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INFECÇÕES DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL AUTOR: PEDRO V.F. MEDRADO MENINGITES - O SN desenvolve uma reação inflamatória intensa nas meninges, caracteristicamente restrita ao espaço contido no LCR (espaço subaracnóideo). - Bactérias, vírus e fungos podem provocar infecções através: · Corrente sanguínea – septicemia, metástases de infecções do pulmão e coração · Focos infecciosos – ouvido, seios paranasais e mastoide · Osteomielite de ossos do crânio – contiguidade com o espaçado subaracnóideo · Traumatismo acidental ou cirúrgico de barreiras naturais – abertura de uma porta de entrada MENINGITES BACTERIANAS - Agentes · H. influenzae (7%) – infecções de seios da face e nariz · S. pneumoniae (47%) – a grande maioria é causada pelo pneumococo · N. meningitids (25%) · Estreptococo do grupo B (13%) · L. monocytogenes (8%) – associado à hidrocefalia e complicações - A mortalidade de um modo geral varia em 10% ou menos · A meningite por N. meningitids e por H. influenzae de 5-15% · S. pneumoniae de 15-30% · 10% dos pacientes que se recuperam por hemófilos e 30% dos que sobrevivem à meningite por pneumococo apresentam problemas neurológicos – é uma condição com alta morbidade (sequelas) Meningite meningocócica - Descrita em 1805, e acontece muito em situações de epidemia. - O meningococo é o microrganismo causador de cerca de 25% dos casos de meningite bacteriana nos EUA, sendo o habitat natural a nasofaringe e possuem acesso através da lâmina cribiforme. - Característica – situação muito rápida e desfavorável, se não tratado pode vir a óbito - Toxemia grande – choque hipovolêmico, equimoses, palidez de extremidades e alterações de pele em 50% como petéquias e rash cutâneo Meningite por H. influenzae - Acompanhada por infecções de VAS, otites e sobretudo em crianças Meningite pneumocócica - Acompanhada (predispõe) em doenças pulmonares, otites, sinusites, doenças imunossupressoras, doenças cardíacas, alcoolismo, asplenismo e doença falciforme. - Mais comum em idosos e crianças com menos de 01 ano Meningite estreptococos do grupo B - É responsável por 70% das meningites bacterianas em crianças com menos de 1 mês de vida Meningite por estafilococos ou bacilos gram-negativos - Pacientes com DVP ou em pós-operatório de neurocirurgia (quando infectada) - Oxacilina é o tratamento preferido · No caso de resistência – vancomicina Meningite por listeria, acinetobacter e pseudomonas - Casos de pacientes com muita imunossupressão com apresentações de abscessos cerebrais, doença linfoproliferativa, colagenoses, infecções ou tumores em ossos do crânio ou metástases cerebrais. - São situações mais incomuns, mas são agentes bastantes virulentos Etiopatogenia - Para atingir o SNC as bactérias precisam aderir ao epitélio da mucosa da nasofaringe e proliferar. · As pilosidades da parede bacteriana ajudam na aderência ao epitélio e na migração através da parede vascular (invade os vasos) - Além disso, as bactérias precisam invadir o interior dos vasos subjacentes e sobreviver à ativação dos mecanismos de defesa do hospedeiro, mediados pelo sistema complemento. - Ao atravessar a BHE e a BHL, atingindo o sistema LCR. As bactérias têm grande chance de proliferar devido ao mecanismo de defesa humoral pouco desenvolvido no interior do sistema nervoso. · Então, precisam sobreviver e replicar-se no LCR - Os lipopolissacarídeos bacterianos parecem desempenhar papel fundamental no processo inflamatório do LCR, o qual está relacionado à liberação de citocinas endógenas. · O processo inflamatório parece ser mais grave do que o agente em si, isso por conta da liberação dessas citocinas endógenas. · As citocinas endógenas resultam em grande parte dos sintomas de toxemia que vemos na meningite. · O processo inflamatório dificulta nas vias de drenagem do LCR, podendo levar até uma hidrocefalia - A proliferação e lise bacteriana liberam citocinas (IL-1 e TNF-a) que estimulam a produção de trombina e ligação de neutrófilos à membrana endotelial. · A liberação de citocinas estimula ainda mais a inflamação, com liberação de IL-8 que por sua vez permite a entrada de neutrófilos no LCR pela diapedese. · Além da IL-8 ativar neutrófilos e degranulação e liberação de substâncias vasoativas. - As substâncias vasoativas e tóxicas do metabolismo do oxigênio alteram a função da BHE e BHL