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Isabela G. Campos 1 TUTORIA (SP-9) 1) ENTENDER COMO O ETILISMO CRÔNICO CAUSA CIRROSE. O consumo excessivo de álcool (etanol) é a principal causa de doença hepática na maioria dos países ocidentais. O álcool é responsável por 3,8% das mortes em todo o mundo, tornando-se o oitavo maior fator de risco de morte (quinto em países de renda média e nono em países de alta renda). No alcoolismo crônico, vários órgãos e sistemas do corpo humano sofrem alterações diversas. Queixas de náuseas e vômitos matinais são comuns quando há uso abusivo de álcool, podendo ou não estar associadas a processos pépticos, ao passo que anorexia e perda de peso, sugerindo doença digestiva, também são encontradas no alcoolismo. O álcool é carcinógeno, sendo que o consumo alcoólico está relacionado com câncer de boca, faringe, laringe e esôfago. Por outro lado, o câncer de fígado, relacionado com o alcoolismo, surge apenas nos pacientes que já desenvolveram cirrose. Aceita-se, atualmente, que a ingestão média diária superior a 40 g para o homem e 20 g para a mulher é compatível com o desenvolvimento de doença hepática alcoólica. A ingestão em curto prazo de até 80 g de álcool (seis cervejas ou 30 mililitros de uma bebida de 40% de teor alcoólico), durante um a vários dias, geralmente produz esteatose hepática leve e reversível. A ingestão diária de 80 g de etanol, ou mais, gera um risco significativo de lesão hepática severa, e a ingestão diária de 160 g ou mais por 10 a 20 anos está associada, de modo mais consistente, à lesão hepática severa. Contudo, apenas 10% a 15% dos alcoolistas desenvolvem cirrose. O etanol pode produzir efeitos adversos em diversos órgãos, entre eles fígado, esôfago, estômago, intestino, pâncreas, coração e cérebro, prejudicando as principais funções vitais. Desses, o fígado é o mais afetado no organismo, sendo a doença hepática alcoólica (DHA) uma das doenças hepáticas mais comuns do mundo ocidental. Usualmente, a DHA é dividida em três formas que podem sobrepor-se: (1) a esteatose hepatocelular ou alteração gordurosa, (2) a hepatite alcoólica (ou esteato-hepatite), e a (3) esteatofibrose (padrões de cicatrizes típicas para todas as doenças hepáticas gordurosas, incluindo álcool), que se soma à cirrose nos estágios tardios da doença. Por algum motivo desconhecido, a cirrose se desenvolve apenas em uma pequena fração de alcoolistas crônicos. Doença hepática alcoólica. As inter- relações entre a esteatose hepática, a hepatite alcoólica e a cirrose alcoólica são mostradas juntamente com ilustrações das principais características morfológicas. Deve-se notar que a esteatose, a hepatite alcoólica e a esteatofibrose podem desenvolver-se independentemente. Alguns pacientes apresentam inicialmente cirrose sem qualquer outra forma de doença hepática alcoólica. Isabela G. Campos 2 Fatores de Risco Outros fatores também devem influenciar o desenvolvimento e a severidade da doença hepática alcoólica. Esses incluem: • Gênero. As mulheres parecem ser mais suscetíveis à lesão hepática que os homens, embora a maioria dos pacientes seja do sexo masculino. Essa diferença pode estar relacionada com a farmacocinética e o metabolismo do álcool, e a resposta dependente de estrogênio à endotoxina derivada de intestino (LPS) no fígado. Embora os mecanismos exatos não sejam conhecidos, parece que o estrogênio aumenta a permeabilidade do intestino a endotoxinas, as quais, por sua vez, aumentam a expressão do receptor CD14 de LPS nas células de Kupffer. Isso predispõe ao aumento da produção de citocinas pró-inflamatórias e quimiocinas. • Diferenças étnicas e genéticas. Nos Estados Unidos, as taxas de cirrose são maiores em consumidores afro-americanos do que em americanos brancos. A diferença não pode ser explicada pela quantidade de álcool consumido, uma vez que não existe uma diferença significativa no consumo entre os grupos étnicos. Estudos com gêmeos sugerem que há um componente genético em doenças hepáticas induzidas por álcool, embora ainda seja difícil separar a genética das influências ambientais. Polimorfismos genéticos em enzimas desintoxicantes e alguns promotores de citocinas podem desempenhar papéis importantes e contribuir para as diferenças étnicas. A ALDH*2, uma variante da aldeído-desidrogenase (ALDH), encontrada em 50% dos asiáticos, tem uma atividade muito baixa. Indivíduos homozigotos para a ALDH*2 são incapazes de oxidar o acetaldeído e não toleram o álcool, sendo a intolerância ao álcool caracterizada por rubor na parte superior do corpo e, variavelmente, náuseas ou letargia. • Condições comórbidas. Sobrecarga de ferro e infecções por HCV e HBV interagem com álcool, levando ao aumento da gravidade da doença hepática. Metabolização do álcool Após ingestão, o álcool é absorvido pelas mucosas gástrica (cerca de 75%) e intestinal (25%) por difusão passiva simples sem necessitar de processos de digestão. Pequena quantidade pode ser absorvida pelas membra-nas das mucosas da boca e do esôfago. São três as possíveis vias metabólicas percorridas pelo etanol para sua oxidação, a saber: (1) sistema da álcool-desidrogenase (ADH), situado no citosol; (2) sistema microssômico (MEOS) situado no retículo endoplasmático liso; e (3) sistema da catalase, situado nos peroxissomos. Sabe-se que, em humanos, mais de 80% do etanol ingerido é rotineiramente oxidado pelo sistema ADH, sendo que o sistema da catalase é utilizado muito eventualmente. Qualquer que seja a via metabólica na oxidação do etanol absorvido, ele deve se transformar em aldeído acético e, posteriormente, em acetato. Esse aceta - to, lançado na circulação sanguínea, é rapidamente transformado em dióxido de carbono e água. Patogenia A exposição ao álcool causa esteatose, disfunção das membranas mitocondriais e celulares, hipoxia e estresse oxidativo. Em concentrações milimolares, o álcool afeta diretamente as funções microtubular e mitocondrial e a fluidez da membrana. A esteatose hepatocelular resulta de (1) desvio dos substratos normais do catabolismo para a biossíntese de lipídios, como resultado do aumento da geração de nicotinamida adenina dinucleotídeo reduzida (NADH) pelas duas principais enzimas do metabolismo do álcool, álcool desidrogenase e acetaldeído desidrogenase; (2) prejuízo da formação e secreção de lipoproteínas; e (3) aumento do catabolismo periférico de gorduras, liberando assim ácidos graxos livres na circulação. Isabela G. Campos 3 As causas da hepatite alcoólica são incertas, mas alguns fatores que provavelmente desempenham papéis importantes são discutidos a seguir. O acetaldeído (o principal metabólito intermediário do álcool) induz peroxidação e formação do aduto acetaldeído-proteína, desorganizando ainda mais o citoesqueleto e a função das membranas. O metabolismo pelo citocromo P-450 produz espécies reativas de oxigênio (ROS), que reagem com proteínas celulares, danificam as membranas e alteram a função hepatocelular. Além disso, o álcool prejudica o metabolismo hepático da metionina, o que provoca a diminuição dos níveis de glutationa, consequentemente sensibilizando o fígado à lesão oxidativa. A indução do citocromo P-450 no fígado pelo álcool aumenta o catabolismo do álcool no retículo endoplasmático e intensifica a conversão de outros medicamentos (p. ex., acetaminofeno) em metabólitos tóxicos. O álcool causa a liberação de endotoxinas bacterianas do intestino para a circulação portal, induzindo respostas inflamatórias no fígado, devido à ativação de NF-κB e a liberação de TNF, IL-6 e TGF-α. Além disso, o álcool estimula a liberação de endotelinas das células endoteliais sinusoidais, causando vasoconstrição e a contração de células estreladas miofibroblásticas ativadas, levando à diminuição da perfusão sinusoidal hepática. Em resumo, a doença hepática alcoólica é um distúrbio crônico caracterizado por esteatose, hepatite, fibrose progressiva e desorganizaçãoacentuada da perfusão vascular. Em essência, a doença hepática alcoólica pode ser considerada como um estado mal adaptativo, no qual as células do fígado respondem de maneira cada vez mais patológica a um estímulo (álcool) que, no início, era apenas marginalmente nocivo. Acrescentando... A lesão hepática inicial e a mais frequentemente encontrada, quando há consumo agudo ou crônico de etanol, é a ESTEATOSE HEPÁTICA. Sua patogênese, como visto anteriormente, está ligada aos processos bioquímicos de metabolização do etanol. Fundamentalmente, ocorre diminuição na degradação das gorduras, aumento de sua síntese e uma resposta lipoproteica inadequada no transporte da gordura para fora do fígado. Tanto a quantidade quanto o tipo de gorduras da dieta, como os ácidos graxos poli-insaturados, parecem ter importância para o grau de lesão. Na fase de esteatose, encontra-se grandes quantidades de lipídios neutros acumulados no interior dos hepatócitos, com distribuição inicial e preferencial na área centrolobular ou zona 3 de Rappaport. Classicamente, distinguem-se dois tipos de esteatose: a microgoticular e a macrogoticular. Esta última é mais frequente na DHA, podendo as gotas de gordura ser tão grandes, que deslocam o núcleo da célula para a periferia, próximo à membrana. Na esteatose hepática, a estrutura lobular do fígado encontra-se inalterada, a fibrose é ausente ou, quando presente, de grau mínimo, restringe-se às veias centrais, não havendo processo inflamatório associado. A HEPATITE ALCOÓLICA, diferentemente da esteatose, ocorre apenas em casos de etilismo crônico, embora possa ser resultante de uma exacerbação alcoólica recente. A patogênese é multifatorial, e entre os fatores envolvidos cita-se a anoxia, para explicar a predominância da lesão em área centrolobular do fígado, onde os teores de oxigênio são mais baixos. Também a produção de radicais livres durante a oxidação do etanol e do acetaldeído, assim como a formação de agregados proteicos insolúveis (aductos), produzem lesões da membrana hepatocelular. Além do papel central das endotoxinas, já comentado, com aumentos de TNF-alfa (fator de necrose tumoral), Isabela G. Campos 4 IL-6 (interleucina-6), IL-8 (interleucina-8) e várias citocinas, outros fatores são o desenvolvimento de lesão imunológica, com formação de neoantígenos, e linfócitos citotóxicos agredindo as células. A caracterização de hepatite alcoólica é feita preferencialmente pela análise histopatológica de espécime obtida por biópsia ou necrópsia, embora alguns dados clínicos e laboratoriais possam ser bastante sugestivos desse diagnóstico. Na hepatite alcoólica, ocorre fundamentalmente necrose e/ou degeneração balonizante dos hepatócitos com reação inflamatória, na qual predominam caracteristicamente os polimorfonucleares neutrófilos e presença de fibrose fina entre as células hepáticas. Os processos degenerativos do hepatócito podem ocasionar o surgimento de aglomerados intracelulares de substância hialina, também denominados corpúsculos de Mallory. Assim como na esteatose, todo esse processo ocorre preferencialmente nas áreas centrolobulares, sendo importante o acometimento da veia central ou hepática, que também pode sofrer processo de esclerose hialina, com oclusão parcial ou total. A fibrose costuma se estender aos sinusoides, mostrando aspecto característico, particularmente na zona 3 de Rappaport. Como apenas 20% dos etilistas crônicos, com quantidade e tempo de etilismo semelhantes, desenvolvem cirrose, é possível afirmar que diferentes fatores, além desses, contribuem para essa evolução. Se for considerado o mesmo espaço de tempo, em média 20 a 40 anos de etilismo, sabe- se que, quanto maior a quantidade de etanol ingerido, maiores são as probabilidades de desenvolvimento de cirrose, podendo chegar a 50% dos casos. O grande fator patogênico para o desenvolvimento de CIRROSE é, certamente, a progressão da fibrose. Recentemente, diversos estudos têm elucidado os complexos mecanismos da fibrogênese e, em menor proporção, da possível degradação da matriz extra - celular, tanto por ação das colagenases quanto por outros mecanismos. Na cirrose, assim como em outras doenças hepáticas, o dano celular e o processo inflamatório propiciam a evolução para regeneração celular e fibrose. Na cirrose alcoólica, caracteristicamente, os nódulos de regeneração costumam ser pequenos (micronódulos) e a fibrose que os envolve não é extremamente densa. Nas fases finais da cirrose alcoólica, entretanto, principalmente quando o tempo de abstinência é longo, os dados histopatológicos sugestivos dessa etiologia desaparecem totalmente. Referências: 1. Tratado de gastroenterologia : da graduação à pós-graduação / editores Schlioma Zaterka, Jaime Natan Eisig. -- 2. ed. -- São Paulo : Editora Atheneu, 2016. 2. Robbins & Cotran, patologia : bases patológicas das doenças / Vinay Kumar, Abul Abbas, Jon Aster ; com ilustrações de James A. Perkins. - 9. ed. - [Reimpr.]. - Rio de Janeiro : GEN | Grupo Editorial Nacional. Publicado pelo selo Editora Guanabara Koogan Ltda., 2021. 3. Clínica médica, volume 4: doenças do aparelho digestivo, nutrição e doenças nutricionais. – 2. ed. – Barueri, SP: Manole, 2016. 