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17/04/2023, 20:55 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 1/15 REGIMES E ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS AULA 1 17/04/2023, 20:55 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 2/15 Profª Devlin Biezus CONVERSA INICIAL O objetivo desta aula é apresentar o contexto histórico em que surgiram as organizações e os regimes internacionais e fornecer um panorama de suas atuações. Para isso, a aula se divide em cinco temas. O primeiro apresenta o contexto histórico da proliferação das organizações internacionais. O segundo tema discute a origem e a natureza jurídica das organizações internacionais. O terceiro trata dos principais conceitos relacionados aos estudos das organizações internacionais. O quarto discute o abrangente papel político das organizações e instituições internacionais. Por fim, o quinto tema discute brevemente os debates teóricos de relações internacionais referentes ao papel das organizações internacionais. TEMA 1 – CONTEXTO HISTÓRICO Herz e Hoffmann (2004) entendem as organizações internacionais (OIs) como a forma mais institucionalizada de cooperação internacional, isso significa que as OIs não são a única forma de realizar cooperação entre atores estatais e não-estatais, mas que seu caráter permanente é o principal diferencial entre outras formas de cooperação. Apesar do modelo de organizações internacionais que conhecemos hoje ter se disseminado a partir do século XX, formas de cooperação organizada não são recentes na história (Onuki; Agopyan, 2020). Já no século XIX, as organizações internacionais começaram a ter maior importância na política internacional (Herz; Hoffmann, 2004). Nesse período, os avanços nos transportes e na comunicação gerados pela industrialização trouxeram problemas que até então não existiam no contexto internacional. O aumento do comércio internacional e o avanço do imperialismo europeu na África e na Ásia resultaram em uma rede econômica complexa que perpassava os limites territoriais do Estado-Nação. Dessa forma, as organizações internacionais desse período surgiram a partir da 17/04/2023, 20:55 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 3/15 necessidade de se criar instituições e métodos sistemáticos que regulassem tais relações complexas (Claude, 1986; Herz; Hoffmann, 2004). Nesse período, o Concerto Europeu é um exemplo de um importante antecessor das OIs modernas (Herz; Hoffmann, 2004). O surgimento do Concerto Europeu se deu em 1815 com o Congresso de Viena, após o final das guerras napoleônicas, cujo objetivo foi restaurar as principais dinastias europeias que haviam sido depostas por Napoleão Bonaparte (Magnoli, 2008). Na prática, o Concerto Europeu foi uma aliança formada entre Reino Unido, Prússia, Áustria e Rússia que se constituiu por meio de diversas reuniões multilaterais e visava a construir um equilíbrio de poder entre tais potências (Onuki; Agopyan, 2020). Apesar de o Concerto Europeu não ser uma organização voltada à segurança internacional, ele contribuiu com o estabelecimento de consultas mútuas entre as potências europeias e colocou as práticas diplomáticas multilaterais em um novo patamar. O destaque às práticas diplomáticas se dá devido à capacidade do Concerto Europeu em lidar com a ordem internacional vigente. Assim, não se restringindo apenas aos tratados de paz (Herz; Hoffmann, 2004). Para além da questão de equilíbrio de poder tratada pelo Concerto Europeu, o século XIX também foi palco de transformações econômicas e desenvolvimento tecnológico. O surgimento do barco a vapor, das estradas de ferro, do telégrafo e dos cabos submarinos são exemplos de novas tecnologias que passaram a demandar maior coordenação entre os Estados. Como consequência, foram criadas a União Telegráfica Internacional, em 1865, e a União Postal Universal, em 1874 (Herz; Hoffmann, 2004). A União Internacional do Telégrafo é considerada a primeira organização internacional do mundo. Seu objetivo foi facilitar a comunicação criando padrões internacionais; por exemplo, a organização foi responsável pela padronização do Código