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Histórico_do_Pensamento_Liberal_-_2

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E - B O O K B P H I S T Ó R I C O D O P E N S A M E N T O L I B E R A L B R A S I L E I R O
1
CURSO 
“HISTÓRICO DO PENSAMENTO LIBERAL BRASILEIRO”
 COM PROFESSOR LUCAS BERLANZA
Inicialmente vinculado aos ideais comunistas, Carlos 
Lacerda é hoje um dos referenciais possíveis, dentro do espectro da 
política nacional, tanto para liberais quantos para conservadores. 
Conhecido por seus discursos inflamados, esse jornalista 
e político brasileiro, cujo destacado e incessante combate ao 
caráter ditatorial de Vargas lhe valeu o apelido de “o corvo”, tem 
sua trajetória esmiuçada nesta aula, a fim de tornar familiar o 
processo de formação de sua personalidade e a importância que 
seus posicionamentos apresentaram para o período histórico do 
qual faz parte. 
BONS ESTUDOS! 
SINOPSE
#12
E - B O O K B P H I S T Ó R I C O D O P E N S A M E N T O L I B E R A L B R A S I L E I R O
3
Nesta aula abordaremos o pensamento político e social de Carlos 
Lacerda, uma das figuras mais ostracizadas, esquecidas, odiadas e também 
uma das mais importantes do século XX que precisa de um resgate. E, 
principalmente, veremos a narrativa que ele construiu acerca da história do 
Brasil, mais especificamente, a respeito da República.
INTRODUÇÃO
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4
O BRASIL NA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL
Antes de partir para o tema propriamente dito, eu queria 
complementar uma questão que foi respondida na aula passada. Fui 
questionado sobre a participação do Brasil na Segunda Guerra Mundial, 
quais seriam as lideranças que organizaram as manifestações dos 
brasileiros em favor do ingresso do Brasil na guerra ao lado dos aliados e 
não ao lado do eixo, não obstante, a natureza política-ideológica de Getúlio 
Vargas, que era o presidente-ditador àquela altura. 
Na ocasião, respondi que o Estado Novo1 dilacerou as lideranças. 
Por causa disso, na condução das manifestações, não havia uma liderança 
pessoal que se distinguisse, eram muito mais entidades, organizações e 
grupos, como por exemplo, a UNE2, que tocaram aquelas manifestações. No 
entanto, provocado pela pergunta, vasculhei novamente o material que li a 
respeito — que é bastante escasso sobre essa questão em específico, mas 
existe e há até mesmo comentários do próprio Lacerda sobre o assunto. 
Ao mesmo tempo, assisti a um documentário chamado Imagens do 
Estado Novo de Eduardo Escorel, no qual durante 4 horas de duração, com 
registros da época, é possível ver todas as etapas da construção da ditadura 
e, também, como a máquina política do PSD3 e do PTB4 se arquiteta, se 
alicerça e se consolida no poder para a República que vai começar em 1946 
com o fim oficial do Estado Novo. 
Um dos episódios é dedicado à entrada do Brasil na Segunda 
Guerra Mundial, nele temos imagens das manifestações para o Brasil 
entrar na guerra, coisa raríssima de se encontrar, onde é possível encontrar 
1 Estado Novo, conhecido também como Terceira República ou Era Vargas, foi um regime político instaurado por 
Getúlio Vargas de 10 de novembro de 1937 até 31 de janeiro de 1946.
2 União Nacional dos Estudantes, fundada em 11 de agosto de 1937.
3 Partido Social Democrático foi um partido político brasileiro fundado em 17 de julho de 1945 sob os auspícios de 
Getúlio Vargas. Foi extinto pelo Ato Institucional Número Dois (AI-2) em 27 de outubro de 1965.
4 Partido Trabalhista Brasileiro foi um partido político brasileiro fundado em 15 de maio de 1945 cujo primeiro 
presidente era Lutero Vargas, filho de Getúlio Vargas. Também foi extinto pelo Ato Institucional Número Dois (AI-2) 
em 27 de outubro de 1965, mas após a abertura do regime militar, parte dos partidários fundaram um partido de 
mesmo nome, Partido Trabalhista Brasileiro, e parte fundou o Partido Democrático Trabalhista.
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5
manifestantes fantasiados de Hitler5, de Mussolini6, de Hirohito7, para 
sacanear japoneses, alemães e italianos, e defender o ingresso do Brasil 
na guerra ao lado dos aliados. Houve até mesmo a participação do PCB8 
nas manifestações porque a União Soviética já estava pragmaticamente 
alinhada aos aliados naquela época. 
Que fique claro que eu não estou falando que nós somos o 
suprassumo da democracia e do liberalismo, nada disso, mas como eu disse 
na série da Brasil Paralelo Brasil - A Última Cruzada, existe na sensibilidade 
do brasileiro, na nossa cultura, algo que não se afinaria, por exemplo, ao 
figurino do nazismo. Existe uma sensibilidade ocidental no Brasil que, por 
natureza, seria de certa forma alérgica a certos extremos como o nazismo. 
Deste período da entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial, 
há duas figuras importantes para destacar. A primeira é Osvaldo Aranha9, 
conhecido como defensor da corrente americanista. A história de Osvaldo 
Aranha é a história de uma relação conflituosa com o seu parceiro, ou 
ídolo, porque ele sempre foi varguista, defendeu as ideias do nacional-
desenvolvimentismo, a amálgama de ideias que formavam o ideal varguista 
e da elite política que decorre da ditadura do Vargas, mas, quando o Estado 
Novo é decretado, ele se desentende com Getúlio, por não ser a favor dessa 
natureza ditatorial do governo. De qualquer forma, a substância de suas 
ideias era varguista, e não udenista.
Nesse momento, Osvaldo Aranha está fazendo tudo que ele 
pode para contrabalançar a corrente germanófila dentro do governo do 
5 Adolf Hitler (1889-1945) foi um político alemão líder do Partido Nazista (Nationalsozialistische Deustsche Arbeit-
erpartei, em português, Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães) responsável pela Segunda Guerra 
Mundial.
6 Benito Amilcare Andrea Mussolini (1883-1945) foi quem liderou o Partido Nacional Fascista e a Itália durante a 
Segunda Guerra Mundial.
7 Hirohito (1901-1989), também conhecido como Imperador Showa, foi o 124º imperador do Japão. Nos anos inici-
ais de seu reinado houve um aumento do poder das forças armadas e, antes da Segunda Guerra Mundial em 1940, 
já havia invadido a Manchúria (1931) e o resto da China (1937).
8 Partido Comunista do Brasil e, mais tarde, Partido Comunista Brasileiro, foi fundado em 25 de março de 1922. Foi 
o primeiro partido político assumidamente de esquerda no Brasil.
9 Osvaldo Euclides de Sousa Aranha (1894-1960) foi um político, diplomata, e advogado brasileiro. Ficou conheci-
do internacionalmente por fazer lobby pela criação do Estado de Israel.
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Vargas encabeçada por Dutra10 e o Góis Monteiro11 que, inclusive, depois 
se prevalecerão do golpe que derruba o Getúlio e coloca o Brasil ao lado 
dos Estados Unidos. Nas manifestações, Osvaldo Aranha não aparece nas 
imagens, mas são vistos nas gravações carros alegóricos com o busto do 
Osvaldo Aranha com a inscrição Campeão da Democracia — não o nome 
dele. Lacerda comenta que Osvaldo Aranha apoiou essas manifestações e 
dialogou com os estudantes que organizaram essas manifestações. Então, 
se for para citar uma liderança, há Osvaldo Aranha.
E há outra liderança que Lacerda cita, Virgílio de Melo Franco12, que 
era um udenista histórico que naquela época não estava exilado, como 
outros foram, nem perdera seus direitos políticos pela ditadura do Vargas. 
Ele ainda estava livre e operante, então discursou nessas manifestações a 
favor da entrada do Brasil na guerra. 
Então, em resposta àquela pergunta inicial, tenho esses dois nomes 
para citar: Osvaldo Aranha e Virgílio de Melo Franco. Dito isso, vamos ao 
nosso tema de hoje.
NASCIMENTO E INFÂNCIA
A nossa história oficialmente começa em 1914, quando em uma 
família já embebida da atividade política, nasce Carlos Frederico Werneck 
de Lacerda, de nome bastante sugestivo quanto à orientação ideológica 
dos seus parentes.Os seus tios eram militantes comunistas do PCB. Seu 
avô, Sebastião Lacerda13, era um abolicionista, republicano na época do fim 
do império e foi ministro do STF. Lacerda tem recordações muito fortes 
do avô, do tempo que viveu frequentando a fazenda do avô, tanto que há 
um livro de 1976, um ano antes de Lacerda morrer, chamado A Casa do 
10 Eurico Gaspar Dutra (1883-1974) foi militar e o 16º presidente do Brasil entre 1946 e 1951.
11 Pedro Aurélio de Góis Monteiro (1889-1956) foi general-de-exército e político brasileiro. Por ter combatido a Re-
volta dos Dezoito do Forte de Copacabana (1922), o Tenentismo (1924) e a Coluna Prestes (1924-1927), comandou a 
Revolução de 1930. Pouco tempo depois comandou as tropas federais que combateram na Revolução Constitucio-
nalista de 1932 e de 1934 até 1945 foi nomeado Ministro da Guerra.
12 Virgílio Alvim de Melo Franco (1897-1948) foi um político e jornalista brasileiro que teve participação política no 
início do Governo Vargas.
13 Sebastião Eurico Gonçalves de Lacerda (1864-1925) foi um magistrado e político brasileiro. Destaca-se na 
sua trajetória: formação na Faculdade de Direito de São Paulo (1884), foi eleito deputado em 1894, comandou o 
Ministério dos Transportes (1897 e 1898) e foi nomeado ministro do Supremo Tribunal Federal (1912).
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7
Meu Avô, que é um livro muito elogiado por ninguém menos que Gilberto 
Freyre e Carlos Drummond de Andrade, eles falam que é uma das melhores 
peças da literatura de língua portuguesa. Nesse livro ele relata o impacto 
das suas memórias de infância e juventude passadas ali naquela chácara 
de Sebastião Lacerda. 
