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ATENDIMENTO EM REDE 
Prof. Paulo Sérgio Aragão 
AULA 6
 
 
2 
INTRODUÇÃO 
Mediações e redes 
Neste espaço vamos nos dedicar ao estudo da relação entre a concepção 
do que vem a ser a categoria de mediações. Como já destacado anteriormente, 
estamos nos alicerçando nas concepções da teoria social crítica, na qual a 
mediação assume um papel central na constituição da sociedade e na 
construção sempre movediça do ser social. 
Até aqui, destacamos conceitos elementares para a atuação em rede, e 
neste espaço buscaremos ainda permear e enriquecer o debate trazendo ao 
centro a concepção de intersetorialidade, o que por si só já pressupõe um 
movimento na constituição de laços recíprocos que mais do que a somatória das 
partes se revela enquanto unidade de diversos. 
Pois bem, esperamos que estas indicações possam ainda mais contribuir 
para o debate e aperfeiçoamento esperado na concepção do atendimento em 
rede. 
Bons estudos. 
TEMA 1 - A CATEGORIA MEDIAÇÃO 
Neste momento de nosso estudo vamos nos dedicar a compreender o que 
é a categoria mediação, dentro da perspectiva teórico crítica, e como esta se 
revela nos processos de rede. 
Pois bem, partimos da concepção de Reinaldo Pontes (1995), para quem 
a mediação é uma categoria nuclear que se instala e se encontra entre as partes 
em um complexo de totalidade, estabelecendo uma relação entre o imediato e o 
mediato. 
Nas palavras do autor: “mediação é a categoria central da articulação 
entre as partes de uma totalidade complexa, e é responsável pela possibilidade 
da passagem entre o imediato e o mediato” (Pontes, 1995). 
Assim, compreendemos que inscrito em uma corrente de inspiração 
marxiana iremos desmistificar o tecido social formado de um todo complexo, que 
é formado por complexos menores, em que as relações entre homens e natureza 
e entre homens e homens não se dão de imediato, mas sim, com relações de 
mediações constitutivas deste próprio movimento. 
 
 
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Essas intervenções na relação com a natureza e entre homens se dão em 
um processo constitutivo histórico, em que o ser social se apropria de uma 
construção histórica, herdada e que cada vez mais se distancia do ser humano 
animal se constituindo em um ser social. 
Expressões históricas das relações que o homem edificou com a 
natureza e consequentemente das relações sociais daí decorrentes, 
nas várias formações sócio-históricas que a história registrou, sendo 
[...] indicadores seguros e fecundos, do ponto de vista histórico-social, 
por que efetivamente constituem-se na expressão concreta do 
envolver no processo de enriquecimento humano, na sua dinâmica de 
objetivar-se no mundo e incorporar tais objetivações, na sua saga de 
buscar mediações cada vez menos degradadas e bárbaras. (Pontes, 
1995, p. 78) 
Assim, também Battini (2009) nos ensina que esta categoria sempre está 
presente na relação, seja entre os homens em suas relações sociais entre 
homens e destes mesmos homens com o trânsito com a natureza. Esta categoria 
se expressa nas concepções desmistificadoras da realidade, bem como nos 
instrumentos que versam e incidem sobre os fenômenos da natureza. Assim, 
mediações se constituem enquanto elemento que está ao meio, que permite a 
relação entre sujeito e objeto, entre fenômeno e sujeito, não sendo propriamente 
um processo, mas sendo constitutivo do modo de ser do ser social. 
Se, assim como dito, compreendemos a sociedade formada em um todo 
complexo, composta por outros complexos menores, suas relações que se 
articulam se dão de forma dialética, tendo como expressão da mediação os 
processos, a teoria, as instituições, os instrumentos, a moral e tantas outras 
expressões que tencionam a conexão entre esferas menores na composição 
deste todo, sempre em um movimento dialético. 
