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R0203-1

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XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) 
 
Especificar a Área do trabalho 
 (CA, EA, HC, EF, EX, FP, LC, MD, TIC, EC) 
O ensino de soluções no nível fundamental: será isso possível? 
Daniela dos Santos Alves Souza*1 (FM), Maria Emilia Caixeta de C. Lima2 (PQ), Iria Luíza de 
Castro Melgaço Vieira3 (FM), Ana Luiza de Quadros1 (PQ). *danielasza@yahoo.com.br 
1 – Depto. De Química – ICEx – UFMG 2 – CECIMIG - FaE/UFMG 3- Centro Pedagógico – UFMG 
 
Palavras Chave: soluções, ensino de ciências, aprendizagem. 
RESUMO: Várias pesquisas envolvendo as concepções de estudantes de Ensino Médio sobre soluções foram 
realizadas e mostraram uma aprendizagem limitada. Considerando que a evolução conceitual se dá pela 
"negociação" de conceitos em cada contexto que o mesmo for retomado, trabalhamos coma hipótese de que 
discussões envolvendo esse conhecimento deveriam iniciar mais cedo com os alunos. Com o objetivo de 
analisar a viabilidade do estudo de soluções no Ensino Fundamental, desenvolvemos essa pesquisa. 
Percebemos que os alunos se apropriam de alguns conceitos importantes envolvendo soluções nessa fase de 
aprendizagem, desde que não envolvam análises matemáticas. Observamos bons resultados com o 
desenvolvimento de uma seqüência de aulas que envolviam soluções e outros conceitos e julgamos que isso 
pode favorecer a aprendizagem durante o Ensino Médio. 
 
INTRODUÇÃO 
No Brasil ainda são raras as pesquisas sobre o ensino de soluções no nível fundamental. 
Provavelmente isso se dá porque esse assunto não faz parte do currículo de ciências a nível 
nacional ou, talvez, porque os estudantes nesse nível de ensino não dêem conta ainda desses 
conceitos. Porém, o CBC (currículo básico comum) de ciências de Minas Gerais – um projeto do 
governo estadual para a educação – contempla o ensino de soluções no nível fundamental em seu 
Eixo Temático III: construindo modelos, Tema II: o mundo muito pequeno – modelo cinético 
molecular. Além disso, uma coleção1 de livros didáticos aprovada pelo PNLD – Plano Nacional 
do Livro didático em 2007 contempla o ensino se soluções no nível fundamental, o que significa 
legitimar oficialmente o ensino deste conteúdo. 
Embora as pesquisas sobre aprendizagem de conceitos relacionados ao conteúdo 
soluções sejam raras no ensino fundamental, elas são inúmeras no nível médio. Esses estudos 
sobre o ensino de soluções têm tomado parte especial nas pesquisas do ensino de ciênc ias de um 
modo geral (ECHEVERRÍA, 1993; LOPES e QUADROS, 2006). Essas pesquisas têm revelado 
que promover o ensino de soluções o quanto antes é de grande importância, já que esse tema 
abre caminho para o estudo de vários outros conceitos abordados em química como, por 
exemplo, reações químicas que acontecem em solução. 
Outro fator que torna importante o estudo de soluções é a realidade de que a maioria das 
substâncias não é encontrada pura na natureza, mas misturadas ou dissolvidas em outras. A 
criação de modelos de dissolução e o entendimento microscópico dos fenômenos são essenciais 
 
1 Coleção Construindo Consciência. APEC. Belo Horizonte : Ed. Autêntica, 2005. 
XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) 
UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. 
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para a formação do pensamento químico. Desse modo, temos a convicção de que o ensino de 
soluções pode promover uma iniciação dos alunos nesses aspectos químicos, bem como prover 
os estudantes de ferramentas conceituais importantes. 
VISITANDO OUTRAS PESQUISAS 
 
