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17/04/2023, 20:57 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 1/15 REGIMES E ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS AULA 5 17/04/2023, 20:57 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 2/15 Profª Devlin Biezus CONVERSA INICIAL O objetivo desta aula é apresentar a criação dos regimes internacionais frente ao dilema da segurança, à mudança do conceito de segurança internacional e à dimensão dos novos desafios no pós-Guerra Fria. Para isso, a aula está estruturada em cinco temas. O primeiro tema engloba os entendimentos de segurança internacional e suas principais mudanças. O segundo tema trata a relação dos regimes internacionais de segurança e o dilema de segurança, definindo o conceito e apresentando seus principais desafios frente à cooperação. O terceiro tema discute o conceito da responsabilidade de proteger, ilustrando o novo entendimento de segurança das Nações Unidas após a Guerra Fria. O quarto tema apresenta o papel da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) no regime contemporâneo de segurança. Por fim, o quinto tema trata das questões de terrorismo e da não proliferação nuclear, temas centrais da agenda de segurança internacional. TEMA 1 – SEGURANÇA INTERNACIONAL E O PODER DOS ESTADOS SOBERANOS Compreender a relação entre os regimes de segurança internacionais e os estudos de segurança se faz necessário porque, durante o ápice do desenvolvimento dos estudos de segurança, os estrategistas civis possuíam conexões com os atores governamentais que planejavam as políticas de segurança. Os estudos sobre segurança são centrais na disciplina das Relações Internacionais. Para os estudos clássicos da área, conceitos como soberania e não intervenção são essenciais para compreender e garantir a segurança estatal perante o sistema internacional (Onuki; Agopyan, 2020). Durante as décadas de 1950 e 1960, as potências ocidentais, principalmente Estados Unidos e países europeus, utilizavam das pesquisas acadêmicas para auxiliar na formulação de suas políticas. Dessa forma, os analistas de segurança desse período priorizavam os estudos sobre teorias de dissuasão de armas nucleares, as análises das forças armadas e instrumentos de gerenciamento de 17/04/2023, 20:57 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 3/15 crises (Williams, 2008). A ênfase desses estudos é explicada pelo contexto histórico em que esses analistas e formuladores de política se encontravam. Durante a Guerra Fria, a principal ameaça de segurança para as potências ocidentais era a possibilidade de uma guerra nuclear. Nesse contexto, os estudos de segurança tiveram uma dominância da teoria realista de relações internacionais, e seus objetos de estudos eram o que Paul D. Williams (2008, p. 3) classificou como “os quatro S”: states, strategy, science e status quo. Na tradução: Estados, estratégia, ciência e status quo. Esses estudos têm o Estado como o agente mais importante na atuação da política internacional; a estratégia é voltada para a pesquisa sobre os melhores meios de empregar o uso da força militar; a ciência é empregada com o objetivo de desenvolver um conhecimento objetivo sobre o tema em estudo, afastando-se de uma análise opinativa; e, por fim, o status quo reflete a preocupação dos estudos tradicionais de segurança em conservar e preservar a conjuntura de vantagens das grandes potências no sistema internacional (Williams, 2008). Essa abordagem, voltada para a teoria realista, tende a compreender a segurança como algo derivado do poder. Isso significa que o poder de um Estado garantiria sua segurança (Rudzit, 2005). Essa abordagem foi a que predominou nos estudos de segurança durante a Guerra Fria. A ênfase nos estudos estratégicos começou a ser modificada a partir do trabalho de Barry Buzan intitulado People, States, and Fear. Uma das principais contribuições dessa obra foi o entendimento de que a segurança não se limitaria apenas à segurança nacional, mas também deveria abranger a segurança da coletividade humana (Williams, 2008). Para ilustrar a formação abrangente dos