As relações entre complexos (e mesmo no seu interior) de uma 
totalidade concreta não se dão linearmente, de forma mecânica e 
unilateral, mas por instâncias e passagens que se forjam no cerne das 
relações sociais, nos processos de mediação. (Battini, 2009, p. 62) 
Fica evidente nas passagens citadas que esta categoria se expressa no 
movimento entre as partes, movimentos estes que se dão de forma dialética, em 
respostas às questões concretas que se apresentam ao mundo dos homens, 
que revelam os esforços destes mesmos homens na constituição de um mundo 
distinto do mundo natural, que é formado e formador do ser social. 
Assim, o movimento constitutivo do ser social se concretiza no 
enfrentamento de suas questões, como respostas ativas diante dos impasses, 
 
 
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sejam eles relacionais – aqui compreendido relações sociais dos seres humanos 
– ou no seu intercâmbio com a natureza. Mediação se faz assim como 
continuidade e ruptura no movimento do real. 
Compreender corretamente que as decisões e ações se dão sempre por 
meio de mediações é elemento fundamental – compreensão de que esta é 
categoria central compósita da realidade - para aqueles que se inserem em 
fenômenos sociais e buscam nestes mesmos fenômenos incidir suas ações em 
busca de uma melhor sociabilidade. Mas o que seria estas melhores 
sociabilidades? Há fórmulas pacificadas de compreensão sobre a melhor 
sociabilidade no mundo homens? Certamente não. 
Aqui, a teoria, que como já tecemos nossas considerações acerca do seu 
entendimento, busca reproduzir o movimento real, aproximar e traduzir 
concretamente os fenômenos também se revela como processo de mediação, 
que se traduz entre o fenômeno e sua apreensão, para daí emanar a sua 
intervenção. 
No entanto, o acúmulo histórico também revela diferentes lentes teóricas 
que apontam em direções distintas no que entende por melhor sociabilidade e 
os seus caminhos a encontrar. Com certeza tais elementos incidem mais 
flagrantemente em constituições multi, inter e transdisciplinar, eivando de 
desafios à compreensão sobre os fenômenos sociais e suas diferentes 
intervenções, é o nosso esforço de exposição e compreensão do tópico seguinte. 
TEMA 2 - MEDIAÇÃO E ATENDIMENTO EM REDE 
Muito bem, tendo nos esforçado para trazer elementos constitutivos do 
que seja a categoria mediação, buscaremos agora estabelecer uma articulação 
entre a perspectiva de atendimento em rede à categoria mediação. Aqui, 
estabeleceremos uma relação de que a constituição de redes também se revela 
como formas historicamente constituídas de mediação sobre os fenômenos a 
serem enfrentados. 
Assim como as políticas sociais que se apresentam às lideranças que 
compõem um determinado território e as relações que emanam com este mesmo 
território, o qual se constituindo na história à medida de suas reivindicações e 
organizações, estabelecendo por meio de movimentos populares e antecipações 
 
 
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do aparato estatal mediações sempre mais complexas que respondem 
dialeticamente a tais questões. 
Assim, não se trata de atribuir a categoria mediação ao processo de rede, 
uma vez que já destacamos que esta categoria é central e eliminável na 
constituição e desenvolvimento do ser social, mas sim de ressaltá-las enquanto 
elemento constitutivo histórico no movimento. 
Nos compete aqui, tão somente, apontar de forma flagrante como estas 
mediações podem se apresentar e quais caminhos viáveis para esta mesma 
mediação apontar para processos de sociabilidade que aqui manifestamos em 
defesa de serem mais progressistas, dentro de uma ética verdadeiramente 
humana. 
Pois bem, se concordarmos com Netto (2011), o qual afirma citando P. 
Togliatti, de que, “quem erra na análise erra na intervenção”, partimos daqui para 
traçar pistas da compreensão sobre os fenômenos sociais que se apresentam. 
Ao propormos ações interdisciplinares à formatação do trabalho em rede nos 
esforçamos a traçar conceitos a respeito desta interdisciplinaridade que se 
apresenta em políticas sociais distintas e múltiplas. 
