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2017 MultiletraMentos: dos textos aos signos Profa. Jeice Campregher Copyright © UNIASSELV 2017 Elaboração: Profa. Jeice Campregher Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. 372.4 C193m Campregher, Jeice Multiletramentos dos textos aos signos / Jeice Campregher: UNIASSELVI, 2017. 238 p. : il ISBN 978-85-515-0091-0 I. Leitura. 1.Centro Universitário Leonardo da Vinci. III apresentação Caro acadêmico! Este livro pretende se colocar como um hall de entrada às discussões referentes aos letramentos ou multiletramentos. Da mesma forma, pretende demonstrar a vinculação que esses conceitos têm com a formação de leitores e cidadãos. As discussões que aqui serão desenvolvidas poderão servir de norte a práticas educacionais. Serão estas que ganham consistência a partir de dois elementos: fundamentação teórica e experiência. Docentes bem fundamentados são capazes de realizar uma prática pedagógica significativa, promotora de subjetividades atuantes no mundo contemporâneo. Conforme poderá ver ao longo das unidades, trabalhar leitura – de textos verbais e não verbais – requer do docente um olhar atento às práticas sociais de leitura (e escrita) da sociedade atual. Sem que se tenha esse olhar sensível, seguiremos replicando práticas que realizaram conosco. As discussões aqui provocarão, desestabilizarão. Muitas vezes, interrogam mais que respondem. Algumas vezes, são as perguntas que movem mais que as respostas. As duas perguntas elementares que orientam esses escritos são: (1) se o mundo atual está em constante movimento e transformação, quais práticas devemos convidar à sala de aula? (2) Quais habilidades de leitura são fundamentais no mundo atual? Este livro é produzido com base na proposta de currículo em espiral – a partir da concepção de Bruner (1960). A partir dele, compreende-se que os conteúdos precisam ser reencontrados pelo aluno – sempre em níveis mais complexos, exigindo representações mais elaboradas. Assim, este livro vai ao encontro de outros em sua caminhada formativa – da mesma forma em que, nele mesmo, há uma progressão, verticalizando e aprofundando os conceitos, unidade a unidade. A organização deste livro se dá em três partes. Na Unidade 1 serão explorados os seguintes conceitos/conceitos: letramento(s), leitura no mundo atual/contemporâneo, formas de entender a leitura. Na Unidade 2 serão abordados os seguintes pontos: Letramentos (no plural), multiletramentos, letramento crítico e letramento visual, leitura de imagens, leitura em documentos oficiais. Na Unidade 3 serão abordados os seguintes tópicos: signos, semiótica, textos publicitários e suas estratégias, habilidades como norte na leitura, diferentes abordagens úteis à leitura de imagens e textos híbridos. A autora, Jeice Campregher, é mestre em Educação, Licenciada em Letras. Por meio de sua experiência em sala de aula e com projetos, conduz as discussões no sentido de dar suporte à sala de aula. Com Letramento, IV realizou na Prefeitura de Blumenau (SC) um trabalho itinerante em escolas; exercendo suporte à alfabetização e ao(s) letramento(s) em turmas de pré a quintos anos de escolas da rede municipal. Ainda na prefeitura, realizou um trabalho voltado à melhoria dos índices municipais na Prova Brasil; neste, produzindo materiais didáticos com ênfase em habilidades de leitura. Entre outras experiências no Ensino Superior e formação de professores. Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! UNI V VI VII suMário UNIDADE 1 - LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA ........................................................................ 1 TÓPICO 1 - LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO ..................................................................... 3 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 3 2 PREÂMBULO TEÓRICO .................................................................................................................... 6 3 LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO ......................................................................................... 10 4 CONCEITOS-CHAVE PARA TRABALHAR O TEXTO ............................................................... 29 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 35 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 36 TÓPICO 2 - OLHARES PARA A LEITURA ........................................................................................ 39 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 39 2 LER: PROCESSO COMPLEXO .......................................................................................................... 40 2.1 FORMAS DE ENTENDER A LEITURA ....................................................................................... 44 2.2 LEITURA NA ESCOLA .................................................................................................................. 49 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 52 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 53 TÓPICO 3 - LETRAMENTO .................................................................................................................. 57 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 57 2 CONCEITUANDO LETRAMENTO ................................................................................................. 57 3 ESCOLA E AS PRÁTICAS SOCIAIS ................................................................................................ 59 4 UM OLHAR PARA A SALA DE AULA ............................................................................................ 62 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 65 RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................68 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 69 UNIDADE 2 - DOCUMENTOS E TEORIAS RELEVANTES.......................................................... 73 TÓPICO 1 – LETRAMENTOS E MULTIMODALIDADE ............................................................... 75 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 75 2 AFINAL, POR QUE PLURAL? ........................................................................................................... 75 3 OS MULTILETRAMENTOS EM SALA ........................................................................................... 83 3.1 LETRAMENTO CRÍTICO ............................................................................................................... 86 3.2 LETRAMENTO VISUAL ................................................................................................................ 92 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 104 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 105 TÓPICO 2 – LEITURA DE IMAGENS ................................................................................................ 107 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 107 2 APROFUNDANDO A LEITURA DE IMAGENS ........................................................................... 108 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 121 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 122 VIII TÓPICO 3 – LEITURA EM DOCUMENTOS OFICIAIS ................................................................. 125 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 125 2 LEITURA EM DOCUMENTOS OFICIAIS ..................................................................................... 127 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 137 RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 141 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 142 UNIDADE 3 - DIDÁTICA: CONCEITOS, POSSIBILIDADES E PRÁTICAS ............................ 145 TÓPICO 1 – ELEMENTOS DA SEMIÓTICA .................................................................................... 147 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 147 2 CONCEITOS CAROS À SEMIÓTICA ............................................................................................. 148 2.1 ÍCONE, ÍNDICE E SÍMBOLO ........................................................................................................ 158 3 HABILIDADES COMO NORTE DA LEITURA............................................................................. 161 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 172 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 173 TÓPICO 2 – PUBLICIDADE: JOGOS E ESTRATÉGIAS ................................................................ 177 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 177 2 IMAGEM NA PUBLICIDADE ........................................................................................................... 179 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 195 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 197 TÓPICO 3 – POSSIBILIDADES DIDÁTICAS .................................................................................. 199 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 199 2 PROFESSOR: CODINOME EXPLORADOR .................................................................................. 199 3 DIFERENTES LEITURAS: EXPLORANDO POSSIBILIDADES ................................................ 