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livro (3)LETRAMENTOS MÚLTIPLOS NA ALFABETIZAÇÃO

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LETRAMENTOS MÚLTIPLOS 
NA ALFABETIZAÇÃO
Autoria: Lidiomar José Mascarello
Indaial - 2021
UNIASSELVI-PÓS
1ª Edição
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090
Copyright © UNIASSELVI 2021
Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri
 UNIASSELVI – Indaial.
M395l
 Mascarello, Lidiomar José
 Letramentos múltiplos na alfabetização. / Lidiomar José Mas-
carello. – Indaial: UNIASSELVI, 2021.
 151 p.; il.
 ISBN 978-65-5646-170-0
 ISBN Digital 978-65-5646-171-7
1. Letramentos múltiplos. – Brasil. II. Centro Universitário 
Leonardo da Vinci.
CDD 372.414
Impresso por:
Reitor: Prof. Hermínio Kloch
Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol
Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: 
Carlos Fabiano Fistarol
Ilana Gunilda Gerber Cavichioli
Jóice Gadotti Consatti
Norberto Siegel
Julia dos Santos
Ariana Monique Dalri
Jairo Martins
Marcio Kisner
Marcelo Bucci
Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais
Diagramação e Capa: 
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI
Sumário
APRESENTAÇÃO ............................................................................5
CAPÍTULO 1
A Língua(GEM) e o Fazer Pedagógico ......................................... 7
CAPÍTULO 2
Letramentos Múltiplos: Os Significados Do Letramento ..... 57
CAPÍTULO 3
Desafios Do Letramento Digital, Cartográfico E
Da Formação De Professores..................................................111
APRESENTAÇÃO
Caro(a) estudante, o livro de Letramentos Múltiplos na Alfabetização tem 
como propósito desenvolver reflexões acerca do estudo das competências que 
envolvem o processo de escolarização, alfabetização e letramento necessários ao 
processo de ensino aprendizagem, especialmente, no primeiro ano do ensino fun-
damental com alguns apontamentos para os anos subsequentes da vida escolar.
Em sua acepção mais genérica, pode-se dizer que o campo de estudos re-
feridos ao letramento se preocupa fundamentalmente com investigações sobre a 
escrita, seus usos, suas funções e seus efeitos tanto para o indivíduo quanto para 
a sociedade. Pela própria amplitude e imbricações que o conceito oferece, o letra-
mento é tido hoje como um fenômeno social complexo e heterogêneo.
No decorrer deste livro, procura-se desenvolver algumas ideias e distinções 
para os conceitos de alfabetização e letramento. Isso se dará pela inclusão no 
estudo da concepção de letramentos múltiplos: o letramento matemático, o letra-
mento científico, o letramento digital e o letramento geográfico/cartográfico, assim 
como os aspectos teórico-metodológicos abordados em sala de aula e a concep-
ção de formação de professores.
Este livro está dividido em três capítulos, a saber:
Capítulo 1 - A língua(gem) e o fazer pedagógico.
Capítulo 2 - Letramentos múltiplos: os significados do letramento.
Capítulo 3 - Desafios do letramento e da formação de professores.
Cada capítulo é dividido em 3 seções e subseções que serão descritas no iní-
cio de cada unidade. Para cada capítulo foram estabelecidos objetivos específicos, 
conteúdo, atividades de estudo, dicas, sugestões e recomendações de leitura.
O primeiro capítulo, A língua(gem) e o fazer pedagógico, tratará de con-
cepções de linguagem que interferem nas práticas de letramento, incluindo a 
linguagem na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para os anos iniciais. 
Procura-se fazer uma distinção entre alfabetização e letramento, distinguindo o 
escrever na escola e o escrever além da escola. 
Pretende-se construir um percurso o qual você possa buscar e construir de-
finições de letramentos sociais e a escolarização do letramento, avaliando o pro-
cesso de mediação do professor em todo esse percurso, afinal, segundo a maio-
ria dos pesquisadores da área, cada professor pode se posicionar diante do tema.
No segundo capítulo, que tem como título Letramentos múltiplos: os signi-
ficados do letramento, o propósito é esclarecer o conceito de letramentos múlti-
plos. Isso se dará pela via do estudo da oralidade e a leitura em meios iletrados, 
estabelecendo relações entre cultura e modos de pensamento e o não letrado, 
distinguindo aspectos específicos e aspectos complementares do letramento cien-
tífico, do letramento matemático e os diversos significados do letramento.
No terceiro capítulo, intitulado Desafios do letramento e da formação de 
professores, o olhar está voltado para o letramento digital e a Cibercultura na es-
cola, para o letramento cartográfico e a cartografia escolar, passando pelo proces-
so de formação dos professores, desde a formação inicial à continuada e os con-
ceitos de formação na legislação e políticas públicas na formação de professores.
Espera-se que este livro contribua de forma significativa em seus estudos e 
que sirva de suporte para sua formação acadêmica.
Bons estudos!
CAPÍTULO 1
A LÍNGUA(GEM) E O FAZER 
PEDAGÓGICO
A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes 
objetivos de aprendizagem:
 Ressaltar a importância de as concepções de linguagem serem tomadas como 
ponto de ancoragem na defi nição de metodologias de ensino/aprendizagem.
 Conscientizar o professor de que a sua prática pedagógica no ensino e práticas 
de letramento têm relação direta com a sua concepção de língua/linguagem. 
 Enunciar distinções entre alfabetização, letramento e escolarização.
 Identifi car ações do professor como mediador de processos de alfabetização e 
letramento.
 Debater concepções de linguagem.
 Analisar e discutir diferenças e semelhanças entre alfabetização e letramento.
 Diferenciar letramentos sociais e escolarização de letramentos.
 Interpretar e avaliar o processo de mediação do professor nos processos de 
alfabetização e letramento.
8
 Letramentos múltiplos na alfaBetização
9
A LÍNGUA(GEM) E O FAZER PEDAGÓGICO Capítulo 1 
1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Você está iniciando o estudo da disciplina Letramentos múltiplos na alfa-
betização. Você já deve ter se deparado com uma variedade de formas para de-
signar o fenômeno da entrada dos sujeitos no mundo da escrita e no processo de 
reconhecimento e uso da linguagem. 
Essa variação de nomes não é apenas um fenômeno de sinonímia, na verda-
de, é uma amostra no que diz respeito às diferentes vias de abordagem do tema. 
É também uma amostra dos diferentes embates teóricos que permeiam o cotidia-
no dos alfabetizadores e dos profi ssionais interessados no desenvolvimento da 
escrita e na inserção dos sujeitos no universo das letras.
Além do embate teórico, a pluralidade na forma de nominar e de designar 
essa entrada dos sujeitos no mundo da escrita também mostra diferentes cami-
nhos que podem ser trilhados para alcançar, muitas vezes, objetivos comuns; não 
é objetivo nesse estudo apontar um caminho fi nito e exclusivo, e sim, possibilitar 
que você tenha contato com a diversidade da e na linguagem apontada por dife-
rentes autores e teóricos linguistas que vão proporcionar aportes teóricos para 
que você olhe para cada caminho como uma possibilidade.
Este primeiro capítulo, intitulado A língua(gem) e o fazer pedagógico, está 
subdividido em três seções: 
Concepções de linguagem e práticas de letramento.
Distinguindo alfabetização e letramento.
Letramentos sociais e a escolarização do letramento.
Propõem-se aqui neste primeiro capítulo uma refl exão sobre a importância 
de as concepções de linguagem serem tomadas como ponto de ancoragem na 
defi nição de metodologias de ensino/aprendizagem no campo da alfabetização 
e do letramento, desde a distinção de conceitos a práticas sociais de usos da 
linguagem.
Vamos começar?
10
 Letramentos múltiplos na alfaBetização
2 CONCEPÇÕES DE LINGUAGEM 
E PRÁTICAS DO LETRAMENTO, 
PRIMEIRAS PALAVRAS SOBRE A 
TEMÁTICA
Segundo Geraldi (1995), sempre que direcionamos nossoolhar para algo ou 
decidimos estudar um determinado tema, elegemos um posto de observação. Isto 
é, sempre nos posicionamos e argumentamos para mostrar que estamos ampara-
dos teoricamente, não estamos emitindo opiniões pessoais e aleatórias sobre um 
determinado tema. Qual é o “posto de observação” neste livro? 
A resposta é: o posto de observação é a linguística aplicada, para analisar 
a linguagem dentro do universo da alfabetização e do letramento. Por que essa 
escolha? Porque nesse lugar o aspecto mais privilegiado é a interlocução. Mui-
to do que fazemos na escola é determinado pela linguagem, especialmente pelo 
conceito e crença (o que acreditamos que seja língua e linguagem) que adotamos 
ou dominamos a respeito do conceito de Língua. 
No espaço que envolve os primeiros anos da educação escolar isso tam-
bém não é diferente. Tanto o ensino de língua portuguesa quanto o processo de 
alfabetização e letramento têm sido muito discutidos pelos professores, sejam pe-
dagogos(as) ou professores(as) de componentes curriculares dos anos fi nais da 
educação básica. 
Além das diferentes concepções de linguagem, a mudança no tempo de es-
colarização provocou alterações na concepção de ensino/aprendizagem do letra-
mento no Brasil. No ano de 2006, foi introduzido o ensino fundamental de nove 
anos no Sistema Educacional Brasileiro, mesmo já consolidado, é uma interven-
ção recente. A inserção de um ano a mais e a redução da idade para iniciar o 
primeiro ano escolar colocou um desafi o para professores(as) e gestores(as) de 
ensino no sentido de defi nir que o currículo adota para desenvolver as habilidades 
de crianças da faixa etária de 6 anos.
Adota-se o termo língua(gem), com uso de parêntesis, pois considera-se que 
a linguagem é uma habilidade humana e a língua é uma forma de interação e de 
manifestação da linguagem, ambas estão imbricadas e as considera estreitamente 
associadas, e durante o percurso aqui estabelecido se trabalha com esse conceito 
de associação entre habilidade e interação (uso da habilidade da linguagem).
11
A LÍNGUA(GEM) E O FAZER PEDAGÓGICO Capítulo 1 
Adicionados aos diferentes entendimentos de linguagem e ao tempo de es-
colarização o processo de alfabetização e letramento e a aprendizagem da lín-
gua(gem) também são alvos das pesquisas e dos projetos de ensino, principal-
mente porque atrelado a estes processos está o fracasso escolar. 
