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Inserir Título Aqui Inserir Título Aqui Bioquímica Básica e Metabolismo Bioquímica Estrutural: Carboidratos, Lipídios, Proteínas e Água Responsável pelo Conteúdo: Prof. Me. Jefferson Comin Jonco Aquino Júnior Revisão Textual: Prof.ª Dr.ª Luciene Oliveira da Costa Granadeiro Nesta unidade, trabalharemos os seguintes tópicos: • Introdução ; • Carboidratos; • Lipídios; • Proteínas; • Água. Fonte: iStock/Getty Im ages Objetivos • Entender a estrutura bioquímica de carboidratos, lipídios, proteínas; • Compreender as propriedades bioquímicas dos carboidratos, lipídios e proteínas; • Classificar carboidratos, lipídios e proteínas de acordo com a estrutura; • Verificar a importância e exemplos dos principais tipos de carboidratos, lipídios e proteínas; • Demonstrar a estrutura da água, sua importância para as reações biológicas e equilíbrio ácido-básico. Caro Aluno(a)! Normalmente, com a correria do dia a dia, não nos organizamos e deixamos para o úl- timo momento o acesso ao estudo, o que implicará o não aprofundamento no material trabalhado ou, ainda, a perda dos prazos para o lançamento das atividades solicitadas. Assim, organize seus estudos de maneira que entrem na sua rotina. Por exemplo, você poderá escolher um dia ao longo da semana ou um determinado horário todos ou alguns dias e determinar como o seu “momento do estudo”. No material de cada Unidade, há videoaulas e leituras indicadas, assim como sugestões de materiais complementares, elementos didáticos que ampliarão sua interpretação e auxiliarão o pleno entendimento dos temas abordados. Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discussão, pois estes ajudarão a verificar o quanto você absorveu do conteúdo, além de propiciar o contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e aprendizagem. Bons Estudos! Bioquímica Estrutural: Carboidratos, Lipídios, Proteínas e Água UNIDADE Bioquímica Estrutural: Carboidratos, Lipídios, Proteínas e Água Contextualização As células do nosso organismo são compostas por proteínas, carboidratos, lipídios e água que interagem entre si e contribuem para o funcionamento adequado do nosso corpo. Dessa maneira, devemos entender a estrutura, função e contribuição em cada reação bioquímica que acontece nas nossas células. O nosso organismo sempre busca a homeostase, ou seja, um equilíbrio constante, e, para manter esse equilíbrio, nossas células produzem componentes celulares e extra- celulares, gastando energia e utilizando como base os elementos químicos a estrutura dos macronutrientes. No entanto, os alimentos e bebidas que consumimos são importantes para manter todos os processos celulares adequadamente funcionando. Cada alimento que consumi- mos pode levar a uma melhora ou piora na saúde, aumentar ou diminuir o peso, alterar pressão arterial, aumentar ou diminuir o consumo de oxigênio etc. Doenças que são cada vez mais endêmicas como, por exemplo, a obesidade, são causadas pelo consumo excessivo de macronutrientes. Filme “Muito além do peso” retrata sobre a problemática da obesidade no Brasil causada pelo consumo excessivo de macronutrientes durante a infância mesmo em localidades bastante afastadas de centros urbanos. https://youtu.be/rb-P-nk2ULA Como e porque os alimentos promovem tantas alterações no nosso organismo? A composição de cada alimento tem uma proporção de macronutrientes específicas e cada macronutriente irá contribuir com elementos químicos. Esses componentes quími- cos podem promover alterações bioquímicas nas nossas células e, por consequência, gerar efeitos benéficos e/ou maléficos. Sendo assim, é necessário entender como é a estrutura de cada macronutriente e como essa estrutura vai garantir aporte necessário para a homeostase do organismo. 6 7 Introdução As células do nosso organismo precisam de energia para permanecer vivas e re- produzirem. Energia é a capacidade das células vivas em realizar trabalho a partir dos alimentos, ou seja, transformar componentes do meio ambiente com a finalidade de produzir o que é necessário para suas atividades. O processo da produção de energia é essencial para que as células possam reali- zar as suas atividades e garantir a sua sobrevivência. Para isso, as células promovem uma ampla variedade de reações químicas que vão permitir que os tecidos corporais possam realizar suas atividades, como, por exemplo, a condução elétrica da ativi- dade nervosa, contração dos músculos, manter a temperatura corporal e a digestão dos alimentos. Os alimentos são compostos por nutrientes que podem ser divididos em macro- nutrientes e micronutrientes. Os macronutrientes são fontes de energia e podem ser classificados em lipídios, carboidratos e proteínas, já os micronutrientes são minerais e vitaminas que contribuem para a manutenção das funções celulares. Os macronutrientes podem ser classificados em carboidratos, lipídios e proteínas, e podem ter funções variadas no organismo (figura 1). Além de promoverem energia para as células, os lipídios permitem a produção dos componentes das membranas plasmáticas das células, os carboidratos podem gerar biossíntese de nucleotídeos e as proteínas podem ser utilizadas na síntese de moléculas transportadoras de oxigênio como a mioglobina (MAHAN, ESCOTT-STUMP, RAYMOND, 2013; NELSON, 2014). Figura 1 − Os macronutrientes e diferenças estruturais Fonte: med.libretexts.org Portanto, cada um desses macronutrientes são essenciais para compor a dieta de um indivíduo saudável e, para isso, é importante entender a composição estrutural de cada macronutriente e da água. O ramo da ciência que estuda a estrutura molecular e função metabólica dos com- ponentes celulares e analisa os processos químicos de produção e consumo de energia pelas células é denominado de bioquímica. Resumidamente, a bioquímica é a química da vida. 7 UNIDADE Bioquímica Estrutural: Carboidratos, Lipídios, Proteínas e Água Os organismos vivos possuem na sua composição estrutural basicamente por áto- mos de carbono, oxigênio, hidrogênio e nitrogênio. Os elementos da sua compo- sição bem como a ligação dessas moléculas permitem a formação de uma grande variedade de macromoléculas e determinam a sua função biológica. O carbono é o elemento químico que mais contribui com o peso seco das células, tem capacidade de ligação bastante versátil. O carbono forma ligações químicas simples com hidrogênio, ligações simples e duplas com o oxigênio e nitrogênio, e até ligações triplas com outro carbono (figura 2). Essa formação de ligações estáveis dos compostos de carbono é de extrema importância para a biologia. Durante a origem e a evolução dos organismos vivos, nenhum outro elemento químico possui essa diversidade de tamanho, formas e composição (MAHAN, ESCOTT-STUMP, RAYMOND, 2013; NELSON, 2014). +C . .. . H. C . .. .. H C H +C . .. . O . . ... . C . .. ..O. . . . . C O +C . .. . O . . ... . C . . .. O. . . ... C O +C . .. . N . .. .. C . .. ..N . . .. C N C . . .. C . . .. C N+C . .. . C . .. . +C . .. . N . .. .. C . . .. N... .. C N + C . .. ..C . . .C . .. . C CC . .. . +C . .. . C . .. . C. C .. .... . C C Figura 2 − Ligações simples, duplas e triplas do carbono com hidrogênio,oxigênio e nitrogênio Fonte: Nelson, 2014 A seguir, será demonstrada em detalhes a bioquímica estrutural dos carboidratos, lipídios, proteínas e água. Carboidratos Os carboidratos são produzidos por células vegetais e animais, possuem a formu- lação (CH2O)n, portanto, possuem carbono, hidrogênio e oxigênio em sua composi- ção. Os carboidratos são fontes para a produção de energia pela maioria das células do organismo humano, correspondendo de 40 a 60% do total de energia de uma dieta saudável. Os carboidratos possuem diversas funções no organismo. A principal função é ser substrato energético para as células, inclusive as células do sistema nervoso utilizam glicoseexclusivamente para manter suas funções. E ainda podem ter função estrutural como, por exemplo, a celulose, que compõe a estrutura física e rígida dos vegetais, e a ribose e desoxirribose, que formam a estrutura dos ácidos nucleicos (DNA e RNA). 8 9 Os carboidratos podem ser classificados em monossacarídeos, dissacarídeos, oli- gossacarídeos e polissacarídeos (MAHAN, ESCOTT-STUMP, RAYMOND, 2013). Monossacarídeos Os monossacarídeos são açúcares simples constituídos por uma molécula que geralmente possuem de 3 a 7 carbonos não ramificadas unidas por ligações simples. Os monossacarídeos que possuem quatro, cinco e sete carbonos em sua estrutura são denominados de tetrose, pentose e heptose. Nos alimentos, os monossacarídeos mais comuns são glicose, frutose e galactose, que possuem 6 carbonos na sua estrutura e por isso são denominados de hexoses. Essas hexoses possuem uma tendência de aparecer na forma cíclica, conforme a figura 3. HEXOSES �-D-Glicose H O C H C OH HO C H H C OH H C OH CH2OH 1 2 3 4 5 6 �-D-Galactose H O C H C OH HO C H HO C H H C OH CH2OH 1 2 3 4 5 6 �-D-Frutose 1 2 3 4 5 6 H C H C O HO C H H C OH H C OH CH2OH H OH ESTRUTURA EM ANEL CH2OH H C OH C O H H COH OHC C H OHH 1 23 4 5 6 CH2OH HO C H C O OH H COH HC C H OHH 1 23 4 5 6 CH2OH HO C H O H CH CH2OH C C HO HOH 1 2 34 5 6 Figura 3 − A estrutura das hexoses contém uma estrutura linear de6 carbonos ligados Fonte: Mahan et al., 2013 A diferença estrutural entre os 3 tipos principais de monossacarídeos da figura 3 são pequenas. A glicose e a galactose são isômeros, ou seja, possuem a mesma forma molecular, porém, possuem diferentes propriedades físicas e químicas. Na forma de cadeia linear, um dos átomos de carbono estão duplamente ligados a um carbono, essa estrutura é denominada de carbonil. Se o grupo carbonil está localizado na extremidade da cadeia de carbonos, é denominado de aldeído ou aldo- se. Se esse grupo carbonil está em qualquer outra posição, é denominado de cetona ou cetose. Na figura 3, podemos observar que a glicose e a galactose possuem um carbono duplamente ligado a um oxigênio na extremidade da cadeia de carbonos, sendo con- siderados aldoses. A frutose possui o carbono duplamente ligado a um oxigênio no carbono 2, podendo ser denominado de cetose. 