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Juiz Federal - Temas Especiais - Tráfico De Pessoas E

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1Curso	Ênfase	©	2021
TEMAS	ESPECIAIS	PARA	JUIZ	FEDERAL
DIREITOS	HUMANOS
	Tráfico	de	pessoas	e	a	Justiça	Federal
1.	Tráfico	de	pessoas
O	tráfico	de	pessoas	é	um	fato	que	acontece	desde	os	tempos	antigos.	Sendo	assim,	já
havia	previsão	no	Código	Penal	(CP)	desde	a	sua	edição,	mas,	com	uma	tipificação	mais
restrita	 do	 que	 a	 emprestada	 ao	 art.	 231	 por	 meio	 da	 Lei	 nº	 11.106/2005,	 já	 que,
inicialmente,	havia	previsão	quanto	ao	tráfico	de	mulheres,	notadamente	no	aspecto	da
exploração	sexual.	
À	época,	o	nosso	legislador	punia	a	entrada	e	saída	em	território	nacional	de	pessoa,	ou
melhor,	a	promoção	da	entrada,	já	que	a	pessoa	era	uma	vítima,	para	fins	de	exploração
sexual.
Atualmente,	o	art.	231	resta	 integralmente	 revogado,	 tendo	a	disciplina	do	 tráfico	de
pessoas	sido	disposta	no	atual	art.	149-A	(Lei	nº	13.344/2016),	todos	do	CP.	
Tráfico	de	Pessoas
Art.	149-A.	Agenciar,	aliciar,	recrutar,	transportar,	transferir,	comprar,	alojar	ou	acolher
pessoa,	mediante	grave	ameaça,	violência,	coação,	 fraude	ou	abuso,	com	a	 finalidade
de:										
I	−	remover-lhe	órgãos,	tecidos	ou	partes	do	corpo;					
II	−	submetê-la	a	trabalho	em	condições	análogas	à	de	escravo;													
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III	−	submetê-la	a	qualquer	tipo	de	servidão;													
IV	−	adoção	ilegal;	ou													
V	−	exploração	sexual.													
Pena	−	reclusão,	de	4	(quatro)	a	8	(oito)	anos,	e	multa.
§	1º	A	pena	é	aumentada	de	um	terço	até	a	metade	se:													
I	 −	 o	 crime	 for	 cometido	 por	 funcionário	 público	 no	 exercício	 de	 suas	 funções	 ou	 a
pretexto	de	exercê-las;													
II	 −	 o	 crime	 for	 cometido	 contra	 criança,	 adolescente	 ou	 pessoa	 idosa	 ou	 com
deficiência;									
III	−	o	agente	se	prevalecer	de	relações	de	parentesco,	domésticas,	de	coabitação,	de
hospitalidade,	 de	 dependência	 econômica,	 de	 autoridade	 ou	 de	 superioridade
hierárquica	inerente	ao	exercício	de	emprego,	cargo	ou	função;	ou													
IV	−	a	vítima	do	tráfico	de	pessoas	for	retirada	do	território	nacional.													
§	 2º	 A	 pena	 é	 reduzida	 de	 um	 a	 dois	 terços	 se	 o	 agente	 for	 primário	 e	 não	 integrar
organização	criminosa.													
2.	Definição	jurídica
Os	tipos	penais	anteriores	a	2016	não	atendiam	às	obrigações	internacionais	assumidas
pelo	Brasil,	porquanto	deveriam	abranger	a	arregimentação	e	o	transporte	de	pessoas
para	 as	 mais	 diversas	 finalidades,	 normalmente	 aquelas	 em	 situação	 de
vulnerabilidade.
Se	 observarmos	 no	 Protocolo	 Adicional	 à	 Convenção	 de	 Palermo,	 da	 qual	 o	 Brasil	 é
signatário	através	do	Decreto	nº	5.017/2004,	temos	uma	definição	da	expressão	tráfico
de	pessoas,	designando	o	que	esse	fenômeno	significa	e	em	que	condições	ele	acontece.
