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1Curso Ênfase © 2021 TEMAS ESPECIAIS PARA JUIZ FEDERAL DIREITO AMBIENTAL Distinções jurisprudenciais na incidência das responsabilidades civil, administrativa e penal ambiental e repercussões na Justiça Federal 1. Introdução O Poder Judiciário exerce papel essencial na tutela do meio ambiente equilibrado, na medida em que a ele cabe a última palavra nos mais variados casos envolvendo responsabilidade civil por danos ambientais, sanções administrativas, persecução criminal, gestão de áreas especialmente protegidas, questões envolvendo licenciamentos ambientais para atividades potencialmente causadoras de significativos desequilíbrios ambientais etc. Casos célebres têm um desfecho junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), a exemplo da proibição de produção de amianto no Brasil, a mitigação do princípio da precaução e os campos eletromagnéticos, evolução jurisprudencial afastando a necessidade de dupla imputação em crimes ambientais, dentre outros. Além disso, hodiernamente os juízes de primeiro grau e tribunais, tanto os estaduais quanto os federais, se deparam com ações civis públicas, cujo objeto envolve, como pano de fundo, a tutela do meio ambiente equilibrado. 2. Atuação do Poder Judiciário na tutela do meio ambiente – linhas gerais 2Curso Ênfase © 2021 O processo – enquanto instrumento, meio para se buscar uma finalidade específica – é uma importante ferramenta na tutela do meio ambiente. Nesse passo, o Poder Judiciário atua em diversas frentes, tutelando o aspecto civil do dano ambiental, o aspecto criminal de condutas a ele lesivas, além das ações cíveis tendentes à reparação dos danos. Além disso, há a intervenção judicial em políticas públicas, zoneamento urbano, a exemplo da ADPF (Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental) nº 45, na qual o STF explicitou que razões de puro pragmatismo governamental não podem levar à nulificação de direitos fundamentais. Em linhas gerais, o STF entendeu que o Poder Judiciário não pode governar, não pode substituir o administrador. Mas, de outra banda, cabe a ele impedir o desgoverno, fazer com que as normas constitucionais tenham uma efetividade, especialmente porque o art. 225 da Constituição Federal de 1988 (CF/1988) veicula direitos fundamentais de terceira geração. Em sede de medida cautelar, o Ministro Celso de Mello explicitou o espectro de atuação do Poder Judiciário em relação às políticas públicas. Veja a ementa: ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. A QUESTÃO DA LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO CONTROLE E DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM TEMA DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS, QUANDO CONFIGURADA HIPÓTESE DE ABUSIVIDADE GOVERNAMENTAL. DIMENSÃO POLÍTICA DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL ATRIBUÍDA AO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. INOPONIBILIDADE DO ARBÍTRIO ESTATAL À EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS, ECONÔMICOS E CULTURAIS. CARÁTER RELATIVO DA LIBERDADE DE CONFORMAÇÃO DO LEGISLADOR. CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA CLÁUSULA DA “RESERVA DO POSSÍVEL”. NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO, EM FAVOR DOS INDIVÍDUOS, DA INTEGRIDADE E DA INTANGIBILIDADE DO NÚCLEO CONSUBSTANCIADOR DO “MÍNIMO EXISTENCIAL”. VIABILIDADE INSTRUMENTAL DA ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO NO PROCESSO DE CONCRETIZAÇÃO DAS LIBERDADES POSITIVAS (DIREITOS CONSTITUCIONAIS DE SEGUNDA GERAÇÃO) (ADPF nº 45 MC/DF, rel. Min. CELSO DE MELLO). Esse raciocínio de que o Poder Judiciário não pode substituir o administrador público, mas, lado outro, tem o dever de imprimir efetividade aos direitos fundamentais, dentre eles a higidez do meio ambiente, aplicar-se-á à inúmeras ações civis públicas 3Curso Ênfase © 2021 ambientais, devendo o julgador cuidar para que não tenha uma atitude demasiado defensiva, autocontida, nem demasiado intervencionista, buscando o equilíbrio. 3. Competência da Justiça Federal Embora a Justiça Federal seja considerada um ramo comum do Poder Judiciário, ao lado das Justiças Estaduais, isso em contraponto às chamadas Justiças Especializadas (Militar, do Trabalho, Eleitoral, e há quem refira à Justiça Desportiva), sua competência está inserida de forma ampla na própria Constituição Federal de 1988, especialmente, no art. 109. Em relação à responsabilidade ambiental, seja ela cível, administrativa ou penal, em regra, será de competência da Justiça dos Estados. As competências cível e administrativa federais firmar-se-ão, excepcionalmente, quando atingidos bens, serviços ou representar interesse da União, ou de suas entidades autárquicas, a exemplo do IBAMA. São bens da União, nos termos como delineados no art. 20 da CF/1988: Art. 20. São bens da União: I – os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos; II – as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação ambiental, definidas em lei; III – os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais; IV – as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 46, 4Curso Ênfase © 2021 de 2005.) V – os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva; VI – o mar territorial; VII – os terrenos de marinha e seus acrescidos; VIII – os potenciais de energia hidráulica; IX – os recursos minerais, inclusive os do subsolo; X – as cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré-históricos; XI – as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. Por força do inciso IV do referido art. 109, danos ambientais, envolvendo áreas consideradas como bens da União, tramitarão perante o juízo federal competente, manejadas pelo Ministério Público Federal, em sua maioria, a exemplo de uma ação civil pública tendente à reparação, à indenização e ao pagamento de danos morais coletivos por construção irregular em área de preservação permanente localizada às margens de rio que represente limite divisório entre estados, como é o caso do Rio Paranapanema (limite entre os estados do Paraná e São Paulo). Além do inciso IV, poderá ser embasada a ação de responsabilidade ambiental no inciso I, por representar interesse da União, como nos casos de multas impostas por autarquias federais, a exemplo do IBAMA, ou mesmo o interesse na preservação ambiental de áreas pertencentes à União. Para além disso, não raras vezes, disputas de direitos indígenas envolvem danos ambientais, atraindo a competência federal, por força do inciso XI do art. 109. Art. 109 Aos juízes federais compete processar e julgar: I – as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho; 5Curso Ênfase © 2021 II – as causas entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e Município ou pessoa domiciliada ou residente no País; III – as causas fundadas em tratado ou contrato da União com Estado estrangeiro ou organismo internacional; IV – os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídasas contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral; V – os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente; V-A – as causas relativas a direitos humanos a que se refere o § 5º deste artigo; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004.); VI – os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira; VII – os habeas corpus, em matéria criminal de sua competência ou quando o constrangimento provier de autoridade cujos atos não estejam diretamente sujeitos a outra jurisdição; VIII – os mandados de segurança e os habeas data contra ato de autoridade federal, excetuados os casos de competência dos tribunais federais; IX – os crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar; X – os crimes de ingresso ou permanência irregular de estrangeiro, a execução de carta rogatória, após o “exequatur”, e de sentença estrangeira, após a homologação, as causas referentes à nacionalidade, inclusive a respectiva opção, e à naturalização; XI – a disputa sobre direitos indígenas. (Grifos nossos.) No que toca à competência criminal, restou estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal a competência da Justiça Federal para o processamento e julgamento dos 6Curso Ênfase © 2021 crimes contra o meio ambiente, após a Lei nº 9.605/1998, somente em havendo lesão a bens, serviços ou interesses da União, a exemplo de condutas realizadas no interior de unidades de conservação criadas e administradas pela União. Foi o quanto decidido no Recurso Extraordinário nº 354.863, decisão do Ministro Sepúlveda Pertence, publicada em 26.05.2003: DESPACHO: Insurge-se o RE do Ministério Público Federal contra acórdão do TRF/1ª Região, que concluiu pela incompetência da Justiça Federal para o julgamento do feito envolvendo crime ambiental (L. 9.605/88, art. 39), assim ementado: PROCESSUAL PENAL. CRIME AMBIENTAL (LEI Nº 9.605/98). MADEIRA. CORTE, AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO. UNIÃO FEDERAL. BENS, SERVIÇOS E INTERESSES. LESÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. JUSTIÇA ESTADUAL. COMPETÊNCIA. 1. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas e bem assim preservar as florestas, a fauna e a flora (art. 23, IV e VII, CF/88). 2. A competência para o processo e julgamento dos crimes contra o meio ambiente, após a edição da Lei nº 9.605/98, somente será da Justiça Federal se houver lesão a bens, serviços ou interesses da União, ou seja, por exemplo, praticados no interior de Unidades de Conservação criadas e administradas pelo Poder Público Federal (Reservas Biológicas, Reservas Ecológicas, Estações Ecológicas, Parques Nacionais, Florestas Nacionais, Áreas de Proteção Ambiental, Áreas de Relevante Interesse Ecológico e Reservas Extrativistas). 3. É competente a Justiça Estadual para processar e julgar os crimes praticados contra a flora, quando não demonstrada a lesão a bens, serviços ou interesses da União. 4. Precedentes do STJ. Inaplicabilidade da Súmula 91/STJ. 5. Recurso improvido. “Segundo o voto condutor” é certo que a Lei nº 9.605/98 nada dispôs acerca da competência para processar e julgar os crimes praticados contra o meio ambiente e, bem assim, também é certo que o artigo 23 da Constituição Federal estabelece que é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: “proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas” (inciso VI), e, ainda, “preservar as florestas, a fauna e a flora” (inciso VII) e, “como a competência da Justiça Federal está expressamente prevista no art. 109 da Constituição Federal, tanto a doutrina, como a jurisprudência firmada no âmbito do colendo Superior Tribunal de Justiça sufragam o entendimento segundo o qual, inexistindo qualquer lesão a bens, serviços ou interesses da União, em regra, competente é a justiça Estadual para o processo e julgamento dos delitos contra o meio ambiente, aí compreendidos os crimes contra a fauna e a flora.” No RE, alega o recorrente, em suma, que a decisão recorrida nega vigência aos artigos 23, VI e VII e 109, da Constituição Federal, “porque o corte de árvores em área considerada de 7Curso Ênfase © 2021 preservação ambiental permanente que resultou na atuação de fiscalização por parte do IBAMA – autarquia federal responsável por intervir na exploração florestal, onde se insere a exploração de madeira realizada no caso (art. 19 do Código Florestal com redação da Lei 7.803/89) – é matéria de interesse da União e constitui, necessariamente, infração praticada em detrimento de serviços de entidade autárquica federal.” Quanto ao art. 109, IV, argumenta que o mesmo “não dispõe atrair a competência da justiça federal apenas a lesão exclusiva a bens, serviços ou interesses da União ou de suas entidades autárquicas. O que é fundamental é que a lesão ocorra, ainda que, concorrentemente, outros entes ou entidades venham a ser eventualmente afetados em seus bens, serviços e interesses.” Aduz, ainda, que “o dispositivo não restringe a competência da justiça federal à lesão que alcance, necessariamente, os três aspectos: bem, serviço, interesse. A disjuntiva ou sinaliza no sentido de que a lesão a qualquer desses aspectos atrai a competência da justiça federal”. Salienta, por fim, que “a hipótese dos autos revela, concretamente, tratar-se de bem cuja tutela também compete à União, sendo inquestionável o seu interesse em resguardá-lo de ações que o comprometam, tanto que disponibilizado serviço para tal fim por meio do IBAMA, entidade autárquica federal, a qual cabia a expedição da ATPF – Autorização de Transporte de Produto Florestal (art. 1º, § 1º, da Portaria IBAMA 44/93), sendo que a ausência da mesma ensejou, por parte desta autarquia, a lavratura do auto de infração (fls. 36), a apreensão da madeira (fls. 37) e a investigação subsequente (fls. 38/43).” Não tem razão o recorrente. Ao afastar a competência da Justiça Federal, no caso, o acórdão recorrido decidiu em consonância com a orientação que vem se firmando em ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal, adotada entre outros, nos REs 166.943, 1ª T, 03.03.1995, Moreira, DJ 04.08.1995; RE 300.244, 1ª T, 20.11.2001, Moreira, DJ 19.12.2001, aos quais se reportou a decisão recentemente proferida no HC nº 81.916, 2ª T, 17.09.2002, Gilmar Mendes, DJ 11.10.2002, sintetizada na seguinte ementa: “EMENTA: (1) Habeas Corpus. Crime previsto no art. 46, parágrafo único, da Lei nº 9.605, de 1998 (Lei de Crimes Ambientais). Competência da Justiça Comum (2) Denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal perante a Justiça Federal com base em auto de infração expedido pelo IBAMA. (3) A atividade de fiscalização ambiental exercida pelo IBAMA, ainda que relativa ao cumprimento do art. 46 da Lei de Crimes Ambientais, configura interesse genérico, mediato ou indireto da União, para os fins do art. 109, IV, da Constituição. (4) A presença de interesse direto e específico da União, de suas entidades autárquicas e empresas públicas – o que não se verifica, no caso –, constitui pressuposto para que ocorra a competência da Justiça Federal prevista no art. 109, IV, da Constituição. (5) Habeas Corpus conhecido e provido.” Na linha dos precedentes e com fundamento no art. 557, do C. Pr. Civil, nego seguimento ao recurso extraordinário. Brasília,14 de maio de 2003. Ministro Sepúlveda Pertence – Relator (RE nº 354.863, rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgado em 14.05.2003, publicado em DJ 26.05.2003, PP-00106). 