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Igor Alvares Enkim

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO 
PUC - SP 
 
 
 
 
 
 
 
Igor Álvares Enkim 
 
 
 
 
 
 
 
Trabalhando com famílias: sentidos da formação para um grupo de 
multiplicadores 
 
 
 
 
 
 
 
 
MESTRADO EM EDUCAÇÃO: PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SÃO PAULO 
2013 
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO 
PUC - SP 
 
 
 
 
 
 
 
Igor Álvares Enkim 
 
 
 
 
 
 
 
Trabalhando com famílias: sentidos da formação para um grupo de 
multiplicadores 
 
 
 
 
 
 
 
 
MESTRADO EM EDUCAÇÃO: PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SÃO PAULO 
2013 
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO 
PUC - SP 
 
 
 
 
 
 
 
Igor Álvares Enkim 
 
 
 
 
 
 
 
Trabalhando com famílias: sentidos da formação para um grupo de 
multiplicadores 
 
 
 
 
 
 
 
 
MESTRADO EM EDUCAÇÃO: PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO 
 
 
 
Dissertação apresentada à Banca 
Examinadora da Pontifícia Universidade 
Católica de São Paulo, como exigência 
parcial para obtenção do título de 
MESTRE em Educação: Psicologia da 
Educação sob a orientação da Prof.ª Dra. 
Heloisa Szymanski. 
 
 
 
 
SÃO PAULO 
2013 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Banca Examinadora 
 
__________________________________________ 
 
__________________________________________ 
 
__________________________________________ 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico esta pesquisa ao inspirador grupo de 
educadores da Vila Horizonte. Que continuem 
sua incessante jornada rumo ao Ser-mais. 
 
 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
Agradeço absolutamente todos que participaram do processo desta pesquisa. 
 
Ao apoio incondicional e paciência de minha família. 
 
Ao amor e carinho de Vanessa Coutinho, sempre disposta a colaborar, esforçando-
se em tornar esta experiência mais leve. 
 
À minha orientadora, Prof.ª Dra. Heloísa Szymanski, por sua preciosa presença, 
inspiração, dedicação e cuidados. 
 
À Renata Capeli, por suas valorosas trocas de ideias e luz em momentos de 
escuridão. 
 
Aos professores João Eduardo Coin de Carvalho, e Marília Josefina Marino por suas 
extremamente bem vindas participações, generosidade, importantes observações e 
críticas. 
 
Aos amigos do grupo de pesquisa, acolhedores e sempre dispostos à reflexão, 
tornando a participação no ECOFAM um prazer. 
 
Aos CAPES por conceder uma bolsa integral, financiando esta pesquisa. 
 
Um agradecimento especial à toda equipe de educadores da Vila Horizonte, por 
permitir minha pequena participação no admirável grupo de destemidos e calorosos 
homens e mulheres, no qual me senti acolhido desde o início, por compartilhar sua 
linda história, me surpreendendo a cada encontro com sua capacidade de ampliar 
horizontes. 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
Objetivou-se nesta pesquisa compreender o sentido de uma formação de 
multiplicadores para um grupo de educadores de uma comunidade de baixa renda 
da cidade de São Paulo. Os participantes viviam e trabalhavam na comunidade, 
tendo o curso, para o trabalho com famílias, sido construído com sua participação. 
Trata-se de uma investigação qualitativa, de orientação fenomenológica, tendo como 
referências a Analítica do Sentido proposta por Dulce Critelli, e os preceitos 
dialógicos de Paulo Freire. Aproximou-se do fenômeno através da entrevista 
reflexiva, conforme proposta por Heloísa Szymanski, de modo que os participantes 
compõem parte ativa na constituição do conhecimento. Foram realizadas sete 
entrevistas individuais e uma devolutiva coletiva. Foram criadas quatro constelações 
a partir dos resultados: envolvimento com a formação, cuidando da comunidade, 
vivenciando a formação e sendo multiplicador. Os discursos dos participantes 
contemplam múltiplos sentidos para o curso que se metamorfosearam ao longo dos 
dois anos de formação. Estes sentidos compreendiam desde o aprimoramento 
profissional, cuidar melhor de crianças, passando por eliminar os problemas do 
outro, gerar qualidade de vida, até o ouvir o outro e promover autonomia. Os 
sentidos se transformaram, conforme os participantes permitiram-se estar com o 
outro conforme este se apresentava, sensibilizando-se para novas possibilidades de 
educar. O modo dialógico passou a orienta-los, não mais fazendo para o outro, mas 
com ele, visando co-construir sua autonomia. 
 
Palavras-chave: Formação de Multiplicadores, Fenomenologia e Educação, 
Diálogo 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
The objective of this research was to comprehend the meanings of a multiplier’s 
course for a group of educators of a low income community in São Paulo. The 
participants lived and worked in the community. The course aimed for working with 
families and was developed with their participation. This is a qualitative investigation, 
oriented by Meaning Analysis purposed by Dulce Critelli and the dialogical precepts 
of Paulo Freire. The phenomenon was approached through the reflexive interview, as 
it is purposed by Heloísa Szymanski. In this conception, the participants represent an 
active role in the constitution of knowledge. Seven individual interviews were 
performed as well a collective devolution of the results. Four constellations were 
created: involvement with the course, caring about the community, experiencing the 
course and being a multiplier. The speeches of the participants contemplate multiple 
meanings that were shaped along the two year course. Those meanings spanned 
since professional improvement and better caring of children, through wipe the 
other’s problems, boost life quality, until listening the other and promote their 
autonomy. As the participants allowed themselves to be in the other’s presence as 
they were presented, the course’s meanings were transformed and new educational 
possibilities came to light, through the affection that took place. The dialogical mode 
came to guide them, no more doing for the other, but with him, aiming to construct 
their autonomy together. 
 
Key-words: Multiplier’s course, Phenomenology and Education, Dialogue 
 
 
 
Sumário 
 
 
1. APRESENTAÇÃO .............................................................................................. 1 
2. INTRODUÇÃO ................................................................................................... 4 
2.1. Olhando para o fenômeno ........................................................................... 4 
2.2. Compreendendo o Sentido .......................................................................... 7 
2.3. O ser-com-os-outros e a Educação ............................................................. 9 
2.4. O cuidado para com famílias populares - um breve histórico .................... 13 
3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ............................................................................. 16 
3.1. Contextualização ........................................................................................ 16 
3.2. O cotidiano do Agente Comunitário de Saúde no trabalho com famílias ... 17 
4. APRESENTAÇÃO DO CONTEXTO DA PESQUISA ....................................... 22 
4.1. Histórico da Vila Horizonte ......................................................................... 22 
4.2. O Projeto de Formação de Multiplicadores ................................................ 25 
4.2.1. Os pressupostos da Formação de Multiplicadores .............................. 25 
4.3. Descrição da Formação de Multiplicadores ............................................... 26 
4.3.1. Síntese do 1º semestre (julho-novembro/2011) ................................... 27 
4.3.2. Síntese do 2º semestre (fevereiro - junho/2012) .................................. 29 
4.3.3. Síntese do 3º semestre (agosto - novembro/2012) .............................. 32 
4.3.4. Síntese do 4º semestre (fevereiro - junho/2013) ..................................34 
5. MÉTODO .......................................................................................................... 38 
5.1. Procedimentos para coleta de dados ......................................................... 39 
5.1.1. Situação de Pesquisa .......................................................................... 39 
5.2. A entrevista reflexiva .................................................................................. 40 
5.2.1. Procedimentos Éticos .......................................................................... 42 
5.3. Participantes .............................................................................................. 43 
5.3.1. Tabela de participantes ........................................................................ 43 
5.3.2. Descrição dos participantes ................................................................. 44 
5.4. Sínteses das entrevistas ............................................................................ 45 
5.4.1. Flávia ................................................................................................... 45 
 
 
5.4.2. Paulo .................................................................................................... 48 
5.4.3. Mariana ................................................................................................ 52 
5.4.4. Valéria .................................................................................................. 55 
5.4.5. Laura .................................................................................................... 57 
5.4.6. Pedro ................................................................................................... 60 
5.4.7. Anita ..................................................................................................... 63 
5.4.8. Síntese da Entrevista Devolutiva em grupo ......................................... 66 
6. PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE .................................................................... 71 
6.1. Constelações ............................................................................................. 72 
6.1.1. Envolvimento com a formação ............................................................. 72 
6.1.2. Cuidando da comunidade .................................................................... 74 
6.1.3. Vivenciando a formação ...................................................................... 77 
6.1.4. Sendo multiplicador ............................................................................. 80 
6.2. Síntese geral das constelações ................................................................. 83 
7. DISCUSSÃO .................................................................................................... 85 
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................. 95 
9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................. 97 
10. ANEXOS ...................................................................................................... 101 
10.1 Modelo do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido .................... 101 
 
 
 