estudos de segurança, Williams (2008) propõe quatro questões fundamentais. Primeiro, o que é segurança; segundo, a quem se direciona a segurança; terceiro, o que conta como uma questão de segurança; e quarto, como a segurança pode ser alcançada. Ao perguntar “o que é segurança?”, Williams (2008, p. 6) identifica duas filosofias diferentes que podem emergir desse conceito. A primeira compreende à segurança como um sinônimo de acumulação de poder. Assim, quanto mais poder um Estado consegue acumular, principalmente poder militar, mais seguro esse Estado seria. Por sua vez, a segunda filosofia desafia esses pressupostos. O segundo entendimento vê a segurança a partir da preocupação com a justiça e os princípios dos direitos humanos. Essa perspectiva parte do princípio de que a segurança é relativa, dependendo da relação que diferentes atores possuem entre si. Nesse sentido, mais armamentos não necessariamente garantiriam uma maior segurança para determinado ator (Williams, 2008). 17/04/2023, 20:57 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 4/15 Um exemplo que pode ilustrar essas diferentes filosofias é a percepção de ameaça dos Estados Unidos em relação ao Reino Unido e ao Irã. O Reino Unido possui 215 armas nucleares em seu arsenal. Em contrapartida, o Irã ainda não possui armas nucleares desenvolvidas, até o presente momento. Apesar dessa discrepância da quantidade de armas nucleares entre Reino Unido e Irã, os Estados Unidos percebem o Irã como uma ameaça à sua segurança. Esse exemplo demonstra que, de acordo com a segunda filosofia, “uma segurança verdadeira e estável não vem da habilidade de exercer poder sobre os outros, mas sim da cooperação para alcançar a segurança sem privar os demais atores dela” (Williams, 2008, p. 6). A segunda pergunta proposta por Williams (2008), “a quem se destina a segurança?”, visa esclarecer o objeto de análise em uma discussão securitária. Durante o ápice dos estudos estratégicos e no período da Guerra Fria, a resposta para essa pergunta estava nos Estados. Uma segunda perspectiva foca na segurança para os indivíduos. Já uma terceira visão compreende a sociedade como o objetivo mais importante para os estudos de segurança (Williams, 2008). A terceira questão que delineia os estudos de segurança trata sobre o que deve ser considerado uma questão de segurança. Esse questionamento envolve uma análise do processo de como agendas de ameaça são construídas e compreende quem decide o que será encarado como uma ameaça. A construção de uma agenda que trate de possíveis ameaças pode abranger questões econômicas e sociais: pobreza, doenças infeciosas, problemas ambientais etc., além de conflitos entre Estados e conflitos internos, como guerras civis, genocídios, terrorismo e crime organizado (Williams, 2008). Essa questão abre um debate nos estudos de segurança sobre o que deveria ser encarado como ameaça securitária. Duas perspectivas podem ser destacadas. A primeira defende que assuntos militares e conflitos armados devem ser o foco da análise de segurança. A segunda argumenta que as análises deveriam ser direcionadas para ameaças imediatas que afetam o cotidiano da sociedade (ibidem). Por fim, a quarta questão proposta por Williams (2008, p. 9) é: “como a segurança pode ser alcançada?”. O objetivo dessa pergunta é esclarecer quais são os atores que colocam seus esforços sobre problemáticas securitárias. No sistema internacional contemporâneo, agentes securitários vão além dos Estados, por exemplo: organizações internacionais, ONGs, empresas de segurança privada e organizações criminais (ibidem). 