreu a criação de todas 
as coisas, começando na luz e terminando no homem; a força da palavra e sua 
capacidade criadora; e a divisão do mundo entre o céu e a terra. Há diferenças 
também, evidentemente, mas são as semelhanças que inquietam os estudiosos, 
fazendo-os concluir que ambos os relatos tiveram a mesma origem ou que talvez, um 
seja derivado do outro. 
Como vimos, é no livro do Genesis que se encontram as principais e maiores 
semelhanças com as outras narrativas da criação, mas também podemos ver, 
principalmente no livro de Deuteronômio, a necessidade da constituição de leis e 
regras que conduzam o homem a serviço de Deus. Assim, embora esses textos não 
sejam propriamente literários na concepção atual, eles abordam aspectos prototípicos 
da literatura, isto é, modos de utilizar a palavra para exprimir o inefável, aquilo que 
não pode ser dito, mas que o é por meio de metáforas e símbolos. 
O texto lido, ou mesmo repetido oralmente, tem a função de preparar o homem 
para uma transformaçãoe, nos tempos primitivos, a transformação mais evidente era 
a que preparava a passagem da vida para a morte; isso talvez explique o compromisso 
humano com o divino. Antes de passarmos ao estudo dos textos propriamente 
literários, desvinculados da religião e com formatos mais bem definidos: os gêneros 
literários (WELLEK,2013). 
 
 
3 GÊNEROS LITERÁRIOS 
 
A divisão literária em diferentes gêneros teve origem na Grécia Antiga com os 
conhecidos filósofos Platão e Aristóteles. Platão é o primeiro a tratar a questão da 
mimese, ou seja, da imitação nas obras poéticas, o que é aprofundado posteriormente 
pelo seu aluno Aristóteles, na memorável Poética. Aristóteles desenvolve, nessa obra, 
um tratado sobre as formas de imitação da natureza e do mundo pelos poetas, 
ilustrando as características que as diferentes formas de imitação assumem na poesia 
épica e na dramática. Especificamente, a lírica, não é tratada, de forma que só se 
fortalece como parte dos três gêneros, durante o Renascimento, quando há uma 
valorização desse tipo de poesia. 
O texto de Aristóteles é reconstruído por Rosenfeld (1985) com propósito de 
visualizar os sinais da caracterização do que hoje conhecemos como gênero lírico. 
Ele compreende três maneiras de narrativa, em Poética: 
 
✓ a ligada ao épico, que conta com a ajuda de terceiros para narrar; 
✓ a dramática, em que as próprias personagens estão em ação, sem a 
necessidade de narração; 
✓ uma terceira, na qual “se insinua a própria pessoa [do autor], sem que 
intervenha outra personagem” (ROSENFELD, 1985), relacionada à lírica. 
 
 
3.1 Épico 
 
O gênero épico compreende os poemas narrativos extensos, que tem como 
principal característica, a presença de um herói responsável por feitos admiráveis 
sobre os quais tratará a obra literária. Sendo assim, a epopeia seria uma das artes da 
imitação que, juntamente com a tragédia, retrata assuntos sérios e reproduz os 
homens melhores do que de fato eles são. Para distinguir a epopeia da tragédia, 
Aristóteles apresenta algumas diferenças entre essas formas literárias. Uma das 
diferenças apresentadas é a dimensão do poema épico, que não teria a sua duração 
limitada como a tragédia. 
Segundo Rosenfeld (1985), o poema épico apresenta um mundo imaginário de 
modo objetivo. Ele não se preocupa em manifestar as emoções do poeta, mas retrata 
os estados de alma das personagens que constitui os seus poemas. Ao mesmo tempo 
em que retrata o destino das personagens, o narrador está sempre presente através 
da sua narrativa, oferecendo a palavra aos personagens através da sua própria voz. 
Sendo assim, há certo distanciamento entre o narrador e o mundo que ele narra. Outra 
característica importante do poema épico é a valorização de um herói. 
O combate histórico é apenas o cenário para o desenvolvimento do herói, que 
enfrenta perigos e jornadas extraordinárias. Contudo, o objetivo dos poemas épicos 
não é o herói enquanto expressão da sua própria personalidade ou individualidade, 
mas sim da sua identidade pátria. Apresentaremos a seguir um exemplo de poema 
épico clássico (Homero): 
 
 
 
Podemos perceber que, em fins do século XVI, a epopeia como gênero puro 
nega, em detrimento de novas formas de narrativas, derivadas dos próprios poemas 
épicos, porém, que passam a ser escritas em prosa. Assim, surgem, então, os gêneros 
narrativos modernos, o romance, o conto e as novelas, que apresentaremos de forma 
mais detalhada posteriormente. 
 
3.2 Lírico 
 
O nascimento da lírica baseia-se na tradição oral dos poemas cantados, 
normalmente acompanhados por um instrumento denominado lira, que motiva a 
denominação desse gênero (ABAURRE; PONTARA, 2005). No século XV, com o 
surgimento da imprensa, ocorre a separação entre a música e a escrita da poesia, 
uma vez que há uma inversão da predominância da cultura oral pela cultura escrita. É 
somente a partir do Renascimento italiano, segundo Abaurre e Pontara (2005), que a 
poesia de característica subjetiva ganha reconhecimento correspondente aos gêneros 
épico e dramático. 
 