Vejamos:
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Art.	 3.	 a)	 A	 expressão	 “tráfico	 de	 pessoas”	 significa	 o	 recrutamento,	 o	 transporte,	 a
transferência,	o	alojamento	ou	o	acolhimento	de	pessoas,	recorrendo	à	ameaça	ou	uso
da	 força	 ou	 a	 outras	 formas	 de	 coação,	 ao	 rapto,	 à	 fraude,	 ao	 engano,	 ao	 abuso	 de
autoridade	ou	à	situação	de	vulnerabilidade	ou	à	entrega	ou	aceitação	de	pagamentos
ou	benefícios	para	obter	o	consentimento	de	uma	pessoa	que	 tenha	autoridade	sobre
outra	 para	 fins	 de	 exploração.	 A	 exploração	 incluirá,	 no	 mínimo,	 a	 exploração	 da
prostituição	de	outrem	ou	outras	 formas	de	exploração	sexual,	o	 trabalho	ou	serviços
forçados,	escravatura	ou	práticas	similares	à	escravatura,	a	servidão	ou	a	remoção	de
órgãos.	
Observa-se	que	a	exploração	não	é	apenas	a	sexual.	Toda	forma	de	exploração	contra	o
ser	humano,	que	o	coloque	em	posição	de	objeto,	coisa,	pretende	ser	punida	por	esse
protocolo,	 incluindo,	no	mínimo,	a	exploração	de	outrem	em	diversas	 formas,	como	a
sexual,	do	trabalho	ou	serviços	forçados,	escravidão	ou	práticas	similares,	a	servidão	ou
a	remoção	de	órgãos.
Nesse	mesmo	protocolo	há	uma	menção	clara	à	ideia	de	que	o	tráfico	de	pessoas	estará
presente	quando	a	vítima	não	puder	manifestar	livremente	o	seu	consentimento.	
Quando	ela	é	colocada	nessa	posição,	de	alguém	que	é	transportado	ou	levado	contra	a
sua	vontade,	ao	menos	com	algum	tipo	de	vício	da	vontade:
Art.	 3.	 b)	 O	 consentimento	 dado	 pela	 vítima	 de	 tráfico	 de	 pessoas	 tendo	 em	 vista
qualquer	tipo	de	exploração	descrito	na	alínea	a)	do	presente	artigo.	Será	considerado
irrelevante	se	tiver	sido	utilizado	qualquer	um	dos	meios	referidos	na	alínea	a).
Art.	3.	c)	O	recrutamento,	o	transporte,	a	transferência,	o	alojamento	ou	o	acolhimento
de	uma	criança	para	fins	de	exploração	serão	considerados	“tráfico	de	pessoas”	mesmo
que	não	envolvam	nenhum	dos	meios	referidos	da	alínea	a)	do	presente	artigo.
3.	Tráfico	de	pessoas	–	art.	149-A	do	CP
Após	a	edição	da	Lei	nº	13.344/2016,	que	alterou	sensivelmente	a	conformação	do	tipo
penal	de	 tráfico	de	pessoas	no	nosso	CP,	 inclusive	 topograficamente,	deslocando-o	do
art.	231	para	o	art.	149-A,	ele	está	muito	mais	coerente	com	os	termos	da	Convenção
de	Palermo.
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Como	foi	determinada	ou	realizada	a	redação	do	art.	149-A	do	CP?
No	 art.	 149-A	 foram	 previstas	 várias	 condutas	 como:	 agenciar,	 aliciar,	 recrutar,
transportar,	 transferir,	 comprar,	alojar	ou	acolher	pessoa,	bem	como	vários	modos	de
praticar	essa	conduta:	mediante	grave	ameaça,	violência,	coação,	fraude	ou	abuso,	bem
como	vários	modos	de	praticar	essa	conduta	e	várias	finalidades:
I	−	remover-lhe	órgãos,	tecidos	ou	partes	do	corpo;	
II	−	submetê-la	a	trabalho	em	condições	análogas	à	de	escravo;	
III	−	submetê-la	a	qualquer	tipo	de	servidão;	
IV	−	adoção	ilegal;	ou	
V	−	exploração	sexual.
