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Aula 2 De onde vêm os dados na área de Segurança Pública? Um panorama das principais fontes Doriam Borges 2 Aula 2 • De onde vêm os dados na área de Segurança Pública? Um panorama Aula 2 • das principais fontes Aula 2 • Meta Apresentar as principais fontes de informação na área de segurança pú- blica, de forma a desenvolver uma avaliação crítica na leitura de dados da área. Objetivos Espera-se que após o estudo esta aula, você seja capaz de: 1. Citaras principais fontes de dados na área de Segurança Pública; 2. Avaliar a confiabilidade de uma fonte de dados; 3. Avaliara relevância dessas fontes de dados; 4. Selecionar a fontemais apropriada para atingir o objetivo do estudo. 3 Estatística Aplicada à Segurança Pública Quais as novidades das estatísticas na área de Segurança Pública? Você sabia que a produção de estatísticas na área de segurança pú- blica ainda apresenta dificuldades de diferentes tipos? De um lado, as próprias características das atividades de segurança pública fazem com que a sua identificação e acompanhamento sejam difíceis. Essas ativida- des atravessam diferentes setores e envolvem diferentes disciplinas; por esse motivo, os levantamentos que normalmente são realizados pelos organismos de produção de informação estatística não costumam ser incorporados às atividades diárias de gestão pública e de decisão estra- tégica das instituições de segurança pública. De outro lado, parte dos responsáveis pela gestão pública de segurança ainda não dão o devido valor aos benefícios que a estatística pode gerar no cotidiano de tra- balho. Infelizmente, não existe uma “cultura da informação” em nosso país, em especial nas instituições de segurança pública, o que, conse- quentemente, afeta o investimento da produção de dados que poderiam ser utilizados na gestão. Um elemento adicional que dificulta a produção e divulgação de es- tatísticas de segurança pública é a própria transversalidade que se ma- nifesta no contexto das instituições interessadas na produção e no seu uso. Em outras palavras, existe uma variedade de produtos atuais ou potenciais de estatísticas relacionados com a diversidade de campos de aplicação da segurança pública. Isto exige um esforço para coordenar e direcionar as melhores ferramentas com o objetivo de maior aplicação dessas estatísticas. A este conjunto de dificuldades de ordem geral, acrescentam-se as que derivam das características dos sistemas de informação das institui- ções de segurança pública. Atualmente, não se observa uma produção periódica e sistemática de estatísticas de segurança pública por parte da maioria dos organismos dedicados às áreas de violência, criminalidade e segurança pública. Os programas de trabalho destasinstituições ami- úde estão limitados pela disponibilidade de recursos humanos e mate- riais. Portanto, embora se conte com um instrumento metodológico, é preciso levar em consideração as restrições dos organismos nacionais. Considerando essas questões, nesta aula, você conhecerá as princi- pais fontes de dados na área de segurança pública, quais as suas limita- ções e as principais dificuldades na coleta de informações de violência e criminalidade. Não obstante, neste capítulo, você poderá descobrir 4 Aula 2 • De onde vêm os dados na área de Segurança Pública? Um panorama Aula 2 • das principais fontes Aula 2 • como estimar o número de pessoas vitimizadas por roubo, bem como verificar qual é a taxa de notificação de um crime à polícia. Vamos falar um pouco sobre as principais Fontes de Dados de Segurança Pública Na construção de estatísticas de segurança pública, é necessário o uso de informações confiáveis que representem as instituições avaliadas. Existem duas maneiras de obter dados sobre criminalidade, violência e segurança pública. Uma delas éatravés de pesquisas do tipo survey, também chamadas pesquisas amostrais. As pesquisas do tipo survey são pesquisas quantitativas com questionário estruturado aplicado apenas a uma parte da população estudada. Se vocêprecisa de informações sobre um grupo determinado, não há necessidade de investigar todos os indi- víduos. Você pode trabalhar com uma amostragem estatística, que é um procedimento através do qual é possível conhecer as características de um grande grupo de pessoas referindo-se a um número bem menor de indivíduos. Exemplos de pesquisas do tipo survey seriam as de intenção de voto, pesquisas de vitimização e também as várias pesquisas realiza- das pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), como a Pesquisa Nacional por Amostragem Domiciliar, Pesquisa de Orçamento Familiar, Pesquisa Mensal de Emprego, etc. Outras fontes de dados provêm dos registros, os quais, diferente- mente das pesquisas amostrais, são resultados de procedimentos que devem ser efetuados quando um tipo de crime ocorre ou a instituição recebe algum chamado. Por exemplo, quando ocorre um crime, este deve ser comunicado às autoridades, e nesse momento é preenchido um registro administrativo, neste caso, o boletim ou registro de ocorrência; ou quando um guarda municipal é chamado para atuar na mediação de algum conflito, um talão também é preenchido com as descrições das atividades realizadas (nem todas as guardas municipais, bem como outras instituições de segurança, possuem informações sobre todas as suas atividades, mas já existem modelos interessantes que estão sendo aplicados). O agrupamento dos vários registros das atividades conforma um banco de dados sobre o trabalho da instituição. O mesmo ocorre com a Declaração de Óbito, que, segundo a legislação brasileira, é um documento obrigatório para o sepultamento. E também, neste caso, o agrupamento das várias Declarações de Óbito constitui uma fonte de dados que provém de registros oficiais. 