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Infecções fúngicas parte II INTRODUÇÃO: Deficiência dos mecanismos básicos de defesa, granulocitopenia, disfunção celular (principalmente de células T), deficiência humoral congênita ou adquirida, esplenectomia e deficiência mecânica são os principais fatores que interferem na defesa orgânica desses pacientes. Destacam-se as causadas pelo Streptococcus pneumoniae, na falta de defesa humoral; as micobactérias, na queda da defesa celular; e as bactérias gram-negativas, como também Staphylococcus aureus, nas granulocitopenias. Clinicamente, as pneumonias fúngicas manifestam-se com quadros febris em pacientes que não respondem à antibioticoterapia. Entretanto, o achado mais significativo é o de uma lesão focal no parênquima pulmonar, vista na radiografia simples e na TC de tórax. A hemocultura, a cultura de escarro e principalmente a cultura do lavado broncoalveolar constituem-se nos meios de identificação dos fungos. ASPERGILOSE: A aspergilose invasiva é a infecção fúngica mais frequente entre os imunodeprimidos neutropênicos. Na maioria das vezes, a aspergilose é restrita aos pulmões, embora seja bastante significativa a parcela de pacientes que desenvolvem sinusite e infecção do sistema nervoso central. Os sintomas mais frequentes são tosse e dispneia, podendo também haver dor pleurítica ou mesmo hemoptise. As lesões vistas na radiografia simples de tórax incluem nódulos únicos ou múltiplos, cavidades ou consolidações segmentares ou subsegmentares. Na fase inicial, a imagem mais característica vista em TC é o sinal do halo, uma área de baixa atenuação em volta do nódulo e que representa edema ou hemorragia. O sinal do halo foi descrito em mais de 90% dos pacientes neutropênicos com aspergilose invasiva, quando a TCAR foi realizada na fase inicial da doença. Em estádios mais tardios, a TCAR pode mostrar áreas de sequestro necrótico do tecido pulmonar, que se separa do parênquima que o rodeia, resultando no sinal do crescente aéreo. Infelizmente, a identificação do fungo não costuma passar de 30% dos casos. Existe uma busca constante de exames que possam indicar a presença de Aspergillus sp. no paciente imunodeprimido. Um exemplo é a detecção através de ELISA ou galactomanana, um componente da parede celular do fungo que é liberado durante a doença invasiva. O uso de anfotericina B tem sido o padrão para o tratamento. No entanto, o sucesso terapêutico continua baixo. A mortalidade chega a 70-90%. Na vigência de nefrotoxicidade, o uso de formulação lipossomal de anfotericina tem sido proposta. Mais recentemente, surgiu o triazólico voriconazol, que mostrou eficácia superior e menor toxicidade que a anfotericina B. Outra opção ainda é o uso de caspofungina, uma equinocandina, da mesma forma reservada para situações especiais. O mais importante determinante da sobrevida, no entanto, é a resolução da neutropenia, ou seja, a recuperação medular constitui-se em um fator primordial no combate ao fungo, evitando-se o desenvolvimento de complicações fatais. PNEUMONIA POR PNEUMOCYSTIS JIROVECI As pneumonias causadas pelo P. jirovecii chegaram a representar 10% das pneumonias em pacientes imunodeprimidos HIV negativos. Essa incidência caiu vertiginosamente após o uso profilático da associação sulfametoxazol/ trimetoprima. O aparecimento dessa forma de pneumonia só tem ocorrido no caso de alergia à sulfa, da não aderência ao tratamento preventivo e, eventualmente, se a infecção antecede à profilaxia O quadro clínico e a investigação diagnóstica, bem como a terapêutica, em nada diferem da descrita para pacientes portadores de HIV. A média de tempo para o início do quadro é em torno da 6a semana após o TMO. As grandes séries apontam a tosse, em geral seca, a dispneia e a febre como os sintomas cardeais, secundados pela astenia e o emagrecimento. Nos exames de imagem, costumam predominar as lesões intersticiais e/ou alveolares e infiltrados assimétricos, sendo relatados também cistos, pneumotórax e derrame pleural. A hipoxemia costuma estar presente, com marcante aumento da diferença alvéolo-arterial de oxigênio. O aumento da desidrogenase lática é comum, mas inespecífico. O achado do P. jirovecii no escarro induzido, em amostras de LBA e de LBA associado à biópsia tem sensibilidade de, respectivamente, 35-95%, 79-98% e 94- 100%. O tratamento de escolha preconizado é de doses altas de sulfametoxazol/trimetoprima por 14-21 dias. A alternativa para pacientes alérgicos ou intolerantes é o uso de pentamidina i.v. O uso de