201 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 226 RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 229 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 230 REFERÊNCIAS ......................................................................................................................................... 231 1 UNIDADE 1 LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS Esta unidade tem por objetivos: • analisar conceito(s) de letramento(s); • analisar a leitura no mundo atual; • diferenciar formas de entender a leitura. Esta unidade está dividida em três tópicos. Em cada um deles você encontrará atividades visando à compreensão dos conteúdos apresentados. TÓPICO 1 – LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO TÓPICO 2 – OLHARES PARA LEITURA TÓPICO 3 – LETRAMENTO 2 3 TÓPICO 1 UNIDADE 1 LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO 1 INTRODUÇÃO Vivemos em um mundo dinâmico, múltiplo, líquido (BAUMAN, 2001). Assim, ensinamos a ler e a escrever neste mundo, do jeito como ele é. Por esse motivo, torna-se, antes de tudo, necessária a compreensão desse universo existencial do qual fazemos parte ativamente. As atividades de leitura e escrita ocorrem dentro desse modo de organização da sociedade. Esta, sendo dinâmica e produzida por uma rede de práticas, não pode ser limitada e definida em papéis prontos e findados. Esses papéis são produzidos em ação, no ato de comunicação. No momento em que se dá – o(a) escritor(a) é artista, mas o(a) leitor(a) também é. O papel de leitor/ouvinte, por muito tempo, acreditava-se ser passivo. Era definido e entendido como o papel de receber a mensagem enviada pelo autor da mensagem (falada, escrita ou não verbal). Essa concepção ignorava as nuances, os detalhes e a riqueza de elementos que compõem o processo de interação por meio da língua/ linguagem/linguagens. Assim, formar leitores começa, antes de tudo, por essa percepção: a de que esses processos precisam ser observados. Assim, sai-se da leitura rasa. Da decodificação. Do ler para reconhecer informações que o professor solicitou para ganhar nota em alguma atividade de sala de aula. Sem uma leitura proficiente, a escrita também fica comprometida – apesar de serem processos independentes, eles se relacionam. Em outras palavras: aprende-se a escrever escrevendo. Não é possível também colocar toda a responsabilidade sobre a leitura. Não é possível imaginar que, lendo, automaticamente será possível escrever. Contudo, ler, ler por diversos objetivos, ler para ver a nuance e aquilo que está subentendido, ler para entender o momento de comunicação, os elementos e, por vezes, paradigmas da sociedade... essa leitura, sim, nãohá como não reconhecer que ela não “respingue” na escrita. Isso posto, esta unidade irá verticalizar alguns conceitos para entendermos desse importante componente dos currículos de nossas disciplinas: a leitura. Esses conceitos, na visão do senso comum, de nada são úteis. Alguns podem, logo de início, desenvolver esse tipo de desejo: “diga-me logo como faço”, “dê-me logo a fórmula”, “pule essa parte teórica e diga-me logo o que e como fazer”. Esse tipo de raciocínio nos amarra a fórmulas que são falsas ou inférteis. Os motivos são variados. O primeiro deles é o de que toda turma, todo aluno é diferente e precisa ser UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA 4 observado em suas características únicas. Esse, por si só, já é motivo suficiente para entendermos que fórmulas é uma busca sem sentido. O que existe são: caminhos, caminhos possíveis, caminhos explorados e caminhos ainda não explorados. A teoria, portanto, oferece reflexões que ajudarão o professor a escolher e a criar melhores caminhos de acordo com as realidades vividas. Da mesma forma, não significa que ao longo desse material não serão oferecidas sugestões de cunho prático. Porém, essa introdução deseja, antes de tudo, fazer essa ressalva: a prática dos professores pode ir muito além de tudo o que for apresentado aqui como sugestões. Pode ir muito além, desde que amparada em uma teoria consistente, em estudos da área. A prática rebelde, sem fundamentação é que deixa de levar os alunos a saltos que eles podem e têm o direito de alcançar. Utilizou-se a palavra “direito”, uma vez que, de fato, a Educação é um direito de todo cidadão (assegurado na Constituição brasileira). Independentemente disso, a noção de que os alunos têm direito de ter acesso e de dominar ferramentas para o exercício da cidadania. A leitura, de fato, é uma das maiores ferramentas para esse exercício (tal e qual a escrita e outros). Assim, nós professores precisamos ter de forma bem clara o fato de que não estamos fazendo um favor ao ensinar os conhecimentos x ou y aos nossos alunos. Que estamos dando acesso ao aluno a algo que é direito dele e, portanto, dever nosso como educadores. É o mesmo senso de responsabilidade que deve ter um médico ao se importar com seu paciente, o policial com os civis, os engenheiros com as obras – que pessoas desfrutarão. Ainda que nossos salários sejam pagos por instituições (públicas ou particulares), precisamos ter ciência de que trabalhamos por pessoas e para pessoas – aquelas que estão na nossa frente, ouvindo-nos e esperando pelo melhor de nós. Esse senso de responsabilidade, ter a visão da relevância da nossa disciplina e de todo o currículo que ela é capaz de formar para/em nossos estudantes é, de fato, o fundamento que nos impulsionará a querer ir além, querer mais conhecimento para poder criar aulas e atividades que desenvolvam habilidades e competências. Essas que serão ferramentas para o(s) exercício(s) de cidadania, para a participação social, para que esses sujeitos em formação possam se movimentar, ter independência. Independência pressupõe domínio de um conjunto (mínimo ou máximo) de habilidades que serão postas em ação (competências). Ter esse senso de responsabilidade fará com que nossa prática não seja moldada ou nosso desejo de (bem) formar não seja enfraquecido perante pessoas desinteressadas ou escolas/ instituições que não nos apoiarem (sim, nem sempre seremos compreendidos por querer fazer mais, mais do que o mínimo, mais do que o básico). Lembre-se: tendo de fato estudado autores e teorias da sua área – com dedicação e afinco – você é uma pessoa gabaritada a saber o que é importante, o que deve fazer parte da formação dos alunos. Isso nos tirará da teimosia pela teimosia. Também nos levará a outro patamar: ao de pessoas comprometidas com o conhecimento e a formação de cidadãos. Por esse motivo, espera-se que esta e as outras unidades contribuam muito no sentido de dar subsídio para a prática e, ainda, para os professores terem fundamentação para as suas práticas. A prática pela prática é cópia. É fazer como todos fizeram e repetir o que nos ensinaram. A TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO 5 prática fundamentada altera vidas – a nossa e a dos que estão sentados à nossa frente, à espera do que estamos lá para fazer: formar pessoas; levar cada um além do estágio em que chegou; ampliar a visão de mundo; ampliar possibilidades de participação no mundo; gerar mudança; abrir portas. Sim, em tudo isso, ler é essencial. Ler no sentido que aqui será trabalhado. A partir dessa provocação inicial da unidade, você é agora convidado a refletir sobre si a partir de algumas perguntas: · Você é daqueles que têm indisposição ou até preguiça de mergulhar nos estudos teóricos da sua área de estudos? · Você é daqueles que pensam que teoria é uma coisa e prática é outra? · Você é daqueles que esperam pelo momento em que virá alguma prática pronta, alguma fórmula perfeita e que resolverá todos os seus problemas? · Você é daqueles que sabem que estudar e entender conceitos é o começo – e fundamento – de uma prática pedagógica bem desenvolvida e que gere ganhos aos alunos/futuros cidadãos? Você pode usar esse espaço para fazer algumas anotações a partir das reflexões aqui levantadas. Essa percepção gera terreno fértil para que todo o mais possa ser mais bem recebido. O bom solo é segredo de uma boa plantação! Essa parte está nas mãos de cada um que agora lê este livro! Refletir e gerar autoconhecimento é arar a terra e preparar para que muito mais possa germinar! ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ Muito bem! Agora sim, poderemos seguir com a Unidade 1. UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA 6 2 PREÂMBULO TEÓRICO “A única constante é a mudança” (Heráclito de Éfeso). Quando lemos algo como “mundo atual” ou “mundo contemporâneo”, antes de tudo, precisamos reconhecer que este é vislumbrado por variadas áreas. Dentro de uma mesma área há perspectivas que se completam ou até mesmo se chocam. Em outras palavras, o mundo atual, a forma de organização da sociedade moderna pode ser explicada de variadas maneiras ou, ainda, tendo um ponto como foco da discussão que passe despercebido a outra corrente teórica. Com isso, deseja-se demonstrar que o que aqui for exposto não é forma única de entender o mundo e nem mesmo é uma tentativa de findar/encerrar a discussão. Muito pelo contrário. Trata-se de explorar alguns conceitos que contribuem para a discussão aqui realizada – não toda a explicação possível do mundo e da organização social. Antes de irmos aos conceitos, anote no espaço a seguir algumas palavras que vierem à sua cabeça sobre as características da sociedade globalizada em que vivemos. Isso fará com que seus conhecimentos prévios aflorem antes de seguirmos adiante. ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ Muito bem! A partir dessas suas anotações, você poderá ir adiante e, com base nesta e nas unidades seguintes, realizar uma comparação com o que aqui anotou. Agora podemosretomar a discussão teórica. Antes de abordarmos conceitos que pretendem descrever o mundo atual e a(s) forma(s) de organização, é necessário falar de uma mudança no campo das ciências humanas. É comum as ciências humanas, hoje, pesquisarem coletando e analisando material linguístico. Ou seja, para entender algum tópico selecionado, elas coletam dados cuja materialidade é a linguagem. Em outras palavras, quando alguma pesquisa das ciências humanas quer buscar entendimento sobre algum aspecto da sociedade, analisa a linguagem, coleta registros escritos, entrevista pessoas, entrega questionários a serem preenchidos, analisa dizeres e imagens (linguagem não verbal) a partir de filmes e livros clássicos, entre outras possibilidades. TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO 7 Nem sempre houve esse entendimento – de que podemos entender o mundo analisando linguagem/linguagens. Isso só foi possível a partir de um movimento que foi intitulado de Virada Linguística. Este aconteceu conforme descrito a seguir. A Saussure é atribuído o gesto fundador do estruturalismo, apresentado em seu Curso de Linguística Geral, de 1916 (GREGOLIN, 2004). A partir de um encontro entre Jakobson e Lévi-Strauss, as ideias estruturalistas chegam à França. Strauss é responsável por transferir os modelos linguísticos para o estudo da antropologia. Com isso, iniciou-se o processo de “transformação das ideias desenvolvidas no interior da Linguística em modelo para outros campos das ciências humanas” (GREGOLIN, 2004, p. 21). A partir dessa transposição dos modelos da linguística à antropologia, outras áreas começaram a se interessar por linguagem e, mais adiante, pelo discurso – como Foucault, Pêcheux, Bakhtin. Além disso, a partir da chamada Virada Linguística, ocorre a ascensão da Linguística como um campo de estudos. Veja a importância dessa mudança para a forma de investigar e entender o mundo: passa-se a entender que, por meio da análise da linguagem, pode-se compreender o funcionamento, a estrutura, a organização da sociedade. Essa compreensão, antes, referia-se somente ao campo da linguística. Assim, muito do que hoje é estudado e até a forma de estudar coroa a linguagem (verbal e não verbal) como formas de entender o que nos cerca, o homem no mundo, as relações humanas, as práticas sociais – em outras palavras, leva a leitura (do verbal e não verbal) a outro patamar; eleva a sua relevância. Portanto, muito do que hoje existe de teoria/teorias sobre o mundo atual é construído sobre a herança da Virada Linguística. Conhecimentos e visões são produzidos a partir da análise dessas materialidades linguísticas (do verbal e do visual). Essa mudança alterou nossa forma de pesquisar e, ainda, sensibilizou a forma de enxergar que os materiais que circulam na sociedade (orais, escritos, não verbais) são dotados de signos, carregados de sentidos e passíveis de provocar outros sentidos (a partir da leitura, de quem lê, quando lê, onde lê, em que circunstâncias lê). Como dito, isso oportunizou que conceitos relevantes surgissem. Hoje, rapidamente, em qualquer caminhada acadêmica – não só na formação da área de Letras –, acadêmicos estudam algum autor que traga a noção do signo, dos sentidos presentes naquilo que se escreve, diz e, também, na linguagem não verbal/visual. Alguns exemplos podem ser o curso de Design, o de Moda, Arquitetura, Jornalismo, Serviço Social, Ciências Sociais, Psicologia, entre outros. Esses e outros cursos, em algum momento, estudam a característica metafórica da linguagem – coisas (aparentes/visíveis) significam outras (não presentes); por isso devem ser analisadas. Na Unidade 3, essas compreensões de representação (presente) de algo (não presente) farão mais sentido. Para isso, nesta etapa vindoura, abordaremos o conceito de signo. NOTA UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA 8 Com toda essa abrangência, a concepção de fato permeia as formações, os currículos universitários, os documentos oficiais brasileiros (Diretrizes, Parâmetros, Propostas Curriculares de Estados e diretrizes de municípios). Assim, com o império dessa concepção, os exames, provas e vestibulares acabam por absorver essa concepção, exigindo de nossos alunos o reconhecimento de sentidos em textos (excertos de fala, textos variados e não verbais). As aulas de Língua Portuguesa não podem ignorar essa realidade: a conceitual (o império dos signos, sentidos, discurso) e a factual (a de que os exames e o mundo irão exigir dos cidadãos a compreensão de que as coisas significam e que necessitam ser lidas, analisadas, interpretadas). O ensino de língua portuguesa, a partir disso, não pode manter o aluno no nível raso de leitura, da superfície, do reconhecimento de informações básicas que não exijam, concomitantemente, a compreensão do mundo, da intertextualidade, da rede de discursos, das relações, dos papéis, dos signos, dos jogos de palavras e de poder, de figuras de linguagem. Ao longo de todo este livro, você estudará variadas formas de leitura – para além da decodificação. A seguir, um exemplo disso. Observe a imagem. Procure realizar uma leitura. Depois disso, leia o que segue. FIGURA 1 – PAWEL KUCZYNSK I63 FONTE: Disponível em: <https://www.pictorem.com/profile/Pawel.Kuczynski>. Acesso em: 18 maio 2017. TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO 9 Análises possíveis (entre outras): - Posso ver uma mão, um guarda, uma tesoura e um sol no formato de “a” com um círculo à volta. - Posso ver uma mão, uma fronteira e um “a” iluminado, em destaque no horizonte. - Posso ver um mouse na mão, a tesoura (controlando alguma coisa) e o @ (arroba) simbolizando a internet. - Posso ver uma pessoa com o mouse em mãos (a autonomia), o @ (arroba) como uma fonte de informações, uma fronteira com um guarda e uma tesoura – demonstrando controle entre o homem e a(s) informação(ões) ou notícia(s). Consigo associar essa imagem a vários países que realizam esse tipo de controle de suas populações. De leis regulamentadoras de seu próprio país. De fatos conhecidos – do presente ou do passado; histórias, notícias – a partir dos quais já reconheceu a censura (algum site ou blog já retirado do ar, alguma revista ou TV que já perdeu financiamento estatal). Enfim, a partir da imagem, associa a variados eventos, acontecimento, a outras histórias, a fatos, entre outros. Para sintetizar A diferença entre o primeiro (decodificação) e último (interpretação) níveis está em alguns fatores: - experiência de vida; - leitura de mundo já realizada ou que é realizada dia a dia; - a quantidade de vezes que já se inseriu em práticas de leitura; - a quantidade de vezes que já se embrenhou na análise de textos visuais; - o quanto procura fontes variadas de informação (documentários, jornais, sites, aplicativos, redes sociais, entre outros); - a quantidade de vezes que foi instigado (convidado) a realizar leituras e aceitou tais convites (de variados textos: músicas, imagens, campanhas, desenhos, propagandas, entre outros); Ao longo das três unidades deste livro, esses aspectos ficarão mais claros. Vamos adiante! UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA 10 3 LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO Se ler no mundo contemporâneo é muito mais que decodificar, quais conceitos podem nos ajudar a entender a sociedade atual? Afinal, se estamos ensinando a ler no tempo presente, precisamos, de fato, de uma base teórica que nos ajude a entender este tempo. Alguns conceitos que iremos utilizar são: sociedade líquida, discurso, enunciação, esferas, gêneros. Bauman (2001) utiliza o conceito de modernidade líquida. Este conceito também é chamado por outros autores de pós-modernidade, contemporaneidade, modernidade tardia, modernidade líquida, hipermodernidade etc. O que mais interessa é que tudo se passa (e nos passa...) como se a modernidade – não só um tempo, mas uma forma (ou formas) de estar no mundo; maneiras de ser e pensar – esteja sendo deixada para trás. Para Bauman (2001, p. 8), há uma aceleradaliquefação do mundo contemporâneo. Como explica o sociólogo, os fluidos “não fixam o espaço nem prendem o tempo”. O autor ainda completa: “não se atêm muito a qualquer forma e estão constantemente prontos (e propensos) a mudá-la” (BAUMAN, 2001, p. 8). Assim demonstra a substância do tempo presente: fluir, mudar, descartar, gerar o novo, usar, alterar; assim por diante. Segue uma citação um pouco mais densa, porém, necessária – leia calmamente, quantas vezes precisar. Da mesma maneira, a flexibilidade – uma propriedade hoje tida como importante e desejável por si mesma – decorre do caráter líquido da pós-modernidade. O mesmo se pode dizer da volatilidade e do correlato fenômeno de descarte, ambos cruciais para a prática do hiperconsumo (consumismo). Palavras como essas – liquefação, aceleração, apagamento de fronteiras, flexibilidade, volatilidade –, tão comuns nos discursos contemporâneos, apontam para a irreversível impermanência e instabilidade do mundo pós-moderno e para o fim do mito do sujeito moderno como uma singularidade estável e indivisível. São, também, palavras que servem para