5 Estatística Aplicada à Segurança Pública Além das duas maneiras de obter dados sobre criminalidade e vio- lência, outra fonte são os dados administrativos das instituições de se- gurança pública que possuem informações sobre os recursos humanos e materiais, os custos, enfim, conhecimento importante para controle, aperfeiçoamento e gestão das instituições de segurança pública. Vale ressaltar que o levantamento dos dados por essas fontes é re- sultado de diversas relações sociais, que devem ser cuidadosamente consideradas na análise, para assegurar a credibilidade do estudo. O modo com que o responsável pelo registro realiza sua tarefa, seja ele um policial servindo na rua ou numa delegacia, um escrivão de justiça ou ainda um médico no hospital ou no Instituto Médico Legal (IML), influencia a base que caracteriza o sistema de dados esta- tísticos. E, mesmo existindo categorias preestabelecidas, o registro sempre é feito baseando-se na interpretação de um indivíduo sobre aquilo que presenciou ou percebeu como sendo realidade. Além dis- so, muitas instituições de segurança pública no Brasil não possuem um sistema de informação ainda. Assim, torna-se necessário que to- das as organizações estejam inseridas em uma “cultura da informa- ção”, que venha ajudar na implementação de produção de estatísti- cas, bem como em planejamento estratégico baseado em resultados. uando as informações vêm dos registros das Polícias Estaduais Conforme foi apresentado anteriormente, uma das principais fon- tes de dados sobre segurança pública advém dos registros das polícias estaduais. De acordo com a Constituição de 1988, as polícias estaduais se dividem em duas: a Polícia Militar, responsável pelo policiamento ostensivo, e a Polícia Civil responsável pelos procedimentos judiciários e investigativos. As estatísticas criminais podem ser coletadas a partir do BO – Boletim de Ocorrência –, que é um documento oficial emitido pelas delegacias de Polícia Civil quando é registrada uma queixa. Na Polícia Militar, o documento preenchido quando há algum atendimento é chamado TRO – Talão de Registro de Ocorrência. Além do TRO pre- enchido, a Polícia Militar recebe chamadas via telefone,que configuram outra fonte de informação. Dessa forma, se o seu objetivo é conhecer a incidência de roubos de celular, então deve buscar essa informação no banco de dados formado pelos registros policiais. Vale ressaltar que nem todas as pessoas que tem o seu celular roubado registram ocorrência na 6 Aula 2 • De onde vêm os dados na área de Segurança Pública? Um panorama Aula 2 • das principais fontes Aula 2 • polícia. Esses casos são conhecidos como sub-registros ou subnotifica- ções, ou seja, casos em que o evento criminal não foi comunicado às autoridades policiais, ainda que, por sua natureza, deveriam ser levados ao conhecimento da Polícia. Nos últimos anos, a Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP) vem investindo esforços para construir um sistema acional de estatística criminal, a partir da coleta de informações nas Secretarias Estaduais de Segurança Pública. Esse esforço se tornou institucionalizado a partir de 2004, com a criação do Sis- tema Nacional de Estatística de Segurança Pública e Justiça Cri- minal (SINESPJC), e em 2012, com a promulgação do Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública, Prisionais e so- bre Drogas (SINESP), cujos objetivos são buscar e padronizar as classificações de ocorrências policiais e ampliar a coleta dos da- dos nacionalmente, incluindo o percentual de cobertura de cada estado. Entretanto, ainda não há uma periodicidade na divulga- ção das informações coletadas pela SENASP. Para que você tenha uma ideia de como são os dados oriundos dos registros policiais, vou listar alguns problemas que as autoridades esta- duais de nosso país enfrentam para coletar e registrar as ocorrências de crimes e identificar as vítimas e os criminosos: • A informação não é coletada de forma sistemática. Em alguns es- tados, as organizações policiais não produzem estatísticas sobre as suas atividades mensalmente; • Algumas estatísticas criminais não possuem informações sobre o dia e a hora, a cidade ou bairro, ou a posição entre as ruas onde o crime ocorreu; • Em muitos casos, não há registro estatístico das circunstâncias em que os crimes foram cometidos. Não se conhecem as perdas mate- riais ou físicas, ou o dano sofrido pelas vítimas, nem aspectos “am- 7 Estatística Aplicada à Segurança Pública bientais” do delito, ou seja, horário, localização geográfica, se houve uma condição física específica, como áreas escuras, sem assistência, que aumentam a possibilidade de vitimização, entre outras coisas; • Em alguns estados, há pouca visibilidade ou não há periodicidade na divulgação das estatísticas criminais, impossibilitando a construção de séries históricas; • Existem estados em que os delitos não podem ser desagregados se- gundo as circunstâncias, mas são tomados de forma geral, como, por exemplo, o homicídio. Em geral, os crimes podem ter variantes que são extremamente relevantes para um diagnóstico específico para definição de políticas públicas, como no caso de homicídios por faca, por arma de fogo, por acidente de trânsito ou causado por briga. To- davia, o homicídio poderia ser desagregado ainda mais, por exem- plo: presença de álcool ou drogas ilícitas, defesa da honra, relação com o tráfico de drogas, brigas entre gangues, etc. Se um policial ou um gestor de políticas públicas tiver acesso a essas informações e souber utilizá-las, o seu trabalho, provavelmente, seria muito mais eficaz e eficiente; • Há sobre-representação de alguns crimes devido à duplicação do re- gistro de um mesmo fato delituoso; • Existe uma série de crimes não comunicados à polícia (subnotifica- ção e sub-registro), seja por falta de confiança nas autoridades ou por considerar que não tem sentido fazê-lo, seja por não acreditar na eficiência das instituições ou pelo tempo gasto para denunciar; • A falta de tecnologia apropriada para a coleta e a crítica dos dados é um problema comum entre as instituições de segurança pública no Brasil; • Algumas instituições desencorajam as queixas dos indivíduos; • Em geral, não se tem muitas informações sobre a vítima ou, quando obtidas, essas informações não são de qualidade. Além da idade e do sexo da vítima, seria muito interessante saber a cor, o estado civil, a renda, a profissão, etc.; • Nos sistemas estatísticos de nosso país, não há informações sobre os agressores; • Pouco se sabe sobre a relação entre a vítima e o agressor. 