corticosteroides na fase inicial da doença em pacientes hipoxêmicos, recomendada para portadores do vírus HIV, tem sua indicação incerta entre os pacientes submetidos a TMO. INFECÇÃO POR CANDIDA SPP: As manifestações clínicas das infecções fúngicas causadas pelo gênero Candida vão desde a infecção da mucosa localizada até a disseminação com o envolvimento de múltiplos órgãos. A resposta imune é determinante para o tipo de infecção que esse fungo acarretará. A queda da imunidade celular costuma estar associada a infecções mais graves, enquanto a disseminação hematogênica pode ocorrer a partir de anormalidades anatômicas como, por exemplo, nas próteses valvares. Pacientes neutropênicos podem sofrer invasão sanguínea do fungo via gastrointestinal, como na DECH. Destacam-se os seguintes fatores de risco para a forma invasiva: a) hemopatias malignas; b) receptores de transplante de órgãos sólidos ou de células tronco hematopoiéticas; e c) pacientes submetidos à quimioterapia. Entre os pacientes previamente hígidos, mais jovens, porém gravemente enfermos, tais como traumatizados ou grandes queimados, outros fatores de risco associam-se à infecção por cândida, a saber: uso de cateter venoso central, uso de nutrição parenteral total, uso de antibióticos de largo espectro, hemodiálise e procedimento cirúrgico abdominal com perfuração gastrointestinal. A apresentação clínica da infecção pela Candida sp. pode ocorrer nas seguintes formas: • Infecção invasiva focal, na qual se destacam endoftalmite, infecção osteoarticular, meningite, endocardite, peritonite, infecção urinária, pneumonia, empiema, mediastinite e pericardite. • Candidemia e candidíase disseminada, a qual tem sido dividida em quatro grupos, a saber: candidíase relacionada a cateter, candidíase disseminada aguda, candidíase disseminada crônica e candidíase de órgãos profundos. As duas primeiras estão mais associadas a uma candidemia documentada. A incidência de candidíase invasiva é bimodal – extremos de idade – menores de 1 ano e maiores de 65 anos. As principais manifestações clínicas incluem: febre não responsiva a antibiótico de largo espectro, especialmente em situação de uso prolongado de cateter e/ou outro fator de risco maior; possibilidade de associação a infecções de múltiplos órgãos; presença de lesões macronodulares na pele ou endoftalmite por cândida; e ocasionalmente choque séptico e disfunção de múltiplos órgãos. O tratamento vigente para candidemia disseminada com cultura positiva para Candida spp. visa primeiramente à remoção de cateteres, a exclusão de flebite séptica, endocardite ou abscesso. A espécie prevalente é Candida albicans. O paciente estável dever ser tratado com fluconazol por mais 14 dias após o desaparecimento de todos os sinais e sintomas da infecção. Para pacientes instáveis ou em deterioração, com candidemia persistente por mais de 5 sdias, considerar o acréscimo de caspofungina ao fluconazol ou à anfotericina B. Para C. glabrata, da mesma forma pode-se usar fluconazol (800 mg/dia) ou caspofungina (50mg/dia) ou anfotericina B (0,7- 1,0mg/kg/dia). Para C. krusei, deve-se aumentar a caspofungina inicial para 70 mg/dia,seguida de 50 mg/dia, ou voriconazol (6 mg/kg cada 12 h, seguida de 3mg/kg cada 12 h). De modo geral, histoplasmose, coccidioidomicose e paracoccidioidomicose comprometem indivíduos imunocompetentes enquanto aspergilose, candidíase, criptococose e pneumocistose comprometem indivíduos imunodeprimidos. DOENÇA PULMONAR FÚNGICA NO INDIVÍDUO IMUNOCOMPROMETIDO: As populações em risco incluem indivíduos portadores de neoplasias sólidas e hematológicas, submetidos a transplantes de órgãos ou de medula óssea e portadores do HIV, além de outros com risco considerado intermediário, como pacientes em uso de corticoidoterapia crônica ou imunossupressores, insuficiência renal crônica, doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) e cirrose hepática. ACOMETIMENTO TOMOGRÁFICO NO TÓRAX: - Opacidades em vidro fosco = achado mais comum na P. jiroveci pelo acúmulo intra- alveolar de fibrina, débris e microrganismos. Predomínio de vidro fosco nos lobos superiores e tende a poupar a periferia. Pavimentação em mosaico. Opacidade em vidro fosco é o achado mais frequente nos pacientes com PCM sem tratamento, de distribuição esparsa; reflete o espessamento intersticial intralobular por inflamação com ou sem preenchimento do espaço aéreo que pode ter fibrose. Na forma crônica ou após o tratamento evolui para fibrose com surgimento de opacidades reticulares caracterizadas por