Musa, reconta-me os feitos do herói astucioso que muito peregrinou, 
dês que esfez as muralhas sagradas de Tróia; 
muitas cidades dos homens viajou, conheceu seus costumes, 
como no mar padeceu sofrimentos inúmeros na alma, 
para que a vida salvasse e a de seus companheiros a volta. (HOMERO, 1997). 
Segundo Rosenfeld (1985), o gênero lírico pode ser definido como o mais 
subjetivo dos três, uma vez que a sua principal característica é a presença de uma 
voz central que transpõe no poema a expressão de um estado da alma, as suas 
emoções e também as suas reflexões sobre o ser humano e o mundo. Dessa forma, 
a poesia lírica tem como ponto de partida a manifestação verbal das emoções e dos 
sentimentos do eu lírico. Com esse objetivo, o mundo, a natureza e as outras 
personagens que por acaso apareçam nesse tipo de poema são evocados apenas 
para ressaltar os sentimentos do eu lírico. 
Rosenfeld (1985, p. 23) afirma que “a bem-amada, recordada pelo eu lírico, não 
se constituirá em personagem nítida de quem se narrem as ações e enredos; será 
nomeada para que se manifeste a alegria, a dor ou a saudade da voz central”. No que 
se refere às características formais da lírica, Rosenfeld indica a curta extensão como 
uma característica fundamental estilística. Visto que não narra acontecimentos, mas 
sim emoções, a poesia lírica não é extensa como o poema épico, senão instantânea, 
como a metamorfose dos sentimentos e das sensações humanas. Apresentam-se 
outras duas características estilísticas que são: a musicalidade e o ritmo das palavras, 
em consequência dos versos. Essas características se destacam de tal maneira que, 
por vezes, são priorizados em prejuízo do sentido, de forma que o poeta se atém antes 
à sonoridade do poema que ao seu conteúdo. 
Segundo Abaurre e Pontara (2005, p.42), o ritmo se define como “um 
movimento regular, repetitivo” que se marca na poesia pelo revezamento entre pausas 
e acentos (sílabas tônicas e átonas). Quando o esquema rítmico contém o mesmo 
número de sílabas, os versos são classificados como regulares; quando possui 
números diferentes, são irregulares. 
Embora não seja obrigatório, para a construção da musicalidade, é considerado 
como fator importante, a rima, que pode ser determinada como “a coincidência ou a 
semelhança de sons a partir da última vogal tônica dos versos” (ABAURRE; 
PONTARA, 2005, p.43). Além disso, a poesia lírica, ao contrário do que ocorre no 
poema épico, as ações não são estabelecidas nem no tempo, nem no espaço. Aponta- 
se uma ausência de distância que o passado taria e prevalece a voz do presente, 
tendo a ideia de que a poesia trata sempre um momento eterno. 
Rosenfeld (1985, p.23-24) traz um exemplo importante para o entendimento da 
temporalidade do gênero lírico: 
 
 
Apavorado acordo, em treva: O tempo verbal, que não remete 
necessariamente ao passado, pode representar tanto uma situação presente 
quanto uma recordação que permanece, que não se restringe ao passado. 
Do contrário, a construção seria acordei. É essa construção que causa a 
impressão de um momento eterno, que tanto pode falar do hoje quanto de 
outro momento que ainda se faz presente; portanto, um momento eterno. 
 
 
3.3 Dramático 
 
Aristóteles inspirou-se no drama grego da época, para propor os seus estudos 
sobre esse gênero e definir alguns princípios do que seria o texto dramático por 
excelência. Dessa forma, a tragédia estaria mais minunciosamente proposta por 
Aristóteles que a comédia. Aristóteles recomenda a tragédia como sendo a imitação 
de homens, retratando-os melhores do que de fato o são, através de personagens em 
ação. Para ele, a ação deveria acontecer de forma centralizada em um espaço-tempo 
máximo de 24 horas, isto é, retratando episódios breves. Esses episódios 
apresentariam o desenvolvimento de uma história já iniciada, enfocando o clímaxe o 
desenlace dos conflitos apresentados. 
Conforme Aristóteles (2003) a tragédia é a imitação de uma ação completa e 
importante, de certa extensão; compõe um estilo tornado agradável pelo emprego 
separado de cada uma de suas formas; na tragédia, a ação não é apresentada com a 
ajuda de uma narrativa, mas por atores. Provocando a compaixão e o terror, a tragédia 
tem por consequência obter a purgação dessas emoções. 
Com relação aos gêneros épico e lírico, uma das principais diferenças do texto 
dramático é a forma como é narrado, ou seja, como não é narrado, já que o narrador 
é desnecessário nesse formato literário, uma vez que, os acontecimentos se dão por 
meio das falas e das ações das personagens (ROSENFELD, 1985). 
A teoria teatral estabelece algumas hipóteses diferentes para o texto dramático. 
Conforme Magaldi (1991), até o início do século XX, aproximadamente, o texto teatral 
era conhecido como parte essencial do drama, apresentando-se sublime frente à 
encenação. Não se considerava teatro sem obra dramática. 
A partir do século XX, há um enfraquecimento do chamado textocentrismo, uma 
vez que o espetáculo teatral passa a ser possível e reconhecido ainda que sem texto. 
Cresce, então, a arte da encenação, apresentando encenador e autor (dramaturgo) 
lado a lado. 
Cada dramaturgo da nossa época adota um estilo diferente, assim como cada 
encenador, diretor ou ator podem adequar esses estilos ao seu, atribuindo um caráter 
mais amplo e um repertório variado ao teatro. 
Magaldi (1991) diz que é necessário entendermos o teatro como uma tríade 
com três elementos essenciais, sem os quais, ela não funciona: ator, texto e público. 
Ao acreditar que esses elementos são essenciais, podemos considerar a existência 
de outros, como o gesto, a interpretação, o cenário, o espaço cênico, o figurino e a 
iluminação, por exemplo. 
 