Partilhamos da idéia de muitos pesquisadores (AUSUBEL, 1976; MALDANER, 2000; 
MORTIMER, 1995; VIGOTSKI, 1993) de que conhecer e trabalhar com as concepções prévias 
dos estudantes torna mais eficaz o ensino. A pesquisa sobre o modo como os alunos 
compreendem essas idéias, construídas a partir da intervenção pedagógica do professor ou 
professora, na interação entre os sujeitos e deles com o meio e mediada pela linguagem, precisa 
ser realizada o quanto antes, para dar suporte às mudanças curriculares que vêm sendo propostas. 
Se, por um lado, acreditamos que os conceitos desenvolvidos ao abordar o tema solução abrem 
caminho para o entendimento de vários outros abordados na química, por outro lado não 
sabemos como os alunos se apropriam deles no nível fundamental. 
Em paises como Portugal e Espanha o ensino de soluções é promovido no nível 
fundamental e pesquisas já foram realizadas a fim de avaliar esse ensino. Estudos realizados na 
Itália (CERVELLATI, 1984), na Espanha (REPETTO, 1987; SANMARTÍ, 1987), Turquia 
(ÇALIK e AYAS, 2005) e em vários outros países indicam que se trata de um conceito de difícil 
entendimento. Algumas dessas pesquisas mostram que até mesmo alunos de ensino médio e 
alunos graduandos (das áreas das ciências ou de magistério) não se apropriam com facilidade 
desse conceito e apresentam concepções equivocadas sobre o mesmo. 
Blanco (1988) desenvolveu um trabalho para identificar as idéias dos alunos sobre 
soluções e se essas idéias diferiam daquilo que era ensinado. Também procurou identificar se os 
alunos possuíam os pré-requisitos necessários para entender concentração. Para isso, usou 
entrevistas e questionário com alunos de 11 a 15 anos. Tendo em vista os resultados, considerou 
necessário e produtivo, em termos de aprendizagem, introduzir a discussão sobre modelos de 
solubilidade com alunos dessa faixa etária. Indicou, no entanto, que o conceito de concentração e 
as diferentes formas de expressá- la, poderiam ser introduzidos mais tarde (indicou 16 anos), e 
que nessa fase, que aqui no Brasil engloba o ensino Fundamental (5ª a 8ª série), já se poderia 
discutir, por exemplo, a intensidade das cores numa solução como decorrência de variáveis (ou 
de soluto ou de solvente). 
Em pesquisa realizada com alunos de Ensino Médio, Echeverría (1993) observou que 
esses alunos concebem a formação de soluções por meio de encaixe de substâncias em espaços 
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vazios existentes em outras substâncias, e, para esses alunos, o tamanho das substâncias 
influencia esse encaixe. Também não consideram que interações sejam responsáveis pela 
formação de soluções, o que revela a ausência de uma compreensão microscópica do fenômeno e 
mostra que, para o aluno, não está claro o papel do solvente e do soluto. A dificuldade em 
explicar a dissolução aumenta quando se fala em compostos não iônicos. Segundo a 
pesquisadora, os alunos têm idéias sobre dissolução de sais porque é o que, geralmente, se ensina 
em sala de aula (ECHEVERRÍA, 1993). 
Lopes e Quadros (2006), ao investigarem a concepção de soluções antes e após a 
aplicação de uma seqüência de aulas sobre o assunto, no qual se priorizava a discussão de 
modelos, observaram que os alunos que já eram capazes de usar algumas “entidades” químicas 
(átomos, íons, cátions, ânions, etc.) nas discussões iniciais de modelo, apesar de fazerem grandes 
“confusões” no uso dessas “entidades”, foram os que mais evoluíram conceitualmente. Segundo 
elas, é indicado que alguns conceitos altamente teóricos sejam introduzidos nas discussões de 
sala de aula assim que se fizerem necessários, para facilitar a evolução conceitual quando forem 
retomados em outro contexto. 
O que se percebe é que os alunos têm dificuldades em explicar microscopicamente o 
fenômeno porque o processo de dissolução (formação de soluções) não é tratado de modo a 
relacionar os fenômenos de dissolução com as representações microscópicas e as teorias 
explicativas. Consideramos, porém, que o aluno tem potencial para a aprendizagem correta. O 
que determina a ut ilização deste potencial é a relação que se estabelece entre professor, alunoe o 
material didático disponibilizado. Uma relação de confiança entre professor e aluno é 
fundamental, pois somente na medida em que se convencerem de que o professor está 
interessado no modo como ele explica e não com o comprometimento em responder o “que é 
correto”, os alunos acabam por manifestarem suas dúvidas e inseguranças, dando oportunidade 
para o professor travar um diálogo frutífero com eles. Do mesmo modo, acreditamos que o 
sucesso na aprendizagem dos estudantes exige boas seqüências didáticas e, talvez, não exista a 
fórmula mágica para isso, já que as seqüências didáticas não representam o potencial de 
aprendizagem em sala de aula. Elas só se tornam “boas” na relação que ocorre entre aquilo que 
os alunos pensam e dizem e no modo como os professores enfrentam as questões postas e 
articulam os diferentes discursos em circulação em cada sala de aula. 
Mesmo considerando a necessidade de introduzir os conceitos químicos importantes de 
forma a permitir a retomada desses conceitos noutros contextos e de considerar teorias 
contemporâneas de ensino e aprendizagem, algumas questões se faziam mais presentes no nosso 
pensar e, entre elas: é possível ensinar soluções no nível fundame ntal de modo que ocorra 
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aprendizagem significativa? É recomendável introduzir esses conceitos no ensino 
fundamental? Qual a profundidade que poderia ser dada a esse assunto, caso ele fosse 
trabalhado no ensino fundamental? 
NOSSA EXPERIÊNCIA COM O ENSINO DE SOLUÇÕES 
 