1 
 
1. APRESENTAÇÃO 
Meu interesse pelo tema da educação surgiu durante a experiência do 
Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) e Estágios Supervisionados, ao longo dos 
dois últimos anos da graduação em Psicologia, na Universidade Paulista - UNIP, 
quando tive minha primeira experiência de pesquisa, a qual foi realizada em uma 
escola pública da periferia de São Paulo e em uma sociedade beneficente que 
oferece cursos profissionalizantes para jovens de baixa renda, também localizada 
em uma região periférica na cidade. Estas duas experiências levaram ao 
desenvolvimento de trabalhos científicos, relatados no TCC e em artigos 
apresentados em congressos. 
Um fato que direcionou meu interesse pela educação foi o relacionamento 
entre instituições e seus alunos. Havia uma grande ênfase na obrigatoriedade do 
estudo, sem o qual, jamais seriam “alguém na vida”. Seus pais e mestres lhes 
apresentavam o futuro através de frases prontas e eles as assumiam, repetindo 
os mesmos jargões (COUTINHO, ENKIM e MARTINS, 2010) e discursos 
semelhantes eram proferidos por jovens de diferentes instituições. Sobre estas, 
não foi percebido por mim, sinal de que se esforçavam por problematizar a 
educação ou a vida dos alunos em si. Frequentar uma escola, um curso, foi 
apresentado por alunos e instituições como a via de acesso a uma situação 
econômica favorável, garantindo seus sonhos de vida. De acordo com o relato 
dos jovens, a necessidade de estudar e possuir um diploma ou certificado era 
natural, não caberia nem ser questionado. Porém, quando indagados sobre o 
sentido, ou, o “para quê” de estudar, os alunos, prestes a iniciar o último ano do 
ensino médio, disseram que seus estudos nas múltiplas disciplinas que cursavam 
serviriam para ajudá-los a reconhecer os números e as letras dos letreiros de 
ônibus quando fossem procurar outros cursos ou se deslocarem para entrevistas 
de emprego mais tarde em suas vidas, situação que me causou espanto. 
Estranhei o fato dos jovens com diferentes histórias de vida, vivendo e 
estudando em locais distintos, terem sonhos e projetos tão uniformes. O poder de 
compra foi amplamente mencionado como objetivo para se dedicarem com “toda 
garra” aos estudos, mas relataram não gostar de nenhuma disciplina da grade 
escolar, nem mesmo aquelas as quais eles próprios escolheram. Nos cursos 
profissionalizantes, também soube pelos educandos quais disciplinas eram as 
2 
 
mais odiadas. O desejo dos pais foi apresentado na maior parte das ocasiões 
como o principal motivo de estarem realizando suas rotinas estudantis. 
Contextualizamos os jovens em uma sociedade de consumo, sendo 
convocados o tempo todo a ter mais, a comprar. Porém, algo mais surgia para 
além desses projetos massificados. Conforme a pesquisa se aprofundou e os 
alunos foram indagados quanto ao que lhes era realmente significativo na vida, 
diziam frases como: “gostaria de ajudar minha família”. Os jovens tinham 
consciência das dificuldades sócioeconômicas em que viviam, e queriam uma 
saída para si e seus familiares. Mas entre o que viviam e o futuro, havia uma 
ponte mágica. Tinham de se dedicar com afinco à escola, mas dali gostavam 
apenas das amizades. A saída da vulnerabilidade era enriquecer para poder 
comprar, quando o que mais lhes importava naquele momento, era sua família e 
suas dificuldades. Não parecia haver ligação. Aqueles projetos de vida não 
soavam como idealizados por eles. Nem mesmo seus sonhos pareciam lhes ser 
próprios. 
O futuro tinha sido apontado para eles e não construído com eles. Este 
destino era tomado pelos jovens, não como possibilidade, mas como certeza, 
bastando que o cumprissem com o método oferecido como única possibilidade: 
estudar muito. Todo o caminho já estava pronto diante deles, tornando seu 
processo educativo um ato mecânico, nada mais que obrigatório e repetitivo. 
Compreendi que tanto as instituições de ensino que frequentavam quanto suas 
famílias possuíam uma ótica de educação instrumental, sendo insuficientes em 
oferecer aos jovens a oportunidade de refletirem sobre suas existências e o 
mundo que os cerca, no qual o único horizonte era o da conformação à ordem. 
De certa forma esta experiência dos jovens remete à minha própria. 
Frequentei escolas que tinham a mesma ótica, “doar” um sonho, dar um caminho, 
nas quais não encontrei outra possibilidade, a não ser seguir o que me era dito 
como certo. Seja bem-sucedido profissionalmente, diziam-me, seja competitivo, 
destaque-se, enriqueça. Entretanto a certeza dos outros não se encontrava 
comigo, parecia não me dizer respeito. Passei por três experiências de 
graduação, Publicidade e Propaganda, Biologia e Psicologia, procurando por algo 
que me fizesse sentido. Creioter encontrado esse algo na Psicologia. 
3 
 
Durante minha experiência na graduação de Psicologia, entrei em contato 
com o pensamento de Paulo Freire, a Fenomenologia e a Psicologia Sócio-
Histórica. Estas abordagens psicológicas compreendem o mundo de forma crítica, 
problematizando-o. Uma das críticas que compartilham é a de que o mundo é 
construído pelos homens e, portanto, não há caminho ou modo certo de se viver. 
Comecei a me perguntar como a educação poderia favorecer a construção de um 
projeto próprio, para o qual seu sentido pudesse ser transformado por quem o 
idealiza, distanciando-se do cumprimento de ideais. 
Sobre esta impregnação do “modo certo” de se viver, Heidegger (1981) 
apresenta a diluição do ser no mundo do “a gente”, o mundo massificado e 
padronizado onde nos desresponsabilizamos de um cuidado próprio, cuidando de 
ser do modo que “todo mundo faz”. Freire (1987), com uma compreensão política, 
fala sobre a contraditoriedade opressor - oprimido, na qual se adota o modo de 
ser uniformizado por aqueles que detêm o poder. 
A imprescindibilidade do diálogo é outro aspecto compartilhado por estas 
abordagens e foi essa possibilidade existencial que me interessou como forma de 
atuação. Por meio do diálogo os homens se encontram entre si e também a si 
mesmos. Ser e mundo se problematizam, tornam-se acessíveis e podem ser 
colocados em movimento, transformando o viver. 
Fui sensibilizado por aquele encontro com os jovens, indo buscar o 
Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: Psicologia da Educação, da 
Pontifícia Universidade Católica (PUC/SP), interessado em pesquisar junto a 
populações de baixa renda e em situação de exclusão, como pode o sentido ser 
construído em um processo educativo. Oportunamente, minha chegada ao 
Programa coincidiu com o início do Projeto de Formação de Multiplicadores para 
o trabalho com famílias, desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa em Práticas 
Educativas e Atenção Psicoeducacional na Família – ECOFAM, Escola e 
Comunidade, que seria oferecido a um grupo de educadores de duas instituições 
da Vila Horizonte1. Idealizado dialogicamente entre o ECOFAM e os educadores, 
a partir das demandas identificadas na Vila Horizonte, apresentava-se ali uma 
situação educacional diferente daquelas com as quais me deparei anteriormente, 
 
1
 O nome original da comunidade foi substituído em razão da garantia de sigilo dos participantes 
da pesquisa. 
4 
 
pois parecia haver um sentido próprio aos educadores em sua escolha de realizar 
a formação. Perguntava-me com o que sonhavam aqueles educadores para si e 
para sua comunidade. Propus-me, então, nesta pesquisa, compreender o sentido 
da formação para os participantes do curso. 
Na introdução será apresentada uma breve abordagem do pensamento 
que embasa a Fenomenologia Existencial, relacionando-a em seguida com a 
Educação e depois especificamente com o cuidado para com famílias de baixa 
renda. Será realizada uma descrição da comunidade, bem como a síntese dos 
dois anos da formação. A partir do capítulo V, Método, relatarei propriamente 
como esta pesquisa foi realizada. 
 
2. INTRODUÇÃO 
2.1. Olhando para o fenômeno 
O modo de pensar fenomenológico foi elaborado no fim do século XIX, 
sendo concebido inicialmente por Edmund Husserl, como uma resposta ao 
positivismo. O filósofo colocou em questão o pensamento científico de sua época, 
em particular as ciências humanas e o psicologismo, criticando o tratamento 
reducionista dado ao psiquismo humano, adotado das ciências naturais. A ciência 
no final do século XIX deslumbrava-se consigo mesma e acreditava-se capaz de 
fornecer todas as respostas para as questões humanas. Contam Martins e Bicudo 
(1989), que o modelo científico positivista que propunha conhecer para controlar, 
cada vez mais alienava o homem daquilo que realmente lhe dizia respeito: ele 
mesmo. Dessa forma, Critelli (1996, p. 23) afirma que: 
A fenomenologia nao pode ser compreendida por nós como uma 
“escola filosófica” entre outras, mas como um pensamento 
provocado pelo descompasso da civilização, pelo seu 
esgotamento, pelo esvaziamento, pela nadificação do sentido em 
que ser nela se fazia possível e solicitante. 
Para elaborar sua fenomenologia, Husserl apropriara-se dos 
questionamentos de seu próprio mestre, Franz Brentano, que se punha a pensar 
o psiquismo humano como sempre relativo a algo, nomeando este fenômeno de 
intencionalidade. Brentano afirmava que consciência é sempre consciência de 
algo. Dessa forma, Dartigues (1992, p. 20) explana: 
5 
 