descrever as novas subjetividades contemporâneas, em termos éticos, polí- ticos, econômicos, culturais, de convivência, de suas relações com a Natureza e assim por diante (VEIGA-NETO, 2008, p. 44). IMPORTANT E Mesmo que em palavras mais complexas, a citação acima revela o caráter do tempo atual: a natureza líquida, flexível, acelerada dos movimentos sociais e subjetivos. As próprias mídias e redes sociais movem-se, hibridizam, atualizam-se e, com algum tempo, são substituídas por novas, mais excêntricas – assim seguem em movimento. O sujeito, as subjetividades são convidadas e impelidas a se seguirem em movimento: indo além de si mesmos, atualizando-se, formando-se TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO 11 para não se tornarem obsoletos. Esse processo ocorre tanto no mercado de trabalho ou, quiçá, em relacionamentos interpessoais – neste último, as redes sociais que promovem o “show do eu” (SIBILIA, 2008) contribuem para esse sentimento de insatisfação para consigo, com aquilo que se é e se tem. Na Unidade 3 serão retomados as práticas de linguagem atuais e o show do eu. NOTA Aqui se encontra a grande sacada: a insatisfação do momento presente é elemento crucial para que as subjetividades sigam se movimentando, indo além, gerando, permanecendo ativas, consumindo (saberes, objetos e modos de ser). Gerando essa insatisfação, gerando essa necessidade de permanecer em movimento que o momento presente gera quem somos. Estamos inseridos nisso. Estamos dentro dessas forças centrífugas que nos impelem e agem sobre nós – mesmo que não percebamos isso. O termo “show do eu”, acima citado, é uma obra da autora brasileira Sibilia. Essa autora analisou a forma com que as redes sociais nos impulsionam a mostrar a nós mesmos. A expor publicamente intimidades que antes não faríamos. A partir disso, ela percebeu quanto essas ferramentas têm poder de alterar-nos. Expondo o eu, acabamos por produzir-nos a partir dos olhos dos outros – uma espécie de regulação externa. Chegamos ao nível de que se tivermos algo e não pudermos mostrar, o nível de satisfação parece diminuir. Um exemplo da importância atual do “show do eu” é o fato de muitas pessoas hoje terem seu sustento vindo de ferramentas como YouTube (canais de variedades, blogger ou youTuber), Instagram (páginas dedicadas a um assunto específico como saúde, moda ou alimentação). Há pessoas que da noite para o dia se tornam famosas, passam a ser seguidas por milhares de pessoas (chamadas de “seguidores”) tendo seu “eu” como fonte de inspiração; de estilo de vida, opiniões, entre outros. A relevância dessas ferramentas se vê por esses exemplos e, também, pelas falas cotidianas “agora somos amigos na rede tal”, “me segue lá”, “compartilhei você”, “tal famoso me segue”, “sou seguida por x pessoas”, “minha última foto tem x curtidas”. São comentários costumeiros que materializam comportamentos e modos de estar no mundo atuais. UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA 12 Veja, caro acadêmico! Aqui se encontra a importância de estudarmos e entendermos o mundo atual e como ele nos altera – como somos transformados por ele. Essa percepção das ferramentas atuais (que nos circundam, que nos afetam e que, também, produzem o ser daqueles que chamamos de alunos) possibilitará que promovamos uma prática pedagógica promotora de reflexão, análise. Como professores, estar cientes de que nossos alunos são parte integrante desse mundo atual e que, portanto, precisam ser levados a enxergar as nuances, os detalhes, as estratégias, os jogos. Isso oportunizará com que nós e eles saiamos da inocência, ou seja, de usar por usar, sem refletir sobre as causas e as consequências. Como isso será feito em sala, como já dito, não há uma fórmula pronta e acabada. Contudo, ao analisar ferramentas – como alguma rede social, por exemplo –, os professores devem levantar reflexões que oportunizem ao aluno refletir aspectos envolvidos. Da mesma forma, podem ajudar seus alunos no “cuidado de si” – não que devam deixar de usar algumas ferramentas, mas que as usem de forma mais consciente. Em tempo: nós trabalhamos leitura e escrita no mundo atual, práticas relativas ao mundo contemporâneo. Assim, precisamos olhar essas práticas (as de leitura e escrita) compreendendo que elas são localizadas no tempo (quando?) e no espaço (onde?) e são produzidas por subjetividades (por quem e para quem?). Na posição de professores que lecionam dentro do tempo aqui chamado de “modernidade líquida”, precisamos ter essa ciência de que nós também precisamos acompanhar esse fluir. Ou seja, os nossos alunos têm contato com as mais variadas ferramentas. Eles são, o tempo todo, convidados a fluírem, a mudarem, a serem outros, a aderirem a novas ferramentas, a abandonar as obsoletas. Assim sendo, quer tenhamos consciência disso ou não, está acontecendo o tempo todo. Tendo ciência, poderemos possibilitar momentos de reflexão, selecionar melhor os nossos materiais e, também, desenvolver atividades significativas de leitura e/ou escrita. Observação: apesar de este livro dar ênfase à leitura, como o título e os capítulos seguintes demonstram, não é possível deixar de fazer referência à escrita em alguns momentos. Leitura e escrita fazem parte das práticas sociais inseridas no mundo contemporâneo e ambas fazem parte das nossas aulas. Ambas devem considerar os aspectos aqui apontados. IMPORTANT E Outro conceito que nos ajuda a entender o mundo atual – e as práticas de leitura, escrita e, não menos importantes, o texto oral e o texto não verbal – é o conceito de discurso e de poder. O próprio termo discurso é abordado em diferentes teorizações, ganhando, também, tônicas diferentes. Neste livro, o discurso é abordado, prioritariamente, a partir da teoria do filósofo Michel Foucault. Ainda, algumas aproximações são feitas a partir da autora brasileira Orlandi – esta, por sua vez, utiliza Foucault e análise do discurso francesa (oriunda da teoria de Michel Pecheux). TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO 13 O conceito de discurso é polissêmico e necessita de certos cuidados. É preciso definir a partir de quem – de qual autor – se apoia para definir o termo “discurso”. Delimitações são necessárias. Este cuidado tem uma razão: manter o rigor e a coerência teórica – seguir uma linha. Podem ocorrer fragilidades analíticas caso muitos autores sejam abordados ao mesmo tempo. O que é discurso? Depende da base teórica, respostas diferentes podem surgir. Assim, este livro vai ao encontro da proposta foucaultiana. Somente aqui já nos bastaria, afinal, com essa percepção, já poderemos levantar problematizações com nossos alunos na leitura de textos (orais, escritos e não verbais – sim, a imagem é um texto que também precisa ser lido: é costurada por discursos). NOTA NOTA Afinal, o que é discurso e por que esse conceito nos ajuda a entender o mundoatual? O conceito de discurso nos leva a algumas compreensões importantes. A começar pela compreensão de que tudo o que é dito, escrito (ou até que é materializado em algum desenho, pintura ou peça de publicidade) não vem de um nada, fruto de um gesto inaugural, oriundo da inteligência de um artista, de uma mente desconexa (como uma ilha). O conceito de discurso nos leva a perceber o aspecto interligado de tudo o que nos circunda. Interligado com o quê? A começar, pela própria história. Tudo o que dizemos no presente e que é socialmente aceito como uma verdade, foi produzido na história para que viesse, hoje, a ser considerado uma verdade. É efeito, é produto. Vamos a um exemplo mais prático. Quando algum texto, por exemplo, definir o que é ser uma boa mulher – em detrimento de todas as outras que não são como esta –, esse texto tem suas bases na história, em outros textos, fontes variadas (na literatura, na música, na ciência – mesmo que em textos não mais aceitos pela própria ciência –, em documentos oficiais anteriormente válidos, em apostilas escolares já utilizadas), enfim, nada é isolado. UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA 14 Apesar de esses tópicos – aqui abordados de forma abstrata – ganharem materialidade (serem visualizados) na Unidade 3 (por meio de exemplos de análises/leituras), aqui é válido um exemplo – para entendermos mais concretamente. Vamos ilustrar a representação da mulher. Esta, em músicas antigas ou atuais, pode receber representações complemente distintas (basta compararmos os clássicos da MPB, Bossa Nova com os estilos que sejam atuais: o funk, pop, reggae). Não só na música, mas nas artes de forma geral, nos gêneros da esfera publicitária (anúncios em revista, anúncios veiculados na televisão, outdoors, capas de revista, rótulos de produtos, entre outras possibilidades). IMPORTANT E FIGURA 2 – PINTURA “THE BIRTH OF VÊNUS” DE BOUGUEREAU FIGURA 3 – ANÚNCIO ITAIPAVA FONTE: Disponível em: <http://arthistorypro- ject.com/artists/william-adolphe-bouguereau/ the-birth-of-venus/>. Acesso em: 18 maio 2017. FONTE: Disponível em: <http://wp.clicr- bs.com.br/napontadalingua/2015/06/20/ conar-recomenta-retirada-de-propagan- da-com-aline-riscado-sensual-demais/?to- po=5>. Acesso em: 18 maio 2017. TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO 15 FIGURA 4 – PINTURA “CHARITY” DE BOUGUEREAU FIGURA 6 – PINTURA “MONA LISA” OU “A GIOCONDA” DE LEONARDO DA VINCI FIGURA 5 – ANÚNCIO DOLCE & GABBANA FIGURA 7 – DESENHO “OFFICE” DE PAWEL KUCZYNSKI FONTE: Disponível em: <https:// www.wikiart.org/en/william-adol- phe-bouguereau/charity-2>. Aces- so em: 18 maio 2017. FONTE: Disponível em: <http://www.in- foescola.com/pintura/mona-lisa/>. Acesso em: 18 maio 2017. FONTE: Disponível em: <https://www.pic- torem.com/profile/Pawel.Kuczynski>. Acesso em 18 maio 2017. FONTE: Disponível em: <http://ego.globo.com/moda/noti- cia/2015/03/apos-polemica-com-elton-john-dolce-gabbana- -volta-ser-criticada.html>. Acesso em: 18 maio 2017. UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA 16 FIGURA 8 - GÊNERO HÍBRIDO (VERBAL E VISUAL) – TIRINHA FIGURA 9 - GÊNERO HÍBRIDO (VERBAL E VISUAL) – TIRINHA FONTE: Disponível em: <https://br.pinterest.com/pin/371265563015277189/>. Acesso em: 18 maio 2017. FONTE: Disponível em: <http://www.willtirando.com.br/>. Acesso em: 18 maio 2017. Linguagem verbal – Letra de música Linguagem verbal – Letra de música Maria, Maria Milton Nascimento Maria, Maria É um dom, uma certa magia Uma força que nos alerta Uma mulher que merece Viver e amar Como outra qualquer Do planeta Maria, Maria É o som, é a cor, é o suor Amiga da Minha Mulher Seu Jorge Ela é amiga da minha mulher. Pois é, pois é.. Mas vive dando em cima de mim. Enfim, enfim... Ainda por cima é uma tremenda gata, pra piorar minha situação. Se fosse mulher feia tava tudo certo, mulher bonita mexe com meu coração. Se fosse mulher feia tava tudo certo, mulher bonita mexe com meu coração. TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO 17 É a dose mais forte e lenta De uma gente que ri Quando deve chorar E não vive, apenas aguenta Mas é preciso ter força É preciso ter raça É preciso ter gana sempre Quem traz no corpo a marca Maria, Maria Mistura a dor e a alegria Mas é preciso ter manha É preciso ter graça É preciso ter sonho sempre Quem traz na pele essa marca Possui a estranha mania De ter fé na vida FONTE: Disponível em: <https://www.letras. mus.br/>. Acesso em: 18 maio 2017. [refrão] Não pego, eu pego, não pego, eu pego, eu não pego não.. Não pego, eu pego, não pego, eu pego, eu não pego não.. Minha mulher me perguntou até: qual é, qual é? Eu respondi que não tô nem aí. Menti, menti.. De vez em quando eu fico admirando, é muita areia pro meu caminhão. Se fosse mulher feia tava tudo certo, mulher bonita mexe com meu coração. Se fosse mulher feia tava tudo certo, mulher bonita mexe com meu coração. FONTE: Disponível em: <https://www.letras. mus.br/>. Acesso em: 18 maio 2017. Comentários sobre os textos acima: 1) há imagens que remetem ao clássico, ao romântico, à mulher idealizada (que pode ser encontrada em movimentos da literatura; não só a brasileira); há a mulher adorada, delicada, corpo com os chamados “padrões de época”, remetendo às ideias românica (intertexto apresentado pelo título da obra que faz referência à Vênus). 2) há mulheres com muita roupa e pouca roupa; falantes ou quietas; com uma postura x ou y em relação aos homens; tristes e serenas; pensativas, reflexivas e contemplativas; 3) há mulheres estabelecendo uma relação com outros na imagem (anjos, adoradores, copo, garrafa de cerveja, crianças); há imagens compostas por elementos como o mar, céu, escada, bolsa, maleta; 4) o corpo está em uma posição cuja posição é socialmente reconhecida como discreta e comedida, posição de sensualidade (quadris, curvas e postura); mulher representada como bela; mulher que trabalha e é forte; 5) corpos que acolhem (recebem, abraçam), corpos ao chão, corpo segurado ao chão, mão que serve de apoio para que um objeto receba destaque no topo, mãos que são levadas ao cabelo, mãos repousadas, mão que segura pasta, bolsas, entre outros; 6) olhares que observam com ternura, com admiração; olhares que observam de cima para baixo, com olhares mais sérios, remetendo aos “bad boys”. UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA 18 Observações: 1) Quanto mais contrastantes os textos (verbais e visuais), mais gritantes ficarão o elementos que as compõem e os sentidos nelas explorados – o que contribuirá com a interpretação e a crítica. 2) Esses são somente alguns gêneros possíveis com algumas posições possíveis (entre várias outras) a serem exploradas em materiais que circulam em sociedade. A variedade é imensa: textos visuais (imagens, desenhos), verbais (letras de música) e híbridos (constituídos por texto verbal e não verbal). As imagens poderiam ser outras. Os elementos a serem percebidos: muitos outros. Esses tópicos farão ainda mais sentido quando chegar à unidade 3 deste livro. Ao chegar no conceito de letramento visual e letramento crítico, sugere-se o retorno aos textos acima apresentados. 3) Os anúncios apresentados (à direita) não foram bem recebidos – tanto pelos consumidores quanto por orgãos de fiscalização. Apresentar anúncios criticados ou censurados – sem dizer aos alunos, imediatamente, que se tratam de anúncios mal recebidos – contribui com a leitura crítica. É válido que antes construam suas análises e, somente ao final da exploração do texto (a partir de variadas estratégias) saibam desses fatos e conheçam os órgãos de regulação das propagandas. ATENCAO Sugere-se o bom senso na seleção das imagens de acordo com a faixa etária dos envolvidos. A imagem em que a mulher se coloca “em frente a uma escada” necessita de maturidade. Selecionar bem seus materiais – frente aos estágios de vida dos sujeitos – e adequação à idade também é parte do crescimento docente no trato com os textos (e imagens) em sala de aula. Retomandoa linha. É possível perceber inter-relações (contradições, ideias contrárias, posições diferentes) em gêneros de uma mesma esfera (apenas publicitária, por exemplo) ou de esferas diferentes (publicitária, jornalística, literária, científica, entre outras) ou, ainda, textos de naturezas distintas (comercial veiculado na tv, documentários, pintura clássica, música gospel, poema modernista, desenhos com ênfase em crítica social, caricaturas, tirinhas, cenas de teatro, entre outras). Uma pesquisa mais bem elaborada (em graduação ou pós-graduação, por exemplo), pode buscar essas referências (esse Arquivo, conforme intitula Foucault) para compreender essa interdependência entre textos e, também, entre história e o presente. Claro que, com nossos alunos, isso seria complicado por alguns TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO 19 ATENCAO A partir disso, pode-se perceber a infinidade de possibilidades de explorar um texto – ou dois ou mais textos, de forma comparativa, com abordagem intertextual. O conceito de intertextualidade já está propagado no ensino de língua/linguagem. Esse conceito vai ao encontro de outros: dialogismo (Bakhtin), discurso (Foucault), enunciado (Bakhtin), entre outros. quesitos – a começar pelo fator tempo. Para realizar pesquisas de forma vertical (aprofundada) é necessário tempo, dedicação – para que o interesse por pesquisar e questionar o mundo comece a brotar. Neste momento da discussão, sugere-se que não se perca de vista o seguinte: o presente é efeito, produto da história, das lutas discursivas anteriormente realizadas, de que os sentidos das coisas – que parecem óbvios no presente – são possibilitados pelo Arquivo (um campo de possibilidades e conhecimentos/ saberes socialmente aceitos). Se estamos formando leitores, portanto, devemos levar nossas turmas a ter essas percepções elementares: (1) a de que o conhecimento é produto e é construção coletiva e (2) a de que tudo está interligado – estabelece alguma relação com algo do passado, do presente ou, ainda, contribui para a construção daquilo que começa a surgir (futuro). Essas compreensões vão aparecer em nossas práticas – quer percebamos ou não. Quando elaboramos um exercício. Quando lançamos perguntas aos alunos querendo levá-los além da leitura que, no momento, conseguiram empreender. Bem conduzir as atividades, portanto, requer domínio desses conceitos. IMPORTANT E A partir de tais compreensões, poderemos, por exemplo, trabalhar a noção de intertextualidade. A partir de Fiorin (2002, apud COVALESKI, 2016), compreendemos que a intertextualidade é a incorporação de um texto em outro. Essa pode ser: (1) citação (uma referência literal a algum texto anterior), (2) alusão (reprodução de construções com algumas substituições) ou (3) estilização (reprodução do estilo – tanto em se tratando da forma de expressão quanto do conteúdo). O mesmo autor ainda compreende que ao estabelecer essa relação intertextual é possível remeter a outro texto de duas outras formas: (1) polêmica (propõe uma oposição) – um exemplo comum é a paródia – e (2) contratual (quando reforça ou enaltece) – um exemplo comum é a paráfrase. UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA 20 Todos estes compreendem que, ainda que o tempo e o espaço sejam diferentes, aquilo que é dito, escrito ou produzido/ visto (objetos simbólicos e artefatos culturais) estabelece, de alguma maneira, relação com o já dito (Orlandi). Coloca- se em uma esteira, encaixa, vai ao encontro, fundamenta-se em concepções, visões e conceitos anteriormente produzidos. Estabelecer essas relações é ler para além do momento presente – é investigar o momento presente e aquilo que nele emerge, ganha visibilidade à nossa volta. FIGURA 10 - ICEBERG FONTE: PICTOREM Disponível em: <https://www.pic- torem.com/profile/Pawel.Kuczynski>. Acesso em: 18 maio 2017. Exemplo de citação: muito comum em textos verbais. Em meio ao texto, algum trecho de livro de algum médico, especialista, cientista, algum fato histórico, entre outros elementos. Utilizado como argumento de autoridade – para reforçar um ponto de vista ou defender uma linha de raciocínio. Exemplo de estilização: quando o estilo de algum autor é reproduzido em suas obras. Por exemplo: estilo de José Saramago sendo utilizado por outro autor. Os traços utilizados por Van Gogh em suas pinturas serem reutilizados por outro pintor. Algum outro autor passar a utilizar o nome Helena em suas personagens – como Manuel Carlos em suas novelas. Esse estilo é o que leva autores a serem eternizados por terem características únicas. Exemplo de alusão: comum em textos verbais e também em textos visuais. A alusão pode ser discreta (velada) ou clara/explícita. Essa alusão (referir-se a algo ou alguém) costuma ser feita a partir de algo conhecido ou não pelo leitor/ espectador. A publicidade e as artes utilizam muitas alusões. Reaproveitam aquilo que já é conhecido, famoso ou benquisto (de outros autores ou de outros tempos) para o interior de suas produções. Algumas vezes, deixando claras as intenções, outras, deixando a responsabilidade de entender por parte do leitor. Ou seja, caso o leitor tenha conhecimento, irá reconhecer a alusão e, assim, irá compreender mais profundamente os sentidos pretendidos por aquele texto. TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO 21 FIGURA 12 – ALUSÃO NA PUBLICIDADE FONTE: Disponível em: <https://blogs.oglobo.com/rebimboca>. Acesso em: 18 maio 2017. A alusão é feita à foto clássica dos Beatles (a capa do Abbey Road da banda, em que os quatro integrantes estão atravessando a rua na faixa). Na propaganda A seguir, dois exemplos de alusão: A alusão feita no desenho é a cena “ser ou não ser” de Hamlet (peça escrita por Shakespeare). Alusão que ajuda a dar sentido ao desenho. Sem a percepção da alusão, o leitor não alcança o mais profundo do texto. Não alcança os sentidos implícitos. FIGURA 11 – ALUSÃO NO DESENHO FONTE: Disponível em: <https://www.pictorem.com/profi- le/Pawel.Kuczynski>. Acesso em: 18 maio 2017. UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA 22 acima, os quatro carros (chamados New Beetle) também atravessam a rua na faixa. Ao fazer alusão cria-se, também, a intertextualidade. Além de um trabalho a partir da intertextualidade, pode-se, ainda, selecionar textos de épocas completamente diferentes (um muito antigo e um atual) para que possam observar que um texto que se propõe a dizer a verdade sobre algo pode, de fato, estar retomando um discurso que circula em vários lugares e por variados meios (orais, escritos e não verbais). Em outras palavras: reproduz algo que já foi dito antes ou mostrado antes (em músicas, em imagens, em propagandas, entre outros). Assim estaremos trabalhando a partir da compreensão do termo discurso sem que nem precisemos abordar o termo em sala. O que importa é a compreensão e a visualização dessas conexões e redes – que fazem parte do mundo contemporâneo, ou melhor, que constituem a essência do mundo atual. Válido, ainda, é observar outros elementos na produção dos textos (esses verbais ou visuais). Neste momento, voltamos a lançar um olhar a partir da teoria foucaultiana. De acordo com Foucault (1987, p. 8-9, grifos nossos), “em toda sociedade a produção do discurso é ao mesmo tempo controlada, selecionada, organizada e redistribuída por certo número de procedimentos”. Abaixo, vamos observar cada termo selecionado. Controlada: pois nem todo mundo pode falar tudo (exemplo: verdades médicas precisam ser proferidas por médicos ou alguém gabaritado pela área da saúde). Selecionada: sim, o que se diz também é selecionado, tendo em vista seu posicionamento, crenças, valores, posição assumida. Organizada: a organização textual tem em vista os efeitos pretendidos (conquistar, convencer, descrever, esclarecer, entre outros objetivos). Redistribuída: dá a ideia de conexões e redes, conforme já dito acima. Vamos adiante, já chegaremos no ponto crucial da atual discussão. Abaixo, umacitação complexa, porém essencial: ATENCAO Em uma sociedade como a nossa, conhecemos, é certo, procedimentos de exclusão. O mais evidente, o mais familiar também, é a interdição. Sabe-se bem que não se tem o direito de dizer tudo, que não se pode falar de tudo em qualquer circunstância, que qualquer um, enfim, não pode falar de qualquer coisa. Tabu do objeto, ritual da circunstância, direito privilegiado ou exclusivo do sujeito que fala: temos aí o jogo de três tipos de interdições que se cruzam, se reforçam ou se compensam, formando uma grade complexa que não cessa de se modificar (FOUCAULT, 1987, p. 9, grifos nossos). TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO 23 Vamos destrinchar essa citação. A começar pelo “não se tem o direito de dizer tudo” – há certa limitação, variando de cultura para cultura, daquilo que não se pode dizer (separação do certo e do errado) – sim, e a maioria de nós, portanto, procura escrever ou produzir dentro daquilo que é aceito socialmente, politicamente correto, mesmo que sequer acreditemos naquilo. DICAS Aqui encontramos mais uma discussão que pode ser levantada com nossos alunos: sentidos presentes nos textos (orais, escritos e não verbais) que promulgam e reforçam o socialmente aceito, aquilo que é almejado, o que recebe o status de “adequado” e “mais elevado” entre todas as possibilidades. Esses sentidos estão por todos os lados, convidando- nos a ser, a adentrar, a encaixar, a ser como os modelos são, a ser como a forma é – para sermos aceitos, para sermos referência, para produzirmos o tão desejado “show do eu”. Continuando a abordar o excerto de Foucault apresentado acima, “não se pode falar tudo em qualquer circunstância”. Os sujeitos ao se posicionarem, ao produzirem textos, ao falarem, ao escreverem, ao produzirem alguma peça de arte ou publicitária, enfim, analisam e passam suas produções pela peneira das circunstâncias – mesmo que de forma não consciente. Seja como for, esse é um aspecto que pode fazer parte de nossas provocações ao lermos com nossos alunos. Ler também é entender esses mecanismos que são postos em funcionamento. Por fim, ainda sobre a citação, “qualquer um, enfim, não pode falar de qualquer coisa”. Nesse momento, é a posição sujeito assumida pelo autor. Qual é a posição assumida e o que se pode dizer a partir dela? É o exemplo dado acima do médico ou profissionais da saúde. Assim, ao ler um texto, para a análise dos sentidos, também é relevante analisar a posição assumida por quem diz, escreve ou produz determinado texto não verbal. Essa posição assumida também contribui para o entendimento do que se diz, como se diz e, algumas vezes, por que diz. Esses aspectos podem levar nossos leitores a outros patamares, a um nível mais proficiente de leitura. Vamos entender pensando na prática! 1) O texto “Não se aproxime” é um texto que pode ter diferentes sentidos. “Não se aproxime” no portão de uma casa, pode gerar medo (mistério sobre algo que oferece perigo – animal, eletricidade, entre outros). O “não se aproxime” de uma mulher que chora ao brigar com o namorado tem outra conotação. O “não se aproxime” em uma propaganda – ao lado de uma mulher de vermelho, segurando um perfume, em uma posição sensual – provoca outros sentidos nos leitores. O “não se aproxime” ao UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA 24 lado de uma campanha social – acima de uma imagem com uma pessoa gripada – produz outro sentido. A frase “não se aproxime” dita por um médico durante uma cirurgia tem outra conotação. Assim por diante. 2) Podem ser dadas imagens, para que os alunos criem outros elementos (parte verbal), produzindo diferentes gêneros. 3) Podem ser entregues textos (poemas, cartas, bilhetes, músicas, carta do leitor, artigo de opinião, crônica, tirinha, carta de apresentação, diário, cartaz de uma campanha social, outdoors) e os alunos devem pensar nos elementos: quem produziu, para quem produziu, quais os objetivos, quais os sentimentos presentes, a quais leitores pode interessar e não interessar, entre outros. 