Morse. Atualmente, é denominada como União Internacional das Telecomunicações e é uma agência integrante da Organização das Nações Unidas (ONU) (Onuki; Agopyan, 2020). Durante o século XX, a eclosão da Primeira Guerra Mundial, em 1914, oscilou as estruturas institucionais de cooperação que surgiram no século anterior. Os esforços para o estabelecimento de uma organização que objetivasse garantir a paz internacional vieram com o final de Primeira Guerra, em 1918. O Tratado de Versalhes, que oficializou o fim da grande guerra, marcou também a criação da Liga das Nações, que surgiu da ideia do 14º ponto de Woodrow Wilson, então presidente dos Estados Unidos. Durante as reuniões referentes ao Tratado de Versalhes, Wilson expôs suas ideias por 17/04/2023, 20:55 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 4/15 meio de seu discurso de 14 pontos, os quais, em seu entendimento, serviriam para estabelecer uma paz duradoura. Seu 14º ponto consistia na ideia de formar uma organização internacional universal de segurança coletiva responsável pela manutenção da paz (Araripe, 2008). A ideia de Wilson, em parte, foi materializada. A Liga das Nações, primeira organização internacional de segurança coletiva, foi estabelecida em 1919. Seu objetivo foi assegurar a paz mundial e institucionalizar mecanismos para a resolução pacífica de conflitos, de forma a evitar outra grande guerra (Onuki; Agopyan, 2020). Apesar de a Liga ser fruto do discurso de Wilson, seu desejo não foi completamente alcançado devido a não universalidade que a Liga das Nações teve; os próprios Estados Unidos nunca chegaram a participar da organização. Devido a ausência de Wilson dos Estados Unidos durante a negociação do Tratado de Versalhes, o presidente perdeu a maioria no Congresso durante as eleições parlamentares. Como consequência, o Tratado de Versalhes não foi ratificado pela casa legislativa estadunidense (Araripe, 2008). Por não evitar a eclosão da Segunda Guerra Mundial, a Liga das Nações é compreendida como um fracasso. Seu sistema de segurança não foi capaz de fornecer alternativas à lógica de balança de poder (Herz; Hoffmann, 2004). Assim, o maior legado da Liga seria a experiência institucional para a constituição das Nações Unidas, sua sucessora (Araripe, 2008). TEMA 2 – ORIGEM E NATUREZA DAS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS De acordo com a definição utilizada por Accioly (2012, p. 673), as organizações internacionais são “associações de Estados (ou de outras entidades possuindo personalidade internacional), estabelecidas por meio do tratado, possuindo constituição e órgãos comuns e tendo personalidade legal distinta das dos Estados-membros”. A partir dessa definição, podemos destacar os elementos da associação de Estados e de personalidade legal. A decisão de criar uma organização internacional parte dos Estados, sendo eles os responsáveis por delimitar o objetivo e as áreas de atuação dessas instituições. Assim, os Estados que formam as potências do sistema internacional têm um papel crucial nesse processo (Herz; Hoffmann, 2004). Isso 17/04/2023, 20:55 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 5/15 ocorre porque a participação e o interesse desses Estados geram um impulso para a criação das OIs. Por exemplo, após a Segunda Guerra Mundial, os interesses dos Estados Unidos em se consolidarem no comércio internacional resultou na criação das instituições de Bretton Woods: o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (Herz; Hoffmann, 2004). A criação de uma organização internacional usualmente é consequência de um acordo multilateral e, nas maiorias dos casos, é ratificado por seus Estados-membros. O tratado constitutivo da instituição é seu instrumento básico; nele, estão delineados direitos e obrigações da organização, além das principais competências (Seitenfus,2018). Mesmo que as OIs sejam criadas devido às decisões dos Estados, elas são consideradas como atores que possuem uma determinada autonomia em relação aos seus membros, pois são capazes de elaborar políticas próprias e possuem personalidade jurídica (Herz; Hoffmann, 2004). Dessa forma, a autonomia e a personalidade