Essas	 cinco	 finalidades	 vieram	 atender	 com	 muito	 mais	 precisão	 às	 obrigações
assumidas	pelo	Brasil	ao	aderir	ao	Protocolo	Adicional	da	Convenção	de	Palermo.
Ainda,	as	penas	foram	elevadas	para	reclusão	de	quatro	a	oito	anos	e	multa.
Quais	 as	 principais	 distinções	 entre	 o	 art.	 149-A	 e	 o	 antigo	 art.	 231,	 já
revogado,	ambos	do	CP?
Primeiro,	a	ampliação	da	 figura	do	 tráfico	de	pessoas.	Segundo,	 tivemos	uma	novatio
legis	in	pejus,	devido	ao	aumento	de	pena	e	a	inclusão	da	pena	de	multa	no	tipo	básico.
No	 art.	 231	 do	 CP,	 como	 não	 se	 atrelava	 a	 priori	 a	 finalidade	 lucrativa,	 só	 quando
caracterizada	 tal	 finalidade	 no	 caso	 concreto,	 é	 que	 se	 aplicava	 a	multa	 prevista	 no
parágrafo	 3º	 do	 art.	 231.	O	 novo	 art.	 149-A	 traz	 a	 previsão	 de	multa	 já	 em	 seu	 tipo
base.
Art.	149-A.	Agenciar,	aliciar,	recrutar,	transportar,	transferir,	comprar,	alojar	ou	acolher
pessoa,	mediante	grave	ameaça,	violência,	coação,	 fraude	ou	abuso,	com	a	 finalidade
de:	(...)
Pena	−	reclusão,	de	4	(quatro)	a	8	(oito)	anos,	e	multa.	(Grifos	nossos.)
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Outro	dado	importantíssimo,	especialmente	para	a	competência	federal,	é	que	houve	a
reunião	do	tráfico	internacional	e	do	interno	de	pessoas	no	mesmo	tipo	penal.
Anteriormente,	 tínhamos	 os	 arts.	 231	 e	 o	 231-A,	 o	 primeiro	 tratando	 do	 tráfico
internacional	de	pessoas	e	o	 segundo	 sobre	o	 tráfico	 interno.	Hoje,	 ambas	as	 figuras
delituosas	 estão	 dispostas	 no	 art.	 149-A.	 Além	 disso,	 houve	 a	 inserção	 de	 várias
finalidades,	 que	 não	 precisam	 necessariamente	 ser	 atingidas	 para	 que	 o	 crime	 se
consuma.	Veremos	que	se	trata	de	crime	formal,	de	ação	múltipla	ou	conteúdo	variado,
ou	 seja,	 não	 precisa	 ter	 a	 finalidade	 exclusiva	 de	 remoção	 de	 órgãos,	 ou	 trabalho
escravo,	podendo	haver	uma	apenas	ou	várias,	cumulativamente.
Como	 se	 trabalhava	 essa	 ideia	 do	 tráfico	 de	 pessoas,	 especialmente	 para	 a
exploração	sexual,	na	redação	anterior,	do	art.	231	do	CP?
A	redação	anterior	não	mencionava	nada	a	respeito	das	modalidades	de	conduta,	mas
trazia,	por	exemplo,	 causa	de	aumento	da	pena,	em	sendo	configurada	uma	ou	outra
situação	 em	 que	 houvesse	 um	 vício	 no	 consentimento	 ou	 emprego	 de	 condutas	mais
reprováveis	na	promoção	da	entrada	ou	da	saída	da	pessoa	em	território	nacional.Dessa	 forma,	 se	 houvesse	 o	 emprego	 da	 fraude,	 violência	 ou	 até	mesmo	 se	 a	 vítima
fosse	 menor	 de	 18	 anos,	 a	 conduta	 era	 agravada.	 Mas,	 se	 a	 vítima	 fosse	 maior,	 já
estivesse	inserida	na	prostituição	e	fosse	promovida	a	sua	saída	do	território	nacional,	o
entendimento	 jurisprudencial	era	no	sentido	de,	mesmo	nessas	condições,	tratando-se
de	 um	 crime	 contra	 a	 liberdade	 sexual,	 no	 qual,	 pelo	menos	 em	 tese,	 poderia	 haver
juízo	 de	 valor	 pela	 própria	 vítima	 e	 impossibilidade	 de	 decisão	 por	 parte	 dela,	 seu
consentimento	 era	 irrelevante,	 pois	 ela	 estaria	 em	 uma	 situação	 de	 vulnerabilidade
social.	Sendo,	portanto,	seu	consentimento	viciado.