2) SOBRE A HIPERTENSÃO PORTAL: A. CONCEITO. A hipertensão portal (HP) é uma síndrome clínica caracterizada pelo aumento de pressão no sistema porta, com consequentes alterações hemodinâmicas esplâncnicas e sistêmicas, que originam as principais complicações das hepatopatias crônicas, tais como hemorragia digestiva alta, ascite e peritonite bacteriana espontânea síndrome hepatorrenal, encefalopatia hepática e síndrome hepatopulmonar. Todas essas complicações clínicas da HP relacionam-se fundamentalmente à formação de veias colaterais e à circulação hiperdinâmica em nível esplâncnico e sistêmico. Isabela G. Campos 5 OU SEJA, a hipertensão portal, é a expressão do aumento da pressão hidrostática (força exercida pelo sangue dentro dos vasos), intra-hepático, no interior do sistema porta. A pressão venosa é configurada HP quando maior que 5 mmHg. A hipertensão portal resulta no desenvolvimento de canais colaterais nos locais onde os sistemas porta e cava se comunicam. Essas veias colaterais permitem que alguma drenagem ocorra, mas, ao mesmo tempo, levam ao desenvolvimento de plexos venosos subepiteliais e submucosos congestos dentro do esôfago distal e do estômago proximal. Essas veias, chamadas de varizes, se desenvolvem, na grande maioria dos pacientes cirróticos, mais comumente associadas a doença hepática alcoólica. B. FISIOPATOLOGIA. Hipertensão portal (HP) consiste no aumento da pressão hidrostática no interior do sistema portal, que se origina nos capilares dos intestinos e nos sinusoides da polpa esplênica, sendo a veia porta formada pela confluência da veia esplênica com as veias mesentéricas superior e inferior. Dois terços do fluxo hepático de 1.500 mL de sangue por minuto são fornecidos pelo sistema portal, enquanto a artéria hepática é responsável por metade do fornecimento de oxigênio ao fígado. A rede sinusoidal do fígado oferece baixa resistência ao fluxo sanguíneo, sendo sua pressão menos de 7 mmHg acima daquela da veia cava inferior. Pressões acima de 17 mmHg no tronco da veia porta caracterizam HP; quando a pressão de oclusão é superior a 8 mmHg, trata-se de hipertensão pós-sinusoidal. A pressão de oclusão é obtida por cateterização das veias supra- hepáticas até o momento em que o cateter oclui um ramo de igual calibre, acreditando-se que seja essa a medida da pressão sinusoidal. Qualquer aumento na resistência ao fluxo sanguíneo em qualquer ponto do sistema portal leva a HP. Nesse sentido, a HP é classificada como: ■Pré-sinusoidal ■pré-hepática: trombose ou invasão neoplásica do tronco da veia porta e/ou esplênica, esplenomegalia com aumento do fluxo esplênico; ■hepática: fibrose portal esquistossomótica, fibrose hepáticacongênita, sarcoidose, toxinas, esclerose hepatoportal; ■Sinusoidal ■cirroses (também com componente pós-sinusoidal), hepatite alcoólica, substâncias citotóxicas, intoxicação pela vitamina A; Obs. causa intra-hepática DOMINANTE É A CIRROSE ■Pós-sinusoidal ■hepática: cirroses, síndrome de oclusão sinusoidal/doença veno-oclusiva e esclerose hialina centrolobular de esteato-hepatites; ■pós-hepática: síndrome de Budd-Chiari, compressão ou membranas nas veias hepáticas, obstrução da veia cava inferior (trombose, invasão neoplásica, membranas), insuficiência cardíaca por diversas causas. O estado hipertensivo deve-se a vários fatores: (1) incremento do fluxo sanguíneo portal, por alterações na circulação esplâncnica (vasodilatação arterial, com aumento do sangue venoso); (2) aumento da resistência ao fluxo sanguíneo nos sinusoides hepáticos, por compressão destes por nódulos e fibrose, contração da musculatura dos vasos por liberação de fatores vasoconstritores (endotelina, angiotensina), contração das células estreladas ou redução na síntese de óxido nítrico; Isabela G. Campos 6 (3) anastomoses arteriovenosas (shunts portais), situação em que o sangue arterial, com pressão elevada, é lançado diretamente no sistema venoso. Entendendo melhor... Envolve a resistência ao fluxo portal ao nível dos sinusoides e um aumento do fluxo portal causado pela circulação hiperdinâmica. A maior resistência ao fluxo portal ao nível dos sinusoides é causada pela contração de células da musculatura lisa vascular e miofibroblastos e pela interrupção do fluxo sanguíneo por cicatrização e formação de nódulos parenquimatosos. As alterações nas células endoteliais sinusoidais, que contribuem para a vasoconstrição intra-hepática associada com hipertensão portal, incluem uma diminuição na produção de óxido nítrico e um aumento da liberação de endotelina-1 (ET-1), angiotensinogênio e eicosanoides. A remodelação sinusoidal e a anastomose entre o sistema portal e arterial nos septos fibrosos contribuem para a hipertensão portal através da imposição de pressões arteriais no sistema venoso portal de baixa pressão. A remodelagem sinusoidal e as derivações intra-hepáticas também interferem com a troca metabólica entre o sangue sinusoidal e os hepatócitos. Outro fator importante no desenvolvimento da hipertensão portal é um aumento no fluxo de sangue venoso portal, resultante de uma circulação hiperdinâmica. Isso é causado pela vasodilatação arterial, principalmente na circulação esplâncnica. O maior fluxo sanguíneo arterial esplâncnico, por sua vez, provoca o aumento do efluxo venoso para o sistema venoso portal. Embora vários mediadores como prostaciclina e TNF tenham sido implicados na causa da vasodilatação arterial esplâncnica, o NO emergiu como o mais significativo. C. QUADRO CLÍNICO. As quatro principais consequências clínicas da hipertensão portal são (1) ascite, (2) formação de derivações venosas portossistêmicas, (3) esplenomegalia congestiva e (4) encefalopatia hepática. Isabela G. Campos 7 Principais consequências da hipertensão portal em um quadro de cirrose, mostradas em um indivíduo do sexo masculino. Nas mulheres, oligomenorreia, amenorreia e esterilidade são resultados frequentes do hipogonadismo. Achados clinicamente significativos estão destacados em negrito. (1) ASCITE: O acúmulo de líquido em excesso na cavidade peritoneal é conhecido como ascite. Em 85% dos casos, a ascite é causada por cirrose. A ascite, em geral, é clinicamente detectável quando há acúmulo de, pelo menos, 500 mL. O líquido geralmente é seroso, apresentando menos de 3 g/dL de proteína (em grande parte albumina) e um gradiente de albumina entre o soro e a ascite ≥ 1,1 g/dL. O líquido pode conter um número escasso de células mesoteliais e leucócitos mononucleares. O influxo de neutrófilos sugere infecção, enquanto a presença de células sanguíneas aponta para um possível câncer intra-abdominal disseminado. Na ascite de longa duração, o vazamento do líquido peritoneal pelos linfáticos transdiafragmáticos pode produzir hidrotórax, mais frequentemente do lado direito. A patogenia da ascite é complexa, envolvendo os seguintes mecanismos: quando há obstrução ao fluxo portal, o sangue começa a se acumular em leitos vasculares que normalmente drenam para a veia porta. Em cirróticos, o aumento da pressão hidrostática - força exercida pelos líquidos que tende a expulsar o líquido de seu compartimento - nos vasos esplâncnicos, associado à diminuição da pressão oncótica - força que atrai água para o compartimento-, secundária à hipoalbuminemia, resulta em extravasamento do fluido para a cavidade peritoneal. Uma vez ultrapassada a capacidade de reabsorção do fluido pelos vasos linfáticos forma-se a ascite. (2) Formação De Derivações Venosas Portossistêmicas: com a elevação da pressão no sistema portal, o fluxo é invertido da circulação portal para a sistêmica pela dilatação de vasos colaterais e pelo desenvolvimento de novos vasos. Circuitos venosos secundários se desenvolvem em qualquer local onde as circulações sistêmicas e portal compartilhem de leitos capilares comuns. Os principais pontos consistem nas veias ao redor e no interior do reto (manifestados como hemorroidas), na junção gastroesofágica (produzindo varizes), no retroperitônio e no ligamento falciforme do fígado (envolvendo colaterais periumbilicais e da parede abdominal). Muito mais importantes são as varizes gastroesofágicas que aparecem em cerca de 40% dos indivíduos com cirrose hepática avançada e causam hematêmese maciça e morte em aproximadamente metade dos casos. Cada episódio de sangramento está associado a uma mortalidade de 30%. Colaterais da parede abdominal aparecem como veias subcutâneas dilatadas, as quais se estendem do umbigo até as bordas das costelas (cabeça de medusa) e constituem uma importante característica clínica típica da hipertensão portal. (3) Esplenomegalia Congestiva: A congestão de longa duração pode causar esplenomegalia congestiva. O grau de aumento esplênico varia muito e pode chegar a até 1.000 g, mas não está necessariamente correlacionado a outras características da hipertensão portal. A esplenomegalia maciça pode induzir Isabela G. Campos 8 secundariamente anormalidades hematológicas atribuíveis ao hiperesplenismo, como trombocitopenia ou até mesmo pancitopenia. (4) Encefalopatia Hepática: é resultado da insuficiência hepática, podendo se desencadear encefalopatia hepática ou encefalopatia portossistêmica. Encefalopatia hepática: Quando existe a falência do fígado em metabolizar certas substancias consideradas toxicas, seguindo na circulação e atingindo o sistema nervoso. Ex. Amônia. Encefalopatia portossistêmica: Quando ocorre o desvio do sangue porta para o sistema cava, sem passar pelo fígado, também atingindo o sistema nervoso com componentes tóxicos. Em ambas as situações, as toxinas podem atingir o SN, podendo se passar por neurotransmissores e causar uma encefalopatia, cominando na deterioração da função cerebral, sendo a capacidade de ficar alerta e confusão mental um dos sinais clínicos. As principais manifestações clínicas da hipertensão portal são desenvolvimento de varizes esofagogástricas com risco de sangramento varicoso, gastropatia hipertensiva, ascite, peritonite bacteriana espontânea (PBE) e encefalopatia hepática. A HDA varicosa é a manifestação clínica mais característica da hipertensão portal. A presença de varizes de esôfago correlaciona-se com a gravidade da cirrose. As varizes estão presentes em cerca de 30 a 40% dos cirróticos compensados e em até 80% dos cirróticos descompensados no momento do diagnóstico da cirrose. D. DIAGNÓSTICO. Objetivado o diagnóstico da hipertensão portal tem-se disponível métodos não invasivos como a elastografia transitória e abordagens invasivas como a biópsia hepática e a endoscopia digestiva alta. A elastografia transitóriadispensa da análise de frequência de ondas para correlação com a resistência tecidual hepática. Com a utilização de um aparelho de ultrassom são obtidos pulsos-eco que permitem através da medição da velocidade de propagação determinar o estado do tecido. A elastografia é realizada com o paciente em decúbito dorsal sendo colocado nos espaços intercostais o transdutor e, dessa forma, é determinada a medição. Trata-se de uma técnica fácil, rápida e indolor. No quadro atual, poucos são os estudos que comprovam a especificidade da elastografia transitória no âmbito da hipertensão portal. Para além disso, limitações e fatores confundidores corroboram para não utilização da técnica. A biópsia hepática e a endoscopia digestiva alta são opções a muito empregadas para o diagnóstico de hipertensão portal. No entanto, pelas limitações que a biópsia hepática apresenta como erros de amostragem, elevada variabilidade interobservador, ser um procedimento invasivo e ter um potencial significativo de mortalidade e morbidade a endoscopia digestiva alta é considerada padrão ouro em quadros de hipertensão portal. Os achados endoscópicos podem ser classificados em varizes esofágicas, sinais de cor avermelhada, varizes gastroesofágicas, varizes gástricas isoladas e gastropatia de hipertensão portal. Sendo assim, mostra-se o alcance que a técnica permite para o diagnóstico do paciente. Outra técnica também utilizada para a avaliação do sistema venoso portal é a ecoendoscopia. Mesmo não permitindo a visualização na integra da vascularização hepática ainda se consegue oferecer um largo espectro circulatório. Mesmo assim, estudos mostram que a ecoendoscopia é menos sensível que a endoscopia digestiva alta. Isabela G. Campos 9 Outros exames podem ser úteis para o diagnóstico visto que a a hipertensão portal é uma complicação decorrente de outras doenças e pode demandar abordagens distintas. Mas, estudos convergem na utilização da endoscopia digestiva alta como uma abordagem preconizada. Referências: 1. Tratado de gastroenterologia : da graduação à pós-graduação / editores Schlioma Zaterka, Jaime Natan Eisig. -- 2. ed. -- São Paulo : Editora Atheneu, 2016. 2. Robbins & Cotran, patologia : bases patológicas das doenças / Vinay Kumar, Abul Abbas, Jon Aster ; com ilustrações de James A. Perkins. - 9. ed. - [Reimpr.]. - Rio de Janeiro : GEN | Grupo Editorial Nacional. Publicado pelo selo Editora Guanabara Koogan Ltda., 2021. 3. Bogliolo Patologia/Geraldo Brasileiro Filho. – 10. ed. – Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2021. 4. A gastroenterologia no século XXI : manual do residente da Federação Brasileira de Gastroenterologia / Flávio Antonio Quilici, Nelma Pereira de Santana, José Galvão-Alves. - 1. ed. - Barueri [SP] : Manole, 2019. 3) SOBRE A INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA: A. CONCEITO. A insuficiência hepática aguda é definida como uma doença hepática aguda associada com encefalopatia e coagulopatia, que ocorre dentro de 26 semanas após a lesão hepática inicial, na ausência de uma doença hepática preexistente. A insuficiência hepática aguda grave também é referida como insuficiência hepática aguda, insuficiência hepática fulminante, necrose hepática aguda, necrose hepática fulminante e hepatite fulminante. A insuficiência hepática aguda é causada por necrose hepática maciça, na maioria das vezes induzida por fármacos ou toxinas. A ingestão acidental ou deliberada de acetaminofeno. B. FISIOPATOLOGIA. A insuficiência hepática aguda geralmente apresenta necrose hepática maciça, com amplas regiões de perda do parênquima, em torno de ilhas de hepatócitos em regeneração. Esses fígados são pequenos e encolhidos. A proeminência de cicatrizes e de reações ductulares nesses fígados depende da natureza e duração da agressão. Lesões tóxicas, como superdosagens de acetaminofeno, aparecem geralmente dentro de horas a dias, um período muito curto para dar tempo para a formação de cicatrizes ou regeneração. Infecções virais agudas podem causar insuficiência ao longo de semanas a alguns meses, de modo que, enquanto a lesão hepática continua a sobrepujar a reparação, a regeneração é frequentemente demonstrável. Além disso, essa escala de tempo permite a cicatrização precoce em áreas de perda do parênquima. Isabela G. Campos 10 Raramente, pode haver lesão difusa dos hepatócitos, sem morte celular óbvia e colapso do parênquima, tal como na esteatose microvesicular difusa, relacionada com o fígado gorduroso da gravidez ou com reações idiossincrásicas a toxinas (p. ex., valproato, tetraciclina). Nesses quadros, geralmente relacionados à disfunção mitocondrial primária, os hepatócitos são incapazes de desempenhar suas funções metabólicas normais. Nos estados de imunodeficiência, como a infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) não tratada, ou a imunossupressão pós-transplante, os vírus não hepatotrópicos, principalmente os citomegalovírus, herpesvírus e adenovírus, podem causar insuficiência hepática fulminante com características histológicas específicas para cada um desses vírus. Com melhores tratamentos para a infecção pelo HIV, a insuficiência hepática aguda causada por essas infecções tem sido menos