com passagem de albumina, H20 e eletrólitos. · Edema vasogênico – pela alteração da permeabilidade da BHE/BHL · Formação de um exsudato inflamatório · Bloqueios no canal raquidiano · Obstrução das vias de drenagem de LCR na base do crânio – hidrocefalia Quadro clínico - Sintomas gerais de toxemia – febre alta, mal estar, agitação psicomotora, dissociação pulso-temperatura - Sinais de hipertensão intracraniana – cefaleia, náuseas, vômitos e confusão mental - Sinais de irritação meníngea – rigidez de nuca, sinal de Kernig e sinal de Brudizinski Diagnóstico - Clínica + EF + Exames laboratoriais - Leucócitos – aumentados até 10.000 a 30.000/mm³, podem estar normais ou acima de 40.000. - Exame do LCR · Aumento na pressão · Pleucocitose (acima de 1000 células/mm³) · Predomínio absoluto de PMN neutrófilos · Proteínas elevadas (acima de 100mg/dL) · Taxa de glicose muito baixa (<10mg/dL) · Exame bacteriológico direto pelo método de Gram - As culturas são importantes, costuma ser positivas em 70-90% dos casos, mas não precisa ficar à mercê da cultura para iniciar o tratamento. · O tratamento pode ser iniciado de forma empírica, considerando a faixa etária e epidemiologia do paciente, porque as culturas demoram até 5 dias. - Pesquisa de antígeno bacteriano – contra-imunoeletroforese e provas de aglutinação em látex - Os exames de imagem não são de escolha para diagnóstico de meningite, mas algumas situações são imperativas se fazer o exame de imagem antes de colher o LCR: · Quando predomina o quadro de HIV, na ausência de sinais toxêmicos · Crise convulsivas na fase inicial, com sinais de irritação meníngea e/ou toxêmicos pouco evidentes · Presença de sinais de localização (déficits focais como hemiparesias) – a meningite não causa déficits focais, quando presente indica possivelmente a presença de uma complicação/lesão focal ou com efeito de massa. Tratamento - É uma emergência médica, deve-se tratar mesmo antes de conhecer o agente etiológico. - O tratamento empírico · < 3meses – possível estreptococos B, listeria, E. coli e pneumococo · Ampicilina + Ceftriaxone · Alternativo – Cloranfenicol ou Gentamicina · Entre 3 meses e 18 anos – possível pneumococo, meningococo e H. influenzae · Ceftriaxona · Alternativo – Meropenem ou Cloranfenicol · Entre 18 anos e 50 anos – possível pneumococo, meningococo e H. influenzae · Ceftriaxona · Alternativo – Meropenem ou Cloranfenicol · Acima de 50 anos – possível pneumococo, listeria e gram-negativos · Ampicilina + Ceftriaxone · Alternativo – Ampicilina + Quinolona - Tratamento do agente específico · Estreptococo B · Escolha – Penicilina G por 14 a 21 dias · Alternativo – Vancomicina · H. influenzae · Escolha – Ceftriaxone por 7 a 10 dias · Alternativo – Cloranfenicol · Listeria · Escolha – Ampicilina + Gentamicina por 14 a 21 dias · Alternativo – Sulfa+Trimetoprim · Nisseria meningitidis · Escolha – Penicilina G por 7 a 10 dias · Alternativo – Ceftriaxone · S. pneumoniae · Escolha – Ceftriaxone ou Vancomicina + Ceftriaxone por 10 a 14 dias · Alternativo – Penicilina G - Uso do corticoide · É preconizado sistematicamente 15-30 minutos antes da 1ª dose ou acompanhando a 1ª dose de ATB · Dexametasona 0,15mg/kg a cada 6h por 4 dias ou 0,4mg/kg a cada 12h por 2 dias em crianças de até 2 anos · Fundamento – redução da reação inflamatória e diminuição da agressão ao tecido cerebral, o processo inflamatório é perigoso não somente pelos sintomas, mas também pelas sequelas Complicações - Sequelas – surdez, paralisias oculares, cegueiras, alterações mentais, convulsões e hidrocefalias - Complicações – são graves · Abscesso cerebrais – afeta o parênquima · Coleções subdurais – pús · Ventriculites – atinge as paredes dos ventrículos, de difícil tratamento,com alta taxa de mortalidade - Quando suspeitar de complicações? · Melhora clínica inicial não se confirma nos períodos seguintes · Piora do nível de consciência (sonolento ou rebaixa) · Surgimento de convulsões – lesão focal · Sinais focais · Evolução lenta ou reagudização no exame de LCR – é feito o LCR de inicio e em 24-48hrs depois é feito um novo para observar, e se não melhora ou piora. MENINGITES VIRAIS - Agentes – Enterovírus, vírus herpes simples, varicela-zoster e Epstein-Barr são responsáveis por 95% dos casos. - O quadro clínico é semelhante ao das meningites bacterianas, porém menos intenso Diagnóstico - Exame de LCR · Aumento do