O	tipo	atual	não	menciona	a	necessidade	de	consentimento	ou	dissenso
da	vítima.	
O	 recrutamento	 é	normalmente	 feito	 em	condições	 em	que	o	 agente	 se	prevalece	de
uma	situação	de	fragilidade	da	vítima	e,	portanto,	repise-se,	mesmo	que	a	vítima	já	se
prostituísse,	 ou	 já	 soubesse	 que	 iria	 se	 prostituir	 no	 exterior,	 a	 conduta	 era	 assim
mesmo	considerada	punível	pelo	CP	na	visão	da	jurisprudência.
Atenção!
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Havia	 alguns	 dissensos	 a	 respeito	 da	 invalidade	 do	 consentimento	 em	 casos	 como
esses,	 alguns	 prestigiando	 a	 situação	 de	 vulnerabilidade,	 outros	 argumentando	 a
presença	da	liberdade	sexual,	devendo	a	análise	recair	caso	a	caso.	
Havia	também	debates	no	sentido	de	que,	caso	se	considerasse	o	consentimento	como
descriminante,	ainda	quando	dado	por	pessoa	capaz,	 tal	consentimento	violaria	ainda
assim	o	bem	jurídico	protegido	pelo	tipo,	pois	afastaria	a	própria	punibilidade	daquela
pessoa	que	promovia	essa	saída	ou	entrada	em	território	nacional	da	suposta	vítima.
Repise-se	 que	 a	 nossa	 jurisprudência	 afastava	 esse	 entendimento	 e	 dizia	 que	 o
consentimento	é	irrelevante.	
Ocorre	que	a	redação	atual	não	permite	mais	essa	conclusão.	Essa	talvez	seja	a	tônica
mais	importante	do	art.	149-A,	ou	seja,	a	necessidade	do	dissenso	da	vítima	ou	do	seu
consentimento	viciado	para	caracterizar	o	crime,	porque	só	existe	crime	se	as	condutas
descritas	 no	 referido	 artigo	 forem	 praticadas	 mediante	 grave	 ameaça,	 violência,
coação,	fraude	ou	abuso	(nessas	duas	situações,	embora	não	haja	essa	agressividade	ou
violência,	 há	 a	 aplicação	 de	meios	 enganosos	 ou	 excessivos	 para	 obter	 um	 eventual
consentimento).
Em	 todas	 essas	 hipóteses,	 grave	 ameaça,	 violência,	 coação,	 fraude	 ou	 abuso,	 a
liberdade	de	escolha	e	de	decisão	da	pessoa	não	se	exerce	plenamente.	Assim,	para	que
haja	o	crime,	deve	haver	pelo	menos	o	dissenso	da	vítima	ou	o	seu	consentimento
viciado.
Se	a	pessoa	é	maior	de	 idade,	 tem	capacidade	de	decisão,	não	está	sendo	enganada,
mesmo	 que	 ela	 esteja	 em	 uma	 situação	 de	 vulnerabilidade	 econômica,	 seu
consentimento	é	válido,	desde	que	a	proposta	reflita	o	que	foi	combinado,	não	podendo
haver	 nenhum	 engodo,	 como	 ser	 submetida	 a	 regime	 de	 escravidão,	 retenção	 de
passaporte,	impedimento	de	manter	comunicação	com	a	família	etc.	Nessas	condições
não	há	crime.	Isso	representa	de	fato,	uma	abolitio	criminis	de	 fatos	anteriores	que
não	passou	despercebida	ao	TRF3,	por	exemplo,	que	já	explicitou	entendimento	nesse
sentido.
