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DESCRIÇÃO Concepções e teorias da alfabetização e do letramento, tendo em vista as abordagens encontradas em diferentes autores e na BNCC. PROPÓSITO Compreender as diferentes concepções e teorias da alfabetização e letramento permite avaliar criticamente o tratamento conferido à alfabetização na BNCC e em outros documentos. OBJETIVOS MÓDULO 1 Identificar perspectivas teóricas e concepções sobre alfabetização e letramento MÓDULO 2 Relacionar as teorias da alfabetização com a BNCC INTRODUÇÃO Existe uma teoria que possamos reconhecer como a verdadeira ou a melhor teoria da alfabetização? Não são poucas as pessoas que gostariam de ter diante de si uma concepção e uma teoria da alfabetização que garantissem fácil e seguramente o sucesso no processo de alfabetização e letramento. Mas, essa não é a situação quando examinamos os estudos da alfabetização, as publicações sobre aquisição e aprendizagem da linguagem, além de temas afins. O que temos, na verdade, são diferentes abordagens teóricas, que até podem ser complementares em algumas situações, apontando-nos o caminho da análise crítica e da escolha. Por isso, vamos conhecer algumas das concepções e teorias que tratam da alfabetização para reunirmos subsídios e critérios que nos ajudem nas escolhas dos percursos metodológicos da alfabetização e, ainda, que nos auxiliem na leitura dos documentos que tratam das políticas de alfabetização. MÓDULO 1 Identificar perspectivas teóricas e concepções sobre alfabetização e letramento CONTEXTO HISTÓRICO Compreender as concepções de alfabetização e suas teorias é, de certo modo, um exercício de escolhas a partir de um contexto histórico e teórico pertinente ao assunto. Existe uma longa história da concepção de alfabetização, assim como teorias para alcançar esse fim que foram mudando ao longo do tempo. Nesse sentido, cabe analisar historicamente como ocorre o processo de ensino e aprendizagem da alfabetização, letramento e produção textual no Brasil. Como nossa realidade foi sendo trabalhada e adaptada, ainda que façamos um retorno histórico, será somente para compreender e validar os processos relacionados ao Brasil. Foto: Joa Souza/Shutterstock.com No final da década de 1970 e início da década de 1980, coincidindo com as transformações decorrentes do processo de abertura política após o período do governo militar, os problemas da educação escolar foram criticados no Brasil. Além das mudanças políticas e sociais, necessárias em função do início da luta pela democratização da sociedade brasileira, urgia reorganizar democraticamente as instituições educativas. As discussões e a análise dos problemas educacionais brasileiros passaram a enfatizar a relação fundamental entre a melhoria da condição social, estrutural, política e a necessidade de olhar a educação como mola mestra. FINAL DA DÉCADA DE 1970 Houve uma considerável expansão dos centros de pesquisas e dos cursos de pós-graduação em educação, notadamente nas regiões Sul e Sudeste. MEADOS DA DÉCADA DE 1980 Há uma gradativa organização dos serviços de extensão universitária e intensa participação de professores universitários em programas de formação continuada de professores, visando divulgar e aplicar os resultados de suas investigações, principalmente, daquelas relacionadas ao processo de alfabetização. EM 1988 O Estado brasileiro chamou para si mesmo a responsabilidade de alfabetizar. A proposta foi de alfabetizar todos mediante atos normativos. Esse fato demonstrou a preocupação com a questão da democratização da cultura, dentro do quadro geral da democratização fundamental. Desse modo, os deficits quantitativos e qualitativos deveriam ter atenção especial. MAIS DE TRINTA ANOS DEPOIS Tivemos evolução, mudanças na visão, mas, ainda assim, a alfabetização precisa de esforços contínuos, pesquisas e debates. Daqui por diante, faremos, então, um reconhecimento deste passado e o estado atual – com o advento da BNCC (Base Nacional Comum Curricular) . A NECESSIDADE DA ESCRITA Vamos agora considerar o contexto do surgimento e do desenvolvimento da escrita ao longo do tempo com a necessidade de comunicação. Já de antemão, vamos nos lembrar da necessidade do ser humano de se comunicar, dar nome às coisas, registrar suas experiências e vivências. O filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900) (2012, p. 221) defende que a: “consciência está sempre relacionada à capacidade de comunicação de uma pessoa; e a capacidade de comunicação, por sua vez, à necessidade de comunicação”. Assim, segundo Nietzsche, a consciência, a capacidade de comunicação e a necessidade de comunicação são condicionais e constitutivas para a sobrevivência da humanidade. Esse pressuposto aponta para o fato de que, mesmo antes de se debater a constituição dos sistemas de representação, sua necessidade já estava à prova. Foto: Biblioteca do Congresso norte americano/Wikimedia Commons/ Domínio Público. Escrita cuneiforme Se levarmos em conta a escrita cuneiforme desenvolvida pelos sumérios, provavelmente, a mais antiga do mundo, vamos verificar que o crescimento da cidade é o principal responsável pela necessidade de desenvolvimento dessa escrita. Na história das civilizações humanas, verificamos que o surgimento da escrita esteve relacionado com a passagem da condição nômade para seminômade ou sedentária de alguns povos. As atividades que passam a ser exercidas demandam a necessidade de registro ou escrita. CUNEIFORME A escrita cuneiforme caracteriza-se pelo uso de objetos com forma de cunha para se fazer os registros. A escrita cuneiforme dos sumérios teria surgido por volta de 3.300 a.C. javascript:void(0) [...] A ESCRITA SURGIU DO SISTEMA DE CONTAGEM FEITO COM MARCAS EM CAJADOS OU OSSOS, E USADO PROVAVELMENTE PARA CONTAR O GADO, NUMA ÉPOCA EM QUE O HOMEM JÁ POSSUÍA REBANHOS E DOMESTICAVA OS ANIMAIS. ESSES REGISTROS PASSARAM A SER USADOS NAS TROCAS E VENDAS, REPRESENTANDO A QUANTIDADE DE ANIMAIS OU DE PRODUTOS NEGOCIADOS. PARA ISSO, ALÉM DOS NÚMEROS, ERA PRECISO INVENTAR SÍMBOLOS PARA OS PRODUTOS E PARA OS NOMES DOS PROPRIETÁRIOS. (CAGLIARI, 2009, p. 16) Nesse contexto de escrita primitiva, podemos dizer que “ser alfabetizado” corresponderia à capacidade de ler o que os símbolos representavam e escrevê-los (CAGLIARI, 2009). Os símbolos inicialmente representavam coisas, como é o caso dos ideogramas, mas, com a expansão do sistema de escrita, começaram a representar sons da fala. IDEOGRAMAS Símbolos gráficos ou desenhos que representam uma ideia ou um objeto. javascript:void(0) No mundo antigo, as escritas rudimentares incluíam a invenção de regras para decifrá-las, ou seja, regras de “alfabetização” para poder usar os sistemas de escrita. É bom lembrar que, durante muito tempo, na Antiguidade, as pessoas aprendiam a ler sem ir a alguma instituição, algo como a escola, a menos que pretendessem se tornar escriba. Mesmo na Idade Média, aprender a ler e a escrever ocorria menos na escola do que na vida privada (CAGLIARI, 2009). Imagem: A☮ineko/Wikimedia Commons/ CC BY-SA 1.0 Hieróglifos egípcios inscritos no Templo de Com Ombo, século II a.C. Imagem: Olive028~commonswiki/Wikimedia Commons/ Domínio Público Prensa manual de Guttemberg. Nos séculos XV e XVI, com o Renascimento e o uso da imprensa na Europa, houve aumento da preocupação com a alfabetização e surgiram as primeiras “cartilhas” e as primeiras gramáticas das línguas neolatinas (CAGLIARI, 2009). No século XVIII e XIX, com o advento do capitalismo, ler e escrever vincularam-se a funções e papéis sociais destacados, tornando-se uma busca popular – incentivada por novos industriais e proletariado recém-formado – e passando a estar na ordem do dia de governos e sociedade. Assim, junto com a necessidade de se comunicar e interagir, tornou-se necessário o domínio dos códigos e dos processos de codificação e decodificação. Mais do que isso, a fala, a escrita e a leitura devem ser trabalhadasa partir de suas relações com as necessidades, as práticas e as interações sociais. ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO Os processos de alfabetização e de letramento são tidos, comumente, como conceitos separados, mas que se interdependem. Isso porque, só é possível letrar uma pessoa após ela ser alfabetizada ortograficamente. Entretanto, esses dois conceitos não estão somente em posição de dependência. Na verdade, eles se relacionam, indicando, assim, que um exerce influência sobre o outro. Em outras palavras, a apropriação da escrita é um processo complexo e multifacetado, em que ocorrem fenômenos diferentes e complementares. O ensino e aprendizado da interpretação das letras – identificação, construção e explicação – pode ser entendido como uma tecnologia de representação da linguagem humana. Quer dizer, faz parte da nossa humanidade e de nossa capacidade de inovação a possibilidade de representar por meio da linguagem, criando uma forma de escrita alfabético-ortográfica. Como qualquer tecnologia – entendida como estudo da técnica mesmo – a linguagem deve ser compreendida como um esforço humano para sistematizar algo que possa ser passado entre gerações. Um conjunto de procedimentos que permitirão aos sujeitos envolvidos utilizar e melhorar a sua própria condição de vida. Nesse sentido, por meio da alfabetização e do letramento, tem-se uma condição de vida desenvolvida coletivamente e que pode e deve ser constantemente aprimorada e melhorada. Por isso, tal condição de vida a partir da apropriação da escrita pode ser levada a crianças, que tenderão a ter mais facilidade de assimilação motora. Por outro lado, jovens e adultos que são alfabetizados nessa fase lutam bravamente contra o que acreditam ser uma inaptidão, que nada mais é do que um estranhamento dos movimentos. Crianças mais estimuladas ao reconhecimento e desenvolvimento do mundo da escrita e da leitura tenderão a apresentar mais facilidade. Além disso, crianças provenientes de famílias ou de ambientes mais distantes de estímulos pedagógicos ou literários podem apresentar maior dificuldade inicial. Isso ocorre porque há uma técnica e um tempo necessários para o domínio dessa nova linguagem. Foto: Shutterstock.com Essa compreensão muda completamente a relação com o processo de alfabetização, uma vez que o senso comum considerava que, quando a criança “ia para escola”, era esperado que ela reproduzisse o aprendizado das “primeiras letras”, pelo desenvolvimento das habilidades de codificação e de decodificação. Tudo seria uma questão de tempo, de um processo de reconhecer, decorar e usar. Pensar, associar, criar e entrar no mundo da leitura associando o conhecimento às práticas sociais de leitura e de produção de textos – tudo isso seria uma etapa posterior à alfabetização, devendo ser desenvolvido nas séries (anos) seguintes. É necessário sublinhar que muita gente ainda acredita que esse é o processo da “classe da alfabetização”, ainda que ela já não exista há um bom tempo. Já o conceito de letramento surgiu de uma ampliação progressiva do próprio conceito de alfabetização. Ao longo do século XX, os debates, históricos e fundamentais, foram ampliando a concepção de alfabetização. Essa ampliação levou em conta aspectos sociais, diferentes metodologias e a necessidade de alargar o olhar social, político e técnico. Já não se podia mais considerar alfabetizado apenas aquele que domina o sistema de escrita e as capacidades básicas de leitura e escrita. Passou a ser considerado alfabetizado e letrado aquele que soubesse usar a língua escrita para exercer uma prática social em que essa modalidade da língua fosse necessária. Desde meados dos anos 1980, concepções psicológicas, linguísticas e psicolinguísticas de leitura e escrita vêm mostrando que, se o aprendizado das relações entre as letras e os sons é uma condição para o uso da escrita, esse uso também é uma condição para a alfabetização. AMBIENTE ALFABETIZADOR Precisamos notar que estamos tratando de marcos que vão aparecendo e criando possibilidades. Um importante marco na histórica da alfabetização tem a ver com a ideia da criação de um ambiente alfabetizador em sala de aula, em que o desenho ou a organização da sala de aula fosse em torno da própria escrita: METODOLOGICAMENTE, A CRIAÇÃO DESSE AMBIENTE SE CONCRETIZARIA NA BUSCA DE LEVAR AS CRIANÇAS EM FASE DE ALFABETIZAÇÃO A USAR A LINGUAGEM ESCRITA, MESMO ANTES DE DOMINAR AS “PRIMEIRAS LETRAS”, ORGANIZANDO A SALA DE AULA COM BASE NA ESCRITA! (SOARES, 2005, p. 64) Conceitualmente, a defesa da criação de um ambiente alfabetizador estaria baseada na constatação de dois aspectos que auxiliariam a criança no processo de alfabetização: Saber para que a escrita serve. Saber como a escrita é usada em diferentes práticas sociais. Mas por que esses dois aspectos auxiliam a criança em sua alfabetização? Eles auxiliam por pelo menos três motivos: Dão significado e função à alfabetização. Criam a necessidade da alfabetização. Favorecem a exploração, pela criança, do funcionamento da linguagem escrita. A ENTRADA NO MUNDO DA ESCRITA Além do ambiente alfabetizador na articulação entre alfabetização e letramento no contexto da sala de aula, vamos considerar outros aspectos relacionados com o momento inicial da aprendizagem da escrita. Lembremos que alfabetização e letramento devem ser indissociáveis, ainda que sejam considerados diferentes. O início ou a introdução da criança, ou mesmo do adulto analfabeto, no mundo da escrita acontece simultaneamente por meio da alfabetização e do letramento. Soares (2004, p. 14) relaciona a alfabetização com a “aquisição do sistema convencional de escrita” e o letramento com o “desenvolvimento de habilidades de uso desse sistema em atividade de leitura e escrita, nas práticas sociais que envolvem a linguagem escrita”. Os dois processos são interdependentes e indissociáveis porque: [...] A ALFABETIZAÇÃO SE DESENVOLVE NO CONTEXTO DE E POR MEIO DE PRÁTICAS SOCIAIS DE LEITURA E DE ESCRITA, ISTO É, ATRAVÉS DE ATIVIDADES DE LETRAMENTO, E ESTE, POR SUA VEZ, SÓ PODE DESENVOLVER-SE NO CONTEXTO DA E POR MEIO DA APRENDIZAGEM DAS RELAÇÕES FONEMA-GRAFEMA, ISTO É, EM DEPENDÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO. (SOARES, 2004, p. 14) Nesse sentido, o letramento pode ser considerado um processo complexo, que quase sempre é visto como associado à alfabetização. Contudo, existem letramentos de natureza variada, inclusive, sem a presença da alfabetização. Trata-se de um termo que é conceituado de modo diverso por diferentes autores que estudam o fenômeno; mas, em suma, pode-se dizer que o letramento é um processo histórico-social. Voltando ao processo de alfabetização, sobretudo de crianças, é perceptível que estas também são produtoras de textos desde pequenas. Além disso, se as crianças desde novas forem habituadas a fazer uso de lápis e papéis, podem registrar tentativas claras de escrever. Essas tentativas são exemplos de garatujas. GARATUJAS javascript:void(0) São desenhos rudimentares, geralmente, disformes e ilegíveis. Seria a fase inicial do grafismo. As primeiras tentativas de escrita são, geralmente, de dois tipos: 1) traços ondulados contínuos; 2) uma série de círculos ou linhas verticais. Nesse momento, já existe escrita na