3.3 Gêneros literários atuais: poesia, romance e ensaio 
 
 
Até agora já aprendemos, a classificação em gêneros literários que corresponde 
aos modelos clássicos da realidade grega antiga. Porém, no mundo contemporâneo, 
existem outras divisões praticáveis para os textos literários. Martins declara que um a 
sociedade grega, gerou a poesia épica, enquanto a sociedade contemporânea gerou 
o romance. Sendo assim, o autor apresenta, com Lukács (2000), que um gênero 
literário não é “meramente o resultado da inventividade de autores ou de uma 
evolução isolada da forma, mas de um produto, um resultado de maneiras sociais de 
produção e de consumo de um determinado momento histórico” (MARTINS, 2012, p. 
248) No mundo contemporâneo, convivem e sobrepõem-se as formas líricas, 
narrativas e dramáticas, dando origem a gêneros como o conto, o ensaio, o romance 
e vários outros que deles se originam. Diante desse breve cenário, vamos analisar 
alguns dos principais gêneros que circulam nos nossos dias. 
 
3.4.1 - Lírica moderna 
 
 
Friedrich, em sua obra Estrutura da lírica moderna, mostra os caminhos que a 
lírica percorre ao longo dos séculos XIX e XX. Segundo o autor, a lírica moderna 
atende a um objetivo comum às artes em geral: a dissonância, ou seja, a junção entre 
a incompreensibilidade e o fascínio, que gera uma tensão no leitor. Ele nos mostra 
que essa tensão se revela na lírica moderna tanto na forma quanto no conteúdo. Na 
forma, há uma familiaridade de características “de origem arcaica, mítica e oculta com 
uma intensa intelectualidade” (FRIEDRICH, 1978, p.16), à medida em que se 
misturam a simplicidade da forma escrita e a complexidade dos seus conteúdos. 
Friedrich aponta outro ponto importante que é a expressão do eu do poeta, que até 
meados do século XIX era indispensável na poesia e passa a não ser mais uma 
característica fundamental. 
O poeta faz parte dos seus poemas como artista, constantemente refletindo 
sobre o próprio poema. Na lírica moderna, a língua, é vista como uma experiência na 
qual o vocabulário e a sintaxe atribuem novas significações e formas. As figuras de 
linguagem, a comparação e a metáfora, “são aplicadas de uma maneira nova, evitando 
o termo de comparação natural e obriga uma união irreal daquilo que logicamente e 
real, é inconciliável” (FRIEDRICH, 1978). O conceito de belo, esteticamente, é 
discutido e repensado, o que se reflete no grotesco. 
Então, podemos dizer que o que acontece na lírica moderna é um conjunto de 
inovações relacionados à poesia clássica que prevalecia até o momento. Ela 
manifesta as transformações sociais que causam conflitos no homem moderno, por 
vezes impactando o leitor, levando-o a pensar e questionar as tradições. No Brasil os 
poemas de Carlos Drummond de Andrade, além de Baudelaire e Pessoa, são bons 
exemplos das inovações relativas à lírica moderna. Veja a seguir o exemplo, do poema 
Mãos dadas de Andrade (2000): 
 
 
Não serei o poeta de um mundo caduco. 
Também não cantarei o mundo futuro. 
Estou preso à vida e olho meus companheiros. 
Estão taciturnos, mas nutrem grandes esperanças. 
Entre eles, considero a enorme realidade. 
O presente é tão grande, não nos afastemos. 
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas. 
Não serei o cantor de uma mulher, de uma história, 
não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista pela janela, 
não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida, 
não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins. 
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes. 
a vida presente. 
Segundo Pereira (2012), o poema acima é um excelente exemplo da disputa 
entre a tradição e a inovação presente na lírica do século XX. O eu lírico se discute na 
tensão entre o “mundo caduco”, ao qual não quer ser relacionado, e o mundo futuro, 
mas evidencia a sua filiação ao “tempo presente”. 
O poema refuta os conteúdos sentimentais ao manifestar que não dirá “suspiros 
ao anoitecer”, em uma tensão entre desprezar a tradição lírica de fundo subjetivo 
enquanto menciona ela, como nos trechos finais: “não distribuirei cartas de suicidas”, 
“nem serei raptado por serafins”. 
 