8Curso Ênfase © 2021 Analisando as hipóteses elencadas no art. 109, podemos estabelecer os casos que poderão desafiar a competência criminal da Justiça Federal: 1) crime ambiental que atente contra bens, interesses ou serviços da União ou de suas entidades autárquicas (autarquias, fundações públicas e empresas públicas), forte no inciso I; 2) crime ambiental transnacional previsto em tratado ou convenção internacionais de que o Brasil faça parte, forte no inciso V; 3) crime ambiental que viole direitos humanos, forte no inciso V-A; 4) crime ambiental cometido a bordo de navios ou aeronaves, forte no inciso IX; 5) crime ambiental contra a organização do trabalho, forte no inciso VI, porquanto o meio ambiente do trabalho faz parte do meio ambiente como um todo considerado; 6) crime ambiental conexo ou que tenha continência em relação a outro crime de competência federal, forte no Enunciado Sumular nº 122 do STJ – “Compete à Justiça Federal o processo e julgamento unificado dos crimes conexos de competência federal e estadual, não se aplicando a regra do art. 78, II, a, do Código de Processo Penal”. A Justiça Federal não julgará contravenções penais, nos termos do art. 109, IV, parte final – “os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral; (...)”–. Mas, de todo modo, em sendo uma contravenção praticada por um juiz federal, competirá o seu processo e julgamento pelo respectivo Tribunal Regional Federal, por força do foro por prerrogativa de função previsto no art. 108, I, “a”, da CF/1988. Alguns casos especiais merecem expressa menção, vejamos: Atenção! 9Curso Ênfase © 2021 3.1. Crimes contra a fauna Os crimes contra a fauna nem sempre serão de competência federal, restando cancelada a Súmula nº 91 do STJ que estabelecia a competência federal como regra em relação a tais crimes. Mas se atente à recente decisão do STF no RE nº 835.558/SP, rel. Min. Luiz Fux, julgado em repercussão geral no ano de 2017. Restou estabelecida a seguinte tese: “Compete à Justiça Federal processar e julgar o crime ambiental de caráter transnacional que envolva animais silvestres, ameaçados de extinção e espécimes exóticas ou protegidas por compromissos internacionais assumidos pelo Brasil”. 3.2. Crime em rio interestadual Será de competência federal somente se causar reflexos de monta regional ou nacional, segundo decidido pelo STJ no Conflito de Competência nº 145.420/RJ, julgado pela 3ª Seção, Ministro Relator Celso Limongi, julgamento em 2010. CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL X JUSTIÇA ESTADUAL. INQUÉRITO POLICIAL E AÇÃO PENAL EM TRÂMITE, CONCOMITANTEMENTE. DERRAMAMENTO DE 30 MIL LITROS DE ÓLEO NO RIO NEGRO – ART. 54 DA LEI 9.605/1998. PREJUÍZO CAPAZ DE AFETAR GRANDE EXTENSÃO DE RIO INTERESTADUAL, BEM DA UNIÃO (ART. 20, III, CF/88). COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. 1. A preservação do meio ambiente é matéria de competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, nos termos do art. 23, incisos VI e VII, da Constituição Federal. 2. A competência do foro criminal federal não advém apenas do interesse genérico que tenha a União na preservação do meio ambiente. É necessário que a ofensa atinja interesse direto e específico da União, de suas entidades autárquicas ou de empresas públicas federais. 3. Evidencia-se a competência da Justiça Federal para processar e julgar ação penal envolvendo crime ambiental praticado em rio interestadual (bem da União, nos termos do art. 20, III, CF), tanto mais quando a conduta investigada (derramamento de 30 mil litros de óleo no leito do rio) tem potencial para afetar a saúde de grande parte do trecho do rio. Precedentes. 4. Conflito conhecido, para declarar a competência do Juízo Federal da 7ª Vara Ambiental e Agrária da Seção Judiciária do Estado do Amazonas, o suscitante (STJ, CC nº 145.420/AM, 2016/0043197-3, S3 – 3ª Seção, rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, data de julgamento 10.08.2016, data de publicação DJe 16.08.2016). 3.3. Crime em mar territorial ou terreno da marinha 10Curso Ênfase © 2021 De acordo com o decidido no Recurso em Habeas Corpus nº 50.692/SC, julgado em 2016, relator Ministro Ribeiro Dantas, considerando a propriedade da União em relação ao mar territorial e aos terrenos da marinha, será de competência da Justiça Federal. CONSTITUCIONAL E PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CRIME AMBIENTAL. TRANCAMENTO. TERRENO DE MARINHA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. RECURSO DESPROVIDO. 1. Nos termos do entendimento consolidado desta Corte, o trancamento da ação penal por meio do habeas corpus é medida excepcional, que somente deve ser adotada quando houver inequívoca comprovação da atipicidade da conduta, da incidência de causa de extinção da punibilidade ou da ausência de indícios de autoria ou de prova sobre a materialidade do delito, o que não se infere na hipótese dos autos. 2. Nos termos da jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, a União tem interesse direto e específico na causa que envolva crime ambiental praticado em terreno de marinha, atraindo a competência da Justiça Federal. Precedentes. 3. Narra a exordial acusatória que o recorrente teria construído uma residência de alvenaria e diversas outras estruturas em terreno de marinha. Ainda, mesmo que não haja demarcação oficial, havendo elementos probatórios indicativos da prática de crime ambiental em bem da União (art. 20, VI, da Constituição Federal), não se pode afastar, ab initio, a competência da Justiça Federal para julgamento do processo-crime (art. 109, IV, da Constituição Federal). 4. Recurso desprovido (STJ, RHC nº 50.692/SC, 2014/0206761-9, T5 – 5ª Turma, rel. Min. Ribeiro Dantas, data de julgamento 05.04.2016, data de publicação DJe 15.04.2016). 3.4. Extração de recursos minerais de forma ilegal A lei dos crimes ambientais, Lei nº 9.605/1998, tipifica, em seu art. 55, a extração irregular ou o excesso em relação à autorização de recursos minerais, vejamos: Art. 55. Executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem a competente autorização, permissão, concessão ou licença, ou em desacordo com a obtida: Pena – detenção, de seis meses a um ano, e multa. Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem deixa de recuperar a área pesquisada ou explorada, nos termos da autorização, permissão, licença, concessão ou determinação do órgão competente. De acordo com o STJ, ainda que os recursos tenham sido extraídos de uma propriedade não pertencente à União, a exemplo de uma propriedade particular, ainda assim, a 11Curso Ênfase © 2021 competência será da Justiça Federal, dada a propriedade da União sobre os recursos minerais, conforme art. 20, IX, da CF/1988: “os recursos minerais, inclusive os do subsolo; (...)”. PENAL E PROCESSO PENAL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. EXTRAÇÃO DE CASCALHO SEM AUTORIZAÇÃO. ART. 55 DA LEI 9.605/98. PROPRIEDADE PRIVADA. IRRELEVÂNCIA. RECURSO MINERAL. BEM DA UNIÃO. ART. 20, IX, DA CF. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. ART. 109, IV, DA CF. 1. Cuidando-se de delito contra bem da União, explicitamente trazido no artigo 20 da Constituição Federal, mostra-se irrelevante o local de sua prática, pois onde o legislador constituinte não excepcionou, não cabe ao intérprete fazê-lo. 2. Conflito conhecido para julgar competenteo JUÍZO FEDERAL DE RONDONÓPOLIS – SJ/MT, suscitante (STJ, CC nº 116.447/MT, 2011/0062400-4, S3 – 3ª Seção, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, data de julgamento 25.05.2011, data de publicação DJe 02.06.2011). 