criança. Embora seja natural que as crianças, no começo da aprendizagem, busquem estabelecer referências entre a fala (que conhecem) e a escrita (que querem conhecer), é importante lhes mostrar que há vários modos de falar, mas só há um modo de escrever, do ponto de vista ortográfico. RESUMINDO Em suma, a alfabetização é o processo pelo qual se adquire uma tecnologia – a escrita alfabética e as habilidades de utilizá-la para ler e para escrever. Dominar tal tecnologia envolve conhecimentos e destrezas variados, como compreender o funcionamento do alfabeto, memorizar as convenções letra-som e dominar seu traçado, usando instrumentos como lápis, papel ou outros que os substituam. PROCESSOS DE LETRAMENTOVamos a uma definição clássica: letramento pode ser definido como o processo de inserção e participação na cultura escrita. Em outras palavras, o letramento é um processo que tem início quando a criança começa a conviver com as diferentes manifestações da escrita na sociedade (bilhetes, mensagens eletrônicas, livros, letreiros, propagandas etc.) e se prolonga por toda a vida, com a crescente possibilidade de participação nas práticas sociais que envolvem a língua escrita. Foto: Felipecbit/Shutterstock.com Mesmo adultos analfabetos, que não podem ler as letras, podem reconhecer o ícone de uma rede social ou o nome de um famoso refrigerante, o que seria uma forma de se viver o letramento. As pessoas estão o tempo todo convivendo com práticas de leitura ou interpretações, as quais têm como condição algum conhecimento sobre a escrita. Tal conhecimento é adquirido pelo fato de que essas pessoas estão inseridas em uma sociedade letrada. Qual é o papel da escrita? Tem uma função mediadora. Cria condições para ampliar as possibilidades de interação na sociedade. Permite a produção de sentidos. A escrita é o que permite uma grande cozinheira, que, porventura, não saiba ler uma palavra, conseguir ter um letramento matemático e um letramento linguístico pelo reconhecimento das marcas e dos produtos. Os estímulos para desenvolver, lentamente, a leitura lhes proporcionam ampliar suas decisões sobre suas tarefas, ler sobre outras técnicas e até mesmo escrever suas próprias receitas. SAIBA MAIS O termo letramento foi criado, portanto, quando se passou a entender que nas sociedades contemporâneas é insuficiente o mero aprendizado das “primeiras letras” e que a integração social implica também saber utilizar a língua escrita nas situações necessárias, lendo e produzindo textos. Essa nova palavra veio para designar a “nova dimensão da entrada no mundo da escrita”, a qual se constitui de um “conjunto de conhecimentos, atitudes e capacidades, necessário para usar a língua em práticas sociais” (BATISTA, 2006, p. 17). É possível encontrar pessoas que passaram pela escola, aprenderam técnicas de decifração do código escrito, são capazes de ler palavras e textos simples, mas que não são capazes de se valerem da língua escrita em situações sociais que requeiram habilidades mais complexas. Essas pessoas são alfabetizadas, mas não letradas. Essa condição, embora frequente dentro da própria escola, é particularmente dolorosa e indesejável, porque acarreta dificuldades para o aprendizado dos diferentes conteúdos curriculares, ou mesmo inviabiliza esse aprendizado. Portanto, as práticas letradas influenciam todos os indivíduos. Pode-se afirmar que não existe uma inevitável relação de causa e efeito entre escolaridade e letramento, embora a escolarização possibilite uma inserção mais democrática do sujeito nas sociedades letradas. O letramento abrange a capacidade de o sujeito colocar-se como autor do próprio discurso, não só em relação ao texto escrito, mas também em relação ao texto oral. Coelho e Castro (2010) propõem que haja incentivo às crianças para conhecer o mundo letrado, para que elas sejam capazes de estabelecer relações, assumir uma postura crítica e confrontar ideias. Com isso, uma concepção histórico-social do letramento há de considerar uma concepção de língua constitutiva das ações sociais. Ações se organizam em enunciados que se criam e se recriam nas práticas comunicativas, configurando os variados gêneros e seus suportes, os quais podem ser vistos como o resultado das práticas discursivas convencionadas e institucionalizadas de comunidades discursivas específicas. RESUMINDO O letramento pode ser considerado um processo complexo, que quase sempre é visto como associado à alfabetização. Contudo, existem letramentos de natureza variada, inclusive, sem a presença da alfabetização. Trata-se de um termo que é conceituado de modo diferente por autores que estudam o fenômeno; mas, em suma, pode-se dizer que o letramento é um processo histórico-social, um “produto da participação em práticas sociais que usam a escrita como sistema simbólico e tecnologia” (BRASIL, 1997, p. 21). CAMINHOS E ESCOLHAS NA ALFABETIZAÇÃO A linguagem tem um papel central nas relações sociais vivenciadas por crianças e adultos, posição que fica caracterizada nos esforços e movimentos a partir da LDBEN e registrada em documentos posteriores. LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Mas o que mudou? Quais concepções passaram a vigorar e se tornaram marco social? Por meio da oralidade, as crianças participam de diferentes situações de interação e aprendem que são pessoas singulares, ao mesmo tempo em que convivem em coletivos. Esse momento crítico para a criança, em que ela deixa de ser um indivíduo com as atenções voltadas para si mesmo para vivenciar mais intensamente o coletivo, deixa de ser negligenciado. Note que as crianças aprendem a falar muito cedo e já conseguem interagir com autonomia quando chegam ao ensino fundamental, salvo algumas exceções. Crianças que se sentem inaptas para exercer sua voz tendem a ter dificuldade de interação e são impactadas em todo o processo de alfabetização. javascript:void(0) Foto: Shutterstock.com Vamos entender: No ambiente escolar, temos as interações entre pares, a interação entre coletivos e a interação professor aluno. Em todas essas interações, as crianças estão diante da necessidade de produzir textos. NA EDUCAÇÃO INFANTIL Os textos são apenas orais, mas as crianças vão continuamente vivendo tensões: textos formais, linguagens que ela não reconhece, linguagens que ajudam a se aproximar de colegas. NO ENSINO FUNDAMENTAL O processo de comunicação herdado pela criança se manifesta: se o processo com o texto formal foi uma dificuldade, esse processo acaba sendo herdado, mas, se foi algo estimulado e positivo, tende a ser buscado. Percebam que o processo é social. É claro que aqui estamos fazendo uma redução para compreender todo esse processo, a fim de mostrar que a realidade e a interação fazem cada processo singular. Na instituição escolar, portanto, as crianças ampliam suas capacidades de compreensão e produção de textos orais, o que favorece a convivência delas com uma variedade maior de contextos de interação e a sua reflexão sobre as diferenças entre essas situações e os textos nelas produzidos. Esse processo acontece, por exemplo, quando falamos sobre escrever. Parece que os alunos entram na escola sem nunca terem visto uma letra, como as concepções tradicionais antigamente achavam que se dava a relação inicial com a escrita. Sem qualquer conhecimento prévio sobre as letras, as crianças chegariam à escola, onde se descortinaria o mundo totalmente inédito das letras. ATENÇÃO Mas, essa percepção é falsa. Ocorre, na verdade, um processo social: o aluno convive com a escrita o tempo todo, em um celular, em uma placa na rua, em um cartaz ou pichação em uma