Vejamos:
4.	 Houve	 revogação	 formal	 do	 tipo	 penal,	 com	 a	 inserção
imediata	de	tipo	inovador	(alteração	fotográfica	normativa),	sem
efetiva	 supressão	 do	 fato	 criminoso,	 ocorrendo,	 portanto,
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continuidade	normativo-típica,	porém	somente	em	parte.	5.	Na
vigência	 da	 Lei	 11.106/2005	 o	 emprego	 de	 violência,	 grave
ameaça,	ou	fraude	consistia	qualificadas	das	condutas	descritas
no	caput	do	artigo	231	do	Código	Penal.	Logo,	na	vigência	dessa
lei,	 o	 entendimento	 jurisprudencial,	 inclusive	 adotado	 na
sentença	 apelada	 e	 por	 este	 Relator,	 era	 amplamente
majoritário	 no	 sentido	 e	 que	 o	 consentimento	 da	 vítima	 era
irrelevante	para	a	 configuração	do	delito	previsto	no	 caput.	 6.
Contudo,	na	nova	redação	do	artigo	149-A	do	CP	dada	pela	Lei
13.344/2016,	 a	 violência,	 agrave	 ameaça	 e	 a	 fraude	 –	 e	 agora
também	 as	 figuras	 de	 coação	 e	 abuso	 estão	 incluídas	 como
circunstâncias	elementares	do	novo	tipo	penal,	de	modo	que,	se
elas	 não	 ocorrem,	 não	 se	 configura	 a	 tipicidade	 da	 conduta.
Equivale	dizer,	especialmente	em	relação	ao	crime	de	tráfico	de
pessoas	 para	 fins	 de	 exploração	 sexual,	 de	 que	 se	 cuida	 nos
autos,	 que	 uma	 vez	 verificada	 a	 existência	 de	 consentimento
válido,	 sem	 qualquer	 vício,	 resta	 afastada	 a	 tipicidade	 da
conduta.	 7.	 Assim,	 quanto	 ao	 crime	 de	 tráfico	 de	 pessoas
disposto	 no	 artigo	 231,	 caput,	 do	 CP	 na	 redação	 da	 Lei
11.106/2005,	 para	 o	 qual	 o	 consentimento	 da	 vítima	 era
irrelevante	penal,	 ocorreu	abolitio	 criminis	 (TRF	3ª	Região,	 1ª
Turma,	 Ap.	 nº	 58.381	 –	 0003569-27.2007.4.03.6181,	 rel.	 Juiz
Convocado	 Márcio	 Mesquita,	 julgado	 em	 19.09.2017,	 e-DJF3
judicial	1,	25.09.2017).
3.1.	Características	da	pena
Temos	no	dispositivo	149-A	que	o	bem	 jurídico	 tutelado	é	a	 liberdade	 individual,	haja
vista	o	crime	estar	inserido	nesse	capítulo.
Qualquer	 pessoa	 pode	 ser	 sujeito	 ativo	 e	 passivo,	 homem	 ou	mulher.	 Durante	muito
tempo,	 esse	 crime	 quando	 era	 concebido	 para	 fins	 de	 exploração	 sexual	 tinha	 como
vítimas	apenas	as	mulheres,	mas	homens	ou	mulheres,	indiscriminadamente	podem	ser
vítimas	desse	crime,	embora	haja	grupos	ou	gêneros	mais	atingidos,	como	os	travestis	e
as	próprias	mulheres.
O	 tipo	 é	 de	 ação	múltipla	 e	 conduta	 variada,	 significa	 dizer	 que,	 se	 várias	 condutas
forem	praticadas	no	mesmo	contexto	de	fato,	o	agente	responderá	por	um	crime	só.
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A	 consumação	 vai	 depender	 do	 núcleo	 verbal,	 e	 não	 da	 efetiva	 transposição	 das
fronteiras	a	alojamento,	desde	que	comprovada	essa	relação	de	destinação	da	pessoa
para	o	exterior.