8 Aula 2 • De onde vêm os dados na área de Segurança Pública? Um panorama Aula 2 • das principais fontes Aula 2 • Atividade 1 Atende ao objetivo2 Baseado no que foi relatado anteriormente sobre os dados de segurança pública no Brasil, qual a sua opinião sobre as estatísticas de criminalida- de e violência que são produzidas a partir dos registros policiais? Resposta Comentada Podemos dizer que as estatísticas de criminalidade e violência no Brasil não são confiáveis, já que não existe sistematização e a cultura da infor- mação em segurança pública ainda não é definida como prioridade pelos gestores. Isto significa que o processo de geração das estatísticas é falho na origem, e observamos que os dados não são válidos nem confiáveis. Logo, qualquer análise, conclusão e decisão com base nessas estatísticas não serão totalmente úteis, se não se conhecer bem os seus problemas e não se fizer uma análise crítica minuciosa dos dados. É digno de nota que essas ques- tões se referem mais especificamente às estatísticas de violência e crimina- lidade no contexto nacional, e não nos níveis estaduais. Existem estados que possuem sistemas de informação mais consolidados, apesar de também apresentarem alguns dos problemas técnico-metodológicos na geração da informação. Por outro lado, existem estados que não possuem controle e crítica sobre seus registros oficiais. Apesar das estatísticas oriundas dos registros policiais apresentarem problemas, é importante que você saiba que os dados oriundos de regis- tros policiais são uma ferramenta de grande relevância no desenvolvi- mento de políticas públicas. Entretanto, esses dados devem ser usados em conjunto com outros instrumentos, como as pesquisas de vitimiza- ção, e outras fontes de informação (Sistema de Informações sobre Mor- talidade – SIM, para os casos de mortalidade violenta, como veremos mais a frente, entre outros). Uma vez que você considera essas e outras fontes de dados para mensurar os fenômenos de violência e criminali- dade, isso permite identificar tendências, padrões e circunstâncias em que o crime ocorre, e, assim, você poderá obter um conhecimento mais concreto acerca da realidade. 9 Estatística Aplicada à Segurança Pública Dessa forma, apesar de todos os problemas que as estatísticas oriundas dos registros policiais possuem, elas representam um pon- to de partida para a construção de um quadro sobre a realidade da violência e da criminalidade. As estatísticas produzidas pelas ocorrências atendidas pelas Guardas Municipais Você sabia que a Constituição de 1988 autoriza os municípios a cons- tituírem Guardas Municipais visando à proteção de seu patrimônio, bens e serviços? Esse papel de segurança patrimonial tem sido bastante ampliado e redefinido sem que se viole o preceito constitucional. Segun- do o artigo 144, § 8º, “os municípios poderão constituir guardas muni- cipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, confor- me dispuser a lei”. Assim, as atividades das Guardas Municipais são uma fonte de dados de suma importância para a geração de diagnósticos so- bre a realidade local, que serão úteis para o desenvolvimento de políticas para a redução da criminalidade e controle da ordem social. Através de informações oriundas das atividades das Guardas Municipais,é possível inferir um conjunto de informações que oferecem um retrato geral da situação dos municípios no que diz respeito à segurança pública. Vamos trabalhar com os dados da Saúde? O Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) como alternativa para a análisede mortes violentas Em todo o mundo, pesquisadores e gestores públicos utilizam as ta- xas de mortalidade e as causas de morte como instrumentos de análise da situação de saúde de populações. A seleção da Causa Básica de Morte é feita pelo médico, segundo padronização da Organização Mundial de Saúde, pela 10ª Revisão da Classificação Internacional de Doenças, que tem sido utilizada desde 1996. No período de 1979 a 1995, utilizou-se a 9ª Revisão desta classificação. Entre as causas do óbito, destacamos: Do- enças dos Aparelhos Circulatório, Respiratório e Digestivo, Neoplasias (tumores) e Causas Externas (Homicídios, Acidentes e Suicídios). Em 1976, o Ministério da Saúde criou o Sistema de Informação so- bre Mortalidade (SIM), com o objetivo de implementar um sistema na- cional de informações para o setor de Saúde. O instrumento utilizado para captação destas informações é a Declaração de Óbito. De acordo 10 Aula 2 • De onde vêm os dados na área de Segurança Pública? Um panorama Aula 2 • das principais fontes Aula 2 • com a Lei nº 6.015, de 31/12/73, com as alterações introduzidas pela Lei nº 6.216, de 30/06/75, vigente no Brasil, nenhum sepultamento pode ser realizado sem a Declaração de Óbito. Essa declaração deve ser pre- enchida, baseando-se no atestado médico ou, na ausência de médico, por duas pessoas qualificadas que tenham presenciado ou constatado a morte. A Declaração de Óbito contém, basicamente, idade, sexo, es- tado civil, profissão, naturalidade, raça/cor e local de residência do(a) falecido(a), a assistência médica, local, data e as causas do óbito. Além disso, para menores de 1 ano ou óbitos fetais, são coletadas algumas informações sobre a situação da mãe e da gravidez. As causas externas ou mortes violentas são declaradas em formulá- rio padronizado, de preenchimento obrigatório pelos médicos legistas. Vale ressaltar que a definição de morte violenta dada pelo SIM é di- ferente da dada pelas polícias. Pelo SIM, os homicídios são definidos segundo a Classificação Internacional de Doenças (CID-10), enquanto para as polícias, a definição é feita segundo o Código Penal. Com isto, por exemplo, as mortes por homicídio classificadas pelo SIM abran- gem mais de um tipo de morte violenta registrado pelas polícias. Deste modo, as taxas de homicídio contabilizadas pelos dados da saúde são sempre maiores que as contabilizadas pelas polícias, uma vez que a po- lícia não registra como homicídios os casos em que a vítima não morre imediatamente após a agressão. Outra diferença entre as duas fontes é que, para a polícia, os dados se referem ao local da ocorrência do fato, enquanto para o SIM referem- -se ao local do óbito. Por exemplo, suponha que um indivíduo levou um tiro em um município Y, foi levado para um hospital no município X, e faleceu neste. Para a polícia, o crime ocorreu no município Y, en- quanto para a Saúde, a morte é registrada no município X. Logo, não é possível realizar comparações entre as duas fontes de dados. Feito um estudo com os dados da Saúde, é importante considerar que os registros se referem ao local da morte, e não o local de ocorrência do crime (da violência), que é o mais importante no estudo da segurança pública. O SIM abrange todas as regiões do país e pode ser analisado nos ní- veis nacional, estadual ou municipal. Por exemplo, podemos fazer uma análise de todo o país ou do estado do Rio de Janeiro ou da cidade de Nova Iguaçu, o que facilita as comparações estaduais e/ou municipais. Alguns problemas do SIM: 11 Estatística Aplicada à Segurança Pública 1. Falhas na cobertura, ou seja, em alguns estados, principalmente os do Norte e Nordeste, alguns óbitos não são registrados; 2. Falhas no preenchimento da Declaração de Óbito. Em grande núme- ro de óbitos, a Causa Básica de Morte é mal definida, não sendo bem classificado o que causou a morte do indivíduo; 3. Atraso na liberação dos dados. Os dados são liberados para os usuá- rios com uma defasagem de dois a três anos. Por exemplo, em junho de 2006, só haviam sido divulgados os dados do ano de 2003; 4. No caso das causas externas, muitas vezes, não é possível determinar a intencionalidade da violência, ou seja, em muitos casos, não se sabe se a causa foi um homicídio (morte intencional) ou um acidente. Com isso, uma parcela das mortes entra para o grupo de óbitos por causas externas de intenção indeterminada. 