espessamento do feixe peribroncovascular, enfisema paracicatricial, bronquiectasias de tração, bandas parenquimatosas e distorção arquitetural. - Nódulos = são achados frequentes na criptococose, PCM e coccidioidomicose e fungos invasivos (aspergilose, mucormicose e candidíase). Nódulos múltiplos de predomínio periférico, especialmente se associados a halo em vidro fosco, são típicos da manifestação angioinvasiva da aspergilose nos pacientes neutropênicos febris. Na evolução da doença, os nódulos progridem para necrose central e escavação, com surgimento de conteúdo aéreo no interior das lesões, descrito como sinal do “crescente aéreo”, características morfológicas tipicamente observadas duas a três semanas após início do tratamento, coincidindo com a resolução da neutropenia. Nódulos móveis no interior de escavação pulmonar também são característicos na apresentação saprofítica da aspergilose. Nódulos e nódulos escavados, bem como opacidades nodulares centrolobulares, são padrões frequentes na paracoccidioidomicose sem tratamento, achados que mais frequentemente predominam nos campos pulmonares periféricos, posteriores e com pequeno predomínio nos campos pulmonares médios. Nódulos pulmonares e massas predominam na criptococose, geralmente com distribuição periférica. Embora escavação dos nódulos possa ser observada tanto em imunocompetentes quanto em imunocomprometidos, é descrita como mais frequente no último grupo. A forma aguda da coccidioidomicose tem como apresentação tomográfica típica a de nódulos irregulares de dimensões variáveis com tendência a confluência e escavação, sendo de particular importância a observação deste aspecto em indivíduos provenientes de regiões semiáridas no nordeste do Brasil. Há associação da doença com o hábito de caça de tatus, e o aspecto imaginológico disseminado possivelmente decorre da aspiração maciça de fungos oriundos do solo contaminado durante o processo de retirada do animal dos buracos. Merece nota o fato de que a apresentação nodular de doenças fúngicas pode ser confundida com doenças neoplásicas, especialmente quando há nódulos irregulares. - Sinal do halo e halo invertido = O sinal do halo refere-se à presença de atenuação em vidro fosco envolvendo um nódulo, sendo primeiramente descrito na manifestação angioinvasiva da aspergilose em indivíduos imunodeprimidos, e nesses casos representa, histopatologicamente, área de infarto envolvida por hemorragia alveolar. Considerando as doenças fúngicas, sua apresentação é descrita, além da aspergilose, na mucormicose, candidíase, coccidioidomicose e criptococose. O sinal do halo tem particular importância em indivíduos imunossuprimidos, nos quais a especificidade é maior para manifestação angioinvasiva de alguns fungos, especialmente a aspergilose. Sua ocorrência é usualmente transitória, mais frequente nos estágios iniciais da doença. Em contraponto, o sinal do halo invertido refere-se a opacidade focal em vidro fosco circundada por anel de consolidação, completo ou parcial. Na tentativa de estreitar o diagnóstico diferencial de doenças com apresentação de halo invertido, a presença de reticulação interna, espessura do halo periférico > 1,0 cm e a presença de derrame pleural favorecem o diagnóstico de doença fúngica angioinvasiva em favor de pneumonia em organização, dentro do contexto clínico adequado de imunossupressão. Na paracoccidioidomicose, bem como em outras doenças granulomatosas como a tuberculose, pode ser observada uma variação do halo invertido, com presença de margens nodulares. - Consolidações = Seguindo a apresentação nodular, é o segundo achado mais frequente na criptococose, com distribuição predominantemente periférica. Considerando indivíduos imunodeprimidos, a doença fúngica angioinvasiva (aspergilose, mucormicose, candidíase) pode levar a consolidações, usualmente de distribuição periférica, e também pode apresentar halo em vidro fosco relacionado a hemorragia alveolar. Apresentações avançadas da pneumocistose também podem cursar com consolidação, e sua ocorrência é mais frequente em pacientes não HIV, tendendo a ter desenvolvimento mais rápido, refletindo dano pulmonar pela resposta imune do hospedeiro. - Padrão miliar = Micronódulos de disseminação randômica (miliar) é apresentação comum a múltiplas micoses pulmonares, sendo descritos mais frequentemente na histoplasmose, paracoccidioidomicose, coccidioidomicose e candidíase, esta última mais observada nos pacientes imunodeprimidos. - Escavações = Lesões escavadas podem ser observadas em múltiplas