jurídica outorgadas às organizações internacionais fazem com que elas não sejam apenas uma soma das vontades de seus membros, fazendo que sua natureza seja distinta e externa aos seus Estados-Membros (Seitenfus, 2018). Contudo, afirmar que as OIs são pessoas jurídicas não significa que elas se equivalem a um Estado. Isso significa não estão acima dos Estados, porque o direito internacional entende a soberania estatal como unitária e indivisível. Assim, são sujeitos secundários do direito internacional porque sua capacidade deriva da vontade dos Estados (Seitenfus, 2018). Para melhor compreender as funções das organizações internacionais, podemos definir fatores que compõe sua natureza, que pode ser qualificada como deliberativa, podendo ser apresentada por meio das competências normativas, operacionais e impositivas. As competências normativas são instrumentalizadas pelas convenções, as quais representam a capacidade da organização de convocar uma conferência diplomática e de elaborar tratados que serão aplicados aos Estados-membros (Seitenfus, 2018). Ainda a competência normativa de uma organização implica que ela pode ser capaz de editar regulamentos e recomendações. Os regulamentos são uma forma de uniformizar as condutas dos Estados-membros perante uma situação comum. Já as recomendações funcionam atuam como propostas direcionadas aos Estados-membros, cujo intuito é recomendar uma conduta e não a tornar como norma (Seitenfus, 2018). A competência operacional das OIs trata de suas atividades externas, podendo ser atividades pontuais ou permanentes. Essas atividades dependem dos poderes, da competência e dos recursos 17/04/2023, 20:55 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 6/15 que as organizações possuem. Por exemplo, as Nações Unidas conduzem atividades permanentes referentes à manutenção da paz. As atividades pontuais podem ser direcionadas a qualquer país que necessite de alguma assistência urgente, como problemas resultantes de catástrofes naturais ou epidemias (Seitenfus, 2018). Por fim, a competência impositiva representa a capacidade das organizações internacionais em impor suas decisões externamente (Seitenfus, 2018). Essa competência pode ser contraditória porque ela não é aplicada universalmente entre os membros da OI, ou seja, a imposição pode ser realizada de maneira mais fácil nos Estados mais débeis e não ser aplicada às potências. A competência impositiva das Nações Unidas, por exemplo, não pode ser aplicada aos membros do Conselho de Segurança (Seitenfus, 2018). A competência impositiva também é prevista no tratado formador da organização. A Carta Constitutiva da ONU prevê que a instituição não intervirá em assuntos que dependem da jurisdição interna do Estado. No capítulo VII da Carta, a ONU determina o cenário em que será capaz de realizar medidas coercitivas. Segundo a Carta, na existência de qualquer ameaça a paz internacional, o Conselho de Segurança será capaz de realizar recomendações e decidir quais medidas serão tomadas (ONU, 1945; Seitenfus, 2018). TEMA 3 – ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS: CONCEITOS-CHAVES A partir do contexto histórico desenvolvido pelo tema anterior, é possível compreender o cenário internacional em que as organizações internacionais surgiram. Apresentaremos algumas questões acerca dos conceitos relacionados às organizações internacionais contemporâneas, como a prática do multilateralismo e as principais características das organizações internacionais. Como demonstrado no tema anterior, as organizações internacionais contemporâneas não surgiram da maneira que conhecemos atualmente. Ao longo das décadas, elas evoluíram e se tornaram mais complexas. No século XX, as OIs se estabeleceram no cenário político internacional e hoje são importantes atores das Relações Internacionais e do Direito Internacional. A prática que rege as organizações internacionais é o multilateralismo (Onuki; Agopyan, 2020). Esse conceito pode ser definido como “a coordenação de relações entre três ou mais Estados de acordo com um conjunto de princípios” (Herz; Hoffmann, 2004, p. 10). Para compreender melhor a 17/04/2023, 