a) O observado 
Acompanhando duas turmas de sexta série de uma escola pública de Belo Horizonte, no 
primeiro semestre de 2007, algumas concepções dos alunos dessas turmas a respeito de soluções 
foram identificadas. 
As concepções dos alunos sobre os processos de formação de soluções, verificados nos 
primeiros contatos com eles, referem-se a peças de um quebra-cabeça, como em um jogo de 
montagem que, com a ajuda da força da gravidade (o único tipo de interação admitida por eles), 
“puxa” o soluto para baixo e as peças se encaixam umas nas outras, como já havia sido 
percebido por outros pesquisadores. Esses mesmos alunos explicam a contração de volume 
através do encaixe de substâncias nos espaços vazios de outras, sem referência explícita à 
existência de interações entre as substâncias. 
Os alunos deram evidências de que acreditam que a formação de soluções depende do 
encaixe de substâncias em espaços vazios de outras. No caso, pode-se inferir que terão, então, 
dificuldade futura em conceber, por exemplo, a formação de soluções sólidas. 
A partir do observado, uma crença que foi se fortalecendo é a de que a formação do 
professor de ciências exerce bastante influência no modo como conceitos de química são 
ensinados e aprendidos por parte dos alunos. Via de regra, os professores de ciências são 
oriundos dos cursos de Licenciatura em Ciências Biológicas e, portanto, o conhecimento de 
conteúdos físicos e químicos costuma ser precário. Em outras palavras, muitos aspectos 
químicos e físicos da ciência ficam prejudicados durante as aulas, o que demanda do professor 
de ciências uma permanente inserção em grupos multidisciplinares para superarem as lacunas 
oriundas da formação inicial. 
 