O	 crime	 é	 doloso	 e	 exige	 dolo	 específico	 (especial	 fim	 de	 agir,	 elemento	 especial	 do
tipo).	Só	há	crime	se	forem	praticadas	aquelas	ações	com	as	intenções	e	circunstâncias
ali	dispostas,	seja	isolada,	sejam	cumulativamente.	É	alguém	que	está	sendo	recrutado
de	forma	fraudulenta	ou	mediante	grave	ameaça	ou	é	sequestrado	para	ser	levado	para
o	exterior	para	que	lhe	seja	retirado	um	rim,	por	exemplo.	Ou	em	outra	situação,	uma
mulher	que	é	seduzida	por	uma	proposta	para	ia	à	Espanha	com	a	promessa	de	que	irá
dançar	em	uma	boate,	mas,	lá	chegando,	tem	seu	passaporte	confiscado	e	é	obrigada	a
fazer	programas	sexuais,	 sendo	vedada	a	comunicação	com	a	sua	 família,	não	recebe
nada,	ficando	em	regime	de	trabalho	escravo	e	de	exploração	sexual.
Os	 crimes	 violentos,	 geralmente	 praticados	 no	 bojo	 do	 tráfico,	 estarão	 em	 concurso
com	o	 art.	 149-A.	Apenas	 a	 violência	 empregada	para	 recrutar	 e	 transportar	 e	 ainda
assim,	 no	 caso	 de	 lesões	 leves,	 ficarão	 absorvidas	 pelo	 crime	 de	 tráfico	 de	 pessoas.
Lesões	graves	e	gravíssimas,	são	punidas	de	forma	autônoma,	em	concurso.
As	penas	para	esses	crimes	são	aumentadas	de	1/3,	até	a	metade,	em	se	tratando	de
tráfico	transnacional	ou	internacional,	conforme	previsto	no	inciso	IV	,	§	1º	do	art.	149-
A	do	CP:	“a	vítima	do	tráfico	de	pessoas	for	retirada	do	território	nacional”.			
3.2.	Tráfico	transnacional
Quando	se	terá	tráfico	transnacional?
O	art.	149-A,	§	1º,	IV,	CP,	prevê	que	ocorrerá	tráfico	transnacional	quando	a	vítima	do
tráfico	 for	 retirada	do	 território	 nacional.	 Assim,	 teremos	 tanto	 tráfico	 de	 pessoas	 se
alguém	 for	 arregimentado	 em	 território	 nacional	 para	 ser	 levado	 para,	 por	 exemplo,
Fortaleza/CE,	ou	ainda,	para	ser	objeto	de	exploração	sexual	dentro	do	mesmo	estado
em	que	a	pessoa	se	encontra,	sem	a	necessidade	de	transposição	de	fronteiras	nessas
circunstâncias,	ou	se	houver	a	retirada	da	pessoa	do	território	nacional.	Sendo	assim,
teremos	a	incidência	da	causa	de	aumento	do	inciso	IV.	
O	 que	 chama	 a	 atenção	 imediatamente	 éum	 equívoco	 gravíssimo	 do
Atenção!
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legislador,	 pois	 só	 existe	 tráfico	 internacional,	 como	causa	de	aumento,
em	um	sentido,	se	a	pessoa	sai	do	Brasil	para	o	exterior.	
Por	outro	lado,	se	a	pessoa	é	arregimentada	no	sentido	contrário,	para	ser	explorada	no
Brasil,	 não	 incide	 a	 causa	 de	 aumento	 da	 transnacionalidade,	 pois	 em	 nenhum
momento	o	artigo	fala	da	hipótese	de	haver	a	entrada	da	pessoa	em	território	nacional
como	 o	 art.	 231	 do	 CP	 dizia	 anteriormente.	 Nessas	 circunstâncias	 a	 conduta	 não	 é
atípica,	somente	não	incide	a	causa	de	aumento	o	inciso	IV.
Duas	questões	de	extrema	importância	em	relação	ao	crime	de	tráfico	de	pessoas:
1)	Só	há	crime	de	tráfico	se	houver	dissenso	da	vítima	ou	se	o	seu	consentimento	for
viciado.	
2)	A	atual	conformação	do	tráfico	internacional	de	pessoas	implica	a	competência	da
Justiça	Federal.