3.5. Assentamento do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) O simples fato de crime ambiental ser praticado em assentamento sob responsabilidade do INCRA (autarquia federal) não atrai, por si só, a competência federal. PROCESSUAL PENAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CRIME AMBIENTAL. DEFENSIVOS AGRÍCOLAS. OCORRIDO EM ASSENTAMENTO. ÁREA DE RESPONSABILIDADE DO INCRA. AUSÊNCIA DE INTERESSE DIRETO. VÍTIMAS PARTICULARES. COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO. 1. A competência da Justiça Federal para julgamento de infrações penais, nos termos do art. 109, IV, da Constituição Federal, está configurada quando a conduta criminosa afeta bens, serviços ou interesses da União, de suas entidades autárquicas ou empresas públicas. 2. Na hipótese dos autos, embora a pulverização do agrotóxico tenha ocorrido em escola localizada em área de assentamento de responsabilidade do INCRA, autarquia federal, não há diretamente qualquer interesse, direito ou bem da União, de suas autarquias ou empresas públicas envolvidos, sendo, se existente, meramente reflexo o interesse do INCRA. 2. Declarada a competência do juízo suscitado (STJ, CC nº 139.810/GO, 2015/0091160-1, S3 – 3ª Seção, rel. Min. Nefi Cordeiro, data de julgamento 26.08.2015, data de publicação DJe 08.09.2015). 4. Princípios basilares da atuação do Poder Judiciário 12Curso Ênfase © 2021 Inicialmente, para que entendamos a atuação do Poder Judiciário na tutela do meio ambiente, é necessário rememorarmos os principais princípios que norteiam essa atuação. 4.1. Prevenção Em se tratando de atividades cujos impactos ambientais sejam cientificamente conhecidos, inclusive em relação à maneira de evitá-los ou ao menos minimizá-los, a atividade somente será permitida, se adotadas essas contramedidas protetivas do meio ambiente. Assim, uma indústria emissora de gases prejudiciais à atmosfera deverá, obrigatoriamente, instalar filtros em suas chaminés, deverá gerir seus resíduos sólidos de maneira adequada, segundo a legislação etc. Este princípio não implica a necessidade de eliminação total de danos ambientais, mas, sim, uma avaliação dos riscos e benefícios como um todo. Veja-se o famoso julgado pelo STF a respeito da constitucionalidade de lei municipal que proibia a queima da cana de açúcar no município de Paulínia, Estado de São Paulo. Apesar de o Supremo dizer que os danos causados pelas queimadas nos campos de cana de açúcar são cientificamente conhecidos, sendo a atividade comprovadamente prejudicial ao meio ambiente, em ponderação de valores, levando-se em consideração a preservação dos empregos dos trabalhadores que atuam no setor canavieiro, entendeu pela inconstitucionalidade da referida lei, porquanto esses trabalhadores merecem proteção diante do chamado progresso tecnológico e da respectiva mecanização, ambos trazidos pela pretensão de proibição imediata da colheita da cana mediante uso de fogo. Esclareceu, por fim, a necessidade de normas federais traçarem um planejamento com a intenção de extinguir gradativamente o uso de fogo como método despalhador e facilitador do corte da cana. Portanto, esse julgado demonstra que o princípio da precaução não se reveste de caráter absoluto, em que pese seja ele um importante referencial que deverá ser Atenção! 13Curso Ênfase © 2021 observado pelo Poder Judiciário em sua atuação. RECURSO EXTRAORDINÁRIO EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE ESTADUAL. LIMITES DA COMPETÊNCIA MUNICIPAL. LEI MUNICIPAL QUE PROÍBE A QUEIMA DE PALHA DE CANA-DE-AÇÚCAR E O USO DO FOGO EM ATIVIDADES AGRÍCOLAS. LEI MUNICIPAL Nº 1.952, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1995, DO MUNICÍPIO DE PAULÍNIA. RECONHECIDA REPERCUSSÃO GERAL. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 23, CAPUT E PARÁGRAFO ÚNICO, Nº 14, 192, § 1º E 193, XX E XXI, DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO E ARTIGOS 23, VI E VII, 24, VI E 30, I E II DA CRFB. 1. O Município é competente para legislar sobre meio ambiente com União e Estado, no limite de seu interesse local e desde que tal regramento seja e harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (art. 24, VI c/c 30, I e II da CRFB). 2. O Judiciário está inserido na sociedade e, por este motivo, deve estar atento também aos seus anseios, no sentido de ter em mente o objetivo de saciar as necessidades, visto que também é um serviço público. 3. In casu, porquanto inegável conteúdo multidisciplinar da matéria de fundo, envolvendo questões sociais, econômicas e políticas, não é permitido a esta Corte se furtar de sua análise para o estabelecimento do alcance de sua decisão. São elas: (i) a relevante diminuição – progressiva e planejada – da utilização da queima de cana-de-açúcar; (ii) a impossibilidade do manejo de máquinas diante da existência de áreas cultiváveis acidentadas; (iii) cultivo de cana em minifúndios; (iv) trabalhadores com baixa escolaridade; (v) e a poluição existente independentemente da opção escolhida. 4. Em que pese a inevitável mecanização total no cultivo da cana, é preciso reduzir ao máximo o seu aspecto negativo. Assim, diante dos valores sopesados, editou-se uma lei estadual que cuida da forma que entende ser devida a execução da necessidade de sua respectiva população. Tal diploma reflete, sem dúvida alguma, uma forma de compatibilização desejável pela sociedade, que, acrescida ao poder concedido diretamente pela Constituição, consolida de sobremaneira seu posicionamento no mundo jurídico estadual como um standard a ser observado e respeitado pelas demais unidades da federação adstritas ao Estado de São Paulo. (...). 8. Distinção entre a proibição contida na norma questionada e a eliminação progressiva disciplina na legislação estadual, que gera efeitos totalmente diversos e, caso se opte pela sua constitucionalidade, acarretará esvaziamento do comando normativo de quem é competente para regular o assunto, levando ao completo descumprimento do dever deste Supremo Tribunal Federal de guardar a imperatividade da Constituição. 9. Recurso extraordinário conhecido e provido para declarar a inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 1.952, de 20 de dezembro de 1995, do Município de Paulínia (RE nº 586.224, Tribunal Pleno, rel. Min. Luiz Fux, julgado em 05.03.2015, Acórdão Eletrônico, Repercussão Geral – Mérito DJe-085, divulgado em 07.05.2015, publicado 14Curso Ênfase © 2021 em 08.05.2015). Note-se que o papel do Poder Judiciário foi explicitamente referido no presente julgado: “O Judiciário está inserido na sociedade e, por este motivo, deve estar atento também aos seus anseios, no sentido de ter em mente o objetivo de saciar as necessidades, visto que também é um serviço público”. 4.2. Precaução Em se tratando de atividades cujos impactos ambientais sejam cientificamente não conhecidos, inclusive em relação à maneira de evitá-los ou ao menos minimizá-los, na dúvida, a atividade não será autorizada, não será dado o licenciamento ambiental. Além disso, a verificação dos riscos e das mitigações existentes será aferida mediante estudo prévio de impacto ambiental (EIA), lembrando que este somente será exigido para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, nos termos do inciso IV do § 1º do art. 225 da CF/1988. Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadiaqualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: (...) IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; (...) Desse princípio, decorre importante efeito processual: a inversão do ônus da prova, cabendo, nestes casos, de incerteza científica, devendo o interessado, no desenvolvimento da atividade, provar que ela não é prejudicial ao meio ambiente ou que há mitigações capazes de minimizar de forma satisfatória esses efeitos. Nesse sentido, o Enunciado nº 618 da Súmula do STJ: “A inversão do ônus da prova aplica-se às ações de degradação ambiental”. Um importante julgado envolvendo o princípio da precaução diz respeito aos campos 15Curso Ênfase © 2021 eletromagnéticos, no qual o STF entendeu pela ausência de fundamentos fáticos ou jurídicos a obrigar as concessionárias de energia elétrica a reduzir o campo eletromagnético das linhas de transmissão de energia elétrica abaixo do patamar legal, não sendo obrigados a adotar os padrões suíços relacionados a tal atividade. Recurso extraordinário. Repercussão geral reconhecida. Direito Constitucional e Ambiental. Acórdão do tribunal de origem que, além de impor normativa alienígena, desprezou norma técnica mundialmente aceita. Conteúdo jurídico do princípio da precaução. Ausência, por ora, de fundamentos fáticos ou jurídicos a obrigar as concessionárias de energia elétrica a reduzir o campo eletromagnético das linhas de transmissão de energia elétrica abaixo do patamar legal. Presunção de constitucionalidade não elidida. Recurso provido. Ações civis públicas julgadas improcedentes. 1. O assunto corresponde ao Tema nº 479 da Gestão por Temas da Repercussão Geral do portal do STF na internet e trata, à luz dos arts. 5º, caput e inciso II, e 225, da Constituição Federal, da possibilidade, ou não, de se impor a concessionária de serviço público de distribuição de energia elétrica, por observância ao princípio da precaução, a obrigação de reduzir o campo eletromagnético de suas linhas de transmissão, de acordo com padrões internacionais de segurança, em face de eventuais efeitos nocivos à saúde da população. 2. O princípio da precaução é um critério de gestão de risco a ser aplicado sempre que existirem incertezas científicas sobre a possibilidade de um produto, evento ou serviço desequilibrar o meio ambiente ou atingir a saúde dos cidadãos, o que exige que o estado analise os riscos, avalie os custos das medidas de prevenção e, ao final, execute as ações necessárias, as quais serão decorrentes de decisões universais, não discriminatórias, motivadas, coerentes e proporcionais. 3. Não há vedação para o controle jurisdicional das políticas públicas sobre a aplicação do princípio da precaução, desde que a decisão judicial não se afaste da análise formal dos limites desses parâmetros e que privilegie a opção democrática das escolhas discricionárias feitas pelo legislador e pela Administração Pública. 4. Por ora, não existem fundamentos fáticos ou jurídicos a obrigar as concessionárias de energia elétrica a reduzir o campo eletromagnético das linhas de transmissão de energia elétrica abaixo do patamar legal fixado. 5. Por força da repercussão geral, é fixada a seguinte tese: no atual estágio do conhecimento científico, que indica ser incerta a existência de efeitos nocivos da exposição ocupacional e da população em geral a campos elétricos, magnéticos e eletromagnéticos gerados por sistemas de energia elétrica, não existem impedimentos, por ora, a que sejam adotados os parâmetros propostos pela Organização Mundial de Saúde, conforme estabelece a Lei nº 11.934/2009. 6. Recurso extraordinário provido para o fim de julgar improcedentes ambas as ações civis públicas, sem a fixação de verbas de sucumbência (RE nº 627.189, Tribunal Pleno, rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 08.06.2016, Acórdão Eletrônico, DJe- 16Curso Ênfase © 2021 066, divulgado em 31.03.2017, publicado em 03.04.2017). 4.3. Poluidor pagador De acordo com a Lei nº 6.938/1981 (Política Nacional do Meio Ambiente), em seu art. 3º, IV, poluidor é a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental. Ainda, conceitua o que vem a ser degradação ambiental, dentre outros conceitos interessantes. Vejamos: Art. 3º Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: I – meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas; II – degradação da qualidade ambiental, a alteração adversa das características do meio ambiente; III – poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c) afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos; IV – poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental; V – recursos ambientais: a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a 17Curso Ênfase © 2021 flora. (Redação dada pela Lei nº 7.804, de 1989.) Nos termos do § 1º do art. 14 da Lei nº 6.938/1981, “(...) é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. (...).” Assim, a própria lei já deixa entrever a adoção da teoria do risco integral, em se tratando de responsabilidade civil por danos ambientais, devendo o Poder Judiciário ater-se a essa situação, implicando apenas a verificação apenas do nexo causal entre a conduta realizada e o dano ambiental, emergindo a responsabilidade pela recomposição do meio ambiente e eventual indenização, quando não possível essa restituição ao status quo ante, sem prejuízo de cumular-se a obrigação de fazer com a de pagar. Nesse sentido da verificação do nexo de causalidade, o STJ enfrentou um caso envolvendo a explosão de um navio cargueiro e a responsabilidade dos adquirentes das mercadorias por ele transportadas, entendendo pela quebra do referido nexo, afastando a responsabilidade pelos danos ambientais. Trata-se do Recurso Especial nº 1.602.106/PR: RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS EXTRAPATRIMONIAIS. ACIDENTE AMBIENTAL. EXPLOSÃO DO NAVIO VICUÑA. PORTO DE PARANAGUÁ. PESCADORES PROFISSIONAIS. PROIBIÇÃO TEMPORÁRIA DE PESCA. EMPRESAS ADQUIRENTES DA CARGA TRANSPORTADA. AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE. NEXO DE CAUSALIDADE NÃO CONFIGURADO. 1. Ação indenizatória ajuizada por pescadora em desfavor apenas das empresas adquirentes (destinatárias) da carga que era transportada pelo navio tanque Vicuña no momento de sua explosão, em 15/11/2004, no Porto de Paranaguá. Pretensão da autora de se ver compensada por danos morais decorrentes daproibição temporária da pesca (2 meses) determinada em virtude da contaminação ambiental provocada pelo acidente. 2. Acórdão recorrido que concluiu pela procedência do pedido ao fundamento de se tratar de hipótese de responsabilidade objetiva, com aplicação da teoria do risco integral, na qual o simples risco da atividade desenvolvida pelas demandadas configuraria o nexo de causalidade ensejador do dever de indenizar. Indenização fixada no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). 3. Consoante a jurisprudência pacífica desta Corte, sedimentada inclusive no julgamento de recursos submetidos à sistemática dos processos representativos de controvérsia (arts. 543-C do CPC/1973 e 1.036 e 1.037 do CPC/2015), “a responsabilidade por dano ambiental é 18Curso Ênfase © 2021 objetiva, informada pela teoria do risco integral, sendo o nexo de causalidade o fator aglutinante que permite que o risco se integre na unidade do ato” (REsp nº 1.374.284/MG). 