17/04/2023, 20:57 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 5/15 Esses quatro questionamentos são úteis para obtermos um panorama sobre os debates e objetos de análise dos estudos de segurança. Assim, nos próximos temas, poderá serdesenvolvida a relação dessa área de estudo com os regimes internacionais de segurança contemporâneos. TEMA 2 – ANARQUIA INTERNACIONAL E O DILEMA DE SEGURANÇA O entendimento de segurança durante a Guerra Fria era focado na atuação dos Estados como principais agentes securitários e era racionalizado a partir da perspectiva da acumulação do poder. Nesse contexto, os Estados Unidos e a União Soviética buscaram maximizar sua segurança com o objetivo de evitar conflitos e de expandir, ou consolidar, suas esferas de influência (Onuki; Agopyan, 2020). Esse entendimento também interpreta o poder a partir dos ganhos relativos do Estado. Assim, a busca por segurança de uma potência pode ser compreendida como uma ameaça para outra potência. Essa escalada de poder, usualmente materializada por armamentos, gera o dilema da segurança (ibidem). O dilema de segurança representa o cenário em que um Estado adota políticas que aumentem sua segurança, o que automaticamente irá diminuir a segurança dos demais Estados (Jervis, 1982). Essas reações que levam ao dilema de segurança possuem natureza unilateral e competitiva de comportamento, em vez da procura por soluções cooperativas (ibidem, 1982). Assim, o dilema de segurança se tornou um risco para a construção de um regime de segurança internacional confiável. Se, por um lado, o acirramento da competição gerada pelo dilema de segurança é um risco para a manutenção de um regime de segurança, quais seriam os fatores que favoreceriam a formação e funcionamento desse regime? Segundo Jervis (1982, p. 360), o primeiro fator seria o desejo das grandes potências em estabelecer esse regime. Para isso, as potências e os demais Estados necessitariam estar razoavelmente satisfeitos com o status quo vigente para mantê-lo. O segundo fator seria a crença dos atores em que os demais Estados dividem valores similares sobre segurança mútua e cooperação. Essa condição também envolve possíveis formas incorretas em que os Estados podem perceber outros como ameaças (Jervis, 1982). O terceiro fator destacado por Jervis (1982, p. 361) é que atores que acreditam que a segurança pode ser sanada por meio da expansão colocam em risco o funcionamento do regime internacional. Por fim, a quarta condição que favorece o surgimento de um regime de segurança seria o 17/04/2023, 20:57 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 6/15 entendimento de que guerras, conflitos armados e a busca individual pela segurança seriam custosos. Segundo o autor, isso significa que se Estados acreditarem que construir armamentos é algo positivo (por exemplo, porque apoia a indústria doméstica), não haverá incentivos para a cooperação em manter baixos os custos de armamentos (Jervis, 1982). Trazendo o dilema da segurança para a contemporaneidade, Booth e Wheeler (2008, p. 133) argumentam que esse conceito deveria ser central para os estudos de segurança. Para os autores, o conceito é essencial porque está intimamente relacionado à condição de incerteza – uma característica presente em todas relações humanas. Nas relações internacionais, a incerteza representa o fato de que nenhum Estado é capaz de estar totalmente certo sobre as intenções e motivações de demais Estados. Nesse sentido, mesmo em tempos de paz, um Estado não conseguiria estar seguro das ações de um terceiro devido à incerteza futura (Booth; Wheeler, 2008). De modo a dar maior complexidade ao conceito do dilema de segurança, Booth e Wheeler apresentam três lógicas que podem moldar a maneira como teóricos e tomadores de decisão de política internacional interpretam o dilema de segurança. Essas lógicas são: 1) a fatalista; 2) a mitigadora e 3) a transcendente. A lógica fatalista determina que a competição securitária seria intrínseca à política internacional. A lógica mitigadora possui o pressuposto de que a competição securitária pode ser amenizada, mas nunca eliminada. Por sua vez, a lógica transcendente parte da ideia de que a sociedade humana é a responsável por constituir a si própria. Assim, a sociedade não é predeterminada e possui agência para promover mudanças (Booth; Wheeler, 2008). Aos trazer essas diferenciações, Booth e Wheeler (2008) demonstram como diferentes perspectivas teóricas compreendem o dilema de segurança. Os autores apresentam como as manifestações empíricas desse conceito têm sido interpretadas de diversas formas. Compreender o dilema de segurança se faz importante para analisar o papel que a cooperação securitária possui na política internacional. Como consequência, compreende-se também a construção e eficácia do regime de segurança internacional contemporâneo. TEMA 3 – SEGURANÇA NA ONU: A RESPONSABILIDADE DE PROTEGER Após a Guerra Fria, o entendimento internacional sobre conflitos armados se modificou. As dimensões internas do conflito passaram a ser uma variável importante para buscar sua resolução. 