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Prévia do material em texto

Urbana
Prof.ª Andressa Lídicy Morais Lima
antropologia 
rUral e
Indaial – 2022
1a Edição
Elaboração:
Prof.ª Andressa Lídicy Morais Lima
Copyright © UNIASSELVI 2022
 Revisão, Diagramação e Produção:
Equipe Desenvolvimento de Conteúdos EdTech
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI
Ficha catalográfica elaborada pela equipe Conteúdos EdTech UNIASSELVI
Impresso por:
C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI.
Núcleo de Educação a Distância. LIMA, Andressa Lídicy Morais.
Antropologia Rural e Urbana. Andressa Lídicy Morais Lima. Indaial - SC: 
UNIASSELVI, 2022.
200p.
ISBN 978-85-515-0614-1
ISBN Digital 978-85-515-0615-8
“Graduação - EaD”.
1. Antropologia 2. Rural 3. Urbana 
CDD 306.981
Bibliotecário: João Vivaldo de Souza CRB- 9-1679
Prezado acadêmico! Bem-vindo à disciplina de Antropologia Rural e Urbana. 
Este é o nosso livro didático, material elaborado com o objetivo de auxiliar e contribuir 
para a formação profissional e o avanço nos seus estudos. Este material lhe ajudará 
a conhecer um universo de muito conhecimento a respeito da vida social entre grupos 
humanos, a antropologia se caracteriza pelo estudo da diversidade dos modos de 
vida, nos proporciona um conhecimento vasto acerca das diferentes línguas, hábitos 
culturais, religiões, formas de direito, sentidos de justiça, artes, modos de existir e 
construir relações entre grupos sociais pertencentes a localidades distintas. Por isso, 
você pode usar este material como base para iniciar a sua imersão em um conteúdo que 
hoje pode parecer muito familiar, como é a cidade, a vida urbana ou a vida rural, suas 
formas de organização social, mas aqui você poderá conhecer um pouco do relevante 
processo histórico de formação e transformação da vida humana a partir dos fenômenos 
rural e urbano e das suas interferências e interfaces. 
Na Unidade 1, abordaremos como ponto de partida os estudos do urbano, isto 
porque a maneira como a antropologia brasileira se desenvolveu passou por diferentes 
expectativas de construção e aplicação de pesquisas marcadas substancialmente pelo 
acontecimento da Revolução Industrial e do sistema capitalista. Logo, cidade, urbano 
e indivíduo fazem parte de um conjunto de categoriais de análise para compreender o 
que é Antropologia Urbana.
Em seguida, na Unidade 2, estudaremos a Antropologia Rural, durante muito 
tempo essa subárea ficou conhecida como “sociedades camponesas”. Seu estudo 
procura se relacionar por contraponto ao urbano. Abordaremos um retrato da grande 
diversidade social e cultural que há no rural brasileiro. A dimensão antropológica dessa 
área de estudos permitirá o entendimento dos indivíduos que habitam os campos, seus 
conflitos, seus saberes e suas lutas pelo direito à terra. 
Por fim, na Unidade 3, estudaremos a relação entre os estudos urbanos e 
rurais, sabendo que as transformações que ocorrem tanto no rural quanto no urbano 
interferem uma na outra. Será possível entender como vários aspectos de uma cultura 
estão interligados a diferentes modos de existir, assim percebidas a interface entre rural e 
urbano como produtora de uma riqueza de modos de vida e de conflitos sociais. 
 
Neste livro você encontrará os conteúdos que lhe serão úteis para sua 
formação. Entretanto, lembre-se que o conhecimento é uma fonte inesgotável e aqui 
é um bom ponto de partida para você navegar pela Antropologia Rural e Urbana tendo 
como perspectiva que essas reflexões despertem o desejo pelo conhecimento, pela 
investigação antropológica, pela leitura de etnografias de temas que estão movendo os 
debates contemporâneos. 
APRESENTAÇÃO
Sabemos que neste livro será apresentado um conjunto de abordagens, escolas 
de pensamento, categorias de análise e linhas de pesquisa, fornecendo assim um mapa 
para facilitar a compreensão deste tema tão desafiador. Aproveite e navegue pelos 
estudos antropológicos. 
Desejo a você um bom estudo e que as leituras deste livro ampliem seus 
horizontes na busca por sempre renovar o interesse pelo conhecimento. 
Boa leitura! 
Prof.ª Andressa Lídicy Morais Lima
Olá, acadêmico! Para melhorar a qualidade dos materiais ofertados a você – 
e dinamizar, ainda mais, os seus estudos –, nós disponibilizamos uma diversidade de QR 
Codes completamente gratuitos e que nunca expiram. O QR Code é um código que permite 
que você acesse um conteúdo interativo relacionado ao tema que você está estudando. Para 
utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos e baixe um leitor de QR Code. Depois, 
é só aproveitar essa facilidade para aprimorar os seus estudos.
GIO
Olá, eu sou a Gio!
No livro didático, você encontrará blocos com informações 
adicionais – muitas vezes essenciais para o seu entendimento 
acadêmico como um todo. Eu ajudarei você a entender 
melhor o que são essas informações adicionais e por que você 
poderá se beneficiar ao fazer a leitura dessas informações 
durante o estudo do livro. Ela trará informações adicionais 
e outras fontes de conhecimento que complementam o 
assunto estudado em questão.
Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos 
os acadêmicos desde 2005, é o material-base da disciplina. 