número de células (abaixo de 500/mm³), com predomínio de linfócitos e monócitos · Proteínas dentro dos limites de normalidade · Taxa de glicose normal · Pesquisa de bactérias e fungos negativas - Cultura para vírus e PCR – são restritas às formas mais graves Particularidades - Nas meningites por caxumba, o número de células pode ultrapassar 1000/mm³ - Os enterovírus podem ocasionar aumento de PMN nas fases iniciais (8-48h) e aumento discreto na concentração proteica pode ocorrer · Por isso a importância de repetir o LCR em 24-48h, pois podemos ter uma elevação e PMN no início, mas depois há uma viragem para um padrão linfo-mononuclear (LMN) característico das virais. Tratamento - O tratamento é sintomático · Corticoide – quando a inflamação é intensa e há sinais exuberantes de HIC · Quadro agressivos ou determinados pelo herpes simples tipo 2 ou pela varicela-zoster – indicado o Aciclovir ENCEFALITES VIRAIS - É uma infecção aguda do parênquima cerebral - Caracteriza-se por febre, cefaleia e alteração da consciência. · Convulsões e sinais neurológicos focais podem estar presentes. - Causas mais frequentes: herpes-simples tipo 1, tipo 2 (em RN), arbovírus, vírus da encefalite de St. Louis e vírus da encefalite B japonesa. MENINGOENCEFALITE HERPÉTICA - Agente causal · Herpes simples tipo 1 (HSV-1) é o mais frequente · Seres humanos são o reservatório natural · Em 6-15% dos casos o agente causal é o herpes vírus tipo 2 · HSV-1 é transmitido por contato respiratório ou salivar · HSV-2 é disseminado por transmissão venérea ETIOPATOGENIA - A infecção primária (ou primo-infecção) do HSV-1 ocorre na orofaringe e é assintomática na maioria dos casos. · Pode ser sintomática dando uma febre leve, dor e dificuldade de deglutição, nada muito intenso, às vezes nem notado. - Após a infecção primária o vírus migra através de ramos do nervo trigêmeo até os gânglios de Gasser (gânglios sensitivos do nervo trigêmeo) e permanece latente. A reativação da forma latente leva a uma replicação do vírus e ao quadro de encefalite. · Cerca de 1/3 dos pacientes possuem a infecção viral primária e em 70% deles ocorre a reativação viral, aí teremos uma meningoencefalite. · É mais típico em idosos, devido à imunossupressão senil, mas não restrito. - O HSV-1 é um vírus com tropismo por alguns locais de lesão, como lobos temporais mesiais, córtex orbitofrontal e estruturas límbicas. São graves, progressivas e têm aspecto necro-hemorrágico. · Essas áreas são tipicamente envolvidas com o comportamento, respostas emocionais e freio social, por isso os sintomas envolve alterações comportamentais. - Em RN a maioria dos casos é causada pelo HSV-2, devido ao contato com secreções genitais durante o parto. CLÍNICA - Quadro · Febre – no idoso, a febre não é tão intensa · Cefaleia · Confusão mental · Alteração comportamental – retraimento ou agitação com alucinações, hipersexualidade, coprolalia · Rigidez de nuca · Convulsões focais e generalizadas · Quadros deficitários – hemiparesias DIAGNÓSTICO - Exames de neuroimagem – a RM é o exame de escolha e costuma estar anormal na 1ª semana (regiões temporais mesiais, orbitofrontais e mesolímbicas). · Enquanto a TC pode ser normal, pois costuma apresentar alterações após a 1ª semana. - Eletroencefalograma (EEG) – anormal na primeira semana, com lentificação difusa, alterações focais sobre as áreas temporais - Exame de LCR – hipertensão, pleocitose, padrão linfo-mononuclear (5-1000 células/mm³), aumento de proteínas, glicose normal (na maioria das vezes), aumento de ADA, hemácias ou xantocromia. - PCR na primeira semana tem 95% de sensibilidade, mas não é um exame viável e disponível. TRATAMENTO - Sem tratamento a doença é fatal em 70-80% dos casos, logo deve ser feito de imediato - Medidas para reduzir edema cerebral – corticosteroides - Aciclovir 10mg/kg a cada 8h por 2 a 3 semanas NEUROCISTICERCOSE - É a infecção do SNC provocada por cisticercos (formas larvárias da Taenia solium), tem sua importância por ser endêmica na região do Vale do São Francisco e é a principal causa de convulsão sintomática no adulto. - O encistamento das larvas da tênia nos tecidos, não somente no tecido nervoso, podendo afetar músculo, olho ou tecido cardíaco CICLO NATURAL E PATOGÊNESE - O ciclo natural é que na natureza o homem seja o hospedeiro definitivo (teníase) e o porco o hospedeiro intermediário infectado pela forma larvária (cisticercose). · A cisticercose ocorre quando o homem se torna o hospedeiro intermediário, e se alimenta das formas contendo ovo da T. solium por meio de água ou alimentos contaminados em virtude da higiene precária, ou ainda devido ao refluxo de conteúdo intestinal (proglotes) para o estômago (como uma autoinfecção). - Tênia adulta – homem infectado com adesão da forma larvária na porção superior do jejuno · Os ovos então são excretados nas fezes, e ocorre a ingestão dos ovos pelo hospedeiro intermediário (porco). · Os ovos embrionados evoluem para larvas encistadas - O homem pode ser contaminado de duas formas: · Água ou alimentos contaminados com ovos da T. solium – cisticercose; OU · Carne suína contaminada por cisticercos – teníase. - Na ingestão dos ovos · O suco gástrico ajuda na eclosão dos ovos e liberação do embrião que originará o cisticerco. Este ao atingir a corrente sanguínea, irá se fixar no tecido celular subcutâneo, tecido muscular estriado, globo ocular e sistema nervoso (em 90% dos casos). · No sistema nervoso, ele pode se fixar no próprio tecido ou nos ventrículos e cisternas da base do crânio. Às vezes, dificulta o processo de drenagem do líquor e gerar uma ventriculomegalia. CLÍNICA - O quadro depende do número de parasitas, localização, tipo e tamanho, viabilidade e resposta inflamatória do paciente. · A resposta inflamatória resulta na lesão e déficit focal - As manifestações dividem em 4 tipos básicos · Forma parenquimatosa – sintomas e déficits focais correspondem ao local de encistamento, com convulsões, hemiparesias, hemianopsias, afasias e ataxias · Forma subaracnóidea – é consequente à ruptura ou morte de um cisto aracnoide · Forma intraventricular – obstruem a via de saída do fluxo de LCR e podem causar hidrocefalia · Forma medular – rara, resulta em lesões extramedulares cervicais ou intramedulares torácicas - Formas clínicas · Hipertensiva – mais grave, responde por 36% · Epiléptica – crises focais ou generalizadas, responde por 44% (principal causa de epilepsia sintomática de adulto jovem) · Mista – hipertensiva e epiléptica · Psíquica e demencial – responsáveis por 4% de todos os casos DIAGNÓSTICO - O diagnóstico é baseado no quadro clínico, epidemiologia, anamnese, neuroimagem e exame de LCR - Neuroimagem · Na TC – dilatação do sistema ventricular, número de parasitas, localização e estágio de evolução (a depender do estágio de evolução da uma ideia no tipo de tratamento) · Na RM – é o melhor exame, pois permite a caracterização do escólex (larva encistada), detecção precoce de inflamação perivesicular e presença de cistos no LCR e na fossa posterior. · A larva encistada é uma forma viável, pois pode resultar numa resposta inflamatória e muda na estratégia de tratamento - Pela RM, podemos identificar os estágios de evolução · Vesicular – cisto de parede fina e nódulo mural (escólex), o parasito está vivo e não há resposta inflamatória. · Coloidal – a larva morre, o escólex começa a se calcificar. Há respostainflamatória e aparece realce da parede e edema na RM (capta mais contraste). · Nodular – cisto se contrai e o escólex fica mais calcificado. · Nodular calcificado – a lesão é totalmente calcificada, não há processo inflamatório, não há edema nem realce (igual a cistos mortos). · Racemosa – o parasita se localiza no espaço subaracnóideo ou dentro dos ventrículos e podem se tornar muito grandes, pois não são contidos pelo parênquima cerebral (ou seja, tem muito espaço para crescer). - No exame de LCR · Aumento de células – abaixo de 50/mm³ de predomínio linfo-mononuclear · Presença de PMN eosinófilos · Presença de anticorpos específicos · Na fase de degeneração há: · Presença de neutrófilos; · Aumento da atividade de ADA · Aumento de gamaglobulinas · Bandas oligoclonais · Síntese local de IgG · Síntese de anticorpos específicos TRATAMENTO - Do processo inflamatório – é um evento adverso com aumento de PIC/edema cerebral · Corticosteroide – Dexametasona 0,1-0,6mg/kg/dia em crianças e 4-18mg/dia em adultos, durante 10 a 15 dias, em doses decrescentes. - Dos parasitas – indicado quando há cistos no parênquima cerebral, desde que não haja sinais de degeneração* dos parasitas. · Albendazol 15-20mg/kg/dia por 10 a 14 dias · *Os cistos que estão em degeneração já vão morrer de todo jeito, não há porque tratar com parasiticida.
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