17/04/2023, 20:57 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 7/15 Isso se materializou nas mudanças das operações de paz das Nações Unidas. Assim, a perspectiva de segurança também foi modificada. Durante a Guerra Fria, a segurança se destinava aos Estados. A partir da mudança do entendimento internacional sobre o conflito, ela passou a permear outras dimensões. Nos estudos de segurança, Barry Buzan foi um dos percursores em associar a segurança não somente aos Estados, mas também à coletividade humana (Onuki; Agopyan, 2020). Nesse novo paradigma da segurança, problemáticas como a pobreza, as mudanças climáticas, o desenvolvimento e os direitos humanos passaram a serem discutidas. Dessa forma, a segurança deixa de ser entendida apenas pela ótica estatal e da integridade territorial, passando a abranger também a garantia da segurança humana (Onuki; Agopyan, 2020). É diante desse cenário que as atividades das operações de paz são expandidas e a questão das intervenções humanitárias ganha espaço no debate sobre política internacional. Em conjunto com a mudança do paradigma de segurança, o entendimento da soberania também se modificou após a Guerra Fria. Durante a disputa bipolar, o enfoque dado ao conceito da soberania residia em uma interpretação indivisível. Isso significa que a soberania estatal era inquestionável e se priorizava a não intervenção em assuntos internos dos Estados. Após esse período, o entendimento da soberania como algo indivisível passou a ser modificado em detrimento da justificativa do direito ao uso da força em situações de violações aos direitos humanos. Nesse sentido, criou-se o conceito de “responsabilidade de proteger”, cujo objetivo seria demonstrar que os Estados teriam o dever de agir quando um Estado não é capaz, ou não deseja, proteger os direitos humanos de sua própria população. A partir do conceito da responsabilidade de proteger, o entendimento da soberania passar a ser vinculado à noção de direitos humanos (Onuki; Agopyan, 2020). Em suma, a soberania não é um atributo intrínseco e imutável do Estado, algo que possa justificar, inclusive, violações de direitos humanos contra populações nacionais. [...], a soberania decorre da responsabilidade de o Estado proteger sua população contra crimes contra a humanidade, genocídio, crimes de guerra e limpeza étnica e tem como fato gerador essa obrigação de proteger. (Alexandre, 2014, p. 8) A responsabilidade de proteger surgiu em um contexto histórico-crítico para as Nações Unidas. A organização enfrentava questionamentos sobre sua eficácia e funcionamento devido às violações humanitárias ocorridas durante a década de 1990. Por exemplo, a ONU foi criticada por não agir rapidamente no caso de genocídio em Ruanda e em não atuar de forma eficaz para impedir o 17/04/2023, 20:57 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 8/15 genocídio na Bósnia-Herzegovina. Dessa forma, o conceito de responsabilidade de proteger tem o intuito de fazer com que as intervenções humanitárias fossem mais assertivas (Alexandre, 2014). Em 2005, o conceitofoi institucionalizado nas Nações Unidas por meio de uma resolução da Assembleia Geral (A/RES/60/1, 2005). De acordo com a resolução, cada Estado individual teria a responsabilidade de proteger sua população de violações humanitárias, incluindo a prevenção que esses crimes venham a ocorrer. Ainda, a resolução afirma que a comunidade internacional, por meio das Nações Unidas, teria a responsabilidade de usar meios pacíficos para proteger populações que sofressem violações humanitárias. Caso os meios pacíficos não surtissem efeito, o Conselho de Segurança poderia autorizar o uso da força para