Consciência e objeto não são, com efeito, duas entidades 
separadas na natureza que se trataria, em seguida, de pôr em 
relação, mas consciência e objeto se definem respectivamente a 
partir desta correlação que lhes é, de alguma maneira, co-original. 
De acordo com esta compreensão, não seria possível olhar para o mundo 
ao modo das ciências naturais, sem que se olhasse para o homem que o 
enxerga. Não seria possível tratar o mundo como mero objeto de estudo, sem 
relacioná-lo ao homem. A fenomenologia pretendida por Husserl, deveria se 
tornar uma filosofia com rigor científico, mas voltando-se às coisas do mundo e ao 
homem, conforme expõe Dartigues (1992, p.13): “Não convém que a impulsão 
filosófica surja das filosofias, mas das coisas e dos problemas.”. Husserl apontava 
a necessidade de uma revisão do método de acesso à verdade nas ciências, 
através do que chamou de “retorno às coisas mesmas”. Este retorno seria a 
busca pelo sentido, pela essência de determinado objeto de estudo, conforme 
apresentam Martins e Bicudo (2006, p. 21): 
Esse olhar se constitui na epoché, que significa suspensão de 
qualquer julgamento, ou seja, significa dar um passo atrás e 
colocar em suspensão as formas familiares e comuns de olhar as 
coisas, que impedem que sejam vistas diretamente, em seus 
modos de aparecer. 
Martins e Bicudo (1989) definem etimologicamente o termo Fenômeno 
como uma palavra advinda do grego ”phainomenon” e deriva do verbo 
”phainestai”, uma forma reduzida que provém de “phaino”, que significa trazer à 
luz do dia. Fenômeno, neste referencial, é concebido como aquilo que se mostra 
a si mesmo. Um fenômeno, ainda segundo os autores difere de um fato, pois 
parte da compreensão que a realidade conhecida é uma realidade percebida, ou 
experienciada, porém, enquanto uma perspectiva e não como verdade absoluta. 
A ciência positivista, segundo este questionamento, seria apenas um ponto 
de vista, uma vez que é dependente de uma consciência indissociável do mundo 
que percebe. O pressuposto da neutralidade científica estaria em xeque e, 
portanto, também sua pretensão a uma verdade única e universal, pois a ciência 
é feita pelo homem que existe em um contexto, com objetivos específicos e não 
existe por si. Dessa forma, Critelli (1996, p. 52) afirma que: “Tudo que aparece 
para o homem aparece-lhe através de sua condição de ser-no-mundo.” Para a 
fenomenologia, não há busca pela “Verdade”, mas visa-se a verdade provisória 
6 
 
de um fenômeno, que só é observável dentro de um contexto de relações, e 
também só concebida enquanto uma das perspectivas possíveis. Se mundo e 
consciência não podem existir por si mesmos, não haveria ser sem um mundo 
que o embasasse e nem mundo sem que houvesse um ser que o observasse de 
acordo com sua perspectiva. Martins (2006, p. 16) afirma que: 
Apresenta-se a Fenomenologia como uma postura mantida por 
aquele que interroga. O inquiridor fenomenólogo dirige-se para o 
fenômeno da experiência, para o dado, e procura vê-lo da forma 
que ele se mostra na própria experiência em que é percebido. Isso 
quer dizer que há um mundo ao redor do fenomenal, em que 
surge e que se doa ao pesquisador que intenciona o fenômeno. 
Tendo sido aluno de Husserl, Martin Heidegger, se pôs a pensar a questão 
do ser seguindo a óticade retorno às coisas mesmas. Surge o pensamento 
fenomenológico existencial, a partir de Heidegger, no qual o ser é compreendido a 
partir daquilo que ele mostra, como afirma Spanoudis (1981, p. 11): 
Para Heidegger, ser é a maneira como algo se torna presente, 
manifesto, entendido, percebido, compreendido e finalmente 
conhecido para o ser humano, (...) para o “ser-aí” ou Dasein”. 
Nada que aparece, surge isolado do mundo, mas sim pertencente a uma 
trama de relações que o precedem e sustentam (CRITELLI, 1996). No entanto, há 
uma diferença fundamental, em relação ao ser do Homem e o ser das coisas. 
Tudo que se revela, simplesmente está-no-mundo, sejam objetos ou outros seres, 
porém, não o homem. O homem é o único realmente existente, ou seja, não 
apenas é, não apenas vive, mas reflete sobre seu viver, sendo que viver não é, no 
referencial fenomenológico, sinônimo de existir (MARTINS e BICUDO, 2006). O 
termo existência neste referencial, difere também do conceito de “realidade”, 
segundo Spanoudis (1981, p. 11) “existência vem do verbo ek-sistere; ek-
sistência é algo que emerge, se manifesta, se desvela”. Existir neste sentido é 
existir para fora, para a abertura. O homem é ó único ser que consegue 
apresentar-se a si mesmo, indagando e percebendo como está existindo, 
vislumbrando seu ser e, dessa forma, confere rumos, dando sentido àquilo que se 
desvelou, a própria existência. 
 
7 
 
2.2. Compreendendo o Sentido 
Indagando o sentido da formação para o grupo de multiplicadores, deve-se 
delinear em primeiro lugar o fenômeno que se quer compreender. Sentido em 
uma orientação fenomenológica, é definido como sinônimo de orientação, 
direcionamento, conforme expõe Critelli (1996, p. 131): 
Ele é mais um rumo que apela, uma solicitação que se faz ouvir, 
um apelo obstinado que se insinua e persegue. Um fundo 
silencioso que abre a possibilidade de realização de nosso ser. 
Ou, em outras palavras, uma destinação em que se abre a 
possibilidade de se cuidar de ser (...). 
O objetivo é compreender o direcionamento que a formação tomou para 
este grupo, como foi sentida e vivenciada e o que os convocava a, 
espontaneamente, aprimorar seu conhecimento para trabalhar com famílias. 
Critelli (1996) afirma que o sentido de ser se expressa por meio dos modos de 
cuidar do homem, isto é, pela da maneira como o homem cuida e vai dando conta 
de sua existência. 
O Homem, como compreende a fenomenologia, é o único ser que interroga 
o sentido de sua existência, porque percebe que esta é transitória. O cuidado é 
constituinte do homem porque este também está lançado à facticidade, o que 
para Critelli (1996, p. 49): “o homem está entregue a ser, não pode se recusar a 
ser. Mesmo a negação radical de ter que ser cuidando de ser, como o suicídio, é 
uma forma ou modo do homem estar respondendo ao ser que lhe é entregue.”. 
O mundo aqui referido é o mundo vivido, com tudo que cerca o homem, 
objetos, história, ideias, pessoas e assim por diante (bem como as possibilidades 
que este mundo acarreta). Heidegger coloca o homem em relação ao mundo, 
dessa forma, refere-se ao termo ser-aí, ou Dasein (O-Ser, pre-sença), 
estabelecendo a inseparabilidade entre sujeito e objeto, ressaltando esta 
condição como constituinte da maneira de existir do homem, conforme apontam 
Pompéia e Sapienza (2011, p.10): 
Com isto o ser do homem passa a ser expresso por meio da 
noção de ser-aí, exatamente porque o homem só conquista o seu 
ser a partir do aí, do mundo que é o dele. Dizer isso, por outro 
lado, é o mesmo que afirmar as possibilidades específicas do ser-
aí como possibilidades específicas de seu mundo. 
8 
 
O homem está-aí, lançado em um mundo que não o acolhe, incerto e 
fluídico, e é nesta abertura que o homem vai cuidando de sua existência, 
habitando este mundo e relacionando-se com ele. Existir é experienciar a 
provisoriedade do estar-no-mundo, sempre na forma de cuidado, cuidando do 
existir. Sob a ótica do ser-aí enquanto fenômeno, o ser do homem não se mostra 
estático, mas sempre em um vir-a-ser, a partir das solicitações do cuidar de seu 
modo de ser. Portanto, o ser do homem é, sendo-no-mundo, e esta é a condição 
de seu existir. 
Spanoudis (1981) aponta que no pensamento da fenomenologia existencial 
se estabelece diferenças entre as características fundantes da condição humana, 
as condições ontológicas, e as maneiras como o ser se mostra, o que lhe é 
ôntico. Compreensão, disposição afetiva e linguagem, são características 
ontológicas que possibilitam ao homem que se apresente de determinada 
maneira e a partir delas, pode-se também compreendê-lo. Dessa forma, ek-
sistindo no mundo, o homem é disposição, abertura e vai se articulando conforme 
é afetado pelo curso das coisas que o cercam e compreendendo, projeta-se em 
suas possibilidades. 
Porque o homem é-com-o-mundo, ser-aí é estar em abertura. O homem 
em seu inescapável ter-que-ser, é a todo momento afetado pelo mundo que se 
apresenta. De acordo com Critelli (1996), é o estado de ânimo que evidencia o 
modo como somos tocados pelas coisas e outros que estão no mundo. As 
emoções conferem consistência ao mundo que o ser-aí observa, remetendo o 
homem a si mesmo e este se posiciona conforme sua compreensão de seu 
afetamento. A compreensibilidade do homem não pode ser separada de sua 
afetividade ou hierarquizada, pois ambas acontecem em simultaneidade, sendo 
então uma compreensão emocionada, que acontece em dada tonalidade afetiva, 
conforme explicita Critelli (1996, p. 93): “A presença do homem no-mundo é 
sempre emocionada. Mesmo a indiferença é um modo pelo qual algo nos toca.”. 
Dessa forma, na compreensão emocionada, o homem, cuidando, vai projetando 
suas possibilidades de ser e dando sentido à existência. 
Cuidando do existir, os homens vão fazendo escolhas quanto ao que 
cuidar, como cuidar e como cuidar do cuidar. Ainda segundo Critelli (1996), as 
escolhas quanto ao que cuidar e como cuidar remetem às possibilidades 
9 
 
oferecidas na cultura em que o ser-aí se insere, porém o modo de cuidar do 
cuidar relaciona-se mais diretamente ao sentido de ser. A seu modo o ser-aí será 
afetado e compreenderá seu ter-que-ser, dessa forma em seu estado de ânimo, 
composto pela disposição afetiva e compreensão, expressará o sentido que ser 
tem/faz para si. Afirma a autora: 
(...) em especial, das escolhas relativas aos modos de cuidar dos 
modos de cuidar, a Analítica do Sentido deve prestar atenção aos 
estados de ânimo – a base fundamental de nossas escolhas, que 
indicam como se “vai indo” no mundo (em relação às coisas do 
mundo a si mesmo, aos outros), que nos abrem para o que 
tendemos, para o que nos voltamos nos modos da versão e da 
aversão. (CRITELLI, 1996, p. 133) 
Embora o foco desta pesquisa seja o sentido da formação, entende-se que 
este é um sentido-com, dado que o ser-no-mundo o compartilha com 
semelhantes, portanto, é necessária imersão na compreensão dos modos de 
relação dos homens uns com os outros, pois este é o âmbito em que a educação 
se dá. 
2.3. O ser-com-os-outros e a Educação 
Para compreender a educação em uma perspectiva fenomenológica 
existencial, é necessário levar em consideração outro constituinte ontológico do 
homem: a coexistência. Para a fenomenologia, ser-aí é ser em um mundo com os 
outros. Como constituinte do homem, esta condição também não pode ser 
hierarquizada, mas é de igual importância às outras mencionadas. O ser do 
homem, apresentado desta maneira, nunca é individual, mas é uma co-produção 
uma vez que não é possível tornar-se humano em condição de isolamento 
(MARTINS e BICUDO, 2006). Desde o nascimento, o homem sempre está em 
relação aos outros. 
Contudo, esta condição de coexistência pode ser experienciada pelo ser-aí 
de diferentes modos. Na co-produção da vida, o eu pode diluir-se no modo de ser 
dos outros, perdendo-se a si mesmo, como afirma Critelli (1996, p.64) “osoutros 
com quem o eu convive podem atuar tanto sobre quem o eu será, que o eu 
mesmo pode ser obra dos outros e não de si mesmo.”. Uma outra possibilidade é 
que o ser-aí pode continuar escolhendo e co-criando o sentido de sua existência. 
Absorvido no modo de ser dos outros, o ser-aí viverá de modo inautêntico ou 
10 
 