20:55 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 7/15 natureza do multilateralismo, destacam-se três elementos que estão atrelados à sua prática. Esses são: princípios norteadores; indivisibilidade; e reciprocidade (Herz; Hoffmann, 2004). Os princípios norteadores são as regras ou os fundamentos que guiam a coordenação entre os Estados participantes de um acordo ou instituição multilateral. Por exemplo, o regime do comércio multilateral é norteado pelo princípio da nação mais favorecida o qual define que as nações terão o mesmo tratamento perante as tarifas comerciais. O segundo elemento que rege a prática do multilateralismo é a indivisibilidade, e isso indica que o que foi acordado entre as nações parte de um acordo multilateral será cumprido por todas. Por fim, o terceiro elemento é definido pela reciprocidade a qual pode ser entendida pela ideia de trocas mútuas entre os Estados (Herz; Hoffmann, 2004). O multilateralismo pode ser praticado de forma ad hoc ou permanente. Os arranjos ad hoc são acordos ou tratados temporários. Já o multilateralismo permanente é o cerne das organizações internacionais. Diferentemente dos arranjos ad hoc, as OIs possuem uma sede fixa e são formalizadas por um acordo que as dá origem (Onuki; Agopyan, 2020). Ao compreender que uma série de princípios comuns gerem o multilateralismo e a relação dos Estados dentro de uma organização internacional, é possível relacionar tais princípios com o conceito de regimes internacionais. O desenvolvimento de tratados e instituições multilaterais formam arranjos que lidam com problemas complexos os quais podem ser resultado dos âmbitos políticos, econômicos ou sociais. Esses arranjos dão origem aos regimes internacionais, podendo ser definidos como “um conjunto de princípios, normas, regras e procedimentos decisórios em torno dos quais as expectativas dos atores convergem em uma área temática”. (Krasner, 1982, p. 1) O regime de comércio, como já citado, o regime monetário e o regime de navegação nos mares são exemplos de regimes formados a partir de arranjos internacionais que guiam cada uma dessas práticas. Com o intuito de entender de forma geral as organizações internacionais, é importante destacar quatro características intrínsecas a elas. A primeira característica são seus membros, os quais necessariamente devem ser Estados ou outras organizações internacionais. A segunda é que a OI é formada por um tratado internacional que deve definir os principais objetivos e competências da organização. Ainda, esse tratado deve ser ratificado internamente por todos os países-membros. A terceira característica é a associação voluntária; isso significa que os Estados participam de qualquer 17/04/2023, 20:55 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 8/15 OI voluntariamente. A quarta característica é o caráter permanente; como mencionado, diferentemente dos arranjos ad hoc, uma organização internacional possui sede fixa, funcionários internacionais e um país que serve como sede (Onuki; Agopyan, 2020). Além dessas características, as organizações internacionais também podem ser classificadas a partir de diferentes critérios, uma vez que as OIs são diversas em suas funções, tamanhos e objetivos. Os principais critérios utilizados para classificar as organizações internacionais são referentes à sua geografia e função. O critério geográfico pode ser dividido entre regional ou global. Alguns exemplos de organizações internacionais regionais são a Organização dos Estados Americanos(OEA) ou a Associação das Nações do Sudeste da Ásia (Asean). Por sua vez, exemplos de organizações globais são a Organização Mundial de Saúde (OMC) ou as Organização das Nações Unidas (ONU). Em relação ao critério referente à função das organizações internacionais, elas podem ser gerais ou especializadas. Alguns exemplos de organizações gerais são a ONU. Já as especializadas podem ser exemplificadas pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) (Herz; Hoffmann, 2004). TEMA 4 – O PAPEL POLÍTICO DAS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS Como demonstrado no tema anterior, as organizações internacionais