Também registramos que a concepção em que ainda se assenta grande 
parte de nossas formaçõesse dá em uma perspectiva disciplinar e não 
interdisciplinar, o que em tempos fluídos nos apresenta desafios ainda maiores 
diante da complexidade que se assumem as expressões da questão social. 
Assim, defendendo uma postura interligada e interdependente, Mello 
(2010) destaca a questão da incompletude de cada serviço dentro da 
multifacetada expressão da questão social: 
Para que haja um atendimento em rede que vise ações integrais, há 
de se ter como princípio a incompletude técnica de um saber 
determinado, assim como a incompletude da instituição: nenhum 
técnico ou nenhuma instituição isoladamente é capaz de atender a 
todas as necessidades dos sujeitos. (Mello, 2010, p. 66) 
O que o autor destaca é que se deve ter atenção para os diferentes 
fenômenos e suas constituições, que requerem não apenas uma intervenção 
disciplinar, mas sim no universo da multi, inter e transdisciplinaridade, bem como 
da intersetorialidade. O autor nos revela em suas palavras um caso concreto na 
cidade de Santos, envolvendo um trabalho destinado a crianças. 
Esta ação concreta requereu uma intervenção em rede intersetorial, o que 
certamente também aponta para possibilidades interdisciplinares 
 
 
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compreendendo as diferentes especializações do trabalho no trato da questão 
social. Adiciona-se a isso a questão do território em sua vertente relacional. 
Ao citar tal exemplo, o autor ainda enfatiza a postura ético-política 
expressa em suas ações, assinalando a necessidade de se estabelecer um 
afinamento de conceitos quanto ao que compreende como proteção integral. 
Ultrapassando o foco concreto da ação descrita pelo autor, podemos abstrair em 
reflexões do concreto pensado de que, para estamos diante de um trabalho de 
rede com viés progressista e que tenha o território como chão das políticas 
públicas, afinar os diferentes conceitos que envolvem suas questões é ato basilar 
e primário esperado de seus compósitos. 
No trabalho de rede desse caso, apareceram questões polêmicas: 
sexualidade, gênero, trabalho e prostituição, sendo necessários o 
enfrentamento e o debate entre os diversos atores sociais para manter 
a rede. As diferentes formas de atuação muitas vezes criaram 
impasses e dilemas que evidenciavam visões diferentes sobre o 
problema. Foi preciso compreender os limites do processo e construir 
consensos a partir do debate em grupo. Em se tratando de rede, um 
elemento importante a se colocar é a questão da afinação de conceitos. 
Há interpretações, formas de agir e intervenções que requerem 
discussão e estudo. Isso exige algum tempo e depende de como os 
atores vão perceber e se comprometer nesse percurso. (Mello, 2010, 
p. 68) 
Como afirmado anteriormente, relevância do elemento teórico que nos 
oferece os parâmetros para compreender as particularidades de cada questão 
se apresenta aqui como objeto necessário de afinação e pactuação, para que 
assim os elementos constitutivos desta rede se apresentem na mesma direção. 
Outro ponto destacado é a questão ao respeito do que é decidido coletivamente, 
sendo este também um elemento primordial ao destacarmos aqui. 
Maricondi e Soares (2010) também revelam pontos interessantes que 
para a lógica contemporânea nos impõem uma forma de pensar. A concepção 
de família como expressão estratégica de sociabilidade, seja qual for o seu 
formato, tem sido valorizado, não apresentando de fato funções pré-
determinadas na constituição de seus membros. 