A partir de 2021, além de nossos livros estarem com um 
novo visual – com um formato mais prático, que cabe na 
bolsa e facilita a leitura –, prepare-se para uma jornada 
também digital, em que você pode acompanhar os recursos 
adicionais disponibilizados através dos QR Codes ao longo 
deste livro. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura 
interna foi aperfeiçoada com uma nova diagramação no 
texto, aproveitando ao máximo o espaço da página – o que 
também contribui para diminuir a extração de árvores para 
produção de folhas de papel, por exemplo.
Preocupados com o impacto de ações sobre o meio ambiente, 
apresentamos também este livro no formato digital. Portanto, 
acadêmico, agora você tem a possibilidade de estudar com 
versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
Preparamos também um novo layout. Diante disso, você 
verá frequentemente o novo visual adquirido. Todos esses 
ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos 
nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, 
para que você, nossa maior prioridade, possa continuar os 
seus estudos com um material atualizado e de qualidade.
QR CODE
Acadêmico, você sabe o que é o ENADE? O Enade é um 
dos meios avaliativos dos cursos superiores no sistema federal de 
educação superior. Todos os estudantes estão habilitados a participar 
do ENADE (ingressantes e concluintes das áreas e cursos a serem 
avaliados). Diante disso, preparamos um conteúdo simples e objetivo 
para complementar a sua compreensão acerca do ENADE. Confira, 
acessando o QR Code a seguir. Boa leitura!
ENADE
LEMBRETE
Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma 
disciplina e com ela um novo conhecimento. 
Com o objetivo de enriquecer seu conheci-
mento, construímos, além do livro que está em 
suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, 
por meio dela você terá contato com o vídeo 
da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complementa-
res, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de 
auxiliar seu crescimento.
Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que 
preparamos para seu estudo.
Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada!
SUMÁRIO
UNIDADE 1 — ANTROPOLOGIA URBANA ................................................................... 1
TÓPICO 1 — CONTEXTO: O URBANO, AS CIDADES E OS SUJEITOS ..................... 3
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 3
2 O URBANO ........................................................................................................... 6
3 AS CIDADES ....................................................................................................... 10
4 OS SUJEITOS .................................................................................................... 15
RESUMO DO TÓPICO1 .......................................................................................... 19
AUTOATIVIDADE ...................................................................................................20
TÓPICO 2 — ENTRE ESCALAS E ESCOLAS DE ETNOGRAFIA URBANA .............23
1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................23
2 ESCOLA DE CHICAGO .......................................................................................24
3 ESCOLA DE MANCHESTER ............................................................................... 31
RESUMO DO TÓPICO 2 ..........................................................................................39
AUTOATIVIDADE .................................................................................................. 40
TÓPICO 3 — MOVIMENTOS SOCIAIS, SUBCULTURAS E IDENTIDADES 
URBANAS .........................................................................................43
1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................43
2 MOVIMENTOS SOCIAIS E SUBCULTURAS URBANAS .................................... 44
3 IDENTIDADES URBANAS .................................................................................. 51
LEITURA COMPLEMENTAR ..................................................................................58
RESUMO DO TÓPICO 3 ..........................................................................................63
AUTOATIVIDADE ...................................................................................................64
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 67
UNIDADE 2 — ANTROPOLOGIA RURAL .................................................................71
TÓPICO 1 — CONCEITOS E TRADIÇÕES TEÓRICAS NOS ESTUDOS DE 
CAMPESINATO E DA RURALIDADE .................................................. 73
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 73
2 OS ESTUDOS DO RURAL NA FORMAÇÃO DA ANTROPOLOGIA BRASILEIRA ......75
3 OS ESTUDOS DE COMUNIDADE ........................................................................89
RESUMO DO TÓPICO 1 ..........................................................................................93
AUTOATIVIDADE ...................................................................................................94
TÓPICO 2 — POVOS TRADICIONAIS E SEUS MODOS DE USO E OCUPAÇÃO 
DO ESPAÇO RURAL .......................................................................... 97
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 97
2 ANTROPOLOGIA RURAL NO BRASIL ...............................................................102
3 CAMPESINATO .................................................................................................106
4 COMUNIDADES TRADICIONAIS ......................................................................109
4.1 INDÍGENAS ..........................................................................................................................111
4.2 QUILOMBOLAS .................................................................................................................. 114
4.3 CAIÇARAS .......................................................................................................................... 115
4.4 RIBEIRINHOS ..................................................................................................................... 116
RESUMO DO TÓPICO 2 .........................................................................................119