parede. Vários alunos de diversas comunidades, antes mesmo de começarem a ler na escola, já conhecem e reproduzem siglas ou letras que veem no seu entorno e acabam levando essa identificação das letras até a escola. Nessas experiências culturais com práticas de leitura e escrita, muitas vezes, mediadas pela oralidade, meninos e meninas vão se constituindo como sujeitos letrados. O ERRO NO APRENDIZADO DA ESCRITA Aprender a escrever sem medo de “errar” é importante. Os tropeços fazem parte de qualquer processo de aprendizagem. Isso não quer dizer que a professora ou o professor não devam mostrar às crianças os problemas e os equívocos observados, levando-as a compreender as motivações dos problemas e equívocos encontrados. Pelo contrário, o professor deve apresentar as dificuldades da escrita e conversar sobre elas, pois ninguém pode errar o que não está aprendendo. ATENÇÃO Não se pode esperar que todas as crianças aprendam tudo o que lhes é falado, ao mesmo tempo. As crianças têm ritmos diferentese modos diferentes de apreender o conhecimento. Por isso, é importante abordar as mesmas questões muitas vezes, e de maneiras diferentes, em momentos diferentes, com recursos diferentes. É esperado que as crianças passem um longo tempo cometendo “erros” ortográficos, antes de estabilizarem o conhecimento das convenções da língua escrita. Mais do que isso: é preciso que haja esse tempo para que elas possam descobrir as possibilidades, as convenções e as artimanhas do sistema alfabético-ortográfico. ESCRITA E O ENTORNO DAS CRIANÇAS As escritas de textos espontâneos pelas crianças são uma grande fonte de informação sobre o que elas sabem e sobre os conteúdos que precisam ser trabalhados para que aprofundem cada vez mais a análise e o conhecimento da língua. Na escola, somos apresentados a novos modos de falar e de ler a realidade, outras formas de viver, falar e se comportar; aprendemos conteúdos das diferentes disciplinas; entramos em contato com a literatura; conhecemos outras expressões da arte, como as artes cênicas e plásticas ou artes ligadas ao movimento e ao ritmo, como a dança e a música. Esses são diferentes modos de ler, mostrar e falar da realidade – precisamos penetrar neles para apreendê-los, contemplando-os e os observando. Consideramos, então, que todo professor, de qualquer nível de ensino, é um professor de linguagem. Para isso, é necessário perceber as diferenças e adequar-se a elas: Imagem: Shutterstock.com As crianças e os adolescentes de zonas urbanas, de modo geral, têm grande contato com esse mundo. As cidades são marcadas pela escrita de vários gêneros textuais, que se manifestam em placas, faixas, embalagens de diversos produtos, etiquetas ou inscrições em peças de roupa, pichações e grafites, entre outras manifestações. Imagem: Shutterstock.com As crianças de áreas rurais muito afastadas, por sua vez, podem ter afastamento maior da linguagem escrita, pelas peculiaridades dessas áreas. O atravessamento da linguagem escrita na vida das pessoas se mostra muitas vezes de modo sutil: pela convivência com pessoas letradas, pela valorização que a escrita possui em determinados grupos, fazendo parte do seu cotidiano de modo trivial. PERSPECTIVAS TEÓRICAS O trabalho docente deve ser o de proporcionar atividades e questionamentos que considerem pelo menos dois tipos de análises: MICROANÁLISES São análises que têm como ponto de partida os elementos menores do texto (letra, fonema, sílaba). MACROANÁLISES São análises que têm como ponto de partida as características mais globais do texto, tais como: o modo como o texto se organiza no papel; o tipo e a temática do texto a partir do título; os portadores de texto e o tipo de texto a eles relacionados; e, quando houver, as ilustrações, as imagens (GOULART, 2006). O mais importante nas análises é não perder de vista o sentido dos textos. Sabemos que, durante muito tempo, o ensino do nosso sistema de escrita foi feito de uma maneira mecânica, repetitiva, na qual os estudantes eram levados a memorizar segmentos das palavras (letras ou sílabas) ou mesmo palavras inteiras, sem entender a lógica que relacionava as partes pronunciadas (pauta sonora) e a sequência de letras correspondente. Foto: Shutterstock.com Hoje, entendendo que há um conjunto de conhecimentos a ser construídos, temos condições de promover desafios que levem as crianças e os adolescentes a compreender que a escrita possui relação com a pauta sonora. Essa é uma descoberta que nem sempre é realizada espontaneamente, razão pela qual se torna indispensável auxiliar os estudantes na descoberta dos princípios que norteiam essa relação que parece ser um enigma: a relação entre a parte oral e a grafia das palavras. A psicóloga e pedagoga argentina Emilia Ferreiro (apud LEAL; ALBUQUERE; MORAIS, 2006) entende que a compreensão da correspondência entre as letras – unidades gráficas mínimas – e os fonemas – unidades sonoras mínimas – é alcançada por meio de uma operação cognitiva complexa. Nas escritas alfabéticas, isso implica a compreensão de pelo menos dois aspectos: O entendimento do que a escrita representa, ou seja, que as letras não representam o sentido das coisas às quais as palavras se referem, e sim representam os sons. O entendimento do modo ou processo como a escrita cria essas representações, ou seja, a escrita representa por meio das letras os pequenos segmentos sonoros (os fonemas) que compõem as sílabas. Nos métodos de alfabetização tradicionais, a criança dependia dos estímulos externos para aprender a ler e a escrever, tais como a repetição e a memorização. A perspectiva construtivista derivou uma nova forma de compreender o processo de alfabetização, divulgada sistematicamente no Brasil a partir de meados da década de 1980 e que se encontra nos resultados das pesquisas de Emilia Ferreiro e da educadora argentina Ana Teberosky. Para essas autoras, o processo de aquisição da escrita é, principalmente, psicogenético, cujo início ocorre antes de a criança ingressar na escola e segue uma linha de evolução regular, baseada na teoria do biólogo e psicólogo suíço Jean Piaget (1896-1980). Já a perspectiva histórico-cultural também trouxe muitas contribuições para a compreensão do processo de aquisição da escrita, reconhecendo a complexidade e as implicações culturais da escrita e seu papel no desenvolvimento do sujeito. O psicólogo bielo-russo Lev Vigotski (1896-1934), por exemplo, explica o surgimento e o desenvolvimento da escrita na criança antes mesmo de sua escolarização, pois “o gesto é o signo visual que contém a futura escrita da criança [...]. Os gestos são a escrita no ar e os signos escritos são, frequentemente, simples gestos que foram fixados” (VIGOTSKI, 1991, p. 121). Vigotski explica ainda a linguagem e o aprendizado da escrita a partir de determinados processos mentais e da relação da escrita com a fala. Ele nos ajuda a entender que a criança vai gradativamente aprendendo a escrita e dominando as dimensões gramatical, ortográfica e semântica. Desse modo, a criança poderá chegar à escrita que a escola define como correta, além de entender seu significado. As concepções de Vigotski sobre linguagem e aprendizagem da escrita são muito interessantes, ainda que reflitam a própria complexidade do fenômeno da aquisição da linguagem. Além dele, o psicólogo russo Alexander Luria (1902-1977) também trouxe grandes contribuições para a perspectiva histórico-cultural da linguagem. SAIBA MAIS Você pode ler mais sobre esse assunto e compreender as implicações desses dois pensadores para o processo de alfabetização conferindo uma sugestão de leitura que damos ao final na seção Explore+. ABORDAGENS TEÓRICAS DA ALFABETIZAÇÃO Confira o resumo dos principais pontos abordados no módulo. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. CONSIDERE AS SEGUINTES AFIRMATIVAS: HÁ UM ERRO IRREPARÁVEL NA CONCEPÇÃO DE ALFABETIZAÇÃO E DE LETRAMENTO QUE AJUDA A CRIANÇA A ESTABELECER REFERÊNCIAS ENTRE A FALA E A ESCRITA, POIS EXISTE SOMENTE UM MODO DE FALAR ENQUANTO HÁ DIVERSOS MODOS DE ESCREVER DESDE UMA PERSPECTIVA ORTOGRÁFICA. É POSSÍVEL RESUMIR A ALFABETIZAÇÃO COMO O PROCESSO POR MEIO DO QUAL SE ADQUIRE A ESCRITA ALFABÉTICA E AS HABILIDADES DE UTILIZAR ESSE TIPO DE TECNOLOGIA PARA LER E PARA ESCREVER. O DOMÍNIO DA ESCRITA MOBILIZA DIVERSOS CONHECIMENTOS E HABILIDADES, COMO A COMPREENSÃO DO ALFABETO, A MEMORIZAÇÃO DAS CONVENÇÕES DA RELAÇÃO ENTRE LETRA E SOM, A CAPACIDADE DE TRAÇAR OU ESCREVER LETRAS E PALAVRAS SE VALENDO DE RECURSOS COMO LÁPIS, PAPEL E OUTROS MEIOS POSSÍVEIS. ASSINALE A ALTERNATIVA CORRETA A) Apenas a afirmativa I está correta. B) Apenas a afirmativa II está correta. C) Apenas a afirmativa III está correta. D) Apenas as afirmativas I e III estão corretas. E) Apenas as afirmativas II e III estão corretas. 2. ESTUDAMOS NESTE MÓDULO ALGUNS CONCEITOS E CONCEPÇÕES RELACIONADOS COM OS PROCESSOS DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO. VIMOS QUE HÁ ABORDAGENS E METODOLOGIASSOBRE ALFABETIZAÇÃO QUE SÃO TRADICIONAIS, ENQUANTO OUTRAS AVANÇAM NA COMPREENSÃO SOBRE A APRENDIZAGEM E A LINGUAGEM, COMO NO CASO DA CONCEPÇÃO CONSTRUTIVISTA. TAMBÉM VIMOS BREVEMENTE QUE VIGOTSKI E LURIA SÃO AUTORES QUE DÃO IMPORTANTE CONTRIBUIÇÃO PARA A QUESTÃO DA LINGUAGEM E SUA AQUISIÇÃO E APRENDIZAGEM, RECONHECENDO A COMPLEXIDADE DESSE PROCESSO E O ASPECTO SOCIAL. ASSIM, ASSINALE A ALTERNATIVA QUE APRESENTA CORRETAMENTE A ABORDAGEM TEÓRICA QUE CARACTERIZA OU DENOMINA OS ESTUDOS DE VIGOTSKI E LURIA. A) Construtivista-instrucionista B) Operatório concreto C) Abordagem tradicional D) Histórico-cultural E) Letramento social GABARITO 1. Considere as seguintes afirmativas: Há um erro irreparável na concepção de alfabetização e de letramento que ajuda a criança a estabelecer referências entre a fala e a escrita, pois existe somente um modo de falar enquanto há diversos modos de escrever desde uma perspectiva ortográfica. É possível resumir a alfabetização como o processo por meio do qual se adquire a escrita alfabética e as habilidades de utilizar esse tipo de tecnologia para ler e para escrever. O domínio da escrita mobiliza diversos conhecimentos e habilidades, como a compreensão do alfabeto, a memorização das convenções da relação entre letra e som, a capacidade de traçar ou escrever letras e palavras se valendo de recursos como lápis, papel e outros meios possíveis. Assinale a alternativa correta A alternativa "E " está correta. A alfabetização é um processo basicamente caracterizado pelo domínio da escrita e da leitura. Como a codificação (escrita) e a decodificação (leitura) apesar de necessárias não são suficientes, o conceito de alfabetização pode ser ampliado, o que se vincula ao conceito de letramento. O domínio da escrita implica conhecimentos e práticas que permitem ao educando a produção de textos, iniciando, é claro, por letras, palavras e fragmentos, usando variados meios ou suportes materiais. 2. Estudamos neste módulo alguns conceitos e concepções relacionados com os processos de alfabetização e letramento. Vimos que há abordagens e metodologias sobre alfabetização que são tradicionais, enquanto outras avançam na compreensão sobre a aprendizagem e a linguagem, como no caso da concepção construtivista. Também vimos brevemente que Vigotski e Luria são autores que dão importante contribuição para a questão da linguagem e sua aquisição e aprendizagem, reconhecendo a complexidade desse processo e o aspecto social. Assim, assinale a alternativa que apresenta corretamente a abordagem teórica que caracteriza ou denomina os estudos de Vigotski e Luria. A alternativa "D " está correta. A perspectiva histórico-cultural tem em Vigotski e Luria importantes representantes, sendo caracterizada, entre outros aspectos, pelo entendimento de que a aquisição da linguagem e o desenvolvimento inicial da escrita não ocorrem em um primeiro momento na escola, pois a criança já carrega a vontade e a necessidade de escrever devido ao seu meio sociocultural. MÓDULO 2 Relacionar as teorias da alfabetização com a BNCC AS TEORIAS DA ALFABETIZAÇÃO Comecemos compreendendo o processo plural de construção social do que vem a ser a alfabetização. Historicamente, o significado de “ser alfabetizado” foi sendo constantemente (re)inventado, tendo em vista que os envolvidos no processo de alfabetizar não compartilham das mesmas concepções acerca do complexo processo da alfabetização. De acordo com Senna (1995), o importante é compreender que o pensar a alfabetização está atrelado ao fazer. Os métodos de alfabetizar precisam estar calçados em uma teoria. A partir dos estudos dos modelos de alfabetização trabalhados por Ferreiro e Teberosky (1974), Senna (1995) afirma que as variadas práticas alfabetizadoras poderiam ser divididas em três paradigmas básicos: o mecanicista, o linguístico e o semioticista. Cada um desses paradigmas refletiria um conjunto de estudos com ideais semelhantes. Vamos conhecer a seguir um pouco mais sobre cada um desses paradigmas. PARADIGMA MECANICISTA Entre o final do século XIX e o início do século XX, o paradigma mecanicista ficou em evidência por concentrar a prática da alfabetização nas capacidades de codificação e de decodificação do código escrito. A aprendizagem estava pautada na oralização das palavras dissociadas de seu significado e contexto; ou seja, a apropriação da automação das regras do código escrito não possibilitava o desenvolvimento das habilidades de criar ou interpretar textos. Imagem: Shutterstock.com O paradigma mecanicista saiu de cena quando se compreendeu que a língua escrita não é a mesma que a língua falada; que o ato de escrever não se confunde com a oralidade. A partir da ruptura da crença de que a língua escrita era uma transcrição da língua oral, legitimou-se que as condições de apropriação das variadas modalidades da língua são diferentes e singulares entre si. Ficou proeminente que o processo de apropriação da leitura e da escrita não pode ser comparado ao simples ato de decodificar e codificar, respectivamente. PARADIGMA LINGUÍSTICO No paradigma linguístico, o entendimento do processo de alfabetização se torna mais complexo porque vai além do domínio do código escrito. A alfabetização é mais do que aprender a escrever, como um ato reduzido à codificação, e mais do que aprender a ler, como um ato reduzido à decodificação. Na verdade, ler significa interpretar e escrever é socializar-se. O aprendizado se dá privilegiando as variadas modalidades de expressão da língua escrita, considerando, principalmente, seu uso social. Saber a escrita é conseguir se apropriar dela e usá-la socialmente. Imagem: Shutterstock.com O paradigma linguístico, embora tenha rompido com alguns pressupostos da teoria mecanicista, como o rompimento da equivalência entre escrita e fala, não pode ser considerado um precursor da prática linguística de alfabetização. Apesar de o paradigma linguístico incluir o método linguístico, que consistia em desenvolver o grafismo, preocupando-se com sua função social, a legitimação da língua oral e as demais formas de manifestações da linguagem não são contempladas em sua pluralidade. ATENÇÃO Nos paradigmas mecanicista e linguístico, o protagonista é o padrão culto da língua escrita, deslegitimando