Portanto, se a família não é mais um núcleo, e sim uma rede, nosso 
trabalho com ela terá de se abrir para o novo, ser mais criativo, 
inovador, inspirar-se no próprio modo como a família está se 
(re)construindo e adaptando aos novos tempos!... Todos nós, desde o 
nascimento, pertencemos a um contexto relacional que aqui vamos 
chamar de rede social primária. Ela é constituída, em primeiro lugar, 
pela família que nos gerou, ou que nos acolheu, seguida pelos 
parentes, amigos, vizinhos, colegas de trabalho, enfim, todos os 
nossos relacionamentos pessoais. Naturalmente, sabemos que, nessa 
 
 
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dimensão relacional, os vínculos são de reciprocidade. (Maricondi; 
Soares, 2010, p. 73-75) 
As autoras sustentam ainda que a postura em rede é fundamental para 
agir diante das múltiplas faces da questão social e compreender a família de 
forma não tradicional, mas enquanto redes de socialização e 
proteção/desproteção é fundamental para um trabalho que busque a 
potencialização dos constituintes de seu território e apontem para as 
democratizações, sejam elas nas decisões mais triviais ou aquelas diretamente 
ligadas ao que coletivamente é produzido enquanto desenvolvimento humano. 
Pois bem, aqui destacamos algumas pistas para o agir profissional na 
perspectiva do atendimento em rede, compreendendo esta postura como forma 
explícita de mediação na dinâmica contemporânea frente aos potenciais 
desafios que constituem os territórios onde versam as diferentes políticas 
públicas. 
Passaremos agora a contemplar a intersetorialidade enquanto ação 
necessária para atuação em rede. 
TEMA 3 - INTERSETORIALIDADE E REDE 
Ao nos aprofundarmos na concepção e defesa de um atendimento junto 
às expressões da questão social que se expressem pela estratégia de rede, 
vamos contemplando e desmistificando diferentes conceitos que se apresentam 
basilares nesta postura. Com isso contemplamos aqui também a questão da 
intersetorialidade. 
Fuentes (2019), com base em diferentes autores, destaca que a questão 
da intersetorialidade está presente nas perspectivas das políticas sociais 
brasileiras com destaque para o processo pós-Constituição Federal de 1988. A 
pesquisadora afirma em sua dissertação que a expectativa e intenção da 
proteção integral junto às políticas sociais – com destaque àquelas voltadas a 
crianças e adolescentes – requerem uma concepção e atuação que ultrapassem 
os limites disciplinares e institucionais. 
Pereira (2014) destaca a concepção de intersetorialidade a qual defende. 
[...] remete à relação dialética; isto é, à relação que não redunda em 
um amontoado de partes que o constituem ligam-se organicamente, 
dependem umas das outras e condicionam-se reciprocamente. Trata-
se, portanto, de uma relação em que nenhuma das partes ganha 
sentido e consistência se isolada ou separada das demais e das suas 
 
 
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circunstâncias (de suas condições de existência e de seu meio). 
(Pereira, 2014, p. 33) 
A concepção da autora a respeito do que vem a ser a intersetorialidade 
nos oferece uma visão privilegiada em defesa do processo de atendimento em 
rede. Emanam de suas palavras um processo recíproco de objetivos que se 
coadunam e que concebem cada ator social enquanto constitutivo no processo 
de proteção social. É perceptível ainda em suas palavras os desafios que podem 
se impor a este movimento e que somente têm potencialidades de serem 
superados se organicamente articulados seus atores. 
Fuentes (2019) soma suas considerações com Pereira (2014) quando 
esta afirma ser um movimento dialético que se consolida em 
complementariedade com os desafios impostos concretamente. Destacam as 
autoras que não se trata de uma mera soma de esforços, mas sim de uma 
projeção de unidade. 
Fazemos coro com as autoras acrescentando a questão do território que 
perpassa os atores, traduzindo-se aqui como as manifestações concretas dos 
desafios postos em uma perspectiva de atendimento de rede. Não se trata aqui 
tão somente de singularização de casos de intervenção – mesmo 
compreendendo a relevância que tais ações incidem sobre a proposta de 
atuação em rede –, defendemos uma postura de gestão de políticas sociais com 
recontes territoriais, intersetoriais e interdisciplinares. 