impróprio, abstendo-se de seu vir-a-ser, ele vai existindo, cuidando de si de 
maneira uniforme, nos modos de ser da massificação. A este modo deficiente de 
existência, Heidegger (1981, p. 51) nomeia de “a gente”, conforme explana: “o ‘a 
gente’ está em toda parte (...), mas de um tal modo que, sempre que o ser-aí o 
pressiona a uma decisão, ele escapa”. O “a gente” não é uma entidade, um ser 
coletivo, mas uma forma generalizada de compreender o mundo, baseia-se em 
uma compreensão massificada sobre como se vive por aí. 
No entanto, a impropriedade do ser não deve ser tomada como algo a ser 
eliminado da existência, pois também é uma condição ontológica (CRITELLI, 
1996). O eu nunca será plenamente impróprio, mas também jamais será 
unicamente singular e a possibilidade do ser-aí encontrar-se consigo mesmo está 
em viver seu ser-com-os outros. Na medida em que o ser-aí retorna para si 
mesmo, pode se ver e se direcionar ao que lhe convoca, autenticamente estará 
trilhando sua existência. 
O estado básico do homem estar no mundo, é cuidando e assim como o 
homem está no mundo preocupado com seu ser, esta condição também o 
possibilita a preocupar-se com o ser de outros (MARTINS e BICUDO, 2006). 
Segundo Heidegger (1981, p. 35): “(...) os outros são encontrados emergindo do 
mundo no qual o ser-aí habita referindo-se a ele através do cuidar.”. O cuidado do 
ser-aí com seus semelhantes é chamado de solicitude, pois estes também são 
outros, são afetivos e conforme compreende seu ser, o homem relaciona-se com 
os outros, sendo afetado e afetando. 
Conforme diz Heidegger (1981, p. 41), no que diz respeito ao envolvimento 
com os outros, a solicitude pode expressar-se de duas diferentes maneiras: 
A solicitude com relação à seus modos, tem dois extremos 
possíveis. Pode-se por assim dizer, tomar “conta” do outro ou 
colocar-se em sua posição de cuidar: pode-se “saltar sobre o 
outro”. Este modo de solicitude é o que assume o encargo que é 
do outro de cuidar de si mesmo. 
A solicitude, no modo de saltar sobre o outro é desapropriar este de seu 
lugar, é uma forma de dominação. O cuidador trata o outro não como ser-aí, mas, 
relaciona-se com ele como se relacionaria com um objeto qualquer. O outro não é 
levado em conta em sua existência, em seu poder-ser, mas como coisa acabada 
e à disposição. No modo oposto, no entanto, o ser-aí se antecipa ao outro, não o 
11 
 
protegendo, mas possibilitando que este se volte a si mesmo de forma que o 
outro possa assumir suas possibilidades existenciais. 
Ter consideração e paciência para com o outro são modos-de-ser solícitos 
e é por essa possibilidade de ser com o outro que se pode coloca-lo em contato 
consigo mesmo. Spanoudis (1981), afirma que a consideração está relacionada 
com a experiência vivida, ou seja, ter um olhar para o passado e ter paciência 
com o outro, significa vislumbrar possibilidades futuras. Heidegger (1981) aponta 
que este é um modo autêntico de cuidar e, neste ponto, pode-se vislumbrar a 
educação como uma possibilidade de apropriar o outro de si mesmo, libertando-o. 
Critelli (1981, p. 62) afirma que: 
Logo que tomado como um tema a ser considerado, o “fenômeno 
educação” traz-nos à vista a evidência de ser ele o lugar onde, 
com primazia, nos defrontamos com a relação homem-homem. O 
que por primeiro enxergamos na educação é “o homem-sendo-
com-os-outros-homens” de uma maneira particular. 
A educação é um modo de cuidado do homem para com os outros homens 
e pode se dar de diferentes formas. Freire (1987) discute a educação se 
aproximando da abordagem fenomenológica, propõe que educar seja o ato dos 
homens facilitarem sua condição de liberdade. O homem é compreendido pelo 
autor enquanto inacabado, isto é, o poder-ser é a condição do homem no mundo. 
O diálogo seria o encontro pelo qual os homens se disporiam em solicitude uns 
aos outros, buscando em conjunto por “ser-mais”: 
Por isto, o diálogo é uma exigência existencial. E, se ele é o 
encontro em que se solidariza o refletir e o agir de seus sujeitos 
endereçados ao mundo a ser transformado e humanizado, não 
pode reduzir-se a um ato de depositar ideias de um sujeito no 
outro, nem tampouco tornar-se simples troca de ideias a serem 
consumidas pelos permutantes (FREIRE, 1987, p. 45) 
O diálogo é um ato de criação mutua e por isso, para Freire (1987), não 
pode prescindir da horizontalidade entre os homens, mas depende do amor à 
humanidade, do compromisso, da humildade e da fé na vocação do homem em 
ser-mais. A troca suscitada pelo diálogo transforma o mundo, pois quando cada 
homem pronuncia e expressa seu mundo a outro, este mundo lhes retorna 
problematizado, demandando um novo pronunciar: “Não é no silêncio que os 
12 
 
homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão.” (FREIRE, 
1987, p. 44). 
Concebendo o homem como essencialmente livre e sendo-no-mundo-com-
os-outros, a educação se torna um processo no qual a finalidade não é a 
operacionalização de uma técnica, mas retornar o homem a si mesmo, em suas 
relações com o mundo, com os outros e seu papel transformador neste mundo. A 
Educação nesta perspectiva, deve possibilitar o homem a (re)conhecer sua 
liberdade, assumindo-se como ser social e histórico, pensante, comunicante, 
criador e realizador (PAULY, 2010). 
No extremo oposto da educação dialógica está a educação bancária. Freire 
(1987), assim a nomeia intencionando expressar a hierarquia da relação na qual 
se dá. Nesta concepção, quem educa deposita suas verdades sobre quem 
aprende, ou seja, um detém todo o saber, conhece “a verdade”, o modo “correto” 
de fazer, e o outro que é apenas um recipiente vazio, será preenchido pelo 
primeiro. Nesta verticalidade entre professor e aluno, em que a educação é uma 
via de mão única, não há diálogo e, portanto, o aluno não é visto em sua 
humanidade, uma vez que não cria com o outro, mas cabe-lhe, adaptar-se à 
cultura/saber do outro. O educador pronuncia sua palavra, seu mundo, mas, ao 
educando, cabe, calar-se. De acordo com Freire (1987), esta situação expressa a 
contradição opressor-oprimido. 
O silenciamento do oprimido pressupõe um acabamento dos homens, no 
qual o opressor é o modelo acabado, para o qual o oprimido deve destinar-se. 
Este é um modo de cuidar inautêntico, deficiente (Heidegger, 1981), pois o 
opressor salta sobre o oprimido, desapropriando-o da possibilidade de cuidar de 
si mesmo. No entanto, cabe ressaltar que, nesta situação, a inautenticidade do 
cuidar cabe a ambos. Oprimido e opressor estão-sendo inautênticos, pois, como 
afirma Freire (1987), a ausência de diálogo implica que as possibilidades do vir-a-
ser estão fechadas e é apenas na solicitude do diálogo que os homens se 
humanizam, infinidavelmente. 
Freire (1983) denuncia um ideal colonizador nas práticas educativas 
ofertadas às classes populares. O autor associa a educação bancária à doação, 
messianismo, mecanicismo, invasão cultural, manipulação. Segundo ele, esta 
forma de educar favorece as classes sociais dominantes enquanto oprime as 
13 
 
mais pobres. Para o opressor, só há um modo de pensar, um saber, um modo de 
fazer, um modo de ser, um projeto de mundo, que, enquanto ele já o detém, o 
oprimido deve adaptar-se. 
A educação tem o potencial de promover o encontro do outro consigo 
mesmo, ou diluí-lo no mundo do “a gente”. Ou mais que isso, oprimi-lo de tal 
forma que não se proponha mais estar na abertura de seu ser-aí e conformando-
se em ser um ser-pronto à despeito da vulnerabilidade, injustiça, desigualdade e 
sofrimento que vivencia. Se o sentido da educação é o cuidadocom o outro, pode 
se perguntar, de que forma se vem cuidando do outro, educando-o, mais 
especificamente, questiona-se como tem sido cuidadas as famílias de baixa 
renda, pessoas as quais os multiplicadores visam em sua atuação. 
A seguir, um breve histórico do cuidado de famílias no Brasil. 
 