socialmente demais manifestações de linguagem que são relevantes para a prática alfabetizadora. PARADIGMA SEMIÓTICO No paradigma semiótico, a alfabetização ou a atitude alfabetizadora está relacionada com a descoberta do processo pelo qual a mensagem não oral é construída ou interpretada. Tal descoberta vai depender “do estímulo à percepção individual da capacidade de linguagem” (SENNA, 1995, p. 227). É possível traçar um paralelo entre a atitude alfabetizadora semioticista para a aprendizagem da escrita e o esforço que alguém pode empreender para aprender o domínio expressivo da pintura, por exemplo. Cada etapa antecipa e pressupõe outra” (SENNA, 1995, p. 228). Se alguém vai aprender a linguagem da pintura, precisará reconhecer o valor expressivo da arte pictórica por meio da autoestimulação contínua. Terá de descobrir a cor, os agentes corantes, suas propriedades, os efeitos obtidos com sua combinação, “a perceptividade da mensagem por si mesmo e pelos outros, a valoração etc. A prática alfabetizadora no contexto do paradigma semiótico deve atender a pelo menos três condições: Imagem: Shutterstock.com MOTIVAÇÃO O processo da prática alfabetizadora semioticista deve ser pensado por meio de uma perspectiva ética, englobando aspectos básicos que são essenciais para uma prática alfabetizadora semioticista. Para passar pelo processo de autodescoberta, intrínseco à fase da alfabetização, o aluno precisa vivenciar experiências motivacionais, proporcionando um real encantamento pelo processo. A fim de construir seu próprio conhecimento e formular teorias, o aluno faz uso dos recursos do código linguístico de forma natural,evitando que o esforço mental seja empregado para outro fim. Imagem: Shutterstock.com PRONTIDÃO COGNITIVA E MOTORA Não menos relevante, as habilidades cognitivas e motoras fazem parte desse processo, considerando que a aquisição de um código linguístico demanda, na prática, recursos físicos do indivíduo. Em outras palavras, exige que o aluno consiga controlar mentalmente seu corpo, sendo capaz de realizar ações motoras específicas, como a coordenação motora fina, por exemplo. Imagem: Shutterstock.com PERSPECTIVAS DE INSERÇÃO SOCIAL Outro elemento básico que sustenta a prática alfabetizadora são as perspectivas de inclusão social do indivíduo na sociedade, que contribui para o aprimoramento do uso da linguagem escrita através do trabalho com os variados domínios sociais. Piaget já dizia que a criança ativa aprende por meio da interação com o meio. O processo de aprendizagem da língua escrita não ocorre de forma diferente. Ao longo da prática alfabetizadora, o aluno por meio da sua interação com o meio social e os diferentes gêneros textuais - em diferentes formatos - começa a compreender a escrita de forma global. Esse cenário é de suma importância para o desenvolvimento da consciência fonológica, imprescindível para que a criança perceba a fala como um sistema de sons e compreenda o sistema de escrita como um sistema de representação desses sons. CONTEXTO DA BNCC E ALFABETIZAÇÃO Vamos agora trabalhar a questão da alfabetização na Base Nacional Comum Curricular. Primeiro, faremos isso a partir de uma breve apresentação do contexto e das principais características da BNCC. Desde a Constituição Federal de 1988, o Estado tem como dever promover inventivos para o desenvolvimento do cidadão. Em 2014, a primeira versão da BNCC é pensada com o objetivo de garantir as aprendizagens mínimas necessárias para o desenvolvimento pessoal, como já previsto na Constituição. SAIBA MAIS A BNCC faz parte do Plano Nacional da Educação e é orientada pelas Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica (DCN). A BNCC está dividida em três partes, correspondentes às três etapas da Educação Básica: educação infantil, ensino fundamental e ensino médio. O documento contempla as competências e habilidades a serem desenvolvidas pelos alunos ao longo da educação básica, além de detalhar os elementos que compõem as etapas da educação infantil, ensino fundamental e ensino médio. O documento normativo também esclarece a organização de cada aprendizagem nas etapas citadas, abordando as diferentes áreas do conhecimento. A primeira etapa, da educação infantil, está dividida em quatro seções: Breve contextualização da educação infantil na BNCC Os campos de experiências Os objetivos de aprendizagem e desenvolvimento A transição da educação infantil para o ensino fundamental A última etapa, o ensino médio, menos importante para a presente reflexão, está dividida em 3 seções: O ensino médio no contexto da educação básica A BNCC do ensino médio Currículos: BNCC e itinerários A etapa do ensino fundamental, onde estão localizados os elementos que compõem o processo de alfabetização, está organizada em cinco áreas do conhecimento: Linguagens Matemática Ciências da Natureza Ciências Humanas Ensino Religioso As áreas do conhecimento estão relacionadas com componentes curriculares, que guardam as especificidades dos saberes próprios que os constituem. A área do conhecimento de Ciências Humanas, por exemplo, contempla os componentes curriculares de Geografia e História. Dentro de cada componente curricular, existem unidades temáticas para cada etapa da aprendizagem, bem como os objetivos de conhecimento – conteúdos – a serem abordados. Por fim, são mencionadas as habilidades relacionadas ao tema, que estariam ligadas ao desenvolvimento das competências propostas pela BNCC. As competências no documento se articulam, basicamente, em competências gerais e competências específicas: COMPETÊNCIAS GERAIS São dez no total e “pretendem assegurar, como resultado do seu processo de aprendizagem e desenvolvimento, uma formação humana integral que vise à construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva” (BRASIL, 2018, p. 25). COMPETÊNCIAS ESPECÍFICAS Dizem respeito aos conhecimentos, às habilidades e atitudes e a valores correspondentes a cada área. Segundo o próprio documento, o foco no desenvolvimento de competências é um dos fundamentos pedagógicos da BNCC: A explicitação das competências oferece referências para o fortalecimento de ações que assegurem as aprendizagens essenciais definidas na BNCC por meio da indicação clara de dois aspectos: o que os alunos devem “saber” (considerando a constituição de conhecimentos, habilidades, atitudes e valores) e, sobretudo, devem “saber fazer” (considerando a mobilização desses conhecimentos, habilidades, atitudes e valores para resolver demandas complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho) (BRASIL, 2018, p. 13). A BNCC foi pensada para fixar conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar a formação básica comum e respeitando a diversidade cultural. Compreender a construção de uma base nacional, destacando aqui os anos iniciais, não deixa de ser um desafio. O documento pode trazer tanto uma perspectiva formadora crítica e voltada para a emancipação dos educandos, quanto representar simplesmente uma forma de homogeneização do currículo, a fim de padronizar as ações educativas dos professores reduzindo a formação dos alunos à preparação para o mercado de trabalho. Torna-se necessário, portanto, um olhar crítico sobre esses documentos norteadores da educação, em especial, o que é normatizado sobre o processo de alfabetização. ALFABETIZAÇÃO E BNCC A alfabetização não é abordada de maneira relevante na BNCC. Segundo Bazani e Montagnoli (2019), o documento menciona a importância da transição da educação infantil para o ensino fundamental, sendo este último a etapa mais longa da Educação Básica. Esse processo de mudança deve assegurar