AUTOATIVIDADE .................................................................................................120
TÓPICO 3 — ORGANIZAÇÕES ECONÔMICAS, RELAÇÕES SOCIAIS E 
MORALIDADES NO MUNDO RURAL ............................................... 123
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................... 123
2 TERRITÓRIO E TERRITORIALIDADE ...............................................................124
3 IDENTIDADE, TERRITÓRIO E NOVAS QUESTÕES DO MUNDO RURAL .......... 126
LEITURA COMPLEMENTAR .................................................................................131
RESUMO DO TÓPICO 3 ........................................................................................ 136
AUTOATIVIDADE ................................................................................................. 137
REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 139
UNIDADE 3 — RELAÇÃO ENTRE O RURAL E O URBANO ...................................143
TÓPICO 1 — O CONTINUUM ENTRE O URBANO E O RURAL NA PRODUÇÃO 
DE IDENTIDADES SOCIAIS .............................................................145
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................145
2 ALGUMAS CATEGORIAS ANALÍTICAS ............................................................ 147
3 O RURAL E O MODERNO ................................................................................... 153
RESUMO DO TÓPICO 1 ........................................................................................158
AUTOATIVIDADE ................................................................................................. 159
TÓPICO 2 — MODOS DE PRODUÇÃO, CONSUMO E USO DE RECURSOS ...........161
1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................161
2 MODOS DE PRODUÇÃO .................................................................................... 163
3 MORALIDADES ENTRE O RURAL E URBANO .................................................. 166
RESUMO DO TÓPICO 2 ........................................................................................ 176
AUTOATIVIDADE ..................................................................................................177
TÓPICO 3 — A QUESTÃO AMBIENTAL: TENSÕES, FRONTEIRAS E DISPUTAS ........ 179
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................... 179
2 NOVAS RURALIDADES .................................................................................... 181
3 NOVAS URBANIDADES ...................................................................................184
LEITURA COMPLEMENTAR ................................................................................188
RESUMO DO TÓPICO 3 ........................................................................................194
AUTOATIVIDADE ................................................................................................. 195
REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 199
1
UNIDADE 1 — 
ANTROPOLOGIA URBANA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
PLANO DE ESTUDOS
 A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
•	 identificar	 a	 formação	 da	 antropologia	 urbana	 a	 partir	 dos	 estudos	 de	 diferentes	
contextos,	grupos	sociais	e	tempos	históricos;
•	 estudar	as	escolas	clássicas	como	a	Escola	de	Chicago	e	a	Escola	de	Manchester	
permitirá	compreender	as	contribuições	metodológicas	que	suas	pesquisas	oferecem	
aos	estudos	do	rural	e	do	urbano	e	suas	implicações	para	nossa	a	sociedade	contem-
porânea;
•	 dominar	as	categorias	centrais	do	campo	como	o	conceito	de	 “cidade”,	 “metrópole”,	
“vida	urbana”	e	“tribos	urbanas”;
•	 relacionar	os	elementos	conceituais	com	a	aplicação	em	estudos	etnográficos	para	
entender	 os	 efeitos	 das	 aglomerações,	 moradias,	 jornadas	 intensas	 de	 trabalho,	
precarização	da	mão	de	obra	nas	novas	formas	de	organização	social	da	vida	urbana.
	 A	cada	tópico	desta	unidade	você	encontrará	autoatividadescom	o	objetivo	de	
reforçar	o	conteúdo	apresentado.
TÓPICO	1	–	CONTEXTO:	O	URBANO,	AS	CIDADES	E	OS	SUJEITOS
TÓPICO	2	–	ENTRE	ESCALAS	E	ESCOLAS	DE	ETNOGRAFIA	URBANA
TÓPICO	3	–	MOVIMENTOS	SOCIAIS,	SUBCULTURAS	E	IDENTIDADES	URBANAS
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure 
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.
CHAMADA
2
CONFIRA 
A TRILHA DA 
UNIDADE 1!
Acesse o 
QR Code abaixo:
3
CONTEXTO: O URBANO, AS CIDADES 
E OS SUJEITOS
TÓPICO 1 — UNIDADE 1
1 INTRODUÇÃO 
A	 antropologia	 se	 consolidou	 a	 partir	 de	 importantes	 estudos	 etnográficos	 do	
final	 do	 século	 XIX.	 Neles,	 os	 antropólogos	 dedicavam-se	 ao	 estudo	 aprofundado	 de	
diversas	sociedades,	tomando	como	premissa	entender	a	diversidade	dos	modos	de	vida	
em	relação	com	a	da	sociedade	do	pesquisador.	Assim,	as	ricas	etnografias	clássicas	da	
antropologia	colocavam	em	evidência	um	conjunto	robusto	de	descrições	dos	povos	com	os	
quais	conviveram	em	suas	pesquisas,	um	exemplo	desse	tipo	de	trabalho	é	o	centenário	
“Os	Argonautas	do	Pacífico	Ocidental:	um	relato	do	empreendimento	e	da	aventura	dos	
nativos	 nos	 Arquipélagos	 da	 Nova	 Guiné	 Melanésia”	 do	 antropólogo	 polonês	 Bronislaw	
Malinowski,	publicado	em	1922.	Acadêmico,	a	seguir	você	verá	uma	imagem	do	antropólogo	
Malinowski	interagindo	entre	trobriandeses	durante	sua	pesquisa	de	campo.	
Figura 1 – Argonautas do pacífico ocidental
Fonte: https://bit.ly/3J5hYw6. Acesso em: 20 jul. 2022.
Naquela	época	as	 investigações	antropológicas	concentravam-se	nos	estudos	
de	diferentes	sociedades	ao	redor	do	mundo	e	seus	modos	de	viver.	Aquelas	sociedades	
que	não	pertenciam	à	civilização	ocidental	foram	caracterizadas	como	“sociedades	de	
pouco	contato”,	 cuja	 tecnologia	não	era	considerada	desenvolvida	ou	que	havia	baixa	
divisão	do	trabalho	social.	Tais	povos	que	ali	habitavam	foram	chamados	em	diferentes	
momentos	históricos	de	“primitivos”,	“sociedades	simples”,	“arcaicos”	ou	“sociedades	frias”,	
sempre	em	comparação	com	as	chamadas	“sociedade	complexas”	–	aquelas	consideradas	
“civilizadas”,	“sociedades	modernas”	ou	“sociedades	quentes”.	
4
Quer saber mais a respeito de um dos livros mais importantes 
da história da Antropologia? Assista ao vídeo das “Aulas abertas: 
teorias e histórias da antropologia – o centenário de argonautas”. 