2.4. O cuidado para com famílias populares - um breve histórico 
No século XIX, a burguesia se consolidou no poder e seus ideais passam a 
se difundir pelo tecido social. O ideal de homem burguês era tido como modelo 
universal, um homem livre, autônomo, asséptico e moralmente perfeito que 
buscava a ascensão econômica e social, valorizando a individualidade, a 
propriedade privada, a igual capacidade de competir e a rígida divisão de papéis 
entre os sexos. A suposição de igual liberdade para todos camuflava os conflitos 
de classe já existentes. 
O desenvolvimento da Psicologia e da Pedagogia enquanto ciências se 
deu neste momento de consolidação da burguesia como classe dominante, 
seguindo o modelo das ciências naturais, reduziam o homem ao componente 
psíquico, procurando corrigi-lo e discipliná-lo, de forma a possibilitar a 
harmonização do indivíduo à sociedade (LIBÂNEO, 1984). As construções 
teóricas da época se fundamentavam nos ideais burgueses, promovendo seus 
interesses e as preocupações das ciências humanas voltam-se sobre as funções 
da família, da mulher e do homem, no esforço de normatizar seu modo de vida. 
Estas ciências contribuíram, em larga escala, para a patologização da família, ao 
defender veemente apenas uma possibilidade de ser, o ideal de família burguesa 
(REIS, 1984). 
14 
 
A vida da família passa a ser alvo do controle de especialistas por meio da 
tutela higienista, domesticando a realidade vivida de modo que atingissem um 
pacote de ideais. O homem é isolado de sua natureza social e visto a partir de 
uma essência inata, universal, sem nenhuma influência da cultura e da história, 
devendo ser cultivado corretamente (LIBÂNEO, 1984) a fim de se garantir “o 
resultado perfeito”. Por esta ótica, sem nenhuma influência de seu meio social, o 
indivíduo “livre” e seu agrupamento familiar são responsabilizados pelos desvios 
de conduta e passam a ser considerados ameaças à ordem. O modo de produção 
capitalista instantaneamente gera contradições que o prejudicam e cria 
estratégias para controlá-las. Na luta de classes, a família operária, não 
conseguindo preencher estes ideais, torna-se foco de constante regulação por 
parte do aparato intervencionista do Estado e culpabilizada pelo próprio “fracasso” 
(TEIXEIRA, 2010). 
A ideia de liberdade individual e essencialismo do homem direcionam 
profundamente os cuidados que são oferecidos às famílias de baixa renda. Às 
classes populares são atribuídas características que, assumidas como naturais, 
perpetuam sua opressão: patológicos, ignorantes, selvagens. Afirma Arroyo 
(2009) que essas visões dos setores populares marcam as políticas, programas e 
campanhas para o povo, na educação, saúde, cultura, promoção social. Vistas 
como incapazes, as famílias pobres são historicamente marginalizadas e esta 
estigmatização reforça a própria ideologia capitalista que as criou, porém, 
dificilmente o modelo de acumulação de capital é questionado. De acordo com o 
autor, a educação e saúde ainda operariam na visão de que o pobre é atrasado, 
subdesenvolvido, imoral, incivilizado e assim por diante. Quanto à Assistência 
Social, Teixeira (2010) afirma que a instalação de uma política de proteção social 
no Brasil também se deu nesta lógica de discriminação e doutrinação. 
Atualmente a estrutura familiar burguesa ainda permanece como ideal a 
ser atingido por grande parte da população, sem ser questionado, até mesmo 
entre psicólogos e educadores, pois é tido como natural, conforme afirma 
Szymanski (2004a, p. 7): 
A forte pressão em direção ao modelo nuclear, com sua estrutura 
e organização patriarcal mantida na perspectiva essencialista, tem 
o sentido de integrar a família em um arranjo social que atende a 
interesses mais amplos da sociedade e da cultura. Qualquer 
15 
 
mudança nessa instituição de base – que tem a missão de ser a 
primeira agência socializadora a transmitir cultura para as 
gerações mais jovens – acaba por atingir as demais instituições e 
ameaçar uma ordem social interessada em manter o status quo. 
Há um descompasso entre a realidade das famílias brasileiras e o ideal de 
família burguesa (SZYMANSKI, 2004b) e apesar de hoje serem discutidas novas 
configurações familiares, estas sempre existiram (TEIXEIRA, 2010). O modelo de 
família burguesa é o modelo do opressor e quando é perseguido, desapropria as 
famílias de seu poder-ser, estas voltam seus esforços a cumprir com um ideal 
único, ignorando qualquer outra possibilidade de viver, como aponta Szymanski 
(2004b, p. 9): 
Os efeitos da discriminação social tiveram como resultado práticas 
educativas defensivas, no sentido de desenvolver um processo 
identitário na negatividade ou medo de serem alvo de 
discriminação, o que levou os pais a adotarem práticas violentas 
para evitar que os filhos se tornassem “marginais”. 
Após transformações políticas e econômicas, a partir da constituição de 
1988, começa um avanço no campo da proteção social no Brasil. O Estado de 
Bem-Estar Social teve como parâmetros a descentralização e a expansão da 
atuação estatal, com vistas à universalização (FRANZESE e ABRUCIO, 2009). 
Esta mudança, que ocorre tardiamente no Brasil (TEIXEIRA, 2010, SPOSATI, 
2011 e DE CARVALHO, 2011), dá origem ao Sistema Único de Saúde e mais 
tarde ao Sistema Único de Assistência Social. Iniciava-se um novo paradigma de 
gestão participativa recebendo a família, centralidade nas políticas públicas de 
proteção social, sendo considerada a base fundadora da sociedade (TEIXEIRA, 
2010). Por um lado, dada sua importância nesta concepção, a família deve ser 
objeto de cuidado do Estado, mas por outro, é “convidada a participar” desta 
proteção, recebendo assim “novos” encargos. 
A responsabilização da família no paradigma atual pode ter o sentido de 
fortalecer a busca por sua autonomia em seu cuidar de si, pode também ter o 
sentido de favorecer a organização social para transformar as condições 
opressivas em que vivem. Porém, como veremos no capítulo 3, Revisão 
Bibliográfica, este “repasse”, tem oferecido um sentido deficiente às famílias que, 
além de representar uma desresponsabilização do Estado (RIBEIRO, 2009) no 
que diz respeito à garantia de suas necessidades e direitos, está longe de 
16 
 
apresentá-las a si mesmas, mobilizando-as para o autocuidado, emancipação e 
transformação social. 
 
3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 
3.1. Contextualização 
Este trabalho tinha a pretensão inicial de realizar um levantamento 
bibliográfico sobre trabalhos que investigassem a formação de multiplicadores 
para o trabalho com famílias. Mecanismos de busca eletrônicos foram explorados 
por longos períodos, utilizando-se das palavras-chave “multiplicadores” e 
“trabalho com famílias” ou “multiplicadores” e “famílias” ou ainda “multiplicadores” 
e “comunidade”, no entanto, houve dificuldade em encontrar tais pesquisas, que 
quando escassamente eram encontradas, tratavam de formações com 
populações específicas, como crianças, ou enfermeiros, para atividades 
igualmente especializadas, como por exemplo, o cuidado dentário ou a formação 
para o tratamento da hanseníase, além do fato de que a concentração destes 
trabalhos se dava, basicamente, na área de enfermagem. 
Era pretendido encontrar pesquisas que tivessem como tema não apenas 
uma experiência de formação, mas que esta se focalizasse na atenção às famílias 
de baixa renda. Não era possível utilizar pesquisas sobre graduação de 
profissionais, pois a equipe de multiplicadores trabalha e mora no mesmo bairro, 
ou bairros vizinhos, tendo uma relação muito próxima com a população. 
Para embasar este trabalho,também havia sido previamente planejado que 
seriam analisados artigos que versassem sobre a experiência de educandos que 
participaram de uma formação para o trabalho com famílias. Foi realizada uma 
nova pesquisa empregando-se as palavras chave “formação”, "trabalhar com 
familias" e o conteúdo encontrado era, em sua maioria, sobre a formação de 
Agentes Comunitários de Saúde (ACS). Além disso, também tentou-se encontrar 
trabalhos na área da assistência social, buscando por “Agente de Proteção 
Social” e “formação”, “Orientador Socioeducativo” e “formação” ou ainda apenas 
os termos isolados que designassem o cargo do profissional de nível técnico do 
SUAS. Nesta tentativa, não foram encontrados trabalhos com foco em 
atendimento de famílias nas ferramentas do Google Acadêmico e Scielo. 
17 
 
A escolha por compreender a prática e formação dos ACS se deu em razão 
de características similares entre as atribuições específicas da prática dos ACS e 
as ações do grupo de multiplicadores, tais como trabalhar com famílias em base 
geográfica definida, orientar as famílias quanto à utilização dos serviços de saúde 
disponíveis, atenção à demanda espontânea, desenvolver atividades de 
promoção da saúde, por meio de ações educativas individuais e coletivas na 
comunidade, estar em contato permanente com as famílias, desenvolvendo ações 
educativas, visando à promoção da saúde (BRASIL, 2011). Além disso, os ACS 
devem passar por uma formação para o trabalho com famílias e é preconizado 
que compartilhem seu saber. O cuidado com o outro fundamenta seu trabalho e 
tanto os ACS quanto os multiplicadores trabalham na comunidade onde vivem. 
 