Por isso, é de fundamental importância que se desenvolva uma prática de 
constante pesquisa e avaliação na área para que se possa conhecer e interpretar 
a realidade das atividades em torno da língua(gem) em sala de aula, com o obje-
tivo de implementar refl exões, propor soluções e contribuir, com subsídios teóri-
cos e práticos, no desenvolvimento da prática pedagógica tanto do processo de 
alfabetização e letramento quanto do ensino do Português enquanto componente 
curricular que ocorre na sequência da vida escolar (SOARES, 2017). 
Ao focalizar o olhar para o estudo da alfabetização e do letramento percebe-
-se ainda a existência de problemas vastos e complexos e que de algum modo 
devem sempre permanecer no foco da atenção, por exemplo: relação professor-
-aluno (o professor ainda é colocado como detentor do conhecimento), modelo 
tradicional de ensino (professor passa ensinamentos para os alunos), difi culdades 
de aprendizagem dos alunos no uso da língua escrita, difi culdades de produção 
de textos orais e escritos, problemas em leitura, em interpretação e compreensão 
de textos, pouco entendimento de gramática (aqui entendida como metalingua-
gem, não restrita a gramática normativa), língua padrão, variedades linguísticas, 
programas de ensino, metodologias de ensino, formação do professor, concep-
ções de língua/linguagem, entre tantos outros. Vamos procurar, no decorrer da 
disciplina, abordar alguns desses elementos e aos poucos você vai construindo 
suas respostas e entendimentos (GERALDI, 1995).
Neste capítulo, interessam-nos os estudos referentes aos modos de se con-
ceber a linguagem e suas implicações metodológicas no processo de alfabetiza-
ção e letramento, sendo que essas ações iniciais interferem em todo o processo 
subsequente do ensino de línguas em geral. 
Como faremos essa caminhada? Iniciaremos observando e estudando con-
ceitos de concepção de linguagem e suas infl uências no fazer pedagógico, ob-
servando como a linguagem é apresentada na Base Nacional Comum Curricular 
para as séries iniciais. Na sequência, continuaremos fazendo a distinção entre 
alfabetização e letramento, refl etindo sobre letramentos sociais e a escolarização 
do letramento.
Como questão prévia, podemos indagar: a concepção que se tem de lingua-
gem pode infl uenciar uma determinada prática pedagógica? Se respondermos po-
sitivamente, de que forma isso ocorre?
12
 Letramentos múltiplos na alfaBetização
De acordo com Gomes (2013), a forma como vemos a linguagem defi ne os 
caminhos de ser aluno e professor em processos de alfabetização e letramento, 
bem como na sequência dos estudos de língua portuguesa, por isso, há de se 
buscar coerência entre a concepção de linguagem e a de mundo. 
Para Geraldi (1995), por exemplo, focalizar a linguagem a partir do processo 
de interação, ou interlocução, e com esse olhar pensar o fazer pedagógico exige 
pensar a singularidade dos sujeitos e a sua constituição no tempo e no espaço. 
Por sua vez, Kato (1995) diz que o professor e suas atitudes e concepções são 
decisivas no processo de aprendizagem, para se confi gurar o tipo de intervenção 
nesse processo. 
Travaglia (1997) destaca que a concepção de linguagem e a de língua altera 
em muito o modo de estruturar o trabalho com a língua em termos de ensino e 
considera essa questão tão importante quanto a postura que se tem em relação à 
educação. Geraldi (1997b) afi rma que toda e qualquer metodologia de ensino ar-
ticula uma opção política com os mecanismos utilizados em sala de aula. Por sua 
vez, a opção política envolve uma teoria de compreensão da realidade, que para 
compreendermos essa realidade precisamos incluir uma concepção de linguagem 
que dá resposta ao para quê ensinamos o que ensinamos. 
Dentro desse universo perceptivo e complexo das pesquisas com linguagem, 
de forma mais direcionada para a alfabetização e o letramento, vários estudos 
mostram, ainda, que para além das questões ideológicas, nem sempre o profes-
sor está consciente da teoria linguística ou do método que embasa o seu trabalho. 
Muitas vezes, não ocorre uma refl exão sobre os pressupostos da metodologia 
que adota em sala de aula, chegando mesmo a não saber exatamente o que está 
fazendo e qual o objetivo pretendido com os seus procedimentos. 
Existe um universo quase infi nito de justifi cativas e motivos que levam a essa 
problemática (problemas de formação de professores), uma das justifi cativas 
pode ser a formação inicial e outra pode ser a pouca valorização da carreira do 
magistério em geral na educação básica e em outras esferas educacionais, exis-
tem muitos outros, mas que não vem ao caso, aqui.
O fato de o professor ter dúvidas sobre a sua base teórica, sobre qual posicio-
namento teórico dá sustentação para o seu trabalho pode se tornar um problema 
muito sério, pois não há um ensino dito de qualidade ou satisfatório sem o conhe-
cimento profundo da concepção de linguagem. A consequência do não domínio 
provoca dúvidas sobre o seu objeto específi co de estudo e ensino: a língua. Essa 
concepção (consciente ou não) interfere nos processos de ensino/aprendizagem, 
determinando questões e ações fundamentais que vão desde o planejamento até 
a avaliação do processo (o quê, como e para quê se ensina). Em outras pala-
13
A LÍNGUA(GEM) E O FAZER PEDAGÓGICO Capítulo 1 
vras, subjacente à prática pedagógica do professor, instaura-se, primeiramente, a 
sua concepção de língua/linguagem, e suas crenças sobre o que é ensinar uma 
língua, ainda que essa refl exão não seja consciente. 
Evidentementeque quando o professor escolhe um caminho para seguir, não 
quer dizer que ele desconheça tudo o que está em sua volta e que não possa re-
pensar suas escolhas e traçar novos caminhos, mas para que a mudança ocorra 
é preciso ter sensibilidade. A sensibilidade, a percepção e a intuição aguçadas 
caracterizam os profi ssionais dessa área e os tornam capazes de, a qualquer mo-
mento, refazer o traçado do próprio caminho. Essa retomada e o desenvolvimento 
dessa sensibilidade só ocorrem quando se avaliam constantemente os resultados 
alcançados comparados aos objetivos iniciais propostos, o que demanda constan-
te planejamento e retomada (SOARES, 2004).
Acredita-se que para que ocorra um processo de alfabetização e letramento 
adequado e, por conseguinte, o ensino de língua, seja altamente recomendado o 
profundo conhecimento da própria língua e das diferentes concepções que podem 
ser adotadas para se trabalhar com ela. O professor/professora que tem clara a 
concepção de língua(gem) pode traçar de forma mais clara também suas ações 
pedagógicas. 
Essa questão pode ser considerada o fenômeno central e determinante no 
processo de ensino/aprendizagem de língua materna e também de língua estran-
geira e estendida para o ensino da leitura e da escrita na alfabetização. Assim, é 
primordial que o professor, preocupado em implantar melhorias no ensino de le-
tramentos múltiplos em face dos objetivos pertinentes a esse ensino, saiba refl etir 
sobre os diferentes modos de se ensinar a língua; saiba analisar, à luz de uma 
teoria linguística, as diversas metodologias que se são usadas em sala de aula; 
conheça os elementos que dão forma à sua prática pedagógica; e, principalmen-
te, esteja consciente de que a sua opção metodológica para realizar e estruturar o 
ensino e o uso da língua em sala de aula tem relação direta com a sua concepção 
de língua/linguagem. 
Podemos dizer que cada momento social e histórico demanda uma percep-
ção de língua, de mundo, de sujeito, demonstrando o caráter dinâmico da lín-
gua(gem) no meio social em que atua. Bakhtin (1997), e o Círculo de estudos de 
Bakhtin, ao considerarem os paradigmas existentes nos momentos ideológicos os 
interpretaram, posteriormente demarcando-os como: Subjetivismo Idealista, Obje-
tivismo Abstrato e concepção dialógica de linguagem.
Geraldi (1984), um dos estudiosos dos pressupostos bakhtinianos no Brasil, 
buscou renomear tais concepções redefi nindo-os como: linguagem como expres-
são do pensamento, linguagem como instrumento de comunicação e linguagem 
14
 Letramentos múltiplos na alfaBetização
como forma de interação. Estas foram estudadas e tiveram suas características 
ampliadas para a realidade brasileira do ensino de línguas.
Uma indicação de leitura sobre o tema é: Portos de Passagem,
o qual pode ajudar na compreensão desse posicionamento. 
Para quem ainda não leu, a referência é: GERALDI, J. W. Por-
tos de passagem. 3 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
Quando nos dedicamos a estudar linguagem, percebemos que existem vários 
caminhos e muitas trilhas teóricas que podemos percorrer e, embora todas tenham 
como objetivo, ou alvo, a língua e seus usos, cada qual preserva suas riquezas e 
surpresas. É como nos colocar em movimento para atingir o ápice de uma monta-
nha ou nos deslocarmos de um lugar para o outro, são pouquíssimos os lugares 
que se chega por um único caminho e, ainda quando há apenas um caminho, as 
formas de percorrê-lo podem ser muito diversas. Dentro das trilhas e dos caminhos 
da linguística que nos levam a olhar de algum modo para a alfabetização e ao letra-
mento, existem pelo menos três vias conceituais apresentadas por Geraldi (1984) a 
partir da leitura da obra de Bakhtin (1997), que destacamos aqui: 
• Compreender a linguagem como instrumento de comunicação.
• Inferir e considerar a linguagem como uma forma de expressão do pen-
samento.
• Reconhecer a linguagem como um processo de interação. 
Vamos tratar de cada uma delas a seguir. Sem esquecer que tais conceitos 
não se restringem ou não se limitam a atuação de um/uma professor(a) em uma 
determinada série ou ano escolar, nem tão pouco a uma idade específi ca, ao con-
trário, ter essa compreensão da linguagem ajuda ao professor ter mais noção de 
seu fazer pedagógico em qualquer sala de aula.
15
A LÍNGUA(GEM) E O FAZER PEDAGÓGICO Capítulo 1 
FIGURA 1 – CONCEPÇÕES DE LINGUAGEM
FONTE: O autor (2020).