Promovido pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia 
Social da Universidade Federal de Campinas (UNICAMP), com a 
presença da Prof.ª Dra. Mariza Peirano (Universidade de Brasília): 
https://bit.ly/3osZpsv.
DICA
Acadêmico,	 neste	momento,	 você	 pode	 se	 perguntar:	 quais	 seriam	 então	 essas	
“sociedades	quentes”?	Pois	bem,	já	adiantamos	a	você:	são	aquelas	das	quais	pertenciam	
os	pesquisadores	e	antropólogos.	Além	disso,	é	 importante	que	você	saiba	que	ambos	os	
termos,	sociedades	“frias”	e	“quentes”,	foram	introduzidos	pelo	antropólogo	francês	Claude	
Lévi-Strauss,	na	tentativa	de	 identificar	e	classificar	as	estruturas	 inconscientes	básicas	
que	definiriam	as	culturas	humanas.	Assim,	aquelas	sociedades	que	estavam	mais	perto	
do	estado	de	natureza	cujo	volume	de	pessoas	era	menor	e	embora	dinâmicas	nutriam	
resistência	às	mudanças	culturais	 foram	chamadas	de	sociedades	frias	ou	simples.	Por	
outro	 lado,	 as	 sociedades	quentes	 ou	 complexas	 são	 aquelas	marcadas	pelos	 processos	
industriais	e	que	foram	afetadas	pela	globalização,	pelo	progresso	e	apresentam	maior	
desarmonia	e	conflitos	de	desordem	social,	possuem	ainda	entre	suas	características	o	
grande	contingente	populacional,	históricas,	estão	mais	distantes	do	estado	de	natureza.	
No	entanto,	 essas	terminologias	passaram	por	 revisões	críticas	dentro	da	própria	
disciplina	 e	 tem	 procurado	 no	 contexto	 contemporâneo	 não	 se	 referir	 aos	 povos	 cujas	
culturas	 se	 diferenciam	da	nossa	de	 “primitivos”,	 entendendo	que	 isto	 é	 uma	 forma	de	
etnocentrismo.	Aliás,	importante	conceito	antropológico	que	será	muito	utilizado	em	
nosso	entendimento	acerca	da	Antropologia	Rural	e	Urbana.	
Abordaremos o estudo da Antropologia Rural em nossa próxima unidade.
ESTUDOS FUTUROS
De	acordo	com	o	antropólogo	Everardo	Rocha	(1988),	etnocentrismo	é	uma	visão	
de	mundo,	na	qual	a	pessoa	toma	seu	próprio	grupo	como	ponto	de	partida	para	avaliar	
e	medir	valores,	hábitos	e	modelos	de	existências	como	se	fossem	superiores,	melhores	
ou	os	mais	corretos	a	serem	seguidos	e	assim	passa	a	negar	a	existência	da	diversidade.	
Cabe	ainda	destacar	que	o	etnocentrismo	é	uma	característica	presente	em	
qualquer	sociedade	ou	grupo	social,	pois	todas	elas	tendem	a	olhar	umas	para	as	outras	
a	partir	de	si	próprias.	
5
A	partir	disso,	outro	importante	conceito	antropológico	merece	atenção:	trata-se	do	
relativismo.	 Este	 conceito	 possibilita	 o	 conhecimento	da	diversidade, entendendo	
os	seus	próprios	valores	e	contextos,	nos	quais	se	realizam,	portanto,	no	encontro	com	
o	“Outro”	e	com	a	diferença.	Assim,	o	relativismo	cultural	nos	auxilia	a	não	hierarquizar	
ou	 emitir	 juízos	 de	valor	 que	 estejam	 investidos	 de	 preconceitos.	 É	 importante	 lembrar	
que	esse	Outro	se	trata	daqueles	que	não	pertencem	à	mesma	cultura	que	o	“nós”	do	
pesquisador.	
O	etnocentrismo	é	produto	do	Ocidente,	que	toma	seu	estágio	de	desenvolvimento	
científico	e	tecnológico	como	o	de	maior	grau	em	desenvolvimento	humano,	ao	fazer	 isto	
analisa	outras	sociedades	de	modo	a	hierarquizá-las	partindo	de	suas	próprias	categorias,	
valores	 e	 conhecimento	 (LÉVI-STRAUSS,	 1993).	 Assim,	 uma	 crítica	 contundente	 ao	
evolucionismo	praticado	na	antropologia,	permitirá	entender	que	 "existem	nas	sociedades	
humanas,	 simultaneamente	 em	 elaboração,	 forças	 trabalhando	 em	 direções	 opostas:	
umas	tendem	à	manutenção,	e	mesmo	à	acentuação	dos	particularismos;	as	outras	agem	
no	sentido	da	convergência	e	da	afinidade"	(LÉVI-STRAUSS,	1993,	p.	331).	
Ao	 adotarmos	 o	 pensamento	 relativista	 compreendemos	 que	 a	 diversidade	
deixaria	 de	 ser	 entendida	 com	 base	 em	 processos	 evolutivos	 e	 passaria	 a	 ser	 vista	
de	uma	perspectiva	de	valorização	da	diferença,	respeitando	suas	configurações	e	as	
possibilidades	de	relações	de	culturas	entre	si.	
No	Brasil,	a	antropologia	tem	uma	 longa	trajetória	de	pesquisas	versadas	em	
estudos	 de	 populações	 indígenas,	 grupos	 rurais,	 grupos	 urbanos	 e	 aqueles	 grupos	
definidos	conforme	a	divisão	de	classes	sociais	 (MELLATI,	 1983;	OLIVEN;	2007).	Essa	
característica	é	 importante	por	nos	aproximar	de	nossa	própria	disciplina	aqui	estudada:	
Antropologia	Rural	e	Urbana.	A	relação	entre	o	eu	e	o	outro	ganha	agora	novos	contornos	
analíticos	que	privilegiam	a	perspectiva	da	alteridade.	