3.2. O cotidiano do Agente Comunitário de Saúde no trabalho com famílias 
Os agentes comunitários fazem parte da Estratégia de Saúde da Família e 
recebem uma capacitação para se inserir neste modelo de atenção. Ao ACS é 
conferida a responsabilidade de criar um elo entre a população à qual atende com 
a rede de saúde circundante, facilitando a co-responsabilidade das famílias nos 
cuidados com sua saúde, como encontrado na Cartilha “Entendendo o SUS”: 
O ACS mora na comunidade em que atua e é um personagem-
chave do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (Pacs), 
vinculado à Unidade de Saúde da Família (USF). Ele liga a equipe 
à comunidade, destacando-se pela comunicação com as pessoas 
e pela liderança natural. É um elo cultural do SUS com a 
população e seu contato permanente com as famílias facilita o 
trabalho de vigilância e promoção da saúde. (BRASIL, 2006, p. 
18) 
Com base na leitura de diversas pesquisas que exploram, por meio de 
entrevistas com ACS, a formação e os aspectos do cotidiano de trabalho, 
observa-se uma discrepância entre os desafios do dia a dia e a formação para o 
trabalho. As prerrogativas governamentais delegam grande quota de 
responsabilidade sobre os ACS, atribuindo-lhes, a função de agentes de 
transformação social, porém, a capacitação oferecida, não os prepara para 
cumprir tais funções, pois não fornece conhecimentos e competências 
necessárias para trabalhar em conjunto com a população atendida (SCHIMIDEL, 
18 
 
2009). Nunes et al. (2002) observam que ao mesmo tempo em que ao ACS é 
designada a responsabilidade de facilitar a autonomia da população perante aos 
cuidados com a saúde, sua própria autonomia de trabalho é restringida pela 
equipe à qual responde, sendo incumbido de orientar a população para a adoção 
de hábitos e comportamentos saudáveis, segundo as prescrições médicas. No 
entanto, Malfitano e Lopes (2009) e Pupin e Cardoso (2008) afirmam que as 
demandas que chegam ao ACS não se restringem às ações de saúde, mas que 
estes profissionais são tomados por seus vizinhos como uma ponte para a 
solução de demandas de ações sociais básicas, por estarem ligados ao serviço 
público. 
De acordo com Pupin e Cardoso (2008), a prática dos ACS baseia-se, 
predominantemente, no saber biomédico, caracterizada por uma concepção 
assistencialista, na qual se utilizam de estratégias educativas verticais, 
transmitindo técnicas em saúde para assimilação da população, ou oferecendo 
respostas às dúvidas dos atendidos. 
O viés biomédico do trabalho, segundo Nunes et al. (2002), suscita 
resistência e rejeição das famílias às práticas do ACS, revelando a dificuldade de 
diálogo entre o saber médico, os profissionais e a cultura da população. Nunes et 
al. (2002) relatam que parte dos ACS entrevistados em sua pesquisa sentia-se 
inconformada com a “desobediência” da população, que insistia em não seguir as 
recomendações médicas. Observa-se que o cuidado oferecido às famílias não 
parte das necessidades que apresentam, mas sim de um ideal acerca do que 
precisam. Martins; Veríssimo e Oliveira (2008, p. 113), afirmam: 
Embora o PSF tenha sido proposto como uma nova metodologia 
assistencial, as atividades educativas ainda são 
predominantemente impositivas, chegando às vezes ao 
autoritarismo, restringindo-se as possibilidades de conversa com 
exposição e confrontação de valores, como tradicionalmente 
ocorre na assistência biomédica. 
Nascimento e Correa (2008) afirmam que, além da capacitação técnica, é a 
capacidade criativa dos ACS, pela iniciativa própria e pelo improviso, que formam 
a base para execução de seu trabalho. Nunes et al (2002), Marzari; Junges; Selli 
(2011), Nascimento e Correa (2008) e Ferraz e Aerts (2005) compreendem que o 
treinamento dos ACS deve capacitá-los para ir além da perspectiva biomédica, 
19 
 
possibilitando uma melhor interação com as famílias, reconhecendo e legitimando 
suas necessidades, conforme se apresentam, de maneira contextualizada, por 
meio de uma abordagem que priorize a reflexão. Os autores também apontam 
que é de grande importância capacitar os profissionais para o reconhecimento de 
características peculiares à comunidade, tais como fatores culturais e religiosos, 
ou temas ligados à sexualidade, facilitando assim uma melhor articulação e o 
diálogo entre os saberes técnicos e populares. 
Apesar da ênfase no saber médico com que realizam seu trabalho, a 
vulnerabilidade da população não passa despercebida e os ACS assumem, 
grande quota de responsabilidade perante a população (MARZARI; JUNGES; 
SELLI, 2011), o que de um lado representaria a eficácia desta abordagem, mas 
por outro, também revela a insuficiência de sua formação quanto à possibilidade 
de refletirem sobre o próprio trabalho, não lhes permitindo reorientar sua prática, o 
que pode lhes proporcionar grande quota de sofrimento. 
Martines e Chaves (2007), Pupin e Cardoso (2008) e Jardim e Lancman 
(2009) apresentam experiências de idealização e angústia dos ACS na realização 
de seu trabalho, quando assumem a missão de transformação da comunidade 
como exclusivamente sua e ao mesmo tempo, vivenciam a frustração da 
impossibilidade de concretização desta tarefa. Os ACS observados por Pupin e 
Cardoso (2008) sentiam-se em uma posição de destaque e autoridade na 
comunidade, confirmadas a eles por incessantes solicitações dos moradores e 
seus discursos sobre os ACS, tais como “anjo da guarda” e “salvador da pátria”. 
Os ACS compreendiam a dependência da comunidade com relação ao seu 
trabalho como algo positivo, pois confirmaria a apreciação da população por sua 
atuação. A população atendida por estes profissionais foi apresentada como 
descomprometida e passiva, o que significava aos ACS sua “imprescindibilidade”. 
Segundo Jardim e Lancman (2009) a prática com base no modelo 
centralizador e assistencialista, pode diluir fronteiras profissionais e pessoais 
entre os ACS e a população que atendem. Observaram que os ACS passaram a 
ser procurados para resolverem os problemas dos moradores fora do horário de 
trabalho e em qualquer lugar, como por exemplo, o mercado e até mesmo em 
suas casas, recebendo inclusive, ameaças da população diante de falhas do 
sistema de saúde: 
20 
 
A gente não devia morar nacomunidade. Tranco meu filho, me 
tranco com medo. (...) O povo da favela quer matar o ACS porque 
o paciente morreu esperando a consulta. Imaginou isso, tenho 
filho que estuda na mesma escola que os filhos deles! (JARDIM e 
LANCMAN, 2009, p. 129) 
Pupin e Cardoso (2008), Jardim e Lancman (2009) compreendem que tal 
situação pode ser de difícil manejo e desconstrução, uma vez que a comunidade 
se acostumaria com o “heroísmo” dos ACS. 
Destaca-se na leitura destas pesquisas o lugar confuso em que, muitas 
vezes, o ACS está. Quanto a formação dos ACS, é possível perceber que esta 
caracteriza-se pelo modelo bancário exposto por Freire (1987) que verticaliza as 
relações entre formadores, equipe médica, agente comunitário e as famílias 
atendidas. A ausência da perspectiva dialógica terá reflexo direto sobre sua 
atuação, criando conflitos com os valores e princípios com as famílias a que 
atendem. A pressuposta liderança atribuída aos ACS, não é de forma alguma 
natural, mas sim, “eleita” pelas pessoas que veem no agente uma possibilidade 
de melhorar sua condição de vida e este, por sua vez, aceita este status, 
encarnando o papel de herói da comunidade, mas não conseguindo colocar-se 
como facilitador da autonomia da população. 
A comunicação com as pessoas se mostrou problemática para os ACS. A 
formação conteudista inviabiliza que os ACS problematizem sua realidade e 
desconsidera as premissas de transformação social sob as quais atuam, Duarte, 
Silva e Cardoso (2007), afirmam não terem observado nos discursos dos ACS 
entrevistados em sua pesquisa, atitudes que visassem à transformação de fatores 
determinantes da saúde, como por exemplo, emprego e saneamento, apesar 
destes serem apontados como fonte de preocupação dos ACS para com a 
comunidade. 
O modelo de trabalho dos ACS os responsabiliza para cuidar das famílias, 
mas esta responsabilidade não é compartilhada, sendo centralizada nas mãos do 
ACS. Segundo Heidegger (1981), este é um dos modos deficientes de cuidado, 
pois substitui o outro em suas possibilidades de cuidar de si. Parte-se de uma 
perspectiva opressora, da adaptação ao modelo “certo” desconsiderando as 
singularidades de cada família, visando a uniformidade e padronização. A técnica 
chega pronta para agentes e famílias, impossibilitando a autonomia comunitária 
21 
 
diante da própria demanda. Freitas e Mesquita (2011), afirmam que o cuidado de 
famílias não pode orientar-se por generalizações quanto a um modelo de família, 
mas de acordo com as particularidades que lhes são plurais. 
Observamos um alto investimento pessoal no trabalho do ACS com a 
comunidade, no entanto, a formação conteudista e orientação assistencialista 
impedem a organização social, além de colocá-los, literalmente, em conflito com 
as populações atendidas. Os sentidos de sua atuação não podem ser 
transformados, pois pautam-se em um modelo dado e pronto. Sua práxis é 
inviabilizada e apesar de perceberem a vulnerabilidade da população, não 
possuem suporte para lidar com esta demanda. 
Na perspectiva da educação popular, fortemente influenciada por Paulo 
Freire, observa-se outro modo de cuidar e outro sentido para as práticas voltadas 
às famílias. A educação popular pressupõe a conscientização sobre a realidade 
vivida pelos educandos, partindo-se dela para o saber sistematizado, elevando 
este a novos níveis de compreensão por meio da criticidade e retornando-se à 
realidade para transformá-la, dialeticamente, em um movimento contínuo 
(OLIVEIRA, 2009). O modo dialógico de educação, tendo seu compromisso com 
as classes populares, requer das formações baseadas na técnica, uma 
reformulação de conceitos e reorientação de práticas, possibilitando o diálogo 
entre o saber formal, e o saber popular (RIBEIRO, 2009). Se está-com-o-outro na 
revelação dos sentidos de seu cuidar, possibilitando que este se pronuncie, se 
aproprie e se direcione para o que lhe convoca cuidar, do modo que lhe for 
conveniente. Dessa forma, pode ser considerado autêntico, na definição de 
Heidegger (1981), pois apresenta o outro a si, tornando-o parte na construção do 
conhecimento. 
Antes de chegarmos aos sentidos da formação para os multiplicadores, 
faz-se imprescindível incluir o contexto da Vila Horizonte nesta pesquisa. 
Seguiremos, no próximo capítulo, para a exploração de um recorte de sua 
história, bem como da formação de multiplicadores. 
 