Em a) é necessário que o professor compreenda o processo; em b) O pro-
fessor precisa inferir e considerar que a linguagem provém do pensamento tanto 
prévio quanto conquistado com base teórica; em c) é preciso que o professor per-
ceba que a linguagem, a alfabetização, o letramento, tanto social quanto digital e 
todo o processo de leitura é um movimento de interação. 
A seguir especifi cam-se mais características de cada uma das vias conceitu-
ais, iniciando-se pela linguagem como instrumento de comunicação.
2.1 A LINGUAGEM É INSTRUMENTO 
DE COMUNICAÇÃO
Quando olhamos para a linguagem e a entendemos como instrumento de 
comunicação, devemos buscar suporte na Teoria da Comunicação, que segundo 
Martins: 
É preciso, desde logo, advertir para o fato de que o campo da 
comunicação é difuso quanto à sua natureza epistemológica. 
Tanto pode ser recortado enquanto campo científi co (ciências 
sociais aplicadas) quanto pode ser encarado como um conjunto 
16
 Letramentos múltiplos na alfaBetização
de segmentos prático-corporativos, composto por profi ssionais 
de comunicação (jornalistas, radialistas, publicitários, relações 
públicas, cineastas, apresentadores, produtores, etc.), ou ainda 
como um campo do ‘saber político’ das instituições direta ou 
indiretamente implicadas na gestão ou no controle dos mass 
media (MARTINS, 2005, p.5).
Segundo o autor, trata-se de um campo amplo e que pode ser interdisciplinar. 
Ainda que não exclusivamente, mas basicamente esse é o posto de observação 
que nos permite vislumbrar melhor essa parte do território. Diferentes autores pes-
quisam e defendem a teoria da comunicação em que a língua é vista como sistema 
organizado de sinais (signos) que serve como meio de comunicação (meio para 
passar uma mensagem) entre os indivíduos, esse conceito de língua como código 
é construído por Saussure (1969) em sua obra denominada Linguística Geral. Em 
outras palavras, a Língua é um código, um conjunto de signos, combinados através 
de regras, que possibilita ao emissor transmitir certa mensagem ao receptor. 
Podemos encontrar mais informações em Saussure (1969), indicado nas re-
ferências. Mesmo dentro das teorias que adotam a língua como meio de comuni-
cação, existem várias escolas e várias trilhas teóricas que podem ser percorridas 
para justifi car determinadas escolhas e determinados passos dados, não é o obje-
tivo aqui estudar essas escolas. 
Dentro das diferentes escolas é ponto comum que a comunicação, no entan-
to, só é estabelecida quando emissor e receptor conhecem e dominam o código, 
que é utilizado de maneira preestabelecida e convencionada (que não dependem 
necessariamente dos sujeitos envolvidos, pois é algo que está além deles). 
Quanto a essa visão, Bakhtin (1997, p. 78) diz que 
[...] o sistema linguístico [...] é completamente independente de 
todo ato de criação individual, de toda intenção ou desígnio. [...] 
A língua opõe-se ao indivíduo enquanto norma indestrutível, 
peremptória, que o indivíduo só pode aceitar como tal. 
Ou seja, nesse caminho, o sistema linguístico é acabado, no sentido da to-
talidade das formas fonéticas, gramaticais e lexicais da língua, garantindo a sua 
compreensão pelos locutores de uma comunidade, para isso basta conhecer o 
sistema em si.
Dentro dessa forma de pensar a língua(gem), são privilegiadas então a for-
ma, o aspecto material da língua e as relações que constituem o sistema linguísti-
co em si. Essa estrada não leva muito em consideração o conteúdo da mensagem 
em si, esse é colocado em segundo plano e juntocom ele são colocadas em 
segundo plano a signifi cação e os elementos extralinguísticos. 
17
A LÍNGUA(GEM) E O FAZER PEDAGÓGICO Capítulo 1 
Para quem quiser saber mais sobre essa forma de entender a língua(gem), 
consultem, por exemplo: Borba (1998), Cabral (1988), Orlandi (1986), Lopes 
(1979) e Roulet (1972) indicados nas referências adicionais. A fundamentação te-
órica desses estudos está tomando como ponto de partida os autores Ferdinand 
de Saussure, fundador do Estruturalismo, no início do século passado e de Noam 
Chomsky, linguista americano que conduziu a gramática gerativo-transformacio-
nal. Entrar na rota do estruturalismo demanda incluir outras trilhas teóricas e é 
outro papo, aqui se colocam apenas duas observações sobre os dois autores.
 Saussure (1969, p. 22), estabelece novos parâmetros para o estudo da lín-
gua e também estabelece que a língua é um sistema abstrato, homogêneo, um 
fato social, geral e virtual. Ao mesmo tempo, a língua é considerada uma realida-
de psíquica e uma instituição social que é “exterior ao indivíduo, que por si só, não 
pode nem criá-la nem modifi cá-la”. Por ser um fato social, “um sistema de signos 
que exprimem ideias”, caracterizar-se por sua “natureza homogênea” e impor-se 
ao indivíduo coercitivamente, a língua se constitui em um elemento de organiza-
ção social, prestando-se, portanto, a um estudo sistemático. 
Chomsky (2002), por sua vez, enfatiza e estabelece uma visão mais interna-
lista da linguagem e considera que a linguagem humana é um objeto biológico e 
que deve ser observada e analisada a partir das metodologias das ciências na-
turais, mesmo estabelecendo algumas críticas ao estruturalismo acaba se apro-
ximando de algum modo, pois também vê a língua como um sistema, mesmo 
que seja um sistema que envolva a criatividade; dessa criatividade surge o termo 
gramática gerativa, porque permite que com um número fi nito de categorias e de 
regras (Competência), o locutor-ouvinte de uma língua possa gerar e interpretar 
um número infi nito de frases dessa língua. 
Ao introduzir os conceitos de competência e de performance (o uso da lín-
gua em situações concretas ou a concretização da competência através da fala 
e da escrita), Chomsky se aproxima do conceito saussuriano de língua e de fala,
porém, substitui uma concepção estática da língua por uma concepção dinâmica.
Em relação a essas perspectivas, podemos dizer que alguns aspectos fi ca-
ram de fora, ou seja, não foram contemplados, por isso é que foi dito anterior-
mente que cada caminho apresenta suas particularidades riquezas e surpresas. 
Deixar algo de lado é próprio da evolução das pesquisas, são escolhas, isso pode 
ocorrer por conta do tempo no qual foi construída essa análise. Pois, foi posterior 
aos precursores que vieram novos estudos na área, novos questionamentos e 
com isso novas formas de entender e compreender a linguagem. 
Atualmente, podemos ter base teórica para dizer que o indivíduo e toda sua 
bagagem cultural e intelectual é o centro do conhecimento e consecutivamente do 
18
 Letramentos múltiplos na alfaBetização
aprendizado em qualquer nível de estudo. Para Orlandi (1986, p. 48), “os recortes 
e exclusões feitos por Saussure e por Chomsky deixam de lado a situação real 
de uso (a fala, em um, e o desempenho, no outro) para fi car com o que é virtual e 
abstrato (a língua e a competência)”. Isolam o homem, portanto, de seu contexto 
social, uma vez que não reconhecem as condições de produção dos enunciados.
Essa perspectiva, ou forma de entender a linguagem, também é conhecida 
historicamente como estruturalista, justamente por privilegiar as estruturas e as 
formas, tanto Saussure quanto Chomsky optaram por seguir esse caminho e ao 
fazer essa escolha deixaram de lado, ou não analisaram de forma sufi ciente o pa-
pel do falante no sistema linguístico, ou seja, não observaram e não destacaram o 
papel dos interlocutores, mas estabeleceram emissores e receptores, codifi cado-
res e decodifi cadores da linguagem. A visão estruturalista pauta-se no estudo do 
funcionamento interno da língua e separa o falante de seu contexto social. 
O que isso muda concretamente no estudo do letramento? Esse modelo 
toma por base uma comunidade linguística homogênea em que os falantes e os 
ouvintes são sujeitos ideais (são sujeitos padronizados) e também não considera 
as questões de variação linguística, logo, na sala de aula teremos sujeitos iguais 
com capacidades iguais e o professor pode fazer as mesmas atividades par todos 
da mesma forma e todos deverão chegar aos mesmos resultados. Com essa for-
ma de pensar, é como se o professor tivesse diante de si alunos não críticos e que 
aceitam o que o professor coloca como verdade. 
A seguir, mais informações sobre a segunda forma de entender a linguagem, 
indicada no início da seção, a linguagem como expressão do pensamento.
2.1.1 A Linguagem é a expressão do 
pensamento
A linguagem como expressão do pensamento é uma perspectiva teórica que 
compõem um movimento denominado estruturalista, referenciados no tópico an-
terior. Para os estruturalistas, a Língua é concebida como um sistema de normas, 
acabado, fechado, abstrato e sem interferência do social. 
A concepção de linguagem como expressão do pensamento se fundamenta, 
de acordo com Perfeito (2005), na tradição gramatical grega, passando pelos lati-
nos, pela Idade Média e pela Moderna. 
Para essa concepção, de acordo com Travaglia (1996, p. 21),
19
A LÍNGUA(GEM) E O FAZER PEDAGÓGICO Capítulo 1 
[...] as pessoas não se expressam por bem porque não 
pensam. A expressão se constrói no interior da mente, sendo 
sua exteriorização apenas uma tradução. A enunciação é um 
ato monológico, individual, que não é afetado pelo outro nem 
pelas circunstâncias que constituem a situação social em que 
a enunciação acontece.
Nessa linha teórica, entende-se que na mente do indivíduo, primeiramente, 
há a enunciação e depois a linguagem, fazendo dela uma atividade monológica 
e individualista (SILVA; COX, 2002). Logo, segundo Bakhtin (1997), demarca-se 
a visão de subjetivismo idealista, na qual as leis da criação linguística são essen-
cialmente aquelas da psicologia individual, fazendo com que a enunciação ganhe 
o percurso do interior para o exterior, não considerando os fatores externos à co-
municação, como o interlocutor. A língua é concebida, assim, como um produto 
acabado, um sistema estável, um depósito inerte (BAKHTIN, 1997).