A figura do avô exerceu muito peso no imaginário de Carlos Lacerda 
e também a do pai, Maurício de Lacerda14, que, ao contrário do que se 
diz, não era propriamente um comunista, — inclusive, mantinha relações 
conflituosas com o PCB — ele era um socialista, no sentido da época, 
utópico, pré-marxista, e, basicamente isso indicava, no começo do século 
XX, o indivíduo que defendia leis sociais, trabalhistas, e era basicamente isso 
que ele era, não um defensor da luta de classes e dos conceitos marxistas 
ortodoxos propriamente ditos.
A RAÇA DE ÍCARO
Maurício de Lacerda ficou marcado como um tribuno, assim como 
Ruy Barbosa15, que combatia a oligarquia da República Velha16, sempre em 
nome do ideal de leis sociais e trabalhistas. Ele também ficou conhecido por 
sua oratória combativa — nesse sentido, um prólogo do filho — tanto que 
Lacerda comenta em A Casa do Meu Avô que a família Lacerda, era de uma 
raça de Ícaro, que os Lacerdas buscam sempre o Sol, voam mais alto do que 
todo mundo e acabam de asas chamuscadas. Assim foi com Maurício. 
Maurício era um dos tribunos mais destacados da República Velha e, 
no entanto, quando acontece a Revolução de 3017, pela qual ele lutou para 
14 Maurício Paiva de Lacerda (1888-1959) foi um político, tribuno e escritor brasileiro. Em sua trajetória desta-
cam-se: sua defesa dos operários comunistas e anarquistas, foi eleito deputado federal (1912, 1915 e 1918) e foi pre-
feito de Vassouras de 191 a 1920 e de 1932 a 1935.
15 Ruy Barbosa de Oliveira (1849-1923) foi um polímata brasileiro que se destacou principalmente como jurista, 
advogado, político, diplomata, escritor, filólogo, jornalista, tradutor e orador. Foi coautor da constituição a Primeira 
República juntamente com Prudente de Moraes e atuou na defesa do federalismo, do abolicionismo e na pro-
moção dos direitos e garantias individuais.
16 República Velha, também conhecida como Primeira República Brasileira ou como República das Oligarquias 
foi o período da história brasileira que se estendeu da proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, até 
a Revolução de 1930.
17 Revolução de 30 foi o movimento armado que depôs o presidente da República Washington Luís em 24 
de outubro de 1930 e pôs em seu lugar Getúlio Vargas, o que deu origem ao período conhecido como Governo 
Provisório.
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derrubar a República Velha, as correntes autoritárias de viés castilhista18 
sequestram as bandeira que o Maurício de Lacerda defendia, assim, 
deixam-no sem peso, sem substância, apagam-no da política, até que, por 
fim, ele perde a sua relevância. Algo análogo acontecerá com Carlos Lacerda 
pelos militares mais tarde. 
Há relatos que contam que Maurício de Lacerda, enquanto assistia 
a uma palestra do filho ainda nos tempos da ANL19, virou-se para um 
companheiro e disse ter sido ele quem gerou esse milagre, devido à oratória 
que Carlos Lacerda tinha e à capacidade de usar as palavras para sustentar 
as suas teses.
A grande questão que eu coloco é: Se, mesmo pertencendo a esta 
raça de Ícaro — que não toca o Sol, tem as asas chamuscadas e desaparece 
—pode-se dizer que toda a obra e todas as realizações, o significado político 
de Lacerda, se torna nulo? Será que acabou? Será que não há qualquer valor 
no trabalho que ele desenvolveu? Essa é uma pergunta que responderei 
nesta explanação.
Lacerda tem várias fases na sua trajetória, que precisam ser 
identificadas quando nós analisamos e reconstruímos o pensamento dele.
A JUVENTUDE
Uma fase óbvia é a fase comunista na juventude, em que ele já 
demonstra a sua contundência, a sua habilidade prodigiosa como orador e 
como militante, mas, ainda ligado às teses da luta de classe do PCB, porém, 
nunca foi membro inscrito deste partido.
Já conheci pessoas que difundem que Lacerda era membro do 
PCB de maneira equivocada, às vezes até com má intenção, por exemplo, 
eu já tive uma discussão com um antigo militante do PCB que inventou 
de dizer que Lacerda era membro deste partido. O sujeito usou como 
18 Castilhismo foi uma corrente política instituída por Júlio de Castilhos que norteou o governo durante toda a 
Era Vargas. Tem como característica a centralização dos poderes no executivo, a instituição de mecanismos de 
participação direta e a instauração de um Estado modernizador e intervencionista.
19 Aliança Libertadora Nacional foi uma frente de esquerda fundada em 1934 por diversas organizações de caráter 
anti-imperialista, antifascista e anti-integralista.
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autoridade o fato de que ele já era vivo nesta época, mas se ele fosse da 
época rigorosamente, provavelmente não estaria vivo, era uma criança, no 
máximo, agora é um senhor já e quis porque quis me convencer de que 
Lacerda foi membro do PCB e traiu, roubou os cofres do partido e levou 
para a UDN, sendo que entre Lacerda se desencantar com os partidos 
de esquerda e entrar na UDN como político, há uma distância temporal 
relevante de alguns anos. Esse dinheiro ficou guardado e depois foi para a 
UDN? Que história é essa? As pessoas inventam umas narrativas que é uma 
coisa impressionante. Lacerda nunca foi membro do PCB, ele foi membro 
da ANL, militante da ANL, orador da ANL, discursou em homenagem à Luís 
Carlos Prestes sim, defendeu aquele bando de comunistas quando jovem 
também, mas nunca foi registrado no PCB.
Dessa época, naturalmente, o que fica em Lacerda é a habilidade 
com que ele começou a desenvolver os estudos em que ele mergulhou, 
mas em matéria de ideias e convicções há uma brutal descontinuidade.
A RUPTURA COM A ANL E SUA CONVERSÃO
Em pleno Estado Novo, a ditadura Vargas realiza em 1938 uma 
exposição, um grande evento para mostrar as suas realizações, as suas 
conquistas sociais, o que o regime do Estado Novo logrou êxito em construir e 
realizar. Um dos departamentos dessa exposição era justamente o combate 
ao comunismo. Os organizadores queriam um jornalista para escrever um 
artigo relacionando o histórico do comunismo no Brasil com destaque para 
o enfrentamento que o Estado Novo fez ao comunismo. 
Nas redações,isto não é um fenômeno inédito, já havia muita gente 
de esquerda e Lacerda era um deles. Sendo-lhe designado o trabalho de 
escrever sobre o evento, permaneceu sobre a mesa do Lacerda o dilema 
de deixar que outra pessoa escrevesse esse artigo, ou assumir a tarefa e 
aproveitar para ocultar nomes, proteger pessoas e mostrar que o comunismo 
não é esse monstro todo que pintam, o que, no final das contas poderia 
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até beneficiar o partido. Recebida a autorização dos camaradas, decidiu 
escrever o artigo.
O artigo foi publicado e os colegas não gostaram do que Lacerda 
escrevera, consideraram que ele tinha sido agressivo com o comunismo, 
tinha traído a causa e criou-se uma campanha contra ele dentro do PCB, no 
qual, repete-se, ele não era inscrito formalmente, mas estava no círculo de 
relação. Ele sofreu uma execração absoluta dos militantes do comunismo, 
que não queriam sequer olhar para ele e apertar a sua mão. 
O tipo de ambiente totalitário que existe nessas militâncias de 
juventude comunista impactou Lacerda com todo o seu peso naquele 
momento, hostilizado por todas as pessoas com quem tinha construído 
relações. A experiência do jovem, antes comunista mergulhado na ideologia 
e agora banido do grupo, é análoga à experiência de quem perde a mãe. 
É assim que o Lacerda descreve esta época. Há até cenas e relatos de ele 
chorando pelos cantos e nos bares porque ninguém queria olhar para a 
cara dele. 
Esse pensamento então tem uma descontinuidade forçada. Lacerda 
sofre na pele as consequências do totalitarismo comunista que ele defendia, 
percebe com maior clareza, então, o que o comunismo seria se chegasse 
ao poder no Brasil: uma ditadura muito pior do que a própria ditadura do 
Vargas, porque aquela é uma ditadura muito mais difícil de derrubar, dada 
esta liga que se cria nesta argamassa ideológica entre os seus próceres.
Por influência de alguns intelectuais, que mais tarde terão presença 
na UDN20, como por exemplo, Gustavo Corção21, Lacerda se converte ao 
Catolicismo e o pensamento dele começa a sofrer uma evolução.
A VOLTA DA REPÚBLICA E A MATURIDADE
Por volta da década de 40, quando acabava a ditadura e entrava o 
20 União Democrática Nacional foi um partido político brasileiro fundado em 1945 de orientação conservadora 
cujo lema é uma frase popularmente atribuída a Thomas Jefferson “o preço da liberdade é a eterna vigilância”
21 Gustavo Corão (1896-1978) foi um escritor, engenheiro, ensaísta, jornalista católico brasileiro e membro da anti-
ga União Democrática Nacional. Seu livro Lições do Abismo foi premiado pela UNESCO.
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11
período da República de 4622, Lacerda está mais atento ao que poderíamos 
chamar de liberalismo social23. Ele ainda dá a atenção a alguns intelectuais 
de esquerda como Harold Laski24, do trabalhismo inglês, ou John 
Dewey25, citado nas obras do brasileiro, no entanto, está abandonando o 
comunismo e já começa a abraçar o que será a narrativa da UDN, a narrativa 
ruybarboseana, de que o Brasil precisa sim, como a Revolução de 30 quis, 
como os tenentistas quiseram, de voto secreto, de direitos individuais, de 
instituições sólidas, de que o país não pode ficar na mão de caudilhos, nem 
de militares. Basicamente, essa era a narrativa que o Ruy Barbosa defendia 
da qual Lacerda se revestirá e dirá, inclusive, que a UDN é um partido 
ruybarboseano. Esta é a definição que ele mesmo afirma para, logo em 
seguida, elogiar figuras como Otávio Mangabeira26, um dos fundadores da 
UDN, um dos primeiros a se insurgirem contra o sistema do Estado Novo.