9 UNIDADE Bioquímica Estrutural: Carboidratos, Lipídios, Proteínas e Água A glicemia sanguínea se refere apenas à concen- tração de glicose, que é o único substrato ener- gético para as células do cérebro. Os monossacarídeos são sólidos incolores e solúveis em água, a maioria tem sabor adocicado. A frutose é o açúcar com maior poder de dulçor. Esses monossacaríde- os não são livres na natureza, portanto, podem se associar e, dessa maneira, são mais comumente encontradas na natureza na forma de dissacarídeos e polissacarídeos (MAHAN, ESCOTT-STUMP, RAYMOND, 2013; NELSON, 2014). Dissacarídeos São a junção de dois monossacarídeos por uma ligação glicosídica em que o grupo hidroxila (OH) de uma molécula de açúcar, geralmente cíclico, reage com outro carbo- no e se condensa, liberando água (H2O). Existe uma ampla variedade de dissacarídeos na natureza, porém, os mais comuns na nutrição humana são. · Lactose: formada pela união de uma glicose + lactose; presente no leite e é produzida na glândula mamária de mamíferos lactantes; · Sacarose: formada pela união de frutose + glicose; ocorre naturalmente nos alimentos e é utilizada como açúcar de adição nos alimentos; · Maltose: formada pela união de duas glicoses; pouco encontrada na nature- za, porém, após o processo de digestão do amido (que é a junção de inúme- ras glicoses), ocorre a formação da maltose. As enzimas digestivas presentes na borda em escova trato intestinal, como lactase, maltase e sacarase promovem a quebra ou hidrólise das ligações glicosídicas dos dis- sacarídeos, para que os monossacarídeos fiquem livres e possam ser absorvidos pelas células intestinais. Essas enzimas são específicas para cada tipo de ligação glicosídica, portanto, a maltase hidrolisa maltose, lactose quebra lactose e sacarase hidrolisa saca- rose (MAHAN, ESCOTT-STUMP, RAYMOND, 2013; LANCHA, 2019). Oligossacarídeos Os oligossacarídeos são a união de 3 a 10 monossacarídeos, por isso são conside- rados polímeros curtos ligados através de ligações glicosídicas. São hidrossolúveis e também possuem sabor doce. Polissacarídeos São constituídos por 10 ou mais monossacarídeos, como, exemplo, temos o glico- gênio e o amido, formado pela ligação de inúmeros monossacarídeos. O glicogênio 10 11 possui função de ser uma reserva energética localizada no fígado e no músculo esque- lético em humanos, já o amido é uma reserva energética nos vegetais. Por exemplo, mandioca, batata e milho são alimentos ricos em amido. As caracte- rísticas sensoriais, como cor e sabor, do amido extraído de cada um desses alimentos são diferentes devido à estrutura do amido que os compõem. O amido nas plantas forma grânulos devido a suas estruturas denominadas de ami- lose e amilopectina, representados na figura 4. A amilose é uma estrutura linear for- mada pela união de glicoses ligadas de maneira linear – esse tipo de ligação glicosídica é do tipo α-1,4, ou seja, o carbono 1 de uma glicose se liga ao carbono 4 da glicose seguinte. A amilopectina é uma estrutura com ramificações a partir da estrutura prin- cipal, pois ela faz ligações do tipo α-1,6, ou seja, o carbono 1 de uma glicose se liga ao carbono 6 da glicose seguinte (MAHAN, ESCOTT-STUMP, RAYMOND, 2013; LANCHA, 2019). amilose (linear) amilopectina (rami�cada) �(1 – 6) �(1 – 4) AMIDO Figura 4 − amilose amilopectina O amido, após ser ingerido, passa por todo processo de digestão e são quebrados em moléculas cada vez menores por enzimas, até se tornarem dissacarídeos. As en- zimas α-amilase e glicosidase presentes na saliva e no intestino fazem a hidrólise dos polissacarídeos em dissacarídeos. Os dissacarídeos, ao chegarem ao intestino, sofrem ação das enzimas da borda em escova que quebram em monossacarídeos, e, então, as células intestinais podem absorver as moléculas totalmente digeridas. O amido da batata crua, por exemplo, é mal digerido, por isso o cozimento desses alimentos facilita as enzimas digestivas a hidrolisar os alimentos. Após o cozimento, os grânulos de amido incham, amaciam e rompem a parede celular vegetal. Quando ingerimos esses grânulos cozidos, isso permite maior facilidade de acesso pelas enzi- mas digestivas. Alguns tipos de amido são resistentes, pois não sofrem alterações após o cozimento. 11 UNIDADE Bioquímica Estrutural: Carboidratos, Lipídios, Proteínas e Água Os amidos alimentares, como o amido de milho, ao serem misturadas em uma solução aquosa, formam cadeias de amilopectina mais ramificadas, alterando a viscosidade e for- mando um gel; portanto, é um espessante ideal para a produção de molhos e sobremesas. O glicogênio também possui ligações do tipo α-1,4 e α-1,6, portanto, possui ra- mificações e formam grânulos no citoplasma dos hepatócitos e miócitos. As enzimas de produção e de degradação de glicogênio permanecem firmemente ligadas a esses grânulos. Quando há necessidade de liberação de glicose, as enzimas de degrada- ção do glicogênio removem as glicoses das extremidades das diferentes ramificações, permitindo maior rapidez na liberação de glicose na circulação sanguínea (MAHAN, ESCOTT-STUMP, RAYMOND, 2013; LANCHA, 2019). Figura 5 − Estrutura do glicogênio Fonte: Lancha Junior, 2019 Os polissacarídeos podem ser constituídos por unidades de monossacarídeos iguais sendo denominado de homopolissacarídeos, como o glicogênio e o amido. Quando há monossacarídeos diferentes, a estrutura é denominada de heteropolissacarídeos. A maltodextrina é a união de glicose e maltose, um polímero que varia de 2 a 20 unidades de monossacarídeos. É produzi- da a partir do amido de milho, na forma de um pó brancoque pode ser adicionado de sabor. Muitos atletas a utilizam como fonte de carboidratos na sua dieta, devido à facilidade de sua manipulação durante treinos e competições. Para aprender mais sobre o uso de carboidratos durante a atividade física, leia o artigo científico “O uso de carboidratos antes da atividade física como recurso ergogênico: revisão sistemática” que está descrito no material complementar. 12 13 Fibras alimentares As fibras alimentares são polímeros de carboidratos não são digeríveis. As fibras alimentares são constituídas de poli ou oligossacarídeos formados por moléculas de glicose (exemplos: celulose, hemicelulose e pectina), frutose (exemplo frutooligossacarídeos) ou galactose (galactooligossacarídeo). Podem ser classificadas como solúveis e insolúveis: · As fibras insolúveis podem aumentar a retenção de água nas fezes, levando ao aumento do volume das fezes e trânsito intestinal mais rápido, além de aumentar a frequência do número de evacuações; · As fibras solúveis formam géis, o que gera um trânsito intestinal e a captação de nutrientes mais lentas. Não há enzimas capazes de hidrolisar as fibras, dessa forma, passam pelo es- tômago e intestino delgado sem alterar a estrutura, chegando intacta no intestino grosso. No intestino grosso, a microbiota intestinal que são as bactérias residentes na luz intestinal fermentam as fibras e produzem compostos que selecionam a sobrevivência e crescimento das bactérias que são benéficas. Diversas fibras que são originárias de alimentos vegetais, bem como de suplementos, possuem essas propriedades prebióticas. Dentre os produtos da fermentação pela microbiota intestinal, temos os ácidos gra- xos de cadeia curta, denominados de acetato, butirato e propionato. Os ácidos graxos de cadeia curta são utilizados pelas células intestinais para produzir energia e também promovem efeitos anti-inflamatórios e na prevenção de diversas doenças (MAHAN, ESCOTT-STUMP, RAYMOND, 2013). Lipídios Os lipídios são um grupo de compostos bioquímicos que possuem uma mesma característica que é a insolubilidade. Possuem diversas funções biológicas como a composição da membrana plasmática das células, agentes emulsificantes no trato digestivo, transportadores de elétrons, hormônios, cofatores enzimáticos e mensa- geiros intracelulares. As gorduras e os óleos são as principais formas de armazenamento de lipídios nos diferentes organismos vivos, nos seres humanos as células adiposas são responsáveis por armazenar lipídios. Cada grama de lipídios contribui com 9 Kcal de energia, corres- pondendo por cerca 30% do total de energia da dieta de um indivíduo. A oxidação pelas células tem como produto final CO2 e H2O (NELSON, 2014). 13 UNIDADE Bioquímica Estrutural: Carboidratos, Lipídios, Proteínas e Água Estrutura Os lipídios também podem ser denominados de ácidos graxos, pois são compos- tos por cadeias de carbono e hidrogênio conectados através de ligações saturadas ou insaturadas. A maioria dos ácidos graxos não possuem ramificações e podem ser saturados ou insaturados. Ácidos graxos saturados possuem somente ligações simples entre os carbonos. Ácidos graxos insaturados possuem ligações simples, porém, também possuem ligações duplas. A presença das insaturações permite uma alteração na conformação dos ácidos graxos, formando regiões que permitem uma maior flui- dez de membrana. Figura 6 − Conformação dos ácidos graxos saturados e insaturados Fonte: Lancha Junior, 2019 As duplas ligações sempre são em posição cis, ácidos graxos trans são produzidos apenas após fermentação no rúmen, ou após processos industriais de hidrogenação de ácidos graxos. A nomenclatura simplificada dos ácidos graxos está de acordo com a quantidade carbonos na sua estrutura e se há ligações duplas (insaturadas) ou simples (saturadas). Por exemplo: • O ácido palmítico possui 16 carbonos ligados por ligações simples (saturadas), sen- do designado como 16:0; • O ácido oleico possui 18 carbonos ligados por ligações simples e também possui uma ligação insaturada, portanto, é denominado 18:1. Na nossa alimentação, os ácidos graxos monoinsaturados e poli-insaturados são importantes na nutrição humana por prevenirem diversas doenças crônicas. Ácidos graxos monoinsaturados possuem apenas 1 ligação dupla e os poli-insaturados pos- suem 2 ou mais ligações duplas (MAHAN, ESCOTT-STUMP, RAYMOND, 2013; NELSON, 2014). 