A partir desse pressuposto, de que a língua é a expressão do pensamento, 
admitimos que quando uma pessoa apresenta difi culdade para se expressar é 
porque na verdade ela apresenta alguma difi culdade para organizar os seus pen-
samentos, os mais radicais diriam que o sujeito não sabe se expressar porque 
não sabe pensar.
Esse entendimento revela que a linguagem funciona como “espelho” do pen-
samento. O fato linguístico, a exteriorização do pensamento por meio de uma lin-
guagem articulada e organizada, é explicado como um ato de criação individual 
e de bom funcionamento do cérebro, o que também é verdade, principalmente se 
tomarmos os caminhos conduzidos pelas bases as teóricas dos estudos da neu-
rolinguagem, neurolinguística e psicolinguística. 
A expressão exterior depende apenas do conteúdo interior, do pensamento 
da pessoa e de sua capacidade de organizá-lo de maneira lógica. Por isso, acre-
dita-se que o pensar logicamente, resultando na lógica da linguagem, deve ser in-
corporado por regras a serem seguidas, sendo que essas regras se situam dentro 
do domínio do estudo gramatical normativo ou tradicional, que defende que saber 
língua é saber teoria gramatical (FERNANDES, 2004).
Nesse campo, ganha espaço o estudo da gramática normativa. Nas pala-
vras de Franchi (1991, p. 48), a gramática normativa é “o conjunto sistemático de 
normas para bem falar e escrever, estabelecidas pelos especialistas, com base 
no uso da língua consagrado pelos bons escritores.”. Essa definição faz com que 
haja a adesão e a aceitação de que os princípios lógicos da linguagem são di-
tados pela gramática normativa, sendo tais fenômenos da linguagem avaliados 
e classifi cados como “certos” e “errados”, privilegiando algumas formas linguísti-
cas em detrimento de outras. Dessa forma, acredita-se que quem fala ou escreve 
20
 Letramentos múltiplos na alfaBetização
bem, seguindo e dominando as normas que compõem a gramática da língua, é 
um indivíduo que organiza logicamente o seu pensamento.
 Na prática, o letramento sob essa ótica é um letramento para a metalingua-
gem, ou seja, não é algo descartável ou totalmente dispensável quando se estuda 
e se aprende a ler e escrever, é um conhecimento necessário, muitas vezes o 
problemático é como fazer isso sem ser totalmente desconectado da realidade 
dos sujeitos envolvidos.
Na escola, ao conceber a língua como um sistema fechado, como um siste-
ma de normas, acabado, abstrato e sem interferência do social como o defendido 
na concepção da Língua como expressão do pensamento, temos como resultado 
a tendência de olhar e considerar apenas a Língua como um mecanismo que 
apresenta uma forma correta, padronizada, concebida também como variedade 
padrão ou culta, ignorando todas as outras formas de uso da Língua, ou seja, o 
estudo se volta para a gramática normativa sem abertura para a discussão de 
outros elementos que compõem a linguagem (não estamos aqui nos referindo às 
regras e normas de escrita e seus padrões). 
Outro aspecto não considerado ao se entender a linguagem como expres-
são do pensamento, é o da manifestação das diferentes formas de falar, mar-
cadas por regionalismos e outros aspectos geográfi cos. As formas de variação 
linguísticas são entendidas aqui como erros ou desvios da língua padrão pauta-
da nos modelos literários, na língua literária artística. Decorre daí o não estabe-
lecimento, portanto, de uma relação com a língua viva do nosso tempo e com o 
uso do nosso cotidiano. As línguas, nesse caso, obedecem a princípios gerais 
racionais, lógicos e a linguagem é regida por esses princípios. As escritas dos 
alunos em sala de aula são pautadas em erros e acertos e não em processos de 
desenvolvimento continuados.
Assim, impõe-se a exigência de que os falantes a usem com clareza e preci-
são, pois ideias claras e distintas devem ser expressas de forma lógica, precisa, 
sem equívocos e sem ambiguidades, buscando a perfeição (FERNANDES, 2004).
De acordo com Koch (2002, p.13), “à concepção de língua como representa-
ção do pensamento corresponde a de sujeito psicológico, individual, dono de sua 
vontade e de suas ações”. Para ela, como esse sujeito é dono absoluto de seu 
dizer e de suas ações, 
o texto é visto como um produto – lógico – do pensamento [...] 
do autor, nada mais cabendo ao leitor/ouvinte senão “captar” 
essa representação mental, juntamente com as intenções (psi-
cológicas) do produtor, exercendo, pois, um papel essencial-
mente passivo (KOCH, 2002, p. 16). 
21
A LÍNGUA(GEM) E O FAZER PEDAGÓGICO Capítulo 1 
Veja, a mudança não é só na oralidade, ela se dá por extensão na concepção 
de texto, na forma de organização da escrita e em toda forma de aprender e ensi-
nar envolvidos.
Sobre esta temática, sugere-se a leitura:
CHOMSKY, N. Novos horizontes no estudo da linguagem e da 
mente. Tradução de SANT’ANNA, Marco Antônio. São Paulo: Ed 
Unesp Cambridge University Press, 2002. 
Perceba que as duas formas de conceber a língua(gem) apresentadas até o 
momento tomam por base os conceitos do estruturalismo e entendem a Língua 
como um sistema estruturado, mas há outros elementos teóricos que as diferen-
cia, em uma a estrutura é meio de comunicação e em outra a estrutura é forma de 
expressão do pensamento. Por fi m, vamos à terceira via conceitual que trata da 
concepção da linguagem como forma de interação: 
2.2 A LINGUAGEM COMO FORMA DE 
INTERAÇÃO
Relembrando, na construção de conceitos e concepções da linguagem te-
mos: A linguagem como instrumento de comunicação; A linguagem como expres-
são do pensamento e a terceira concepção de linguagem, desenvolvida no Círcu-
lo de Bakhtin, que defende que o locus da linguagem é a interação. 
Segundo Bakhtin (1997), a língua constitui-se como processo ininterrupto, 
realizado através da interação verbal, social, entre interlocutores, não sendo um 
sistema estável de formas normativamente idênticas. Assim, os sujeitos são vistos 
como agentes sociais, pois é por meio de diálogos entre os indivíduos que ocor-
rem as trocas de experiências e conhecimentos.
Para Travaglia (1997, p. 23), “nessa concepção, o que o indivíduo faz ao usar 
a língua não é tão-somente traduzir e exteriorizar um pensamento ou transmitir 
informações a outrem, mas sim realizar ações, agir, atuar sobre o interlocutor (ou-
vinte/leitor)”. 
22
 Letramentos múltiplos na alfaBetização
Nesse enfoque, a concepção interacionista da linguagem faz oposição às vi-
sões estruturalistas e conservadoras da língua, que a concebem, como dito aci-
ma, quando tratamos da língua enquanto manifestação do pensamento ou como 
instrumento de comunicação, em que a Língua é vista como um objeto autônomo, 
sem história e sem interferência do social. Para a visão interacionista, não consi-
derar a realização de ações linguistas (o fazer com a língua(gem)) o atuar sobre a 
língua(gem) é desconsiderar a realidade e o contexto dos sujeitos e isso deixa de 
contemplar aspectos relevantes de toda ação possível com a língua(gem). 
Ao contrário das concepções anteriores (língua enquanto manifestação do 
pensamento ou como instrumento de comunicação), a língua(gem) como forma 
de interação, situa a linguagem como um lugar de interação humana, como o 
lugar de constituição de relações sociais em que tudo está interligado e se auto 
infl uenciando. 
Portanto, quando elegemos o trabalho dos sujeitos com a linguagem como 
fi o condutor das refl exões não estamos nem colocando o sujeito como o todo po-
deroso, ou seja, o produtor único dos sentidos, nem tão pouco o colocando como 
o nada, como ser assujeitado a uma estrutura de um sistema linguístico fechado. 
Segundo Geraldi (2003, p.16), “os sujeitos não podem ser concebidos como 
“autômatos sintáticos”, “monstros da gramática” e também – e no mesmo sentido 
– não podem ser concebidos como meros porta-vozes da hegemonia discursiva 
de seu tempo. 
Assim, é colocado em evidencia e no centro da refl exão, um conjunto amplo 
de aspectos relevantes, sendo: as condições de produção do discurso, o social, 
o sujeito da linguagem, as relações de sentido estabelecidas entre os interlocuto-
res, a dialogia, a intenção, a argumentação, a ideologia, a historicidade da lingua-
gem e seus diferentes modos de uso. 
Em tal contexto aceita-se, e mais do que aceitar, acredita-se que o fazer lin-
guístico ocorre pela interação comunicativa mediada pela produção de efeitos de 
sentido entre interlocutores, sendo que todos os interlocutores ocupam um lugar 
no mundo, um lugar social e uma dada situação em um contexto sócio histórico 
e ideológico em que a compreensão é o objetivo do próprio ensino de Língua e 
leitura e que para que ele ocorra, se faz primordial que dentro do processo de 
aquisição da linguagem, da alfabetização e do letramento, tenha-se a interação 
(LEFFA, 1996).
Nestas ações interativas, pode-se dizer que há ações que os sujeitos fazem 
com a linguagem e ações que fazem sobre a linguagem, principalmente se pen-
sarmos em ações de alfabetização e letramento há sempre um fazer com e um fa-
23
A LÍNGUA(GEM) E O FAZER PEDAGÓGICO Capítulo 1 
zer sobre. Além de existir também, principalmente quando pensamos em agencia-
mento de recursos expressivos, uma ação da linguagem em si. Com a linguagem 
não só representamos o real e produzimos sentido, mas representamos a própria 
linguagem (GERALDI, 2003).
Nesse sentido, ainda de acordo com Geraldi (2003), a aprendizagem da lin-
guagem é um ato de reflexão sobre a linguagem, podemos compreender, por-
tanto, que não se domina uma língua apenas por incorporarmos em nossas vi-
das um conjunto de itens lexicais (saber um número elevado de palavras) e nem 
pela aprendizagem de um conjunto de regras (dominar a gramática normativa) 
as ações e interações linguísticas que praticamos constantemente em nosso co-
tidiano estão envoltas de refl exão, pois compreender a fala do outro e se fazer 
compreender pelo outro não é tarefa aleatória, mas nem por isso devemos deixar 
de lado o conhecimento metalinguístico e as outras demandas do processamento 
da linguagem.