OS ANOS 50 E 60
Há esse Lacerda dos anos 40 com referências udenistas e referências 
do liberalismo ruybarboseano. No entanto, na década de 50 e 60, ele 
assumirá a sua conformação mais definitiva. Nesse período, Lacerda 
está mais interessado na democracia cristã e em Konrad Adenauer27, 
que reergueu a Alemanha — este país é o modelo dele de sucesso. 
Lembremo-nos de que ainda não havia acontecido a chamada, por alguns, 
Revolução Conservadora de Ronald Reagan ou Margaret Thatcher, assim, o 
grande exemplo de sucesso era a Alemanha reerguendo-se dos escombros 
22 República de 46, também chamado de República Populista, Quarta República Brasileira e República Nova 
foi o período que foi iniciado em 31 de janeiro de 1946, com o fim do governo provisório de José Linhares, até 31 de 
março de 1964, quando aconteceu o Golpe Militar de 1964.
23 Liberalismo social, também chamado de novo liberalismo ou liberalismo moderno é um desenvolvimento no 
século XX do liberalismo clássico, este identificava a liberdade enquanto inexistência de coação e compulsão, já 
para o liberalismo social a falta de oportunidades de emprego, educação, saúde, etc., podem ser tão prejudiciais à 
liberdade quanto a compulsão e a coação.
24 Harold Laski (1893-1950) foi um cientista político importante e líder do Partido Trabalhista Britânico.
25 John Dewey (1859-1952) foi um filósofo e pedagogo representante da corrente pragmatista.
26 Otávio Mangabeira (1886-1960) foi um engenheiro, professor e político brasileiro. Em 1930 foi eleito para a Ac-
ademia Brasileira de Letras, mas é exilado voltando somente em 1937, quando é novamente forçado a exilar-se. 
Apenas em 1945 retornou elegendo-se deputado da constituinte e vice-presidente da UDN.
27 Konrad Hermann Joseph Adenauer (1876-1967) foi um político alemão cristão-democrata, advogado e um dos 
fundadores da economia social de mercado.
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do nazismo sob a orientação econômica dos ordoliberais28 e a economia 
social de mercado29 de Ludwig Erhard30. Então, era esses caras que o Lacerda 
estava lendo, era neles que ele se inspirava. 
Eles fundamentalmente defendiam controle da emissão da moeda, 
austeridade fiscal, mas admitiam certas participações mais extensas do 
Estado no mercado — com leis para controlar trustes e monopólios — do 
que admitirão os austríacos que hoje são influentes no movimento liberal e 
libertário brasileiro. Lacerda defendeu isso e, em alguns setores da economia, 
não só defendeu a construção de empresas públicas como fundou 
empresas estatais no governo da Guanabara. Apesar de ter um discurso 
privatista, ele fez isso, porque acreditava que o mercado não tinha interesse 
naquelas áreas naquele momento e que as tarifas eram absurdas, então, 
fundou a CETEL e outras empresas públicas para determinados setores, 
principalmente a telefonia, que certamente foi um dos maiores insucessos 
do governo Lacerda. No entanto, considerando o quadro político brasileiro, 
era o mais aberto dos líderes políticos às ideias, em primeiro lugar, privatistas, 
da livre iniciativa, de respeitar o livre-mercado, e descentralizadoras, com 
ainda mais ênfase para a descentralização administrativa, porque isso era a 
bandeira da UDN.
Um dos grandes motivos do sucesso do governo do Lacerda era essa 
descentralização que ele estabeleceu na administração do Estado, sem 
criar municípios, ele dividiu a Guanabara em unidades que conservavam 
certa autonomia. Isso foi a chave da racionalidade administrativa que ele 
usou no governo da Guanabara. 
A descentralização, a conquista plena e efetiva da federação no 
Brasil, era uma bandeira da UDN. Tudo de acordo e coerente, no fundo, com 
os ideais médios, digamos assim, da democracia cristã europeia, era isso 
28 Ordoliberalismo, também chamado ordoliberalismo alemão, é uma escola de pensamento econômico liberal 
que enfatiza a necessidade de o Estado corrigir as imperfeições do mercado. Essa escola de pensamento mais 
tarde inspiraram a criação da economia social de mercado.
29 Economia social de mercado foi o principal modelo econômico que a Alemanha Ocidental adotou após a 
SegundaGuerra Mundial que possui como objetivo uma economia social de mercado altamente competitiva.
30 Ludwig Erhard (1897-1977) foi um político e economista alemão chanceler da Alemanha (1963-1966).
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que eles defendiam efetivamente: descentralização, respeito aos corpos 
intermediários da sociedade, autonomia para a família, liberdade de ensino 
e, também, leis no combate aos trustes, aos monopólios. Esse componente 
estatista existia no pensamento dele assim como existia no pensamento da 
democracia cristã.
O POENTE DE LACERDA
Depois existe um Lacerda decadente, acabado politicamente. Ele 
perde o seu papel no ambiente político, faz algumas concessões — na minha 
modesta opinião, indevidas — ao discurso dos seus antigos adversários, mas 
faz isso acreditando que o regime militar que se perpetuava no poder traiu 
o movimento original de 6431 era um inimigo maior naquele momento. 
Então, é um Lacerda em desespero, enquanto político ele tinha ambições 
e não envergonhava-se de admitir isso, em O Depoimento ele afirma: “Eu 
gosto do poder, mas não é o poder pelo poder, eu não entendo como os 
políticos carreiristas ambicionam tão desassombradamente o poder em 
si mesmo, o poder pelo poder. Não, o poder me dá prazer pelo que ele me 
permite realizar, pelo que ele me permite fazer”.
Com as suas ambições frustradas, com todas as relações que 
poderiam apoiá-lo para uma eventual presidência cortadas, o regime se 
fecha cada vez mais, a tal ponto que nessa fase ele perde as estribeiras e 
até, de certa forma, facilita o seu próprio abortamento quando intensifica, 
a meu ver, demais a sua divisão com Castello Branco32, porque dividindo-se 
Lacerda e Castello Branco, Costa e Silva33 ganha força e estabelece o poderio 
da linha dura militar mesmo.
31 Golpe de Estado no Brasil em 1964, também conhecido como Contragolpe Militar de 1964, designa o conjunto 
de eventos ocorridos em 31 de março de 1964 que culminou no encerramento do mandato do presidente João 
Goulart.
32 Humberto de Alencar Castello Branco (1897-1967) foi militar e o 26º presidente do Brasil. Foi também um dos 
articuladores do Golpe Militar de 1964.
33 Artur da Costa e Silva (1899-1969) foi militar e o 27º presidente do Brasil. Foi sob o governo deste que foi 
promulgado o AI-5 que lhe deu poderes de fechar o Congresso Nacional, cassar direitos políticos e institucional-
izar a repressão.
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O NÚCLEO DAS IDEIAS DE LACERDA
Reuni alguma das citações no programa da UDN que Lacerda 
encampou no seu O Poder das Ideias que diz, por exemplo, que ele defende 
a universalização do concurso e do contrato no serviço público com 
formação de especialistas e pessoal habilitado. Ele tinha nojo de indicações, 
tanto que, quando a família e até amigos tentavam sugerir nomes, Lacerda 
era intransigente e não aceitava indicações. Ele tinha horror a qualquer 
possibilidade de ser acusado de nepotismo. O governo da Guanabara foi 
marcado até por alguns episódios de recusas que pegaram mal dentro do 
próprio partido. Aliás, Lacerda brigou com todo mundo na história política 
brasileira, mas estimo que com quem ele mais brigou foi o próprio partido.
A política externa brasileira era uma preocupação de Lacerda o 
tempo todo, pois havia três possibilidades naquela época de guerra fria: (1) 
ou nós estamos com os soviéticos e apoiamos aqueles que têm uma posição 
eminentemente totalitária, como tem a União Soviética, ou (2) nós estamos 
com os americanos e, portanto, com o Ocidente, com o capitalismo, com 
as liberdades democráticas, ou (3) nós queremos, como diz o Lacerda, não 
com estas palavras mas queremos pagar de gostosões e ficamos como os 
não-alinhados, os independentes.
Lacerda tinha nojo dessa ideia de não-alinhados, ele dizia que o Brasil 
estava com os Estados Unidos sim — não como capacho, nosso país era 
uma nação que se preza e se respeita — mas sobretudo, porque as causas 
que os americanos defendiam e apresentavam eram as nossas também. 
Também afirmava que nós temos de recusar peremptória e firmemente a 
opção totalitária e não temos de pagar de gostosão, de bonitão, como por 
exemplo, tentou fazer a França de Charles de Gaulle34. Lacerda brigou com 
de Gaulle no final do governo dele, porque não aceitava a linha do de Gaulle 
de não-alinhamento. 
34 Charles André Joseph Marie de Gaulle (1890-1970) foi um general, político e estadista francês e também o re-
sponsável por fundar a Quinta República Francesa.
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Ele defendia uma política enérgica de sustentação da moeda nessa 
época. No começo dos anos 50 a UDN já estava abraçando essa ideia da 
austeridade fiscal com rigorosa amputação de todas as despesas supérfluas 
ou adiáveis e a revisão imediata de todas as leis, regulamentos, circulares 
e mandamentos que visam a impedir o afluxo de capital para o Brasil. 
Também a necessidade de podar esses apetrechos que o Estado brasileiro, 
varguista sobretudo, criou para conter o fluxo do capital, pois havia uma 
série de propostas demagógicas do PTB, de Vargas e de João Goulart35 para 
impor restrições à remessa até do lucro para o exterior, e outra série de 
propostas como, por exemplo, aumento do salário mínimo em 100%. Todas 
essas coisas horrorizavam Lacerda e a UDN.