Do	 ponto	 de	 vista	 antropológico	 a	 alteridade	 significa	 que	 o	 “eu”	 só	 pode	
ser	 entendido	 a	 partir	 da	 interação	 que	 estabelece	 com	 o	 “outro”,	 tal	 categoria	 é	
frequentemente	usada	como	definidora	da	própria	antropologia,	por	colocar	em	foco	
a	importância	de	estudarmos	as	diferenças	entre	várias	culturas,	sociedades	e	grupos	
sociais	 com	o	 interesse	de	conhecermos	e	estabelecermos	uma	 relação	de	 respeito	
mútuo	e	aprendizado	moral	a	partir	das	diferenças.	
Desse	 modo,	 os	 estudos	 de	 diferentes	 contextos,	 grupos	 sociais	 e	 tempos	
históricos	permitirá	compreender	as	contribuições	dos	estudos	do	rural	e	do	urbano	e	
suas	implicações	para	nossa	a	sociedade	contemporânea.	As	especificidades	que	estão	na	
descrição	de	grupos	sociais	como	jovens	e	tribos	urbanas	nos	permitem	conhecer	suas	
práticas,	consumo,	formas	de	lazer	na	cidade	e	no	mundo	urbano,	ao	mesmo	tempo	em	
que	é	possível	conhecermos	os	campesinos,	seus	processos	de	trabalho	no	campo,	suas	
culturas	de	 subsistência	bem	como	seus	 rituais	 festivos.	 E,	finalmente,	 na	 interação	
entre	esses	universos	vastos	de	pesquisas	e	experiências	vividas	podemos	ainda	descobrir	
o	fio	invisível	que	permanece	ligando	essas	interações	entre	o	rural	e	o	urbano	no	mundo	
contemporâneo.6
Nesse	sentido,	o	antropólogo	em	campo	busca	 reunir	um	vasto	material	que	
possa	 registrar	as	diferenças	entre	essas	populações	de	acordo	com	a	observação	da	
organização	social,	do	sistema	de	parentesco,	do	 idioma	daquela	população,	o	modo	
como	manejam	alimentos,	a	maneira	de	se	relacionar	com	os	animais,	as	práticas	rituais	
de	magia	e	 religião,	 seus	sentidos	de	 justiça	e	direito,	 assim	como	diferentes	outros	
aspectos	 da	 vida	 social	 de	 um	 povo,	 sempre	 respeitando	 suas	 diferenças.	 A	 partir	
dessas	considerações	iniciais	e	da	breve	apresentação	desses	conceitos	elementares	e	
definidores	do	campo	da	antropologia,	nos	Tópico	2	e	3,	abordaremos	mais	diretamente	o	
urbano	e	o	surgimento	da	Antropologia	Urbana.	
Sistema de parentesco: conforme bom apontamento da 
antropóloga Cynthia Sarti (1992, p. 71) quando falamos em 
sistemas de parentesco na antropologia estamos nos referindo as 
estruturas formais de relação social, que resultam da combinação 
de três tipos de relações básicas:  a)  a relação de descendência, 
que é a relação entre pai e filho e mãe e filho;  b)  a relação de 
consanguinidade, que é a relação entre irmãos; e  c)  a relação 
de afinidade, ou seja, a que se dá por meio do casamento, pela 
aliança. Essas três relações são básicas e o estudo do parentesco é 
o estudo da sua combinação. Essas relações são a estrutura formal 
universal. Qualquer sociedade se forma pela combinação dessas 
três relações. A variabilidade está em como se faz essa combinação.
NOTA
2 O URBANO 
Caro	 acadêmico,	 até	 aqui	 podemos	 considerar	 que	 você	 já	 está	 um	 pouco	
familiarizado	com	o	universo	da	antropologia,	uma	riqueza	sem	fim	de	informações	e	
conhecimento	das	formas	de	vida,	agora	vamos	nos	aprofundar	um	pouco	no	contexto	
da	antropologia	urbana,	uma	subárea	da	antropologia,	na	qual	se	dará	nossa	disciplina.	
Uma	 dimensão	 interessante	 é	 procurar	 entender	 as	 transformações	 sociais	
advindas	 com	o	meio	urbano,	 isto	porque	 tais	 transformações	definiram	uma	 importante	
agenda	de	estudos	que	cobre,	principalmente,	processos	de	mudanças	sociais	ocorridas	
após	o	surgimento	do	sistema	capitalista	que	foi	impulsionado	pela	Revolução	Industrial.	
Assim,	as	cidades	industriais	são	uma	consequência	desse	intenso	processo	de	urbanização	
que	 marca	 o	 século	 XIX	 em	 termos	 de	 infraestrutura	 do	 espaço	 social,	 mas	 também	
mudanças	de	comportamento	e	interação	entre	pessoas	nesse	novo	contexto	o	que	nos	
leva	ao	estudo	aprofundado	das	diferenças,	dos	conflitos,	das	novas	formas	de	sociabilidade	
nesse	ambiente	e	muitas	outras	dimensões	da	vida	social	agora	no	meio	urbano.	