Podemos dizer então que aqui, nesta forma de compreender a língua, o pro-
fessor pode oferecer exercícios contínuos de descrição gramatical e estudo de 
terminologias e regras que privilegiam tão somente a forma das palavras ou a 
sintaxe da língua, ofereça a possibilidade de estudar o uso da língua em situações 
concretas de interação, percebendo as diferenças de sentido entre uma forma de 
expressão e outra. A língua, nesse caso, é, em certa medida, o refl exo das rela-
ções sociais e da interação entre leitor e texto (LEFFA, 1996). 
De acordo com o contexto e com o objetivo específi co da enunciação, é que 
ocorre uma forma de expressão ou outra, aceitando-se dessa forma o conceito de 
variação linguística e suas implicações, não como erro ou desvios de padrão, mas 
como movimento de transformação e mudança que ocorrem naturalmente nas 
línguas a medida que os sujeitos se modifi cam. 
Em outras palavras, é preciso deixar claro para os estudantes que o locutor 
constrói o seu discurso mediante as suas necessidades enunciativas concretas, 
escolhendo formas linguísticas que permitam que seu discurso seja adequado 
num dado contexto e possa circular livremente nele. Para que haja essa adequa-
ção é indispensável que o locutor leve em consideração o seu interlocutor, não só 
da imagem aparente que tem dele, mas também de tal modo que a construção do 
discurso atinja o objetivo pretendido. 
Nas palavras de Koch (2002, p.9), a concepção de linguagem como forma 
(lugar) de ação ou interação: 
[...] é aquela que encara a linguagem como atividade, como 
forma de ação, ação interindividual fi nalisticamente orientada; 
24
 Letramentos múltiplos na alfaBetização
como lugar de interação que possibilita aos membros de uma 
sociedade a prática dos mais diversos tipos de atos, que vão 
exigir dos semelhantes reações e ou comportamentos.
Partindo dessa concepção, uma proposta de ensino de língua deve valorizar 
o uso da língua nas diferentes situações sociais, com sua diversidade de funções 
e sua variedade de estilos e modos de falar. Para estar de acordo com essa con-
cepção, é importante que o trabalho em sala de aula se organize em torno do 
uso e que privilegie a refl exão dos alunos sobre as diferentes possibilidades de 
emprego da língua. 
Isso implica, certamente, a rejeição de uma tradição de ensino apenas trans-
missiva, isto é, preocupada em oferecer ao aluno conceitos e regras prontos, que 
ele só tem que memorizar, e de uma perspectiva de aprendizagem centrada em 
automatismos e reproduções mecânicas centradas no conhecimento do profes-
sor. Por isso, uma adequada proposta para o ensino de língua deve prever não 
só o desenvolvimento de capacidades necessárias às práticas de leitura e escrita, 
mas também de fala e escuta compreensiva em situações públicas (a própria aula 
é uma situação de uso público da língua).
Colocadas esses entendimentos da língua(gem) (expressão do pensamento, 
comunicação e interação) que interferem no fazer pedagógico, podemos nos ques-
tionar: quais outras forças, interferem no processo de alfabetização e letramento? 
Dentre muitas forças, temos a força da legislação e da normatização do currículo, 
do projeto político pedagógico, da Lei de Diretrizes de Base - LDB, dentre outros. 
O objetivo não é propor que você estude todos os documentos e nem a le-
gislação que regulam a educação básica no Brasil para entender a língua(gem) 
predominante, seja nos documentos regulatórios, seja nas leis ou nas diretrizes 
que orientam o ensino, especialmente o Ensino Básico. Apresenta-se a seguir um 
fragmento de texto da Base Nacional Comum Curricular – BNCC, documento com 
diretrizes por áreas do conhecimento que apresenta competências e habilidades 
a serem desenvolvidas pelos alunos da Educação Básica. O objetivo é exempli-
fi car como a concepção de língua(gem) é contemplada e apresentada no docu-
mento, lembrando que o documento não é uma lei regulatória, é um documento 
amparado pela LDB e dá indicações para que o ensino se torne mais homogêneo 
no território nacional.
Qual será a concepção de língua(gem) em um dos documentos mais recen-
tes: a BNCC no limite dos anos iniciais? A seguir observaremos e faremos a lei-
tura de um fragmento do texto da BNCC relacionado a linguagem para os anos 
iniciais.
25
A LÍNGUA(GEM) E O FAZER PEDAGÓGICO Capítulo 1 
2.3 A LINGUAGEM NA BNCC PARA 
ANOS INICIAIS
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) estabelece as competências ge-
rais da educação básica, aponta caminhos para o fazer pedagógico e indica os 
campos de experiências e as áreas de aprendizagem. Neste momento, faremos 
apenas um apanhado geral sobre a Etapa do Ensino Fundamental no que diz 
respeito à área de linguagens. Não será uma leitura e análise profunda da obra, 
ainda que se considere muito importante para quem trabalha com educação. 
Para quem ainda não conhece, deem uma olhada e leiam as 
partes relacionadas com o seu fazer pedagógico ou com sua área de 
conhecimento. 
O texto completo da BNCC está disponível em: https://bit.ly/3m-
BZ1Wu.
A seguir, incluímos a introdução do capítulo 4.1 A área de linguagens, da 
BNCC, Brasil (2017, p. 63-64). O objetivo é que você faça a leitura tentando iden-
tifi car a predominância da concepção de língua(gem). Qual é a visão ou a concep-
ção de linguagem que predomina nessa parte do documento (expressão do pen-
samento, comunicação ou interação)? Será que a concepção adotada prevalece 
em todo o documento?
4.1. A ÁREA DE LINGUAGENS
As atividades humanas realizam-se nas práticas sociais, mediadas por 
diferentes linguagens: verbal (oral ou visual-motora, como Libras, e escrita), 
corporal, visual, sonora e, contemporaneamente, digital.
Por meio dessas práticas, as pessoas interagem consigo mesmas 
e com os outros, constituindo-se como sujeitos sociais. Nessas intera-
26
 Letramentos múltiplos na alfaBetização
ções, estão imbricados conhecimentos, atitudes e valores culturais, mo-
rais e éticos.
Na BNCC, a área de Linguagens é composta pelos seguintes compo-
nentes curriculares: Língua Portuguesa, Arte, Educação Física e, no Ensino 
Fundamental – Anos Finais, Língua Inglesa. A fi nalidade é possibilitar aos 
estudantes participar de práticas de linguagem diversifi cadas, que lhes per-
mitam ampliar suas capacidades expressivas em manifestações artísticas, 
corporais e linguísticas, como também seus conhecimentos sobre essas 
linguagens, em continuidade às experiências vividas na Educação Infantil.
As linguagens, antes articuladas, passam a ter status próprios de obje-
tos de conhecimento escolar. O importante, assim, é que os estudantes se 
apropriem das especifi cidades de cada linguagem, sem perder a visão do 
todo no qual elas estão inseridas. Mais do que isso, é relevante que com-
preendam que as linguagens são dinâmicas, e que todos participam desse 
processo de constante transformação.
No Ensino Fundamental – Anos Iniciais, os componentes curriculares 
tematizam diversas práticas, considerando especialmente aquelas relativas 
às culturas infantis tradicionais e contemporâneas. Nesse conjunto de práti-
cas, nos dois primeiros anos desse segmento, o processo de alfabetização 
deve ser o foco da ação pedagógica.
Afi nal, aprender a ler e escrever oferece aos estudantes algo novo e 
surpreendente: amplia suas possibilidades de construir conhecimentos nos 
diferentescomponentes, por sua inserção na cultura letrada, e de participar 
com maior autonomia e protagonismo na vida social.
Por sua vez, no Ensino Fundamental – Anos Finais, as aprendiza-
gens, nos componentes curriculares dessa área, ampliam as práticas de 
linguagem conquistadas no Ensino Fundamental – Anos Iniciais, incluindo 
a aprendizagem de Língua Inglesa. Nesse segmento, a diversifi cação dos 
contextos permite o aprofundamento de práticas de linguagem artísticas, 
corporais e linguísticas que se constituem e constituem a vida social.
É importante considerar, também, o aprofundamento da refl exão críti-
ca sobre os conhecimentos dos componentes da área, dada a maior capa-
cidade de abstração dos estudantes. Essa dimensão analítica é proposta 
não como fi m, mas como meio para a compreensão dos modos de se ex-
pressar e de participar no mundo, constituindo práticas mais sistematizadas 
27
A LÍNGUA(GEM) E O FAZER PEDAGÓGICO Capítulo 1 
de formulação de questionamentos, seleção, organização, análise e apre-
sentação de descobertas e conclusões.
Considerando esses pressupostos, e em articulação com as compe-
tências gerais da Educação Básica, a área de Linguagens deve garan-
tir aos alunos o desenvolvimento de competências específi cas (BRASIL, 
2007, p. 63-64). 
COMPETÊNCIAS ESPECÍFICAS DE LINGUAGENS 
PARA O ENSINO FUNDAMENTAL
1. Compreender as linguagens como construção humana, histórica, 
social e cultural, de natureza dinâmica, reconhecendo-as e valorizando-as 
como formas de signifi cação da realidade e expressão de subjetividades e 
identidades sociais e culturais.
2. Conhecer e explorar diversas práticas de linguagem (artísticas, 
corporais e linguísticas) em diferentes campos da atividade humana para 
continuar aprendendo, ampliar suas possibilidades de participação na vida 
social e colaborar para a construção de uma sociedade mais justa, demo-
crática e inclusiva.
3. Utilizar diferentes linguagens – verbal (oral ou visual-motora, como 
Libras, e escrita), corporal, visual, sonora e digital –, para se expressar e 
partilhar informações, experiências, ideias e sentimentos em diferentes 
contextos e produzir sentidos que levem ao diálogo, à resolução de confl i-
tos e à cooperação.
Você deve ter percebido, ao ler o documento, ou pelo menos o fragmento 
aqui colocado, que a língua(gem) permeia o fazer pedagógico. Você deve ter se 
dado conta também que a concepção predominante é a de que a língua é um 
meio de interação e que as atividades humanas são mediadas pela linguagem e a 
refl exão sobre a língua é necessária, não como um fi m em si mesma, mas como 
uma forma de participar do mundo.