possuem diferentes critérios, os quais dependem de seus objetivos políticos. Devido a essa diversidade, o papel político exercido pelas OIs pode ter como alvo diferentes temáticas. Por exemplo, as organizações podem tratar do aspecto: da segurança coletiva, seja ela regional ou global; da cooperação funcional; da integração regional; e podem ser criadas a partir de uma sociedade civil organizada (Herz; Hoffmann, 2004; Hamann, 2005). Essa seção terá como objetivo apresentar os diferentes papéis políticos das Organizações Internacionais dentro desses quatro âmbitos propostos. A cooperação entre Estados no campo da segurança pode ser realizada por diferentes maneiras, como a formação de alianças, a elaboração de mecanismos de resolução de conflitos e pelo estabelecimento de acordos mútuos que reflitam medidas de confiança. Em conjunto com essas formas de cooperação, existe o sistema de segurança coletiva o qual busca administrar os sistemas internacionais e, entre os demais dispositivos de cooperação para a segurança, é o mais comumente relacionado às organizações internacionais (Herz; Hoffmann, 2004). 17/04/2023, 20:55 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 9/15 A ideia basilar do sistema de segurança coletiva é criar mecanismos que agreguem diferentes Estados com o intuito de evitar ou mitigar agressões entre os Estados (Herz; Hoffmann, 2004). Para que isso ocorra, deve existir confiança no funcionamento do sistema de segurança coletiva e ele deve contar com participação universal, ou quase universal, dos Estados. Como o intuito do sistema de segurança coletiva é evitar os conflitos violentos e as guerras, as normas de quando a força pode ser utilizada perante o sistema internacional é um ponto crucial (Herz; Hoffmann, 2004). Assim, é objetivo do sistema de segurança coletiva estabelecer as normas referentes ao uso da força, os armamentos permitidos a serem utilizados, o modo como os prisioneiros de guerra devem ser tratados e proteger os canais de comunicação entre países em conflito (Herz; Hoffmann, 2004). Em relação à cooperação funcional, esta pode ser definida como cooperação em uma área específica sobre questões sociais e econômicas e em diferentes graus de institucionalização, como iniciativas ad hoc ou por organizações internacionais (Herz; Hoffmann, 2004). A cooperação funcional trata de um tema amplo, tento uma importância política nas áreas de telecomunicações, saúde, comércio internacional e nos direitos humanos (Hamann, 2005). Apesar de as organizações internacionais que tratam da cooperação funcional apresentarem um aspecto mais técnico, elas não estão isentas de conflitos políticos (Herz; Hoffmann, 2004). No caso da União Internacional de Telecomunicações (UIT), por exemplo, existe um antagonismo entre Estados Unidos, União Europeia e Japão sobre a adoção de padrões técnicos que podem favorecer a indústria de determinado país. Apesar das divergências políticas, a cooperação na área da telecomunicação é uma necessidade prática, uma vez que a comunicação seria difícil de ser realizada sem padronizações e tecnologias comuns (Herz; Hoffmann, 2004). Sobre a cooperação funcional na área da saúde, destacam-se a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), de caráter regional, e a Organização Mundial da Saúde (OMS), de caráter universal. Em seu início, a OMS limitava suas atividades priorizando intervenções técnicas e programas de tratamentos específicos de doenças. A partir da década de 1970, passou abranger um maior escopo de atividades e tratar de questões socioeconômicas relacionadas à saúde (Herz; Hoffmann, 2004). Na área do comércio, pode ser destacado o papel da Organização Mundial do Comércio (OMC) como um importante agente da cooperação funcional. Dentro do sistema ONU, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial também são importantes atores no comércio internacional. Por fim, na área referente aos Direitos Humanos, o Alto Comissariado da ONU é um importante ator. 17/04/2023, 20:55 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 10/15 O papel político das organizações de integração regional, por sua vez, está relacionado