b) O que propomos e desenvolvemos 
Diante do observado, propomos uma seqüência de aulas que foi aplicada numa escola 
pertencente à Rede Federal de Ensino. Atualmente, ela mantém o Ensino Fundamental de 1º ao 
9º ano escolar organizado em três ciclos de formação humana, assim constituídos: 
1ºciclo: 1º , 2º e 3º ano escolares 
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2ºciclo: 4º , 5º e 6º ano escolares 
 3ºciclo: 7º, 8º e 9º ano escolares 
O ingresso de alunos, na escola, é feito por meio de sorteio, tornando, segundo a 
filosofia da escola, a seleção democrática e atendendo a todas as classes sociais. O objetivo 
principal da escola é ser um campo de experimentação e renovação educacional no ensino 
fundamental e na formação de professores. Os alunos e alunas que fizeram parte desse estudo 
pertencem ao final do 2º ciclo dessa escola. 
Considerando as concepções sobre soluções já apontadas em outras pesquisas, 
utilizamos como principais parâmetros para a produção das atividades aplicadas às turmas de 
sexta série do ensino fundamental pesquisadas, as seguintes diretrizes: 
1. Levar em conta as concepções prévias dos alunos 
2. Articular ensino, aprendizagem e avaliação. 
3. Fomentar um processo de ensino/aprendizagem de caráter investigativo 
com graus de abertura variados de acordo com a situação, estimulando a participação do 
aluno no processo. 
Uma outra metodologia foi utilizar experimentos que envolveram o universo de 
interesse dos alunos tornando, na nossa opinião, as atividades interessantes. Por este motivo, 
utilizamos atividades cotidianas como, por exemplo, o preparo de sucos e gelatinas. 
Tendo em vista que uma das maiores dificuldades apresentadas tanto pelos alunos por 
nós investigados, quanto pelos demais citados nos trabalhos de revisão bibliográfica foi o 
entendimento microscópico dos fenômenos, demos especial atenção às atividades que abordaram 
os aspectos microscópicos da formação de soluções, sempre articulados com o fenômeno e suas 
representações. 
Em cada turma de sexta série, foram ministradas nove aulas, durante três semanas 
seguidas, para abordar o tema soluções e concentração de soluções. Em cada semana foram 
ministradas três aulas germinadas, que duraram um pouco mais de duas horas. Estas aulas foram 
elaboradas de forma a manter um diálogo constante com os alunos, levantando aspectos 
corriqueiros relacionados ao assunto em questão e abrindo espaço para que os alunos 
expusessem suas opiniões e idéias. Ao final de cada semana de aulas, foram realizadas 
avaliações sobre o assunto discutido. Os resultados das avaliações foram, posteriormente, 
comentados em sala, sendo as dúvidas dos alunos novamente discutidas. 
Nesta primeira semana foram abordados os aspectos macroscópicos das soluções, tendo 
como meta o ensino/aprendizagem/construção dos conceitos de substância, misturas e solução e 
como objetivos específicos o reconhecimento de que lidamos com vários tipos de misturas 
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diariamente, a capacidade de diferenciar misturas heterogêneas de misturas homogêneas, a 
associação de misturas homogêneas a soluções e a capacidade de dar exemplos de soluções. 
Partimos da discussão sobre a “pureza” da água mineral, seguindo para água de torneira, água do 
mar e outras. Os conceitos iam, pouco a pouco, sendo introduzidos na discussão. 
A meta da segunda semana foi o entendimento dos conceitos de dissolução, 
solubilidade, soluto, solvente e a sistematização dos conceitos de mistura homogênea (solução) e 
mistura heterogênea. Os objetivos específicos foram: saber conceituar soluto e solvente em uma 
solução e entender que as partículas do soluto estão distribuídas homogeneamente em uma 
solução. Iniciamos retomando os conceitos de mistura homogênea e heterogênea, e dando nome 
aos componentes das misturas homogêneas – solvente e soluto. Após, usamos a gelatina – pela 
sua cor – para discutir a solubilidade e como soluto e solvente se comportavam, nesses casos. 
Discutimos vários modelos para esse fenômeno e, inclusive, com diferentes quantidades de 
gelatina em um mesmo volume de água. 
Usamos, na terceira semana, exemplos de soluções em que variamos, ora o volume do 
solvente (mantendo a quantidade do solutofixa), ora a quantidade do soluto (mantendo o volume 
do solvente fixo). Outras vezes variamos a quantidade do soluto e o volume do solvente 
juntamente. Inicialmente, o objetivo era classificar como mais ou menos concentrada. A partir 
daí tentamos introduzir a concentração em valores quantitativos, ou seja, através de cálculos 
simples, a concentração em g/L. 
 
