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1Curso Ênfase © 2021 TEMAS ESPECIAIS PARA JUIZ FEDERAL DIREITO PROCESSUAL PENAL Vantagens e Desvantagens da Especialização de Varas Criminais nos “Crimes de Lavagem de Dinheiro e Contra o Sistema Financeiro Nacional”. Experiências dos Tribunais Regionais Federais. 1. Introdução Todo órgão julgador é dotado de poder jurisdicional, mas esse poder é limitado pela competência jurisdicional. A competência é determinada na Constituição Federal, em lei infraconstitucional, principalmente, os Códigos de Processo, Penal e Civil, e pelos atos normativos dos Tribunais, como o próprio Regimento Interno de cada Corte. Dessa maneira, a Constituição Federal de 1988 (CF/1988) enumera a competência dos mais variados Tribunais da República a começar pela competência do próprio Supremo Tribunal Federal (STF). E assim também procedeu o legislador constituinte no que diz respeito à competência da Justiça Federal. Com efeito, o art. 108 da CF/1988 enumera a competência dos Tribunais Regionais 2Curso Ênfase © 2021 Federais (TRFs), enquanto o art. 109 trata da competência dos juízes federais. Do texto constitucional se conclui que compete à Justiça Federal o julgamento das infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral (art. 109, IV, CF/1988), bem como o julgamento dos crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no país, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente (art. 109, V, CF/1988). No que diz respeito ao julgamento dos crimes de lavagem de dinheiro, a Lei nº 9.613/1998 estabelece que a Justiça Federal tem competência para o julgamento: a) quando praticados contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira, ou em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas; e b) quando a infração penal antecedente for de competência da Justiça Federal. Já, em relação aos crimes contra o sistema financeiro nacional, o art. 26 da Lei nº 7.492/1986 também estabelece a competência da Justiça Federal para o julgamento de infrações penais dessa natureza. Estabelecida, pela CF/1988 e pela legislação ordinária, a competência da Justiça Federal para o julgamento dos crimes de lavagem de dinheiro e contra o sistema financeiro nacional, dada a complexidade de crimes dessa natureza, a Justiça Federal se viu na necessidade de se criar varas especializadas para o julgamento dessas infrações penais. Com efeito, o Conselho da Justiça Federal (CJF), editou a Resolução nº 314/2003, segundo a qual os TRFs criariam varas especializadas para o julgamento dessas infrações penais. Em seguida, os TRFs passaram por meio de atos internos a criar Varas Federais especializadas em crimes contra o sistema financeiro e lavagem de dinheiro. Pois bem, os referidos atos normativos foram objeto de impugnação, sob o fundamento de que violariam o princípio da legalidade, tendo em vista que a competência jurisdicional deveria ser regulamentada por lei em sentido formal, e, em consequência, 3Curso Ênfase © 2021 o princípio do juiz natural. Contudo, o STF, no julgamento do Habeas Corpus (HC) nº 88.660/CE, de relatoria da Ministra Cármen Lúcia, por maioria de votos, firmou entendimento no sentido de que a criação de varas especializadas é inerente ao poder de organização judiciária dos Tribunais, o que se pode dar por ato normativo do próprio Tribunal, sem necessidade de lei ordinária, aprovada pelo Poder Legislativo e sancionada pelo Poder Executivo. Ademais, não há que se falar em violação ao princípio do juiz natural, tendo em vista que não se criam as varas federais especializadas com o intuito de julgamento de fatos ou contra pessoas determinados. Outra questão que surgiu da criação das varas especializadas é se elas tinham competência para julgamento de fatos anteriores à sua criação. Contudo, os Tribunais Superiores firmaram entendimento de que “em se tratando de competência material, não se opera a perpetuatio jurisdicionis, devendo os feitos ser imediatamente encaminhados à nova Vara especializada, pois ditas disposições têm incidência imediata e aplicam-se independentemente da fase em que se encontre o processo, dada a sua natureza nitidamente instrumental” (STJ, REsp. nº 1.432.917/RS, rel. Min. Rogério Schietti Cruz, publicado em 21.10.2015). Por fim há de se dizer que, em caso de conexão ou continência, prevalece a competência da Vara Especializada para o julgamento dos crimes de lavagem de dinheiro ou contra sistema financeiro, bem como dos crimes conexos a eles (STJ, HC nº 334.571/MT, rel. Min. Rogério Schietti Cruz, julgado em 19.11.2015). A criação de varas especializadas tem como objetivo a prestação jurisdicional mais célere e efetiva. Note-se que tanto os crimes contra o sistema financeiro como o de lavagem de dinheiro, ainda mais quando envolvem transações internacionais, são altamente complexos. Sendo assim, necessitam de serviço especializado para o seu processamento, não apenas de juízes e membros do Ministério Público, como também dos servidores da Justiça. A desvantagem de se criarem varas especializadas reside na publicidade do corpo de juízes, membros do Ministério Público e de servidores que compõe a Vara e que, com isso, ficam expostos a agentes perigosos, como membros de organizações criminosas. 4Curso Ênfase © 2021 Além disso, as varas especializadas podem ter significativo impacto orçamentário. Por fim, assim como se observa no meio empresarial, a especialização pode implicar em acomodação dos servidores e magistrados que atuam nas varas especializadas. Postas as vantagens e as desvantagens de especialização das Varas de Crimes de Lavagem de dinheiro e de crimes contra o sistema financeiro, o fato é que esse é um caminho sem volta. Diga-se que a especialização da prestação jurisdicional não é uma novidade. Ao contrário, em França, por exemplo, como se sabe há Tribunal específico que cuida do contencioso administrativo. Isso no Brasil não se mostra possível dado o princípio da inafastabilidade da prestação jurisdicional, o que não impede a especialização das unidades jurisdicionais, como ocorre nas Varas de Infância e Juventude, da Fazenda Pública, de causas previdenciárias e outras. E essa especialização deve seguir também em matéria processual penal, como ocorre nas varas de combate à lavagem de dinheiro e crimes contra o sistema financeiro, os quais, em face da cada vez maior sofisticação, exigem uma resposta pronta e eficiente do Poder Judiciário. Obra coletiva do Curso Ênfase produzida a partir da análise estatística de incidência dos temas em provas de concursos públicos. A autoria dos e-books não se atribui aos professores de videoaulas e podcasts. Todos os direitos reservados.
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