3.4.2 - Romance 
 
 
Com a necessidade do mundo moderno de traduzir a sociedade por meio de 
uma forma literária que correspondesse ao momento histórico, surge o Romance. 
Lukács (2000, p.59) faz uma comparação entre a epopeia e o romance: “O romance 
é a epopeia de uma era em que a totalidade ampla da vida não é mais dada de modo 
claro, para a qual a imanência do sentido à vida tornou-se problemática, mas que 
ainda assim tem por intenção a totalidade”. 
O romance está relacionado diretamente às Revoluções Francesa e Industrial 
e ao decorrente surgimento de novas classes sociais, como a burguesia, e apesar de 
ter surgido antes, somente em meados do século XIX foi que o Romance se 
consolidou como um gênero literário, mantendo a epopeia ao passado. Essa nova 
configuração social levou, naturalmente, ao surgimento de novas buscas, 
principalmente culturais. 
Nesse contexto, as longas narrativas, como as epopeias, estavam relacionadas 
ao clássico, que não correspondia a classe burguesa emergente. Surgem então, os 
folhetins, que eram novelas publicadas nos jornais, diariamente. Como expressão 
desse período histórico, o romance apresenta um indivíduo que, de acordo com 
Martins (2012), busca a sua essência, contudo encaminha-se para o encontro das 
estruturas sociais, pois não existe tempo para a subjetividade. Assim, “[...] o romance 
completa o homem que é alheio a esse mundo alheio à subjetividade. O romance é a 
forma que representa uma realidade interior não encontrada nas estruturas sociais 
que nos regem e que nos sufocam” (MARTINS, 2012, p.252). 
Podemos então perceber que o romance é um gênero de reflexão, que 
possibilita ao homem se descobrir. Estruturalmente, o romance também responderia 
a esses interesses do mundo contemporâneo. Em vista disso, o limite do romance 
deve ser o limite da vida do herói, uma vez que a sua trajetória tem o papel de enfocar 
umaparcela do mundo. Assim sendo, podemos diferenciar duas características 
essenciais do romance em contradizer à epopeia: o herói, que agora é um homem 
comum, dividido e que poderia representar qualquer um de nós; e o tempo, que não 
mais retrata necessariamente o passado, mas se direciona para o futuro, adotando 
certo caráter de imprevisibilidade que não se configurava na epopeia (MELLO; 
OLIVEIRA, 2013). 
Nesse sentido, também o espaço adquire outra importância: no entanto na 
epopeia a ação acontecia em um espaço reduzido, no romance o espaço excede a 
questão dimensional. Se essas são características relacionadas ao momento criador 
do romance ou, ainda, a uma relativa análise ao século XIX e ao início do século XX, 
o romance contemporâneo se transformou e se desprendeu de tais teorias. 
As ideias de espaço, tempo e a própria estrutura da narrativa têm sido 
constantemente reformuladas pelos autores. Virginia Woolf e James Joyce são 
bastante apresentados como pioneiros de uma nova forma de narrativa. Uma dessas 
inovações é o uso do fluxo de consciência, que tem em Clarice Lispector, uma forte 
representante. 
Também a prosa poética é uma forma de inovação no romance e juntamente 
com Clarice Lispector, João Guimarães Rosa e outros escritores, retratam a narrativa 
contemporânea com a ruptura do convencionalismo até então presente e um caráter 
de experimentação que segue até os dias atuais. 
 
3.4.3 - Ensaio 
 
 
Na teoria literária contemporânea, o ensaio conquista um estatuto curioso e não 
compreensível, porque esse gênero já foi bastante discutido entre os teóricos, 
chegando-se até mesmo ao ponto de manifestar que já se havia dito tudo a seu 
respeito. Portanto, o ensaio tem lugar entre o literário e o teórico. Usaremos essa 
concepção como princípio para que você entenda o que vem a seguir. 
Nesse intermédio entre literatura e teoria, podemos entender o ensaio como um 
“irmão” da literatura, ao mesmo tempo em que se distancia das formas artísticas 
por discutir conceitos e possuir uma certa “pretensão à verdade desprovida de 
aparência estética”, conforme afirma Adorno (2003, p.18). 
Carvalho (2012), defende que o ensaio é um tipo de texto que parte da 
experiência pessoal para gerar um pensamento conceitual. Assim, o autor afirma que 
no ensaio existe um exercício de espaço para a criação e liberdade, transformando o 
gênero em algo pouco científico, diferenciando, portanto, da monografia ou do artigo 
científico, por exemplo. Sendo assim, situa-se próximo ao artístico, parece sempre 
atingi-lo. De acordo com Carvalho, o ensaio é “o texto teórico que pode ser lido como 
literatura”, reforçando ainda que neste gênero a forma é tão importante quanto o 
conteúdo (CARVALHO, 2012, p.196). 
O ensaio apresenta um ponto de vista, que correspondente à perspectiva do 
autor, sobre determinado assunto, procurando discuti-lo com vistas a defender uma 
hipótese ou uma tese sobre o assunto. Ao contrário de um artigo científico, no ensaio 
não se exige a adaptação a aspectos formais. Logo, o ensaio é o desenvolver livre e 
fundamentado por um autor, sobre algum assunto. Com essa liberdade, o ensaio se 
encontra entre os gêneros chamados literários e não entre os gêneros científicos. 
 