 
22 
 
4. APRESENTAÇÃO DO CONTEXTO DA PESQUISA 
4.1. Histórico da Vila Horizonte 
 A Comunidade Vila Horizonte começou a surgir em 1987, a partir da 
ocupação de um terreno particular, por pessoas que, em maioria, haviam sido 
despejadas de outras regiões da cidade de São Paulo (WALCKOFF, 2009). O 
matagal que existia no local, aos poucos foi tomando forma para abrigar os novos 
moradores, que, literalmente, começaram a comunidade do zero, pois ali não 
havia condição básica alguma de moradia. Vinte e cinco anos depois é um bairro 
que conta com Associação de Moradores, instituições educacionais, saneamento, 
eletricidade, ruas asfaltadas e linhas de ônibus. Tudo que existe hoje no local foi 
conquistado com muito esforço conjunto dos moradores, enfrentando toda sorte 
de obstáculos, desde dificuldades econômicas, a ausência de apoio 
governamental e conflitos com criminosos, como relata Pedro, um líder 
comunitário, em entrevista a Ferraz (2011, p. 23): 
Eles matavam o pessoal na beira desses córregos aí. Eu ficava 
impressionado, a violência e a água, a energia também, porque 
era tudo clandestino. Mas o que me impressionava muito era a 
violência, como que [isso pode ocorrer] tão perto da cidade, há 20 
km da Praça da Sé. Eu falava assim, não é possível. Depois a 
prefeitura colocou uma pipa [...] o pessoal não pagava e a 
prefeitura cortou e foi ligado de modo clandestino [...] 
 A história da Vila Horizonte revela condições de vida de extrema 
vulnerabilidade, mas também lutas, superação, coragem e cooperação dos 
moradores, demonstrando sua alta capacidade de resiliência, necessária para 
consolidar esta comunidade, como aponta o relato de uma das moradoras 
entrevistadas por Walckoff (2009, p. 3): 
(...) achar um meio de água boa, foi até pra Sabesp, fizeram 
testes tudo, a gente podia beber dessa água, cozinhar dessa 
água, (...) Porque eu saí de terreno em terreno arrecadando tijolo, 
um pouco de cimento, um pouquinho de areia e consegui fazer 
uma caixa pra poder a água ficar ali e a gente pegar com balde, aí 
pusemos madeira em cima e com a caneca a gente enchia os 
balde né? (...) E eu ficava de prontidão em cima da pedra, com um 
facão (para proteger a água) e todo mundo me chamava de “a 
mulher do facão”. 
A violência era algo muito comum na Vila Horizonte e não faltam histórias 
espantosas a este respeito. Havia disputas entre grileiros, gangues e os 
23 
 
moradores tinham muito medo, tiroteios ocorriam a qualquer hora do dia ou noite, 
como relata o já mencionado líder comunitário, Pedro,“Era um grupo atirando no 
outro e eu estava no meio. Corri para dentro de um barraco de madeira e deitei no 
chão. Os grupos se confrontavam abertamente” (FERRAZ, 2011, p. 24). 
Havia toque de recolher para os moradores. Para os jovens poderem 
estudar à noite, tinham de ser escoltados por moradores corajosos. Há muitos 
exemplos dessa bravura ao longo dessa história, em que “pessoas comuns” 
arriscaram sua vida para proteger aquilo que estavam construindo. Até mesmo 
formar comissões e lideranças para continuar esta luta pela cidadania era difícil. 
Após a saída de um dos padres, alguns membros dessas comissões tiveram suas 
casas queimadas por criminosos. Pedro fez a escolha de estabelecer residência 
na Vila Horizonte, para honrar seu compromisso com os moradores e abandonou 
o seminário para se tornar padre, continuando a mobilizar a organização dos 
moradores. 
Após a luta pela água, precisavam garantir a distribuição de energia 
elétrica, e aí encontraramum grande obstáculo. A Eletropaulo não os supriria 
caso a irregularidade das moradias não fosse sanada, e para tanto, precisariam 
comprar 62.000 metros quadrados de terreno, correspondente à área que as 
famílias ocupavam. De acordo com Xavier (2009, p. 12), a partir do enfrentamento 
destas dificuldades a união e organização entre os moradores se fortalecia: 
Dessa forma, no ano de 1991, criou-se uma associação de 
moradores de bairro, como estratégia para busca de melhorias 
para uma ocupação irregular que, pouco a pouco, tornava-se uma 
grande comunidade. 
O angariamento da renda entre os moradores para a compra e 
regularização das terras por eles habitadas seria impossível sem perseverança e 
colaboração coletiva e esta empreitada se consolidou no ano 2000, quando as 
terras foram quitadas e deram origem ao Conjunto Residencial Vila Horizonte, 
possibilitando-os também a ter sua energia elétrica regularizada. 
A criação de um CEI (Centro de Educação Infantil) se iniciou em 1992, 
representando outra luta comunitária para cuidar de necessidades emergenciais. 
Nesta época, não havia instituições que pudessem cuidar das crianças enquanto 
as mães trabalhavam e duas crianças morreram em um incêndio, presas em 
casa. Articulados com instituições religiosas e não governamentais da Itália, os 
24 
 
moradores em sistema de mutirão, construíram e fundaram o que na época 
chamavam de creche. Após inaugurada, novamente foi preciso muito esforço para 
mantê-la em funcionamento, pois naquele momento, além da falta de recursos 
financeiros, água e luz eram clandestinas. A creche chegou a ser fechada um ano 
após a abertura e sob o risco de perderem o espaço construído, alguns 
moradores que antes ali trabalharam, ocuparam-na novamente, e, através de 
parcerias e um convênio com a Prefeitura, conseguiram estruturá-la para atender 
melhor as crianças (WALCKOFF, 2009; FERRAZ, 2011). 
Em 1993, iniciou-se o envolvimento de Heloísa Szymanski com as 
lideranças da Vila Horizonte, para realizar grupos de discussão com os moradores 
sobre o tema “família”. Em 1994, novamente, a pesquisadora foi chamada para 
colaborar com o desenvolvimento do Projeto Pedagógico do CEI, a fim de 
adequarem-se às solicitações da prefeitura. Muitos trabalhos acadêmicos foram 
desenvolvidos na comunidade desde então, em parceria com moradores e 
instituições do bairro, até configurar-se o grupo de pesquisa ECOFAM. Heloísa 
(apud WALCKOFF, 2009, p. 13), explica a origem do ECOFAM: 
Então, o Ecofam teve desde o início esse duplo interesse que era 
de lócus de pesquisa, formação de pesquisadores e prestação de 
serviço. É uma atividade de extensão pura da universidade, 
porque as pessoas sabem que tudo que a gente faz lá tem um 
respaldo de pesquisa, mas eles esquecem isso e nos veem como 
pessoas parceiras nos projetos delas. 
O grupo de pesquisa atuava com os educadores da creche e com as 
famílias da comunidade, acompanhava as demandas apresentadas por estes, 
pautando-se em seguir o movimento que indicavam, de acordo com seus 
princípios dialógicos. Grupos reflexivos eram realizados com famílias da 
comunidade e os temas eram definidos conforme as necessidades expressas 
pelos participantes. Walckoff (2009), afirma que o abuso sexual, a forma de 
educar os filhos e a possibilidade de educar sem o uso de violência, eram desde o 
início, os temas mais recorrentes nestas solicitações. 
A partir do ano de 2007, o grupo de educadores já fazia solicitações por 
novos horários para realização dos encontros reflexivos. Ocorria uma oscilação 
no número de participantes dos grupos e solicitações de mudança de horário 
eram feitas por eles. Porém, na época, não era possível ao ECOFAM estender 
25 
 
sua participação na comunidade. Ao mesmo tempo, as lideranças comunitárias, 
em uma tentativa de manter o “espírito” da comunidade2, estimulavam a busca 
dos educadores por maior mobilização coletiva (TERAHATA, 2008). 
No final do ano de 2010, foi sugerido pelo Grupo ECOFAM que se 
realizasse uma formação para os educadores que desejavam trabalhar com 
famílias. A proposta foi ao encontro da necessidade percebida pelos educadores 
e assim começou a ser pensado o Projeto de Formação de Multiplicadores para o 
trabalho com famílias. Detalharemos a seguir o PFM, em seus objetivos, bem 
como os principais pressupostos metodológicos que sustentam suas práticas. 
 
4.2. O Projeto de Formação de Multiplicadores 
4.2.1. Os pressupostos da Formação de Multiplicadores 
O Projeto de Formação de Multiplicadores (PFM3) se insere no projeto 
principal do Grupo de Pesquisa ECOFAM: O Projeto Articulação e Diálogo, e teve 
seu início em julho de 2011. Este projeto tem como objetivos gerais: compreender 
o processo construtivo de propostas articuladas entre dois ou mais contextos 
educativos formais e informais (famílias) que envolvam a adoção de práticas 
dialógicas por parte de educadores e famílias ao longo de um projeto de 
intervenção participativa, bem como pesquisar possibilidades, obstáculos e 
caminhos apontados para a articulação entre instituições educativas, com vistas a 
contribuir com políticas públicas em Educação. 
Pautando-se na perspectiva fenomenológica existencial e na prática 
dialógica de Paulo Freire, o ECOFAM elaborou e desenvolveu um Projeto de 
Formação de Multiplicadores em conjunto com os participantes, assim como 
propõe Freire (1987, p. 48): “A educação autêntica, repitamos, não se faz de “A” 
para “B” ou de “A” sobre “B”, mas de “A” com “B”, mediatizados pelo mundo.”. 
Outros objetivos do projeto Articulação e Diálogo são a compreensão do 
processo de articulação entre PUC/ECOFAM e Associação de Moradores da Vila 
Horizonte na realização do PFM e a investigação sobre como as práticas de 
 
2
 Website do Instituto Vila Horizonte. 
3
 Projeto de Formação de Multiplicadores será mencionado pela sigla PFM daqui em diante. 
 