Em relação à Petrobras, Lacerda tem uma posição oscilante: num 
primeiro momento ele tende a aceitar o capital estrangeiro na Petrobras, 
mas, quando o governo Vargas resolve fazer um acordo para captar capital 
estrangeiro para a Petrobras e criar uma série de diretrizes para os diretores 
nacionais terem controle sobre esses recursos, Lacerda dá abrigo na Tribuna 
da Imprensa ao discurso em que os udenistas afirmavam que Vargas 
estava entregando a empresa aos trustes internacionais. Ele não podia ser 
tão independente em relação ao partido, mas é, no final das contas, um dos 
desatinos que Lacerda cometeu. 
Depois, quando já é governador, Lacerda fala que a Petrobras está 
uma bagunça, então, num primeiro momento nós temos de estabelecer 
metas a serem cumpridas num prazo determinado, não sendo cumpridas 
essas metas, a exploração do petróleo está livre no Brasil. Ele, então, move-se 
nessa direção mais privatista, mais liberal.
Em relação aos minérios a UDN também tinha as suas restrições 
antiliberais e Lacerda não fugia a essa regra, mas no final ele se abriu 
bastante a essa opção.
A completa descentralização administrativa foi uma bandeira perene 
35 João Belchior Marques Goulart (1919-1976) foi um advogado e político brasileiro. Ocupou o cargo de presidente 
do Brasil de 1961, quando Jânio Quadros renunciou, até 1964, quando foi deposto pelo Golpe Militar.
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na vida de Lacerda. O tempo todo ele estava defendendo isso, porque a 
atividade de presidentes, ministros, e demais cargos políticos, consistia em 
apenas confabularem e assinarem papéis.
Prestígio à iniciativa privada e, ao mesmo tempo, planejamento 
nacional com prioridades bem estabelecidas para a solução dos problemas. 
Isso não é só compatível, como é complementar.
E, embora seja uma ideia bastante questionável, ele defendia uma 
reforma dos estatutos dos partidos. Lacerda também mudou a opinião sobre 
isso ao longo do tempo, algumas vezes ele dizia para estabelecer regras e 
programa nos partidos porque estes, em sua maioria, não tinham programa, 
eram apenas parte da máquina da ditadura continuando a funcionar 
dentro de uma suposta democracia formal. Com o estatuto determinando 
programa para os partidos, a intenção era reduzir o número de partidos. Em 
alguns momentos ele defendeu o bipartidarismo com a livre presença decorrentes internas. Ironicamente, no regime militar, Lacerda está lutando 
contra o bipartidarismo e pela criação da frente ampla.
Na minha modesta opinião, o bipartidarismo no Brasil me parece um 
tanto quanto artificial, nós não temos essa tradição como há nos Estados 
Unidos, embora, claro, a preocupação de reduzir o número de partidos por 
causa da fragmentação do Congresso seja válida. O modelo americano, 
inclusive, tem livre acesso para criar partidos, as restrições são do fundo 
recebido e da presença no Congresso, mas os partidos são livremente 
criados. Isso me parece uma solução mais inteligente que a do Lacerda.
Também levantava a bandeira de uma reforma interna do Congresso 
para assegurar melhor rendimento ao trabalho parlamentar e a elaboração, 
votação e fiscalização do orçamento. Então, a grosso modo é isso que ele 
defendia.
Recordo aqui também a experiência dele com a democracia cristã. 
Quando ele viajou pela Itália, encontrou-se na época com o Cardeal Montini, 
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futuro Papa Paulo VI36, e também com o secretário do Vaticano Monsenhor 
Tardini37 e, falando sobre Alcide de Gasperi38, um democrata cristão que 
se destacava na Itália, Lacerda diz que queria sair da UDN, porque a UDN 
tinha muitas brigas, muitos chapas brancas39 que se vendem ao governo 
e queria fundar um partido democrata cristão no Brasil — há agora um 
partido democrata cristão no Brasil, mas naquele momento ainda não 
tinha. Lacerda queria fazer um grande partido democrata cristão no Brasil, 
inspirando-se no sucesso dos ordo-liberais e dos democratas cristãos 
europeus. Monsenhor Tardini o desencorajou, pedindo-lhe que não fizesse 
isso, porque assim que o de Gasperi morresse, o partido democrata cristão 
italiano desmoronaria, e que não é uma boa ideia misturar a estrutura 
da Igreja acaba com partido. Lacerda desanimou da ideia e ficou mesmo 
sofrendo na UDN com os seus colegas com que ele se desentendia o tempo 
todo.
Lacerda diz que “A UDN visa a preservar e sustentar, levando-os à 
prática certos valores e princípios que se costuma resumir, chamando-os 
princípios da civilização cristã, como tal denominada a herança da cultura, 
do estilo de vida, pensamento e comportamento que recebemos da cultura 
judaica, grega e latina através dos nossos formadores, a religião cristã e a 
colonização portuguesa”. Nesse sentido Lacerda tinha um discurso que é o 
de partidos conservadores modernos.
Ele era muito entusiasta de um sacerdote católico chamado Fulton 
Sheen40, conhecido pelo seu trabalho de radialista, tanto que Lacerda se 
inspirou nas técnicas dele para falar na televisão e rádio. Fulton Sheen fala 
também da civilização cristã, e existe uma série de artigos do Fulton Sheen 
36 Giovanni Battista Enrico Antonio Maria Montini (1897-1978), foi o Sumo Pontífice da Igreja Católica Apostólica 
Romana de 21 de junho de 1963 até a data da sua morte.
37 Domenico Tardini (1888-1961) foi um cardeal italiano da Igreja Católica que trabalhou muitos anos na Cúria 
Romana.
38 Alcide de Gasperi (1881-1954) foi um político democrata cristão italiano que ocupou os cargos de presidente e 
primeiro-ministro da Itália.
39 Termo usualmente utilizado para designar as pessoas ou instituições que defendem um determinado gover-
no. Como até 2017 somente veículos de órgãos públicos possuíam placa na cor branca, ou seja, uma chapa branca, 
o termo foi aproveitado para criticar quem defende intransitivamente o governo.
40 Fulton John Sheen (1895-1979) foi um bispo e arcebispo americano da Igreja Católica conhecido por sua pre-
gação e, especialmente, por seu trabalho na televisão e no rádio.
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publicanos em A Tribuna da Imprensa41 como colaborador estrangeiro, aliás, 
folhear as páginas deste jornal e ver os nomes que havia ali, João Camilo 
de Oliveira Torres42, Gustavo Corção, é um outro mundo de jornalismo que 
é impensável hoje em dia. E Lacerda não só publicou os artigos do Fulton 
Sheen, como também o entrevistou e escreveu sobre as ideias dele em O 
Correio da Manhã43. E era basicamente essa pregação da civilização cristã, 
da necessidade de se cultivar uma base moral na sociedade, como inclusive, 
a ferramenta de fortalecimento das instituições liberais. Essa ideia de que 
o vácuo moral é prejudicial é uma ideia que parte tanto de Fulton Sheen 
quanto de Lacerda na rejeição que eles tinham ao economicismo.
Para Lacerda, a UDN deveria ter três grandes alvos a serem rejeitados 
na política brasileira: o primeiro deles é justamente o economicismo, 
pois o homem não é só a economia, não é só econômico, é preciso que 
o partido trabalhe, inclusive, com o senso de propósito, que se preocupe 
com a formação do imaginário e da mentalidade da população, até para 
que ela esteja mais preparada para a vida pública, para a vida democrática. 
Ele era contra o materialismo histórico, dialético e marxista, e era contra o 
nacionalismo, a UDN deveria ser para o Lacerda, contra o nacionalismo. Mas 
que ele está querendo dizer com isso?
Gustavo Corção escreveu um livro sobre isso, Patriotismo e 
Nacionalismo, é bom que se diga que essas palavras são polissêmicas 
nos rótulos políticos, a ponto de que é mais fácil entender e convencionar 
termos para se comunicar com base nos autores que está sendo trabalhado. 
Não existe uma única definição absoluta, universal, de liberalismo, de 
conservadorismo. 
Eu já me convenci disso e a mesma coisa acontece com o patriotismo 
e o nacionalismo. Roberto Campos44, por exemplo, vai dizer que ele mesmo 
é um nacionalista, mas um nacionalista de fins e não de meios, ou seja, a 
41 A Tribuna da Imprensa foi um jornal brasileiro fundado em 27 de dezembro de 1949 por Carlos Lacerda.
42 João Camilo de Oliveira Torres (1915-1973) foi um escritor, jornalista, professor e historiador brasileiro.
43 O Correio da Manhã foi um jornal brasileiro fundado em 15 de junho de 1901 por Edmundo Bittencourt e extin-
to em 08 de julho de 1974.
44 Roberto de Oliveira Campos (1917-2001) foi um economista, professor, escritor, diplomata e político brasileiro.
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meta dele é o bem do Brasil, o sucesso do Brasil, mas não pelo protecionismo 
econômico, não pelo inchaço do Estado. Ele vai usar, portanto, a palavra 
nacionalista com uma acepção positiva. Lacerda não, ele vai usar a acepção 
de Gustavo Corção, que diz que o patriotismo é o apreço natural merecido, 
cultivado, a liga que se cria numa sociedade pelo seu apreço a sua terra, 
sua história, ao fundamento de uma comunidade política desenvolvida 
em comum. Já o nacionalismo é uma doença do patriotismo, é a sua 
desnaturação, que coloca a nação como um ídolo acima de todos os outros 
aspectos da vida e da existência, coloca a nação acima do indivíduo, acima 
da família, acima da fé, acima do senso humanitário, a nação acima de tudo, 
isso seria o nacionalismo.
Lacerda não se afinava com Roberto Campos, inclusive, teve com ele 
uma discussão bastante acirrada acerca da Petrobras. Também discutiu 
com o General Horta Barbosa45, que era um dos defensores da estatização 
da Petrobras, aliás, é bom que se diga também que não é uma regra que 
os militares tenham sido a favor da linha mais estatizante. Houve um 
grande udenista chamado Juarez Távora46, que concorreu à presidência 
da República, um dos maiores defensores da liberdade da exploração do 
petróleo e era um militar, um dos tenentista, inclusive.