5. Problemas de não-preenchimento ou preenchimento inadequa- do das informações coletadas pela Declaração de Óbito, como, por exemplo, para o ano de 2003 no estado do Rio de Janeiro, 0,1% não tinham a informação de sexo preenchida; 8,5%, de idade; 11,5%, de estado civil; 30,3%, de escolaridade, constituindo um conjunto de dados com registros incompletos. As bases nacionais de mortalidade podem ser facilmente acessadas pelo site http://www.datasus.gov.br e analisadas a partir do software de tabulação TabWin, que permite tabular os dados das bases de dados citadas com grande facilidade e flexibilidade, distribuído também pela Internet (http://www.datasus.gov.br/tabwin/tabwin.htm). Atividade 2 Atende ao objetivo 3 Analise a incidência de mortes por agressão nos últimos cinco anos na sua cidade natal, através dos seguintes procedimentos: • Visite o sitehttp://www.datasus.gov.br; • Na caixa de opções azul, do lado esquerdo da página, clique em “In- formações de Saúde”; • Em seguida, clique na opção “Estatísticas Vitais”; 12 Aula 2 • De onde vêm os dados na área de Segurança Pública? Um panorama Aula 2 • das principais fontes Aula 2 • • Agora, no meio da página, vão aparecer as opções de Estatísticas Vitais. Como o seu interesse é analisar a incidência de mortes por agressão, você deve escolher a opção “Óbitos por causas externas”; • Quando você clicar nesta opção, no lado esquerdo da página, vai aparecer o mapa do Brasil dividido por Unidades da Federação (UFs). Clique na UF em que você nasceu; • Nesse momento, você verá uma nova página, em que você poderá construir uma tabela com a estatística desejada. Para tanto, na caixa “Linha”, escolha a opção “Grande Grupo CID10”; na caixa “Coluna”, escolha a opção “Ano do Óbito”; na caixa “Conteúdo”, escolha a op- ção “Óbitos p/ Residência”; na caixa “Períodos Disponíveis”, selecio- ne o período desejado (últimos cinco anos); na caixa “Município”, selecione o município onde nasceu. 13 Estatística Aplicada à Segurança Pública • Depois, arraste até o final na página e clique em “Mostra”; • Finalmente, você poderá ver o resultado desejado. Resposta Comentada Com essa ferramenta, você pôde visualizar uma tabela com o nú- mero de vítimas por tipo de morte por Causas Externas. Além disso, é possível verificar se o número de mortes por agressão (Mortes Violentas Intencionais) aumentaram ou não no município em que você nasceu, ao longo dos últimos 5 anos. Outra informação importante que você pode observar na tabela gerada a partir dos dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) é o número de “Eventos cuja intenção é inde- terminada”, ou seja, não se sabe se o óbito foi causado por um acidente, suicídio ou homicídio. É muito importante acompanhar a incidência de óbitos nessa categoria, uma vez que quanto maior o número de mortes cuja intenção é indeterminada, mais prováveis são as chances de as mor- tes violentas intencionais estarem sendo subestimadas. O que acha de trabalhar com Pesquisas Quantitativas ou Surveys,para gerar estatísticas de segurança pública? Pesquisas Quantitativas ou Surveyssão muito semelhantes ao Cen- so realizado pelo IBGE, com a diferença de ser examinada apenas uma parcela (amostra) da população (enquanto o censo geralmente 14 Aula 2 • De onde vêm os dados na área de Segurança Pública? Um panorama Aula 2 • das principais fontes Aula 2 • implica a coleta de informações de toda a população). Surveyssão muito utilizados, por exemplo, em pesquisas políticas para avaliação da intenção de voto. Antes de analisar osresultados de um Survey, é fundamental co- nhecer a metodologia utilizada no trabalho, para verificar a confia- bilidade dos dados. Por exemplo, o erro amostral é aquele que diz o quão perto a estatística da amostra cai ou está em relação ao valor real da população, ou seja, os resultados de uma pesquisa eleitoral podem revelar que o candidato “A” possui 40% das intenções de voto, com um erro amostral de 5% para mais ou para menos (você verá isso com mais detalhes na Aula 10). Isso significa dizer que, no resul- tado final das eleições, o candidato “A” pode ter entre 35% e 45% do total de votos. O tamanho da amostra pode ser um problema. Pes- quisas com amostras muito pequenas para representar uma popula- ção grande, em geral, têm significativas implicações nos resultados. Para analisar algum estudo, você deve tomar algumas precauções, tais como: a) não ter ideias preconcebidas acerca do resultado. Exemplo: realizar uma pesquisa eleitoral já contando com a vitória do candidato “A”; b) não desprezar fatos que contrariam o resultado a que se quer chegar. Exemplo: aceitar que o candidato “B” tem mais intenções de voto que o candidato “A”; c) descobrir todas as causas e não indicar uma só. Exemplo: não aceitar que a única explicação para que o candidato “A” esteja melhor nas pes- quisas que o candidato “B” seja porque ele “aparece mais bem vestido na TV”, muito embora “aparecer bem vestido na TV” seja uma das explica- ções possíveis da pesquisa; d) evitar o confronto de dados não comparáveis (unidades ou épocas diferentes). Exemplo: comparar os censos de 2000 com os dados da Pes- quisa Nacional de Amostra por Domicílio de 2004; e) contentar-se com o grau de precisão necessário. Exemplo: se uma pesquisa responde bem a um problema com uma margem de erro de 5%, não é necessário fazer uma pesquisa com margem de erro de 0,1%; f) tirar conclusões com um número suficiente de observações. Exem- plo: nas pesquisas quantitativas,você não pode projetar os dados da amostra utilizando apenas seis ou sessenta indivíduos. 