a continuidade nas etapas de aprendizagem das crianças, sendo um momento fundamental para pensar estratégias e adaptações que acolham esses educandos, considerando suas vivências. Conforme a BNCC, esse período de transição é marcado por grandes mudanças, ampliando suas demandas por autonomia, relações sociais, percepção, compreensão, dentre outros aspectos. As experiências que os alunos compartilham, suas vivências e curiosidades devem ser consideradas durante essa etapa, para que a motivação seja o combustível do educando. Foto: Shutterstock.com De acordo com a BNCC, os dois primeiros anos do ensino fundamental devem ser focados na alfabetização e em ações pedagógicas que ofereçam amplas oportunidades para que os alunos possam se apropriar do sistema de escrita alfabética. É o momento de dar atenção à capacidade de representação, essencial para o desenvolvimento da escrita. Aspectos já vivenciados pelas crianças, como espaço, tempo e oralidade, facilitam a compreensão de novas práticas de leitura, escrita e oralidade. DURANTE OS PRIMEIROS ANOS, A APROPRIAÇÃO DO SISTEMA ALFABÉTICO OCUPA UM ESPAÇO DE DESTAQUE. AS DEMAIS LINGUAGENS OBTÊM UM NOVO SIGNIFICADO PELA ALFABETIZAÇÃO. AS LINGUAGENS UTILIZADAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL, COMO CAMPO DE EXPERIÊNCIA, PASSAM A SER AGORA OBJETO DE CONHECIMENTO ESCOLAR. (BAZANI; MONTAGNOLI, 2019, p. 18) Na Base Nacional Comum Curricular, em relação às práticas da linguagem, o ensino fundamental nos anos iniciais é composto por cinco eixos, que são: oralidade, conhecimentos linguísticos e gramaticais, leitura, escrita e educação literária. O documento especifica as habilidades envolvidas em cada um desses eixos, fazendo menção à importância “de possibilitar a participação significativa e crítica nas diversas práticas sociais permeadas/constituídas pela oralidade, pela escrita e por outras linguagens” (BRASIL, 2018, p. 67). Além disso, a BNCC propõea interdisciplinaridade entre as diferentes áreas do conhecimento como uma perspectiva importante para o processo de alfabetização. Percebemos que a alfabetização é, portanto, muito importante para o avanço da aprendizagem do aluno, tendo em vista que ela possibilita uma leitura da realidade, fundamental para a compreensão e intervenção no mundo, colaborando para uma construção social justa e igualitária. [A EDUCAÇÃO] ACONTECE NOS MAIS VARIADOS LUGARES, NÃO SÓ NAS ESCOLAS, SUA MISSÃO É TRANSFORMAR SUJEITOS E MUNDOS EM ALGUMA COISA MELHOR. [...] A EDUCAÇÃO NÃO É NEUTRA, ASSIM COMO PODE MELHORAR AS PESSOAS E O MUNDO TAMBÉM PODE REALIZAR O PROCESSO CONTRÁRIO, TUDO DEPENDE DA FORMA COMO É UTILIZADA, POR QUEM É UTILIZADA E PARA QUEM SERÁ INDICADA. (PERTUZATTI e DICKMANN, 2019, p. 783) A versão final da BNCC, que sistematiza a alfabetização através dos eixos de conhecimento linguístico, de uma forma geral, aparenta estar de acordo com essa perspectiva de educação que, como estudamos anteriormente, encontra-se afastada de um paradigma mecanicista. Porém, percebe-se que o significado, a importância, a finalidade e a intencionalidade da alfabetização acabam se perdendo ao longo da base nacional. A leitura e a escrita são abordadas pelo viés do aprendizado da técnica, por meio de uma concepção linear de alfabetização: som (fonema), letra (grafema), palavra, frase, e assim por diante. É sugerido no documento, por exemplo, que se inicie a alfabetização por meio da aprendizagem do alfabeto. Recomenda-se o trabalho com as regras ortográficas e gramaticais associadas à alfabetização. Em outras palavras, pressupõe um método silábico de aprendizagem, o que seria característico do paradigma mecanicista. Foto: Shutterstock.com A BNCC, inclusive, cita que é necessário inserir as crianças em um ambiente letrado, que as práticas de linguagem atuais não só envolvem novos gêneros textuais e textos multissemióticos e multimidiáticos, mas também novas formas de construir, disponibilizar e interagir. Ainda menciona a alfabetização como sendo uma importante porta de acesso para o mundo letrado; que o letramento é condição para a alfabetização e vice-versa. Pertuzatti e Dickmann (2019), no entanto, pontuam que, apesar de usar termos importantes para o processo de alfabetização, como o letramento, a forma como esses conceitos são explorados nos documentos denuncia ainda a falta de concordância sobre o significado real desse elemento, não havendo uma identidade conceitual e de intencionalidade. Compreendemos que o foco principal do trabalho com a leitura deve ser a busca pelo significado e a linguagem, compreendida em sua função social, para que o aprendizado ganhe sentido e seja significativo. A alfabetização só faz sentido quando envolve o aluno na essência da linguagem escrita. A leitura que permite reler o mundo precisa ser reflexiva e crítica, para que o sujeito tenha autonomia no seu dizer e possa utilizar as linguagens oral e escrita em prol da sua emancipação social, fazendo valer os seus direitos enquanto indivíduo transformador (PERTUZATTI; DICKMANN, 2019). A análise da BNCC deve considerar se os conceitos de alfabetização e letramento estão sendo propostos de acordo com o seu real sentido: alfabetização como a técnica do ler e escrever (decodificar e codificar) e o letramento como algo mais complexo, que proporciona autonomia de leitura do mundo, utilizando as ferramentas de leitura e escrita no seu cotidiano social, desenvolvendo sua opinião e propondo mudanças possíveis e necessárias aos diferentes contextos sociais. [...] QUANDO NOS REFERIMOS À ALFABETIZAÇÃO ESTAMOS INDICANDO A APRENDIZAGEM E O DOMÍNIO DO CÓDIGO ALFABÉTICO, OU SEJA, O ESTUDANTE APRENDEU A DECODIFICAR O CÓDIGO, E, COM ELE, A TECNOLOGIA DA ESCRITA, POSSUI DOMÍNIO SOBRE A ESCRITA ALFABÉTICA E HABILIDADES PARA UTILIZÁ-LA NA LEITURA E NA ESCRITA. JÁ PARA O TERMO LETRAMENTO, DESIGNAMOS A CAPACIDADE E COMPETÊNCIA DE, ALÉM DA TECNOLOGIA ESCRITA, QUE O SUJEITO SEJA CAPAZ DE FAZER INFERÊNCIAS, RELACIONAMENTOS COM A SUA REALIDADE, ATRAVÉS DA LEITURA E ESCRITA. DIZ-SE DO SUJEITO CAPAZ DE LER, INTERPRETAR, PRODUZIR, OPINAR, ARGUMENTAR E UTILIZAR A LEITURA E ESCRITA EM SEU CONVÍVIO SOCIAL. (PERTUZATTI; DICKMANN, 2019, p. 785) Apesar de distintos, os conceitos de alfabetização e letramento são inseparáveis. O ideal é alfabetizar (ensinar a ler e escrever) letrando (por meio do diálogo com as práticas sociais da leitura e da escrita). Compreendemos que essa etapa da escolaridade ocorre, normalmente, nos três primeiros anos do ensino fundamental. A BNCC prioriza a alfabetização nos dois primeiros anos, compreendendo que é a fase em que o aluno deve se apropriar do código escrito. Não se deve deixar de questionar o texto da BNCC, tendo em vista que não se trata meramente de um indicativo, mas, sim, de uma lei geral sobre o importante processo de alfabetização. Foto: Shutterstock.com Devido a essa perspectiva, a alfabetização nos primeiros três anos do ensino fundamental não problematiza as diversas implicações contidas na percepção de que há crianças que aprendem mais devagar enquanto outras mais rapidamente (PERTUZATTI; DICKMANN, 2019). A BNCC é um documento norteador pensado para ser aplicável nas mais diversas realidades do nosso país, o que deve suscitar um olhar crítico e um esforço de contextualização. CONCEPÇÕES E TEORIAS DA ALFABETIZAÇÃO Neste vídeo, abordaremos a relação das teorias de alfabetização com a BNCC. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. CONSIDERE AS SEGUINTES AFIRMATIVAS SOBRE A RELAÇÃO ENTRE TEORIAS DA ALFABETIZAÇÃO E A BNCC. PODEMOS SINTETIZAR AS PRINCIPAIS ABORDAGENS TEÓRICAS DA ALFABETIZAÇÃO EM, PELO MENOS, TRÊS PARADIGMAS: O PARADIGMA MECANICISTA, O PARADIGMA LINGUÍSTICO E O PARADIGMA SEMIÓTICO. AO LONGO DA BNCC, AO SE TRATAR DA ALFABETIZAÇÃO A PARTIR DE UMA CONCEPÇÃO LINEAR E PRESSUPOR UM MÉTODO SILÁBICO DE APRENDIZAGEM, É POSSÍVEL IDENTIFICAR UMA ABORDAGEM RELACIONADA COM O PARADIGMA MECANICISTA. A BNCC EXPLORA OS CONCEITOS DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO A PARTIR DE UMA IDENTIDADE CONCEITUAL E DE INTENCIONALIDADE, ALÉM DE APROFUNDAR SEU TRATAMENTO NOS TRÊS PRIMEIROS ANOS DO ENSINO FUNDAMENTAL. ASSINALE A ALTERNATIVA CORRETA: A) Somente a afirmativa I está correta. B) Somente a afirmativa II está correta. C) Somente a afirmativa III está correta. D) Somente as afirmativas I e II estão corretas. E) Somente as afirmativas II e III estão corretas. 2. ASSINALE A ALTERNATIVA QUE APRESENTA OS DOIS ASPECTOS POR MEIO DOS QUAIS A BNCC INDICA AS APRENDIZAGENS ESSENCIAIS NA PERSPECTIVA DAS COMPETÊNCIAS. A) O que os alunos devem “saber” e o que devem “saber fazer”. B) O que os alunos devem “fazer” e o que não devem “saber”. C) O que os alunos precisam “saber” e o que não necessitam “saber”. D) O que é preciso conhecer e o que é necessário para se conhecer. E) O que é necessário na escrita e o que é desejável na leitura. GABARITO 1. Considere as seguintes afirmativas sobre a relação entre teorias da alfabetização e a BNCC. Podemos sintetizar as principais abordagens teóricas da alfabetização em, pelo menos, três paradigmas: o paradigma mecanicista, o paradigma linguístico e o paradigma semiótico. Ao longo da BNCC, ao se tratar da alfabetização a partir de uma concepção linear e pressupor um método silábico de aprendizagem, é possível identificar uma abordagem relacionada com o paradigma mecanicista. A BNCC explora os conceitos de alfabetização e letramento a partir de uma identidade conceitual e de intencionalidade, além de aprofundar seu tratamento nos três primeiros anos do ensino fundamental. Assinale a alternativa correta: A alternativa "D " está correta. Os paradigmas mecanicista, linguístico e semiótico ajudam a compreender as diferentes teorias que tratam da linguagem e da alfabetização, sendo um recurso para avaliação crítica das propostas metodológicas de alfabetização. A BNCC, apesar de tratar da alfabetização a partirde eixos relacionados com o conhecimento linguístico e habilidades e competências, estaria mais vinculada a um paradigma mecanicista da alfabetização. Isso porque o aprendizado da linguagem, envolvendo a leitura e a escrita, é abordado desde uma perspectiva técnica e linear de alfabetização. Também há recomendação para que o trabalho de alfabetização se volte para as regras ortográficas e gramaticais relacionadas com a alfabetização, pressupondo uma abordagem metodológica silábica. 2. Assinale a alternativa que apresenta os dois aspectos por meio dos quais a BNCC indica as aprendizagens essenciais na perspectiva das competências. A alternativa "A " está correta. A BNCC declara ter uma perspectiva da aprendizagem baseada em competências. Assim, essas competências são explicitadas e ajudam a oferecer referências para as aprendizagens essenciais. Nesse sentido, há dois pontos. O primeiro é o que os alunos devem “saber”, levando em conta conhecimentos, habilidades, atitudes e valores. O segundo aspecto é o que os alunos devem “saber fazer”, levando em conta o trabalho com o “saber” para lidar com as exigências do dia a dia, o exercício da cidadania e o desafio do mundo do trabalho. CONCLUSÃO CONSIDERAÇÕES FINAIS Vimos que a alfabetização é um processo bem consolidado quando há uma boa vivência na educação infantil, uma vez que é um processo que se constrói aos poucos e começa muito antes do ensino fundamental. Verificamos que há diversas abordagens teóricas e conceitos que podem nortear esse processo e orientar metodologicamente os procedimentos de alfabetização. Conhecer as diferentes teorias e concepções de alfabetização também contribui para uma leitura crítica dos documentos, como a BNCC. Esses documentos normatizam ou orientam as políticas e as práticas pedagógicas voltadas para o ensino-aprendizado da linguagem, particularmente, do processo de alfabetização. Mesmo estudando algumas questões do processo de alfabetização e letramento a partir da Base Nacional Comum Curricular, ainda estamos longe de esgotar todos os pontos e desafios desse assunto. É necessário continuarmos estudando o tema e lutando por uma educação inclusiva, que respeite a diversidade dos sujeitos, além de cobrarmos que as decisões sejam descentralizadas, proporcionando uma discussão democrática sobre esses temas. AVALIAÇÃO DO TEMA: REFERÊNCIAS BATISTA, A. A. G. Alfabetização, leitura e escrita. In: CARVALHO, M. A. F.; MENDONÇA, R. H. (org.) Práticas de leitura e escrita. Brasília: Ministério da Educação (MEC), 2006, p. 10-17. BAZANI, L. V.; MONTAGNOLI, G. A. A Alfabetização na Nova Base Nacional Comum Curricular. In: EaD PMB. Consultado em meio eletrônico em: 19 mar. 2021. BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, 2018. CAGLIARI, L. C. Alfabetizando sem o bá-bé-bi-bó-bu. São Paulo: Scipione, 2009. COELHO, S.; CASTRO, M. O processo de Letramento na Educação Infantil. Pedagogia em Ação, Belo Horizonte, v. 2, n. 2, p. 79-85, 2010. FERREIRO, M.; TEBEROSKY, A. Psicogênese da língua escrita. Porto Alegre: Artes Médicas, 1974. GOULART, C. A organização do trabalho pedagógico: alfabetização e letramento como eixos orientadores. In: BRASIL, Ministério da Educação. Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a inclusão da criança de seis anos de idade. Brasília: FNDE, 2006, p. 87-98. LEAL, T. F.; ALBUQUERQUE, E. B. C.; MORAIS, A. G. Letramento e Alfabetização: pensando a prática pedagógica. In: BRASIL, Ministério da Educação. Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a inclusão da criança de seis anos de idade. Brasília: FNDE, 2006, p. 71-85. NIETZSCHE, F. W. A Gaia Ciência. São Paulo: Companhia das Letras, 2012. PERTUZATTI, I.; DICKMANN, I. Alfabetização e letramento nas políticas públicas: convergências e divergências com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Ensaio: aval.pol.públ.Educ., Rio de Janeiro, v. 27, n. 105, p. 777-795, 2019. SENNA, L. A. G. Psicogênese da língua escrita, universais linguísticos e teorias de alfabetização. Revista ALFA, São Paulo, n .39, p. 221-241, 1995. SOARES, M. B. Letramento e Alfabetização: as muitas facetas. Rev. Bras. Educ., Rio de Janeiro, n. 25, p. 5-17, 2004. SOARES, M. B.; BATISTA, A. A. G. Alfabetização e letramento. Belo Horizonte: Ceale/FaE/UFMG, 2005. (Coleção Alfabetização e Letramento) VIGOTSKI, L. S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos mentais superiores. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991. EXPLORE+ Para aprimorar os seus conhecimentos no conteúdo estudado, leia os artigos: “A Alfabetização na Perspectiva Histórico-Cultural”, de Sônia Maria Coelho, encontrado no site do Acervo Digital da UNESP, e conheça mais sobre a perspectiva histórico-cultural da alfabetização e os estudos de Vigotski e Luria. “Algumas questões de Linguística na alfabetização”, de Luiz Cagliari, encontrado no site do Acervo Digital da UNESP, e conheça melhor uma perspectiva linguística da alfabetização. “Panorama das teorias de alfabetização na América Latina nas últimas décadas (1980- 2010)”, de Mirta Castedo e Mirta Torres, disponível no Google Acadêmico, a fim de enriquecer seus estudos teóricos sobre a alfabetização. CONTEUDISTA Graça Regina Franco da Silva Reis CURRÍCULO LATTES javascript:void(0);
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