Lacerda, sobre a questão do não-alinhamento, dá demonstração 
da sua retórica quando diz que uma das bases argumentativas que esse 
pessoal usa para dizer que devemos ficar neutros é a autodeterminação 
dos povos, por exemplo, que nós não devemos nos meter, não devemos 
nos importar com a ditaduracubana. Ele então faz o seguinte raciocínio: 
Pode-se falar da autodeterminação da Hungria quando o seu povo não 
tiver para oprimi-lo a presença dos tanques russos, do Tibete quando em 
lugar do Dalai Lama autêntico, não imperar ali o sucedâneo, o fantoche 
45 Júlio Caetano Horta Barbosa (1881-1965) foi um militar e sertanista brasileiro. Destacam-se em sua trajetória a 
participação da Guerra de Canudos, a formação na Escola Militar da Praia Vermelha, a participação na equipe de 
Cândido Rondon e a presidência do Conselho Nacional do Petróleo (1938-1943).
46 Juarez do Nascimento Fernandes Távora (1898-1975) foi um militar e político brasileiro. Destacam-se sua partic-
ipação do Movimento Revolucionário Paulista (1924), foi eleito deputado em 1930 (mas não assumiu devido à Rev-
olução de 1930), participou da organização das Forças Expedicionárias Brasileiras (1939) e em 1946 filiou-se à UDN.
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do regime de Pequim.
 Ou seja, fala-se muito na intromissão na soberania nacional 
quando os Estados Unidos supostamente querem combater uma ditadura 
comunista, mas quando o império soviético colocava seus tanques para 
subjugar as nações do Leste Europeu, pode, é sobre isso que ele está falando. 
E continua seu raciocínio: 
“A autodeterminação da Polônia, da Hungria, da Tchecoslováquia, da 
Bulgária, da Romênia, da Estônia, Letônia, Lituânia, da Albânia e das minorias 
nacionais incorporadas pela força ao império comunista russo, daquelas 
parcelas grandes ou pequenas de território e nações inteiras, recentemente 
subjugadas por tratados iníquos, que consagraram por pactos malditos a 
agressão e a conquista, desses não se fala,
 A autodeterminação é condição de soberania, e a soberania do 
povo e do governo que o representa, por meio de processos definidos, 
com pequenas variações segundo a cultura e a civilização de cada povo, 
todos esses processos democráticos, sem embargo de suas variações, 
têm em comum uma constante, uma condição essencial, a liberdade de 
manifestação da vontade do próprio povo. Não a gritaria da massa na praça 
pública, porque tal manifestação é muito mais a dos regimes totalitários.”47
O povo precisa ter condições de organizar seu governo, investido 
de poderes por este mesmo povo, esse governo tem o condão de assumir 
compromissos com outras nações. E então ele fala da política internacional 
de Cuba em relação à América, que Cuba o fizera, quer dizer, assumiu esses 
compromissos com as demais nações americanas, compromissos que ainda 
eram válidos à revelia do que pensassem deles Fidel e sua trupe. Então, 
“As demais nações assumiram perante Cuba o compromisso de 
defender-se, defendendo-a, e de considerar agressão contra todas a 
agressão contra ela. Portanto, se tivesse razão o ditador Fidel Castro quando 
acusa os Estados Unidos de agressão a Cuba, tem a comunidade das nações 
47 BERLANZA, Lucas. Lacerda: A Virtude da Polêmica. São Paulo. LVM Editora. 2019.
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do continente o dever de definir-se para condenar o governo dos Estados 
Unidos. Ou, ao contrário, reforçar a ação que este proponha contra a agressão 
efetivamente cometida em Cuba, já não somente contra o povo cubano, 
mas contra a paz e a liberdade em todo o continente americano. Contra a 
fé dos tratados e a honra dos compromissos, contra a confiança dos povos 
cuja tranquilidade depende do respeito de cada nação aos compromissos 
que assumem com as demais. Assim, pois, falar de autodeterminação 
para justificar ou tolerar a ditadura cubana, ou melhor dito, anticubana, é 
exatamente usar o exemplo para provar o contrário do que se quer dizer.”48
Ele enfatiza muito que a ascensão do comunismo em Cuba é 
um satélite para a penetração soviética, para o ingresso soviético da sua 
ideologia na América e isto é uma ameaça a todos os americanos. Vai além 
dessa questão da autodeterminação nacional.
LACERDA E SALAZAR
Nessa questão do alinhamento internacional está bem definido, 
porque a grande preocupação internacional dele era com o comunismo. 
Inclusive, Lacerda tem uma relação polêmica com Salazar49, o ditador de 
Portugal, ele se dá relativamente bem com Salazar porque ele entende 
que, primeiro, desejava que houvesse uma aliança entre todos os países de 
língua portuguesa, que houvesse uma sinergia maior da identidade cultural 
e linguística, segundo, porque ele entendia que as colônias portuguesas, 
dominadas pela ditadura portuguesa, estavam desenvolvendo movimentos 
emancipacionistas por causa da pressão da União Soviética, da penetração 
dos movimentos comunistas nas colônias. Então ele temia que se perdessem 
aqueles países para a União Soviética. 
Para Lacerda, era melhor ficar com Salazar, e este adorava isso, 
tanto que quando Lacerda vai visitar Portugal, ele é muito bem recebido, 
48 BERLANZA, Lucas. Lacerda: A Virtude da Polêmica. São Paulo. LVM Editora. 2019.
49 António de Oliveira Salazar (1889-1970) foi um estadista nacionalista português e governou Portugal desde 5 
de julho 1932 até 27 de setembro de 1968.
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é aclamado em Portugal, porque é o único líder que fala bem do regime 
português, por causa desse cálculo pragmático de achar que o pior mal é a 
União Soviética.
Há uma conversa do Lacerda com Salazar que é engraçada, ele 
disse algo como: O Brasil é um país hegeliano, o Brasil dá saltos, o Brasil é 
um país de teses, antíteses e sínteses, além disso, se Vossa Excelência me 
permite, eu tenho também uma outra coisa a dizer: se a liberdade fosse 
uma glândula, Vossa Excelência seria privado dessa glândula. Espero que 
com isso não o esteja ofendendo, o que quero dizer, é que a liberdade para 
o senhor é um bem secundário, o que importa é a segurança, a unidade, a 
salvação, enfim, a permanência da pátria, para os brasileiros a liberdade é 
um bem essencial. Assim disse o Lacerda e é engraçado porque, apesar de 
muito cordato, jogou a verdade na cara de Salazar.
ROBERTO CAMPOS E LACERDA
Há uma opinião de Roberto Campos sobre Lacerda. Para quem 
não sabe, os dois tiveram um entrevero violento no Regime Militar, no 
mandato do Castello Branco, eu não vou detalhar, 
está no livro também as razões, os termos técnicos, a 
discussão econômica que foi travada entre os dois, não 
haverá tempo para isso mas, fundamentalmente, uma 
manifestação do desespero que o Lacerda já estava 
desenvolvendo e do clima político de endurecimento 
do regime que já se desenvolvia, e os dois brigaram 
feio, mas o Roberto Campos em A Lanterna na Popa 
diz o seguinte, no capítulo dedicado ao Lacerda, o 
grande desencontro, o nome já diz para ele o grande 
afastamento que não deveria ter havido, Roberto Campos diz assim: 
“quando a gente sente mais fundo que da vida nada se leva, 
aumenta o meu nível de tolerância. Verifico que o que houve entre mim 
Roberto Campos
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e Lacerda, foi um trágico desencontro. Pois tínhamos muitas coisas em 
comum. Ambos sofríamos do xingamento injurioso das esquerdas, que no 
Brasil exploram a mais larvar forma de xenofobia. Lacerda era acoimado de 
‘revolucionário a serviço do imperialismo americano’ e eu de ‘entreguista’. 
Ambos considerávamos o nacionalismo uma forma zangada e infantil de 
patriotismo”.
Neste trecho ele já usa a acepção do Gustavo Corção, mas no mesmo 
livro o Roberto Campos fala em nacionalismo como uma coisa boa, porque 
é o nacionalismo de fins que ele proclama. E continua:
“Dizia Lacerda: ‘o nacionalismo não é uma causa. É um pretexto... 
e uma impostura’. Acreditávamos ambos em austeridade monetária e 
fiscal. Detestávamos ambos o monopólio da Petrobras propugnado pelos‘nacionalistas do bananismo”, que é como Lacerda se referia ao General 
Horta Barbosa durante a campanha do ‘Petróleo é Nosso’. Estávamos ambos 
vacinados contra o despotismo e a ineficiência do comunismo. Lacerda 
por tê-lo praticado na juventude e eu pela análise histórica e sociológica. 
Sofríamos ambos daquilo que Assis Chateaubriand chamava de ‘índole 
da controvérsia’. Tínhamos em comum ambos suspicácia em relação ao 
Estado-empresário e eu considerava Lacerda um grande administrador. 
Éramos ambos privatistas. Nenhum de nós tinha a visão complexada da 
participação de capitais estrangeiros. Foi tudo um grande desencontro.”
A ANÁLISE DE LACERDA
Até aqui foi abordado o pensamento de Lacerda de maneira geral, 
pincelei aqui alguns trechos de ele expressando a sua visão de mundo, de 
cultura e de política, seu pensamento descentralizador, o seu pensamento de 
defesa da civilização cristã, toda aquela história de defender o alinhamento 
do Brasil à corrente ocidental. Agora, adentraremos na narrativa que ele 
construiu a respeito da história brasileira.
Essa narrativa, muito rapidamente passa pela monarquia, porque 
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Lacerda não se ocupou tanto da monarquia, mas elogiava José Bonifácio50, 
elogiava o realismo político da elite da monarquia e também dizia que se 
construiu um sistema político de retórica de alicerce liberal, o liberalismo do 
século XIX, sobre um oceano de escravos e fazendas. José Bonifácio também 
falava isso e Lacerda acrescenta que, por uma questão da própria limitação 
da sociedade civil que se construiu no Brasil, o sistema que conseguiu ter 
a sua estabilidade pelas suas cinco décadas na monarquia, operava e se 
mantinha funcional dependendo de uma série de intervenções do poder 
moderador muito mais do que, por exemplo, o sistema político britânico.