14 15 Os ácidos graxos com instauração, atualmente muito estudados, são conhecidos como ômega-3. O ômega-3 possui esse nome devido à contagem do carbono ser diferenciado. No geral, a contagem é feita a partir do carbono que possui a carboxila (na figura 6 vemos os números em preto), porém, nesse caso, a contagem é feita começando pelo carbono mais distante do grupo carboxila (na figura 6, vemos pelos números em vermelho). O O C – �1 2 3 4 9 10 18 (a) 18:1 (�9) ácido cis-9-octadecenoico O O C – (b) 20:5 (�5,8,11,14,17) ácido eicosapentaenoico (EPA), um ácido graxo ômega-3 � 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 1234567 � Figura 7 − A) Ácido graxo monoinsaturado, com a instauração localizada entre carbono 9 e 10. B) Ácido graxo poli-insaturado, com instauração entre carbono 17 e 18, ou 3 e 4 através da contagem ômega Fonte: Nelson, 2014 Os ácidos graxos ômega-3 não são produzidos pelo organismo humano e devem ser obtidos através da dieta ou de suplementação com óleo de peixe. O óleo de peixe con- tém ácidos graxos poli-insaturados como EPA e DHA e são frequentemente prescritos para pacientes com doenças cardiovasculares. Além do ácido graxo ômega-3, o ômega-6 também não é produzido pelo nosso orga- nismo, portanto, são considerados ácidos graxos essenciais. Na alimentação, existe uma proporção considerada ideal de 3:1 ou 4:1 de ômega-6 para ômega-3. Para aprender mais sobre as propriedades dos ômega-3 e -6, leia o artigo ‘Ácidos graxos poli-insaturados ômega-3 e ômega-6: importância e ocorrência em alimentos” que está descrito no material complementar. A estrutura de hidrocarbonetos, ou seja, carbonos e hidrogênios dos ácidos graxos são res- ponsáveis por diversas propriedades desses ácidos graxos. • Insolubilidade: a cadeia de hidrocarbonetos é responsável pela baixa solubilidade em água; quanto maior a cadeia de hidrocarbonetos mais insolúvel esse ácido graxo é; • Ponto de fusão: em temperatura ambiente, os ácidos graxos insaturados perma- necem na consistência de óleo e ácidos graxos saturados permitem a consistência de cera. Por exemplo, o óleo de coco, que é rico em ácidos graxos saturados, possui a consistência em temperatura ambiente é no formato de cera. 15 UNIDADE Bioquímica Estrutural: Carboidratos, Lipídios, Proteínas e Água As ceras podem ser produzidas por glândulas com diversas finalidades como prote- ger o pelo e a pele, para que se mantenham flexíveis e impermeáveis. A cera produzida pelas abelhas é constituída por ácido palmítico com o álcool triacontanol o que garante consistência mais rígida em temperatura ambiente (25ºC). Os ácidos graxos produzidos pelo nosso organismo são sempre em posição cis, porém, a indústria alimentícia ao hidrogenar alguns óleos vegetais produzem os ácidos graxos trans. Essa hidrogenação é necessária para a produção de algumas margarinas e prolongar o prazo de validade dos óleos, ao adicionar hidrogênios os ácidos graxos oxidam, evitando sabor de ranço. Os ácidos graxos trans são prejudiciais à saúde, já que são relacionados com a incidência de doenças cardiovasculares, câncer e diabetes tipo 2 (MAHAN, ESCOTT-STUMP, RAYMOND, 2013; NELSON, 2014). Triacilglicerol É a estrutura mais simples que se forma a partir dos ácidos graxos, formada pela ligação éster de um glicerol com 3 ácidos graxos, como podemos ver na figura 8. Figura 8 – Triacilglicerol (TAG) é a união de uma molécula de glicerol com 3 ácidos graxos (representados pelas cores rosa e laranja), através de ligações éster Fonte: USP Os triacilgliceróis(TAG) podem ser armazenados no citoplasma das células do te- cido adiposo em humanos. Os TAG são estruturas apolares, hidrofóbicas, insolúveis em água. Portanto, é uma forma da célula armazenar energia de maneira eficiente, para poder utilizar no momento que for necessário. As lipases das células são respon- sáveis por liberar os ácidos graxos do tecido adiposo na circulação sanguínea, quando for necessário. Porque esse tipo de armazenamento de energia é mais eficiente do que na forma de glico- gênio? Motivo 1: As TAG são apolares, não se ligam com água, tornando essas moléculas mais leves e menores; o glicogênio é um polissacarídeo que se liga a moléculas de água, por isso possui um peso extra. Motivo 2: Além disso, cada grama de TAG contribui com o dobro de energia do que o glicogênio. Motivo 3: Ainda, o corpo de humanos e mamífe- ros possuem uma capacidade ampla em armazenar lipídios, devido à alta capacidade de expansão do tecido adiposo e às diversas localizações no corpo; já o glicogênio pode se acumular apenas no fígado e no musculo esquelético, em quantidades limitadas para o uso em poucas horas. 16 17 Membrana plasmática é constituída por lipídios estruturais: A membrana plasmática das células é uma dupla camada de lipídios que controla a passagem de íons e moléculas polares. Os lipídios de sua estrutura possuem uma região hidrofílica (polar) e outra hidrofóbica (apolares), sendo então denominados de anfipáticos. A organização das regiões apolares e polares são de acordo com a re- presentação gráfica da figura 9, na qual a região apolar do lipídeo fica no interior da membrana e a região hidrofílica fica na parte externa da membrana. Essa organização das membranas plasmáticas permite a formação de uma barreira ao redor das células, delimitando o seu tamanho (NELSON, 2014). Figura 9 − Membrana plasmática é constituída por uma bicamada lipídica que separa o meio extra e intracelular Fonte: Memorial University of Newfoundland A composição dos lipídios da membrana plasmática vai determinar a fluidez, a presença de muitos lipídios saturados nas membranas plasmáticas faz com que sejam mais compactas. Membranas mais fluidas são formadas quando há ácidos graxos in- saturados na sua composição, o que pode facilitar o transporte de moléculas entre o meio extra e intracelular. Na figura 10, podemos observar que existem proteínas e carboidratos que ficam ancorados na membrana plasmática. Essas estruturas contribuem com funções como receptores de nutrientes, água e íons, além de organizar os compartimentos celulares. Figura 10 − Membrana plasmática serve de ancoramento para várias estruturas celulares Fonte: Memorial University of Newfoundland 17 UNIDADE Bioquímica Estrutural: Carboidratos, Lipídios, Proteínas e Água Além disso, as membranas de algumas organelas também possuem uma membrana lipídica para separar os diferentes compartimentos celulares (NELSON, 2014). Esfingolipídios, Isoprenoides e colesterol: Esfingolipídios são lipídios ligados a uma esfingosina, os quais são importantes para membranas celulares. No sistema nervoso, desempenham um papel essencial na bai- nha de mielina, que isola a transmissão do impulso nervoso através do axônio, que é composta por 25% de esfingomielina, um esfingolipídeo ligado à colina. Isoprenoides são lipídios derivados do isopreno, contêm cerca de 5 carbonos na sua estrutura e fazem parte da composição do licopeno, carotenoides e clorofila, necessá- rios para a fotossíntese nas células vegetais. Ainda mais uma classe de lipídios muito importante que é o colesterol. Uma de suas funções atuar como base para a produção de hormônios como aldosterona e estrogênio, produzidos na glândula suprarrenal, ovários e testículos, respectivamente. A outra função do colesterol é na membrana plasmática das células, garantindo maior rigidez da membrana plasmática (NELSON, 2014). Proteínas As proteínas são a principal estrutura do nosso corpo e controlam praticamente todas as funções das nossas células. As proteínas são macromoléculas presentes em todas as células e em todas as partes das células. Como as proteínas são produzidas com base no nosso DNA, possuímos uma ampla variedade de tipos de proteínas e funções encontradas nos diferentes organismos. Dentre as funções das proteínas, podemos destacar: as proteínas estruturais do citoesqueleto celular; enzimas que catalisam reações bioquímicas como na geração de energia a enzima ATPase; hormônios que agem através da corrente sanguínea atingindo órgãos localizados mais periféricos; anticorpos utilizados como sinalizadores para as células do sistema imune; transportadores como, por exemplo, receptores que ficam nas membranas das células (NELSON, 2014). Estrutura dos aminoácidos As proteínas são macromoléculas constituídas pela aglomeração de diversos ami- noácidos. Os aminoácidos são a unidade monomérica da proteína que contém na sua composição estrutural nitrogênio. É importante observar que os carboidratos e lipídios não possuem nitrogênio em sua composição. As proteínas são um conjunto de aminoácidos que se unem por ligações peptídicas e formam uma sequência linear característica. Existem 20 tipos de aminoácidos que se combinam de modo diferente para desempenhar funções diferentes. Essa combinação 18 19 é determinada pelo nosso código genético, o DNA (ácido desoxirribonucleico), localizado no núcleo das células e orquestra como a síntese de determinadas proteínas irá ocorrer. Existem cerca de 20 tipos de aminoácidos conhecidos que possuem em sua estru- tura molecular átomos de carbono e nitrogênio. Como podemos ver na figura 11, a estrutura geral de um aminoácido onde há um átomo de hidrogênio (H), um grupo carboxila (COO), um grupo R e um grupo amino (NH3) ligados ao carbono alfa (Cα) central. O carbono alfa é um centro quiral em que os outros 4 grupos estão ligados (MAHAN, ESCOTT-STUMP, RAYMOND, 2013; NELSON, 2014). Figura 11 − Estrutura geral de um aminoácido Quase todos os compostos biológicos naturais que possuem um centro quiral ocor- rem na forma L ou D, devido à configuração dos 4 grupos que ficam ligados ao centro quiral, por exemplo, a L-glutamina. O grupo R varia bastante e leva a alterações nas propriedades dos aminoácidos, como solubilidade e polaridade, o que nos permite classificar os aminoácidos de acordo com o grupo R (observar na figura 12 quais são os aminoácidos de cada classificação): • Grupo R apolares, alifáticos: são hidrofóbicos, ou seja, não são solúveis em água; • Grupo R aromáticos: possuem cadeia de anel aromático em sua estrutura e são hidrofóbicos; • Grupo R polares, não carregados: são hidrofílicos, ou seja, possuem grupos em sua estrutura que permitam se ligar ao hidrogênio da molécula de água; • Grupo R carregados positivamente: são hidrofílicos e possuem carga positiva quando estão em pH 7,0; • Grupo R carregados negativamente: são hidrofílicos e possuem carga negativa quando estão em pH 7,0. 