Assim, podemos compreender que é por meio da reciprocidade e da 
contradição, que são elementos constitutivos de uma relação “inter” e, 
portanto, dialética, que se pode produzir o movimento necessário para 
um processo de mudança e de superação. Nesse sentido,a relação 
intersetorial pressupõe atitudes ao mesmo tempo recíprocas e 
antagônicas e ambas as características são fundamentais para que 
esse tipo de relação possa construir “o novo”. (Fuentes, 2019, p. 99) 
Agir de forma intersetorial possibilita a superação de ações isoladas e 
revela o debate enquanto caminho metodológico do decidir e agir, trabalhando 
em prol de movimentos democráticos, superando a setorialização e a 
individualização de uma pretensa completude em sua ação institucional. Para 
Pereira (2014), também temos aqui uma ação pedagógica, ao passo que ao 
debater e propor ações em conjunto também se circula conceitos e concepções 
de fenômenos, antes apropriados de forma isolada em seus nichos institucionais. 
o exercício de sua constituição como unidade de diversos saberes 
exige a elaboração de uma concepção que, ao optar por uma dada 
 
 
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visão de mundo, terá que romper com outra que lhe é oposta. (Pereira, 
2014, p. 28) 
Para Fuentes (2019), há uma estreita ligação entre intersetorialidade e 
interdisciplinaridade, uma vez que as duas apontam para uma soma, uma 
relação em que não se perde de vista suas especificidades, mas se coadunam 
no sentido de construir arranjos interdependentes e complementares em face de 
uma mesma situação apresentada. Surge assim uma nova compreensão e ação 
sobre o objeto que se apresenta aos atores sociais. 
A autora, ainda, embasando-se nas concepções de Pereira (2014), afirma 
que a intersetorialidade ultrapassa a questão meramente de estratégia de 
intervenção, consolidando-se como elemento político uma vez que emana 
conceitos e posturas distintas dialeticamente diante dos fenômenos. 
Aqui é flagrante o quanto a compreensão de intersetorialidade e 
interdisciplinaridade se convergem no processo de atendimento em rede, 
superando, assim, as visões e concepções segmentadas diante dos fenômenos, 
então a questão que se apresenta a nós é: diante de suas concepções mais 
vantajosas, por que se insiste em uma postura setorializada e uma concepção 
disciplinar? 
A resposta aventada por Pereira (2014) é contundente. Apresenta-se à 
gestão pública formas burocratizadas de controle que se revelam 
administrativamente mais fáceis de controle por instâncias já consolidadas 
anteriormente. 
Como vimos, tal elemento é rico demais para encerrarmos o debate por 
aqui. Deste modo, continuaremos as nossas considerações a respeito da 
intersetorialidade e o atendimento em rede no próximo tópico. 
TEMA 4 - INTERSETORIALIDADE E ATENDIMENTO EM REDE II 
Defendermos uma postura de atendimento em rede pressupõe 
compreender um processo de constituição das expressões da questão social 
como constitutivas de um movimento imanente implícito na sociedade, cujo o 
enfrentamento requer a aglutinação de força. Esta compreensão, está apoiada 
de forma que, conforme as expressões da questão social vão se 
complexificando, também deve se complexificar as suas respostas. 
 
 
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Tanto uma como outra - expressões da questão social e seus 
enfrentamentos – revelam movimento, o que nos remete a um entendimento de 
constituição do ser social sempre em movimento. 
Ainda amparados em Fuentes (2019) destacamos que as políticas sociais 
brasileiras não apresentaram em sua origem concepções de necessidade 
intersetorial, mas sim uma setorialização, imanente à própria postura disciplinar 
que recorta suas proposições. Assim, a autora destaca ser relativamente nova 
esta postura e concepção. 
Afirma ainda que algumas políticas sociais constituem redes internas de 
aporte enquanto esforços para superar os desafios impostos setorialmente, mas 
que a constituição de suas especializações se configuraram como respostas 
fragmentadas do Estado brasileiro diante das expressões da questão social. 