Os próprios liberais do Império reconheciam que havia deficiência 
naquele sistema político, não obstante, ele tenha se perenizado ali durante 
aquelas cinco décadas. Por fim, ele colapsa e entra a ditadura da República 
da Espada51. Não sei se pode chamar assim, não era propriamente ou 
formalmente uma ditadura, havia na época o desenvolvimento da discussão 
depois da constituinte em 1891, mas eram governos autoritários, governos de 
força, o governo de Floriano Peixoto52 mais do que o de Marechal Deodoro53, 
mas eram governos militares em que as correntes positivistas, as correntes 
autoritárias jacobinas, como se dizia na época, tinham bastante peso.
Depois disso, recapitulando, há a República Velha na qual também 
a representação é desfigurada pela Comissão Verificadora de Poderes54, 
pelos instrumentos estabelecidos na Política dos Governadores55, a Política 
do Café com Leite56. É um sistema em que a democracia não é efetivamente 
50 José Bonifácio de Andrada e Silva (1763-1838) foi um naturalista, estadista, e poeta luso-brasileiro. Destaca-se 
no campo da mineralogia por ter descoberto quatro novos minerais, já na política, antes da independência apoiou 
a regência de D. Pedro de Alcântara e, no período posterior, organizou a ação militar contra os focos da resistência 
à Separação de Portugal.
51 República da Espada foi o período no qual o Brasil foi governado pelo Marechal Deodoro da Fonseca e o Mare-
chal Floriano Peixoto e que compreendeu o período entre 1889 e 1894.
52 Floriano Vieira Peixoto (1839-1895) foi um militar e político brasileiro. Destacam-se os fatos de ter sido ele o pri-
meiro vice-presidente e o segundo presidente da República.
53 Manuel Deodoro da Fonseca (1827-1892) foi um militar e político brasileiro, o primeiro da República brasileira.
54 A Comissão de Verificação de Poderes, ou Comissão dos Cinco, foi uma comissão criada no período Imperial 
que, durante a República Velha, serviu de instrumento para reforçar a Política dos Governadores, pois possuía po-
deres para excluir os nomes dos grupos de oposição.
55 A Política dos Governadores ou Política dos Estados foi um acordo realizado nos primeiros anos da Repúbli-
ca Velha no qual o Governo Federal apoiava os governos estaduais e em troca estes faziam uso de seus coronéis 
(política conhecida como coronelismo) para elegerem uma bancada pró-Governo Federal. Assim, nem o Governo 
Federal, nem os governos estaduais, enfrentavam oposição.
56 A Política Café com Leite objetivava a predominância do poder nacional pelas oligarquias paulista (produtoras 
de café) e mineira (produtora de leite) executada durante o período da República Velha. Isso impedia que alguns 
estados de relevância econômica à época, como Rio Grande do Sul e Pernambuco, não tivessem aceso ao poder.
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vicejante, pujante, ela é um clube de oligarcas que mantém o sistema 
político em rédea curta e que também recorreu constantemente a estados 
de sítio, por exemplo, as políticas de salvação de Hermes da Fonseca57, 
que de política não tiveram nada, era política da pancada para manter as 
oligarquias descontentes sob controle dos estados. Desse manancial de 
insatisfações no processo de urbanização e do desenvolvimento dessa 
sociedade que faltava desde o Império até a República Velha, o alvorecer 
de um povo com mais densidade ansiando por participação acontece em 
todos os lugares, a formação da democracia de massa começa a acontecer.
Da erupção desse processo emergirá a condição para que se 
estabeleça a Revolução de 30 e, quando esta acontece, quebra e rompe 
com essa sequência morosa. Sob um aspecto mais geral a República Velha 
pode aparentar morosidade, mas, estudando detalhadamente, é o período 
que tem a maior concentração de revoltas e de conflitos possíveis. Esse 
joguete das oligarquias da República Velha é rompido com a Revolução 
de 30 que é comandada também por oligarquias, oligarquias descontentes 
com a eleição de Júlio Prestes58 para a presidência, e essa revolução coloca 
Getúlio Vargas no poder. 
O que Lacerda vai dizer disso tudo? Nesses primeiros quatro 
anos, estabelece-se o que ficou conhecido como Governo Provisório59 
(provisório que durou muito tempo), que o sr. Getúlio Vargas demorou 
muito para abrir mão do seu mandato provisório, um período que as 
pessoas, eu mesmo não compreendo o porquê, minimizam esses anos. 
Quando o Estado Novo começa em 1937, pelo menos há uma constituição, 
57 Hermes Rodrigues da Fonseca (1855-1923) foi um militar e político brasileiro presidente da República entre 1910 
e 1914. Em novembro de 1910 teve início a Revolta da Chibata, na qual controlou o motim prometendo anistia a to-
dos os envolvidos, para logo em seguida, declinar da sua palavra e começar um processo de expulsão. Foi seguido 
por um levante dos fuzileiros navais no qual o Marechal Hermes declarou estado de sítio e ordenou o bombardeio 
aos portos.
58 Júlio Prestes de Albuquerque (1882-1946) foi um advogado, fazendeiro, poeta e político brasileiro. Também foi 
o único presidente do Brasil eleito pelo voto popular que foi impedido de tomar posse.
59 Governo Provisório foi o primeiro período da Era Vargas (1930-1934) no qual Getúlio Vargas tornou-se chefe do 
Governo Provisório até 1934 quando foi promulgada a Constituição de 1934, e ocorreu uma eleição indireta para a 
presidência da República na qual venceu Getúlio Vargas que deveria governar até 03 de maio de 1938.
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a Constituição Polaca60, a Constituição de Francisco Campos, que é uma 
constituição que oficializa a ditadura, mas pelo menos há um documento 
lá que fala que o presidente pode isso, que o presidente pode mandar 
na tua vida, que pode roubar a tua mãe, mas está escrito. Nesse período, 
depois que a Revolução de 30 vence, Vargas que chega ao poder e 
estabelece o Governo Provisório, nem isso está presente, então fica um 
períodode governo totalmente discricionário, ditatorial, e isso irrita o 
pessoal de São Paulo e acontece a Revolução Constitucionalista em 193261. 
 
Aluno: Nem tinha essa previsão de que seria em 1932?
Na verdade, a Constituinte acontece em 193462 e acontece já sendo 
escamoteada, porque Vargas maneja para colocar lá os seus pelegos para 
votarem pela sua permanência, isso será visto no texto do Lacerda que será 
lido daqui a pouco. Inclusive, é o único artigo do Lacerda que eu fiz questão 
de colocar na íntegra no meu livro, um dos artigos mais importantes talvez 
da história política brasileira, que é um dos mais mencionados sempre com 
a amputação de conteúdo chave para entender o que Lacerda quis dizer.
Então, dois anos depois, tem a Revolução 
de 1932, os paulistas são derrotados, mas Vargas 
faz ali os seus acordos, suas conciliações e vai 
fazer a Constituinte, escamoteia a Constituinte 
para conseguir continuar como presidente, 
depois dá um golpe, manda fechar o Congresso. 
Os deputados saem do Parlamento e vão até 
o Palácio do Governo bater palmas e aclamar 
Getúlio, apenas uma minoria se insurge e 
60 A Constituição Brasileira de 1937, conhecida como Polaca, foi outorgada por Getúlio Vargas em 10 de novem-
bro de 1937. Por ser sido inspirada no modelo polonês que era bastante centralizador, ganhou este apelido. Foi 
redigida pelo jurista Francisco Campos, Ministro da Justiça do novo regime, foi previamente aprovada por Vargas e 
de Eurico Gaspar Dutra, na época, ministro da guerra.
61 Revolução Constitucionalista de 1932, conhecida também como Revolução de 1932 ou Guerra Paulista, foi um 
movimento armado em São Paulo, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul entre julho e outubro de 1932 que tinha 
por objetivo derrubar o governo de Vargas.
62 A Constituinte de 1934 culmina na Constituição Brasileira de 1934, promulgada em 16 de julho e, no dia se-
guinte, Vargas foi eleito presidente do Brasil.
Revolução de 1932
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vai embora sob queixumes. Como diz Lacerda, a corriola do Vargas vai lá 
cumprimentá-lo, aclamá-lo por ele ter estabelecido a salvação nacional, que 
seria a ditadura do Estado Novo. Aí fica esse tempo todo cultivando uma 
máquina política a serviço da ditadura constituída ali de interventores que 
vão governar discricionariamente os estados com mão de ferro, a máquina 
dos pelegos. Constrói o Ministério do Trabalho e coloca os sindicatos sob a 
sua tutela, sem eleições de fato nos sindicatos livres, tutelados pelo imposto 
sindical. Os pelegos passam a ser armas do exército do governo, gente de 
Vargas está nos sindicatos. Ele cria uma máquina toda a seu serviço. 
E então, o Brasil ingressa na guerra a favor dos Aliados por vários 
fatores: a questão econômica, o acordo da Companhia Siderúrgica Nacional63 
e a já citada questão que o povo brasileiro espiritualmente, digamos assim, 
não teria essa afinidade com o nazismo.
Uma vez que os Aliados vencem a guerra, o Brasil precisaria ter uma 
relação mais palpável e positiva com os americanos e com todo o lado 
ocidental, para, ao menos, parecer que não era uma ditadura que tinha 
lutado contra os ditadores, contra o Eixo, um regime muito mais parecido 
com os seus oponentes do que com os seus aliados, mas que travou as 
batalhas na guerra ao lado dos aliados democráticos. Ficou a contradição. 
O pessoal da FEB influencia a atmosfera a ir nessa direção possível, 
inclusive, no documentário As Imagens do Estado Novo, há o registro de 
uma manifestação, na época em que a guerra foi vencida, de brasileiros 
também comemorando a vitória e o Presidente Vargas aparece em público, 
saúda o seu povo e alguém levanta um cartaz cuja inscrição era Democracia, 
como que dizendo, “Aqui também, seu Vargas?! Não é só lá não, nós não 
mandamos nossos homens para se sacrificarem lá enquanto aqui a nossa 
liberdade é negada”. É uma cena impactante do documentário, Vargas 
aparece com um sorriso amarelo diante da faixa escrita Democracia.