No fi nal do fragmento, o documento afi rma que a área da linguagem deve 
garantir ao aluno o desenvolvimento de competências específi cas. São apresen-
tadas como competências específi cas para os anos iniciais:
28
 Letramentos múltiplos na alfaBetização
4. Utilizar diferentes linguagens para defender pontos de vista que res-
peitem o outro e promovam os direitos humanos, a consciência socioam-
biental e o consumo responsável em âmbito local, regional e global, atuan-
do criticamente frente a questões do mundo contemporâneo.
5. Desenvolver o senso estético para reconhecer, fruir e respeitar as di-
versas manifestações artísticas e culturais, das locais às mundiais, inclusive 
aquelas pertencentes ao patrimônio cultural da humanidade, bem como parti-
cipar de práticas diversifi cadas, individuais e coletivas, da produção artístico-
-cultural, com respeito à diversidade de saberes, identidades e culturas.
6. Compreender e utilizar tecnologias digitais de informação e comuni-
cação de forma crítica, signifi cativa, refl exiva e ética nas diversas práticas 
sociais (incluindo as escolares), para se comunicar por meio das diferentes 
linguagens e mídias, produzir conhecimentos, resolver problemas e desen-
volver projetos autorais e coletivos (BRASIL, 2007, p. 65
Atividade de Estudo:
1 - Para pensar e refl etir 
Retomando o que foi colocado no início do estudo: podemos di-
zer que cada momento social e histórico demanda uma percepção 
de língua, de mundo, de sujeito, demonstrando o caráter dinâmico da 
língua(gem) no meio social em que atua. Bakhtin (1997), e os colabo-
radores de seu Círculo de estudos ao considerarem os paradigmas 
existentes nos momentos ideológicos, os interpretaram, demarcan-
do-os como: Subjetivismo Idealista, Objetivismo Abstrato e concep-
ção dialógica de linguagem. 
Geraldi (1984), um dos estudiosos dos pressupostos bakhti-
nianos, no Brasil, buscou renomear tais concepções redefi nindo-os 
como: linguagem como expressão do pensamento, linguagem como 
instrumento de comunicação e linguagem como forma de interação. 
Estas foram estudadas e tiveram suas características ampliadas à 
realidade brasileira de ensino de línguas.
De acordo com o texto, aponte as principais características 
de cada uma das concepções.
29
A LÍNGUA(GEM) E O FAZER PEDAGÓGICO Capítulo 1 
Para quem quiser se aprofundar no tema sugere-se a leitura: 
BARBOSA, J. J. Alfabetização e leitura. São Paulo: Cortez, 
1994.
COELHO, N. N. Literatura Infantil: teoria – análise – didática. 
São Paulo: Ática, 1997.
SILVA, E. T. O ato de ler: fundamentos psicológicos para 
uma nova pedagogia da leitura. São Paulo: Cortez, 1981.
SOARES, M. B. As condições sociais da leitura: uma refl exão 
em contraponto. In: ZILBERMAN, R.; SILVA, E. T. Leitura: perspecti-
vas interdisciplinares. São Paulo: Ática, 2004. p. 18-29.
SOUZA, A. C. Cognição, Aprendizagem e Língua. Parte I. In:
SOUZA, A. C.; GARCIA, W. A. C. A produção dos sentidos e o lei-
tor: os caminhos da memória. 1. ed. Florianópolis: NUP/CED/UFSC, 
2012. p. 21-105.
Na próxima seção faremos uma distinção entre alfabetização e letramento. 
30
 Letramentos múltiplos na alfaBetização
3 DISTINGUINDO ALFABETIZAÇÃO E 
LETRAMENTO
FIGURA 2 – ALFABETIZAR E LETRAR, HÁ DIFERENÇA?
FONTE: O autor (2020).
Atualmente, nas culturas letradas, é praticamente impensável que uma crian-
ça, desde pouco tempo após seu nascimento e em todo seu processo de desen-
volvimento, incluindo a educação infantil, não participe de diferentes práticas e 
vivências em que as letras, a leitura e a escrita não se faça presente. Entretanto, 
é nos anos iniciais, especialmente no 1º e no 2º ano do Ensino Fundamental que 
se espera que ela seja alfabetizada. Tornar-se alfabetizado, de algum modo, é um 
tipo de nascimento, é o nascimento para o mundo das letras.
A escola, em sua essência, é o lugar privilegiado para a alfabetização e para 
o letramento. Aprender a ler e a escrever demandam tempo e ações bem coorde-
nadas. É um processo relativamente lento e trabalhoso, mas que dada a existên-
cia de diferenças individuais se concretiza de modo diverso para cada indivíduo. 
31
A LÍNGUA(GEM) E O FAZER PEDAGÓGICO Capítulo 1 
Nesse processo, é preciso que os estudantes conheçam o alfabeto e a mecâ-
nica da escrita e da leitura – processos que visam a alguém que (se) torne alfabe-
tizado, ou seja, consiga “codifi car e decodifi car” os sons da língua (fonemas) em 
material gráfi co (grafemas ou letras), o que envolve o desenvolvimento de uma 
consciência fonológica (dos fonemas do português do Brasil e de sua organização 
em segmentos sonoros maiores como sílabas e palavras) e o conhecimento do 
alfabeto do português do Brasil em seus vários formatos (letras imprensa e cursi-
va, maiúsculas e minúsculas), além do estabelecimento de relações grafofônicas 
entre esses dois sistemas de materialização da língua.
Alfabetizar é trabalhar com a apropriação pelo aluno da ortografi a do por-
tuguês do Brasil escrito, compreendendo como se dá este processo (longo) de 
construção de um conjunto de conhecimentos sobre o funcionamento fonológico 
da língua pelo estudante. Como isso se dá? É preciso que o estudante conheça 
e saiba estabelecer as relações fono-ortográfi cas, isto é, as relações entre sons 
(fonemas)do português oral do Brasil em suas variedades e as letras (grafemas) 
do português brasileiro escrito (SCLIAR-CABRAL, 2003). 
Observe o esquema a seguir:
FONTE: O autor (2020).
Em outras palavras, o estudante em processo de alfabetização e letramento 
precisa primeiro conhecer a mecânica, ou seja, todo o processo de funcionamento 
32
 Letramentos múltiplos na alfaBetização
da escrita alfabética e saber que esses mecanismos servem para ler e escre-
ver em diferentes contextos e, principalmente, perceber a existência de relações 
bastante complexas que são estabelecidas entre os sons da fala (fonemas) e as 
letras da escrita (grafemas), o que envolve consciência fonológica da linguagem: 
perceber seus sons, como se separam e se juntam em novas palavras etc. Ocor-
re que essas relações não são tão simples quanto as cartilhas ou os livros de 
alfabetização fazem parecer. Não há uma regularidade nessas relações e elas 
são construídas por convenção. Não há, como diria Saussure (1969), “motivação” 
nessas relações, ou seja, diferente dos desenhos, as letras da escrita não repre-
sentam propriedades concretas desses sons.
 A partir das afi rmações de Soares (2004), apresento de forma bastante sin-
tetizada algumas características e diferenças de alfabetização e letramento:
QUADRO 1 – DIFERENCIANDO
Alfabetização Letramento
Conceito
Alfabetização é o processo de aprendi-
zado da leitura e da escrita.
Letramento é o desenvolvimento do 
uso competente da leitura e escrita nas 
práticas sociais.
Uso Uso individual da leitura e escrita. Uso social da leitura e escrita.
Ensino
Deixa o indivíduo apto a desenvolver os 
mais diversos métodos de aprendizado 
da língua.
Habilita o sujeito a utilizar a escrita e a 
leitura nos mais diversos contextos.
Atividades 
Envolvidas
Codifi car e decodifi car a escrita e os 
números.
Organizar discursos, interpretação e 
compreensão de textos, refl exão.
Indivíduo
Alfabetizado é o sujeito que sabe ler e 
escrever.
Uma pessoa letrada sabe usar a leitura 
e a escrita de acordo com as demandas 
sociais.
FONTE: Adaptado de Soares (2004).
Pensando em todo esse processo de interação, indica-se, para 
quem ainda não leu, a leitura de: ROJO, R. Letramentos múltiplos, 
escola e inclusão social. São Paulo: Parábola Editorial, 2009.
Acredita-se que tanto a visão a partir do conceito de alfabetização quanto a 
partir do ponto de vista do letramento, são estas contribuições importantes que 
33
A LÍNGUA(GEM) E O FAZER PEDAGÓGICO Capítulo 1 
melhoram o entendimento e a compreensão dos fatos envolvidos, pois ambos se 
preocupam em buscar uma melhora nas atividades escolares. Afi nal, para se ler 
um texto escrito é preciso, antes de outras habilidades necessárias, saber reco-
nhecer as letras, compreendendo o signifi cado e o sentido sintático e semântico 
das palavras. Uma pessoa comum que vive em um meio urbano, mesmo uma 
criança, percebe que a escrita é uma realidade no mundo em que ela vive. Como 
ela consegue lidar com isso? Para entender a escrita, ela vai começar fazer algu-
ma especulação e a levantar alguma hipótese a respeito do uso desse objeto. 
Certamente, ela vai tentar entender se há alguma estrutura interna e como ela 
se organiza externamente. Assim como um cientista que busca informações e le-
vanta hipóteses sobre seus estudos e pesquisas e percorre diversos caminhos para 
concluir uma determinada investigação, a criança também pode trilhar diferentes 
caminhos até chegar a descobrir o que precisa saber para decifrar e ler o nosso sis-
tema de escrita, e mais, precisa saber como pode escrevê-lo de forma adequada.
O cientista vai adiante e progride em sua pesquisa à medida que compara o 
que já fez com a sua nova descoberta. A criança vai agir de forma semelhante, ou 
seja, ela confi rma suas hipóteses e dá um passo adiante. Um dos cuidados que to-
dos os educadores precisam ter é evitar, durante o processo de alfabetização, a ên-
fase exagerada no processo de ensino, ou seja na ação do professor e esquecer-se 
da aprendizagem, esquecer do processo individual do aluno frente ao apresentado. 