7
FILME TEMPOS MODERNOS – CHARLIE CHAPLIN
DICA
Modern Times (Tempos Modernos) é um filme do cineasta Charlie Chaplin, no qual seu 
famoso personagem "O Vagabundo" tenta sobreviver em meio ao mundo moderno 
e industrializado. Lançado em 5 de fevereiro de 1936 (Nova Iorque), com produção, 
roteiro, direção e música (Smile) composta por Charlie Chaplin.
Fonte: https://bit.ly/2ErrXxM. Acesso em: 3 ago. 2022.
Assim,	um	dos	principais	objetos	de	 interesse	de	 investigação	científica	foram	
as	 “cidades”	 e	 o	 “urbano”,	 isto	porque	efeitos	 como	aglomerações,	moradias,	 jornadas	
intensas	 de	 trabalho,	 precarização	 da	 mão	 de	 obra	 eram	 notáveis	 nas	 formas	 de	
organização	social	da	vida	urbana.	
 
As	mudanças	profundas	oriundas	desses	acontecimentos	modificaram	a	vida	em	
sociedade	não	só	em	aspectos	relacionados	ao	espaço,	ao	ambiente	das	cidades,	mas	
também	naquilo	que	se	refere	ao	modo	de	habitar	e	os	próprios	indivíduos.	
Cientistas	 sociais	acompanharam	os	primeiros	efeitos	dessas	mudanças	nas	
relações	 sociais	 e	 nas	 estruturas	 do	 ambiente.	 A	 partir	 de	 então	 a	 questão	 urbana	
tornou-se	uma	preocupação	por	parte	de	uma	rede	de	pesquisadores	interessados	nas	
mudanças	advindas	desse	processo	de	inchaço	nas	grandes	cidades	e,	do	mesmo	modo,	
como	 isso	 impactava	na	vida	 rural.	Muitos	 cientistas	 sociais	 foram	contra	os	processos	
intensos	de	urbanização	defendendo	que	a	vida	rural	com	hábitos	e	população	mais	
homogêneas	era	uma	forma	de	vida	cujos	laços	sociais	eram	mais	intensos	e	detentor	de	
maior	qualidade.	Naquele	momento,	a	vida	rural	passou	a	ser	modificada	com	eventos	
como	a	migração	e	o	êxodo	cada	vez	mais	presentes	e	intensificados.	
https://bit.ly/2ErrXxM
8
Em	 1903,	 o	 sociólogo	 alemão	 George	 Simmel	 publicou	 um	 interessante	 ensaio	
intitulado	 “A	metrópole	e	a	vida	mental”,	 e	 trouxe	para	o	debate	científico	no	campo	
das	ciências	sociais	essas	preocupações	em	torno	das	mudanças	no	binômio	rural	e	
urbano.	Simmel	apresentou	um	impressionante	olhar	sobre	os	estilos	de	vida	urbanos	e	
a	questão	da	personalidade	nesse	contexto.	Sua	contribuição	observa	a	organização	
social	e	as	práticas	culturais	que	caracterizavam	as	áreas	urbanas	como	consequência	da	
grande	aglomeração	de	pessoas.	Em	sua	 rica	descrição,	 somos	 instigados	a	perceber	 as	
características	 físicas	 da	 cidade	 em	 correlação	 com	 as	 características	 sociais	 de	 seus	
habitantes.	
Simmel,	 que	 era	 filho	 de	 industrial,	 observava	 as	 transformações	 a	 partir	 da	
cidade	de	Berlim,	onde	nasceu.	Percebia	a	mudança	de	sua	cidade	natal	a	partir	de	uma	
moderna	 aglomeração	 urbana,	 caracterizada	 pelo	 enorme	 fluxo	 de	 pessoas,	 presença	
intensa	de	comércios,	práticas	de	prostituição,	assim	como	uso	de	bondes	e	elevada	
circulação	de	dinheiro.	Para	Simmel,	Berlim	era	um	modelo	da	cidade	moderna,	mais	
até	 do	 que	 Londres,	 por	 ter	 experimentado	 um	 processo	 tardio	 de	 industrialização.	
A	 partir	 da	 observação	 sistemática,	 isto	 é,	 uma	 observação	 regular	 da	metrópole,	 o	
sociólogo	alemão	encontrou	o	cenário	de	seu	diagnóstico	a	respeito	da	modernidade.	
Naquele	momento	Simmel	estava	diante	de	um	“campo	empírico”	de	experiências	de	
proximidade	e	a	partir	disso	foi	possível	elaborar	suas	reflexões	com	base	nas	tensões	
modernas	entre	a	experiência	do	indivíduo	e	da	sociedade	ou,	dito	de	outro	modo,	“a	
base	 psicológica	 do	 tipo	metropolitano	 de	 individualidade	 consiste	 na	 intensificação	 dos	
estímulos	 nervosos,	 que	 resulta	 na	 alternação	 brusca	 e	 ininterrupta	 entre	 estímulos	
exteriores	e	interiores”	(SIMMEL,	1979,	p.	14).	
A	descrição	minuciosa	de	Simmel	forneceu	bases	teóricas	e	analíticas	essenciais	
para	o	desenvolvimento	de	uma	sociologia	urbana,	posteriormente,	também	de	uma	
Antropologia	 Urbana.	 Além	 de	 observar	 a	 sociabilidade	 ali	 contida,	 Simmel	 aprofundou	
sua	 análise	 das	 emoções	 e	 os	 sentimentos	 que	 estavam	presentes	 naquela	 intensa	
mudança	 na	vida	 citadina.	 Era	 assim	 que	 seu	 texto	 se	 tornava	 um	 clássico	 para	 os	
estudos	de	Antropologia	Urbana,	nos	fazendo	mergulhar	em	uma	análise	contundente	
das	emoções	e	as	subjetividades	no	interior	de	uma	grande	metrópole.	