com a intensificação e abrangência das relações entre atores de uma mesma região, podendo resultar na criação de novas formas de governança institucionais (Herz; Hoffmann, 2004). Neste sentido, a integração regional abrange a cooperação em diferentes âmbitos, como político-institucional, sociocultural e econômico (Herz; Hoffmann, 2004). Aqui, é importante diferenciar a integração econômica da integração regional, uma vez que a última deve contar com a cooperação nas questões políticas, sociais e culturais. Alguns exemplos de organizações de integração regional são o Mercosul e a União Europeia. Por fim, também é necessário destacar o papel político das organizações não-governamentais internacionais (ONGIs) que são um exemplo de como a sociedade civil pode se organizar no plano internacional. Assim, a sociedade civil global pode ser definida como “um espaço de atuação e pensamento ocupado por iniciativas de cidadãos” (Herz; Hoffmann, 2004, p. 217). A sociedade civil global é organizada em variadas formas, a exemplo de movimentos sociais transnacionais, redes políticas globais, comunidades epistêmicas e organizações não- governamentais. As ONGIs possuem diversas áreas de atuação e desempenham diferentes funções; algumas têm uma relativa autonomia e são relevantes na política internacional, como a Cruz Vermelha, o Greenpeace Internacional e a Human Rights Watch (Hamann, 2005). TEMA 5 – DEBATES TEÓRICOS SOBRE REGIMES E OIS O tema referente às organizações internacionais é um importante campo de estudos na área das Relações Internacionais. Nas próximas linhas abordaremos quatro grandes teorias de campo que abrangem as OIs: o neorrealismo, o institucionalismo, o construtivismo e a teoria crítica. Na teoria neorrealista, destacam-se as interpretações de Kenneth Waltz sobre o papel das instituições internacionais na política internacional (de Paula, 2011). Para Waltz, o sistema internacional é uma estrutura formada a partir da anarquia, da ausência de um poder coercitivo internacional. Assim, a estrutura política internacional é determinada por dois critérios: autoajuda e distribuição de capacidades entre os Estados (Solomón, 2016). A autoajuda significa que devido aos Estados estarem num sistema anárquico não podem contar com os demais para garantir sua sobrevivência (Freitas, 2009). Segundo Waltz, a distribuição de capacidades entre os Estados significa que o sistema internacional possui duas estruturas possíveis: bipolar e multipolar (Solómon, 2016). 17/04/2023, 20:55 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 11/15 Além do conceito da anarquia internacional, o conceito da balança de poder também é importante no entendimento de Waltz sobre a natureza do sistema internacional. Para o autor, a balança de poder é o principal elemento estrutural que orienta o comportamento dos Estados (de Paula, 2011). Nesse sentido, a lógica da balança de poder é do jogo de soma zero ou que busca ganhos relativos (Hertz, 1997). Isso significa que, para o neorrealismo de Waltz, as possibilidades de os Estados cooperarem são limitadas e as instituições internacionais não são capazes de mudar a estrutura anárquica e de autoajuda do sistema internacional (Hertz, 1997). De acordocom a teoria de Waltz, as instituições internacionais seriam instrumentos de poder das grandes potências, usadas de acordo com seus interesses (de Paula, 2011). Por sua vez, a teoria institucionalista, ou neoliberalismo institucional, possui um entendimento diferente em relação ao papel das OIs no cenário internacional. Assim como o neorrealismo, o institucionalismo compreende que ações racionais guiam ações dos atores internacionais. De acordo com Keohane (1984), o comportamento dos atores é traçado de forma racional, de acordo com constrangimentos e incentivos do sistema internacional (Onuki; Agopyan, 2020), ou seja, a decisão de participar ou não de uma organização internacional será determinada de forma racional, com base em um cálculo de custo-benefício (Onuki; Agopyan, 2020). Contudo, institucionalistas e neorrealistas divergem no entendimento da importância das organizações internacionais. Para o institucionalismo, as