19 UNIDADE Bioquímica Estrutural: Carboidratos, Lipídios, Proteínas e Água Figura 12 – Os 20 aminoácidos mais comuns agrupados de acordo com a classifi cação do grupo R: em sombreado estão o grupo R Fonte: Nelson, 2014 Alimentos ricos em proteínas como, por exemplo, as carnes são digeridas pelo trato gastrointestinal e são hidrolisadas em pequenas unidades estruturais que são os aminoácidos. Os enterócitos, então, absorvem os aminoácidos e posteriormente po- dem ser utilizados pelas nossas células. Os aminoácidos podem ser utilizados pela via da gliconeogênese para produzir gli- cose quando não há outros nutrientes (carboidrato ou gordura) disponíveis. Para cada grama de proteína, nosso organismo pode produzir 4 Kcal (MAHAN, ESCOTT-STUMP, RAYMOND, 2013; NELSON, 2014). Síntese proteica A síntese de proteínas é um processo complexo no qual o DNA é utilizado como base para a produção de RNA (ácido ribonucleico), que, por sua vez, é utilizado como base para a produção das proteínas.Essa produção de proteínas pode ser dividida 20 21 em duas fases transcrição e tradução, que serão abordadas em maiores detalhes em outras aulas, mesmo assim, é importante entender como funciona esse processo. As bases nitrogenadas do DNA são utilizadas como referência para a produção do RNA mensageiro. A seguir, o RNA mensageiro é exportado do núcleo para o citoplasma das células, onde os ribossomos estão localizados. Os ribossomos então fazem a tradução do RNA mensageiro em proteína, através da ligação entre os ami- noácidos correspondentes à sequência. Alguns aminoácidos não podem ser sintetizados pelo nosso organismo e outros sim, portanto, podem ser classificados respectivamente em essenciais e não essenciais. Aminoácidos essenciais são aqueles que o nosso organismo não é capaz de pro- duzir ou não produz em quantidades suficientes, e, para manter uma quantidade mínima adequada, esses aminoácidos devem ser consumidos através da alimenta- ção. Sendo os aminoácidos essenciais: treonina, lisina, metionina, arginina, valina, fenilalanina, leucina, triptofano, isoleucina e histidina. Aminoácidos não essenciais podem ser sintetizados endogenamente pelo nosso organismo; através do ciclo de ácido tricarboxílico, alguns intermediários podem formar aminoácidos. A adição de um grupo amino (NH3) é denominado de transa- minação, isso acontece somente se esse grupo amino não está sendo utilizado para excretar ureia. Os aminoácidos não essenciais são: glicina, alanina, serina, prolina, cisteína, ácido aspártico, ácido glutâmico, asparagina, glutamina e tirosina. Um grupo amino não pode ficar livre no organismo porque forma amônia, que é tóxica e atravessa a membrana das células facilmente. Portanto, é necessário que esse grupo amino seja utilizado rapidamente. Para isso, o organismo usa duas vias de biossíntese: síntese endógena de aminoácidos não essenciais, ou excreção na forma de ureia pela urina. O ciclo da ureia é realizado pelo fígado com finalidade de evitar a toxicidade da amônia. O balanço nitrogenado é uma forma de avaliar como está a síntese e a degradação de proteínas pelo organismo. Ambas as vias acontecem simultaneamente, porém, em alguns momentos, uma via ocorre em maior proporção do que a outra. Portanto, a avaliação da ureia urinária e do consumo de proteínas permite avaliar se o balanço nitrogenado está positivo ou negativo. Em pacientes doentes, no qual há muita de- gradação de proteínas, o balanço nitrogenado é negativo e deve ser aumentado o consumo de proteínas por este paciente (MAHAN, ESCOTT-STUMP, RAYMOND, 2013; NELSON, 2014). 21 UNIDADE Bioquímica Estrutural: Carboidratos, Lipídios, Proteínas e Água Proteínas e peptídeos Como já dito anteriormente, os aminoácidos se juntam através de ligações pep- tídicas que vão formar polímeros. Na ligação peptídica, ocorre a liberação de uma molécula de água, a partir do hidrogênio e oxigênio do grupo amino. Verifique essa reação na figura 13. Figura 13 − Formação da ligação peptídica com liberação de uma molécula de água Fonte: Lehninger, 2014 A união de: • 2 aminoácidos formam dipeptídeos; • 3 aminoácidos são tripeptídeos; • 3 ou mais aminoácidos juntos formam oligopetídeos; • Muitos aminoácidos juntos formam polipetídeos ou proteínas. Os polipeptídeos podem ter diversos tamanhos, desde pequenos a muito grandes, com 100 aminoácidos ou ainda mais (MAHAN, ESCOTT-STUMP, RAYMOND, 2013; NELSON, 2014). Conformação das proteínas Após a formação da estrutura linear de uma proteína, ela pode ser dobrada e obter uma conformação específica para realizar determinada função. A carga negativa de um aminoácido, por exemplo, pode reagir e se aproximar de um outro aminoácido com carga positiva, alterando a estrutura tridimensional da proteína. Essas estruturas tridimensionais podem ser classificadas em: • Estrutura primária: a proteína completa é uma cadeia linear; • Estrutura secundária: atrações entre os grupos R permitem formar pregas ou hélices; 22 23 • Estrutura terciária: as hélices e pregas podem ser dobradas e formar estruturas grandes ou pequenas compactas; • Estrutura quaternária: os polipeptídeos podem formar complexos maiores que interagem entre si por interações fracas. É bastante comum formarem pontes dissulfeto entre essas estruturas maiores para estabilizar o complexo, como, por exemplo, a hemoglobina. Figura 14 − Estruturas das proteínas podem ser primárias, secundárias, terciárias e quaternárias Fonte: Lehninger, 2014 Os sítios catalíticos das proteínas são os locais em que interagem com outro ele- mento e, subsequentemente, ocorre alguma reação bioquímica. Esses sítios são for- mados pelas interações entre os grupos R de cada aminoácido e são específicas para a função de cada proteína (MAHAN, ESCOTT-STUMP, RAYMOND, 2013; NELSON, 2014). Água A água é a substância mais importante no organismo dos seres vivo, corresponde a 70% do peso dos organismos. É importante saber sobre suas propriedades bioquímicas, pois a água afeta a estrutura e a função de todos os componentes celulares. A entrada e saída de água do nosso organismo é altamente regulada para que o volume dos líquidos não aumente ou diminua. A entrada de água no nosso organismo é feita através da ingestão de líquidos e pode ser produto final de algumas reações bioquímicas, como no final da oxidação de carboidratos, por exemplo, que produz agua e gás carbônico no final da reação. A saída é regulada através do suor, urina e fezes (MAHAN, ESCOTT-STUMP, RAYMOND, 2013; NELSON, 2014). 23 UNIDADE Bioquímica Estrutural: Carboidratos, Lipídios, Proteínas e Água Estrutura A água é formada por 2 átomos de hidrogênio ligados a um átomo de oxigênio. Essa estrutura é responsável pela propriedade da água se manter líquida em tempera- tura ambiente e sólida em temperaturas mais frias (figura 15). Cada átomo de hidrogênio forma uma dupla ligação com o átomo de oxigênio que fica na região central, formando um ângulo de 104,5o, adquirindo uma conformação de tetraedro. As ligações de hidrogênio ao oxigênio são relativamente fracas, são mantidas por pequenos picossegundos e, após o desligamento, rapidamente se ligam a outro hidrogênio. Sendo assim, essas ligações oscilam o tempo todo. Figura 15 – A molécula de água é formada por dois átomos de hidrogênio ligados a um átomo de oxigênio: https://goo.gl/B2GdVA O arranjo tetraédrico permite que cada ligação de hidrogênio se ligue até 4 molécu- las de água. Entretanto, na água líquida, as moléculas de água estão desorganizadas e se movimentando continuamente, podendo se ligar com 3 a 4 moléculas de água. Sob temperaturas frias, cada molécula hidrogênio se liga a 4 moléculas de água, formando uma estrutura de rede regular fixa e bem ordenada, permitindo a formação do gelo (NELSON, 2014). O ponto de fusão da água é a 0oC e, para que ela passe do estado líquido para o sólido ou gasoso, é necessária energia térmica para modificar as ligações de hidrogê- nio, desestabilizar a estrutura e alterar a cinética do movimento dos átomos. No gelo, os átomos estão em disposição mais ordenada e, no estado líquido, estão menos or- denadas. No estado gasoso, estão completamente desordenados e, para evaporarem, é necessário que esteja sob temperaturas acima do ponto de ebulição da água que é de 100oC. Portanto, são as ligações de hidrogênio que fornecem forças coercivas necessárias para manter a água líquida em temperatura ambiente e um sólido cristalino quando está em temperaturas frias. Por que algumas moléculas dissolvem em água e outras não? As moléculas que se dissolvem na água são capazes de interagir entre as moléculas de água, de maneira que formem uma estrutura entre a água e o soluto. Essas moléculas podem ser classificadas em polar e hidrofílicas. Por exemplo, alguns carboidratos são solúveis em água como frutose e glicose. Algumas moléculas não podem formar essas interações entre água e soluto. Em soluções aquosas, as substânciasque não são hidrofílicas, não se misturam e formam agregados. Um exemplo disso seria colocar óleo na água, consequentemente, formaria duas fases em que o óleo fica sobre a água e não se mistura. Portanto, os ácidos graxos que constituem o óleo não são solúveis em água e são classificados em apolares e hidrofóbicas. 