4. Em que pese a responsabilidade por dano ambiental seja objetiva (e lastreada pela teoria do risco integral), faz-se imprescindível, para a configuração do dever de indenizar, a demonstração da existência de nexo de causalidade apto a vincular o resultado lesivo efetivamente verificado ao comportamento (comissivo ou omissivo) daquele a quem se repute a condição de agente causador. 5. No caso, inexiste nexo de causalidade entre os danos ambientais (e morais a eles correlatos) resultantes da explosão do navio Vicuña e a conduta das empresas adquirentes da carga transportada pela referida embarcação. 6. Não sendo as adquirentes da carga responsáveis diretas pelo acidente ocorrido, só haveria falar em sua responsabilização – na condição de poluidora indireta – acaso fosse demonstrado: (i) o comportamento omissivo de sua parte; (ii) que o risco de explosão na realização do transporte marítimo de produtos químicos adquiridos fosse ínsito às atividades por elas desempenhadas ou (iii) que estava ao encargo delas, e não da empresa vendedora, a contratação do transporte da carga que lhes seria destinada. 7. Para os fins do art. 1.040 do CPC/2015, fixa-se a seguinte TESE: As empresas adquirentes da carga transportada pelo navio Vicunã no momento de sua explosão, no Porto de Paranaguá/PR, em 15/11/2004, não respondem pela reparação dos danos alegadamente suportados por pescadores da região atingida, haja vista a ausência de nexo causal a ligar tais prejuízos (decorrentes da proibição temporária da pesca) à conduta por elas perpetrada (mera aquisição pretérita do metanol transportado). 8. Recursos especiais providos (REsp. nº 1.602.106/PR, 2ª Seção, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 25.10.2017, DJe 22.11.2017). Além disso, o magistrado deve ter em mente situações em que o dano é propter rem, vale dizer, segue a coisa, como nos casos de propriedades localizadas em locais especialmente protegidos, onde a obrigação alcançará o futuro proprietário ou possuidor, ainda que não haja conduta sua, mas apenas continuação de uma situação irregular. Nesse passo, o Poder Judiciário poderá responsabilizar quaisquer proprietários ou possuidores, passados ou futuros, bem como estabelecer litisconsórcio entre eles, sempre tencionando a maior proteção possível ao meio ambiente. Por isso, não se admite em tais casos a chamada teoria do fato consumado, invocada por proprietários de imóveis irregulares, sob o argumento de que não foram eles que construíram, já compraram assim, portanto, o fato já está consumado. 19Curso Ênfase © 2021 Confira o Enunciado nº 613 da Súmula do STJ: “Não se admite a aplicação da teoria do fato consumado em tema de Direito Ambiental”. Apenas a responsabilidade civil por danos ambientais é objetiva, informada pela teoria do risco integral, ao passo que a responsabilidade administrativa e penal, é subjetiva, leia-se, dependentes da comprovação de dolo ou, ao menos, culpa. 4.4. Princípio do meio ambiente ecologicamente equilibrado Trata-se de princípio constitucional expresso no art. 225, caput, estando diretamente interligado ao direito à vida, à proteção da dignidade humana, ostentando, portanto, status de direito fundamental, portanto, cláusula pétrea, nos termos do art. 60, § 4º, ambos da CF/1988. Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: (...) § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I – a forma federativa de Estado; II – o voto direto, secreto, universal e periódico; III – a separação dos Poderes; IV – os direitos e garantias individuais. O meio ambiente ecologicamente equilibrado possui natureza jurídica de bem difuso, Atenção! 20Curso Ênfase © 2021 de uso comum do povo, com natureza jurídica própria, diversa dos bens que o integram, sendo considerado um direito fundamental, como já referido, embora não previsto no rol do art. 5º da CF/1988, portanto, dispensável de regulamentação para que seja efetivado, isto é, possui aplicabilidade imediata. Em decorrência dessa natureza própria, o STJ, por ocasião do julgamento do REsp. nº 1.410.698/MG, compreendeu que o dano moral coletivo surge diretamente da ofensa ao direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, sendo que, em determinadas hipóteses, basta a mera violação do bem jurídico tutelado, pela ofensa aos valores da pessoa humana, sendo dispensável a dor ou o padecimento por serem consequências ou resultados oriundos da violação. PROCESSO CIVIL E AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ORDEM URBANÍSTICA. LOTEAMENTO RURAL CLANDESTINO. ILEGALIDADES E IRREGULARIDADES DEMONSTRADAS. OMISSÃO DO PODER PÚBLICO MUNICIPAL. DANO AO MEIO AMBIENTE CONFIGURADO. DANO MORAL COLETIVO. 1. Recurso especial em que se discute a ocorrência de dano moral coletivo em razão de dano ambiental decorrente de parcelamento irregular do solo urbanístico, que, além de invadir Área de Preservação Ambiental Permanente, submeteu os moradores da região a condições precárias de sobrevivência. 2. Hipótese em que o Tribunal de origem determinou as medidas específicas para reparar e prevenir os danos ambientais, mediante a regularização do loteamento, mas negou provimento ao pedido de ressarcimento de dano moral coletivo. 3. A reparação ambiental deve ser plena. A condenação a recuperar a área danificada não afasta o dever de indenizar, alcançando o dano moral coletivo e o dano residual. Nesse sentido: REsp. nº 1.180.078/MG, 2ª Turma, rel. Min. Herman Benjamin, DJe 28.02.2012. 4. “O dano moral coletivo, assim entendido o que é transindividual e atinge uma classe específica ou não de pessoas, é passível de comprovação pela presença de prejuízo à imagem e à moral coletiva dos indivíduos enquanto síntese das individualidades percebidas como segmento, derivado de uma mesma relação jurídica-base. (...) O dano extrapatrimonial coletivo prescinde da comprovação de dor, de sofrimento e de abalo psicológico, suscetíveis de apreciação na esfera do indivíduo, mas inaplicável aos interesses difusos e coletivos” (REsp. nº 1.057.274/RS, 2ª Turma, rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 01.12.2009, DJe 26.02.2010). 5. No caso, o dano moral coletivo surge diretamente da ofensa ao direito ao meio ambiente equilibrado. Em determinadas hipóteses, reconhece-se que o dano moral decorre da simples violação do bem jurídico tutelado, sendo configurado pela ofensa aos valoresda pessoa humana. Prescinde-se, no caso, da dor ou padecimento (que são consequência ou resultado da violação). Nesse sentido: REsp. nº 1.245.550/MG, 4ª Turma, rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 16.04.2015. Recurso 21Curso Ênfase © 2021 especial provido (STJ, EREsp. nº 1.410.698/MG, 2013/0346260-3, S1 – 1ª Seção, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, data de julgamento 14.11.2018, data de publicação DJe 03.12.2018 ‒ grifos nossos). No mais, o STJ entende que, apesar de não ser possível atribuir ao meio ambiente ecologicamente equilibrado uma característica de direito absoluto, este será inserido dentre os direitos indisponíveis, característica que pressupõe a imprescritibilidade de sua reparação (REsp. nº 1.394.025/MS). AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OCUPAÇÃO E EDIFICAÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE-APP. CASAS DE VERANEIO. MARGENS DO RIO IVINHEMA/MS. SUPRESSÃO DE MATA CILIAR. DESCABIMENTO. ART. 8º DA LEI 12.651/2012. NÃO ENQUADRAMENTO. DIREITO ADQUIRIDO AO POLUIDOR. FATO CONSUMADO. DESCABIMENTO. DESAPROPRIAÇÃO NÃO CONFIGURADA. LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA. DANO AMBIENTAL E NEXO DE CAUSALIDADE CONFIGURADOS. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. 1. Descabida a supressão de vegetação em Área de Preservação Permanente – APP que não se enquadra nas hipóteses previstas no art. 8º do Código Florestal (utilidade pública, interesse social e baixo impacto ambiental). 2. Conquanto não se possa conferir ao direito fundamental do meio ambiente equilibrado a característica de direito absoluto, certo é que ele se insere entre os direitos indisponíveis, devendo-se acentuar a imprescritibilidade de sua reparação, e a sua inalienabilidade, já que se trata de bem de uso comum do povo (art. 225, caput, da CF/1988). 3. Em tema de direito ambiental, não se cogita em direito adquirido à devastação, nem se admite a incidência da teoria do fato consumado. Precedentes do STJ e STF. 4. A proteção legal às áreas de preservação permanente não importa em vedação absoluta ao direito de propriedade e, por consequência, não resulta em hipótese de desapropriação, mas configura mera limitação administrativa. Precedente do STJ. 5. Violado o art. 14, § 1º, da Lei 6.938/1981, pois o Tribunal de origem reconheceu a ocorrência do dano ambiental e o nexo causal (ligação entre a sua ocorrência e a fonte poluidora), mas afastou o dever de promover a recuperação da área afetada e indenizar eventuais danos remanescentes. 6. Em que pese ao loteamento em questão haver sido concedido licenciamento ambiental, tal fato, por si só, não elide a responsabilidade pela reparação do dano causado ao meio ambiente, uma vez afastada a legalidade da autorização administrativa. 7. É inadmissível o recurso especial quanto a questão não decidida pelo Tribunal de origem, por falta de prequestionamento (Súmula 211/STJ). 8. Recurso especial parcialmente conhecido e provido (Recurso Especial nº 1.394.025/MS, 2013/0227164-1). 22Curso Ênfase © 2021 Em recentíssima decisão, o STF confirmou esse entendimento em sede de repercussão geral no RE nº 654.833/AC, julgado em 20.04.2020, DJe 24.06.2020, rel. Min. Alexandre de Moraes. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 999. CONSTITUCIONAL. DANO AMBIENTAL. REPARAÇÃO. IMPRESCRITIBILIDADE. 1. Debate-se nestes autos se deve prevalecer o princípio da segurança jurídica, que beneficia o autor do dano ambiental diante da inércia do Poder Público; ou se devem prevalecer os princípios constitucionais de proteção, preservação e reparação do meio ambiente, que beneficiam toda a coletividade. 2. Em nosso ordenamento jurídico, a regra é a prescrição da pretensão reparatória. A imprescritibilidade, por sua vez, é exceção. Depende, portanto, de fatores externos, que o ordenamento jurídico reputa inderrogáveis pelo tempo. 3. Embora a Constituição e as leis ordinárias não disponham acerca do prazo prescricional para a reparação de danos civis ambientais, sendo regra a estipulação de prazo para pretensão ressarcitória, a tutela constitucional a determinados valores impõe o reconhecimento de pretensões imprescritíveis. 4. O meio ambiente deve ser considerado patrimônio comum de toda humanidade, para a garantia de sua integral proteção, especialmente em relação às gerações futuras. Todas as condutas do Poder Público estatal devem ser direcionadas no sentido de integral proteção legislativa interna e de adesão aos pactos e tratados internacionais protetivos desse direito humano fundamental de 3ª geração, para evitar prejuízo da coletividade em face de uma afetação de certo bem (recurso natural) a uma finalidade individual. 5. A reparação do dano ao meio ambiente é direito fundamental indisponível, sendo imperativo o reconhecimento da imprescritibilidade no que toca à recomposição dos danos ambientais. 6. Extinção do processo, com julgamento de mérito, em relação ao Espólio de Orleir Messias Cameli e a Marmud Cameli Ltda, com base no art. 487, III, b do Código de Processo Civil de 2015, ficando prejudicado o Recurso Extraordinário. Afirmação de tese segundo a qual. É imprescritível a pretensão de reparação civil de dano ambiental. Valério de Oliveira Mazzuoli (2018) traz a correlação entre o meio ambiente ecologicamente equilibrado e os direitos humanos, ao detalhar a Opinião Consultiva nº 23, de 15 de novembro de 2017, pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, a qual conclui pelo dever dos Estados-Partes na Convenção Americana de prevenir danos ambientais significativos, dentro e fora de seus respectivos territórios, devendo fiscalizar as atividades capazes de provocarem danos ambientais significativos. Conforme leciona Romeu Thomé (2016), o meio ambiente equilibrado foi reconhecido como direito humano pela Declaração de Estocolmo das Nações Unidas sobre o 23Curso Ênfase © 2021 Ambiente Humano de 1972, segundo o qual “o homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições de vida adequadas em um meio ambiente de qualidade tal que lhe permita levar uma vida digna e gozar de bem-estar, tendo a solene obrigação de proteger e melhorar o meio ambiente para as gerações presentes e futuras.” Nessa linha de intelecção, o STF tem afirmado, reiteradamente, que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é uma prerrogativa jurídica de titularidade da coletividade, conforme Mandado de Segurança (MS) nº 22.164, de relatoria do Ministro Celso de Mello. O direito à integridade do meio ambiente – típico direito de terceira geração – constitui prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, refletindo, dentro do processo de afirmação dos direitos humanos, a expressão significativa de um poder atribuído, não ao indivíduo identificado em sua singularidade, mas, num sentido verdadeiramente mais abrangente, à própria coletividade social. Enquanto os direitos de primeira geração (direitos civis e políticos) – que compreendem as liberdades clássicas, negativas ou formais – realçam o princípio da liberdade e os direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais) – que se identificam com as liberdades positivas, reais ou concretas – acentuam o princípio da igualdade, os direitos de terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem um momento importante no processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados, enquanto valores fundamentaisindisponíveis, pela nota de uma essencial inexauribilidade (STF ‒ MS nº 22.164, rel. Min. Celso de Mello, j. 30.10.1995, DJ 17.11.1995). Assim, por se tratar de um direito fundamental, intrínseco à própria existência da vida humana, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem-se posicionado no sentido da imprescritibilidade da ação de reparação de danos ambientais (recurso especial, no que veio acompanhado pelo STF, conforme já explicitado anteriormente, RE nº 654.833/AC, julgado em 2020). ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL – DIREITO AMBIENTAL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL – IMPRESCRITIBILIDADE DA REPARAÇÃO DO DANO AMBIENTAL – PEDIDO GENÉRICO – ARBITRAMENTO DO QUANTUM DEBEATUR NA SENTENÇA: REVISÃO, POSSIBILIDADE – SÚMULAS 284/STF E 7/STJ. (...) 