OIs são capazes de amenizar efeitos da anarquia internacional e possibilitar a cooperação entre os Estados (Solómon, 2016). Podemos destacar duas contribuições teóricas de Keohane para o campo das relações internacionais: a teoria dos regimes e debate com o neorrealismo (Solómon, 2016; Keohane, 1984). Diferentemente dos neorrealistas, Keohane argumenta que os regimes internacionais são capazes de modificar a distribuição de recursos de poder entre os Estados. Segundo o autor, os Estados escolhem cooperar porque é de seu interesse. Keohane desenvolve sua teoria a partir da argumentação de que os regimes internacionais são capazes de diminuir os custos de transações legítimas ao mesmo tempo que aumentam o custo das transações ilegítimas. Isso significa que, racionalmente, seria mais vantajoso cooperar do que não cooperar (Keohane, 1984). Por divergir de preposições centrais das teorias neorrealistas, as pesquisas institucionalistas construíram um importante debate teórico nos estudos das relações internacionais, denominado como debate neo-neo (Solómon, 2016). Em relação ao entendimento das instituições e regimes internacionais, o institucionalismo argumenta que os regimes e organizações conseguem amenizar 17/04/2023, 20:55 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 12/15 os efeitos limitadores da anarquia por meio da cooperação. Já os teóricos neorrealistas argumentam que as instituições não são capazes de desempenhar tal papel porque a estrutura anárquica se sobrepõe às instituições. Além das teorias neorrealista e institucionalista, a teoria construtivista também se debruça em relação ao papel das organizações internacionais. A inovação da teoria construtivista é ir além da discussão da anarquia e racionalidade, presentes no neorrealismo e no institucionalismo, e dar ênfase para elementos como ideias, princípios e valores para entender o papel das OIs na política internacional (Onuki; Agopyan, 2020). Já o foco dos estudos construtivistas está nos processos que dão origem às instituições e aos regimes (Solómon, 2016). Nesse sentido, o intuito é demonstrar como instituições, sejam internacionais ou nacionais, são socialmente construídas por meio de um consenso e das ideias compartilhadas por determinada sociedade (Solómon, 2016). Um importante autor que representa essa corrente teórica é Alexander Wendt, que argumenta que a anarquia internacional pode resultar no sistema de autoajuda, como defendido pelos neorrealistas, ou no sistema cooperativo, como defendido pelos institucionalistas. Entre tais extremos, o autor considera que também pode existir possibilidades intermediárias. Para justificar esse entendimento, Wendt considera que “essas diferentes instituições ou estruturas não surgiram da anarquia. Elas seriam consequência de outros processos e, fundamentalmente, da interação recíproca entre os autores”. (Solómon, 2016, p. 101) A importância das contribuições construtivistas é o argumento de que a interação entre estrutura e agentes podem resultar em diversas realidades, ou seja, não há uma lógica que determina as ações dos agentes. Por fim, a Teoria Crítica também se propõe a compreender o fenômeno das organizações internacionais pressupondo seus argumentos a partir da percepção de que as teorias, no geral, são relativas às condições históricas (Nogueira; Messari, 2005, p. 136). Isso significa que as teorias devem ser analisadas a partir do contexto histórico-social em que elas foram formuladas, para assim identificar a quem tais teorias servem. 17/04/2023, 20:55 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 13/15 Esses pressupostos têm como base os estudos de Robert Cox, em que o autor questiona a neutralidade das teorias tradicionais, como o realismo e o liberalismo, defendendo a ideia de que toda teoria é relativa ao seu tempo e lugar (Nogueira; Messari, 2005, p. 139). A Teoria Crítica dá ênfase ao caráter histórico das estruturas políticas, econômicas e sociais, entre elas, àquelas entre a formação das instituições internacionais. Assim, as instituições são analisadas a partir da reflexão de uma estrutura histórica fruto de um determinado contexto (Onuki; Agopyan, 2020). NA PRÁTICA A Organização Mundial da Saúde (OMS) é um exemplo de organização internacional de cunho técnico e específico, mas que sua atuação também está relacionada ao âmbito político. Em 30 de janeiro de 2020, a OMS declarou que o surto do coronavírus (COVID-19) se constitui como uma emergência de saúde pública de importância internacional. Em fevereiro de 2020, apresentou seu Plano Global contra o coronavírus. Pesquise quais são os principais pontos que formam o Plano Global e relacione-os com o papel político que a organização possui. Saiba mais Para saber mais sobre este assunto, sugerimos dois sites para consulta: https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_contentview=articleid="6101":folha-infor mativa-novo-coronavirus-2019-ncovItemid="875">. Acesso em: 23. Mar. 2020. https://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2020/02/05/plano-global-contra-o-coronavirus -previsto-para-durar-3-meses-vai-custar-us-675-milhoes-diz-oms.ghtml>. Acesso em: 23. Mar. 2020. FINALIZANDO Primeiramente, destacamos o contexto histórico em que ocorreu o aumento do surgimento das organizações internacionais. O intuito do tema trabalhado foi evidenciar como a cooperação internacional se modificou ao longo dos séculos, culminando na formação das Nações Unidas no pós-Segunda Guerra Mundial. Em um segundo momento, apresentamos a origem e a natureza das https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_contentview=articleid= https://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2020/02/05/plano-global-contra-o-coronavirus-previsto-para-durar-3-meses-vai-custar-us-675-milhoes-diz-oms.ghtml 17/04/2023, 20:55 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 14/15 OIs; a ideia central dessa sessão temática foi conceituar as organizações internacionais e compreender porque elas podem ser consideradas sujeitos do direito internacional. Já o terceiro tema tratou dos principais conceitos relacionados aos regimes e às organizações internacionais. O intuito foi familiarizar esses conceitos e relacioná-los com a atuação prática das OIs. A quarta seção temática apresentou o papel político das organizações internacionais. Aqui, buscamos evidenciar que os aspectos políticos podem estar presentes mesmo em organizações voltadas a aspectos técnicos. Destaca-se ainda a multiplicidade das OIs no cenário contemporâneo. Por fim, o quinto tema apresentou brevemente as correntes teóricas das relações internacionais que tratam das OIs e do seu papel na política internacional. Na aula seguinte, esses debates teóricos serão aprofundados. REFERÊNCIAS ARARIPE, L. de A. Tratado de Versalhes.In: MAGNOLI, D. História da paz. São Paulo: Contexto, 2008. DE PAULA, O. F. Instituições Internacionais: um debate teórico. Revista de Estudos Internacionais, v. 2, n. 2, p. 139-153, 2011. HAMANN, E. P. Organizações internacionais: história e práticas. Contextoint., Rio de Janeiro, v. 27, n. 1, p. 217-224, jun. 2005. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext pid="S0102-85292005000100006" lng=en nrm=iso>. Acesso em: 08 mar. 2020. HERZ, Mônica. Teoria das Relações Internacionais no Pós-Guerra Fria. Rio de Janeiro, v. 40, n. 2. 1997. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php? script=sci_arttextpid="S001152581997000200006"lng=ennrm=iso. Acesso em: 08 mar. 2020. KEOHANE, R. O.After hegemony. Princeton: Princeton University Press, 1984. MESSARI, N.; NOGUEIRA, J. P. Teoria das Relações Internacionais: correntes e debates. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005. ONU. Asamblea General. Carta das Nações Unidas.São Francisco, 1945. ONUKI, J.; AGOPYAN, K. Organizações Internacionais. Uninter: Curitiba, 2020. 17/04/2023, 20:55 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 15/15 PERES, H. F. O Debate entre Neorrealismo e Neoliberalismo. Revista InterSaberes, v. 4, n. 7, p. 69- 88, 2012. SALOMÓN, M. Teorias e enfoques das Relações Internacionais: uma introdução.Curitiba: InterSaberes, 2016. SEITENFUS, R. A. S.Manual das organizações internacionais. Livraria do Advogado Editora, 2018.
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