15 Estatística Aplicada à Segurança Pública Você já ouviu falar dasPesquisas de Vitimização? É prioritário contar com estatísticas criminais confiáveis para poder entender a dinâmica do fenômeno e desenhar e implementar políticas eficazes para o controle, prevenção e redução do crime. As- sim, conforme vimos anteriormente, as estatísticas oficiais são cla- ramente importantes no desenvolvimento, monitoramento e avalia- ção de políticas públicas de segurança. Entretanto, por uma série de motivos, os dados oficiais nem sempre refletem com fidedignidade a situação real da criminalidade na sociedade. Essas estatísticas esta- riam corretas se todos os cidadãos vitimizados relatassem às autori- dades os crimes de que foram vítimas, com uma descrição completa do ocorrido. Você acredita que todas as pessoas vítimas de algum crime registram a ocorrência na Delegacia? A resposta para essa per- gunta é não, sobretudo se definirmos o tipo de crime pelo qual a pessoa foi vitimizada. Deste modo, as estatísticas oficiais são apenas uma fração do total de crimes e apresentam um quadro distorcido da violência e da criminalidade. Você sabia disso? Na década de 60, com o objetivo de resolver esse problema, pes- quisadores norte-americanos desenvolveram a pesquisa de vitimiza- ção, um instrumento capaz de estimar o total de crimes ocorridos e não notificados aos órgãos governamentais, conhecida como taxa de subnotificação ou “cifra obscura”. Além de verificar as taxas de sub- notificação, as pesquisas de vitimização foram desenvolvidas para identificar quais razões influenciam os indivíduos a não notificarem o delito à polícia, verificando se isto ocorre de acordo com a nature- za do crime, com as características da vítima ou devido à percepção da vítima em relação às autoridades policiais. Partindo das pesquisas de vitimização, torna-se possível obter informações de extrema rele- vância para o desenvolvimento de estratégias de correção de varia- dos problemas na área de segurança pública. As pesquisas de vitimização são pesquisas em que os entrevista- dos são abordados em casa, em escolas ou no trabalho, feitas com base em amostra representativa da população, sendo o entrevista- do uma vítima ou não de um conjunto de crimes, dependendo da metodologia adotada. Permitem conhecer o perfil das vítimas; in- formações sobre a experiência das pessoas relacionadas ao crime; a propensão das vítimas em registrar queixa policial; definir os grupos com risco de vitimização; identificar as atitudes da população em relação aos agentes encarregados da administração da justiça (po- 16 Aula 2 • De onde vêm os dados na área de Segurança Pública? Um panorama Aula 2 • das principais fontes Aula 2 • liciais, promotores, juízes). É preciso deixar claro, entretanto, que as pesquisas de vitimização não substituem os registros oficiais. Es- tas são complementares e constituem uma alternativa às estatísticas produzidas pelo sistema policial. Aparentemente, seria mais simples e econômico consultar as estatís- ticas oficiais para conhecer a quantidade de crimes de que a sociedade tem sido vítima. Acontece que, por uma série de motivos, os dados ofi- ciais nem sempre refletem com fidedignidade a situação real da crimi- nalidade. As estatísticas oficiais estariam corretas se todos os cidadãos vitimizados relatassem os crimes de que foram vítimas às autoridades. Neste sentido, as pesquisas de vitimização foram desenvolvidas, inicial- mente, como uma tentativa de estimar a quantidade de crimes sofridos pela população e não comunicados aos órgãos governamentais. Como exemplo, imagine que tendo uma pessoa sofrido um furto e não noti- ficado à polícia sobre o acontecido, esta não-notificação faz com que os dados oficiais (aqueles que representam todos os crimes registrados) não representem todos os crimes ocorridos. É preciso deixar claro, entretanto, que as pesquisas de vitimização não substituem os registros oficiais. Elas são complementares e constituem uma alternativa às estatísticas produzidas pelos siste- mas policial, judiciário e penitenciário. “Elas não refletirão com exatidão o fenômeno da criminalidade, constituindo-se apenas numa melhor aproximação deste último, porque nem todos os entrevistados lembrarão, terão a disponibilidade ou a confiança necessária para relatar a um desconhecido fatos desagradáveis ocorridos no passado” (Kahn, 2000). 17 Estatística Aplicada à Segurança Pública Figura 2.1:Fluxo da Ocorrência dos Crimes As pesquisas de vitimização, além de estimarem as taxas de crimes, têm um foco na vítima e nas circunstâncias dos crimes, o que é espe- cialmente relevante para a formulação de políticas preventivas, permi- tindo traçar mapas de risco, identificar grupos mais expostos a deter- minados tipos de delitos, estimar a frequência dos pequenos crimes cometidos cotidianamente – que, sendo os mais numerosos, em geral têm grande impacto sobre o sentimento de insegurança da população. Este instrumento possibilita um melhor conhecimento do fenômeno da violência e da criminalidade, ajudando no desenvolvimento de políticas públicas da referida área. Seus objetivos podem ser: • Ao realizar pesquisas de vitimização regulares, será possível compa- rar as fontes de dados. Por exemplo, para crimes como roubo, que possui altos níveis de sub-registro, ao comparar no tempo as estatís- ticas oficiais com as taxas de sub-registro, poderá saber se o aumento dos registros se deve à violência ou à confiança nas instituições; • As pesquisas de vitimização também podem ser um instrumento de controle do trabalho policial (externo), sendo capazes de captar informações sobre as experiências das pessoas com os policiais em diferentes eventos; • Através das pesquisas de vitimização, é possível medir a confiança das pessoas nas instituições de segurança pública, além de verificar 18 Aula 2 • De onde vêm os dados na área de Segurança Pública? Um panoramaAula 2 • das principais fontes Aula 2 • os fatores explicativos de cada avaliação. Na medida em que se co- nhece o porquê de uma avaliação negativa ou de uma desconfiança, torna-se possível reorientar as ações, as estratégias e qualificar os serviços prestados à comunidade; • Também é possível conhecer as medidas preventivas utilizadas pelas vítimas reais ou potenciais, as providências tomadas após a vitimiza- ção e os mecanismos informais de resolução de conflitos; • Conhecer as características do(a)s agressor(a)s identificado(a)s pelas vítimas e especificar, para os váriostipos de crimes, a re- lação existente entre vítima e agressor(a)s (familiar, conhecido, desconhecido, etc.); • Ao conhecer quais os fatores demográficos, econômicos e sociais que determinam os riscos individuais da vitimização, o agente de segurança pública tem como prevenir a incidência, já que tem maior conhecimento para tomada de decisões. Será na junção das fontes de dados que se obterá um diagnóstico mais claro do fenômeno; • Ao considerar que o conceito de estilo de vida pode explicar o risco de vitimização, será possível pensar em estratégias de prevenção, a partir das experiências relatadas na pesquisa; • A partir das pesquisas de vitimização, é possível determinar locais cuja coesão social e controle social, formal e informal estão enfra- quecendo. Para o controle social formal, por exemplo, é necessária uma política direta de policiamento; já para o controle social infor- mal, seria implementar um projeto em parceria