4 FUNÇÕES DA LITERATURA 
 
Desde o princípio do seu desenvolvimento é essencial o contato do ser humano 
com a escrita, uma vez que trata-se de uma forma de comunicação fundamental à 
vida em sociedade. Produzimos textos dos mais diferentes gêneros e para diversos 
fins. Existem textos que possuem finalidade prática, ou seja, dependemos deles para 
o dia a dia, como leis, decretos, fórmulas. No entanto, há outros textos, cuja finalidade 
não tem um fim prático, mas, sim, particular, são os chamados texto de literatura. 
Cabe então, refletir quais as funções estão ligadas a um determinado tipo de 
texto que, de acordo com Eco (2003), deveria ser lido apenas por prazer ou fruição, 
não necessitando de uma justificativa para que aconteça o processo de leitura. Para 
iniciar a discussão sobre as funções do texto literário, faremos um desenho histórico, 
citando Aristóteles, em sua obra Poética (1981). O autor dá a entender, na obra 
relacionada, que há três funções literárias: cognitiva, estética e catártica. 
 
• A função cognitiva é relacionada ao conhecimento, onde o autor, através 
da sua intuição cognitiva, transmite a mensagem ao leitor por meio de 
sua obra. 
• A função estética está relacionada ao fato de entendermos a literatura 
como uma arte, isso percorre a capacidade que temos de reconhecer o 
belo, desfrutar do prazer e viver emoções. 
• A função catártica está relacionada com uma espécie de descarga de 
emoções, de que tanto o leitor quanto o escritor abrem mão para 
conquistar uma sensação de alívio e purificação diante da tensão que os 
cerca. 
 
No entanto, as funções da literatura não se limitam às citadas. Para basear-se 
de um modo mais específico, desenvolveremos a discussão com ajuda de grandes 
nomes da teoria como: Umberto Eco, Roland Barthes e Antônio Cândido. 
A literatura é caracterizada por Eco (2003), como um poder imaterial que foi 
produzido pela humanidade para fim gratia sui, ou seja, por amor de si mesma. Aqui 
encontramos, uma das grandes funções da literatura, isto é, ler por prazer, por deleite, 
ler sem obrigação, ler porque o que atrai o leitor é justamente a função estética desse 
texto, o que amplia a cultura, enaltece os saberes e enriquece o ser humano. 
 
 
[...] E entre esses poderes, arrolarei também aquele da tradição literária, ou 
seja, do complexo de textos que a humanidade produziu ou produz não para 
fins práticos (como manter registros, anotar leis e fórmulas científicas, fazer 
atas de sessões ou providenciar horários ferroviários), mas antes gratia sui, 
por amor de si mesma - e que se leem por deleite, elevação espiritual, 
ampliação dos próprios conhecimentos, talvez por puro passatempo, sem que 
ninguém nos obrigue a fazê-lo (com exceção das obrigações escolares). 
(ECO, 2003, p. 9) 
 
O autor sugere uma série de funções que a literatura tem em nossas vidas, 
tanto individuais, quanto coletivas. Segundo Eco (2003), a literatura sendo um bem 
consumido gratia sui, deveria ser uma ferramenta que provocasse significativo prazer 
ao leitor e não apresentada apenas como atividade obrigatória. Ainda assim, é preciso 
discutir de que forma o texto literário pode se incorporar às nossas vidas. A primeira 
função do texto literário destacada pelo autor é que “a literatura mantém em exercício, 
antes de tudo, a língua como patrimônio coletivo” (ECO, 2003, p.10). 
Isso acontece, de acordo com o autor, porque a língua não é exclusividade de 
uma única pessoa, mas pertence a todos, dessa maneira, faz com que através da 
língua seja exercida uma abrangente interação social, de forma que as pessoas 
conseguem se comunicar e, consequentemente, eternizam a língua como um bem 
imaterial. Outra função particular à literatura e debatida por Eco (2003), é a capacidade 
que esse texto tem de criar valores e colaborar para o exercício da sensibilidade: 
 
[...]nem eu seria idealista de pensar que às imensas multidões às quais faltam 
pão e remédios, a literatura poderia trazer alívio. Mas uma observação eu 
gostaria de fazer: aqueles desgraçados que, reunidos em bandos sem 
objetivos, matam jogando pedras de viadutos ou ateando fogo a uma menina, 
sejam eles quem forem afinal, não se transformaram no que são porque foram 
corrompidos pelo newspeak do computador (nem ao computador eles têm 
acesso), mas porque restam excluídos do universo do livro e dos lugares 
onde, através da educação e da discussão, poderiam chegar até eles os ecos 
de um mundo de valores que chega de e remete a livros (ECO, 2003 p. 12). 
 
O poder e a sensibilidade que provêm da literatura colaboram para a formação 
e o desenvolvimento do caráter humano. Para o autor, a função da literatura como um 
bem imaterialestá na eminência possível de valores para a sociedade através dos 
leitores. “Mas estes jogos não substituem a verdadeira função educativa da literatura, 
função educativa que não se reduz à transmissão de ideias morais, boas ou más que 
sejam, ou à transformação do sentido do belo” (ECO, 2003, p.20). A literatura traz em 
evidência, uma força educativa que é transmitida à sociedade e que contribui para a 
formação. 
Llosa (2009) reflete em sua obra: “Em defesa do romance”, que uma 
comunidade sem literatura escrita, sem dúvida, teria muito menos riqueza de detalhes, 
clareza comunicativa e precisão, comparada a outra comunidade que tenha tido como 
acesso principal de comunicação, os textos literários. Para o autor, uma sociedade 
que não tenha sido contagiada pela literatura sofrerá a falta da comunicação, e 
desenvolverá uma linguagem ordinária e rudimentar. Sobre isso, o autor, assim, 
manifesta: 
 