O	crime	de	tráfico,	como	concebido	hoje,	e	como	era	anteriormente,	em	regra,	será	de
competência	 da	 Justiça	 Estadual;	mas,	 havendo	 a	 transnacionalidade,	 a	 competência
passa	a	ser	da	Justiça	Federal,	tendo	em	vista	os	tratados	e	convenções	internacionais
incidentes	nesses	casos.
Ainda	 que	 a	 transnacionalidade	 se	 dê	 como	 imigração,	 vale	 dizer,	 a
vítima	é	trazida	de	outro	país	ao	Brasil,	a	competência	será	federal.	Mas,
nesse	caso,	sem	a	incidência	da	causa	de	aumento,	incidente	apenas	no
caso	 de	 emigração,	 ou	 seja,	 caso	 a	 vítima	 seja	 retirada	 do	 Brasil	 para
outro	país.	
3.3.	Causas	de	aumento	da	pena
Quais	são	as	outras	causas	de	aumento	hoje	previstas	no	CP?
Atenção!
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§	1º	A	pena	é	aumentada	de	um	terço	até	a	metade	se:
I	 −	 o	 crime	 for	 cometido	 por	 funcionário	 público	 no	 exercício	 de	 suas	 funções	 ou	 a
pretexto	de	exercê-las;	(...)
A	 pena	 é	 aumentada	 de	 um	 terço	 até	 a	 metade	 se	 o	 crime	 for	 cometido	 por
funcionário	público	no	exercício	de	suas	funções	ou	a	pretexto	de	exercê-las,	ou
seja,	um	crime	em	que	há	uma	facilitação	ou	participação	do	funcionário	público	para
aquela	atividade.	
Imagine	 que	 seja	 um	 funcionário	 público	 que	 trabalhe	 em	 uma	 fronteira	 e	 faz	 a
intermediação	de	mulheres	com	o	fim	de	serem	exploradas	em	território	paraguaio,	por
exemplo.	 Mulheres	 brasileiras	 são	 coagidas	 por	 uma	 determina	 pessoa	 que	 recebe
certa	quantia	por	fazer	isso.
II	 −	 o	 crime	 for	 cometido	 contra	 criança,	 adolescente	 ou	 pessoa	 idosa	 ou	 com
deficiência;
Outra	hipótese	é	quando	o	crime	for	cometido	contra	criança,	adolescente,	pessoa
idosa	 ou	 com	 deficiência.	 Essas	 são	 pessoas	 que	 o	 legislador	 considera	 como
vulneráveis,	frágeis,	merecedoras	de	especial	proteção.
III	−	o	agente	se	prevalecer	de	relações	de	parentesco,	domésticas,	de	coabitação,	de
hospitalidade,	 de	 dependência	 econômica,	 de	 autoridade	 ou	 de	 superioridade
hierárquica	inerente	ao	exercício	de	emprego,	cargo	ou	função.
Ainda,	nas	hipóteses	em	que	se	espera	do	agente	uma	ação	de	maior	zelo	com	a	vítima,
casos	 de	 parentescos	 com	 a	 vítima,	 pai,	 mãe	 que	 cede	 ou	 explora	 o	 próprio	 filho
sexualmente,	 mediante	 violência	 ou	 ameaça,	 fazendo	 parte	 de	 um	 esquema	 de
exploração	em	que	a	vítima	é	uma	pessoa	que	está	em	sua	relação	de	parentesco.	Isso
vale	também	para	aquele	que	se	prevalece	das	relações	domésticas,	de	coabitação,	de
hospitalidade,	 de	 dependência	 econômica,	 de	 autoridade	 ou	 de	 superioridade
hierárquica	inerente	ao	exercício	de	emprego,	cargo	ou	função.