com a sociedade ci- vil, que aumente a sociabilidade, a confiança e a coesão social entre os vizinhos; • À medida que as pessoas se sentem mais inseguras, elas tendem a se relacionar menos, corroendo as redes de relações sociais, a confian- ça, a sociabilidade e a solidariedade, que são importantes fatores na explicação do aumento da criminalidade. As Pesquisas de Vitimização no Contexto Brasileiro O Brasil tem experimentado problemas crescentes quanto à seguran- ça pública, mas eles não são os mesmos em todas as regiões e em todas as cidades; por isto, nos últimos anos, muitos estudos foram realiza- dos com o intuito de construir instrumentos capazes de acompanhar a evolução da criminalidade. A partir destas iniciativas, surgiram críticas 19 Estatística Aplicada à Segurança Pública acerca das estatísticas oficiais existentes, levando pesquisadores a utili- zarem outros instrumentos de análise da segurança pública, entre esses, as pesquisas de vitimização. No Brasil, as pesquisas de vitimização tiveram início tardiamente, mais especificamente no ano de 1988, através do suplemento Partici- pação Político-Social da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD), realizada pelo IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Es- tatística, que incluiu um bloco com perguntas sobre vitimização. Entre 1988 e 2013, foram realizadas 29 pesquisas de vitimização em diferentes cidades brasileiras, cabendo ressaltar que devido à falta de uniformida- de na metodologia e nos processos de coleta destas pesquisas, torna-se difícil a elaboração de análises comparativas com a consistência neces- sária. Além disso, a maior parte destas pesquisas se limitou ao estudo do tema em cidades (capitais de unidades federativas), principalmente na região sudeste do Brasil. Tabela 1.1: Pesquisas de Vitimização no Brasil Pesquisa Ano Abrangência Período de Referência Tamanho da Amos- tra Pnad 1988 Brasil 1 ano 81.628 domicílios Ilanud 1992 1996 1997 Município do Rio de Janeiro Município de São Paulo 5 anos 5 anos 1.000 entrevistados 2.400 entrevistados Iser/PAHO 1996 Município do Rio de Janeiro 5 anos 2.469 entrevistados Iser/FGV 1996 Região Metropolitana do RJ 1 ano 1.126 entrevistados O Povo e a PM 1997/1998 Distrito Federal Seade 1998 SP – Região Metropolitana e municípios com mais de 50.000 habitantes 1 ano 14.000 domicílios USP 1999 Região Metropolitana de SP 6 meses 1.000 entrevistados ISER 2000 Baixada – RJ 1 ano 1.389 entrevistados CDHP - IBGE 2001 Copacabana e Leme 1 ano 450 entrevistados Módulo da PESB 2002 Brasil Toda a vida 2.460 Ilanud/FIA/USP 2002 São Paulo, Rio de Janeiro, Vitória e Recife (municípios) 5 anos 2.800 entrevistados ISP / Viva Rio 2002 Município do Rio de Janeiro 1 ano 765 entrevistados 20 Aula 2 • De onde vêm os dados na área de Segurança Pública? Um panorama Aula 2 • das principais fontes Aula 2 • CRISP 2002 Município de Belo Horizonte 1 ano e 5 anos 4.000 entrevistados IFB 2003 Município de São Paulo 1 ano e 5 anos 5.000 entrevistados GUTO - UNESP 2003 Município de Marília (SP) Toda a vida Não consta Módulo do BH Área Survey 2003 UFG 1 ano 1029 entrevistados Marcos Rolim 2004 Alvorada (RS) 1 ano 500 domicílios IBPS - PMV 2005 Rio de Janeiro 1 mês 1.100 entrevistados por telefone SSP- NEPP- PR 2005 Curitiba e Foz do Iguaçu 1 ano e 5 anos 4.000 entrevistados UERJ – NUPEVI 2005/2006 Município do Rio de Janeiro Toda a vida e 1 ano 4.000 entrevistados CRISP 2006 Região Metropolitana de Belo Horizonte 1 ano e 5 anos 6.220 entrevistados ISP 2007/2008 Região Metropolitana do RJ 1 ano e 5 anos 4.553 entrevistados UFG 2007/2008 13 Municípios de Goiás 1 ano 6.809 entrevistados Pnad 2009 Brasil 1 ano 399.387 entrevista- dos DATAUFF - MT 2010 Estado de MT 1 ano 3.900 entrevistados DATAUFF - SC 2012 Estado de SC 1 ano 2.400 entrevistados DATAUFF – Santo Amaro 2013 Bairro de Santo Amarro – Recife – PE 1 ano 400 entrevistados Diferenças Metodológicas das Pesquisas de Vitimização no Brasil A maioria das pesquisas de vitimizaçãorealizadas no Brasil não se- guiu uma metodologia padrão, nem tão pouco foram realizadas de ma- neira sistemática, diferentemente do que acontece atualmente em outros países do mundo (por exemplo, nos Estados Unidos, desde a década de 60, esse tipo de pesquisa é realizado anualmente). Sendo assim, torna- -se difícil a comparação do fenômeno da vitimização no tempo e entre regiões. Para se ter uma ideia, estabelecendo um breve panorama das pesquisas de vitimização já realizadas no Brasil, pode-se observar que dos 29surveys, poucos podem ser comparados. Entre esses, alguns em- pregaram a mesma metodologia, mas utilizaram diferentes questioná- rios, além de existirem casos em que a abrangência geográfica conside- rada ter sido distinta, ou seja, algumas pesquisas foram representativas 21 Estatística Aplicada à Segurança Pública para os municípios, enquanto outras, para as regiões metropolitanas. A seguir, alguns exemplos: • as pesquisas do Ilanud - município do Rio de Janeiro (1992), muni- cípio do Rio de Janeiro (1996), do Ilanud - município de São Paulo (1997) edo Ilanud/FIA/USP - municípios de São Paulo, Rio de Ja- neiro, Vitória e Recife (2002) adotaram a metodologia UNICRI com questionários diferentes; • as pesquisas do ISER/PAHO - município do Rio de Janeiro (1996), do ISER/FGV - região metropolitana do RJ (1996) edo ISP / Viva Rio - município do Rio de Janeiro (2002) adotaram a mesma meto- dologia, mas utilizaram questionários diferentes. As únicas pesquisas que podem ser comparadas como um todo são as pesquisas do CRISP - município de Belo Horizonte (2002) e região me- tropolitana (2006), NUPEVI município do Rio de Janeiro (2005/2006) e SSP- NEPP municípios de Curitiba e Foz do Iguaçu (2005), já que empregaram a mesma metodologia e questionário. Deste modo, você pode perceber a existência de importantes dife- renças entre as pesquisas de vitimização no Brasil. No que se refere às discrepâncias metodológicas, devem-se destacar a população-alvo, a abrangência da pesquisa, o período de referência, o mês de realização da pesquisa, o desenho amostral, o método de entrevista e os tipos de delitos que configuram a vitimização. A população-alvo, ou seja, o grupo sobre o qual se deseja pesquisar, é um importante fator que diferencia os resultados de uma pesquisa. Em algumas pesquisas de vitimização, a população-alvo é definida se- gundo um limitemínimo e máximo de idade do respondente, e esses limites variam entre as pesquisas. Por exemplo, na Pesquisa Lei, Jus- tiça e Cidadania (1996), elaborada pelo CPDOC/FGV e pelo ISER, a população-alvo foi composta pelos moradores do município do Rio de Janeiro com idade de 16 