c) Os resultados 
Ao final das semanas 1 e 2, os alunos responderam a um questionário a respeito do 
assunto estudado. Na semana 3, foi proposto um exercício, com o objetivo de examinar como os 
alunos resolveriam questões quantitativas a respeito de concentrações de soluções a partir do que 
foi discutido nas aulas anteriores e da matemática abordada no currículo da sexta série. 
Na primeira semana a ênfase na avaliação recaiu sobre o conhecimento de que toda 
mistura homogênea representava uma solução, de que soluções apresentam uma só fase por 
serem misturas homogêneas, na descrição macroscópica de soluções e exemplificações de 
soluções. A discussão sobre a “pureza” da água mineral e da torneira levou-os a refazerem o 
conceito de água pura. A concepção de mistura heterogênea precisou ser mais discutida, já que 
os alunos tendem a dizer que, por exemplo, água e óleo não se misturam e “evitam” usar o termo 
miscibilidade/imiscibilidade. Ao verem as misturas (que fizemos em sala de aula) e discutir 
sobre elas, os alunos conseguem estabelecer as relações necessárias para o entendimento do que 
é uma solução com uma certa tranqüilidade. É bom ressaltar, também, a importância de dar 
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espaço para o aluno pensar, ou seja, raciocinar sobre o fenômeno que lhe é apresentado. Fornecer 
conceitos prontos não favorece a aprendizagem. Isso ficou claro quando pedimos a eles para 
classificarem o leite, enquanto mistura. Pela concepção de “fases”, tendem a fazer a classificação 
erroneamente. 
Na segunda semana a ênfase avaliativa foi em como as partículas de soluto se 
distribuem na solução, na identificação de soluto e solvente e no conceito de 
solubilidade/miscibilidade. Os resultados obtidos mostraram que os alunos, aos poucos, foram 
usando as palavras soluto e solvente, para se referir aos componentes das misturas usadas. 
Concordaram que, na mistura homogênea, o soluto se distribui por todo o solvente e que uma 
solução pode ser mais “forte” ou mais “fraca”, o que lhes foi explicado se tratar de concentração. 
Na terceira semana, quando se abordou aspectos mais quantitativos das soluções, 
percebemos uma total falta de ânimo dos alunos. Apesar de classificarem corretamente soluções 
mais concentradas e menos concentradas, não estavam muito dispostos a se empenharem na 
resolução matemática de qualquer um dos problemas apresentados. Quando entenderam que 
deveriam usar matemática para resolver essas questões, mostraram uma grande rejeição e o 
interesse que vinham apresentando, até então, pelo tema soluções pareceu ter se perdido como 
por encanto. 
Esse grupo de alunos não sabia como usar a matemática para resolver as questões, não 
apresentou domínio matemático para lidar com regra de três e proporcionalidade (matéria que, 
segundo a professora de ciências, os alunos ainda não haviam aprendido, apesar de o cronograma 
da escola propor o contrário). Neste momento, pareceu-nos impossível abordar concentrações 
expressas em gramas/litro. Eles não davam conta de expressar mL em litros, pois não possuíam 
a ferramenta necessária para tal processo que, no caso, representavam o domínio de unidades e 
medidas e de conversões de uma unidade em outra. Nossa opção foi por abordar a concentração 
grama/mL. Os alunos faziam contas simples de divisão para encontrarem a concentração em 
grama/mL, mas logo que entendiam a lógica matemática da divisão, se esqueciam dos aspectos 
químicos em questão e o que significavam os números que haviam obtido através dos cálculos. 
Assim, os resultados matemáticos não auxiliavam na análise do fenômeno em si. 
Alguns alunos chegaram a afirmar que haviam gostado das aulas até então, mas que, a 
partir desse ponto, já não gostavam de mais nada nas aulas de Ciências. 
Ao terem de utilizar a matemática para resolver problemas, apresentaram uma espécie 
de bloqueio cognitivo e de falta de motivação e gosto pela aprendizagem. Foi como se nada mais 
pudesse ser aprendido ou valesse a pena investir. O rumo e o sentido que vinham sendo dados às 
aulas mudaram completamente, tornando-se quase impossível concluí- las do modo como vinha 
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ocorrendo até então. Desse modo, não foi possível coletar os dados relativos ao exercício três da 
terceira semana, devido ao caos e a perplexidade instaurados entre os alunos e a própria 
professora, que se sentiu impotente diante de tamanha tarefa. 
 