Junqueira (1999) destaca que dada a complexidade das expressões da 
questão social, a setorialização passa a ser um desafio junto às políticas sociais 
brasileiras, daí emergem enquanto estrutura do real, mediações que postulam a 
intersetorialidade em nossas ações. Diferentes documentos têm se erguido 
nesta direção, movimento este que não é acompanhado pelas estruturas 
burocráticas de gestão pública, com suas especializações fragmentadas 
expressas em orçamentos próprios. 
Contudo, as formas de gestão, capacidades tecnológicas e condições 
de financiamento de cada política pública estão longe de serem 
homogêneas. Portanto, a problematização da intersetorialidade deverá 
considerar as particularidades de cada política social. Isso não significa 
dizer que a trajetória de cada setor tenha se dado de maneira 
endógena, ao contrário, ocorreu, em grande medida, a partir da relação 
com os demais. (Fuentes, 2019, p. 105) 
Contudo, a autora adverte que implícito nesta forma inovadora de ação 
junto às políticas sociais também temos contornos conservadores travestidos de 
renovação. Aqui está se referindo à corrente neoliberal, que tem entre seus 
caminhos percorridos a otimização de recursos a fim de conseguir realizar mais 
com menos recursos. 
Esta abordagem não teria uma tonalidade flagrantemente nociva se a 
questão do fundo público não estivesse em disputa. Mas, inerente à postura 
neoliberal, temos sua constituição também formada por uma postura de isenção 
do aparato estatal com relação aos investimentos nas áreas sociais, a fim de 
direcionar fundo público. 
 
 
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A eficácia das políticas sociais estaria relacionada, sobretudo, à 
economia de recursos, sejam eles financeiros, humanos e materiais. 
Assim, a busca por essa eficácia gerencial com enfoque na economia 
de gastos poderia suplantar objetivos de cunho mais estruturantes, 
como a superação de uma dada realidade. Além disso, ela poderia 
ainda estabelecer ritos procedimentais focados no monitoramento e 
controle, que não atendam às exigências de uma realidade dinâmica e 
contraditória. (Fuentes, 2014, p. 106) 
Que fique evidente aqui, esta não é a postura defendida por nós, e 
rechaçamos suas inclinações neste sentido. Nossas afirmações vêm tão 
somente a acrescentar que o fundo público e as iniciativas de Estado, sejam elas 
de caráter estatal ou da sociedade civil organizada, contemplem a dinamicidade 
das expressões da questão social, façam seu enfrentamento com múltiplas 
especialidades que se somam em busca de soluções comuns, e acima de tudo, 
com o território e seus componentes relacionais. 
Somamos nossa postura com a de Monnterat e Souza (2014): 
[...] estratégia de gestão voltada para a construção de interfaces entre 
setores e instituições governamentais (e não governamentais), visando 
o enfrentamento de problemas sociais complexos que ultrapassem a 
alçada de um só setor de governo ou área de política pública. 
(Monnerat; Souza, 2014, p. 42) 
Diante da configuração multisetorial das políticas públicas, esta afirmação 
nos parece mais coerente, uma vez que não se limita apenas aos aparatos 
estatais, mas contempla a realidade complexa dos territórios, sendo constituído 
por diferentes atores da sociedade civil. A visão aqui exposta extrapola a 
concepção adotada por Pereira (2014), uma vez que contempla não só aquilo 
que é da dinâmica burocrática do aparato estatal, mas busca se aproximar do 
movimento concreto do território. 
Bronzo (2010) destaca que as respostas de intersetorialidade junto às 
políticas sociais revelam também a complexidade exigida ao combate das 
expressões da questão social, aqui entendida mais no conjunto de expressão de 
pobreza. 
A intersetorialidade na gestão é a contraface da multidimensionalidade 
da pobreza; a intersetorialidade é uma decorrência lógica da 
concepção da pobreza como fenômeno multimensional. Este é o 
primeiro registro sob o qual se deve examinar o tema da 
intersetorialidade. (Bronzo, 2010, p. 9) 
Sabemos que as políticas sociais não são necessariamente soluções 
estruturais para o combate às expressões da questão social, estando inscritas 
no rol dos movimentos dialéticosda sociedade capitalista contemporânea, no 
 
 
12 
entanto, é bem verdade de que como expressamos maiores condições de 
sociabilidade com maiores acessos aos frutos coletivamente produzidos, 
também nos movemos nesta esteira social para aprofundar nossos graus de 
liberdade. 