frequente. A insuficiência hepática na doença hepática crônica é associada mais frequentemente com a cirrose, uma condição marcada pela transformação difusa de todo o fígado em nódulos parenquimatosos regenerativos, circundados por faixas fibrosas e graus variáveis de derivações (shunts) vasculares (muitas vezes portossistêmicos). No entanto, nem todas as cirroses levam inexoravelmente à insuficiência hepática crônica, e nem todas as doenças hepáticas crônicas de estágio final são cirróticas. Por exemplo, doenças crônicas como a cirrose biliar primária, a colangite esclerosante primária, a hiperplasia nodular regenerativa, a esquistossomose crônica e a doença hepática fibropolicística muitas vezes não são acompanhadas por cirrose plenamente estabelecida, mesmo no estágio final. Por outro lado, pacientes com hepatite autoimune bem tratada ou aqueles com hepatite B suprimida ou hepatite C curada, muitas vezes não progridem para o estágio final, embora sejam cirróticos. A classificação de Child-Pugh da cirrose distingue entre a classe A (bem compensada), B (parcialmente descompensada) e C (descompensada), que se correlacionam, histologicamente, com diferentes características morfológicas. A utilidade desse sistema é que ele ajuda a monitorar o declínio de pacientes na evolução para a insuficiência hepática crônica. Mesmo nas doenças que são suscetíveis a dar origem à cirrose, como a hepatite viral não tratada, doença hepática alcoólica, doença hepática gordurosa não alcoólica e doenças metabólicas, a morfologia e fisiopatologia da cirrose podem ser diferentes. Portanto, enquanto o termo cirrose implica a presença de doença crônica grave, ele não é um diagnóstico específico e carece de implicações precisas de prognóstico. Algumas vezes, o termo cirrose criptogênica é usado para descrever a cirrose quando não há uma causa clara. Conforme descrito, a cirrose ocorre de forma difusa por todo o fígado, constituindo-se de de nódulos parenquimatosos regenerados, cercados por faixas densas de cicatriz e graus variáveis de derivações (shunts) vasculares. O tamanho dos nódulos, o padrão da formação de cicatrizes (ligação de tratos portais uns aos outros versus a ligação de tratos portais a veias centrais), o grau de colapso do parênquima, em que nenhum tecido hepático viável está presente, o grau da trombose vascular macroscópica (particularmente da veia porta), todos variam entre doenças e, até mesmo em alguns casos, entre indivíduos com a mesma doença. Para enfatizar, não há apenas uma cirrose, mas sim várias. Os detalhes importantes que distinguem a cirrose das diferentes causas são descritos nas seções subsequentes que dizem respeito a cada uma das doenças específicas. Está cadavez mais claro que as mudanças identificáveis na biópsia, em diferentes pacientes cirróticos, estão correlacionadas com a classificação prognosticamente útil de Child-Pugh mencionada anteriormente e com as pressões de oclusão da veia porta, um novo importante método, embora ainda não universal, que avalia a presença e o grau de hipertensão portal. Amostras de biópsia demonstrando septos fibrosos delgados, densamente compactados e separados por grandes ilhas de parênquima hepático intacto, estão propensas a apresentarem menor hipertensão Isabela G. Campos 11 portal. Aqueles com amplas faixas de cicatriz densa, muitas vezes com espaços linfáticos dilatados, com menor quantidade do parênquima, são propensos a progredirem para a hipertensão portal e, portanto, para o estágio final da doença. As implicações clínicas desses achados histológicos e as do aumento das pressões de oclusão venosas hepáticas estão em vias de serem definidas. Espera-se que elas desempenhem um papel cada vez mais importante nos próximos anos, particularmente em pacientes com infecções crônicas de hepatites B e C, para os quais distinguir o fluxo e refluxo das características cirróticas pode ser essencial para determinar o prognóstico à medida que os tratamentos antivirais melhoram. Como mencionado, a ativação de células-tronco é observada na forma de reações ductulares. Na doença hepática crônica, as reações ductulares aumentam com o estágio avançado da doença e são geralmente mais proeminentes na cirrose. Há dois correlatos de reações ductulares: • O papel das células-tronco do fígado na regeneração do parênquima aumenta à medida que os hepatócitos preexistentes sofrem envelhecimento replicativo após anos a décadas de replicação. • Reações ductulares podem incitar cicatrizes na doença hepática crônica e, portanto, podem ter um efeito negativo sobre a doença hepática progressiva. Apesar de incomum, a regressão da fibrose, embora rara, ocorre na cirrose plenamente estabelecida; essa é outra razão pela qual a cirrose não deve ser equiparada automaticamente com doença em estágio terminal. No passado, quando não havia meios confiáveis para curar qualquer doença hepática crônica, não houve oportunidade para observar se a cirrose poderia regredir. No entanto, com um número crescente de tratamentos eficazes para condições causadoras de cirrose, hoje entendemos que pode ocorrer regressão de cicatrizes. As cicatrizes podem se tornar mais finas, mais densamente compactadas e, eventualmente, fragmentadas. À medida que os septos fibrosos se rompem, nódulos adjacentes de parênquima em regeneração coalescem em ilhas maiores. Todos os fígados cirróticos mostram elementos de ambas, progressão e regressão, sendo o equilíbrio determinado pela severidade e persistência da doença subjacente. C. QUADRO CLÍNICO. As manifestações clínicas da IHAG estão relacionadas diretamente à perda do parênquima hepático e à falência de múltiplos órgãos. Obs. Muitos dos sintomas iniciais em pacientes com insuficiência hepática aguda são inespecíficos. Eles incluem: • Fadiga/mal-estar; • Letargia; • Anorexia; • Náusea e/ou vômito; • Dor no quadrante superior direito; • Prurido; • Icterícia; • Distensão abdominal por ascite. À medida que a insuficiência hepática progride, os pacientes que estavam inicialmente anictéricos podem desenvolver icterícia, e aqueles com alterações sutis do estado mental (por exemplo, letargia, dificuldade para dormir) podem ficar confusos ou eventualmente comatosos. D. DIAGNÓSTICO. Exame físico A presença de encefalopatia hepática é uma das características definidoras da insuficiência hepática aguda. Os achados em pacientes com encefalopatia hepática são variáveis, desde mudanças de comportamento até coma. Isabela G. Campos 12 A encefalopatia hepática é graduada de I a IV: • Grau I: Mudanças no comportamento, confusão leve, fala arrastada, sono perturbado; • Grau II: letargia, confusão moderada; • Grau III: confusão acentuada (estupor), fala incoerente, dormir, mas acordar com estimulação; • Grau IV: Coma, sem resposta à dor. Outros achados no exame físico em pacientes com insuficiência hepática aguda podem incluir: • Icterícia, que é um achado comum em pacientes com insuficiência hepática aguda, mas pode estar ausente no início do curso de envenenamento por paracetamol ou infecção pelo vírus herpes simplex; • Lesões de pele vesiculares sugestivas de vírus herpes simplex (presentes em 30 a 50% dos pacientes com insuficiência hepática aguda devido ao vírus herpes simplex); Febre em pacientes com vírus herpes simplex (relatada em 82% dos pacientes em uma revisão); • Sensibilidade no quadrante superior direito e hepatomegalia; • Ascite; • Sinais de depleção de volume intravascular, como hipotensão ortostática. Exame laboratoriais Tempo de protrombina prolongado, resultando em INR ≥ 1,5 (esse achado faz parte da definição de insuficiência hepática aguda e, portanto, deve estar presente); a hemostasia quando medida por tromboelastografia é normal; • Níveis elevados de aminotransferases (muitas vezes significativamente elevados); • Níveis elevados de bilirrubina; • Baixa contagem de plaquetas (≤150.000/mm3). A diminuição dos níveis de aminotransferases pode indicar recuperação espontânea, mas também pode sinalizar piora da insuficiência hepática com perda de massa de hepatócitos. Em pacientes que estão melhorando, a bilirrubina e o tempo de protrombina/INR diminuirão, enquanto naqueles com piora, a bilirrubina e o tempo de protrombina/ INR continuarão a aumentar. Devido à importância prognóstica do tempo de protrombina/INR, recomenda-se que produtos como o plasma só sejam usados quando houver indicação clara. Além disso, apesar de um INR anormal, os pacientes podem não estar num estado hipocoagulável. Outros achados laboratoriais podem ser observados em pacientes com insuficiência hepática aguda: • Anemia; • Elevação da creatinina sérica e ureia no sangue; • Amilase e lipase elevadas; • Hipoglicemia; • Hipofosfatemia; • Hipomagnesemia; • Hipocalemia; • Acidose ou alcalose; • Nível elevado de amônia; • Nível elevado de lactato desidrogenase (LDH). A lesão renal aguda complica a IHAG em aproximadamente 30 a 70% dos pacientes. A frequência de lesão renal é maior (até 75%) para etiologias de IHAG que são conhecidas por causar danos aos rins de forma independente, como a intoxicação por acetaminofeno. Isabela G. Campos 13 A patogênese da lesão renal em pacientes com insuficiência hepática aguda não é totalmente compreendida, mas pode estar relacionada a alterações hemodinâmicas sistêmicas e intrarrenais semelhantes às observadas na síndrome hepatorrenal. O quadro clínico é semelhante. Os achados de exames laboratoriais costumam variar dependendo da causa específica da IHAG. Os resultados podem sugerir um diagnóstico, mas exames laboratoriais e de imagem adicionais são necessários antes de fazer um diagnóstico. Esses padrões não devem ser usados para fechar ou descartar um determinado diagnóstico. Exames de imagem e outros estudos A tomografia computadorizada (TC) abdominal em um paciente com insuficiência hepática aguda frequentemente revela um fígado que parece menos denso que o músculo esquelético. Outros achados podem incluir parênquima hepático heterogêneo, hepatomegalia, ascite, evidência de infiltração maligna e evidência de oclusão da veia hepática. A cirrose pode estar presente em pacientes com insuficiência hepática aguda devido à doença de Wilson, hepatite B transmitida verticalmente ou hepatite autoimune e pode resultar em um fígado de aparência nodular nas imagens. No entanto, um fígado maciçamente necrótico também pode parecer nodular devido ao colapso do parênquima. Contudo, devido ao risco de insuficiência renal com o contraste intravenoso usado para TC, a ultrassonografia com Doppler costuma ser preferida para a avaliação de insuficiênciahepática aguda. A neuroimagem (TC de crânio ou ressonância magnética) em pacientes com insuficiência hepática aguda pode revelar evidências de edema cerebral, incluindo uma diminuição no tamanho dos ventrículos, achatamento das convoluções cerebrais e atenuação da intensidade do sinal do parênquima cerebral. Um eletroencefalograma pode revelar atividade convulsiva, mesmo na ausência de sinais clínicos de convulsão. Edema pulmonar e infecções pulmonares se desenvolvem em aproximadamente 30% dos pacientes com insuficiência hepática aguda e podem ser vistos em radiografias de tórax. Isabela G. Campos 14 4) SOBRE A ASCITE: O termo ascite tem origem na palavra grega “askos” que significa saco ou conteúdo de um saco. Deste radical derivou “askites” e depois “ascite”. Embora a origem do líquido que se acumula na cavidade peritoneal possa variar (plasma, bile, sangue, suco pancreático, líquido intestinal, linfa, urina, etc.). Existem várias doenças que cursam com ascite, como neoplasias, doenças cardíacas, infecciosas e hepáticas. Sendo assim, a ascite não é uma doença, mas sim uma manifestação de uma patologia Obs. Em 85% dos casos, a ascite é causada por cirrose. A. CONCEITO. A ascite é, portanto, a coleção de líquido em excesso (acúmulo de líquido) dentro da cavidade peritonial, determinando aumento significativo do volume abdominal. Ela é decorrente principalmente de alterações da pressão hidrostática e da pressão coloido-osmótica (leis de Starling) e de um componente renal no caso da cirrose hepática. Isto é, resulta de aumento da pressão hidrostática nos sinusoides hepáticos e capilares esplâncnicos por hipertensão portal e da produção aumentada de linfa hepática e visceral, geralmente associada a reabsorção diminuída de água e proteínas pela membrana peritoneal. A ascite, em geral, é clinicamente detectável quando há acúmulo de, pelo menos, 500 mL. O líquido geralmente é seroso, apresentando menos de 3 g/dL de proteína (em grande parte albumina) e um gradiente de albumina entre o soro e a ascite ≥ 1,1 g/dL. O líquido pode conter um número escasso de células mesoteliais e leucócitos mononucleares. B. FISIOPATOLOGIA. Isabela G. Campos 15 A ascite é consequência de várias alterações anatômicas, fisiopatológicas e bioquímicas que ocorrem em pacientes com cirrose hepática. Basicamente existem 3 grupos de etiologia para a ascite: Hipertensão portal, Doença peritoneal e outras causas de ascite, sendo que os mecanismos de cada grupo se convergem em vários pontos. De modo geral, a presença de líquido ascítico na cavidade peritonial depende de dois mecanismos fisiopatológicos: alteração da pressão hidrostática e da pressão coloido-osmótica (leis de Starling). Legenda: Pressão oncótica ou pressão coloido-osmótica, é a pressão osmótica gerada pelas proteínas no plasma sanguíneo, especialmente pela albumina e pelas globulinas. A pressão hidrostática é uma força exercida pelos líquidos que tende a expulsar o líquido de seu compartimento. • Hipertensão portal (HP): É a principal causa de ascite. A HP pode estar presente em várias doenças. Porém sua principal causa é a cirrose hepática. Para ocorrer hipertensão portal é necessário um aumento do fluxo sanguíneo portal ou aumento da resistência vascular ou de ambos. Quando ocorre o aumento da pressão no sistema porta, começa a extravasar líquido dos sinusoides hepáticos para a cavidade peritoneal e, com isso, forma-se a ascite. Com isso, formação de ascite alivia a pressão no sistema porta. A cirrose hepática é a causa mais comum de HP, caracterizada pela fibrose, formação de nódulos e capilarização dos sinusoides, com alterações da microcirculação hepática, resultando no aumento da resistência vascular. Essa congestão volêmica secundária ao aumento da pressão no sistema porta leva a ascite. No caso do cirrótico, em que ocorre hipertensão portal, além dos dois mecanismos