63 A Companhia Siderúrgica Nacional foi criada durante o Estado Novo por Getúlio Vargas. Para que durante a 
Segunda Guerra Mundial o Brasil produzisse aço para os aliados, o governo brasileiro se uniu ao governo estadun-
idense através dos Acordos de Washington.
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Então, cria-se uma atmosfera em que alguém tem de fazer alguma 
coisa. A continuidade do Estado Novo perdeu o seu apoio internacional, 
inclusive. As ideologias fascistas ruíram — é bom que se diga que semelhança 
não é a absoluta equivalência, pois o varguismo era a ideologia de Vargas, 
não o fascismo propriamente dito. 
Uma das diferenças fundamentais seria o fato de que o regime 
varguista tem a sua raiz castilhista, mas não é 100% castilhista, ele fez o 
amálgama que ele achou conveniente aos seus interesses. Por exemplo, 
esse regime não se apoiava em partido de massa, já no fascismo, o partido 
fascista de Mussolini é um partido que se totaliza na sociedade. No caso 
de Vargas ele poderia ter usado os integralistas, mas os descartou, ele não 
quis essa opção, o regime dele era muito mais a figura dele, os elementos 
da nacionalidade, do que um partido de massa, então, há diferenças, mas 
se o regime brasileiro for comparado com o regime fascista italiano e com 
o regime americano, é óbvio com o qual ele era mais parecido, no entanto, 
lutou ao lado dos americanos.
Cria-se esse clima de estabelecer um novo regime e acabar com o 
Estado Novo. Vargas começa a fazer algumas concessões, permite partidos, 
mas o que acontece? Os principais partidos, o PTB e o PSD, tirando a UDN, 
esses dois partidos saem da máquina que ele montou na ditadura. O PSD 
é capitaneado pelos interventores, pessoas como Benedito Valadares64 e 
Amaral Peixoto65, que não estavam nem aí para a democracia. A verdade é 
essa. Inclusive, Vargas coloca o seu genro, Amaral Peixoto, como presidente 
do PSD e no PTB, que vai sair da máquina sindicalista e peleguista, coloca 
Lutero Vargas66, seu filho. Também João Goulart67 é uma das figuras 
64 Benedito Valadares Ribeiro (1892-1973) foi um jornalista e um político brasileiro muito influente na era Vargas. 
Destacam-se os cargos de governador de Minas Gerais (1933-1945), deputado federal por Minas Gerais (1946-1955) e 
senador por este mesmo estado (1955-1971).
65 Ernâni do Amaral Peixoto (1904-1989) foi um militar e político brasileiro. De sua carreira destacam-se o casa-
mento com Alzira Vargas, filha de Getúlio Vargas, foi nomeado interventor do estado do Rio de Janeiro e, após a 
redemocratização ajudou na fundação do Partido Social Democrático (PSD) pelo qual foi eleito deputado consti-
tuinte.
66 Lutero Sarmanho Vargas (1912-1989) foi um médico, político e diplomata brasileiro, filho mais velho de Getúlio 
Vargas.
67 João Belchior Marques Goulart (1919-1976), conhecido popularmente como Jango, foi um advogado e político 
brasileiro. Destaca-se o fato de ter sido deposto pelo Golpe Militar de 1964.
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destacadas do PTB. Então, toda essa gente saiu da máquina da ditadura.
Vargas começa a dar sinais de que 
ele apenas está ganhando tempo para 
permanecer no poder. Cria-se a onda do 
queremismo68. O que os queremistas diziam? 
Se olharmos as fotos da época, notaremos 
que há faixas com os seguintes dizeres 
“Queremos Vargas, com ou sem constituição”. 
A constituição é um detalhe, o líder é mais 
importante.
Percebeu-se que Vargas trabalhava com a sua base para tentar 
permanecer e, do próprio PSD, os militares que apoiaram o golpe, existe 
uma reação para tirar o Vargas do poder, pois percebem que não seria 
conveniente a perpetuação daquela ditadura. 
Góis Monteiro e Dutra tiram-no do poder, mas, quando acontece a 
eleição, Vargas apoia Dutra,apesar de ter sido traído por ele, porque sabe 
que Dutra não vai desmontar a máquina que ele fez, não vai desmontar a 
estrutura que ele criou, e não vai puni-lo. 
O que acontece é como se Hitler saísse de férias, deixasse todo o 
mundo no poder, toda a máquina que ele criou, todas as rádios que ele fez, 
a legislação eleitoral, que foi feita por gente dele, tudo fica montado, tudo 
fica prontinho, ele sai de férias, durante 5 anos permanece um militar que se 
desentendeu com ele por um átimo de segundo, vira presidente, com essa 
máquina toda a favor, e depois ele vai voltar e dizer “Agora é democracia”.
Por quê? Porque há uma constituição que a gente de Vargas fez, 
está escrita, mas a máquina é toda dele. Vargas, ditador, que governou sem 
constituição por aqueles quatro anos, suprimiu os paulistas, escamoteou 
a constituição de 1934 para continuar no poder, deu golpe, fechou o 
parlamento, sai de férias para a fazenda dele, enquanto toda a gente que 
68 Queremismo foi um movimento político surgido em maio de 1945 que objetivava defender a permanência de 
Getúlio Vargas no poder.
Movimento Queremista
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ele colocou no poder permanece com todo o controle da estrutura social 
do Brasil.
Lacerda vai dizer que o que acontece nesse momento é um sequestro 
dessa emancipação popular, dessa busca popular por participação, que seria 
o desenvolvimento de uma democracia de massa. Vargas sequestra esse 
povo para o seu entorno através das leis sociais e desfigura a construção 
e edificação de uma consciência política liberal-democrática baseada 
em instituições. Um sequestro que Lacerda vai enxergar repetindo-se na 
América Latina na referência que ele tem de Perón69 e é isso que ele vê 
acontecendo no Brasil. 
E cinco anos depois há uma eleição e Getúlio volta! Lacerda, 
então, publica o artigo de 1º de junho de 1950 na Tribuna da Imprensa. 
Vargas ainda era candidato nesse momento, estava se anunciando como 
candidato, estava se discutindo se ele poderia assumir o poder. É nesse 
momento que temos aquele parágrafo famoso 
do Lacerda: “O sr. Getúlio Vargas, senador, não 
deve ser candidato à presidência. Candidato, 
não deve ser eleito. Eleito, não deve tomar posse. 
Empossado, devemos recorrer à revolução para 
impedi-lo de governar” é a frase que o pessoal 
usa. O pessoal que estou falando, o público em 
geral, os escritores em geral, acadêmicos, as teses, separa esse parágrafo e 
botam isso. Falta um trecho, no final Lacerda diz assim: “Ele já fez várias, isso 
para ele não é novidade”, é a última frase do parágrafo, mas leiam o artigo 
inteiro, ele precisa ser lido por inteiro para se entender o contexto, mesmo 
que não se concorde com Lacerda, é preciso compreender a extensão do 
cenário para entender porque ele se portou da maneira que ele se portou. 
Para tanto, imagine-se que você é um líder democrata na Alemanha e você 
69 Juan Domingo Perón (1895-1974) foi um militar e político argentino. Destacou-se por ter sido presidente da Ar-
gentina em três mandatos: de 1946 a 1952, de 1952 a 1955 e de 1973 a 1974. Assim como Getúlio Vargas, buscou gan-
har popularidade através de iniciativas trabalhistas, inclusive, fundando o seu próprio partido, o Partido Justicialista.
Carlos Lacerda, Tribuna da Imprensa 
(1º de junho de 1950)
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vê o Hitler cinco anos depois voltar das férias e assumir o poder, como é que 
você reagiria?
Eu, sinceramente, no lugar de Lacerda provavelmente diria a mesma 
coisa, é revolução mesmo e dane-se. Diz assim Lacerda: “A esta hora, 
terá o sr. Getúlio Vargas recebido uma 
advertência oportuna. Não se trata de 
retirar-lhe os direitos políticos, pois o que 
não foi feito” isso Lacerda já defendia 
desde o fim do Estado Novo, que era 
absurdo terem feito uma constituinte 
formal com todos aqueles elementos 
autoritários permanecendo sem qualquer 
punição, sem qualquer investigação, sem 
qualquer apuração dos malfeitos que eles 
tinham desenvolvido, sem purgar a máquina que foi criada. Na Alemanha 
isso aconteceu por intervenção estrangeira, Nuremberg é prova disso. No 
Brasil não, aqui é como se os nazistas continuassem, no caso, os equivalentes 
brasileiros eram os varguistas. Lacerda continua: “pois o que não foi feito 
em 29 de outubro não teria cabimento agora”, deixaram ele manter seus 
direitos políticos num sistema eleitoral que permitia que ele concorresse 
em vários estados ao mesmo tempo, então, puxou ainda mais gente da 
máquina dele para dentro do poder:
“Menos ainda se trata de proibir-lhe o acesso a assembleias 
legislativas, para uma das quais, a mais alta de todas, foi eleito e à qual não 
se dignou de comparecer.
 Trata-se, isto sim, de advertir o antigo ditador sobre os perigos que 
ele faz correr a nação, e os que ele próprio terá de arrostar, se insistir em se 
prevalecer das armas democráticas que negou aos seus concidadãos para 
voltar ao poder de que se havia apropriado pela força.
Essa advertência feita agora com ponderação e equilíbrio pelo 
Carlos Lacerda
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Ministro da Guerra, sem arreganhos de força, mas sem o açodamento 
ignóbil com que alguns políticos e outros tantos militares desmandados 
procuram fazer reverdecer a árvore seca da ditadura, deve calar fundo no 
espírito do sr. Getúlio Vargas.
Ele bem sabe que não tem o direito de protestar contra qualquer 
aparente cassação de seus direitos de ser candidato à presidência da 
República. Candidato ele pode ser, o que não pode é ser presidente. 
Absurdo? De nenhum modo. O sr. Getúlio Vargas bem sabe que não é 
absurdo, uma vez que não fez outra coisa senão beneficiar-se dele.