Abordaremos o estudo da migração e do êxodo rural no Brasil na 
próxima Unidade deste livro, quando aprenderemos Antropologia Rural.
ESTUDOS FUTUROS
9
Sua	 narrativa	 coloca	 em	 evidência	 aspectos	 como	 “a	 intensificação	 da	 vida	
nervosa”,	seu	fundamento	psicológico	e	as	consequências	de	uma	vida	agitada,	com	
alta	 concentração	 de	 indivíduos	 e	 que	 produz	menos	 consciência	 das	 diferenças.	 O	
raciocínio	 sociológico	 de	 Simmel	 atua	 em	 distinções	 importantes	 para	 compreender	
a	 dinâmica	 do	 fenômeno	 urbano,	 quando	 ele	 problematiza	 diferentes	 dicotomias	
(individuo/sociedade,	 cidade/campo,	 intelectual/sentimental,	 cultura	 subjetiva/cultura	
objetiva).	 Uma	 das	 principais	 contribuições	 está	 na	maneira	 de	 observar	 as	 emoções	
oriundas	do	urbano,	da	cidade,	da	intensa	relação	de	indivíduos	que	passam	a	naturalizar	
um	 ritmo	de	vida	 acelerado,	 um	código	 temporal	medido	 em	 relógios	para	marcar	 o	
tempo	 do	 trabalho,	 a	 experiência	 coletiva	 de	 deslocamento	 em	 transportes	 coletivos,	
quando	passa	a	ser	dominante	os	“egoísmos	econômicos”	e,	portanto,	a	presença	maiscomum	do	sentimento	de	indiferença.	
O	dinheiro,	também	um	objeto	de	sua	análise,	é	um	elemento	importante	para	
entender	a	vida	urbana,	isto	porque,	por	meio	desse	novo	sistema	econômico,	o	dinheiro	
valida	a	relação	de	 interdependência	que	se	constitui	essencial	no	mundo	da	metrópole	
urbana,	pois	o	indivíduo	que	agora	passa	fazer	parte	dessa	dinâmica	urbana	está	imerso	
em	um	tipo	de	economia	monetária	que	lhe	confere	um	conjunto	de	práticas	essenciais	
ao	seu	cotidiano:	“comparações,	cálculos,	determinações	em	numéricas	e	reduções	de	
valores	qualitativos	e	valores	quantitativos”	(SIMMEL,	2013,	p.	315).	O	dinheiro	será	um	
meio	de	acesso	à	bens,	mas	também	uma	forma	de	medir	valor	para	objetos,	pessoas	e	
relações,	além	de	abrir	um	campo	vasto	para	as	formas	de	consumo.	
A	cidade	produz	efeitos	na	vida	urbana,	na	sociabilidade	e	mesmo	na	psicologia	
humana.	A	“atitude	blasé”,	por	exemplo,	é	uma	consequência	da	vida	urbana	e	produto	
de	 um	 excesso	 de	 estímulos	 nervosos,	 “é	 o	 embotamento	 em	 relação	 a	 distinção	
das	 coisas”,	 aponta	Simmel	 (2013,	 p.	 317).	Assim,	 um	 indivíduo	que	 seria	visto	 como	
antissocial	pois	não	se	 relaciona	com	os	outros,	na	verdade	estabelece	uma	 relação	
de	 indiferença	com	a	multidão,	ele	caminha	no	meio	dela,	mas	não	 interage	com	ela.	O	
indivíduo	urbano	na	metrópole	faz	questão	do	anonimato,	é	indiferente,	não	manifesta	
suas	 reações.	Vejamos	um	exemplo	disso.	Um	dos	acontecimentos	mais	comuns	no	
cotidiano	de	uma	metrópole	urbana	é	estarmos	nos	deslocando	de	casa	para	o	trabalho	
ou	de	casa	para	a	escola	e	somos	surpreendidos	por	um	acidente	de	carro	no	meio	de	
nosso	percurso	habitual.	Um	indivíduo	de	“atitude	blasé”	não	vai	parar	ou	 interromper	seu	
percurso	para	observar,	pelo	contrário,	ele	verá	o	acidente,	mas	vai	seguir	adiante	sem	
estabelecer	uma	intencionalidade	sobre	aquele	evento.	
Em	 outras	 ocasiões,	 podemos	 ter	 como	 exemplo,	 aquele	 indivíduo	 que	
caminha	 livremente	 pela	 cidade	 para	 “flanar”,	 isto	 é,	 sem	 pretensão	 de	 estabelecer	
uma	intencionalidade	de	encontro	com	outros	indivíduos,	mas	apenas	estar	por	estar	
caminhando	pela	 rua.	Estas	seriam	análises	feitas	por	Simmel	 (2013)	sobre	o	urbano	
e	 como	 ele	 produz	 novos	 acontecimentos	 na	 vida	 social,	 o	 autor	 nos	 apresenta	 as	
experiências	e	percepções	da	singularidade	nesse	novo	 lugar.	O	 indivíduo	citadino	é	
então	apresentado	pelo	autor	como	aquele	que	cultiva	o	anonimato	e	o	 individualismo,	
às	vezes	são	considerados	como	“frios	e	sem	ânimo”	ou	como	indivíduos	que	nutrem	
10
uma	 “atitude	 de	 reserva”	 no	 meio	 social.	 Nas	 descrições	 do	 contexto	 de	 surgimento	
do	 fenômeno	 urbano,	 a	vida	 na	 cidade	 é	 definida	 por	 uma	 alta	 diferenciação	 social,	
e	 Simmel	 (2013)	 destaca	 um	 conjunto	 de	 práticas	 de	 sociabilidade,	 assim	 como	 de	
atitudes	psicológicas	(“leve	aversão”,	“repulsa	mútua”,	“indiferenças”	e	“aversões”)	que	serão	
próprias	desse	meio	urbano.	