24 25 Os lipídios são biomoléculas que possuem estrutura hidrofóbica, não permitindo dissolver em água (NELSON, 2014). Além disso, existem alguns compostos que possuem uma região polar e apolar em uma mesma estrutura, essas substâncias são denominadas de anfipáticas. Os exem- plos de substâncias anfipáticas são os sabões e detergentes que possuem em sua es- trutura longa de hidrocarbonetos e uma extremidade com NH3 +, ou seja, possui uma estrutura apolar longa formado por carbonos e hidrogênios, que estão ligados a uma extremidade polar que contém sal de amônio (NH3 +). Na figura 16, a seguir, estão as estruturas de moléculas polares, apolares e anfipáticas. Figura 16 − Exemplos de moléculas polares apolares e anfi páticas Fonte: Lehninger, 2014 Por que os lipídios são importantes na estrutura da membrana plasmática das células? Toda membrana plasmática é constituída de uma bicamada de fosfolipídios: a região apo- lar fica voltada para o meio interno e a região polar fica nas extremidades, ou seja, em contato com o citoplasma e o meio extracelular (que em geral são ambientes hidrofílicos). A configuração dos fosfolipídios permite a definição dos limites das células, o controle o tráfego molecular e a fluidez dessa membrana. A água é um solvente polar que dissolve biomoléculas carreadoras que têm um pa- pel essencial no transporte de substâncias através das nossas células, além de controlar a hidratação. O NaCl (cloreto de sódio) dissolve em água, portanto, quando o NaCl entra em contato com a água, os íons se dissociam em Na+ e Cl-, enfraquecendo as interações entre eles. Assim, os íons Na+ e Cl- abandonam o estado sólido e adquirem muito mo- vimento na solução, neutralizando a sua tendência de formar uma rede cristalina ou sólida (NELSON, 2014). 25 UNIDADE Bioquímica Estrutural: Carboidratos, Lipídios, Proteínas e Água Equilíbrio ácido-básico A água tem uma tendência de ionização reversível: H2O ⇄ H++OH-. Como todas as reações reversíveis, os ácidos são dissolvidos em água e contribuem com H+ por ionização, já as bases consomem OH-. A quantidade desses íons H+ em uma solução pode ser medido através do pH. O valor de pH 7 é considerado neutro, devido a ser o valor do produto iônico da água a 25ºC. Os valores abaixo de 7 são considerados ácidos e possuem maior con- centração de H+ do que OH-. Os valores de pH acima de 7 são considerados básicos ou alcalinos e possuem maior concentração de íons OH-. Por exemplo, refrigerante possui pH 3, vinho tinto, pH 3,7, suco de limão, pH 2, portanto, são bebidas ácidas. Leite, saliva e sangue possuem pH neutro por volta de 7. O equilíbrio ácido-básico é amplamente controlado no nosso organismo, pois pode alterar a atividade catalítica de enzimas, além de prejudicar a estrutura e função de diversas macromoléculas. Uma pequena mudança de pH pode promover grandes alterações na velocidade dos processos biológicos. Para isso, o sistema de tampo- namento é essencial na regulação do pH e isso será melhor discutido na próxima unidade (NELSON, 2014). 26 27 Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Livros Krause – Alimento Nutrição e Dietoterapia MAHAN, L. K.; ESCOTT-STUMP, S.; RAYMOND, J. L. Krause – Alimento Nutrição e Dietoterapia. 13. ed. Elsevier, 2013. Filmes “Muito além do peso” Hoje em dia, um terço das crianças brasileiras está acima do peso. Esta é a primeira geração a apresentar doenças antes restritas aos adultos, como depressão, diabetes e problemas cardiovasculares. Este documentário estuda o caso da obesidade infantil princi- palmente no território nacional, mas também nos outros países no mundo, entrevistando pais, representantes das escolas, membros do governo e responsáveis pela publicidade de alimentos. https://youtu.be/rb-P-nk2ULA Leitura O uso de carboidratos antes da atividade física como recurso ergogênico: revisão sistemática. Artigo científico: O uso de carboidratos antes da atividade física como recurso ergogê- nico: revisão sistemática. Rev. Bras. Med. Esporte. Vol. 21, No 2 – Mar/Abr, 2015. Ácidos graxos poliinsaturados ômega-3 e ômega-6: importância e ocorrência em alimentos. Artigo científico: Ácidos graxos poliinsaturados ômega-3 e ômega-6: importância e ocor- rência em alimentos. Rev. Nutr., Campinas, 19(6):761-770, nov./dez., 2006. 27 UNIDADE Bioquímica Estrutural: Carboidratos, Lipídios, Proteínas e Água Referências LANCHA JUNIOR, A. H.; CAMPOS-FERRAZ, P. L.; ROGERI, P. S. Suplementação nutricional no esporte. 2 ed. Rio de janeiro: Guanabara Kooggan, 2019. cap 6. pp. 81-100. MAHAN, L. K.; ESCOTT-STUMP, S.; RAYMOND, J. L. Krause – Alimento Nutrição e Dietoterapia. 13. ed. Elsevier, 2013. cap. 3 e 7. NELSON, D. L. Princípios de bioquímica de Lehninger. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014. cap. 2, 3 , 7 e 10. 28 Inserir Título Aqui Inserir Título Aqui Bioquímica Básica e Metabolismo Sistema Tampão e Tampões Fisiológicos Responsável pelo Conteúdo: Prof. Me. Jefferson Comin Jonco Aquino Júnior Revisão Textual: Prof.ª Dr.ª Luciene Oliveira da Costa Granadeiro Nesta unidade, trabalharemos os seguintes tópicos: • Introdução; • Respiração Celular; • Regulação Ácido-Base; • Concentração de H+ e o pH dos Líquidos Corporais; • Tamponamento; • Tampões Fisiológicos; • Exercício Físico e Suplementação de Bicarbonato de Sódio e β-Alanina. Fonte: iStock/Getty Im ages Objetivos • Conhecer as respostas biológicas do organismo para manter o equilíbrio ácido-base; • Explorar os diferentes tipos de mecanismos dos sistemas tampões; • Integrar o conhecimento acerca dos sistemas tampões e sua importância na prática de exercício físico; • Estimular o pensamento crítico através de diferentes visões da literatura científica. Caro Aluno(a)! Normalmente, com a correria do dia a dia, não nos organizamos e deixamos para o úl- timo momento o acesso ao estudo, o que implicará o não aprofundamento no material trabalhado ou, ainda, a perda dos prazos para o lançamento das atividades solicitadas. Assim, organize seus estudos de maneira que entrem na sua rotina. Por exemplo, você poderá escolher um dia ao longo da semana ou um determinado horário todos ou alguns dias e determinar como o seu “momento do estudo”. No material de cada Unidade, há videoaulas e leituras indicadas, assim como sugestões de materiais complementares, elementos didáticos que ampliarão sua interpretação e auxiliarão o pleno entendimento dos temas abordados. Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discussão, pois estes ajudarão a verificar o quanto você absorveu do conteúdo, além de propiciar o contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e aprendizagem. Bons Estudos! Sistema Tampão e Tampões Fisiológicos UNIDADE Sistema Tampão e Tampões Fisiológicos Contextualização A importância do melhor entendimento do sistema tampão, da presença dos tam- pões fisiológicos e do estresse metabólico provocado pelo exercício físico permitirá aos profissionais da área uma abordagem fundamentada em busca da melhora do desempe- nho do praticante de atividade física/atleta. Antigamente, a utilização de treinamentos com grande característica de aumento de lactato que provocam grande acidose meta- bólica ficava restrita aos atletas em geral, isso porque esse tipo de treinamento induz um desconforto. No entanto, de alguns anos para cá, muitas práticas desportivas que utilizam a via anaeróbia láctica na produção energética vêm ganhando destaque para a população em geral, que se preocupa com a saúde e emagrecimento. Nesse grupo,podemos inserir, por exemplo, os praticantes de crossfit, alguns tipos de exercícios fun- cionais, dentre outras estratégias. Com isso, o entendimento dessa via metabólica, assim como estratégias que podem amenizar seu desconforto são pontos importantes que os profissionais da área devem saber atuar e manejar. 6 7 Introdução Para manter a homeostase, o corpo humano necessita de diversas adaptações fisio- lógicas. Dentre essas inúmeras adaptações, manter o equilíbrio ácido-base é uma delas. Esse equilíbrio é fundamental para que as ações enzimáticas ocorram em pH ótimo. Em eutrofia, ou seja, em condições fisiológicas normais, o pH do corpo humano varia entre 7,35 e 7,45, com a média em 7,40. Vale ressaltar que alguns quadros patogênicos, como na sepse, o pH pode variar abruptamente – inclusive a aferição do pH sanguíneo é realizada corriqueiramente nos prontos-socorros do nosso país, exatamente pela di- minuição do pH ser um fator importante no diagnóstico de sepse. No entanto, outras morbidades são capazes de alterar profundamente o pH celular. Um pH abaixo de 7,35 é classificado como um estado de acidose, enquanto um pH acima de 7,45 apresenta um estado de alcalose. A alcalose metabólica é definida como um estado metabólico em que o pH do corpo é elevado a mais de 7,45, secundário a um aumento na produção de bases orgânicas ou diminuição da produção de ácidos orgânicos. Então podemos afirmar que o sistema primário de tampão de pH no corpo humano é o sistema de equilíbrio químico entre bicarbonato (HCO3)/dióxido de carbono (CO2). Sendo: H+ + HCO3 ↔ H2CO7 ↔ CO2 + H2O O HCO3 pode funcionar como uma substância alcalina. Portanto, o aumento do HCO3 ou a diminuição do CO2 tornará o sangue mais alcalino. O oposto também é verdadeiro, no qual a diminuição do HCO3 ou um aumento no CO2 tornarão o sangue mais ácido. Os níveis de CO2 são fisiologicamente regulados pelo sistema pulmonar através da respiração, enquanto os níveis de HCO3 são regulados através do sistema renal com taxas de reabsorção. Assim, a alcalose metabólica é um aumento no nível sérico de HCO3. O