citados, existe um componente renal decorrente da insuficiência renal funcional (pré-renal) e da vasodilatação arterial esplâncnica, que contribuem para a persistência da ascite nos pacientes acometidos. Isto é, além de hipoalbuminemia por comprometimento funcional dos hepatócitos, há maior retenção de sódio pelos rins, por ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona, o que realimenta a ascite. A patogenia da ascite é complexa, envolvendo os seguintes mecanismos: o Hipertensão sinusoidal, que altera as forças de Starling e impele o líquido para o espaço de Disse, de onde é removido pelos linfáticos hepáticos; esse movimento do líquido também é promovido pela hipoalbuminemia. o Percolação da linfa hepática para a cavidade peritoneal: O fluxo linfático normal no ducto torácico corresponde a aproximadamente 800 a 1.000 mL/dia. Com a cirrose, o fluxo linfático hepático pode atingir 20 L/dia, excedendo a capacidade do ducto torácico. A linfa hepática é rica em proteínas e pobre em triglicerídeos, o que explica a presença de proteína no líquido ascítico. o Vasodilatação esplâncnica e circulação hiperdinâmica. Essas condições foram descritas anteriormente, com relação à patogenia da hipertensão portal. A vasodilatação arterial na Isabela G. Campos 16 circulação esplâncnica tende a reduzir a pressão arterial. Com o agravamento da vasodilatação, a frequência cardíaca e o débito cardíaco não conseguem manter a pressão arterial. Isso desencadeia a ativação de vasoconstritores, incluindo o sistema renina-angiotensina, e também aumenta a secreção do hormônio antidiurético. A combinação de hipertensão portal, vasodilatação e retenção de sódio e água aumenta a pressão de perfusão dos capilares intersticiais, causando o extravasamento de líquido para a cavidade abdominal. Acrescentando... Em relação à cirrose hepática, algumas teorias foram formuladas com o objetivo de explicar a ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona e do sistema nervoso simpático, como a teoria do “underfill” (baixo enchimento), o “overflow” (super-fluxo) e da vasodilatação esplâncnica. Obs. A visão moderna preconiza que as três teorias estão presentes no mesmo paciente com cirrose, em maior ou menor grau dependendo da fase e do tempo de doença. A teoria da vasodilatação estaria presente na fase pré-ascítica e seria importante em toda a evolução posterior. A teoria do “overflow” seria a mais importante nos primeiros meses do desenvolvimento da ascite no cirrótico, e a teoria do “underfill” explicaria a maior parte dos achados em pacientes com vários meses de ascite. Nessa última teoria (“overflow”), fisiopatologia da hipertensão porta decorre da obstrução ao fluxo sanguíneo, insuficiência renal funcional e vasodilatação arterial esplâncnica. Além disso, outros fatores como alterações da função renal, alterações de sistemas neuro-humorais e anormalidades da microcirculação hepática estão associados. Sendo assim, na cirrose hepática ocorre desregulação hormonal, com aumento da aldosterona. Através da ativação do eixo renina-angiotensina- aldosterona há retenção de sódio devido à elevada reabsorção de sódio nos túbulos renais. Nós sabemos que o sódio retém água, portanto, com o aumento do sódio plasmático também ocorre a retenção excessiva de água, que por sua vez, leva ao aumento do volume extracelular. Com isso, esse volume em excesso passará, em algum momento, para a cavidade peritoneal. Na teoria underfill (mais antiga), nas fases iniciais da cirrose hepática haveria vasodilatação periférica e retenção renal de água e sódio. A seguir haveria “overflow” e escape de fluido para a cavidade peritoneal. Enquanto isso, após a piora da vasodilatação periférica, o “underfill” levaria à queda do volume efetivo circulante e estimulação permanente dos sistemas vasopressores. Dessa maneira, nas fases iniciais da cirrose hepática haveria vasodilatação periférica e retenção renal de água e sódio. A seguir haveria “overflow” e escape defluido para a cavidade peritoneal (vindo principalmente da superfície hepática). Provavelmente depois que a ascite começa a se formar e Isabela G. Campos 17 piora a vasodilatação periférica, o “underfill” passa a assumir papel relevante, com queda do volume efetivo circulante e estimulação permanente dos sistemas vasopressores, levando à retenção contínua de água e sódio pelos rins. A saturação da capacidade de drenagem linfática abdominal, e principalmente a limitação da drenagem linfática hepática, contribuem para o acúmulo final de líquido na cavidade peritoneal. •Doenças Peritoneais: A ascite por doenças peritoneais, como neoplasias, infecções e inflamações ocorre por lesões na estrutura peritoneal. Essa estrutura é formada por capilares arteriais, venosos, linfáticos, tecido intersticial e mesotélio que regulam a troca de líquido intra e extracelular. Portanto, quando ocorre lesão dessas estruturas, há alteração do fluxo normal e acúmulo de líquido na cavidade peritonial. Devido ao aumento da permeabilidade, proteínas, colesterol, glicoses e outras moléculas vasculares, passam para o líquido ascítico, determinando portanto um exsudato. Mas lembre-se, quando as neoplasias vêm associadas à hipertensão portal (carcinoma hepatocelular, metástases hepáticas maciças), estas costumam se apresentar como transudato. Aliado a esse processo de aumento da permeabilidade vascular, ocorre produção de óxido nítrico, vasodilatação esplâncnica e ativação do sistema renina-angiotensina. C. QUADRO CLÍNICO. A ascite se manifesta com a junção de sinais e sintomas típicos das doenças de base que ocasionam a ascite, associada a sintomas próprios do quadro ascítico. O exame físico de um paciente com ascite pode ser normal em pacientes com ascites pequenas ou extremamente rico, em pacientes com doença hepática avançada, por exemplo. Nesses casos de doença hepática avançada, podem ser encontrados desnutrição, hepatoesplenomegalia, icterícia, ginecomastia, aranhas vasculares, eritema palmar e circulação colateral, conhecidas como “cabeça de Medusa”. Obs. Lembre-se, a circulação colateral se forma pela hipertensão porta que promove a recanalização da veia umbilical devido à alta pressão no sistema. Enquanto que o eritema palmar, Isabela G. Campos 18 ginecomastia e telangectasias do tipo “aranhas vasculares” é resultado da hiperproliferação e dilatação de capilares cutâneos, gerado pela alteração da homeostase dos hormônios sexuais, gerando hiperestrogenismo e hipoandrogenismo. A ictericia é encontrada principalmente nos pacientes que tem como causa da ascite uma cirrose hepática decorrente de obstruções das vias biliares. Quanto à hepatoesplenomegalia, esse achado será encontrado principalmente nos pacientes com hipertensão portal, levando ao aumento desses órgãos por congestão. Ademais, um dos principais sintomas associados a ascite é a distensão abdominal que ocorre quando há acúmulo de líquido na cavidade visceral. Quando há grande quantidade de líquido ascítico, os órgãos intratorácicos podem ser pressionados, levando ao desconforto respiratório. Além disso, a ascite costuma ser indolor, porém, diante de uma ascite muito significante, estruturas podem ser pressionadas e levar ao desconforto abdominal. Outro item importante é o ganho de peso, que serve inclusive para o monitoramento da resposta terapêutica na ascite. Diante de um quadro de neoplasia, além do quadro consumptivo, também podemos encontrar linfonodomegalia em região supraclavicular ou umbilical, nesse último caso, o linfonodo é conhecido como “linfonodo de Irmã Mary Joseph”, sugere câncer como causa da ascite. Nos quadros de etiologia renal ou devido a mixedema, geralmente o quadro ascítico faz parte do contexto de anasarca. Em relação à insuficiência cardíaca, a ascite pode vir acompanhada de turgência de jugular, congestão pulmonar ou edema periférico. Uma complicação importante da ascite é a peritonite bacteriana espontânea (PBE). Nesses casos, o paciente pode apresentar além do quadro ascítico, febre, alteração no estado mental e hipersensibilidade abdominal. D. DIAGNÓSTICO. A avaliação inicial do paciente com ascite deve incluir história clínica, exame físico, exames laboratoriais de sangue, urina, líquido ascítico (LA) e ultrassonografia abdominal, esta última para diagnóstico de pequenos volumes de ascite não detectados ao exame físico, assim como para estadiamento da doença e rastreamento de carcinoma hepatocelular. Exame Clínico Geral A anamnese é fundamental na investigação da patologia responsável pelo derrame ascítico. História de ingestão etílica, hepatites, transfusão sanguínea, história familiar para neoplasias e outros aspectos devem ser pesquisados. É importante lembrar que a ascite representa evento tardio da doença hepática crônica, de maneira que o paciente provavelmente apresenta também ao exame físico estigmas de cirrose hepática. Isabela G. Campos 19 Vários aspectos deverão ser procurados no exame geral do paciente com ascite. A distribuição do edema periférico é um deles. No paciente com hepatopatia crônica, o edema concentra-se nos membros inferiores e abdome, raramente chegando aos membros superiores e ao rosto. Ascite de pequeno volume (300 a 1.000 mL) pode ser detectada pelo toque retal, que mostra abaulamento do fundo de saco de Douglas, situação na qual ainda não é detectada pela propedêutica física do abdome em sua face anterior. A presença de abaulamento abdominal deve ser seguida da percussão dos flancos. Caso a quantidade de macicez seja maior que o usual, deve-se testar a presença de macicez móvel, que apresenta 83% de sensibilidade e 56% de especificidade na detecção de ascite. São necessários pelo menos 1,5 L de ascite para promover macicez em flancos. Caso esta não exista, o paciente tem menos de 10% de chance de ter ascite. Somente com o aumento progressivo da quantidade de líquido livre, maior que 5 L, aproximadamente, é que o abdome se abaula e é possível a observação do “semicírculo de Skoda” e o “sinal do piparote”. São frequentes também os achados de hérnias inguinais, umbilicais e cicatriciais, edema de membros inferiores e pobre estado nutricional, com consumo de massa muscular. No exame clínico do paciente com cirrose, podem ser encontrados sinais de insuficiência hepática como os “spiders” ou “aranhas vasculares”, localizados na pele do tronco superior, pescoço e face. Esses sinais são telangiectasias com arteríola central de onde saem pequenos vasos irradiados até o diâmetro máximo de 0,5 cm. Quando se pressiona a região central do spider, os pequenos vasos em volta desaparecem, comprovando que são alimentados pela arteríola central. O “eritema palmar” é outro sinal que pode estar presente, mostrando as palmas das mãos avermelhadas, principalmente nas eminências tenar e hipotenar. O paciente masculino pode ter sinais de “feminilização” como queda dos pelos e presença de ginecomastia. No exame dos campos pulmonares do paciente com cirrose e ascite, é possível detectar a presença de derrame pleural em 6% dos pacientes. Em cerca de 70% das vezes, o derrame pleural ocorre do lado direito, em decorrência principalmente de defeitos do diafragma que permitem a passagem do líquido do abdome para o espaço pleural. O balanço das pressões (aumento da pressão abdominal e pressão negativa no tórax) favorece a passagem do líquido apenas no sentido abdome-pleura e não no sentido contrário. Os defeitos no diafragma, normalmente virtuais, ficam patentes com a pressão exercida pelo líquido ascítico no abdome. As seguintes condições clínicas podem causar confusão com a ascite: distensão gasosa do intestino, obesidade mórbida e neoplasias ovarianas. Exame Clínico Abdominal o Inspeção: Com o paciente em decúbito dorsal, o abdome com ascite assume a forma de “ventre de batráquio”, pois o líquido, por força de seupeso, ocupa preferencialmente os flancos. Na posição em pé, pelo mesmo motivo, o líquido ocupa o hipogástrio e as fossas ilíacas, e o abdome avança para a frente da raiz dos músculos abdominais. Nessa posição, para manter o equilíbrio, o paciente joga o tronco para trás, exagerando a curva lombar. A ruptura das fibras elásticas da pele (derme), causada pela distensão do abdome, pode provocar o aparecimento de estrias (rosadas quando são recentes e branco-nacaradas quando antigas). Isabela G. Campos 20 Na inspeção do abdome com ascite pode ser constatada a presença de circulação colateral venosa (acentuação da rede venosa superficial), principalmente nas ascites de longa duração. Com relação à circulação colateral venosa, há basicamente três tipos que podem ser caracterizados: Circulação tipo porta: está presente quando ocorre hipertensão portal. As redes venosas podem se concentrar ao redor da cicatriz umbilical, em aspecto comparado com “cabeça de medusa”. Desse ponto, as veias vão para os hipocôndrios (principalmente à direita) e para o epigástrio em direção ao tórax. A direção do fluxo venoso pode ser pesquisada com escolha de uma veia bem calibrosa e visível. Enquanto se comprime a veia em determinado ponto, faz-se compressão no sentido longitudinal por 4-5 cm e, em seguida, libera-se a pressão do primeiro dedo. É possível, dessa maneira, perceber a direção do fluxo de sangue, que no tipo porta tem as seguintes características: acima da cicatriz umbilical é de baixo para cima e abaixo da cicatriz umbilical é de cima para baixo. Circulação tipo cava: surge nas obstruções da veia cava inferior ou das ilíacas primitivas, sendo o desenvolvimento venoso mais subumbilical, com a distribuição das veias indo da cicatriz umbilical para os flancos e para a parte baixa do abdome. Podem aparecer veias também na região dorsal e na região inguinal. A direção do fluxo de sangue nesses casos é de baixo para cima em qualquer posição pesquisada. Mista porto-cava: é o tipo mais raro e pode ocorrer quando a obstrução das duas veias está presente, ou quando o peso de grandes ascites comprime a região da cava inferior de forma acentuada. Outra observação simples que pode ser feita no paciente com ascite, durante a inspeção do abdome, é a verificação da posição da cicatriz umbilical em relação ao apêndice xifoide e à sínfise púbica. A cicatriz umbilical tem tendência a se aproximar da sínfise púbica nos pacientes com ascite e do apêndice xifoide nos casos de cistos ovarianos, por exemplo. Achados adicionais, também possíveis na inspeção abdominal, são a presença de hérnias (umbilical, incisional, inguinal ou