4) Podem ser trabalhadas frases genéricas (abstratas) e ser solicitado que os alunos (com uso de imagens e diferentes gêneros textuais) produzam sentido àquela frase – dentro de contextos, gêneros, definindo quem diz, para quem diz e as circunstâncias. A seleção de imagens ajuda a definir e a fixar sentidos que estejam abstratos ou sejam genéricos. Exemplos de frases genéricas: “isto é para você”, “vim aqui para falar algo importante a você”, “quero dar a você uma boa notícia”, “há uma experiência única à sua espera”, “Um acontecimento chamou a atenção de uma cidade do interior de São Paulo”, “Aqui está a maior alegria da vida”. “Amiga, você é insubstituível”. Esses dizeres podem passar a fazer parte de gêneros da esfera jornalística, literária, publicitária, interpessoal (entre outros). Por vezes, a produção de materiais com os alunos contribui não só com a produção de gêneros. Essas atividades contribuem, inclusive, com a leitura sensível e aprofundada proposta neste livro. As habilidades solicitadas na produção solidificam habilidades úteis à leitura. Portanto, retomando: direito de dizer, circunstância e posição assumida fazem parte de todo texto a que nos dispomos a ler. O termo “circunstância”, a partir de Orlandi, é chamado de “condições de produção” (ORLANDI, 2005). A partir da autora, as condições de produção interferem em aspectos como estilo e, também, em quais saberes (discurso) serão evocados por parte dos sujeitos. É necessário assumir uma posição que tenha direito e credibilidade para falar de alguma coisa (objeto): como é o caso de o professor falar do desempenho do aluno; como é o caso do médico falando de seu paciente; como é o caso do psicólogo discorrendo sobre a personalidade do seu paciente; entre outras formas de poder falar sobre algo ou alguém. TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO 25 Assumir um lugar não é lugar estável. Um professor ou uma professora não é sempre professor(a) quando deixa sua sala de aula (não veste o papel para sempre). Um médico não é sempre médico, quando está em momentos informais com amigos ou família. Um mesmo sujeito se alterna, muda, flui, de acordo com as condições de produção, intenções, posição assumida. A ilustração ao lado pretende demonstrar essa ideia de movimento e flexibilidade de um mesmo sujeito ao produzir textos (orais, escritos e não verbais). FIGURA 13 - CURL-UP FONTE: Disponível em: <http://www.mcescher.com/>. Acesso em: 18 maio 2017. A posição não é única e nem mesmo é levada o tempo todo. Ela é assumida. Assim como uma mesma pessoa pode assumir variadas posições ao produzir textos. “Um único e mesmo indivíduo pode ocupar [...] diferentes posições e assumir o papel de diferentes sujeitos” (FOUCAULT, 2002, p. 107). Assim, ainda que possamos encontrar o currículo do autor x ou dados sobre ele, como idade e afins, ainda assim preciso verificar naquele texto qual é a posição por ele assumida, os jogos, as argumentações, as defesas, o que critica e o que defende. Assim poderei observar, com mais clareza, a posição ou posições por ele assumida(s). Observações sobre as posições assumidas Posições são assumidas em todos os gêneros discursivos. Em uma notícia, o jeito com que uma história é narrada pode ser a visão do jornalista discretamente defendida. Um romance produz (por variados elementos) a visão do autor sobre cada personagem (ainda que não seja algo propriamente dito – é dito de outros modos, por meio das ações dos personagens ou, ainda, sobre a opinião de um personagem sobre outro). Um poeta, ainda que não sinta aquilo que o “eu lírico” está sentindo, assume uma posição frente àquilo que o poema aborda (a vida, algum fato, ou uma visão sobre uma pedra, como Drummond bem o fez). UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA 26 Um exemplo na literatura (poemas) é Fernando Pessoa e seus heterônimos e pseudônimos. Fernando é a mesma pessoa, contudo, por vezes, escrevia comoÁlvaro de Campos – intenso, pessimista, sem energia para a mudança, entre outros –, outras como Alberto Caeiro – adepto ao bucolismo, não pensar – e outras, ainda, como Ricardo Reis – carpe diem, viver o presente, contra emoções e sentimentos exagerados. Em cada uma, há uma posição diferente no mundo. Assim, na produção de um mesmo jornalista, de um mesmo publicitário, de um mesmo blogueiro podem aparecer posições diferentes – ao produzir materiais sobre um mesmo assunto, inclusive. Ainda, pode não coincidir com a opinião que daria caso não estivesse na posição de jornalista, publicitário ou blogueiro – opinião essa que apenas vem à tona quando junto a parentes e/ou amigos íntimos. Assim, uma mesma pessoa pode assumir diferentes posições. Nas imagens, desenhos ou textos híbridos, os posicionamentos também podem ser analisados. Abaixo, exemplos de algumas obras de Pawel Kuczynski. Nelas – e em outras obras do autor – pode-se visualizar o posicionamento dele em relação aos livros e aos celulares. FIGURA 14 – ISLANDS (ILHAS) FIGURA 15 – HARPA FONTE: Disponível em: <https://www.picto- rem.com/profile/Pawel.Kuczynski>. Acesso em: 18 maio 2017. FONTE: Disponível em: <https://www. pictorem.com/profile/Pawel.Kuczynski>. Acesso em: 18 maio 2017. TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO 27 FIGURA 16 - DINNER FIGURA 17 - JOURNEY FONTE: Disponível em: <https://www.picto- rem.com/profile/Pawel.Kuczynski>. Acesso em: 18 maio 2017. FONTE: Disponível em: <https://www. pictorem.com/profile/Pawel.Kuczynski>. Acesso em: 18 maio 2017. As escolhas, as composições, os contextos aos quais celulares (ilhas, solidão, mesa de jantar, oração sobre o celular, roteador no centro da mesa, um jantar sem comida, cabeças inclinadas, ambiente ao fundo escurecido; fora a mesa, não haver outros objetos na composição; além do azul da tela, só há o branco e tons pastel) e livros (barco, vela, navegar, imaginação são associados, harpa, música, arte, papel ativo do leitor junto ao livro) não são aleatório s. Remetem às vivências, aos comportamentos e ao simbólico (livro/viagem/barco e celular/ comida/sagrado). Todos esses elementos contribuem para a produção da posição no texto – neste caso, em relação a dois assuntos. As posições precisam ser analisadas em um texto específico (seja ele verbal ou visual) – não um fato dado, uma opinião eterna do autor. As posições são assumidas ao serem produzidos os textos, as falas/oralidade, os desenhos, os documentários, os textos dissertativos argumentativos, assim por diante. Conforme anunciado há algumas páginas, os dois conceitos baseados em Foucault que seriam abordados eram o de discurso e de poder. Durante muito tempo e em algumas teorias, o poder foi compreendido de uma forma bipartidarizada: (1) os que têm e (2) os que não têm. A partir de Foucault – e outros UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA 28 Na Unidade 3 veremos exemplos de imagens presentes em livros didáticos – o que nos possibilita compreender a relevância de sermos nós sensíveis ao que chega à escola (pronto a ser aplicado e utilizado). Para contribuirmos com o senso crítico, precisamos antes dominar conceitos específicos para a análise de materiais diversos (em nossa vida diária e no exercício da docência). Há imagens que reforçam verdades aceitas, reforçando-as. Voltemos à discussão teórica. NOTA O poder também é considerado em rede, uma vez que ele é exercido em relação a algo ou alguém num dado momento – não somos professores 24 horas; somos docentes no exercício da docência; depois disso somos filhos, pais, amigos, jogadores de vôlei, cozinheiros; são variadas as posições assumidas em um dia ou ao longo de nossa vida. Não há um só papel fixo para uma pessoa. Esta também, de um jeito ou de outro, acaba por regular a si e/ou submeter-se ao poder. “Ao mesmo tempo se submetem ao poder, são capazes de exercê-lo. E se os indivíduos são capazes de exercer o poder é porque o poder os atravessa” (VEIGA-NETO, 2006, p. 24). Exemplo: o profissional x que atualmente escreve em uma revista conceituada já teve que se submeter a uma instituição que o formou e deu a ele um diploma, uma certificação. Da mesma forma, os sujeitos seguem se adequando à emissora para a qual trabalhem, ao partido ao qual sejam filiados, à revista para a qual escrevam, entre autores que se colocaram nessa esteira teórica – o poder passou a ser visto muito mais como rede e, também, como posições a serem assumidas. Assim, o docente que assume uma posição de poder em relação à turma também está em uma posição de responsabilidade em relação a instâncias superiores ou instituições. Ou seja, ele também está sendo acompanhado por outros (pessoas, instituições, questões burocráticas) que estão acima dele. No texto, também, esse poder é assumido. Todo ato de escrita (ou, claro, a produção de alguma obra de arte – texto não verbal) é um ato de assumir uma posição, marcar posição no mundo, participar, firmar uma visão, externar uma crença, utilizar um espaço de ação e, quiçá, crítica do mundo. Assim, pode-se compreender que assumir um lugar é assumir um local de poder, é firmar-se no mundo e em relação aos outros, é exercer influência, é sair do silêncio. Sair do silêncio já é posicionar-se e posicionar-se já é assumir um lugar em relação ao outro. Quando alguém se apropria de um discurso, há também o poder atrelado a ele. Ocorre “uma apropriação do discurso com seus poderes e saberes” (FOUCAULT, 1987, p. 44-45). Assim sendo, em vários textos que leremos em sala, existe a possibilidade de analisarmos esse poder assumido: o de alguém que se posiciona e revela um poder de dizer algo sobre alguém ou alguma coisa – seja numa posição de crítica ou de manutenção das verdades aceitas, defendendo-as e reforçando-as. TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO 29 Caso o leitor desse livro aprecie mergulhos filosóficos, sugere-se a busca pelos conceitos de público e privado na visão de Kant. Mais especificamente, no texto “O que é o esclarecimento?” A esfera privada e a pública exercem influências sobre nós, ainda que de formas diferentes. NOTA outros. A visão de mundo e dos acontecimentos da Veja é completamente diferente da Carta Capital – as pessoas que produzirem textos para uma ou outra revista, portanto, irão ao encontro do conselho editorial da revista e dos mantenedores. O mesmo acontece em cargos que ocupem em instituições – sem contar que, por vezes, essas instituições se submetem a seus clientes. O mesmo acontece no uso da linguagem (oral, escrita e visual). Analisar um texto é entender que, ao mesmo tempo em que se assume uma posição, há uma escolha que tanto reflete um exercício de liberdade e, ao mesmo tempo, há também regulações que caem sobre aquele que produz textos ou obras – alguns mecanismos sutis, outros mais visíveis. Entender esses processos também faz parte da leitura dos textos que circulam na contemporaneidade. Eles também fazem parte da rede de saber-poder. 