De	forma	semelhante	ao	que	ocorre	no	tráfico	de	drogas,	estabeleceu	a	lei	uma	causa
de	 redução	 de	 pena	 (art.	 149-A,	 §	 2º,	 do	 CP),	 que	 se	 chama	 de	 tráfico	 de	 pessoas
privilegiado.	 A	 pena	 é	 reduzida	 de	 um	 a	 dois	 terços	 se	 o	 agente	 for	 primário	 e	 não
integrar	 organização	 criminosa.	 Essa	 redação	 é	 suficiente	 para	 mostrar	 que	 nas
hipóteses	eventuais	em	que	a	pessoa	não	esteja	associada	para	a	exploração	do	tráfico,
11Curso	Ênfase	©	2021
ela	pode	ter	esse	benefício.
IV	−	a	vítima	do	tráfico	de	pessoas	for	retirada	do	território	nacional.
Por	 fim,	 no	 caso	 do	 tráfico	 internacional,	 lembrando	 que	 somente	 no	 sentido	 Brasil-
exterior	a	pena	poderá	ser	aumentada	em	um	terço	até	a	metade.	
3.4.	Livramento	condicional
Embora	a	Lei	nº	13.344/2016	não	equipare	o	crime	de	tráfico	de	pessoas
a	crime	hediondo,	 inseriu	no	art.	83	do	CP	uma	regra	mais	rigorosa	de
exigência	para	fins	de	livramento	condicional.	
Requisitos	do	livramento	condicional
Art.	83.	O	juiz	poderá	conceder	livramento	condicional	ao	condenado	a	pena	privativa
de	liberdade	igual	ou	superior	a	2	(dois)	anos,	desde	que:	(...)
V	−	 cumpridos	mais	 de	 dois	 terços	 da	 pena,	 nos	 casos	 de	 condenação	 por	 crime
hediondo,	prática	de	tortura,	tráfico	ilícito	de	entorpecentes	e	drogas	afins,	tráfico	de
pessoas	 e	 terrorismo,	 se	 o	 apenado	 não	 for	 reincidente	 específico	 em	 crimes	 dessa
natureza.	(Incluído	pela	Lei	nº	13.344,	de	2016.)	(Grifos	nossos.)
O	livramento	condicional	é	aquele	benefício	de	obtenção	de	 liberdade	prévia,	a	partir
do	bom	cumprimento	da	pena,	sendo	mais	restritivo,	com	critérios	mais	rígidos,	em	se
tratando	 de	 determinadas	 categorias	 de	 crimes,	 como	 ocorre	 com	 os	 hediondos	 e
equiparados.
Neste	 particular	 apenas,	 em	 que	 pese	 o	 crime	 de	 tráfico	 de	 pessoas	 não	 tenha	 sido
equiparado	aos	hediondos,	porquanto	a	 lei	não	o	 inseriu	no	rol	da	Lei	nº	8.072/1990,
estabeleceu	a	regra	mais	gravosa	do	livramento	condicional.
Assim,	 ainda	que	 os	 requisitos	 para	 o	 livramento	 condicional,	 no	 crime	de	 tráfico	 de
pessoas,	sejam	mais	rígidos,	ele	não	foi	equiparado	a	hediondo.
Atenção!
12Curso	Ênfase	©	2021
Outras	regras	processuais	importantes:
−	Aplica-se	subsidiariamente	a	Lei	nº	12.850/2013	(art.	9º	da	Lei	nº	13.344/2016).
Art.	9º	Aplica-se	subsidiariamente,	no	que	couber,	o	disposto	na	Lei	nº	12.850,	de	2	de
agosto	de	2013.
−	A	competência	pode	ser	da	Justiça	Estadual	ou	Federal.
−	 Os	 processos	 devem	 tramitar	 em	 segredo	 de	 justiça	 (art.	 6º,	 IV,	 da	 Lei	 nº
13.344/2016).
Art.	6º	 A	 proteção	 e	 o	 atendimento	 à	 vítima	 direta	 ou	 indireta	 do	 tráfico	 de	 pessoas
compreendem:	(...)
IV	−	preservação	da	intimidade	e	da	identidade;	(...)
Obra	coletiva	do	Curso	Ênfase	produzida	a	partir	da	análise	estatística	de	incidência
dos	temas	em	provas	de	concursos	públicos.	
A	autoria	dos	e-books	não	se	atribui	aos	professores	de	videoaulas	e	podcasts.	
Todos	os	direitos	reservados.

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