corpo humano pode sofrer quatro tipos principais de distúrbios baseados no siste- ma tamponante: acidose metabólica, alcalose metabólica, acidose respiratória e alcalose respiratória. Se uma dessas condições ocorrer, o corpo humano deve induzir um con- trapeso na forma de uma condição oposta. Temos como exemplo, uma acidose meta- bólica, no qual seu corpo tentará induzir uma alcalose respiratória, tentando assim uma compensação. É raro que a compensação torne o pH completamente normal em 7,4 (BURGER; SCHALLER, 2018; HOPKINS; SHARMA, 2018). Respiração Celular Para uma melhor compreensão sobre o equilíbrio ácido-básico no corpo humano, é necessário entender sobre a respiração celular. Os seres humanos necessitam de oxigênio para produzir energia, ou seja, eles realizam uma respiração aeróbia. A maior parte da energia produzida pela respiração celular deriva da oxidação dos macronutrientes dietéticos 7 UNIDADE Sistema Tampão e Tampões Fisiológicos representados por carboidratos, lipídios e proteínas. A respiração celular aeróbia é necessá- ria para a vida humana. Entretanto, a respiração celular aeróbia apresenta um subproduto, que é o dióxido de carbono (CO2). A respiração celular aeróbia pode ser simplificada em uma equação química: C6H12O6 (glicose) + 6O2 → 6CO2 + 6H2O + energia (38 moléculas de ATP) O estado metabólico das células é sintonizado através das respostas e sinalizações extracelulares e da disponibilidade de nutrientes. A metabolização da glicose ocorre através da glicólise, seguida pela fosforilação oxidativa na mitocôndria, produzindo apro- ximadamente 30 moléculas ou mais de ATP para cada molécula de glicose. Em contra- partida, observa-se que as células normais e as células tumorais promovem uma rápida proliferação usando glicólise aeróbia, ou fermentação aeróbia, também conhecida como efeito Warburg. Efeito Warburg: foi o nome dado em homenagem ao pesquisador Otto Warburg que re- cebeu o prêmio Nobel em 1931, exatamente por desvendar um mecanismo de produção energética diferente das vias clássicas, onde ocorre a glicólise ao mesmo tempo em que a manutenção da via de fosforilação oxidativa também é induzida. Durante o passo da glicólise (com a produção de apenas 2 moléculas de ATP), o piru- vato, ou seja, o produto final da glicólise, em vez de ser importado para mitocôndrias para abastecer o ciclo de Krebs, é reduzido a lactato e secretado no meio extracelular. A escolha entre essas duas vias metabólicas é rigidamente controlada principalmente pela expressão e atividade das isoformas da piruvato quinase M (PKM), que são alteradas em células que precisam de um alto processo biossintético, como nos tumores e células do sistema imuni- tário, como os linfócitos que demandam um alto gasto metabólico para produzir lipídios, ácidos nucleicos e proteínas para a manutenção de um rápido processo de proliferação. Dessa forma, o primeiro estágio da respiração celular é a glicólise, que utiliza uma mo- lécula de glicose e a divide em duas moléculas de piruvato. Para a realização da glicólise, são utilizados dois ATP, porém, essa via pode produzir quatro ATP. Podemos ressaltar então que essa via gerou dois ATP, pois foi capaz de produzir quatro ATP, entretanto, gastou dois ATP. Até o fim desse processo, não foi necessário o uso de oxigênio. Como informado acima, o produto final da glicólise é o piruvato, logo, as moléculas de piruvato são oxidadas e entram no ciclo de Krebs. O ciclo de Krebs gera NADH da NAD+, FADH2 da FAD e dois ATP. Esse processo do ciclo de Krebs é um processo aeróbio e logo, é necessário o uso de oxigênio. O produto final da glicólise, o piruvato, vai para a mitocôndria, onde é descarboxilado para acetil-Coa com a perda de dióxido de carbono, que será exalado durante o processo de expiração. O último passo na respiração celular é representado pela cadeia de transporte elétrons. A cadeia de transporte de elétrons que será discutida com mais detalhes em outra unidade, produz a maior parte das moléculas de ATP. Para que o processo da cadeia de transpor- te de elétrons ocorra, é imprescindível o oxigênio. Caso não haja oxigênio suficiente, a 8 9 glicólise segue para outra reação, da qual o subproduto final é o ácido lático. Durante a glicólise e o ciclo de Krebs, o NAD+ é reduzido a NADH e o FAD é reduzido a FADH2. Essa redução é caracterizada por um ganho de elétrons, impulsionando a cadeia respira- tória de elétrons. Para cada molécula de glicose, dez moléculas de NAD+ são convertidas em NADH. Esse processo corresponde a uma parte da cadeia respiratória de elétrons. Desse modo, o dióxido de carbono é produzido como um subproduto do ciclo de Krebs. O dióxido de carbono é fundamental para o equilíbrio ácido-base no corpo, que é demonstrado com a seguinte reação: CO2 + H2O ↔ H2CO3 ↔ HCO3 - + H+ O dióxido de carbono formado durante a respiração celular combina com a água para criar o ácido carbônico. Esse ácido se dissocia em bicarbonato e um íon de hidrogênio (H+). Essa reação corresponde a um dos muitos sistemas de tampões do corpo humano; ela resiste a mudanças drásticas no pH para permitir que as células permaneçam dentro da faixa estreita de pH fisiológico. Esse sistema de tampão está em equilíbrio, isto é, todos os componentes da reação existem em todo o corpo. Além desse sistema de tampão citado brevemente no parágrafo anterior, o corpo humano apresenta outros sistemas de tampões, que incluem o sistema de tampões quí- micos, que engloba o tampão bicarbonato, fosfato e proteico, juntamente com os tam- pões fisiológicos, como o tampão ventilatório e o tampão renal (BURGER; SCHALLER, 2018; HOPKINS; SHARMA, 2018). Esses tampões serão abordados com maiores detalhes ao longo da unidade. Regulação Ácido-Base O equilíbrio ácido-base é um desafio para os sistemas orgânicos, pois sofrem alte- rações frequentes devido aosácidos ingeridos na dieta diária. Aqui cabe ressaltar que o tamponamento inicial dos alimentos que ingerimos ocorre no estômago. Ou seja, o ácido clorídrico que é um ácido forte e apresenta um pH de aproximadamente 2,3 é secretado durante o processo de digestão – caso houvesse um escape desse ácido para dentro da circulação sanguínea, nós não teríamos condições de manter os nossos processos fisio- lógicos e morreríamos em minutos. Cabe ressaltar esse fato porque, exatamente pela necessidade de o ácido ser tão forte no processo digestivo, no estômago, apresentamos células com funções altamente especializadas na produção de bicarbonato para rapida- mente neutralizar esse pH ácido. Aliás, esse pH tão ácido seria extremamente deletério e provocaria a morte celular das células que se encontram no estômago, isso não acontece porque existe uma espessa camada de muco que protege essas células epiteliais retendo uma quantidade enorme de bicarbonato nessa camada acima das células basais. Portanto, fica claro porque o consumo de alimentos cítricos ou ácidos não é capaz de alterar o pH sanguíneo. Quando comemos uma refeição rica em alimentos ácidos, produzimos menos ácido clorídrico pelas células epiteliais do nosso estômago. 9 UNIDADE Sistema Tampão e Tampões Fisiológicos Agora podemos entender porque utilizamos antiácidos quando estamos com um pro- blema digestivo para auxiliar no tamponamento do pH celular, assim ocorre um menor trabalho celular das células estomacais para produzir o bicarbonato. A Escala de pH Ácido Neutro Base Ácido gástrico Suco de limão Suco de maçã Suco de tomate Leite Café Água Ovo Amônia Sabonete Bicarbonato de sódio Soluções concentradas de álcalisAlvejante Figura 1 – Escala de pH Fonte: iStock/Getty Images Finalmente, podemos dizer com clareza que a ingestão de alimentos mais ácidos não influenciam no pH sanguíneo, por isso não devemos culpar esses alimentos pelo proces- so do desenvolvimento do câncer. Não há a menor evidência científica para isso, como é fisiologicamente impossível. Para um melhor entendimento do sistema tampão, primeiro precisamos compreender as definições e significados dos ácidos e bases. Assim, o íon de hidrogênio é próton único livre, liberado do átomo de hidrogênio. Essas moléculas contendo átomos de hidrogênio que podem liberar íons de hidrogênio são conhecidas como ácidos. Exemplo é o ácido clorídrico (HCl), que se ioniza na água formando íons de hidrogênio (H+) e íons de cloreto (CL-). Da mesma maneira, o ácido carbônico (H2CO3) se ioniza na água formando íons H + e íons bicarbonato (HCO3 -). A base é um íon ou uma molécula capaz de receber um H+. Um exemplo: HCO3 - é a base porque pode se combinar com H+ para formar H2O + CO2. As proteínas no corpo também funcionam como bases, pois alguns dos aminoácidos que formam as proteínas têm cargas negativas afetivas que aceitam prontamente íons H+. A proteína hemoglobi- na nas hemácias e as proteínas de outras células estão entre as bases mais importantes do corpo. Um ácido forte é o que dissocia rapidamente e libera grandes quantidades de H+ na solução, como, por exemplo, o já citado HCl. Ácidos fracos têm menos tendência a dissociar de seus íons, liberando menos H+, como o H2CO3. 