O APRENDIDO COM A PESQUISA 
 
Voltando às perguntas que nortearam a investigação, ou seja, é possível ensinar 
soluções no nível fundamental de modo que ocorra aprendizagem significativa? É 
recomendável introduzir esses conceitos nesse nível de ensino? e de posse da análise dos 
dados obtidos, podemos dizer que promover o ensino de soluções em um nível fundamental de 
escolaridade é possível e, mais ainda, a aprendizagem dos alunos pode ser significativa, mesmo 
trabalhando o assunto em turmas de sexta série (para quase todas as perguntas, obtivemos um 
índice superior a 60% de acerto nas respostas, algumas tiveram índice de acerto acima de 80%) . 
Ao corroborarmos com muitos pesquisadores, quando afirmam a importância de 
conhecer as concepções prévias dos alunos, ressaltamos que é necessário fazer conexões entre as 
pré-concepções e os novos conhecimentos. Considerando que a evolução dessas concepções não 
ocorre momentaneamente, mas é um processo a ser construído ao longo do tempo reafirmamos, 
baseadas em Vigotski (1993), que a negociação de significados é necessária para a evolução 
conceitual. Pensando assim, quanto antes esse processo for iniciado, maior a chance de que as 
idéias dos alunos evoluam e a aprendizagem realmente aconteça. 
Com certeza, não considerar os conhecimentos prévios dificulta em muito o ensino e a 
aprendizagem de qualquer assunto. Como elaborar uma aula sem entender onde se encontram as 
maiores dificuldades dos alunos? Mas não podemos deixar de questionar a origem das 
concepções dos alunos de que o soluto ocupa os espaços vazios do solvente, sem considerar a 
interação que ocorre entre eles. Alguns livros didáticos, ao tentarem simplificar o assunto, 
recorrem erroneamente a essa explicação e essa mesma idéia foi, algumas vezes, usada pelos 
professores das turmas cujas aulas foram por nós observadas. Acreditamos, então, que ela foi 
construída dentro da própria escola. 
As “ferramentas de trabalho” também são de extrema importância em determinado 
aprendizado. Por exemplo, para ensinar química, precisamos constantemente da matemática. 
Análises qualitativas (as quais foram muito bem aceitas pelos alunos) podem e devem ser feitas, 
mas a química (ou as ciências) não se prende somente a este tipo de análise. Percebemos, nesta 
pesquisa, o quanto o ensinamento está, em alguns casos, vinculado à matemática. Esses alunos 
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com os quais trabalhamos não sentem qualquer interesse pela matemática e nem por qualquer 
outro assunto em que a matemática seja instrumento para um novo aprendizado. Podemos inferir, 
por meio dessas observações, que essa é uma dificuldade específica desta escola.Mas, se isso for 
uma realidade nas demais, não temos dúvida de que é necessário um trabalho de conscientização 
envolvendo os professores das áreas de ciências e de matemática sobre como a matemática está 
sendo ensinada e como o seu ensino/aprendizagem pode ser melhorado, já que o conhecimento 
nela trabalhado é básico para diversas áreas. 
A composição das turmas em estudo não poderia deixar de ser, também, um dos fatores 
que determinam como estabelecer um plano de aulas. As turmas analisadas, por exemplo, são 
bastante heterogêneas no que diz respeito a classes sociais e a aprendizado. Estas turmas contêm 
alunos de vários segmentos da sociedade, uma vez que os alunos são matriculados após passarem 
por um sorteio, conforme foi dito anteriormente. Isto faz com que o diálogo em sala também seja 
bastante heterogêneo, influenciando acentuadamente o desenvolvimento das aulas. Esse fato 
pode se tornar tanto um ponto positivo quanto negativo para as aulas. Isso vai depender de como 
os alunos enfrentam a convivência com as diferenças e em como o professor os auxilia a 
conviverem com as diferenças. O relacionamento de respeito e cooperação é necessário em 
qualquer sala de aula. 
Enfim, o ensino de soluções apresenta dificuldades sim, porém, pensamos que um 
professor engajado com o seu trabalho pode melhorar bastante essa situação. O professor precisa 
reconhecer constantemente em que pontos melhorar suas aulas, reelaborando-as sempre que 
necessário e jamais dar o assunto por encerrado ou aprendido. É indicado o estabelecimento do 
processo de “negociação” de significados, conforme Vigotski (1993), e isso acontece a cada vez 
que o conceito for retomado, em diferentes contextos. Determinados assuntos ou temas, como 
soluções, precisam ser constantemente abordados, ora enfaticamente, ora nem tanto, isto porque 
os alunos, além de outras coisas, tendem a confundir os conceitos ou usá- los 
indiscriminadamente (por exemplo, misturar, diluir e dissolver), os quais, com o tempo, vão 
sendo construídos mais solidamente, melhorando o aprendizado. E é nesse ponto que devemos 
situar a necessária mediação pedagógica. 
Também não podemos deixar de retomar a formação dos professores de Ciências do 
Ensino Fundamental. Eles ensinam um pouco de tudo (física, química, biologia, astronomia, etc) 
e, por isso, precisam estender seus horizontes no que diz respeito à busca de conhecimentos 
complementares. A crítica aqui posta se restringe ao fato de que os cursos de formação de 
professores para lecionarem ciências no nível fundamental, em muitos lugares, estão orientados 
para a disciplina de biologia de nível médio. O ensino de ciências (que é muito amplo) requer 
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profissionais com uma formação mais sólida na área de ciências da vida e da natureza. No caso 
de professores de ciências licenciados em química ou física a dificuldade que encontram é da 
mesma natureza, porém relativos aos aspectos das duas outras sub-áreas. Diante disso, vê-se a 
importância e a urgência de pensar políticas de formação continuada de professores e novos 
cursos de licenciatura capazes de superar a formação especializada como tem sido até aqui. 
 