Quando o processo é muito engessado (pautado no fazer do professor, no 
método) geralmente se deixa de lado a efetivação da aprendizagem, o fato de o 
professor ensinar seguindo um método fi xo demais não garante a aprendizagem 
do aluno. O método ensina tudo passo a passo em uma ordem hierárquica (do 
mais fácil para o mais difícil), mas necessariamente essa hierarquia não corres-
ponde e não atinge todos os alunos. Geralmente um método muito fi xo não dá 
espaço para que o aluno exponha suas ideias a respeito do que está aprendendo, 
por isso, o equilíbrio se faz necessário.
Livro: Alfabetização e Letramento: Perspectivas Linguísticas
Capítulo: A respeito de alguns fatos do ensino e da apren-
dizagem da leitura e da escrita pelas crianças na alfabetização
Luiz Carlos Cagliari
IEL/UNICAMP
Alunos que são submetidos a um processo de alfabetização, se-
guindo o método das cartilhas (com livro ou não), são alunos que são 
34
 Letramentos múltiplos na alfaBetização
expostos exclusivamente ao processo de ensino. O método ensina 
tudo, passo por passo, numa ordem hierarquicamente estabelecida, 
do mais fácil para o mais difícil. O aluno, seja ele quem for, parte 
de um ponto inicial zero, igual para todos, e vai progredindo, atra-
vés dos elementos já dominados, de maneira lógica e ordenada. A 
todo instante, são feitos testes de avaliação (ditados, exercícios es-
truturais, leitura perante a classe), para que o professor avalie se o 
aluno “acompanha” ou se fi cou para trás. Neste último caso, tudo é 
repetido de novo, para ver se o aluno, desta vez, aprende. Se ainda 
assim não aprender, repete-se mais uma vez, remanejam-se os alu-
nos atrasados para uma classe especial, para não atrapalharem os 
que progrediram, até que o aluno, à força de fi car reprovado, desista 
de estudar, julgando-se incapaz. E a escola lamenta a chance que a 
criança teve e que não soube aproveitar (sic!).
O método das cartilhas não leva em consideração o processo 
de aprendizagem. Quando diz que faz a verifi cação da aprendizagem 
através de ditados, provas, etc., na verdade, está verifi cando, não se 
o aluno aprendeu ou não, mas se o aluno sabe responder ao que se 
pergunta, reproduzir um modelo que lhe foi apresentado, demonstrar 
que o professor ensinou direito. O que se passa na mente do aluno, 
as razões pelas quais ele faz ou deixa de fazer algo, são coisas que 
o método não permite que o aluno manifeste.
Um método de alfabetização que leve em conta o processo de 
aprendizagem deve deixar um espaço para que o aluno exponha 
suas ideias a respeito do que aprende. Isto pode ser feito não de ma-
neira dissertativa (como faz o professor, quando ensina), mas atra-
vés da realização de trabalhos, onde se pode ver o que o aluno fez 
e descobrir o que o levou a fazer o que fez, do jeito que fez. Quando 
o aluno toma a iniciativa e diz algo, ou escreve, ou lê, ele coloca, 
nessas atividades, seus conhecimentos. Como ele, nesse momento, 
conhece apenas parcialmente o que está fazendo, inevitavelmente, 
irá cometer acertos e erros. Da análise desses acertos e erros, pode-
-se descobrir o que o aluno sabe e o que não sabe, se sabe ao certo 
ou se está tomando decisões equivocadas, estranhas e incorretas.
Porque as cartilhas dirigem demais a vida do aluno na escola, 
ele tem que seguir apenas um caminho, por onde passam todos; só 
pode pensar conforme o método manda e fazer apenas o que está 
previsto no programa. Para alguns alunos, esse “caminho” até que é 
“suave” no começo, mas depois, quando acaba a cartilha e se veem 
na situação de terem de lidar não apenas com elementos já domina-
35
A LÍNGUA(GEM) E O FAZER PEDAGÓGICO Capítulo 1 
dos, como na cartilha, mas com o novo e desconhecido, então, não 
sabem mais progredir, aprender, e a escola, que parecia tão orga-
nizada, torna-se uma enorme confusão para essascrianças. Aquilo 
que parecia tão organizado na cartilha, torna-se um caos fora dela e 
o aluno, geralmente, não tem mais a quem recorrer.
Por outro lado, aquele aluno que tem seu espaço para revelar 
suas hipóteses, através de sua iniciativa, em trabalhos escolares, pa-
rece, no começo, em meio a um enorme caos. Mas, aos poucos, vai 
aprendendo a organizar seus conhecimentos e a adequá-los à realida-
de e, aos poucos, tudo vai achando seu lugar e sua razão de ser, de 
tal modo que esse aluno acaba aprendendo não só o que deve, em 
termos de conteúdo, mas também aprende a aprender: aprende como 
ele, do jeito que é, deve fazer para construir seus conhecimentos. A 
escola precisa se preocupar antes com a aquisição do processo de 
aprendizagem e depois com os resultados obtidos pelas crianças.
Alfabetizar pelas cartilhas (isto é, pelo BABEBIBOBU) é desas-
troso e, quando o aluno aprende e progride nos estudos, faz isto ape-
sar da escola. Para outros alunos, o método é catastrófi co e sem 
solução para os seus problemas, difi culdades e perplexidades, ao 
tentarem construir os seus conhecimentos na alfabetização.
CAGLIARI, L. C. A respeito de alguns fatos do ensino e da aprendizagem da leitu-
ra e da escrita pelas crianças na alfabetização. In: ROJO, R. (org). Alfabetização e 
Letramento: Perspectivas Linguísticas. Campinas-SP: Mercado das Letras, 2009
De acordo com Cagliari (2009), o professor, para poder realizar um bom tra-
balho de alfabetização, precisa levar em consideração um processo de ensino 
aprendizagem com equilíbrio sem ser um expectador daquilo que o aluno faz nem 
facilitar demais o processo de aprendizagem apenas passando tarefas. Cabe ao 
professor ensinar também e, assim, ajudar cada aluno a dar um passo adiante e 
progredir na construção de seus conhecimentos.
Com as novas ideias do construtivismo, alguns professores têm 
levado os trabalhos de alfabetização para o extremo oposto ao 
das cartilhas, também com graves consequências para alguns 
alunos. É o caso absurdo do professor que pretende tirar todos 
os conhecimentos a partir do aluno e, para tanto, acha que 
sua tarefa não é a de ensinar, mas, apenas, a de promover 
situações para o aluno fazer algo. Tudo o que o aluno faz é 
valorizado - mesmo que se constate que ele começa a andar 
em círculos e não consegue ir além do que faz -, na esperança 
36
 Letramentos múltiplos na alfaBetização
de que, um dia, ele descubra a solução de seu problema. Isto 
pode demorar demais e o aluno se vir ridicularizado pelos seus 
colegas, perturbado pelos pais, quando não acontece, para 
sua grande surpresa, um convite por parte da escola para ele 
se retirar ou para ir para uma “classe se alunos de seu nível”. 
Muitos eufemismos e hipocrisias (CAGLIARI, 2009, p.37).
Para Cagliari (2009), os alunos, quando colocados diante do sistema de es-
crita, não podem se sentir perdidos, a escola deve propiciar uma experiência pro-
funda para cada um dos alunos e para que essa experiência aconteça é necessá-
rio que o professor conheça o sistema de escrita em sua totalidade. 
Ainda que não se possa atribuir exclusivamente ao professor a tarefa de me-
diador entre uma atividade e um aluno que aprende, pois, os próprios alunos po-
dem ser mediadores uns dos outros, quando trabalham juntos e compartilham 
seus conhecimentos. É preciso deixar o aluno construir seus conhecimentos na 
interação com outros alunos. A interação é especialmente importante na fase da 
alfabetização, mas também é signifi cativa em séries posteriores.
Ensinar não é repetir um modelo até que se aprenda o que ele quer dizer. 
Ensinar é compartilhar as difi culdades do aprendiz, analisá-las, entendê-las e su-
gerir soluções. Como, a cada momento, um indivíduo está numa situação históri-
ca diferente da construção da sua vida e de seus conhecimentos, a cada momen-
to o ensinar é diferente.
Após a leitura e as refl exões de Cagliari (2009), em que foram estabelecidas 
algumas diferenças entre alfabetização e letramento, vamos prosseguir refl etindo 
sobre o escrever na escola e a relevância da escrita fora da escola.
3.1 ESCREVER NA ESCOLA E ALÉM 
DA ESCOLA
FIGURA 3 – USOS DA ESCRITA
FONTE: O autor (2020).
37
A LÍNGUA(GEM) E O FAZER PEDAGÓGICO Capítulo 1 
Poderíamos nos perguntar: em que instante da vida você percebeu que po-
dia fazer coisas com a linguagem? Vamos considerar aqui que a língua é um sis-
tema discursivo, isto é, um sistema que tem origem na interlocução e se organiza 
para funcionar na interlocução (inter + locução = ação linguística entre sujeitos). 
Esse sistema inclui regras vinculadas às relações das formas linguísticas entre si 
e às relações dessas formas com o contexto em que são usadas. Seu centro é, pois, 
a interação verbal que se faz através de textos ou discursos, falados ou escritos. 
Quando pensamos em processo de alfabetização e letramento, certamente 
nos questionamos: como ou qual é a melhor forma de encarar o ensino da leitura 
e da escrita? Que diferença eu enquanto professor posso fazer na vida dos estu-
dantes e o que posso fazer de novo?
Não podemos perder de vista que a escrita, segundo Halliday (1998), cria um 
novo tipo de conhecimento, que é o conhecimento científi co e ao mesmo tempo cria 
uma nova forma de aprendizagem que é chamada de ensino. Essa associação en-
tre o conhecimento e o ensino procura desenvolver a habilidade e o desenvolvimen-
to da linguagem escrita e, como colocado anteriormente, é um processo complexo.
Você já se perguntou se escrever na escola é a mesma coisa de escrever 
fora da escola? Por que ou para que escrevemos na escola? E, por que ou para 
que escrevemos fora da escola?