4. O dano ambiental além de atingir de imediato o bem jurídico que lhe está próximo, a comunidade indígena, também atinge a todos os integrantes do 24Curso Ênfase © 2021 Estado, espraiando-se para toda a comunidade local, não indígena e para futuras gerações pela irreversibilidade do mal ocasionado. 5. Tratando-se de direito difuso, a reparação civil assume grande amplitude, com profundas implicações na espécie de responsabilidade do degradador que é objetiva, fundada no simples risco ou no simples fato da atividade danosa, independentemente da culpa do agente causador do dano. 6. O direito ao pedido de reparação de danos ambientais, dentro da logicidade hermenêutica, está protegido pelo manto da imprescritibilidade, por se tratar de direito inerente à vida, fundamental e essencial à afirmação dos povos, independentemente de não estar expresso em texto legal. 7. Em matéria de prescrição cumpre distinguir qual o bem jurídico tutelado: se eminentemente privado seguem-se os prazos normais das ações indenizatórias; se o bem jurídico é indisponível, fundamental, antecedendo a todos os demais direitos, pois sem ele não há vida, nem saúde, nem trabalho, nem lazer, considera-se imprescritível o direito à reparação. 8. O dano ambiental inclui-se dentre os direitos indisponíveis e como tal está dentre os poucos acobertados pelo manto da imprescritibilidade a ação que visa reparar o dano ambiental (REsp. nº 1.120.117/AC, rel. Min. Eliane Calmon, julgado em 10.11.2009 – Informativo nº 415). 4.5. Princípio da equidade intergeracional Diretamente interligado ao princípio do meio ambiente ecologicamente equilibrado, o princípio da equidade intergeracional pressupõe que tanto a coletividade quanto o Poder Público deverão preservar os recursos naturais em benefício das presentes gerações e das futuras. Ou seja, as presentes gerações possuem o direito de usufruírem de recursos naturais, mas de maneira consciente, para que as próximas gerações possuam igual direito, nos termos do caput do art. 225 da CF/1988. Não apenas condutas negativas são deduzidas do princípio da equidade intergeracional, mas também as condutas positivas, como a recuperação de áreas degradadas e as demais previstas no § 1º do art. 225 da CF/1988. Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I – preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; 25Curso Ênfase © 2021 II – preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; III – definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; V – controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; VI – promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. 5. Enunciados do STJ em destaque na atuação do Poder Judiciário Vejamos alguns enunciados do Jurisprudência em Teses, publicação temática do STJ em forma de teses sobre determinadas matérias, refletindo o entendimento do tribunal. 5.1. Edição nº 30 1) Admite-se a condenação simultânea e cumulativa das obrigações de fazer, de não fazer e de indenizar na reparação integral do meio ambiente. (...) 3) Não há direito adquirido a poluir ou degradar o meio ambiente, não existindo permissão ao proprietário ou posseiro para a continuidade de práticas vedadas pelo 26Curso Ênfase © 2021 legislador. 4) O princípio da precaução pressupõe a inversão do ônus probatório, competindo a quem supostamente promoveu o dano ambiental comprovar que não o causou ou que a substância lançada ao meio ambiente não lhe é potencialmente lesiva. (...) 7) Os responsáveis pela degradação ambiental são coobrigados solidários, formando-se, em regra, nas ações civis públicas ou coletivas litisconsórcio facultativo. 8) Em matéria de proteção ambiental, há responsabilidade civil do Estado quando a omissão de cumprimento adequado do seu dever de fiscalizar for determinante para a concretização ou o agravamento do dano causado. 9) A obrigação de recuperar a degradação ambiental é do titular da propriedade do imóvel, mesmo que não tenha contribuído para a deflagração do dano, tendo em conta sua natureza propter rem. 10) A responsabilidade por dano ambiental é objetiva, informada pela teoria do risco integral, sendo o nexo de causalidade o fator aglutinante que permite que o risco se integre na unidade do ato, sendo descabida a invocação, pela empresa responsável pelo dano ambiental, de excludentes de responsabilidade civil para afastar sua obrigação de indenizar (tese julgada sob o rito do art. 543-C do CPC/1973). 5.2. Edição nº 119 Recente edição focou no tema responsabilidade por dano ambiental, especialmente a civil. 1) A responsabilidade por dano ambiental é objetiva, informada pela teoria do risco integral, sendo o nexo de causalidade o fator aglutinante que permite que o risco se integre na unidade do ato, sendo descabida a invocação, pela empresa responsável pelo dano ambiental, de excludentes de responsabilidade civil para afastar sua obrigação de indenizar (tese julgada sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 – Temas nºs 681 e 707, letra a). 2) Causa inequívoco dano ecológico quem desmata, ocupa, explora ou impede a regeneração de Área de Preservação Permanente – APP, fazendo emergir a obrigação 27Curso Ênfase © 2021 propter rem de restaurar plenamente e de indenizar o meio ambiente degradado e terceiros afetados, sob o regime de responsabilidade civil objetiva. 3) O reconhecimento da responsabilidade objetiva por dano ambiental não dispensa a demonstração do nexo de causalidade entre a conduta e o resultado. 4) A alegação de culpa exclusiva de terceiro pelo acidente em causa, como excludente de responsabilidade, deve ser afastada, ante a incidência da teoria do risco integral e da responsabilidadeobjetiva ínsita ao dano ambiental (art. 225, § 3º, da Constituição Federal de 1988 – CF/1988 e do art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938/1981), responsabilizando o degradador em decorrência do princípio do poluidor-pagador (tese julgada sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 – Tema nº 438). 5) É imprescritível a pretensão reparatória de danos ao meio ambiente. 6) O termo inicial da incidência dos juros moratórios é a data do evento danoso nas hipóteses de reparação de danos morais e materiais decorrentes de acidente ambiental. 7) A inversão do ônus da prova aplica-se às ações de degradação ambiental (Súmula nº 618/STJ). 8) Não se admite a aplicação da teoria do fato consumado em tema de direito ambiental (Súmula nº 613/STJ). 9) Não há direito adquirido à manutenção de situação que gere prejuízo ao meio ambiente. 10) O pescador profissional é parte legítima para postular indenização por dano ambiental que acarretou a redução da pesca na área atingida, podendo utilizar-se do registro profissional, ainda que concedido posteriormente ao sinistro, e de outros meios de prova que sejam suficientes ao convencimento do juiz acerca do exercício dessa atividade. 11) É devida a indenização por dano moral patente o sofrimento intenso do pescador profissional artesanal, causado pela privação das condições de trabalho, em consequência do dano ambiental (tese julgada sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 – Tema nº 439). 28Curso Ênfase © 2021 Obra coletiva do Curso Ênfase produzida a partir da análise estatística de incidência dos temas em provas de concursos públicos. 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