Pois bem, com estas expressões finalizamos as nossas considerações a 
respeito da intersetorialidade, compreendendo seu vínculo estreito com a 
interdisciplinaridade e a multidisciplinaridade, compreendendo ainda que não se 
faz intervenções sociais com a perspectiva de integralidade longe de uma 
postura de rede amparada no território. 
TEMA 5 – APONTAMENTOS E PERSPECTIVAS 
Chegamos até aqui percorrendo um caminho que se propôs a 
compreender elementos constitutivos para um atendimento em rede. 
Desmistificamos o conceito de Estado, em que nos apoiamos na concepção 
gramsciniana de Estado a fim de sinalizar as responsabilidades, seu caráter 
dialética, dinâmico e em construção nas relações sociais contemporâneas. 
Com isso contemplamos ainda a compreensão sobre as políticas sociais 
enquanto relações concretas e contraditórias que alcançam objetivos distintos 
para atores distintos, não se revelando apenas com uma única faceta, mas como 
elementos de movimento dialético e histórico. 
Compreendemos que o ser social se constrói na história sob forma 
concreta e expressando-se em uma dimensão espacial que pressupõe ainda o 
uso desta porção delimitada de espaço, trazendo assim o entendimento sob o 
território e sua relação com os sujeitos que ali se objetivam. Buscamos ainda 
nesta corrente argumentar que as medidas de proteção social configuradas no 
movimento dialético devem ter na perspectiva do território o seu fundamento e 
expressão, aqui também entendida como as diferentes expressões das redes 
sociais. 
E por falar em rede, buscamos uma aproximação conceitual dos 
diferentes formatos que estas expressam, compreendendo ainda que estas teias 
relacionais de proteção social tendem a não se isolar, buscando na 
intersetorialidade, multidisciplinaridade e interdisciplinaridade as expressões 
mais fiéis de suas manifestações, sendo estas um vocábulo recorrente para 
aqueles que desejam uma atuação mais progressista nas políticas sociais. 
 
 
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Contudo, não seria possível trazer a questão do atendimento em rede sem 
expressar que tipo de participação defendemos, compreendendo aqui, caro 
discente, que na perspectiva de rede temos que ter a dimensão de uma 
participação progressista, e não apenas como um adorno, ou invólucro em que 
seu conteúdo passa distante de uma participação efetiva. 
Após tecermos nossas considerações sobre os conceitos de 
disciplinaridade, multidisciplinaridade, interdisciplinaridade e 
transdisciplinaridade, – esta última ainda por se realizar – buscamos 
compreender e lançar mão de uma ação que tenha em mente uma ética 
verdadeiramente humana, compreendendo aqui seus desafios e perspectivas 
concretas e historicamente construídas e/ou a serem construídas. 
Delimitamos aqui como a incidência da ética permearia as relações de 
atendimento em rede. Aqui defendemos uma construção nos valores humanos 
na medida ontológica dos elementos do ser social, buscando com isso incidir as 
posturas junto às políticas sociais em um processo que revela não apenas as 
necessidades imediatas, mas enquanto caminhos mediatizados nas relações do 
Estado com a sociedade. 
É aqui que as posturas de rede enquanto mediações constitutivas e 
necessárias junto às expressões da questão social se fazem presentes, 
requerendo ações de caráter mais do que setorial, mas sim em relações 
interinstitucionais, intersetoriais e além das materializações dos aparatos 
burocráticos do aparelho estatal. 
Esperamos que com estas indicações possamos conjuntamente construir 
os elementos constitutivos de uma nova postura junto às políticas sociais, 
requerendo assim uma visão integral e humana em suas valorações éticas que 
a história vem proporcionar na constituição sempre em movimento do ser social. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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REFERÊNCIAS 
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