mitigar crimes humanitários (A/RES/60/1, 2005). O endosso sobre a responsabilidade de proteger veio de forma unânime pela Assembleia Geral. Contudo, existem críticas em relação à sua prática. Essas críticas ganharam força a partir da intervenção na guerra civil da Líbia, em 2011. Em março de 2011, o Conselho de Segurança das Nações Unidas aprovou a Resolução 1973 a qual autorizava o uso robusto da força para impor uma zona de exclusão aérea a Líbia com a justificativa de proteger os civis do regime de Gaddafi. Contudo, a intervenção militar não estabilizou a política na Líbia e levou o país a uma guerra civil entre apoiadores de Gaddafi e seus opositores – apoiados pela OTAN (Neves, 2014). A situação de instabilidade criada pela intervenção despertou debates dentro do âmbito das Nações Unidas. Um importante conceito que surgiu a partir desse questionamento foi o da ‘responsabilidade ao proteger’ cunhado pela representação diplomática brasileira e o ministro das relações exteriores do período, Antônio Patriota. Após a intervenção da Líbia, o Brasil foi um importante porta-voz das críticas direcionadas à responsabilidade de proteger. As críticas trazidas pelo Brasil não foram fruto unicamente da intervenção na Líbia, mas preocupações de longa data sobre as limitações do sistema de segurança coletiva. Essa proposta sofreu resistência inicial das potências pertencentes à OTAN, como os Estados Unidos, França e Reino Unido, mas o debate ganhou corpo e passou a ser abertamente discutido nas Nações Unidas (Tourinho; Stuenkel; Brockmeier, 2016, p. 7). O conceito da responsabilidade ao proteger pode ser interpretado como uma crítica também à maneira como as potências ocidentais no hemisfério norte conduzem as intervenções humanitárias. Assim, abre espaço para uma discussão de cunho securitário para participação de países em desenvolvimento. 17/04/2023, 20:57 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 9/15 O conceito da responsabilidade ao proteger foi um importante passo para a formulação de uma crítica construtiva à doutrina de intervenções que surgiu do próprio âmbito político. Contudo, o debate perdeu espaço a partir de 2012. Na prática, as consequências das intervenções na Líbia ressoaram na doutrina vigente. Por exemplo, o argumento de que o uso da força pode trazer mais malefícios do que benefícios ganhou espaço nas discussões políticas e acadêmicas (Tourinho; Stuenkel; Brockmeier, 2016, p. 10). TEMA 4 – SEGURANÇA NO CONTEXTO DA ORGANIZAÇÃO DO TRATADO DO ATLÂNTICO NORTE (OTAN) Tratar da atuação da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) no âmbito dos regimes internacionais se faz necessário por dois principais motivos. O primeiro está relacionado ao seu papel na cooperação securitária como a principal organização de defesa coletiva da contemporaneidade. Em segundo lugar, a OTAN serve como exemplo prático para a compreensão de como o entendimento de segurança foi expandido após a Guerra Fria. A OTAN foi oficialmente formada em 1949 com a assinatura do Tratado de Washington. Inicialmente, a organização contava com 12 países-membros: Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, Portugal, França, Dinamarca, Bélgica, Islândia, Itália, Países Baixos, Noruega e Luxemburgo (Onuki; Agopyan, 2020). Atualmente, a organização conta com 29 Estados-membros, sendo Grécia e Turquia exemplos de como a OTAN se expandiu geograficamente para além do Atlântico Norte (Bertazzo, 2010). O contexto histórico do surgimento da OTAN foi o início dos acirramentos entre as duas potências do pós-Segunda Guerra: Estados Unidos e União Soviética. A OTAN materializou, por meio de recursos militares, o conjunto de valores e ideologias representados pela democracia liberal. Liderada pelos EUA, a organização visava ampliar a cooperação com a Europa e mitigar o avanço soviético no território europeu (Barroso, 2006). O documento original constitutivo da OTAN contava com 14 artigos. Entre eles, pode-se destacar o Artigo 5: as Partes concordam em que um ataque armado contra uma ou várias delas na Europa ou na América do Norte será considerado um ataque a todas, e, consequentemente, concordam em que, se um tal ataque armado se verificar, cada uma, no exercício do direito de legítima defesa, 17/04/2023, 20:57 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 10/15 individual ou coletiva, reconhecido pelo artigo 51.