anos ou mais, enquanto no suplemento Justiça e Vitimização, da PNAD (1988), a população-alvo se referia a pessoas de todas as idades no Brasil. Neste sentido, outro ponto importante a ser considerado é a abrangência da pesquisa. Algumas pesquisas são re- presentativas para municípios, para região metropolitana, e outras para estado ou até país. Outro importante fator metodológico em pesquisas de vitimização é o período de referência em relação à experiência com o delito. O perío- do de referência pode ser de 5 anos, 12 meses ou 6 meses antes da data 22 Aula 2 • De onde vêm os dados na área de Segurança Pública? Um panorama Aula 2 • das principais fontes Aula 2 • da entrevista. Por exemplo, nas pesquisas que utilizam a metodologia UNICRI, o período de referência é de 5 anos; na pesquisa do ISER/FGV (1996), foram considerados dois períodos diferentes: 3 e 12 meses antes da entrevista. A pesquisa de vitimização realizada na região metropoli- tana de São Paulo pela USP é a única que utiliza o período de referência de seis meses, já a pesquisa realizada pela UERJ/NUPEVI (2005/2006) possui perguntas sobre vitimização alguma vez na vida. O aumento mé- dio nas taxas de vitimização de 3 para 12 meses, registrados na pesquisa FGV-ISER, foi de 144%, ou seja, as taxas anuais são apenas 2,5 vezes maiores do que as trimestrais (você imaginou que seria 4 vezes maior, não foi?). A memória dos entrevistados em pesquisas retrospectivas, como é o caso dos surveys de vitimização, é muito importante, já que eventos mais distantes tendem a ser mais esquecidos do que os mais recentes. Assim, quanto maior o período de referência, mais chances o entrevistado tem de negligenciar algum fato importante para a pesqui- sa, principalmente no caso dos tipos de crime menos sérios. Também é importante considerar o mês de realização da pesquisa, pois este está diretamente ligado à ideia da memória do entrevistado. Por exemplo, se em uma pesquisa que está sendo realizada no mês de outubro/13, for perguntado sobre alguma vitimização nos 12 meses que a antecedem, o período de referência será de novembro do ano anterior até a data da pesquisa. No entanto, existe um alto risco de o entrevistado contar o período como sendo o ano da realização da pesquisa, ou seja, seguindo o exemplo, o entrevistado daria as informações do período desde janei- ro/13, em vez de novembro/12. Por isso, é aconselhado realizar pesqui- sas de vitimização no início do ano, e tendo como período de referência o ano anterior (12 meses), ou, caso o período de referência seja dife- rente, definir um acontecimento que marque a data de referência, por exemplo, “desde a tragédia do 11 de setembro, você já foi vitimizado?”. O desenho amostral empregado nas pesquisas também influencia em seus resultados. Algumas pesquisas utilizaram grandes amostras probabi- lísticas, enquanto outras trabalharam com amostras por quota, geralmente de tamanho reduzido (1.000 a 1.200 entrevistados). Neste último caso, o número de vítimas fica reduzido (em torno de 150 indivíduos) e a análi- se prejudicada. Algumas pesquisas utilizaram um método de listagem dos domicílios, ou seja, contabilizam todos os domicílios da rua. Este método aplica um questionário simples a um grande número de pessoas. A partir deste levantamento, os entrevistados são sorteados para responder a um questionário completo. O objetivo desse método é controlar o número de entrevistados que foram vitimizados e os que não foram vitimizados. 23 Estatística Aplicada à Segurança Pública No que se refere aos métodos de entrevista, foram utilizados dois mé- todos nas pesquisas brasileiras: um que seleciona aleatoriamente ou por quota o respondente, que é submetido a um questionário individual so- bre as ocorrências criminais das quais foi vítima; e outro, onde qualquer morador (respondenteproxy) pode dar informações sobre os demais moradores do domicílio, não havendo nenhum critério estatístico para controlar a seleção do respondente, apenas um limite de idade mínima (geralmente, 15 anos). O National Crime VictimizationSurvey(NCVS), dos EUA, admitia, até 1986, respondentes proxies para menores de 13 anos de idade; atualmente, apenas os indivíduos temporariamente au- sentes do domicílio e os incapacitados mentalmente podem ser substi- tuídos por respondentes proxies. As diferenças quanto ao processo de entrevista são o principal fa- tor a ser levado em conta na comparação dos resultados. Isso se deve ao fato de que muitos eventos de vitimização não são conhecidos por todos os membros do domicílio. Nesse sentido, os problemas de recall, sempre presentes em pesquisas de vitimização, são agravados quando a metodologia da pesquisa permite proxies respondentes. As taxas de vitimização em pesquisas sem respondente proxy são aproximadamente 2,8 vezes maiores do que as taxas das pesquisas com respondente proxy e, inversamente, as taxas de recurso à polícia no primeiro grupo de pes- quisa são 2,5 menores do que no segundo. Em resumo, as taxas calcula- das com base em informações prestadas por proxies respondentes, não diretamente envolvidos na ocorrência, tendem a ser subestimadas (pais desconhecem o que acontece com seus filhos jovens, cônjuges omitem determinados episódios, etc.). Ademais, os tipos de crimes abordados também influenciam na comparação entre as pesquisas. Por exemplo, nas pesquisas realizadas pelo IBGE (suplemento da PNAD e CDHP), os crimes roubos e furtos foram agrupados. Nas pesquisas que utilizam a metodologia do CRISP, roubo e furto são perguntados separadamente, já nos surveys com me- todologia UNICRI, os roubos e os furtos são divididos segundo tipifica- ção específica (veículo, itens do carro, residência, etc.). Outras Fontes Para trabalhar com estatísticas na área de Segurança Pública,você pode utilizar diferentes fontes de dados, além das apresentadas anterior- mente. Entre elas, as principais são as informações oriundas das segura- 24 Aula 2 • De onde vêm os dados na área de Segurança Pública? Um panorama Aula 2 • das principais fontes Aula 2 • doras, que podem ser uma fonte muito interessante no caso de roubos e furtos de veículo. Outra fonte importante são as secretarias e departa- mentos municipais e estaduais de segurança pública e afins. É possível obter informações preciosas dessas instituições, que venham colaborar para um melhor planejamento de políticas públicas de segurança. Ademais, outras fontes de dados muito valiosas são aquelas oriundas dos inquéritos policiais, processos judiciais e denúncias encaminhadas ao Ministério Público. Além dessas, existem o SAIH (Sistema de Auto- rização de Internações Hospitalares), que traz indicações de