10 11 Já para ser considerada uma base forte, é necessária uma rápida reação com H+, removendo espontaneamente de uma solução, por exemplo, o OH-, que reage com H+ formando água (H2O). Uma típica base fraca é o HCO3 -, que se liga ao H+ com menos força do que o OH. Nos líquidos extracelulares, são encontrados geralmente ácidos e bases fracos (H2CO3 e HCO3 -). Concentração de H+ e o pH dos Líquidos Corporais A concentração plasmática de H+ geralmente se mantém dentro de limites estreitos, sendo um valor normal de aproximadamente 0,00004 mEq/L ou 40nEq/L. Variações normais ficam entre 3 e 5 nEq/L. Porém, em condições extremas, esses valores de H+ podem variar de 10 nEq/L até 160 nEq/L, sem causar morte. Como a concentração de H+ geralmente é baixa, essa concentração é expressão em uma escala logarítmica, usando unidades de pH, sendo esse relacionado com a concentração de real de H+ pela seguinte fórmula. pH H H� �� �� � � �� ��� �log log 1 Considerando que H+ é igual a 40 nEq/L ou 0,00000004Eq/L, o pH normal é: • pH = -log [0,00000004] • pH = 7,4 O pH é inversamente relacionado à concentração de H+; portanto, pH baixo corres- ponde a uma elevada concentração de H+, enquanto pH alto equivale a uma concentra- ção baixa de H+. O gráfico abaixo ajudará a entender melhor a relação pH e H+. • pH sanguíneo = 7,4 mol/Litro • [H+] = 4 x 10-8 Eq/L Figura 2 11 UNIDADE Sistema Tampão e Tampões Fisiológicos Observem no gráfico as variações de pH e da concentração de íons H+, representado por [H+]. Figura 3 – Alcalose No gráfico acima, observe que há uma menor concentração de H+, portanto, ocorre um aumento do pH, como mostrado no gráfico e indicado pela seta vermelha. Figura 4 – Acidose O oposto também é verdadeiro, quando há uma maior concentração de H+, teremos uma menor pH, tornando a solução ácida. A tabela abaixo mostra as concentrações ideais de H+ e pH nos líquidos corporais: Tabela 1 – Concentrações de H+ e pH nos líquidos corporais Líquido extracelular Concentração de H+ (mEq/L) pH • Sangue Arterial 4,0x10-5 7,40 • Sangue Venoso 4,5x10-5 7,35 • Líquido Intersticial 4,5x10-5 7,35 Líquido Extracelular 1,0 x 10-3 a 4,0 x 10-5 6,0 a 7,4 Urina 3,0 x 10-2 a 1,0 x 10-5 4,5 a 8,0 HCl Gástrico 160 0,8 Fonte: https://goo.gl/a718Xw Vale ressaltar, nessa tabela, que observamos um pH ligeiramente menor no sangue ve- noso, exatamente por ele apresentar uma quantidade maior de CO2 difundido no sangue. 12 13 Tamponamento Após apresentarmos a relação do pH e H+, vamos discutir agora os mecanismos de tamponamento. Os ácidos são dissociados em soluções e liberam íons de H+, enquanto as bases aceitam os íons de H+ para formar íons hidroxilas (OH-). Tamponamento é um termo usado para reações que tendem a manter as concentrações de H+. Já o termo tampões se refere aos mecanismos químicos e fisiológicos que previnem essa modifica- ção do pH. As características ácido-básicas dos líquidos corporais variam dentro dos limites es- treitos, pois o metabolismo é altamente sensível às concentrações de H+ no meio re- agente. Três mecanismos regulam o pH, sendo eles os tampões químicos, ventilação pulmonar e função renal. Tampões químicos O sistema de tamponamento químico é composto por um ácido fraco e por um sal. Por exemplo, o tampão bicarbonato consiste no ácido fraco, ácido carbônico e seu sal, bicarbonato de sódio, no qual o ácido carbônico é gerado quando o bicarbonato fixa o íon H+. Com a concentração de H+ elevada, a reação produzirá o ácido fraco, portanto, os íons H+ em excesso são fixados de acordo com a reação geral: H+ + Tampão → H -Tampão Quando a concentração de H+ diminui como ocorrido durante a respiração pulmo- nar, o ácido carbônico plasmático diminui porque o dióxido de carbono deixa o sangue e sai através dos pulmões, sendo que a reação de tamponamento libera H+. H+ + Tampão ← H-Tampão O dióxido de carbono gerado no metabolismo energético reage com a água para for- mar ácido carbônico, que é relativamente fraco e dissocia-se em H+ e HCO3 -. Um ácido mais forte, o ácido lático, reage com o bicarbonato de sódio para formar lactato de sódio e ácido carbônico, sendo que o ácido carbônico dissocia-se e eleva a concentração de H+ dos líquidos extracelulares. Há outros ácidos orgânicos, como os ácidos graxos, que dissociam e liberam H+. Durante o catabolismo das proteínas, ocorre a geração dos ácidos sulfúrico e fosfórico, que também vão dissociar e liberar H+. Os tampões químicos representados por bicarbonato, fosfato e proteínas são a pri- meira linha rápida de defesa para manter o equilíbrio ácido-base, e serão os próximos tópicos a serem abordados. 13 UNIDADE Sistema Tampão e Tampões FisiológicosTampão Bicarbonato Dentre os tampões químicos, iniciaremos pelo tampão bicarbonato, que consiste em ácido carbônico (H2CO3) e bicarbonato de sódio (NaHCO3) em solução. Durante o pro- cesso de tamponamento, o ácido clorídrico (HCl), que pode ser considerado um ácido forte, é transformado em ácido carbônico (H2CO3), um ácido muito mais fraco, ao com- binar com o bicarbonato de sódio (NaHCO3). Essa combinação gera a seguinte reação: HCl + NaHCO3 → NaCl + H2CO3 ↔ H ++ HCO3 - O ácido clorídrico fornece apenas uma pequena redução do pH. Já o bicarbonato de sódio no plasma exerce uma forte ação de tamponamento sobre o ácido lático para formar lactato de sódio e ácido carbônico. A dissociação do ácido carbônico pode gerar aumento adicional na concentração de H+, e isso fará que essa reação de dissociação se desloque na direção oposta, liberando assim dióxido de carbono. Essa dissociação entrará em solução da seguinte maneira: Acidose H2O + CO2 ← H2CO3 ← H + + HCO3 - Agora, um aumento no dióxido de carbono plasmático, ou mesmo na concentra- ção de H+, promove um aumentando da ventilação pulmonar e, consequentemente, aumento da troca gasosa, eliminando o dióxido de carbono. Entretanto, uma redução na concentração plasmática de H+ diminui a ventilação pulmonar, retendo o dióxido de carbono, que se combinará com a água para aumentar a acidez (ácido carbônico), nor- malizando o pH. Alcalose H2O + CO2 → H2CO3 → H + + HCO3 - Veja que isso é extremamente interessante quando pensamos no exercício físico. Afinal, quando realizamos um treino que tenha como característica a utilização das vias anaeróbias para produção de energia, temos um quadro de aparente hiperventilação. Se formos pensar, isso seria contraintuitivo, já que esta é uma via metabólica que independe da utilização de O2 para gerar energia. No entanto, o aumento da frequência respiratória se dá exatamente para aumentar a liberação de CO2 que foi gerado em excesso pelo nosso sistema tampão. Tampão Fosfato Para discutir o sistema de tamponamento fosfato, primeiro precisamos saber em que consiste o tampão fosfato. O tampão fosfato consiste em ácido fosfórico (H3PO4) e fos- fato de sódio (NaH2PO4), sendo que essas substâncias químicas vão exercer uma função semelhante aos tampões de bicarbonato. O sistema tampão fosfato não apresenta uma função importante como tampão do líquido extracelular, porém, exerce um efeito importante sobre o equilíbrio ácido-base nos túbulos renais e nos líquidos intracelulares, pois as concentrações de fosfato nesses lugares estão sempre altas. 14 15 Os principais elementos desse sistema são H2PO4 - e HPO4 2-. Quando acrescentado um ácido forte como o HCl à mistura dessas duas substâncias, o hidrogênio é aceito pela base HPO4 2- e convertido em H2PO4 -. HCl- + Na2HPO4 → NaH2PO4 + NaCl O produto final dessa reação ocorre com a substituição do ácido forte, HCl, pela quantidade adicional de ácido fraco, NaH2PO4, e há uma queda do pH. Agora, quando uma base forte é adicionada, como NaOH, no sistema tampão fosfato, OH- é tampona- do pelo H2PO4 -, formando quantidades adicionais de HP4 2- + H2O. NaOH + NaH2PO 4 → Na2HPO 4 + H2O Nessa situação, verificamos que o ocorrido foi que uma base forte, o NaOH, foi troca- da por uma base fraca, NaH2PO4, em que, no caso, houve um discreto aumento do pH. Há dois motivos pelos quais o tampão fosfato é importante nos líquidos tubulares dos rins: a primeira é que o fosfato geralmente fica muito concentrado nos túbulos, aumen- tando assim o poder de tamponamento do sistema fosfato. O segundo fator é que o lí- quido tubular geralmente tem o pH consideravelmente menor que o líquido extracelular. Esse sistema também tem um papel importante no tamponamento dos líquidos intracelu- lares, pois a concentração de fosfato nesse líquido é bem maior que no líquido extracelular. Além do mais, o líquido intracelular tem um pH mais baixo que o líquido extracelular. Tampão Proteico As proteínas estão entre os tampões mais abundantes no corpo devido às suas con- centrações elevadas, especialmente no interior das células. O tamponamento no sangue venoso, devido à liberação do H+ pela dissociação do ácido carbônico, pode ser relativa- mente fraco, produzido a partir de H2O + CO2. A hemoglobina tem uma função muito importante de tamponamento, sendo um regulador da acidez plasmática, além de ser seis vezes mais forte na regulação da acidez que outras proteínas plasmáticas. Quando há a liberação do oxigênio das hemoglobinas para as células, ocorre uma transformação da hemoglobina em um ácido mais fraco, aumento da atividade para fixar o íon de H+. O H+, gerado quando o ácido carbônico é formado no eritrócito, combina-se prontamente com a hemoglobina desoxigenada (Hb-) na reação: H+ + Hb- (proteína) → HHb As proteínas intracelulares também exercem funções de regular o pH plasmático, como os aminoácidos, que podem possuir radicais ácidos livres, e quando dissociadas, formam OH-, reagindo com H+ para formar água. Um exemplo é o aminoácido histidi- na, o qual apresenta um anel imidazol, que dá uma característica de aceptor de prótons H+ a histidina (MCARDLE et al., 2016; HALL, 2017). 