° da Carta das Nações Unidas, prestará assistência à Parte ou Partes assim atacadas, praticando sem demora, individualmente e de acordo com as restantes Partes, a ação que considerar necessária, inclusive o emprego da força armada, para restaurar e garantir a segurança na região do Atlântico Norte. Qualquer ataque armado desta natureza e todas as providências tomadas em consequência desse ataque serão imediatamente comunicados ao Conselho de Segurança. Essas providências terminarão logo que o Conselho de Segurança tiver tomado as medidas necessárias para restaurar e manter a paz e a segurança internacionais. (OTAN, 1949) Como é possível observar, o Artigo 5 é o responsável por determinar as justificativas do uso da força da organização. Qualquer ataque contra algum dos membros da OTAN levaria todos os membros ao conflito em sua defesa. Dessa forma, o artigo demonstra a natureza de aliança militar da OTAN durante a Guerra Fria. Após o período bipolar, essa natureza se expandiu (Onuki; Agopyan, 2020). Com o desmantelamento da União Soviética em 25 de dezembro de 1991, a OTAN precisou de um novo propósito para seu funcionamento. A organização ganhou maior institucionalidade e se consolidou como uma organização regional de cooperação em segurança (Onuki; Agopyan, 2020). De modo a justificar sua continuidade, a OTAN ampliou seu escopo sobre assuntos securitários. Assim, a organização adaptou suas normas e ampliou suas estruturas para lidar com a realidade das novas ameaças securitárias. Por exemplo, seus Estados-membros passaram a conduzir e participar de operações de paz. Ainda, a OTAN ampliou suas atividades para além do âmbito militar, tornando-se um fórum político para discussões entre seus membros (Bertazzo, 2010). A mudança institucional da OTAN pode ser evidenciada pelo ‘conceito estratégico’, apresentado em 1991. Nesse documento, afirma-se que o ambiente pós-Guerra Fria não modificaria o propósito da organização. Contudo, tais mudanças trariam visões mais amplas de segurança (Barroso, 2006). Esse novo entendimento de segurança da OTAN refletia a promoção de instituições livres e da economia de mercado, uma vez que essas medidas estavam relacionadas à promoção de paz, democracia e segurança. Apesar de essa modificação refletir a conjuntura internacional de mudanças sobre percepções securitárias, Barroso (2006) menciona uma crítica sobre o tema. Segundo ele, o conceito heterogêneo de segurança adotado pela OTAN foi demasiado amplo (idem, p. 49). Por exemplo, reformas econômicas, violações de direitos humanos e questões ambientais entraram no entendimento mais amplo de segurança. Contudo, a OTAN não definiu o escopo e o alcance de sua atuação para cada um desses casos. 17/04/2023, 20:57 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 11/15 Em relação à atuação contra a violação de direitos humanos, é possível destacar duas atuações da OTAN. O primeiro caso é a Guerra da Bósnia e o segundo caso é a intervenção em Kosovo (Barroso,2006). A intervenção da OTAN na Guerra da Bósnia (1992-1995) marcou a primeira vez em que a organização utilizou a força em um conflito. A atuação da OTAN foi capaz de desmantelar as forças sérvias contra os grupos bósnios para que o Acordo de Paz fosse negociado. Quanto à Guerra do Kosovo (1999), a intervenção da OTAN foi justificada com o intuito de prevenir violações de direitos humanos durante o conflito. Os ataques da OTAN foram direcionados às forças sérvias, as quais objetivavam reprimir o movimento separatista dos kosovares albaneses. Uma importante diferença entre as atuações da OTAN em ambos os casos foi sua relação com o Conselho de Segurança da ONU. Durante a Guerra da Bósnia, o Conselho de Segurança aprovou a intervenção. Já no caso do Kosovo, a intervenção foi vetada. Apesar do veto do Conselho de Segurança, a OTAN realizou a intervenção na região. TEMA 5 – TERRORISMO E NÃO PROLIFERAÇÃO DE ARMAS NUCLEARES Como discutido, a conjuntura internacional pós-Guerra Fria foi acompanhada por um novo entendimento de segurança, trazendo questões como o desenvolvimento humano, os direitos humanos e questões ambientais para a agenda tantos dos Estados quanto dos estudos de segurança. O início do século XXI mobilizou, de forma ainda mais assertiva, as instituições internacionais para novas ameaças (Onuki; Agopyan, 2020). Os ataques terroristas ao World Trace Center, em Nova York, e ao Pentágono, em Washigton D.C., fizeram com que os atores internacionais se mobilizassem contra essa nova ameaça. Além do terrorismo, a invasão do Iraque em 2003 fortaleceu o debate entorno da não proliferação de armas de destruição em massa. O argumento utilizado pelos Estados Unidos para realizar a invasão foi de que Saddam Hussein deteria um arsenal de armas de destruição em massa. Em 2004, o então secretário-geral das Nações Unidas, Kofi Annan, propôs a reunião de um painel sobre ameaças, desafios e mudanças com o intuito de lidar com esses desafios. (Onuki; Agopyan, 2020). O painel foi intitulado “A more secure world: our shared responsability” e seu objetivo era endereçar as principais ameaças à paz e à segurança internacional (A/59/565, 2004). 17/04/2023, 20:57 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 12/15 Entre as ameaças tratadas pelo documento, a questão do terrorismo e das armas de destruição em massa são abordadas. Em relação ao terrorismo, o documento relata a existência de duas novas dinâmicas que tornam essa ameaça urgente. A primeira dinâmica é a capacidade de os grupos terroristas formarem uma rede com alcance global e capacidade de agir de forma sofisticada, como ocorreu com a Al Qaeda. A segunda dinâmica é a ameaça de que o terrorismo buscaria causar casualidades em massa e, por isso, criaria perigos sem precedentes no contexto da segurança coletiva das Nações Unidas. O documento recomenda que uma das formas para lidar com essa ameaça seria por meio do controle dos materiais nucleares, químicos e biológicos e também construir sistemas globais robustos de saúde pública (A/59/565, 2004). Entre as principais dificuldades em lidar com a ameaça do terrorista está a questão de que não há uma definição comumente aceita sobre o que poderia ser considerado um ato terrorista (Onuki; Agopyan, 2020). O relatório traz essa dificuldade à tona, afirmando que os Estados-membros das Nações Unidas não haviam sido capazes de chegar a um consenso sobre a definição de terrorismo. Reconhecendo esse empecilho, o documento define o terrorismo como qualquer ação [...] que tem como intenção causar morte ou danos corporais a civis ou não combatentes, quando o propósito desse ato, em sua natureza ou contexto, é intimidar uma população ou compelir um governo ou organização internacional em agir ou se abster de um determinado ato. (A/59/565, 2004, p. 49) Partindo dessa definição, é interessante ressaltar o elemento da intimidação. Nesse sentido, a violência causada pelo terrorismo teria um objetivo predeterminado e usaria o medo como instrumento para alcançá-lo (Onuki; Agopyan, 2020). Ao tratar das formas de prevenção ao terrorismo, o relatório dá destaque ao desenvolvimento de instrumentos globais para a cooperação no tema (A/59/565, 2004). Apesar de a importância dessa iniciativa ter sido reconhecida em 2004, o Escritório de Contraterrorismo das Nações Unidas (UNOCT) foi criado apenas em 2017. O objetivo do escritório foi o de unificar as iniciativas do sistema ONU e fortalecer os esforços dos Estados-membros sobre a temática do contraterrorismo (Onuki; Agopyan, 2020). Em 1968, o Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP) foi elaborado. O objetivo do TNP era conter a difusão de armamentos nucleares por meio do comprometimento dos Estados que [1] 17/04/2023, 20:57 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 13/15 aderem o acordo. Apesar de o TNP ser um importante passo para a cooperação nuclear, sua eficácia é questionada. Uma das críticas é de que o TNP não foi capaz de impedir que Israel, Índia e Paquistão e a