doenças fúngicas, como as doenças angioinvasivas (aspergilose, mucormicose, candidíase), as manifestações semiinvasiva (necrosante crônica) e saprofítica da aspergilose, a histoplasmose, a paracoccidioidomicose, a criptococose e a coccidioidomicose. A aspergilose semi-invasiva ou necrosante crônica é a manifestação granulomatosa crônica da aspergilose, apresentando-se, clinicamente, por tosse produtiva, febre e hemoptise com duração de alguns meses. Compromete indivíduos com imunocomprometimento leve, como portadores de DPOC, alcoolistas, diabéticos e portadores de doenças do tecido conjuntivo. Nos estudos tomográficos observam-se sinais de broncopneumonia e consolidações de predomínio nos lobos superiores, que evoluem para lesões escavadas de paredes espessas, inclusive com aspergilomas. Lesões escavadas podem estar presentes na histoplasmose, tanto na forma aguda quanto na crônica, tendendo a ser mais frequentes em pacientes com doenças pulmonares crônicas, como DPOC, e indivíduos com imunossupressão. Na forma escavada crônica, os sintomas são semelhantes aos da tuberculose pós-primária, com febre baixa, tosse, hemoptise e perda ponderal. Nos métodos de imagem são observadas opacidades reticulares associadas a lesões escavadas, com predomínio nos campos pulmonares superiores. Na forma saprofítica da aspergilose, o fungo desenvolve-se no interior de lesões escavadas, especialmente relacionadas a tuberculose, sarcoidose e outras. A presença de nódulo ou massa móvel no interior de escavação é a manifestação típica da aspergilose saprofítica. - Doençadas vias aéreas = A aspergilose broncopulmonar alérgica é uma manifestação clínica incomum de doença das vias aéreas e decorre de uma reação de hipersensibilidade complexa ao Aspergillus. Compromete especialmente indivíduos asmáticos de longa data, mas também portadores de fibrose cística, síndrome de Kartagener e pacientes com transplante pulmonar. O acometimento leva a aumento na produção de muco e prejuízo no clearance ciliar, resultando em dano à parede brônquica, impacção mucoide e bronquiectasias. Os achados tomográficos que merecem atenção são as bronquiectasias centrais (segmentares e subsegmentares), especialmente nos campos pulmonares superiores, associadas a impacção mucoide. Destaca-se que em cerca de 30% dos pacientes a impacção mucoide será hiperdensa ou com calcificações. Especialmente nos indivíduos neutropênicos imunodeprimidos e naqueles com síndrome da imunodeficiência adquirida, pode sobrevir a manifestação invasiva das vias aéreas da aspergilose. O espectro da doença se estende desde comprometimento de grandes vias aéreas (traqueia) até das pequenas vias aéreas. O comprometimento das pequenas vias aéreas pode ocorrer na forma de bronquiolite, com nódulos centrolobulares, “árvore em brotamento” e consolidações peribroncovasculares, ou broncopneumonia, com padrão semelhante ao das broncopneumonias em geral. - Acometimento mediastinal = A mediastinite fibrosante resulta de resposta imune do hospedeiro determinando proliferação de tecido denso fibroso no mediastino, cuja causa permanece indefinida em vários casos. Pode ser idiopática, secundária a doenças neoplásicas infiltrativas ou causas infecciosas, entre elas tuberculose, aspergilose, mucormicose, criptococose e, especialmente, histoplasmose, esta última sendo causa importante particularmente em locais endêmicos. Afeta especialmente indivíduos jovens, com manifestações clínicas variáveis e usualmente relacionadas a compressão de estruturas mediastinais vitais. Ao estudo tomográfico caracteriza-se lesão sólida infiltrativa com densidade de partes moles e realce variável, que compromete especialmente o mediastino médio, podendo apresentar calcificações. Comprometimento de linfonodos mediastinais é descrito em algumas micoses, particularmente na histoplasmose, criptococose, coccidioidomicose e, de modo menos frequente, na paracoccidioidomicose. Linfonodomegalias disseminadas são descritas na criptococose e histoplasmose, especialmente quando relacionadas a imunossupressão. Eventualmente, podem ser observados linfonodos com centro necrótico. - Derrame pleural = possível, porém incomum. Mais presente na mucormicose. - Acometimento de parede torácica = Envolvimento da parede torácica pode ser observado como extensão do acometimento pulmonar na aspergilose, determinando lesões líticas em arcos costais e vértebras, sendo mais bem caracterizado nos estudos de tomografia e ressonância magnética.
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