15 UNIDADE Sistema Tampão e Tampões Fisiológicos Tampões Fisiológicos Outras maneiras de regular o equilíbrio ácido-base são através dos sistemas pulmonar e renal. Pelo sistema respiratório, o equilíbrio ácido-base pode ser controlado através do aumento da ventilação pulmonar eliminando o CO2 do líquido extracelular, reduzindo assim a concentração de H+. Já pelo sistema renal, os rins controlam o balanço ácido- -base ao excretar urina mais ácida ou mais básica. Adiante, abordaremos os assuntos com maiores detalhes. Tampão Ventilatório Para manter o equilíbrio ácido-base, o corpo humano é provido de diversos meca- nismos, dentre eles, o sistema ventilatório. Esse mecanismo funciona quando há um acúmulo de CO2 nos líquidos extracelulares. Dessa forma, ocorre um aumento da venti- lação pulmonar eliminando o CO2 do líquido extracelular; à vista disso, há uma redução da concentração de H+. Por outro lado, quando há uma menor ventilação pulmonar, ocorre o aumento de CO2 no líquido extracelular, assim como ocorre à elevação da concentração de H+. Expiração pulmonar de CO2 no equilíbrio ácido-base e a formação metabólica de CO2 O dióxido de carbono (CO2) é um gás incolor que compreende aproximadamente 0,04% da atmosfera da Terra. No corpo humano, o dióxido de carbono é formado a partir do metabolismo de carboidratos, gorduras e aminoácidos, em um processo conhe- cido como respiração celular. Embora a respiração celular seja notável por ser uma fonte de ATP, ela também gera o produto residual, o CO2. O corpo se livra do excesso de CO2 ao expeli-lo. No entanto, o CO2 em sua faixa normal de 38 a 42 mm Hg desempenha vários papéis no corpo humano, como a regulação do pH do sangue, estimula a respi- ração e influencia a afinidade da hemoglobina pelo oxigênio (O2). Em um estado de hipoventilação, há um acúmulo de CO2. O aumento do CO2 pro- voca uma queda no pH, levando a um estado de acidose respiratória. Os quimiorre- ceptores desempenham um importante papel para permitir que o corpo responda às mudanças de pO2, pCO2 e pH. Os quimiorreceptores podem ser categorizados como periféricos ou centrais. Os quimiorreceptores periféricos são posicionados nos corpos carotídeos e aórticos. Os quimiorreceptores centrais estão localizados perto das superfí- cies ventrolaterais da medula. Embora os quimiorreceptores periféricos sejam sensíveis a alterações na maioria dos casos de O2 e CO2 e pH em menor grau, os quimiorre- ceptores centrais são sensíveis a mudanças na pCO2 e no pH. A célula glômica é um quimiorreceptor periférico, principalmente localizado nos corpos carotídeos e corpos aórticos, que ajuda o corpo a regular a respiração. Quando há uma diminuição no pH do sangue, uma diminuição no oxigênio (pO2), ou um aumento no dióxido de carbono (pCO2), os corposcarotídeos e os corpos aórticos sinalizam a medula (especificamente o centro inspiratório dorsal na medula) para aumentar o volume e a taxa de respiração, 16 17 então as células glômicas nos corpos carotídeos e aórticos detectam estados de hipóxia, hipoventilação e acidose. Por outro lado, os quimiorreceptores centrais não detectam estados de hipóxia. Eles detectam uma mudança na PCO2 muito rapidamente porque o CO2 se difunde através da barreira hematoencefálica e para o líquido cefalorraquidiano facilmente. Portanto, os quimiorreceptores centrais levam mais tempo para detectar uma alteração no pH arterial, porque o H+ não atravessa a barreira hematoencefálica. Quando um estado de hipoventilação é introduzido, a atividade dos quimiorreceptores centrais é aumentada. Como resultado, o sinal simpático é emitido para a vasculatura, aumentado os esforços e a frequência respiratória. Esse processo irá reconhecer se há um aumento na formação metabólica de CO2, consequentemente, também haverá um aumento da do PCO2. Com isso ocorre o au- mento da ventilação pulmonar e o CO2 é expelido pelos pulmões, e o pCO2 no líquido extracelular é diminuído. Desse modo, mudanças na ventilação pulmonar ou na forma- ção de CO2 pelos tecidos podem alterar a PCO2 do líquido extracelular. Esse mecanismo complexo de controle é o que justifica e explica o aumento da venti- lação após exercício anaeróbio que já foi discutido acima. Aqui podemos ressaltar outra perspectiva que permite ilustrar como esse sistema é fundamental para a regulação dos processos fisiológicos. A afinidade da hemoglobina pelo CO2 é maior que pelo O2, isso faz com que um aumento rápido nos níveis de CO2 sanguíneo seja uma ameaça para a entrega de O2 para os tecidos, já que a hemoglobina estará ligada ao CO2 e não ao O2, por isso nosso organismo tem que responder rapidamente a essa ameaça. Controle ácido-base pelo sistema renal Os rins desempenham um papel fundamental na manutenção do equilíbrio ácido- -base do corpo junto com os pulmões, e o fazem reabsorvendo o bicarbonato filtrado e removendo o excesso de íons de hidrogênio. No entanto, a ação do rim é essencial para o equilíbrio ácido-base e pode ser compreendida em reabsorção e produção de bicarbo- nato pelos rins e excreção do ácido. Como dito, os rins têm o papel importante de regular a concentração sistêmica de HCO3 − e, portanto, é um componente metabólico do equilíbrio ácido-base. Essa função dos rins tem dois componentes: reabsorção de praticamente todo o HCO3 - filtrado e produção de novo HCO3 - para substituir o que foi consumido. A produção ou geração de novo HCO3 − é feita por excreção líquida de ácido. Em outras palavras, os rins produ- zem o novo HCO3 − excretando o ácido. Como o HCO3 − é filtrado livremente no glomérulo, aproximadamente 4,5 molde HCO3 − é normalmente filtrado por dia (concentração de HCO3 − de 25 mM/L× taxa de filtração glomerular de 0,120 L/min × 1440 min/d). Todo esse HCO3 − filtrado é reabsorvido, com a urina normalmente essencialmente livre de HCO3 −, 70% a 80% do HCO3 − filtrado é reabsorvido no túbulo proximal; o restante é reabsorvido ao longo de segmentos mais distais do néfron. 17 UNIDADE Sistema Tampão e Tampões Fisiológicos 80% Túbulo proximal TAL 15% DT CCD IMCD 5% HCO3 – Reabsorção ao longo do néfron -0% Figura 5 – Transporte relativo de HCO3 − ao longo do néfron. A maior parte do HCO3 − fi ltrado é reabsorvida no túbulo proximal. Praticamente nenhum HCO3 − permanece na urina fi nal. CCD, ducto coletor cortical; DT, túbulo contornado distal; IMCD, ducto coletor medular interno; TAL, membro ascendente espesso Além da reabsorção de HCO3 − filtrado, os rins também produzem HCO3 - adicional além do que foi filtrado no glomérulo. Esse processo ocorre pela excreção de ácido na urina. A excreção líquida de ácido dos rins é quantitativamente equivalente à quantidade de geração de HCO3 - pelos rins. A geração de novo HCO3 − pelos rins geralmente é de aproximadamente 1 mEq/kg de peso corporal por dia (ou cerca de 70 mEq/d) e substi- tui o HCO3 - que foi consumido pela produção de ácido endógeno usual (também cerca de 70 mEq/d). Durante o aumento de cargas ácidas, ou mesmo em certas condições patológicas, os rins resultam no aumento da quantidade de excreção de ácido e a geração de um novo HCO3 -. A excreção líquida de ácido pelos rins ocorre por dois processos: a excreção de ácido titulável e a excreção de amônio (NH4 +). Ácido titulável refere-se à excreção de prótons com tampões urinários. A capacidade do néfron de excretar ácidos como prótons livres é limitada, conforme ilustrado pelo fato de que a concentração de prótons (H+), mesmo na urina pH 4,5, é <0,1 mEq. No entanto, a disponibilidade de tampões de urina (principalmente fosfato) resulta na excreção de ácido acoplado a esses tampões de urina. Em condições normais, aproximadamente um terço a metade da excreção líquida de ácido pelos rins está na for- ma de ácido titulável. A outra metade a dois terços é a excreção de NH4 +. A capacidade de excretar NH4 + sob condições de cargas ácidas é quantitativamente muito maior do que a capacidade de aumentar o ácido titulável. 18 19 Portanto, na alcalose, a perda de urina na forma de HCO3 - diminui a quantidade de excreção líquida de ácido ou a nova geração de HCO3 -. A perda de ânions orgânicos, como o citrato, na urina, representa a perda de potencial alcalina ou HCO3 −. No entanto, em humanos, a perda desses ânions orgânicos geralmente não é quantitativamente signi- ficativa no equilíbrio ácido-base de todo o corpo (MCARDLE et al., 2016; HALL, 2017). Fatores que podem aumentar ou diminuir a secreção e a reabsorção de HCO3 - pelos túbulos renais. Tabela 2 – Fatores que podem aumentar ou diminuir a secreção e a reabsorção de HCO3 - pelos túbulos renais Aumentam a secreção de H+ e a Reabsorção de HCO3 - Diminuem a secreção de H+ e a reabsorção de HCO3 - ↑ Pco2 ↓ Pco2 ↑ H+ e ↓ HCO3 - ↓ H+ e ↑ HCO3 - ↓ Volume do líquido extracelular ↑ Volume do líquido extracelular ↑ Angiotensina II ↓ Angiotensina II ↑ Aldosterona ↓ Aldosterona Hipocalemia Hipercalemia Fonte: https://goo.gl/a718Xw A figura abaixo ilustra o controle ácido base do sistema pulmonar e renal, mostrando o que foi descrito nesta unidade. CO2 + H2O H2CO3 H+ + HCO3- HCO3- Reserva de bicarbonato Outros sistemas tampão Redução na frequência respiratória Rins Pulmão Aumento na frequência respiratória Remoção de H+ Adição de H+ Figura 6 – Controle ácido base do sistema pulmonar e renal Fonte: Adaptdo de iStock/Getty Images 19 UNIDADE Sistema Tampão e Tampões Fisiológicos Exercício Físico e Suplementação de Bicarbonato de Sódio e β-Alanina Comparado ao nosso estado de repouso, o exercício físico representa um aumento substancial na demanda energética do corpo. O exercício físico estimula o sistema ner- voso simpático e induz a uma resposta integrada do corpo. Essa resposta funciona para manter um nível adequado da produção energética para o aumento da demanda em esforços físicos, metabólicos, respiratórios e cardiovasculares. O exercício físico pode alterar drástica e rapidamente muitas variáveis fisiológicas, entre eles, fluxo sanguíneo, pH e temperatura. A concentração de H+ aumentada devido à produção do dióxido de carbono e da formação de lactato durante o exercício físico vigoroso causa alterações no pH sanguíneo e, portanto, a manutenção do equilíbrio ácido-base torna-se um desafio. Estudos mostram que os íons de hidrogênio liberado pela dissociação do lactato po- dem inibir enzimas da via glicolítica, gerando assim efeitos negativos sobre a função muscular, e esse processo pode gerar fadiga periférica, prejudicando o desempenho do indivíduo praticante de exercício. Durante o exercício físico de alta intensidade, o acúmulo de piruvato ocorre pelo aumento do fluxo da glicose na via glicolítica, gerando um processo inibitório, por feedback negativo. Para
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