REFERÊNCIAS 
AUSUBEL, D. P. Psicologia Educativa. Um punto de vista cognoscitivo. México : Trilhas, 
1976. 
BLANCO, Angel. Lãs Ideas de Los Alumnos sobre los conceptos de Disolucion y 
Concentracion. In: GISBERT, T. S e LOPEZ, A. B. Lãs Ideas de los Alumnos em el 
Aprendizaje de lãs Ciências. Madri : NARCEA S. A., 1988. p. 47 – 62. 
 
ÇALIK, M. e AYAS, A. A cross-age study on the understanding of chemical solution and their 
components. International Education Journal, V. 6, Nº 1, 2005. p. 30 – 41. 
CERVELLATI, R et all. Chemical Knowledge of students entering a first year university 
chemistry course in Italy. European Journal of Science Education, V. 6, Nº 3, 1984. p. 268 – 270. 
ECHEVERRÍA, A.R. Dimensão empírico-teórica no processo de ensino/aprendizagem do 
conceito soluções no ensino médio. Tese de doutorado. Campinas: Faculdade de Educação da 
Unicamp, 1993. 
 
MALDANER, O. A. A Formação inicial e continuada de professores de química: 
Professores/Pesquisadores. Ijuí: Unijuí, 2000. 424 p. 
 
MORTIMER, E. F. Concepções atomistas dos estudantes. In: Química Nova na Escola, n. 1, p. 
23-26, mai. 1995. 
REPETTO, E. y otros. Estudio de los cambios metodológicos a introducir para una enseñanza 
experimental de las disoluciones. Comunicación presentada al II Congreso Internacional sobre 
investigación en la didáctica de las Ciencias y las Matemáticas, Valencia, 1987. 
 
SANMARTIN, N. La diferenciació entre els conceptes de Mescla i de Compost. Comunicación 
presentada al II Congreso Internacional sobre investigación en la didáctica de las Ciencias y las 
Matemáticas, Valencia, 1987. 
 
VIGOTSKI, L.S. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1993. 
 
LOPES, R. P. e QUADROS, A. L. A dissolução dos compostos iônicos em água: concepções 
iniciais de alunos. Anais do XIII Encontro Nacional de Ensino de Química. Unicamp, Campinas, 
SP, de 24 a 27 de Julho de 2006

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