crimes para os que estão sendo internados, e o INFOPEN (Sistema de Informações do DEPEN), que possui informações sobre a população do sistema pri- sional e o Sistema de Estatísticas da Justiça, que possui algumas infor- mações sobre os processos. Atividade 3 Atende aos objetivos 1 e 4 Apresente as principais fontes existentes para a mensuração da violência no Brasil, considerando as particularidades e limitações de cada uma. Resposta Comentada Existem duas maneiras de obter dados sobre violência no Brasil: uma por meio de registros oficiais e outra por pesquisas do tipo survey. As principais estatísticas oficiais de violência no Brasil são: • as coletadas a partir de BO – Boletim de Ocorrência ou Registro de Ocorrência da Polícia Civil.No que se refere às estatísticas policiais, existem algumas particularidades que devem ser destacadas: nem todas as polícias e/ou secretarias de segurança no Brasil dispõem de sistemas de banco de dados e/ou de estatísticas criminais; existem ocorrênciascriminais que podem ter sido registradas em mais de uma delegacia, gerando duplicidade de casos; e os BOs (ou ROs) po- dem ter problemas de preenchimento em seus campos relevantes, sobretudo no que se refere ao perfil da vítima e do suspeito. 25 Estatística Aplicada à Segurança Pública • as estatísticas de mortalidade do Ministério da Saúde (Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM), produzidas com base nas Declarações de Óbito. Essas estatísticas também possuem algumas peculiaridades, tais como falhas no preenchimento da Declaração de Óbito; atraso na liberação dos dados; problemas na determinação da intencionalidade da violência; problemas de não-preenchimento das informações coletadas pela Declaração de Óbito. As pesquisas de vitimização são pesquisas do tipo survey, baseadas na montagem de amostras cuidadosamente elaboradas, que representem fielmente uma população. Esse tipo de pesquisa aborda pessoas que fo- ram vítimas ou não de um conjunto de crimes, dependendo da metodo- logia adotada. As pesquisas de vitimização permitem conhecer o perfil das vítimas ou informações sobre a experiência das pessoas relaciona- das ao crime, entre outras informações relevantes no estudo da violên- cia e da criminalidade. No entanto, esse tipo de pesquisa é cara, e se o instrumento de coleta de informações (questionário), bem como toda a metodologia da pesquisa, não forem desenvolvidos adequadamente, os resultados podem ser enviesados. CONCLUSÃO Por que é tão difícil mudar a situação da segurança pública? A res- posta é que não há política ou planejamento sem diagnóstico, e não há diagnóstico sem informações qualificadas e consistentes. Sem o plane- jamento, falta clareza quanto aos objetivos, o que impede qualquer ava- liação rigorosa do fenômeno. As estatísticas oficiais são claramente importantes no desenvolvimen- to, monitoramento e avaliação de políticas públicas. Entretanto, como você viu nesta aula, é muito difícil conhecer a quantidade de crimes que ocorrem na sociedade, já que as estatísticas oficiais são apenas uma fração do total de crimes. E se você comparar as fontes de dados, para averiguar a qualidade da informação? Ou se você realizar uma pesquisa de vitimização, para estimar as taxas de sub-registros? Então, a análise será mais confiável. Gostaria que você, ao analisar ou trabalhar com estatísticas de segurança pública, reconheça que, por definição, elas são 26 Aula 2 • De onde vêm os dados na área de Segurança Pública? Um panorama Aula 2 • das principais fontes Aula 2 • fruto de inúmeros processos políticos, organizacionais, institucionais e legais, centrais para o ciclo das políticas públicas. Falar dessas estatísticas é lembrar da possibilidade de se aumentar a eficiência da gestão das políticas na área, por meio da construção de dados e de indicadores que permitam que a segurança pública seja um serviço cuja provisão esteja baseada intensamente em planejamento, monitoramento e avaliação. Resumo Para realizar uma análise, um monitoramento ou uma avaliação é pre- ciso conhecer as fontes de dados. Na área da violência e criminalidade, destacamos três fontes de dados: as registradas pela Polícia Civil, as co- letadas pelo Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), do Minis- tério da Saúde, e as pesquisas de vitimização. As estatísticas criminais coletadas através dos Boletins ou Registros de Ocorrência da Polícia Civil possuem categorias criminais definidas pelo Código Penal.Já o Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) tem sua informação inicial gerada pela DO – Declaração de Óbito, e classifi- ca as mortes violentas como “Causas Externas”, segundo a Classificação Internacional de Doenças (CID). Vale ressaltar que a definição de morte violenta dada pelo SIM é diferente da dada pelas polícias. Pelo SIM, os homicídios são definidos segundo a CID, enquanto para as polícias, a definição é feita segundo o Código Penal. As pesquisas de vitimização são um tipo de levantamento na população sobre a experiência com o crime. Gera informações que eventualmente sirvam ao desenvolvimento de políticas para o controle da criminali- dade e quantifica a ocorrência de violações específicas para estimar a realidade das incidências criminais a partir dos dados divulgados pelos órgãos oficiais. Este tipo de pesquisa tem como objetivo obter informa- ções sobre a experiência das pessoas com respeito ao crime, risco de vitimização, propensão a registrar queixa policial, atitudes com relação à polícia e a punição dos criminosos, estratégias de prevenção ao crime e avaliação dos serviços prestados pelas forças policiais. 27 Estatística Aplicada à Segurança Pública Informações sobre a próxima aula Na próxima aula, você será treinado a organizar as informações e a reco- nhecer qual o nível de mensuração de um dado. Ademais, discutiremos como construir uma distribuição de frequência e qual a sua vantagem na análise estatística. Leitura Recomendada BEATO, Cláudio. Determinantes da criminalidade em Minas Ge- rais. Revista Brasileira de Ciências Sociais. São Paulo, Anpocs, 13(37), jun., pp. 74-87, 1998. BORGES, D.; DIRK, R. Compreendendo os dados de violência e crimi- nalidade. In: MIRANDA, A. P. M. & TEIXEIRA, P. A. S. (orgs.). Polícia e comunidade: temas e desafios na implantação de conselhos comunitá- rios de segurança. Rio de Janeiro: Instituto de Segurança Pública, 2006. CATÃO, Y. Pesquisas de Vitimização. Fórum de Debates Criminalidade, Violência e Segurança Pública no Brasil: Uma Discussão sobre Bases de Da- dos e Questões Metodológicas II. Rio de Janeiro: Ipea e Cesec/Ucam, 2000.
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