femoral) provocadas pelo aumento da pressão intra-abdominal em pacientes predispostos e por edema escrotal no homem (que deve ser sempre pesquisado). o Percussão e palpação: Nessa etapa estão os principais sinais propedêuticos de pesquisa da ascite. Para que a ascite possa ser detectada na percussão do abdome, são necessários cerca de 1.500 mL de líquido coletado na cavidade peritoneal. Quantidades de líquido inferiores a essa são dificilmente detectadas ao exame de percussão. Nesses casos, o método mais empregado para o diagnóstico é a ultrassonografia de abdome, capaz de detectar até 100 mL de líquido ascítico. Isabela G. Campos 21 Com o paciente em decúbito dorsal, como já mencionado, o líquido ascítico ocupa os flancos e a parte posterior do abdome, rechaçando as alças intestinais para a parte anterior e central. A “macicez no flanco” é um dos sinais úteis para a pesquisa das ascites de pequeno volume e auxilia no diagnóstico diferencial dos aumentos de volume abdominal de outra natureza, como obesidade, cistos de ovário ou gravidez, nos quais a percussão do flanco não é maciça. Esse sinal é muito sensível (chegando a 94% em alguns estudos), mas pouco específico. O sinal da “macicez móvel” é outro recurso propedêutico útil na pesquisa da ascite, de importância equivalente à “macicez no flanco”. Para a obtenção desse sinal, percute-se o flanco até encontrar uma região claramente maciça. Fixa-se esse ponto e solicita-se ao paciente que assuma o decúbito lateral do lado oposto ao que se está percutindo. Nova percussão no ponto fixado revela som timpânico em razão de deslocamento do líquido, por gravidade, para o lado contralateral. Esse sinal também detecta ascites a partir de 1.500 mL de volume e só não estará presente se por alguma causa (em geral inflamatória) ocorrer o encistamento da ascite apenas de um lado do abdome (o que dificilmente acontece no cirrótico com ascite). Esse sinal é muito útil no auxílio diagnóstico e raramente deixa de ser obtido nas ascites pequenas, médias e grandes, com sensibilidade de 83% e especificidade de 56%. O “sinal do piparote” ou da “onda de fluido” não é útil para o diagnóstico das ascites pequenas, sendo obtido com maior nitidez apenas nas ascites médias e grandes. É, por esse motivo, o sinal menos sensível para o diagnóstico de ascite (50%), mas um dos mais específicos (82%). Para sua obtenção, coloca-se uma das mãos espalmada sobre um dos flancos, enquanto no flanco contralateral dá-se um “piparote”*. O piparote provoca uma onda no líquido ascítico, cujo choque contra a parede pode ser sentido pela mão espalmada do outro lado. Isabela G. Campos 22 Nas ascites de menor volume, esse sinal deve ser pesquisado com a colaboração de um ajudante (que pode ser o próprio paciente), que coloca sua mão apoiada sobre a linha média do abdome. Essa manobra visa impedir a passagem cutânea da onda de percussão pela parede abdominal, permitindo apenas que a onda de fluido se propague. Outro sinal que faz parte do arsenal semiológico para a pesquisa de ascite são os semicírculos de Skoda. Para a obtenção desse sinal, é preciso percutir o abdome a partir da região timpânica para a região maciça. Na presença de ascite, a região timpânica estará localizada na parte central do abdome (pelo acúmulo de alças intestinais nesse local). Percute-se, portanto, da cicatriz umbilical, de forma radiada, em direção aos flancos e à região hipogástrica. Em determinado ponto, a percussão torna-se maciça (na transição entre as alças intestinais e o líquido ascítico). Marca-se esse ponto imaginário e repete-se a manobra em outras direções marcando 3 pontos (2 pontos em cada flanco e 1 no hipogástrio). A união imaginária desses pontos forma um semicírculo que terá a concavidade voltada para cima na ascite. Esse sinal tem utilidade no diagnóstico diferencial com cistos gigantes de ovário, bexigoma e gravidez, quando a concavidade do semicírculo estará voltada para baixo. Apesar do destaque dado aos sinais semiológicos para a ascite no exame abdominal, é preciso dar atenção à palpação do fígado e do baço nessa condição. Principalmente nas ascites médias e grandes, a palpação dos dois órgãos pela técnica convencional fica muito prejudicada. Deve-se tentar a palpação do fígado e do baço pela “técnica do rechaço”, efetuando um “golpe” com ambas as mãos bem próximas do rebordo costal, e percebendo o choque do órgão na sua volta. Como a sensação palpatória do órgão ocorre em um momento muito rápido, torna-se difícil a boa definição de suas características com essa técnica, então, com frequência, solicita-se o auxílio da ultrassonografia de abdome como exame complementar. Diagnóstico Laboratorial Além da história e do exame clínico, a análise do líquido ascítico é a melhor abordagem para a definição diagnóstica no estudo da ascite. A paracentese abdominal, quando feita dentro das normas, é um procedimento seguro. O local mais adequado para realização da punção é o quadrante inferior esquerdo, visto que existe menor chance de perfuração de estruturas abdominais e ter parede mais fina. Feita a punção, é preciso atenção ao aspecto do líquido ascítico na observação a olho nu antes de encaminhá-lo para análise laboratorial, sendo possível adiantaralgumas conclusões. O líquido ascítico normal do paciente com cirrose hepática é transparente ou tingido de amarelo (amarelo citrino). É possível notar se o líquido é claro, turvo ou purulento. Sabe-se que a concentração de neutrófilos na ascite contribui para definir seu aspecto: [neutrófilos] = 1.000/mm3 determina líquido claro; 5.000/mm3: líquido turvo; e 50.000/mm3: líquido purulento. A concentração de hemácias, por sua vez, determina a coloração do líquido para tons de vermelho: [hemácias] = 10.000/mm3 produz cor rósea, enquanto acima de 20.000/mm3 ocasiona cor avermelhada, semelhante ao sangue. A cor de “melado” do líquido ascítico indica provável perfuração biliar. Outro aspecto típico na observação à beira do leito é o líquido leitoso, que pode estar presente nas ascites quilosas e nas pseudoquilosas (dúvida definida pela dosagem alta de triglicérides nas ascites quilosas). Após a observação simples do líquido, deve-se enviá-lo para análise em laboratório. Vários estudos têm procurado padronizar quais exames devem ser solicitados nesse momento para a melhor relação custo-benefício. Isabela G. Campos 23 A contagem celular, o gradiente soroascite de albumina (GASA), o método de Gram e a cultura geral do líquido ascítico são testes obrigatórios e firmaram-se como os exames mais úteis para a avaliação diagnóstica da ascite. Obs. Os exames proteína total, DHL (enzima desidrogenase láctica), glicose ou amilase só devem ser feitos quando não for evidente o diagnóstico de ascite por cirrose hepática A contagem normal de leucócitos na ascite cirrótica não complicada é de 281 ± 25 células/mm3, e o limite superior é de 500 células/mm3. O número de leucócitos pode variar com a diurese atingindo 1.000 células/mm3, com predomínio de linfócitos. Já o limite superior de polimorfonucleares (PMN) é de 250/mm3 (deve-se fazer o cálculo: número de leucócitos x porcentagem de neutrófilos). Os PMN têm meia-vida curta (algumas horas) e são estáveis durante a diurese (ao contrário dos leucócitos totais). Pela influência da diurese na contagem celular da ascite, deve-se evitar a punção imediatamente após uma diurese do paciente. A contagem celular é útil para diagnosticar várias doenças relacionadas à ascite: na peritonite bacteriana espontânea (PBE) há aumento dos leucócitos com predomínio de PMN ≥ 250/mm3. O gradiente soroascite de albumina (conhecido como GASA) foi provado em estudos prospectivos classificar a ascite melhor do que o conceito de exsudato/transudato baseado na proteína total. O índice GASA é calculado da seguinte forma: GASA = [albumina] soro – [albumina] ascite. Para esse cálculo, as duas amostras devem ser colhidas no mesmo dia e de preferência na mesma hora. O GASA tem correlação direta com a pressão portal, portanto, quanto maior for o GASA, tanto maior será a pressão portal. Isso se deve ao fato de que a [proteína] na ascite tem relação direta com a [proteína] sérica, mas relação inversa com a pressão portal. Dessa forma, quanto maior a pressão portal, tanto menor será a [proteína] na ascite e maior será o gradiente soro-ascite de albumina. Estudos mostraram que, se o GASA for ≥ 1,1 g/dL, haverá hipertensão portal em 95-97% dos casos, enquanto o GASA < 1,1 g/dL afasta hipertensão portal em 95-97%. Dessa maneira, é possível classificar as ascites de modo satisfatório quanto à presença ou não de hipertensão portal (Quadro 2). OBS. permite identificar a presença de hipertensão portal, ajudando na avaliação da etiologia da ascite O índice GASA independe de infecção na ascite, diurese, paracentese terapêutica, infusão de albumina próxima ao procedimento ou etiologia da doença hepática, mantendo sempre a indicação da presença ou ausência de hipertensão portal. Nos casos de ascite com mais de uma causa (causa mista), o GASA mantém a indicação de hipertensão portal caso ela esteja presente. Na comparação direta com outros testes, o GASA é superior à proteína total, razão ascite/soro de proteína, razão ascite/soro de DHL e DHL isolado, na diferenciação de ascite por hepatopatia de ascite por neoplasia (não hepática). Alguns autores encontraram que o GASA < 1,1 g/dL foi o exame mais sensível para o diagnóstico de ascite maligna. Se a ascite for maligna e o GASA > 1,1 g/dL, é necessário pesquisar metástases hepáticas. Isabela G. Campos 24 A cultura do líquido ascítico é outro exame obrigatório na análise da punção da ascite. O líquido deve ser coletado em balões de hemocultura na proporção de 10-20 mL por frasco (20-40 mL no total). Com essa manobra, a positividade vai de 42-52% para 81-93%. Na PBE a densidade bacteriana na ascite é de 1-2 organismos/mL, semelhante à densidade de uma bacteremia, e a presença de um meio de cultura no frasco (como acontece nos frascos de hemocultura) aumenta a chance de sobrevivência da bactéria até seu isolamento pela bacteriologia. No diagnóstico da ascite decorrente da cirrose hepática, devem-se analisar os exames bioquímicos do sangue e os realizados no LA, obtido por punção. Considera-se ideal a obtenção do material sérico e do LA ao mesmo tempo e dentro das primeiras 24 horas da internação do paciente. Na análise bioquímica do sangue, devem-se solicitar exames que considerem o diagnóstico diferencial das as - cites e que avaliem além da função hepática, a função renal, pancreática, tireoidiana e marcadores tumorais, no caso de essa hipótese ser também considerada. Assim, costumam-se solicitar nessa avaliação: hemograma, ureia, creatinina, sódio, potássio, AST, ALT, fosfata - se alcalina, gamaglutamil-transferase, proteína total e frações, tempo de protrombina e INR, amilase, glicose, colesterol, triglicérides, desidrogenase lática (DHL), TSH, T4L e outros, se necessário, por exemplo, a dosagem do BNP sérico, na suspeita de ascite por insuficiência cardíaca congestiva, e dos marcadores tumorais, alfafetoproteína, CA-19-9, CEA, na suspeita de carcinoma hepatocelular e carcinomatose peritoneal. Exames complementares Dentre os exames complementares, a ultrassonografia (USG) é o padrão-ouro para o diagnóstico de ascite. Com esse método é possível fazer o diagnóstico de pequenos volumes de líquido ascítico (100 ml). Na USG, a ascite é vista como coleções anecoicas. Além disso, ela pode ser usada para direcionar o local ideal para realização da paracentese. No caso de dúvida entre ascite e uma massa tumoral, pode-se utilizar a tomografia computadorizada que distingue melhor entre tumores, cistos ou coleções. Referências: 4. Tratado de gastroenterologia : da graduação à pós-graduação / editores Schlioma Zaterka, Jaime Natan Eisig. -- 2. ed. -- São Paulo : Editora Atheneu, 2016. 5. Ascite - estado da arte baseado em evidências. Dahir Ramos de Andrade Júnior; Flávio Henrique Ferreira Galvão; Sânia Alves dos Santos; Dahir Ramos de Andrade. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ramb/a/bhH9F9xSpJfDD9NXdTRg59L/?format=pdf&lang=pt 6. Robbins & Cotran, patologia : bases patológicas das doenças / Vinay Kumar, Abul Abbas, Jon Aster ; com ilustrações de James A. Perkins. - 9. ed. - [Reimpr.]. - Rio de Janeiro : GEN | Grupo Editorial Nacional. Publicado pelo selo Editora Guanabara Koogan Ltda., 2021. 7. Gastroenterologia essencial / Renato Dani, Maria do Carmo Friche Passos. – 4. ed. – [Reimpr.]. - Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018. 8. Bogliolo Patologia/Geraldo Brasileiro Filho. – 10. ed. – Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2021. 9. Clínica médica, volume 4: doenças do aparelho digestivo, nutrição e doenças nutricionais. – 2. ed. – Barueri, SP: Manole, 2016. 10. Clínica médica : consulta rápida / Organizadores, Stephen Doral Stefani, Elvino Barros. – 5. ed. – Porto Alegre : Artmed, 2020. 11. Semiologia clínica / editores Mílton de Arruda Martins ... [et al.]. - 1. ed. - Santana de Parnaíba [SP] : Manole, 2021. 