26 
 
encontros reflexivos, entrevistas reflexivas e o projeto de formação em si, são 
compreendidos pelos participantes. 
A intervenção educativa se estendeu ao longo de dois anos, oferecendo 
aprimoramento teórico e profissional para o trabalho com famílias, apreensão da 
perspectiva dialógica no desenvolvimento do trabalho com as famílias e na 
educação das crianças, facilitando o intercâmbio com os recursos, conhecimento 
formal e oportunidades culturais com a PUC/SP. 
O caráter de multiplicação que se encontra no título do projeto diz respeito 
ao compartilhamento da prática dialógica. Diferentemente de defender a 
transmissão de uma técnica, o curso foi concebido para a conscientização de uma 
práxis. Este termo é empregado em sua definição por Freire (1987, p. 11): 
A palavra é entendida, aqui, como palavra e ação; não é o termo 
que assinala arbitrariamente um pensamento que, por sua vez, 
discorre separado da existência. É significação produzida pela 
“práxis”, palavra cuja discursividade flui da historicidade – palavra 
viva e dinâmica, não categoria inerte, exâmine. Palavra que diz e 
transforma o mundo. 
 Freire (1987) se refere à imprescindibilidade da ação humana estar 
dialeticamente alinhada com a reflexão e vice versa, em um incessante 
movimento de criação modificando-se mutuamente, rumo à interminável 
humanização. Este é o caminho que o PFM se propõe a trilhar. O mundo da vida, 
não é propriedade exclusiva de alguém, mas colaborativamente construído pelas 
pessoas, no diálogo dos homens uns com os outros. É esta postura de abertura, 
horizontalidade, reflexão e ação que se almejava construir com o Projeto de 
Formação de Multiplicadores. 
Será apresentada a seguir uma descrição dos quatro semestres do curso, 
destacando os pontos mais significativos dos dois anos de curso do PFM. 
 
4.3. Descrição da Formação de Multiplicadores 
A formação ocorreu ao longo de 24 meses, sendo iniciada em julho de 
2011 e encerrada em junhode 2013. Foram realizados 41 encontros com os 
multiplicadores, destes, 21 ocorreram na Vila Horizonte e 20 na PUC/SP (Campus 
Monte Alegre), tendo sido destinados 9 encontros para o planejamento do curso 
27 
 
com os educadores, 8 aulas teórico-práticas, 24 encontros interventivos para o 
planejamento, realização e compreensão dos grupos com pais e mães da 
comunidade realizados pelo ECOFAM. 
 
4.3.1. Síntese do 1º semestre (julho-novembro/2011) 
Foram realizados dez encontros com os multiplicadores ao longo do 
semestre, com duração média de 2,5 horas cada. O semestre de curso contou 
com 1 encontro teórico, 6 práticos e 3 de planejamento do curso. 
Nos dois grupos introdutórios do curso, o objetivo foi pensar, em conjunto 
com os educadores, a formação de multiplicadores. Houve presença de um 
grande número de educadores da Vila Horizonte, que relataram como 
expectativas iniciais para a formação um meio de adquirir uma base teórica para 
realizar os encontros com os pais. A formação era concebida como um curso 
conteudista que os ajudaria a transmitir conhecimento aos pais dos alunos. 
O número de crianças atendidas pelas instituições educacionais da Vila 
Horizonte era, aproximadamente, 200. 
A necessidade de formação foi enfatizada pelo ECOFAM a partir da 
percepção que os grupos reflexivos com pais favoreciam a troca de saberes e 
abriam a possibilidade de se colocar no lugar do outro. O grupo de educadores 
afirmou que havia uma grande demanda da comunidade, para a qual deveriam 
responder, pois segundo eles: “as famílias querem saber como lidar com suas 
dificuldades, precisam de apoio, trazem muitas perguntas” (Relatório 
Planejamento do curso, 27/07/11). 
As lideranças comunitárias presentes afirmaram que as famílias 
acreditavam no trabalho com as instituições e que a relação entre educandos e 
educadores era muito boa. Eles afirmaram que buscavam através do bom 
relacionamento com as crianças, melhorar a relação com as famílias. 
No encontro seguinte, lideranças da comunidade relatam que os 
educadores haviam sido divididos em três turmas para atender às necessidades 
da comunidade no que diz respeito a datas e horários dos grupos reflexivos com 
as famílias: quinta-feira à noite, sábado à tarde e domingo. A proposta dos 
educadores era se aproximar do maior número de famílias, ampliando seu 
28 
 
trabalho, procurando cobrir os horários possíveis à estas, delineando um esforço 
de aproximação intenso. Indagaram ao ECOFAM como deveriam se preparar, 
pois o próximo grupo reflexivo já havia sido marcado e seu tema definido, o qual 
realizariam por conta própria. 
Os educadores mostraram-se preocupados com o baixo número de pais 
que frequentava os grupos reflexivos, relatando que as famílias não viam sentido 
nos grupos da maneira que estes aconteciam. De acordo com um líder 
comunitário, um pai lhe disse que: “os encontros servem para desabafar e mais 
nada”. Formularam como hipótese para a baixa frequência dos pais nos grupos, a 
ausência de respostas para as dúvidas das famílias quanto a educação de seus 
filhos. Havia uma crítica à prática dialógica por parte dos educadores, que 
desejavam que a formação pudesse munir de conteúdos para transmitir aos pais 
e assim, aumentar a atratividade dos grupos para a maior quantidade de famílias 
possível. O grupo de educadores também havia decidido que não mais separaria 
homens e mulheres nos grupos de pais e que seria feita uma pesquisa com as 
famílias para verificar os melhores dias para reunião, de modo a garantir a 
presença do maior número de famílias. A questão dos educadores que marcou o 
encontrou foi: como atrair e fazer com que os pais frequentem os grupos. 
Também foi apresentada pelos educadores a possibilidade de realização de 
visitas domiciliares, como forma de conhecer e classificar os perfis de famílias da 
região. 
O ECOFAM retomou com os educadores o sentido original da formação e 
sua fundamentação dialógica, assim como a necessidade ética de realizar uma 
formação para trabalhar com pessoas. Após este encontro de planejamento da 
formação, que contou com a presença de nove interessados na formação, houve 
uma divisão do grupo e o número de interessados em realizá-la reduziu, pelo 
menos, à metade. Compreendeu-se, então, que as expectativas para o curso não 
se concretizaram, dada a diferença de paradigmas entre o modo dialógico e o 
conteudista. 
Do dia 05/09/2011 ao dia 03/10/2011, foram realizados seis encontros 
referentes ao planejamento, realização e análise dos grupos com pais (3 para 
pais e 3 para mães). Nestes encontros que faziam parte da formação, os 
educadores participaram pela primeira vez como multiplicadores. Apresentaram 
29 
 
dados e fatos sobre as demandas das famílias e do bairro. Colaboraram com o 
planejamento das atividades do grupo reflexivo e se dispuseram a preparar os 
materiais que seriam utilizados. Os educadores participaram dos grupos de pais e 
mães, de acordo com seu respectivo gênero, colaborando com sua própria 
experiência de vida, dentro da temática. Os multiplicadores também participaram 
dos encontros de análise dos grupos reflexivos em conjunto com o ECOFAM, 
colaborando com sua compreensão sobre os acontecimentos. Foi salientada a 
importância do sigilo e respeito ao outro. Cabe destacar que no grupo de mães foi 
mencionado como solução para um problema específico, um plantão para dúvidas 
educacionais, maior proximidade entre pais e educadores e a intermediação 
institucional entre escolas. 
 
4.3.2. Síntese do 2º semestre (fevereiro - junho/2012) 
Foram realizados dez encontros com os multiplicadores ao longo do 
semestre, com duração média de 2,5 horas cada. O semestre de curso contou 
com 2 encontros teóricos, 6 práticos e 2 de planejamento. 
No início do semestre, novamente, foi apresentada a preocupação do 
grupo com relação à frequência das famílias nos grupos reflexivos e seu 
envolvimento na educação dos filhos. Indagavam: “Como o convite para participar 
dos encontros chega melhor às famílias?” “Como se comunicar melhor com as 
famílias?” “Por que os pais participam mais de um encontro do que dos outros?”. 
A quantidade de pessoas que frequentava os grupos era preocupante para os 
multiplicadores quando comparada ao número de pais que era atendido pelos 
serviços oferecidos pelas instituições comunitárias. 
O grupo levantou hipóteses a este respeito, compreendendo que pais 
teriam a expectativa de falar especificamente dos seus filhos nesses encontros, e 
que, ao virem que se tratava de um tema mais amplo, acabavam não voltando, e 
também, quanto a um possível desgaste da relação entre pais, educadores e 
coordenação. Colocou-se em discussão o modo de abordar os pais e a 
consideração pelos temas de interesse das famílias, de forma que os 
participantes conseguissem se enxergar e enxergar seus filhos. 
30 
 
Os educadores demonstraram interesse em organizar estatisticamente 
dados já recolhidos para descrever as famílias participantes de seus projetos. 
O apoio às famílias também foi compreendido na formação, como o 
conhecimento dos serviços de saúde, educação e serviço social da região, 
podendo contar também com parcerias existentes no bairro, como profissionais 
da área da saúde e educação para possíveis encaminhamentos. Em um momento 
posterior, os multiplicadores realizaram a pesquisa de recursos para 
encaminhamento das demandas familiares, criando uma página no serviço de 
mapas do Google, contendo informações quanto a localização de instituições de 
saúde, de ensino, além de psicólogos, fonoaudiólogos, dentistas etc. Foi 
apontada pelo ECOFAM, a necessidade de que os multiplicadores deveriam ter 
disponibilidade para conhecer as coisas a sua volta, as políticas públicas, o CRAS 
etc. 
Ao longo do semestre, os multiplicadores ressaltaram como significativa a 
compreensão da teoria através de exemplos práticos, afirmando se utilizar

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