uma pessoa que não lê, ou que lê pouco, ou que lê apenas porcarias, pode 
falar muito, mas dirá sempre poucas coisas, porque para se exprimir dispõe 
de um repertório reduzido e inadequado de vocábulos. Não se trata apenas 
de um limite verbal; é, a um só tempo, um limite intelectual e de horizonte 
imaginário, uma indigência de pensamentos e de conhecimentos, porque as 
ideias, os conceitos, mediante os quais nos apropriamos da realidade e dos 
segredos da nossa condição, não existem dissociados das palavras, por meio 
das quais as reconhece e define a consciência. Aprende-se a falar com 
precisão, com profundidade, com rigor e agudeza, graças à boa literatura, e 
apenas graças a ela (LLOSA, 2009, p. 65-66). 
 
 
Nota-se então, a importância que detém a literatura quando se fala do aspecto 
formativo. A profundidade de conhecimento que o ser humano pode alcançar é 
possibilitada pela influência da literatura que, ao proporcionar uma riqueza vocabular, 
permite a superação intelectual, moral e imaginária. Não se pode perder de vista que, 
se a literatura não é um bem acessível a todos, isso se dá em um contexto de 
acentuada desigualdade social. 
Cândido (1995) sedimenta também a literatura, classificando-a como literatura 
de ricos e pobres. A estes são designadas as obras da cultura popular e do folclore, 
enquanto àqueles são destinadas as obras clássicas, eruditas: 
 
Em nossa sociedade, há fruição segundo as classes, na medida em que um 
homem do povo está praticamente privado da possibilidade de conhecer e 
aproveitar a leitura de Machado de Assis ou Mário de Andrade. Para ele, 
ficam a literatura de massa, o folclore, a sabedoria espontânea, a canção 
popular, o provérbio. Essas modalidades são importantes e nobres, mas é 
grave considerá-las como suficientes para a grande maioria que, devido à 
pobreza e à ignorância, é impedida de chegar às obras eruditas (CÂNDIDO, 
1995, p. 256-257). 
 
Vale ressaltar que, sustentar o mesmo acesso cultural a todos os indivíduos, 
independente da classe social, é uma forma significativa de possibilitar a toda 
sociedade um instrumento de emancipação e libertação. Cândido (1995) explica ainda 
que: 
 
A distinção entre cultura popular e cultura erudita não deve servir para 
justificar e manter uma separação iniqua, como se do ponto de vista cultural 
a sociedade fosse dividida em esferas incomunicáveis, dando lugar a dois 
tipos incomunicáveis de fruidores.Uma sociedade justa pressupõe o respeito 
dos direitos humanos, e a fruição da arte e da literatura em todas as 
modalidades e em todos os níveis é um direito inalienável (CÂNDIDO, 1995, 
p. 262-263). 
 
Nesse sentido, pode-se perceber do autor citado, que a literatura, por sua 
capacidade de formação humana, deve ser um direito oferecido a todos os cidadãos. 
Dessa forma o homem precisa ter a possibilidade de conhecer e a capacidade para 
ler os grandes nomes da literatura clássica, modelos que apesar do tempo são 
literatura erudita de grande valor estético e formam, hoje, com seu caráter 
humanizador, da mesma forma que há cinco décadas formavam. 
Cândido, crítico literário e estudioso da literatura, discute a importância dos 
direitos fundamentais na vida de um cidadão. Ele justifica que, se temos de lutar para 
que as classes desfavorecidas tenham garantido o direito de ter uma casa digna, 
educação, lazer, transporte público de qualidade, trabalho e muitos outros, é porque 
estamos inseridos em uma sociedade que, além de individualista, é também desigual. 
O autor faz uma ligação entre aquilo que a legislação chama de direitos 
humanos e o direito à arte e à literatura e conclui que lutar por direitos humanos 
deveria ser, não apenas garantir os bens fundamentais à integridade física, mas 
também, à integridade moral “[...] e também o direito à crença, à opinião, ao lazer e, 
por que não, à arte e à literatura” (CÂNDIDO, 1995, p. 241). Dessa forma, podemos 
fazer o seguinte questionamento: a Literatura poderia ser considerada um bem 
indispensável à sobrevivência do homem? 
Para responder, dialogamos com Cândido (1995), que afirma ser a literatura, 
essencial para a vida humana, conforme a necessidade que o homem tem de sonhar 
e viver a magia, a ficção, tudo isso acreditamos fazer parte da formação do caráter 
humano. Contudo, ainda há quem questione a importância da literatura na vida do ser 
humano. 
Cândido (1995), ao tratar dos valores propostos ou recusados pela sociedade, 
reflete: 
 
 
Por isso é que nas nossas sociedades a literatura tem sido um instrumento 
poderoso de instrução e educação, entrando nos currículos, sendo proposta 
a cada um como equipamento intelectual e afetivo. Os valores que a 
sociedade preconiza, ou os que considera prejudiciais, estão presentes nas 
diversas manifestações da ficção, da poesia e da ação dramática. A literatura 
confirma e nega, propõe e denuncia, apoia e combate, fornecendo a 
possibilidade de vivermos dialeticamente os problemas. (CÂNDIDO, 1995, 
página) 
 