12. Bates : propedêutica médica essencial : avaliação clínica, anamnese, exame físico / Lynn S. Bickley,Peter G. Szilagyi ; tradução Maria de Fátima Azevedo. - 8. ed. - Rio de Janeiro : Guanabara Koogan, 2018. Isabela G. Campos 25 5) SOBRE A ENCEFALOPATIA: A. CONCEITO. A encefalopatia hepática (EH) compreende um amplo espectro de distúrbios neurológicos ou neuropsiquiátricos associados à insuficiência hepática aguda ou crônica, ocorrendo também em pacientes submetidos à derivação portossistêmica na ausência de doença hepatocelular. B. FISIOPATOLOGIA. O mecanismo fisiopatológico exato da EH ainda não foi completamente esclarecido, mas acredita-se que seja dependente de múltiplos fatores isolados ou combinados entre si. Acredita-se também que, na maioria dos casos, mais de um fator contribui para o desenvolvimento das alterações do sistema nervoso central (SNC). O fígado exerce um importante papel no clearance hepático de produtos tóxicos produzidos no intestino, e o comprometimento da função hepática ou a presença de shunts portossistêmicos permite que essas toxinas cheguem à circulação sistêmica. Essas toxinas agem inibindo a neurotransmissão e apresentam efeitos deletérios na função cerebral. A amônia é a neurotoxina mais bem caracterizada que precipita a EH. O trato gastrointestinal é a principal fonte de amônia que entra na circulação pela veia porta. A amônia é produzida pelos enterócitos da glutamina e pelo catabolismo bacteriano do cólon de fontes nitrogenadas, como as proteínas ingeridas e ureia secretada. Outra fonte de amônia pode ser a ureia digerida pelo Helicobacter pylori no estômago, embora o papel do H. pylori no EH não seja claro. O fígado intacto limpa quase toda a amônia da veia porta, convertendo-a em glutamina e impedindo a entrada na circulação sistêmica. No entanto, a glutamina é metabolizada nas mitocôndrias produzindo glutamato e amônia, e a amônia derivada da glutamina pode interferir na função mitocondrial, levando à disfunção dos astrócitos. O aumento da amônia no sangue na doença hepática avançada é uma consequência da função hepática prejudicada e do desvio de sangue ao redor do fígado. Assim, o metabolismo extra- hepático da amônia também é de grande importância: alterações renais e a perda muscular, uma Isabela G. Campos 26 condição comum nestes pacientes, associada à hepatopatia contribui para o aparecimento da EH, pois os músculos são uma das formas de remoção da amônia da circulação sistêmica. Estudos mostram que ocorre hiperamonemia arterial em mais de 90% dos pacientes com EH, embora seus níveis não sejam nem sensíveis, nem específicos para o diagnóstico de EH em pacientes cirróticos crônicos. Além disso, as discrepâncias de correlação direta entre concentração sérica de amônia e a gravidade da EH nesses pacientes sugere, que embora a amônia tenha um papel fundamental na patogênese da EH, ela parece não ser a única responsável pelas alterações neurocognitivas. Outras alterações associadas com o aparecimento da EH incluem: • Deposição de magnésio nos gânglios da base, o que justifica parcialmente as manifestações extrapiramidais da EH. • Deficiência de zinco, que age como cofator no metabolismo da ureia e amônia e sua deficiência leva a aumento de amônia e falsos neurotransmissores. • Ação de mediadores inflamatórios são contribuintes para o aparecimento da EH. • Disfunção dos astrócitos catalisada pelo aumento de glutamato e amônia. • Aumento da permeabilidade da membrana hematoencefálica a produtos tóxicos. • Hiperatividade do sistema GABAérgico com ação endógena similar a benzodiazepínicos, com efeito negativo cerebral. • Outros fatores envolvidos na disfunção cerebral incluem serotonina, óxido nítrico, peptídeos opioides circulantes e radicais óxidos livres. • Fatores precipitantes de EH como infecções bacterianas ou hemorragia digestiva alta e constipação intestinal com sobrecarga resultante de aminoácidos no trato gastrointestinal com aumento da produção de falsos neurotransmissores (benzodiazepínicos endógenos). Isabela G. Campos 27 CLASSIFICAÇÃO A encefalopatia hepática deve ser classificada de acordo com todos os seguintes quatro fatores. Em relação a patologias associadas: • Tipo A: encefalopatia associada com insuficiência hepática fulminante; • Tipo B: encefalopatia associada com shunt portossistêmico na ausência de doença hepática intrínseca; • Tipo C: encefalopatia associada com cirrose e hipertensão portal. As manifestações clínicas dos tipos B e C são semelhantes, ao passo que o tipo A tem características distintas e, em particular pode associar-se a aumento da pressão intracraniana e risco de herniação cerebral. Em relação a gravidade das manifestações: A EH deve ser classificada em relação à gravidade de suas manifestações, de acordo com a classificação de West Haven. A importância dessa classificação é sua correlação com o prognóstico. Estudos mostram uma mortalidade 4 a 5 vezes maior em pacientes com EH graus 3 e 4 em comparação com EH graus 1 e 2. Em relação ao padrão de evolução: • Episódica: paciente só apresenta manifestações ocasionalmente, usualmente relacionada a algum fator precipitante. • Recorrente: indica episódios de EH que ocorrem com um intervalo de tempo igual ou inferior a 6 meses. • Persistente: paciente mantém padrão de alterações comportamentais que estão sempre presentes, com episódios de piora importante. Usualmente associada a doença hepática grave. Em relação a fatores precipitantes: Não desencadeada por fator precipitante; ou Desencadeada por fator precipitante, e os fatores desencadeantes devem ser especificados. Os fatores desencadeantes podem ser identificados em quase todos os episódios de EH episódica tipo C e devem ser ativamente procurados e tratados quando encontrados. Isabela G. Campos 28 C. QUADRO CLÍNICO. A EH produz um amplo espectro de manifestações neurológicas e psiquiátricas inespecíficas, que podem ser de difícil reconhecimento. Na sua expressão mais leve, as alterações são sutis, muitas vezes reconhecidas somente pelo círculo de convivência mais próximo do paciente. São identificadas apenas alterações de testes psicométricos voltados para a atenção, memória de trabalho, velocidade psicomotora e habilidade visual-espacial, bem como medidas funcionais eletrofisiológicas do cérebro. Uma de suas manifestações características nesse estágio é a presença de micrografia. À medida que a EH progride, outras alterações podem ocorrer e incluem: • Alterações do padrão do sono: muito comuns, podendo cursar com sonolência ou insônia. O ciclo sono-vigília é alterado com sonolência diurna excessiva e insônia noturna, embora uma completa inversão do ciclo sono-vigília seja infrequente. • Alterações do estado de consciência: os pacientes apresentam desde desorientação progressiva temporoespacial, comportamento inapropriado e quadro confusional, estado de agitação ou sonolência, letargia, e até coma. • Manifestações psiquiátricas: incluem a mudança repentina ou gradativa da personalidade, como apatia, euforia, agressividade, excitação e comportamento inadequado. • Achados neurológicos: em pacientes não comatosos com EH, ocorrem principalmente anormalidades da motricidade, como hipertonia, hiperreflexia e positivação do sinal de Babinski. Hipocinesia, monotonia e lentidão da fala, tremor similar ao parkinsoniano e discinesia com movimentos voluntários diminuídos são achados comuns. • Flapping ou asterixis: pode ser descrito como um movimento in voluntário das mãos, semelhante ao bater de asas. Pode aparecer nos estágios intermediários da EH, mas desaparece no estupor e coma. Embora seja ocasionalmente descrito como um tremor, o flapping é, na verdade, uma forma negativa de mioclonia que consiste em perda do tônus postural. Deve ser testado provocando a dorsiflexão dos punhos, com os dedos separados. A presença de Asterixis ou flapping não é patognomônico de EH, pois podeestar presente em outras encefalopatias metabólicas, como uremia e narcose por hipercapnia. • Hipertensão Intracraniana: em pacientes com quadro de insuficiência hepática fulminante, a EH pode cursar com quadro importante de edema cerebral e aparecimento de sinais neurológicos focais. • Achados relacionados aos fatores precipitantes: como ressaltado, a EH sempre é consequência de um fator precipitante. Assim, pacientes com EH devem apresentar os sintomas característicos da causa que levou à descompensação, como sintomas de infecção, sangramento ou obstipação. Isabela G. Campos 29 D. DIAGNÓSTICO. O diagnóstico de EH é clínico e de exclusão. Classificar a gravidade do paciente e as alterações descritas na classificação de West Haven é o padrão utilizado para determinar a presença de manifestações compatíveis com o diagnóstico de EH. Os pacientes podem ter alterações do estado mental por outros motivos, como o uso de medicamentos, abuso de álcool, uso de drogas, efeitos de hiponatremia e doença psiquiátrica. Assim, os exames complementares servem em grande parte para exclusão desses diagnósticos diferenciais. Portanto, conforme clinicamente indicado, existe indicação para a exclusão de outras etiologias por avaliação laboratorial e de imagem num doente com alteração do estado mental. Exames complementares Os exames complementares têm como objetivo confirmar o diagnóstico de EH e afastar outros diferenciais, diagnosticar os fatores precipitantes e avaliar o estado geral do paciente. Exames específicos para avaliação da função do SNC na suspeita de EH não são rotineiramente solicitados, mas podem ser úteis em casos de dúvida diagnóstica ou terapêutica. A encefalopatia hepática mínima é definida como alteração em testes psicométricos ou disfunção cerebral em pacientes que não estão desorientados ou com flapping. O termo “mínimo” denota que não há nenhum sinal clínico, cognitivo ou outro de EH. Assim, o ideal é que para sua determinação sejam realizados, pelo menos, dois testes psicométricos. É importante descartar fatores de confusão, como distúrbios neuropsiquiátricos, medicamentos psicoativos ou uso de álcool. O eletroencefalograma (EEG) pode detectar alterações na atividade cerebral cortical em todo o espectro de EH sem a cooperação do paciente ou de um efeito de aprendizagem. O exame não é específico e pode ser influenciado por distúrbios metabólicos, como a hiponatremia, bem como drogas. Testes psicométricos Os testes comumente realizados são insuficientemente sensíveis para detectar alterações sutis na função mental. Como resultado, vários testes psicométricos foram elaborados para quantificar o comprometimento da função mental em pacientes com estágios leves de encefalopatia hepática. Esses testes são mais sensíveis à detecção de déficits menores da função mental do que a avaliação clínica convencional ou um EEG. Nossa abordagem é usar o teste de conexão numérica se os sinais apontarem para a possível presença de encefalopatia hepática mínima. Isabela G. Campos 30 O uso de testes psicométricos é limitado, porque muitos são trabalhosos e demorados (até duas horas por sessão), sua confiabilidade é reduzida pelo efeito de aprendizado quando aplicados repetidamente, e há pouca correlação entre os testes. Outra questão dos testes psicométricos é que eles são inespecíficos (ou seja, não podem diferenciar entre várias condições subjacentes que podem levar a resultados semelhantes). Esse é um problema específico em pacientes com doença hepática alcoólica ou doença de Wilson, por exemplo, pois ambos estão associados a anormalidades do sistema nervoso central. O teste psicométrico mais utilizado é o teste de conexão numérica (NCT ou Reitan Test), que é facilmente administrado e interpretado. O NCT é um teste de conexão dos números cronometrado. Pacientes sem encefalopatia hepática devem terminar o teste em um número de segundos menor ou igual à sua idade em anos. Em outras palavras, se um paciente tiver 50 anos, ele poderá terminar o teste em ≤50 segundos. Como funciona o Reitan Test • Etapa 1: verifique se o paciente está alerta o suficiente para cooperar para este teste, pode ver adequadamente, tem uma superfície de escrita, é capaz de contar e pode segurar uma caneta ou lápis. • Etapa 2: demonstre ao paciente como conectar os números no “exemplo da parte A” (caixa inferior). • Etapa 3: informe ao paciente que você cronometrará o teste e para concluir as conexões numéricas de 1 a 25 o mais rápido possível, sem levantar a caneta ou o lápis do papel. • Etapa 4: se ocorrer um erro, aponte-o imediatamente e permita que o paciente corrija o erro. O tempo total decorrido para concluir o teste, incluindo o tempo gasto na correção de erros, é a pontuação. • Etapa 5: registre o tempo gasto para concluir o teste. Se levar mais de 3 minutos para concluir o teste A, registre “> 3 minutos” como a pontuação. Uma pessoa alerta sem encefalopatia hepática deve ser capaz de concluir a parte A do teste em segundos semelhante à sua idade em anos. Exames laboratoriais Exames de avaliação geral são necessários e incluem hemograma completo, coagulograma (RNI), função renal, glicemia, eletrólitos e gasometria, lembrando que a glicemia capilar deve ser realizada em todos os pacientes com alteração de nível de consciência. Salienta-se que alterações hidroeletrolíticas são causas importantes de descompensação desses pacientes e devem sempre ser abordadas. A dosagem de amônia arterial é o marcador mais estudado da doença. A elevação de seus níveis tem sensibilidade de 75 a 85%, porém existe pouca correlação entre seus níveis e a gravidade da EH. O uso da amônia para diagnóstico de EH permanece controverso e seu aumento não eleva a probabilidade diagnóstica de EH, porém se seus resultados forem normais, outros diagnósticos devem ser considerados. Exames para determinar os fatores desencadeantes da EH Esses exames devem ser guiados pela história clínica e pelo exame físico. Endoscopia digestiva alta: deve sempre ser solicitada em pacientes com história de sangramento, toque retal com a presença de sangue ou queda de níveis de hemoglobina. Isabela G. Campos 31 Tomografia computadorizada (TC) ou ressonância magnética (RM) de crânio: são úteis principalmente para excluir os diagnósticos diferenciais de lesões intracranianas (hemorragias, infarto cerebral, abscesso). A TC de crânio é recomendada para excluir anormalidades estruturais em pacientes com sinais neurológicos focais, encefalopatia grave, sinais de trauma cranioencefálico (TCE), na ausência de fatores precipitantes ou nos pacientes que não apresentam melhora após início de tratamento adequado. O risco de hemorragia intracerebral é pelo menos 5 vezes maior neste grupo de pacientes. Ultrassonografia ou tomografia de abdome: podem ser úteis na suspeita de peritonite bacteriana secundária, e ultrassonografia com Doppler pode ser necessária em pacientes com suspeita de síndrome de Budd-Chiari. Líquido cefalorraquidiano: pode ser útil na suspeita de meningite ou encefalite. Antes de realizar a punção liquórica, deve-se avaliar o coagulograma e a contagem de plaquetas. Paracentese: a realização de paracentese diagnóstica é obrigatória em todos os pacientes com suspeita de EH e ascite, uma vez PBE é um fator precipitante frequente de EH. Embora seja uma causa rara, em paciente sem outras causas aparentes deve-se dosar a alfafetoproteína para descartar a possibilidade de hepatocarcinoma. Isabela G. Campos 32 6) ENTENDER O METABOLISMO DA BILIRRUBINA, CARACTERIZANDO A ICTERÍCIA DIRETA E INDIRETA. A principal fonte de bilirrubina é a hemoglobina, proveniente da quebra de eritrócitos maduros. Em condições fisiológicas, a maioria dos eritrócitos normais é sequestrado da circulação após 120 dias de vida. Dentro das células fagocitárias ocorre a lise dos eritrócitos ea degradação da hemoglobina. A molécula globina é degradada, o anel de ferroprotoporfirina é quebrado e o