Certamente, você já deve ter percebido que o uso que se faz da linguagem 
na escola difere do uso cotidiano fora dela. Podemos fazer uso social da lingua-
gem para exigências cotidianas, pedir, informar, trocar experiências, entre tantas 
possibilidades. Por sua vez, na escola, o uso em geral é feito a partir de atividades 
estratégicas e didaticamente adaptadas, muitas vezes retiradas de seus contex-
tos, mas com o intuito de tornar o uso da linguagem, em especial da linguagem 
escrita, mais consciente. 
O escrever inicia a partir do momento em que o sujeito se inscreve num ou 
em mais sistemas linguísticos, mas difi cilmente se sabe onde acaba. Aliás, segun-
do Cassany (1999), este é um processo que jamais termina, porque implicará o 
conhecimento pleno de códigos escritos e isso sempre estará em movimento. 
Então, a pergunta inicial poderia se transformar agora: em que momento você 
descobriu que também poderia fazer coisas com a linguagem escrita ou, de outra 
forma, a linguagem escrita por outros interfere em suas percepções de mundo? Em 
geral, ao responder essa pergunta relacionamos o escrever com atividades escola-
res, ou com o escrever na escola, mas ela não deveria limitar-se a esse contexto.
38
 Letramentos múltiplos na alfaBetização
A escrita na escola, em geral, é uma escrita mais estratégica, controlada e 
orientada para uma determinada fi nalidade. Em uma visão mais panorâmica de prá-
ticas educativas relacionadas à cultura escrita em sala de aula, percebe-se que a 
partir de estudos, por exemplo, de Geraldi (1997), ainda se apresenta um estudo 
excessivo apegado aos estudos gramaticais e segundo Orlandi (1996), tenta-se 
olhar para uma prática voltada para usos sociais da escrita. Temos, assim, forças 
distintas que podem interferir nas ações conduzidas na escrita da escola.
Por que se afi rma que o escrever é um processo estratégico? Porque ins-
creve o sujeito num universo próprio de representações, de formulações e, nesse 
processo, o sujeito se descobre a cada momento, lendo ou escrevendo. A leitura 
e a escrita possibilitam que o aluno amplie a sua visão de mundo, consolide uma 
percepção crítica acerca de tantas crenças, valores, posições políticas e econômi-
cas de forma ampla. 
A escrita, iniciada na escola e prolongada socialmente na vida que segueapós o período de vida escolar, permite que os sujeitos estabeleçam uma ligação 
com a cidadania. O ler e o escrever estarão sempre vinculados a uma relação 
com a capacidade, criticidade e também frequência leitora e escritora de cada 
um. Tal relação não é simétrica. Afi nal, a medida que se entende e se amplia o 
entendimento da manifestação escrita como forma de representação e refração 
da realidade percebe-se que a construção social do sujeito também se amplia e 
com ele o seu poder de simbolizar. 
Segundo Bakhtin (1997), a cultura letrada remete ao signo institucionalizado, 
ou seja, a escrita na escola e a escrita fora dela estão relacionadas, ainda que 
utilizadas de modos distintos. 
Para Bakhtin (1997), pela palavra traduzida em textos (orais ou escritos), o 
sujeito não só refl ete a realidade expressa, mas a refrata também. Tanto o refl etir 
quanto o refratar estão relacionados às orientações ideológicas envolvidas em 
cada processo. Compreender um signo (um texto) implica, para o autor, aproximar 
o signo apreendido (escrito) de outros já conhecidos.
Nesse ponto, podemos retomar as perguntas iniciais e olhar para o escrever 
na escola: em que medida se reconhecem as representações de mundo que o 
aluno traz para a escola? Quer-se realmente ouvi-lo? Na escola, não raro, ocorre 
um apagamento da voz do aluno ou a manifestação dela apenas para fi ns de es-
tudos gramaticais. 
Reconhece-se que os estudos gramaticais têm sua importância como fer-
ramenta para o uso adequado do código escrito, mas o professor precisa ter o 
cuidado e o equilíbrio para não se restringir a esse aspecto. Ainda que esse apa-
39
A LÍNGUA(GEM) E O FAZER PEDAGÓGICO Capítulo 1 
gamento da voz do aluno não se dê de forma acentuada no processo de alfabeti-
zação, ele ainda se faz presente nos anos subsequentes. Nesse sentido, algumas 
ações de uso da escrita na escola podem equivaler a completar o pensamento do 
outro e limitar-se a compreender o que já está escrito para poder dar prossegui-
mento (SOARES, 2004).
Uma das mais importantes características do ler e do escrever é que tanto na 
atividade de escrever como de ler, pode-se retornar a qualquer momento, rever, 
substituir, mudar tudo. Esses movimentos vão permitindo a construção de conhe-
cimentos, de percepções de mundo que a atividade apenas oral até contempla, 
mas com um poder temporal muito diluído. O que provavelmente difere da escrita 
da escola e da escrita fora da escola talvez seja o próprio uso social da escrita. 
Na escola, tem-se prioritariamente o uso limitado muitas vezes pelos muros 
escolares, ou seja, são atividades realizadas e que permanecem na escola ao 
passo que a escrita fora dela se relaciona com espaços cotidianos que exigem o 
conhecimento de escrita, como exemplo, bancos, hotéis, institutos de previdên-
cias, documentos ofi ciais, além de situações em que o sujeito sem a escrita fi ca 
privado de imergir em jornais, revistas, livros, restringindo a construção do imagi-
nário pessoal e social (GERALDI, 2003).
Atividade de Estudo:
2 - Para refl etir e pensar
Observe, analise e posicione-se diante da citação de SOARES 
(2017, p. 44):
“Dissociar alfabetização e letramento é um equívoco porque, 
no quadro das atuais concepções psicológicas, linguísticas e psico-
linguísticas de leitura e escrita, a entrada da criança (e também do 
adulto analfabeto) no mundo da escrita ocorre simultaneamente por 
esses dois processos: pela aquisição do sistema convencional de es-
crita – a alfabetização – e pelo desenvolvimento de habilidades de 
uso desse sistema em atividades de leitura e de escrita, nas práticas 
sociais que envolvem a língua escrita – o letramento.” 
40
 Letramentos múltiplos na alfaBetização
Após refl etirmos sobre o escrever na escola e o escrever fora da escola, va-
mos direcionar o olhar para os letramentos sociais e a escolarização do letramento. 
4 LETRAMENTOS SOCIAIS E A 
ESCOLARIZAÇÃO DO LETRAMENTO
O letramento é tido hoje como um fenômeno social complexo e heterogêneo. 
Tais características se justifi cam principalmente quando levamos em conta que, 
na investigação dos elos entre escrita, sociedade e indivíduo, são colocadas em 
pauta inúmeras e importantes questões, de diversas ordens, que, por sua vez, 
tornam-se objeto de análise sob diferentes pontos de vista.
Continuando nossa caminhada no campo do letramento, adentramos no es-
paço social, ou seja, nas diferentes formas de se conceber tal conceito e no movi-
mento da escola de assumir o letramento como um de seus papeis fundamentais. 
De acordo com Gnerre (1994), em sua obra Linguagem, escrita e poder, 
diferentes áreas do conhecimento, com suas categorizações, metodologias e ins-
trumentos de análise, procuram compreender as múltiplas facetas da escrita, sua 
relação com a oralidade e outras semioses; seus usos em diferentes contextos 
históricos e sociais; suas funções e suas consequências para grupos ou indivídu-
os específi cos. 
Portanto, constata-se que há muitos letramentos e acredita-se nisso, como 
foi então que uma variedade bastante particular de letramento adentrou o espaço 
escolar e tornou-se mais importante que as outras? Seria o poder das teorias? De 
algum modo, a escola pedagogizou o letramento, ou seja, tornou o conceito de 
letramento como conteúdo acadêmico (é o que fi zemos o tempo todo aqui neste 
livro), mas será que as pessoas (nós) em seu cotidiano estão preocupadas com 
os aspectos teóricos? Parece-me um pouco contraditório, não? Com a escolariza-
ção do letramento agregam-se aspectos cognitivos que não são em si elementos 
do letramento. 
O que é necessário compreender para compreender o letramento como prá-
tica social e componente de estudo ao mesmo tempo? Street (1984), em seu livro 
Literacy in Theory and Practice, crítica os efeitos cognitivos do letramento e da 
visão dicotômica entre fala e escrita, a concepção dominante que reduz o letra-
mento a um conjunto de capacidades cognitivas, que pode ser medida nos sujei-
tos. Street denominou tal modelo interpretativo de “autônomo”. 
41
A LÍNGUA(GEM) E O FAZER PEDAGÓGICO Capítulo 1 
O modelo autônomo tem como característica o fato de abordar o letramento 
como uma realização individual, ou seja, o foco concentra-se no indivíduo e não 
em um contexto social mais amplo no qual o indivíduo opera. O letramento é per-
cebido como uma habilidade que é adquirida por um indivíduo, geralmente, dentro 
de um contexto educacional, tendo como base o uso da linguagem oral e afetan-
do, como resultado, o desenvolvimento cognitivo (STREET, 1984). 
Como esclarece Street (2014), o modelo autônomo de letramento funciona 
a partir do pressuposto de que o letramento per se – autonomamente – terá efei-
tos em outras práticas sociais e cognitivas. Entretanto, esse modelo, levando a 
crer que tais práticas são neutras e universais, na verdade mascara e silencia as 
questões culturais e ideológicas que a elas são subjacentes. 
Expressões comuns como “grau de letramento”, “nível de letramento” ou 
“baixo letramento” revelam essa concepção autônoma, centrada no sujeito e nas 
capacidades de usar apenas o texto escrito. As avaliações em rede, as políticas 
públicas de desenvolvimento da leitura, os concursos públicos, o ENEM e os exa-
mes vestibulares são bons exemplos de ações sociais que mobilizam e legitimam 
essa maneira de concepção, uma vez que se baseiam na crença da possibilidade 
de “avaliação” do letramento dos sujeitos. 
Em suma, o foco central está na análise das capacidades cognitivas individu-
ais dos sujeitos ao lidar com textos escritos. O maior esforço, então, consiste em 
avaliar o que os sujeitos sabem sobre alguns textos escritos, com raras preocu-
pações sobre como as pessoas os usam e o que fazem com eles em diferentes 
contextos históricos e culturais (STREET, 2014).
O mesmo autor contrapõe o modelo autônomo e defende a ideia de que o 
modelo ideológico é que deveria ser implementado. Conforme Street (2014),

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