4 CONCEITOS-CHAVE PARA TRABALHAR O TEXTO As licenciaturas devem fazer esse movimento de estudar áreas variadas e correntes teóricas – assim como fizemos até aqui, emprestando conceitos da filosofia, sociologia e da análise do discurso. Afinal, nosso objeto de trabalho é o conhecimento e nosso maior interesse é formar pessoas da melhor forma que formos capazes. Para isso, a nossa formação deve ser um processo de construção do senso de responsabilidade e da ampliação da visão sobre a relevância do nosso trabalho. Esse eterno movimento de ir além, de não parar, de estudar mais, de analisar, de selecionar outros materiais com os quais ainda não trabalhamos – esse movimento que é próprio do mundo em que vivemos e não há como vivermos em uma caixinha, isolados de todo o mais. Outro autor que nos é caro nos estudos da linguagem e dos textos que circulam em sociedade – pelos mais variados meios – é Bakhtin. Tal autor, assim como sua própria teoria apregoa, não produziu sozinho. Junto a ele, houveuma multiplicidade de vozes que formou o que hoje chamamos de Círculo de Bakhtin. Tal pluralidade já pode ser observada na própria constituição do círculo. Os membros são de variadas partes da Rússia: Nevel, Vilnius, São Pertersburgo, Vitebsk e Orel. Além do fato de que esses exerceram múltiplas atividades profissionais – jornalistas, filósofos, historiadores, filólogos, musicistas, poetas, professores (de UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA 30 filosofia, história, literatura) e escultores (SZUNDY, 2014). Essa multiplicidade possibilitou a vivência do pluralismo linguístico e cultural que verteu na teoria. Esse autor, em seu círculo de estudos, trouxe importantes contribuições à forma de ver a circulação de materiais em nossa sociedade e, assim sendo, poderemos ter práticas pedagógicas mais significativas. Vamos a alguns conceitos que nos ajudarão a entender os processos de leitura e escrita no mundo atual. Um dos conceitos que está na base da construção teórica é heterogeneidade. Esse conceito vai ao encontro daquele visto anteriormente (discurso). A partir da noção de heterogeneidade, pode ser percebido que aquilo que circula, as verdades, os enunciados, as afirmações, os textos não são desconexos. Não existe enunciado único, que nasça totalmente novo, sem elos com toda uma rede de significação construída nas/a partir das relações humanas e a história. Como dito anteriormente, as teorias acabam por se entrecruzar, explicando aspectos semelhantes de formas diferentes. Neste momento, não se torna tão relevante entrarmos em aspectos da teoria bakhtiniana – que é vasta e complexa. Trata-se de selecionar elementos essenciais que abordem o mundo atual – claro, para procurar visualizar os processos de produção de sentidos, de circulação de textos e, a partir disso, para melhor fundamentarmos e organizarmos nossas aulas. Reforçando: a partir disso, o docente pode se tornar mais autônomo. A riqueza de conhecer o mundo vai elevar o trabalho pedagógico a novos patamares. NOTA FIGURA 18 - LITHOGRAPH FONTE: Disponível em: <http://www.mcescher.com/gallery/back-in-holland/ predestination/>. Disponível em: 10 maio 2017. TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO 31 Um exemplo ajuda a compreender melhor essa visibilidade. Algum tempo atrás, você tinha uma ideia e a divulgava em alguma roda de conversa, recebia aprovação ou reprovação dos outros “filósofos” (amigos ou familiares) que a ouviam. Muitos dos ouvintes sequer precisavam opinar ou demonstrar contentamento ou desgosto. Às vezes, aquela ideia se propagava e acabava virando uma gíria ou algum jargão; caso tivessem gostado da sua ideia ou opinião, aquilo era passado adiante, formando opiniões de outras e outras pessoas. Atualmente, é possível inclusive medir quanto que o pensamento recebeu aprovação ou reprovação. Hoje existem ferramentas como twitter ou facebook. A medida dessas aprovações são as vezes que a mensagem é “replicada”, compartilhada ou curtida. Ou, ainda, a mensagem pode receber um bombardeamento de “dislikes” (para traduzir, podemos fazer uso de um neologismo: “descurtidas”), em se tratando de vídeos do YouTube. Hoje, essas redes estão mais visíveis. Ganham visibilidade por meio dessas ferramentas de interação. NOTA Se enunciados se colocam em redes, o que é um enunciado para Bakhtin? As pessoas não falam, escrevem ou externam por gestos ou arte, apenas palavras ou frases. Elas externam enunciados. O enunciado precisa ser analisado dentro do contexto. “Cada enunciado é um elo na corrente complexamente organizada de outros enunciados” (BAKHTIN, 2003, p. 272). Detalhe: Bakhtin chegou a essa compreensão – junto a outros intelectuais – em sua época. Atualmente, vivemos em um mundo globalizado, em redes (de internet, de TVs a cabo repletas de canais internacionais, redes sociais constantemente aparecendo e sendo substituídas, sites de bate-papo – incluindo entre países, para praticar idiomas). Redes antes sutis, discretas. Hoje muito mais visíveis e palpáveis. Em tempo: por esses meios, ferramentas e redes passam, circulam os enunciados. Estes agrupados, organizados em gêneros. Esses gêneros circulam em sociedade pela TV, pela internet, livros, revistas, jornais, aplicativos de celular, sites de bate-papo, entre inúmeras possibilidades. Assim, como estudantes de linguagem, devemos ter ciência de que esses gêneros circulam e são carregados de enunciados, sentidos – que devem ser analisados dentro do contexto. Aqui chegamos a outro conceito-chave para o ensino de leitura e escrita na contemporaneidade: gêneros do discurso. Nas palavras do autor, gêneros são “tipos relativamente estáveis de enunciados” (BAKHTIN, 2003, p. 261-262). Importante é a palavra “relativamente”, afinal, a partir do estilo do autor, da circunstância, dos objetivos, das intenções, dos jogos de poder, das ferramentas linguísticas de que cada um dispõe, esse gênero é plástico e flexível – além de muitos serem híbridos (misturam-se). Antes dos estudos bakhtinianos, no Brasil, a nomenclatura utilizada era somente a de “tipologia textual”, ou seja, interessava saber qual o tipo do texto: narração, descrição, dissertação. A partir disso, procurava-se verificar qual a tipologia do texto. Esses termos ainda são usados, mas com uma percepção diferente: dentro de um mesmo gênero pode haver uma ou mais tipologias. Exemplo: quando o autor descreve o contexto de um homicídio, ele faz uma descrição. Contudo, não deixa de continuar a ser uma narração (do fato). Assim como em textos cujo objetivo primordial seja dissertar, pode haver a descrição ou quiçá a narração. UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA 32 Voltemos aos gêneros. Bakhtin (2003) descreveu gêneros em duas categorias: os primários e os secundários. Os primários são aqueles que vão chegando a nós no convívio social desde a infância – no contato, vão sendo “apreendidos” e por nós incorporados em nossas práticas. Esses são ainda aqueles espontâneos, menos ensaiados – aqueles da linguagem cotidiana, de comunicação verbal espontânea, caracterizados, muitas vezes, pela oralidade. Exemplos desses gêneros são: recados, conversações espontâneas, fofocas, piadas, entre outros. São os gêneros apreendidos, absorvidos pelo convívio. Os secundários são aqueles mais complexos, que necessitam de intervenção – esses precisam ser aprendidos. Os secundários absorvem os primários, indo além, intensificando os protocolos, os elementos que os compõem, o vocabulário, as construções frasais e as formatações. Exemplos são os textos escritos ou orais que começam a seguir certos protocolos; dos mais simples (cartas pessoais, telefonemas, apresentação pessoal) aos mais complexos (carta de apresentação, currículo, artigo de opinião, artigo científico, entre outros). Se gêneros são relativamente estáveis, pode-se imaginar que eles tenham nomes, certo? Que todo gênero do discurso possa receber um nome para identificá- lo, correto? Vale dizer que o círculo de Bakhtin não se debruçou tanto nesse sentido. Esse trabalho foi sendo feito pelos que se colocaram na esteira teórica de Bakhtin – inclusive autores brasileiros. Além disso, muito se caminhou na discussão sobre esferas – outro conceito que surgiu a partir dos estudos do círculo de Bakhtin. Os textos científicos/acadêmicos circulam, prioritariamente, na esfera acadêmica. Os textos jornalísticos, por sua vez, na esfera jornalística. Os artísticos, na esfera artística. A escolha do gênero, portanto, não é aleatória. Ela é feita a partir das condições reais e sociais da enunciação (esfera). Em alguns momentos, gêneros próprios de uma esfera podem passear por outra (os religiosos, por exemplo, podem circular na esfera acadêmica com alguma finalidade específica, como realizar alguma análise em alguma pesquisa em andamento; alguns gêneros literários podem ser inseridos em alguma abertura de capítulo de algum gênero acadêmico, como uma dissertação, por exemplo). Assim sendo, essas migrações são raras,
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