ferro é reutilizado na síntese do heme. O produto resultante é a biliverdina, que pela ação da enzima biliverdina redutase é convertida em bilirrubina. Essa forma de bilirrubina é denominada não conjugada e é lipossolúvel. A bilirrubina não conjugada ou indireta liga-se reversivelmente a albumina até ser captada e metabolizada pelo fígado, que a prepara para ser eliminada. O processo de excreção de bilirrubina para o canalículo biliar requer energia, sendo um dos passos mais susceptíveis de comprometimento quando a célula hepática é lesada. Obs. Quando esse passo do metabolismo da bilirrubina é comprometido, ocorre diminuição de sua excreção para a bile e regurgitação para o sangue. Quando no sangue, a bilirrubina forma complexos que não são filtrados pelos rins e podem ser detectados na circulação durante várias semanas após a resolução do processo causador da icterícia. Uma vez excretada do hepatócito, a bile é transportada dos canalículos biliares até atingir os dois principais ductos hepáticos que emergem dos lobos direito e esquerdo do fígado. Os dois ductos formam o ducto hepático comum, o qual, após unir-se com o ducto cístico e formar o ducto biliar comum, desemboca no duodeno. A bilirrubina conjugada ou direta é hidrolisada por enzimas bacterianas, formando-se o urobilinogênio. Uma parte desse urobilinogênio volta para os enterócitos e volta a ser bilirrubina direta e uma mínima parte vai ser eliminado na urina, o restante que sobra no organismo é transformado em estercobilina, que é o pigmento que da a cor acastanhada das fezes. A bilirrubina conjugada, por ser solúvel em agua, penetra mais facilmente em fluidos corpóreos e é capaz de causar graus mais acentuados de icterícia que a bilirrubina não conjugada. Entendendo melhor... Isabela G. Campos 33 A icterícia é definida como a coloração amarelada da pele, escleróticas e membranas mucosas consequente à deposição de bilirrubina, que deve estar em níveis elevados no plasma (hiperbilirrubinemia). É clinicamente detectada quando a concentração sérica de bilirrubina ultrapassa 2-3mg/100ml (valor normal: 0,3-1,0mg/100ml). Um passo importante para o entendimento pleno das síndromes ictéricas diz respeito ao metabolismo da bilirrubina, que pode ser encarado como um itinerário com três regiões principais: pré-hepática, hepática e colestática. De onde vem a bilirrubina? A maioria dos eritrócitos normais (corresponde a cerca de 80% da produção de bilirrubina) é sequestrada da circulação após 120 dias de vida pelas células reticulares do baço, fígado e da medula óssea. Os 20% restantes da produção de bilirrubina são oriundos da destruição prematura, na medula óssea ou no baço, de eritrócitos recém-formados e o maior componente é formado no fígado, derivado do heme não eritróide e de hemoproteínas hepáticas tais como mioglobina, citocromo e catalases. O percurso pré-hepático Dentro de células fagocíticas, como macrófagos, ocorre a lise dos eritrócitos e a degradação da hemoglobina em fração heme e globina. A molécula globina é degradada, o anel de ferroprotoporfirina é quebrado, e o ferro parcialmente reutilizado para a síntese do heme. Então, a hemeoxigenase é responsável pela conversão da fração heme em biliverdina, que, por sua vez, é convertida em bilirrubina pela enzima biliverdina redutase. Tal bilirrubina é dita não conjugada pois ainda não sofreu um processo chamado de glicuronidação (o qual ocorre nos hepatócitos). Outro nome para a bilirrubina não conjugada é o de bilirrubina indireta. É importante salientar que a bilirrubina indireta é lipossolúvel. Posteriormente, na corrente sanguínea, a bilirrubina indireta realiza uma ligação reversível com a albumina, a fim de ser transportada até o tecido hepático para sofrer o processo de glicuronidação citado anteriormente. Após transportada pela albumina, a bilirrubina não conjugada adentra o hepatócito. A conjugação no hepatócito Após captada pelo fígado, a bilirrubina se liga, em parte, a uma proteína citoplasmática denominada ligandina, o que garante que a bilirrubina indireta não retorne para o plasma. Em seguida, a bilirrubina é direcionada para o retículo endoplasmático, onde é convertida pela ação da enzima UDP-glicuronosil transferase em um composto solúvel em água – a bilirrubina conjugada ou direta. A porção colestática e o trajeto intestinal Depois da conjugação, a bilirrubina direta é excretada nas vias biliares, sendo armazenada na vesícula biliar. Com a alimentação, a bile é secretada no duodeno e, por ser polar, a bilirrubina conjugada não é absorvida, sofrendo hidrolise pela ação de enzimas bacterianas, transformando-se em urobilinogênio. Este é não polar e somente uma mínima parcela é absorvida no cólon. Em condições normais essa parcela é re-excretada pelo fígado na bile (90% do total) e pelos rins (10% do total). Em situações de aumento da produção de bilirrubina, pode haver aumento de urobilinogênio e de seus níveis na urina, ocorrendo o fenômeno chamado de colúria. No intestino grosso, o urobilinogênio é oxidado pela microbiota local em um outro componente, o estercobilinogênio. A diminuição ou ausência de excreção de bilirrubina na luz intestinal provoca alterações na cor das fezes tornando-as mais claras (hipocolia fecal) ou esbranquiçadas (acolia fecal). Isabela G. Campos 34 7) SOBRE A PANCREATITE CRÔNICA ALCOÓLICA ENTENDER: A. CONCEITO. Pancreatite crônica corresponde a inflamação persistente do pâncreas acompanhada de destruição do parênquima, fibrose e, consequentemente, perda progressiva da função pancreática. As pancreatites crônicas (PC) caracterizam-se pela substituição irreversível do parênquima pancreático normal por áreas de fibrose e pelo surgimento de estenoses e irregularidades nos ductos pancreáticos. Tais lesões são, em geral, progressivas, mesmo com retirada do fator causal. Sob esta denominação são agrupadas afecções com etiopatogenias diversas que apresentam características morfológicas e evolutivas semelhantes. Obs. Nem sempre é precedida de inflamação aguda. As pancreatites crônicas caracterizam-se por fibrose progressiva do parênquima glandular, inicialmente focal e, na sequência, por todo o pâncreas. Além disso, apresenta atrofia e disfunção exócrina e endócrina. ADENDO... (CLASSIFICAÇÃO) Há dois tipos principais de pancreatites crônicas – as calcificantes (PCCs) e as obstrutivas (PCOs) –, de acordo com classificação proposta em Roma em 1988, a qual, embora útil, não engloba outros tipos de pancreatites crônicas, em particular as pancreatites crônicas autoimunes (PCAs). Isabela G. Campos 35 As PCCs, assim denominadas porque se calcificarão com o passar do tempo, representam a quase totalidade dos casos de pancreatites crônicas e correspondem às pancreatites crônicas alcoólica, hereditária, nutricional, metabólica e idiopática. As PCO, bem mais raras e que não se calcificam, são consequentes a qualquer modificação anatômica que dificulte a drenagem de secreção pancreática para o duodeno, como estenose cicatricial, traumática, cirúrgica, endoscópica ou congênita do ducto pancreático principal, pancreas divisum etc. B. FISIOPATOLOGIA. A causa mais comum de pancreatite crônica é alcoolismo. Os pacientes geralmente têm história de ingestão alcoólica prolongada (10 a 15 anos), são homens em sua maioria e situam-se preferencialmente na quarta ou quinta década de vida. Os exatos mecanismos pelos quais o álcool promove a lesão pancreática não são conhecidos, mas acredita-se que isso ocorra por uma série de fatores, como toxicidade direta às células acinares, produção de um suco pancreático litogênico, aumento do estresse oxidativo, indução da ativação prematura dos zimogênios pancreáticos e carências nutricionais relacionadasao alcoolismo. Na pancreatite alcoólica, admite-se ocorrer hipersecreção proteica pelas células acinares induzida pelo álcool, sem secreção proporcional de água e bicarbonato pelas células centroacinares/ductulares; com isso, a secreção produzida, mais espessa, forma tampões proteicos intraductais que acabam por obstruir os pequenos ductos. Precipitação de cálcio sobre os tampões resulta em cálculos intraductais comumente observados nessa pancreatite, razão pela qual ela é conhecida também como pancreatite crônica calcificante. Explicando melhor... Obs. O fato de que somente de 3% a 7% dos consumidores de álcool em excesso desenvolvem pancreatite crônica sugere que o álcool é apenas um cofator e que outros agentes ou elementos são necessários para desenvolver essa complicação. O álcool exerce diversos efeitos nocivos no pâncreas – aumenta a concentração total de proteína no suco pancreático, promove a síntese e a secreção de litostatina pelas células acinares e aumenta a secreção de glicoproteína 2 no suco pancreático. Esses fatores levam à precipitação, à formação subsequente de tampões de proteína e, eventualmente, a cálculos no ducto pancreático. Como resultado da obstrução, as células acinares não podem mais secretar as enzimas pancreáticas e ficam predispostas à autodigestão. Além disso, diversos produtos do metabolismo do álcool, como ésteres de etil do ácido graxo e espécies reativas de oxigênio, provocam fragilidade das organelas intra-acinares, como os grânulos de zimogênio e os lisossomos, que levam à ativação anormal da enzima pancreática nas células acinares. O acetaldeído, outro metabólito do álcool, provoca lesão acinar direta. O consumo crônico de álcool está associado a atividade elevada de NF-κβ, perfusão reduzida na microcirculação do pâncreas e níveis elevados de cálcio intracelular. A identificação das células estreladas pancreáticas (CEP) no final dos anos 1990 é uma das descobertas mais importantes na fisiopatologia da pancreatite crônica. As CEPs são fibroblastos quiescentes especializados encontrados na base das células acinares. Uma vez estimuladas, as CEPs diferenciam-se em miofibroblastos ativados, que sintetizam as proteínas que formam a matriz extracelular. Os exemplos dessas proteínas incluem colágeno I e III, fibronectina, laminina e metaloproteinases da matriz. Isabela G. Campos 36 As CEPs têm respostas semelhantes como as células estreladas hepáticas; a necrose crônica e a inflamação (necroinflamação) induzem a liberação dos mediadores inflamatórios, como o fator de crescimento derivado de plaquetas, TGF-β, TNF-α, IL-1 e IL-6, que são conhecidos por ativar as CEPs. Consequentemente, a síntese de colágeno e de outros componentes conduz ao aumento da fibrose pancreática. Postulou-se que a necroinflamação crônica induzida por álcool ativa as CEPs e induz a fibrose pancreática. Curiosamente, também foi mostrado que o álcool e alguns de seus metabólitos (p. ex., acetaldeído) provocam ativação das CEPs. Tem sido assinalado que antioxidantes, inibidores da enzima conversora da angiotensina, ligantes do receptor gama ativado pelo proliferador de peroxissomo e vitamina A inibem a atividade das CEPs. C. QUADRO CLÍNICO. As manifestações clínicas observadas geralmente são características, sem variações importantes de um caso a outro, salvo as inerentes à própria fase evolutiva do processo. A dor é sintoma habitualmente presente e, em geral, a primeira exteriorização clínica da doença. Manifesta-se sob a forma de crises dolorosas recorrentes, intensas, localizadas no andar superior do abdome, com duração de 1 a 7 dias, intercaladas por períodos de acalmia variáveis de meses a anos, precipitadas, quase sempre, pelo abuso alcoólico e/ou por alimentação gordurosa. A sua fisiopatologia não é adequadamente conhecida, mas seu aparecimento é atribuído à hipertensão ductal provocada pela presença de rolhas proteicas nas fases iniciais da doença e por estenoses ductais nas fases mais tardias; inflamação perineural dos nervos intra e peripancreáticos também pode contribuir para o quadro doloroso. DE MANEIRA GERAL, ▶ Inespecífico, dor abdominal, distensão, flatulência, emagrecimento, esteatorreia, diarreia, diabetes. Obs. A dor é considerada a principal causa de indicação cirúrgica em portadores de pancreatite crônica. A redução do peso corporal é notada, pelo menos temporariamente, em quase todos os pacientes; o grau de emagrecimento depende, inicialmente, da frequência e da intensidade das crises dolorosas e, em seguida, do grau de envolvimento do parênquima glandular, determinando má absorção e diabete. A má absorção e o diabete melito são manifestações tardias da afecção, surgindo, em média, dez anos após o início das crises dolorosas, quando já houve comprometimento de mais de 70% do parênquima pancreático. Resultam, respectivamente, da substituição do parênquima secretor exócrino e endócrino pela fibrose. As complicações clínicas das pancreatites crônicas podem surgir em qualquer fase da doença, porém, são mais frequentes em suas fases mais iniciais, quando ainda não houve extenso Isabela G. Campos 37 comprometimento do parênquima pancreático. Podem ser locais ou sistêmicas (Quadro 82.1), e sua incidência é elevada em nosso meio, sobretudo em relação a outras grandes casuísticas. A icterícia, clínica e/ou laboratorial, observada em aproximadamente 25% dos pacientes, resulta da compressão do colédoco terminal, retropancreático, por aumento do volume da cabeça do pâncreas, secundário a edema, nódulos fibróticos, cálculos pancreáticos ou cistos cefálicos. Trata- se, em geral, de icterícia discreta, fugaz e apirética, com frequência e intensidade não relacionadas à fase evolutiva da doença, e sim com a relação anatômica entre colédoco terminal e cabeça da glândula. Os cistos, presentes em aproximadamente ⅓ dos pacientes, podem surgir em qualquer fase evolutiva da afecção, sendo pequenos, intraglandulares (cistos de retenção) ou maiores, extraglandulares (cistos necróticos). Podem, eventualmente, ser sede de complicações, como compressões de órgãos ou estruturas vizinhas (estômago, cólon, vesícula, colédoco), infecção (abscessos), hemorragia, fistulização para vísceras ocas ou para o peritônio livre (ascite) e, em cerca de 70% dos casos, têm resolução espontânea. Ascite, derrame pleural e, raramente, derrame pericárdico podem surgir durante a evolução da pancreatite crônica, sendo a ascite a mais frequente. Esta, quando presente, deve-se à fistulização de pseudocisto ou do próprio ducto pancreático principal para a cavidade abdominal. Durante a evolução das pancreatites crônicas, os pacientes podem desenvolver hemorragia digestiva, exteriorizada sob a forma de hematêmese ou melena, causada, em