Em 1930, derrotado na eleição, ainda que esta não fosse das mais lisas” 
porque Lacerda também era crítico da República Velha “prevaleceu-se de 
uma revolução para assumir a presidência. O candidato legalmente eleito é 
o sr. Júlio Prestes, quem subiu ao poder foi o sr. Getúlio Vargas.
Em 1934, quando a eleição deveria ser feita pela consulta direta ao 
sufrágio direto e universal, o sr. Getúlio Vargas manobrou de modo a que 
se escamoteasse a decisão das urnas — e se fez eleger pelo voto indireto da 
Constituinte. Com isso evitou o debate, a campanha e a concorrência nas 
urnas livres, e não houve candidato — pois quem estava, lá ficou.
Em 1937, quando se devia efetuar uma eleição livre e honrada, o 
grande benefício da Revolução de 30 ao Brasil, a qual deveria ser, apesar 
dos pesares, a consagração do seu governo, ele traiu a Constituição e, 
mentindo, fez-se ditador — cancelando a eleição e, portanto, suprimindo os 
candidatos.
Em 1945, preparava-se para fazer o mesmo quando foi apeado do 
poder. Com um governo provisório, ele se rebelou? Mostrou-se, acaso, 
inconformado? Nada disso. Concorreu muito bem comportado às eleições. 
E, à última hora fez valer todo o peso de sua propaganda e da confiança que 
de boa-fé depositava nele grande parte do povo para eleger o seu candidato, 
o candidato de Getúlio Vargas, chamado Eurico Gaspar Dutra. Aceitou, 
portanto, o novo estado de coisas, submeteu-se às regras e princípios que 
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informaram a nova, situação surgida do 29 de outubro. E fez das franquias 
que lhe foram concedidas o uso que se sabe, elegeu o general Dutra.
Agora, premido pelos famintos do poder e da volta à comilança, por 
todos os coronéis Teles, por todos os Artures Pires deste país, ele conta utilizar 
o honrado apoio de muitos brasileiros dignos que nele creem como tantos 
bons italianos acreditaram em Mussolini, ele se dispõe a ser candidato — e 
ainda pretende tomar posse. 
Não. Mil vezes não. Aindaque para isso seja preciso fazer uma 
revolução no Brasil, tenhamos a coragem de dizer claramente ao sr. Getúlio 
Vargas: desista, porque não voltará à presidência da República.
Isso desgostará a muitos brasileiros? É pena. O que não é possível é 
ver o governo que tem governado tão mal, por culpa do próprio sr. Getúlio 
Vargas que o elegeu, servir afinal à volta do seu antigo amo, do ditador 
fantasiado de democrata.
A campanha divide opiniões. A existência de mais um candidato 
divide salutarmente as correntes partidárias, provoca um choque útil — 
aquele que o Estado Novo procurou eliminar. Mas, uma vez terminada a 
campanha, cessa a luta e o que existe ou deve existir é apenas o governo e 
oposição numa emulação, numa concorrência útil ao país. 
A eleição do sr. Getúlio Vargas, porém, seria diferente. Ela não dividiria 
opiniões dos brasileiros, ela dividiria os brasileiros. Verdadeiramente 
não seria uma luta política, seria uma luta de vida ou morte, entre os 
que acreditam na democracia com democratas e os que acreditam na 
democracia com antidemocratas.
A divisão não seria de opiniões e sim de concepções de vida, 
do Estado, da sociedade, da nação. O sr. Getúlio Vargas deixaria de ser 
aquele velhote galhofeiro e churrascal do Itu, para ser então, na prática, o 
símbolo de uma empreitada monstruosa de destruição do regime em que 
pretendemos viver, e que ele já traiu mais de uma vez. 
O sr. Getúlio Vargas, senador, não deve ser candidato à presidência. 
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Candidato, não deve ser eleito. Eleito, não deve tomar posse. Empossado, 
devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar. Ele já fez várias, 
isso para ele não é novidade.
Sentimos no dever de lealmente lhe dizer que a advertência do 
Ministro da Guerra não é apenas o do oficialismo, a do governo, a das Forças 
Armadas. É a de uma parte considerável e também responsável da nação, 
que está pronta a se unir com o governo ou com quem quer que seja para 
evitar que ele, o traidor de 10 de novembro de 1937, volte a governar o Brasil 
com a sua camorra.
O Sr. Getúlio Vargas já teve tudo que podia esperar do Brasil — e 
muito mais. Deixe-o agora em paz, se quiser ter paz. Pois, se quiser guerra, 
ele a terá também, e não poderá se queixar dos resultados.”70
Esse era o estilo do Lacerda. Também disse na mesma época que 
a candidatura do Vargas não deveria ser registrada, o que seria uma 
economia de violência. Ele acabou provando que realmente Getúlio Vargas 
era incompatível com o regime democrático.
Lacerda diz: 
“O principal inimigo da democracia no Brasil chama-se Getúlio 
Vargas. Pois não é um inimigo em potencial, alguém que pode vir a ameaçar 
as instituições democráticas. Não. É alguém que já destruiu uma vez e que 
nada autoriza a crer que não virá a destruí-las outra vez como fez em 1930, 
para depois trair o ideal tenentista que teria justificado a supressão da 
Carta 91, em 1932, quando sufocou o movimento constitucionalista para ao 
mesmo tempo enfraquecer os homens de outubro, em 1935 para ‘sufocar’ 
uma quartelada que não valia mais que um susto, em 1937 (...) Diante de 
tais antecedentes, acreditar na ‘democracia’ a ponto de permitir que o seu 
inimigo se aposse do poder para destruí-la é o mesmo que destruir com 
as próprias mãos, a democracia cujo nome assim de degrada (...) O que 
realmente não se entende é um democrata que não esteja pronto a repelir, 
70 BERLANZA, Lucas. Lacerda: A Virtude da Polêmica. São Paulo. LVM Editora. 2019.
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por todos os meios, até pelos meios mais heroicos, a volta do traidor”.
Todos nós sabemos que isso não deu em nada, Getúlio Vargas foi 
eleito, tomou posse, e Lacerda ficou preocupado com o seguinte: se nós 
formos para a revolução, tem um risco de o pessoal do PSD, dos militares, 
Góis Monteiro, Dutra, esse pessoal se aproveitar disso e ficar no poder direto. 
Então é melhor a gente tentar fazer o que dá, tentar controlar o ditador que 
foi eleito presidente, tentar controlá-lo pelos meios disponíveis, apesar de 
tudo ser contra, nós vamos tentar fazer isso. E ele diz quando já se resolveu 
a eleição:
“Uma parte considerável do povo brasileiro, digamos mesmo a 
maioria, resolveu que o país deve — seria mais prudente dizer que essa parte 
decidiu que ele pode eventualmente — voltar à ditadura. Não lhe interessa 
a liberdade senão para aclamar o responsável pela escravidão. Existe esse 
direito da maioria condenar a minoria — e que minoria! Não uma parcela 
insignificante, mas uma parte considerabilíssima da nação à escravidão 
política? Pode o eleitorado, por majoritário que seja, decidir que um país 
não precisa de liberdade de pensamento e de palavra e não precisa do 
Congresso senão na medida em que ele for subserviente à demagogia do 
‘chefe nacional’? (...) Nem a maioria, nem a totalidade do povo pode abrir mão 
de sua liberdade, que não é apenas um direito, mas é igualmente um dever. 
Existe o dever de ser livre. Não existe o direito de ser escravo (...) A divisão 
que se operou no país não foi a de facções, a de parcialidades políticas, 
fundadas na diversidade de programas fiéis, no entanto, à essência de uma 
mesma concepção do Estado e da sociedade. Não. O que atingiu o país foi 
uma ruptura que o rachou quase de meio a meio. De um lado estão os que 
não se incomodam com a liberdade e que, portanto, não dão um doce pela 
Constituição com todos os seus direitos, porque malbarataram o seu direito 
desde que não cumpriram o seu dever — que é o de seguirem e fazerem 
seguir a Constituição que é a norma fundamental da comunidade política. 
De outro lado, aqueles também numerosos, miseravelmente traídos, ou 
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levados, tantos deles, no engodo de campanhas falsamente conduzidas 
e pessimamente desenvolvidas, mas sempre e com direitos muito mais 
firmemente estabelecidos, dispostos a não viver na escravidão política, a 
usar e reclamar os seus direitos porque cumprem o seu dever de respeito 
à Constituição e às normas que ela estabelece para a convivência nacional. 
A casa, portanto, está dividida. Não é uma separação ocasional do jogo 
político, mas uma divisão fundamental, que atinge a própria concepção da 
sociedade e do Estado, para não dizer a própria concepção da vida.”71
Em algum momento, um lado vai ter de prevalecer. As tentativas 
varguistas de subtrair a normalidade e estabelecer no Brasil uma réplica 
do peronismo, não mais com a natureza ortodoxa do fascismo ou com a 
natureza do Estado Novo formalmente, mas aliando-se de maneira mais 
explícita à demagogia dos setores mais esquerdistas, construindo, como 
Perón fez, uma aliança com os comunistas. E Vargas constrói essa aliança 
em 50 para se eleger, puxando a coisa mais para a esquerda e era isso que 
o Lacerda temia.
Todos nós sabemos onde isso vai acabar. Getúlio Vargas mantém 
ao seu redor uma guarda pessoal ilegal que foi criada no Estado Novo 
capitaneada pelo sr. Gregório Fortunato72. Lacerda bate no Banco do Brasil, 
porque este na época era o coração da economia e impunha as restrições 
de verbas, como o dinheiro seria usado, que negócios iam funcionar, e o 
governo usava aquilo ali para financiar candidaturas, financiar os seus 
aliados econômicos, então era uma máquina econômica que estava 
disponível.
Lacerda baterá no Banco do Brasil, vai bater no peleguismo, na 
máquina do PSD e PTB que passa a se juntar em torno das forças varguistas, 
e nessa retórica varguista de passar por cima do Parlamento, porque Vargas 
já começa a voltar a desprestigiar o Legislativo. Lacerda bate tanto que 
71 BERLANZA, Lucas. Lacerda: A Virtude da Polêmica. São Paulo. LVM Editora. 2019.
72 Gregório Fortunato (1900-1962),

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