Sendo assim, podemos perceber que a literatura, apesar de ser constituída por 
textos ficcionais e que não devem ser confundidos com o real, muitas vezes, traz em 
seu argumento situações relativas às nossas vidas. Essa característica aprova a 
necessidade da literatura ser garantida como um direito humano. 
A importância da literatura cresce à medida que identificamos, como Cândido 
(1995), que todo ser humano tem necessidade de, sonhar. Então, aquele que não 
passa pela literatura não conquista uma formação completa. Para o autor, não há 
ninguém que tenha passado pela experiência de uma obra literária e que não tenha 
aprendido algo. Se a literatura opera em nós tantos valores, é necessário, então, 
garantir o acesso a ela como um direito humano básico e sem restrição. O texto 
literário, por ser ficção e cheio de fantasia, tem a capacidade de cativar o leitor e 
despertar nele um mundo inimaginável, enriquecendo sua formação e estimulando 
sua capacidade criativa. 
Eco (1997), em sua obra “Obra Aberta” mostra como mais uma função da 
literatura: o fato do leitor poder interferir na formação de um texto. Isso acontece 
porque cada leitor tem uma experiência diferente diante do texto e dessa maneira, ele 
tem possibilidade de participar ativamente, através da leitura e enriquecer com seu 
olhar diferenciado, contribuindo para destacar os saberes literários e aperfeiçoar os 
significados do texto. Nesse período, surge outra importante função da literatura que 
é a fruição que leitor obtêm diante do texto. 
Faz-se necessário então, diferenciar o que é uma leitura de prazer e uma leitura 
de fruição, que segundo Barthes (2010), não são sinônimos. Nas palavras do autor: 
 
Texto de prazer: aquele que contenta, enche, dá euforia; aquele que vem da 
cultura, não rompe com ela, está ligado a uma prática confortável de leitura. 
Texto de fruição: aquele que põe em estado de perda, aquele que desconforta 
(talvez até um certo enfado), faz vacilar as bases históricas, culturais, 
psicológicas do leitor, a consistênciade seus gostos, de seus valores e de 
suas lembranças, faz entrar em crise sua relação com a linguagem 
(BARTHES, 2010, p. 20-21). 
 
 
Por meio da fruição, o leitor expande sua visão de mundo, torna-se crítico e 
assume pontos de vista múltiplos em relação à obra literária, produzindo diversos 
significados possíveis para o texto lido. E assim, o leitor, incomodado com o texto, 
busca fugir do senso comum e ler as entrelinhas, procura captar todas as diferenças 
oferecidas pelo texto como propósito fiel de esclarecer mistérios e atribuir 
significações. Tudo isso se torna possível quando o leitor consegue, diante do texto, 
o poder de fruição. 
Neitzel e Carvalho (2014) defendem que: 
 
 
A relação estética que se constrói com o texto literário vai mobilizar as 
percepções do sujeito para a apreensão dos múltiplos sentidos do texto, não 
apenas aqueles que os signos escancaram, mas também aqueles que estão 
escondidos, enviesados, marcados na linguagem, nas entrelinhas (NEITZEL 
; CARVALHO, 2014). 
 
Todavia, Eco (2003), ressalta a importância do leitor respeitar aquilo que 
caracteriza de intenção do texto, por isso afirma: 
 
[...] as obras literárias no convidam à liberdade de interpretação, pois 
propõem um discurso com muitos planos de leitura e nos colocam diante das 
ambiguidades e da linguagem da vida. Mas para poder seguir neste jogo, no 
qual cada geração lê as obras literárias de modo diverso, é preciso ser movido 
por profundo respeito para aquela que eu, alhures, chamei de intenção do 
texto (ECO, 2003, p. 12). 
 
Eco (2003) continua ressaltando as diferenças entre o texto literário e o mundo 
real, salientando os benefícios que o leitor tem a respeito das pistas deixadas pelo 
texto, em relação à interpretação, coisa que não desfrutamos no mundo real. 
 
Os textos literários não somente dizem explicitamente aquilo que nunca 
poderemos colocar em dúvida, mas, à diferença do mundo, assinalam com 
soberana autoridade aquilo que neles deve ser assumido como relevante e 
aquilo que não podemos tomar como ponto de partida para interpretações 
livres (ECO, 2003, p. 13). 
 
Sem a intenção de esgotar a temática, Eco (2013), reforça aquela que acredita 
ser a principal função implícita à literatura, que é a educação para a morte, ou seja, 
apontar que as coisas acontecem de uma forma diferente do que queremos, para que 
suportemos as frustrações e identifiquemos a ação do destino. 
A função dos contos “imodificáveis” é precisamente esta: contra qualquer 
desejo de mudar o destino, eles nos fazem tocar com os dedos a 
impossibilidade de mudá-lo. E assim fazendo, qualquer que seja a história 
que estejam contando, contam também a nossa, e por isso nós os lemos e 
os amamos. Temos necessidade de sua severa lição “repressiva”. A narrativa 
hipertextual pode nos educar para a liberdade e para a criatividade. É bom, 
mas não é tudo. Os contos “já feitos” nos ensinam também a morrer. Creio 
que esta educação ao Fado e à morte é uma das funções principais da 
literatura (ECO, 2003, p. 21). 
 