República Democrática da Coreia desenvolvessem suas armas nucleares (Onuki; Agopyan, 2020). Uma segunda crítica é de que o TNP teria legitimado a divisão entre Estados que detêm armamentos nucleares e aqueles que não (César, 2008). O relatório “A more secure world” reconhece que o TNP não seria tão eficaz quanto na época de sua formulação (A/59/565, 2004). Além do TNP, outros elementos essenciais que formam os alicerces do regime de não proliferação são: 1) um sistema que verifique o cumprimento do que foi acordado pelo tratado, como é o caso da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA); 2) controle de fornecedores de materiais nucleares ou químicos; e 3) um mecanismo de cumprimento ao tratado, como funciona o Conselho de Segurança das Nações Unidas (Batista, 2011; Lamazière, 1996). A cooperação na área nuclear surgiu durante a Guerra Fria, na década de 1950. O então presidente dos Estados Unidos, Dwight D. Eisenhower, propôs às Nações Unidas o programa Átomos para a Paz. A preocupação estadunidense surge a partir de uma possível corrida armamentista nuclear e para manter um oligopólio formado pelos países que já eram detentores de armas nucleares. Por meio do programa Átomos para a Paz, os Estados Unidos se comprometeram a compartilhar seus conhecimentos científicos nucleares para propósitos pacíficos (Batista, 2011). A cooperação promovida por esse programa aconteceu de forma bilateral. Em 1954, a Assembleia Geral da ONU aprovou a criação da AIEA, dando ênfase multilateral à cooperação nuclear. O objetivo da criação de uma agência voltada à questão nuclear foi coordenar, reduzir e eliminar o uso do material nuclear para fins bélicos (Batista, 2011). NA PRÁTICA O conceito da responsabilidade de proteger representou um novo posicionamento das Nações Unidas sobre os crimes contra civis. Explique o que é a responsabilidade de proteger e como ela se relaciona com o entendimento de segurança vigente no pós-Guerra Fria. Saliente, também, uma contradição, ou crítica, possível de direcionar a esse conceito. FINALIZANDO 17/04/2023, 20:57 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 14/15 Esta aula teve como objetivo apresentar o desenvolvimento do regime internacional de segurança, tratando de temas pertinentes ao assunto em pauta. Em um primeiro momento, os temas trataram dos diferentes entendimentos de segurança e da relação do regime com o dilema de segurança. Em um terceiro momento, discutiu-se questões pertinentes ao regime, como a responsabilidade de proteger, o terrorismo e a não proliferação nuclear. REFERÊNCIAS A/59/565. UN General Assembly. A more secure world: our shared responsibility, 2004. Disponível em: https://www.refworld.org/docid/47fdfb22d.html. Acesso em: 10 maio 2020. ALEXANDRE, C. F. Responsabilidade de proteger e soberania como responsabilidade: análise teórica e desafios brasileiros. Trabalho de conclusão de curso (Especialização em Relações Internacionais)– Universidade de Brasília, Brasília, 2014. BATISTA, G. F. F. 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Curitiba: Uninter, 2020. 17/04/2023, 20:57 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 15/15 OTAN. Tratado do Atlântico Norte. Washington D.C., 4 de abril de 1949. Disponível em: https://www.nato.int/cps/su/natohq/official_texts_17120.htm?selectedLocale=pt. Acesso em: 9 maio 2020. TOURINHO, M.; STUENKEL, O.; BROCKMEIER, S. Responsibility while protecting: Reforming R2P implementation. Global Society, v. 30, n. 1, p. 134-150, 2016. WHEELER, K. B.; NICHOLAS, J. Uncertainty.In: WILLIAMS, P. D. Security Studies: An Introduction, p. 133-150, 2008. WILLIAMS, P. D. Security studies: an introduction. In:Security studies. Routledge, 2012. p. 23-34. Tradução da autora. No original: “any action [...] that is intended to cause death or serious bodily harm to civilians or non-combatants, when the purpose of such an act, by its nature or context, is to intimidate a population, or to compel a Government or an international organization to do or to abstain from doing any act” (A/59/565, 2004, p. 49). [1]
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