geral, pela ruptura de varizes esofagogástricas, secundárias à compressão ou trombose da veia esplênica, pela presença de cisto ou pelo aumento de volume do pâncreas. Pode originar-se, também, da ruptura de vasos intracísticos e da formação de pseudomicroaneurismas. Podem estar presentes necrose pancreática, estéril ou infectada, abscessos e fístulas, mas são complicações raras. A associação com cirrose hepática nas fases iniciais das pancreatites crônicas é excepcional, mas, com a evolução da doença, após a instalação da má absorção do diabete melito, o fígado começa a se comprometer morfofuncionalmente. D. DIAGNÓSTICO. O diagnóstico das pancreatites crônicas depende de um contexto clínico apropriado (p. ex., homem jovem com intenso e prolongado consumo alcoólico e dor abdominal típica, perda ponderal, insuficiência exócrina e/ou endócrina) associado a exames que reflitam a perda da função pancreática e a presença de anormalidades anatômicas compatíveis. Isabela G. Campos 38 Diagnóstico laboratorial No sangue, a dosagem das enzimas pancreáticas, em particular da amilase e da lipase, pode estar alteradanas crises de agudização da doença, especialmente em suas fases iniciais, quando o parênquima pancreático ainda se encontra relativamente preservado. Nas fases finais da afecção, é relativamente comum o encontro de níveis normais dessas enzimas, o que se justifica pela escassez da produção enzimática secundária à extensa substituição do parênquima pancreático por fibrose. Obs. As dosagens séricas da amilase e da lipase têm baixa sensibilidade para a PC, embora, quando elevadas, induzam ao diagnóstico de agudização da PC ou de complicações, como pseudocisto. Os testes laboratoriais que documentam a insuficiência glandular exócrina são sensíveis somente em fases avançadas da PC; os que avaliam a secreção da glândula têm potencial para detectar a PC em fases iniciais e são chamados de testes funcionais diretos, pois analisam os componentes do suco pancreático após estímulo hormonal. No entanto, são invasivos e não estão disponíveis na prática clínica diária. Entre os testes laboratoriais que avaliam a IEP (insuficiência exócrina pancreática) na PC de forma indireta, a dosagem fecal da elastase-1, por ser enzima exclusivamente pancreática e não degradável no trato digestório, é útil nos casos de insuficiência exócrina moderada ou grave. O teste respiratório com triglicerídeos marcados com C13 também auxilia na detecção da IEP, em fases avançadas da PC, mas não é acessível em nosso meio. Quando houver colestase, a fosfatase alcalina e a gamaglutamiltransferase, além das bilirrubinas séricas, também podem se elevar. Nos derrames cavitários (abdominal, pleural ou pericárdico), a quantificação da amilase e da proteína total no líquido obtido por punção possibilita a caracterização da origem pancreática do derrame, já que ambos os parâmetros estão elevados, especialmente a proteína. No suco duodenal ou no suco pancreático puro, obtidos respectivamente pela tubagem duodenal ou por cateterismo transpapilar, a determinação quantitativa dos componentes do suco pancreático (secreções hidroeletrolítica e enzimática), após estímulo hormonal com secretina e colecistocinina (ou ceruleína), é, até o presente momento, o melhor método de avaliação da função exócrina do pâncreas. No entanto, esse exame não é passível de realização habitual entre nós, haja vista o alto custo para importação dos hormônios. Isabela G. Campos 39 Nas fezes, a pesquisa qualitativa de gordura pode sugerir a síndrome de má absorção relacionada à insuficiência pancreática. A dosagem de gordura, após dieta padronizada (balanço de gordura fecal), é útil para o diagnóstico do grau de envolvimento do pâncreas. Outro teste que tem sido utilizado é a dosagem fecal da elastase pancreática por técnica de ELISA. Tal exame reflete a reserva funcional do pâncreas exócrino por quantificar nas fezes essa enzima pancreática, que sofre pouca degradação durante o trânsito intestinal. No entanto, é pouco sensível, por não identificar pacientes com função pancreática minimamente reduzida. Quanto menores são os níveis de elastase fecal, mais grave é a insuficiência exócrina apresentada pelo paciente. Exames de imagem Após a introdução da US, da TC e da ressonância nuclear magnética (RNM) abdominais, os exames contrastados do tubo digestivo, a colangiografia venosa, a esplenoportografia e a arteriografia seletiva do tronco celíaco e da artéria mesentérica superior são realizados excepcionalmente. Radiologia convencional A radiografia panorâmica do abdome tem uma boa sensibilidade para detecção de calcificação pancreática (mais alta que a US e mais baixa que a TC). Embora altamente sugestiva de PC, sobretudo em pacientes alcoolistas, a calcificação no leito pancreático tem outros diagnósticos diferenciais, como hematoma e/ou infarto pancreáticos, metástases, pseudocistos, neoplasias císticas, tumores neuroendócrinos, entre outros. Alterações calcificantes na coluna lombar e ateroma aórtico podem ser confundidos com calcificação pancreática na incidência frontal, podendo ser diferenciados com a incidência em perfil. A radiografia do tórax deve complementar o estudo radiológico, pois pode identificar complicações, como derrame pleural e pseudocistos intratorácicos, entre outros. Ultrassonografia de abdome Atrofia glandular, heterogeneidade parenquimatosa, calcificações, irregularidade e/ou dilatação ductal e complicações como formações císticas e/ou sólidas, dilatação das vias biliares e derrames intracavitários podem ser detectados pela US transabdominal. Esta não avalia pequenas alterações ductais (irregularidades ou pequenas dilatações). Tomografia computadorizada Atualmente, é o método de imagem de escolha na avaliação inicial da PC clinicamente suspeita. Aumento ou atrofia do pâncreas, dilatação do ducto pancreático principal, presença de calcificações, pseudocistos, pseudoaneurismas, obstrução do tubo digestivo, espessamento de planos fasciais e envolvimento dos ductos biliares são achados e complicações detectáveis. Presença de mais de 10 focos de calcificações parenquimatosas correlaciona-se com fibrose em estágio avançado. A TC é mais sensível para detecção de calcificações parenquimatosas do que os demais métodos de imagem não invasivos. Ressonância magnética e colangiopancreatografia por ressonância magnética A RM tem a capacidade de detectar e caracterizar alterações do parênquima pancreático e dos ductos pancreáticos na PC, valendo-se de sequências que propiciam diferenciação tecidual e da técnica de colangiopancreatografia por ressonância magnética (CPRM). Os aspectos de imagem mais típicos da PC são as calcificações, mais facilmente identificadas na tomografia computadorizada e de difícil caracterização nos exames de RM. A atrofia e a Isabela G. Campos 40 heterogeneidade parenquimatosa são idealmente verificadas com a administração intravenosa de substância de contraste (gadolínio). Associam-se a estes achados a dilatação do ducto principal e/ou secundários, bem como o padrão alternado de estenose/dilatação ductal, a presença de cálculos intrapancreáticos e de pseudocistos. Quando disponível, preconiza-se a utilização da secretina por via endovenosa nos protocolos de CPRM (sCPRM), que, face à maior quantidade de secreção resultante, propicia melhor identificação de alterações morfológicas dos ductos pancreáticos, inclusive em fases precoces da PC. Sendo assim, a análise morfológica completa do pâncreas pela RM, nos casos confirmados de PC ou nas suspeitas, deve incluir as sequências multiplanares tradicionalmente aplicadas para caracterização tecidual (sequências pesadas em T1, antes e após a administração de contraste paramagnético, e sequências pesadas em T2, ambas associadas a técnicas com supressão de gordura), bem como técnica para análise da morfologia ductal (CPRM). Colangiopancreatografia retrógrada endoscópica Embora até o momento não exista um verdadeiro padrão ouro, a endoscopia ainda é considerada o melhor método para o diagnóstico de PC, especialmente em um subgrupo de pacientes com dor abdominal crônica e suspeita diagnóstica, porém que não apresentam evidências clínicas claras de insuficiência pancreática ou imagenologia anormal. Atualmente, a posição ocupada pela endoscopia tornou-se ainda mais forte, considerando-se, em conjunto, a complementação da CPRE pela EE que, além das imagens que fornece, possibilita a colheita de material por meio de agulhas para avaliação histopatológica. Do ponto de vista da CPRE, representam limitações ao exame papilas localizadas no interior de divertículos duodenais que tenham orifício de entrada muito estreito. Pacientes gastrectomizados à Billroth II com alça aferente longa ou com reconstrução do trânsito à Y de Roux ou submetidos à cirurgia bariátrica, cujas papilas localizam-se a uma distância fora do alcance dos duodenoscópios convencionais, são hoje factíveis ao procedimento, através dos enteroscópios de balão(ões) assistidos.Atualmente, com o advento da pancreatografia por RM e da EE, a CPRE tornou-se um método mais terapêutico do que diagnóstico. Ecoendoscopia A EE deve ser indicada para o diagnóstico de PC após insucesso dos outros métodos de imagem. A EE produz imagens detalhadas do pâncreas. Este método possibilita avaliar critérios morfológicos parenquimatosos (focos e traves hiperecoicas, lobularidade glandular, cistos e calcificações) e ductais (ectasia ductal principal e secundária, irregularidade ductal, paredes ductais hiperecoicas e calcificações), possibilitando estadiar a PC. Não existe padronização da técnica e a maioria das publicações emprega terminologia ecográfica não consensual, dificultando a interpretação e a concordância dos achados, sobretudo entre os observadores. Organizando os critérios morfológicos ecográficos, o 1° Consenso de Rosemont (2007) propôs uma classificação diagnóstica gradativa. A EE permite a detecção de alterações da PC leve, possivelmente não visíveis em outros métodos de imagem, unindo elementos qualitativos e quantitativos, e espera estabelecer o diagnóstico ecoendoscópico da PC por meio da soma de seus critérios. No entanto, tomando por base apenas achados ecoendoscópicos, ainda permanece controverso o diagnóstico da PC inicial. Isabela G. Campos 41 Com a progressão da doença, achados como cálculos, focos hiperecoicos, focos com sombra acústica posterior e ectasia ductal principal podem estar correlacionados à insuficiência pancreática, possivelmente contribuindo com a decisão terapêutica. Representando novo recurso semiológico ecográfico, a elastografia qualitativa e a quantitativa podem contribuir na identificação gradativa dos diferentes grupos descritos na classificação de Rosemont e da probabilidade de haver insuficiência pancreática. Pelo risco de complicação e pela ausência de critérios histológicos definidos para PC, a indicação de punção ecoguiada aspirativa com agulha fina (EE-PAAF) ficou restrita ao diagnóstico diferencial das massas pancreáticas, notadamente das neoplasias malignas pancreáticas. Embora sem consenso e recomendando considerar a relação custo-benefício em cada caso, estudos recentes demonstram que a EE-PAAF melhora o valor preditivo negativo da EE e, combinada aos seus achados, pode contribuir na compreensão da fase de doença. RESUMINDO... O diagnóstico laboratorial baseia-se na avaliação exócrina do pâncreas (IEP), que é sensível apenas nas fases avançadas da doença. Amilase e lipase elevadas auxiliam no diagnóstico de pancreatite agudizada ou complicada. Pesquisa de gordura fecal e pesquisa da elastase fecal. Avaliação nutricional (albumina, vitaminas A, D, E, e K, eletrólitos como magnésio e cálcio). Os exames de imagem, como US, TC, RM e US endoscópica, são confirmatórios apenas em casos avançados. Entre esses, a US endoscópica é o exame mais sensível para detectar as alterações parenquimatosas e ducais iniciais. Podem-se encontrar calcificação do parênquima, cálculos intraductais, dilatação de dueto principal e de secundários, atrofia e heterogeneidade do parênquima. Recomenda-se, já no primeiro contato com o paciente, a mensuração laboratorial de pré- albumina, albumina, vitaminas lipossolúveis e B12, ácido fólico, magnésio, cálcio, zinco e tiamina, que ajudarão no diagnóstico precoce de IEP, avaliação nutricional e resposta terapêutica. Referências: 5. Tratado de gastroenterologia : da graduação à pós-graduação / editores Schlioma Zaterka, Jaime Natan Eisig. -- 2. ed. -- São Paulo : Editora Atheneu, 2016. 6. Robbins & Cotran, patologia : bases patológicas das doenças / Vinay Kumar, Abul Abbas, Jon Aster ; com ilustrações de James A. Perkins. - 9. ed. - [Reimpr.]. - Rio de Janeiro : GEN | Grupo Editorial Nacional. Publicado pelo selo Editora Guanabara Koogan Ltda., 2021. 7. Gastroenterologia essencial / Renato Dani, Maria do Carmo Friche Passos. – 4. ed. – [Reimpr.]. -Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018. 8. Bogliolo Patologia/Geraldo Brasileiro Filho. – 10. ed. – Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2021. 9. Clínica médica, volume 4: doenças do aparelho digestivo, nutrição e doenças nutricionais. – 2. ed. – Barueri, SP: Manole, 2016. 10. Clínica médica : consulta rápida / Organizadores, Stephen Doral Stefani, Elvino Barros. – 5. ed. – Porto Alegre : Artmed, 2020. 11. Sabiston tratado de cirurgia : a base biológica da prática cirúrgica moderna / Courtney M. Townsend ... [et al.] ; tradução GEA ; [colaboração Cary B. Aarons ... [et al.]]. - 20. ed. - Rio de Janeiro : Elsevier, 2019. 12. A gastroenterologia no século XXI : manual do residente da Federação Brasileira de Gastroenterologia / Flávio Antonio Quilici, Nelma Pereira de Santana, José Galvão-Alves. - 1. ed. - Barueri [SP] : Manole, 2019. Tutoria (SP-9) 1) Entender como o etilismo crônico causa cirrose. 2) Sobre a hipertensão portal: a. Conceito. b. Fisiopatologia. c. Quadro clínico. d. Diagnóstico. 3) Sobre a insuficiência hepática: a. Conceito. b. Fisiopatologia. c. Quadro clínico. d. Diagnóstico. 4) Sobre a ascite: a. Conceito. b. Fisiopatologia. c. Quadro clínico. d. Diagnóstico. 5) Sobre a encefalopatia: a. Conceito. b. Fisiopatologia. c. Quadro clínico. d. Diagnóstico. 6) Entender o metabolismo da bilirrubina, caracterizando a icterícia direta e indireta. 7) Sobre a pancreatite Crônica alcoólica entender: a. Conceito. adendo... (classificação) b. Fisiopatologia. c. Quadro clínico. d. Diagnóstico.