Ao cumprir a sua função, a literatura nos ensina que no mundo da fantasia e da 
imaginação, como no mundo real, estamos expostos a imprevistos e dificuldades e 
nem sempre os nossos desejos são atendidos. Lidar com os contratempos é uma 
dificuldade particular do ser humano, que deve ser encarada e transformada em 
superação. 
Quando a literatura colabora para amenizar esses obstáculos, ela ajuda 
diretamente o ser humano em suas projeções reais de vida. No entanto, ao mesmo 
tempo em que a literatura nos distancia da realidade em que vivemos, ela também 
proporciona pontos de encontro com os saberes cotidianos, os quais são consolidados 
através do aperfeiçoamento cognitivo proporcionado pelo texto literário. 
Nesse aspecto Llosa (2009) define que: 
 
 
[…] as invenções dos grandes criadores literários, ao mesmo tempo em que 
nos arrancam de nossa prisão realista, conduzem e guiam pelos mundos da 
fantasia, abrem-nos os olhos sobre aspectos desconhecidos e secretos da 
nossa condição, e nos dão os instrumentos para explorar e entender mais os 
abismos do que é humano. (LLOSA, 2009, p. 65-66). 
 
Acerca da relação da literatura com as nossas vidas e com os problemas 
cotidianos, Zilberman (2009), justifica a importância e a necessidade desse gênero 
para a formação do senso crítico no ser humano. A autora pondera que, mesmo 
usando uma grande parcela de fantasia, a literatura não deixa de ser realista porque: 
[...] pode lidar com a ficção mais exacerbada, sem perder o contato com a 
realidade, pois precisa condicionar a imaginação à ordem sintática da língua. 
Por isso, a literatura não deixa de ser realista, documentando seu 24 tempo 
de modo lúcido e crítico; mas revela-se sempre original, não esgotando as 
possibilidades de criar, pois o imaginário empurra o artista à geração de 
formas e expressões inusitadas (ZILBERMAN, 2009, p. 17). 
 
A literatura ao mesmo tempo em que se revela eficiente e criativa ao lidar com 
as práticas do dia a dia, o faz de maneira crítica, mantendo-se original, e para tanto, 
abre mão de todos os recursos que a cerca para impressionar o leitor e estimular sua 
compreensão crítica. Analisando a literatura como um mecanismo de superação de 
desigualdades e de formação humana, é apropriado pensar sobre o acesso que a 
população tem a esse bem cultural, acesso esse que, em nossa sociedade, deveria 
ser garantido pela escola. 
 
5 PERÍODOS E MOVIMENTOS DA LITERATURA 
 
 
A literatura e seu papel nas sociedades ao longo dos séculos foram se 
transformando. Era reconhecida na antiguidade como expressão oral, e mesmo nos 
primórdios da humanidade e então, passa a ser registro escrito, controlado pelas 
classes dominantes, porém, aos que não tinham acesso à leitura, ela permanecia 
como tradição oral. Foi então, a partir do século XVIII, que esse status mudou. A 
literatura começa a ser propagada para além da elite, porém a sua função passa a ser 
secundária. Ela não tem mais, naquele momento, função para o sistema econômico e 
político; não tem mais valor utilitário (SAMUEL, 2011). 
Diante de uma realidade cada vez mais tecnológica, a literatura se volta a uma 
problematização real como forma de protesto. A obra literária compreende a vida 
humana, a individualidade e retrata o caos da sociedade, da pobreza e das guerras 
que acontecem. Inicia-se o processo de revolução industrial entre o século XVII e o 
XVIII e como uma resposta a essa evolução, existem obras que lutam contra a 
organização da vida. 
A compreensão que se tem sobre a cultura também se revoluciona. 
Antigamente a filosofia, política e técnicas, se integravam de forma artística, no 
entanto, na sociedade moderna, a produção industrial produz a divisão das diversas 
áreas do conhecimento. A literatura diferencia-se das outras artes, da filosofia e da 
política. A obra literária é considerada como um produto, uma mercadoria a ser 
consumida, não se resumindo apenas a um veículo da ideologia dominante. Quando 
a literatura “ascende” como literatura, em sua significação moderna, como observa 
Michel Foucault (2000), acontece, então, uma separação entre as disciplinas. 
Para teóricos como Benedito Nunes e Niklas Luhmann, essa separação entre 
as disciplinas acontece no final do século XVIII (KORFMANN, 2002). Com a proposta 
de Niklas Luhmann, de pensamento sistêmico, percebe-se que a literatura, na “pré- 
modernidade”, se apresentava ainda incorporada em uma sociedade sedimentada e 
limitada a noções de representação ou imitação. Quando a sociedade moderna passa 
a ser composta em sistemas funcionais diferenciados e determinam, esse movimento 
permite uma definição da literatura como área autônoma, com sua linguagem própria 
(KORFMANN, 2002). 
Foucault (2000) também nota que, a literatura aparece como algo que deve ser 
abordado e pensado, pelos teóricos, manifestando seus significados e sua forma na 
cultura ocidental. À frente dessa

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