Menos	interessado	em	emitir	um	juízo	de	valor	sobre	essas	mudanças,	Simmel	
(2013)	nos	estimula	a	pensar	os	efeitos	sociais	dessas	transformações	no	meio	urbano,	
considerando	 que	 a	 presença	 intensa	 de	 um	 quantitativo	 elevado	 de	 indivíduos	 no	
mesmo	espaço	gera	novas	 formas	de	 interação	que	 terão	 efeitos	 em	escala	 individual	 e	
coletiva.	Isto	deve	ser	mais	bem	compreendido	como	um	efeito	da	forma	de	relação	social	
experimentada	na	cidade	moderna.	Não	é	 ausência	do	 “social”	 ou	do	 “coletivo”,	mas	
uma	nova	morfologia	do	social e	de	uma	presença	“quantitativa”	do	coletivo.	Para	Simmel	
(2013),	um	dos	sentidos	adquiridos	pela	vida	na	metrópole	é	o	conjunto	de	transtornos	e	
adversidades	 para	 acomodar	 seus	 acontecimentos,	múltiplos,	 descontínuos,	 acelerados	
e	 inesperados,	 sempre	 orientando	 o	 indivíduo	 a	 ter	 a	 razão	 como	 precedência	 para	
organizar	sua	vida	na	metrópole.	
A	 seguir,	 conheceremos	detalhes	desses	processos	 a	 partir	 do	 estudo	de	 outras	
categorias	analíticas	importantes	para	o	campo	da	Antropologia	Urbana	na	forma	como	
se	desenvolveu	no	Brasil.	
3 AS CIDADES 
Caro	acadêmico,	a	reflexão	que	propomos	aqui	permitirá	a	você	o	entendimento	
da	 complexidade	 das	 mudanças	 da	 cidade	 moderna,	 principalmente	 nas	 grandes	
metrópoles,	 ao	 observarmos	 como	 esse	 evento	 influenciou	 decisivamente	 para	 a	
consolidação	de	pesquisas	 e	 escolas	 de	 investigação	dessa	 área	 de	 conhecimento.	A	
segunda	metade	do	século	XIX	marca	profundamente	o	 interesse	de	diversos	estudiosos	
pertencentes	a	áreas	diferentes	na	busca	pelo	entendimento	do	que	estava	acontecendo	
no	contexto	de	grande	efervescência	por	onde	surgiam	as	grandes	metrópoles	urbanas	
e	é	aqui	que	a	cidade	assume	relevante	 interesse,	tratada	enquanto	uma	categoria	de	
análise	científica	e	um	objeto	de	investigação	desse	fenômeno	urbano.	
Na antropologia, usamos o termo morfologia social para descrever 
de que maneira uma sociedade está estruturada. O estudo dessas 
estruturas permitiria ao antropólogo entender como funcionava 
e de que maneira estariam interligadas as diferentes partes que 
integram uma sociedade.
NOTA
11
Em	seu	famoso	ensaio	“A	cidade:	sugestões	para	a	investigação	do	comporta-
mento	humano	no	meio	urbano”,	publicado	originalmente	em	março	de	1916,	Robert	Ezra	
Park	definirá	cidade	como	um	“estado	de	espírito,	um	corpo	de	costumes	e	tradições	
e	dos	sentimentos	e	atitudes	organizados,	inerentes	a	esses	costumes	e	transmitidos	
por	essa	tradição”.	Em	outras	palavras	a	cidade	é	para	este	autor	um	laboratório	para	
entender	os	processos	sociais,	Park	(1979,	p.	26)	ainda	diz	“a	cidade	não	é	meramente	
um	mecanismo	físico	e	uma	construção	artificial.	Está	envolvida	nos	processos	vitais	das	
pessoas	que	a	compõem;	é	um	produto	da	natureza,	 e	particularmente	da	natureza	
humana”.	
Ao	mesmo	tempo	que	alguns	estudiosos	precipitam	uma	definição	de	cidade	
como	 uma	 unidade	 geográfica	 e	 ecológica	 de	 um	 tipo	 social	 produto	 da	 ação	 humana,	
ela	 também	 é	 percebida	 como	 o	 lugar	 das	 transações	 políticas	 e	 econômicas	 e	 de	
construção	dos	novos	modos	de	vida.	Desse	modo,	Park	insiste	em	nos	aproximar	de	
uma	definição	de	cidade	que	procura	considerar	nuances	presentes	nesse	meio	social.	Ele	
observa	as	mudanças	de	densidade	populacional,	assim	como	o	espalhamento	das	vias	
de	circulação	para	automóveis,	a	construção	das	rodovias,	a	expansão	das	profissões,	e	a	
intensidade	do	fluxo	urbano	que	caracterizam	o	perfil	das	cidades.	
A	 partir	 desse	 ponto	 de	 vista	 podemos	 perceber	 alguns	 fatores	 que	 são	
considerados	primários	na	abordagem	da	cidade,	aquilo	que	motivou	um	intenso	grupo	
de	pesquisadores	em	uma	investigação	científica	sobre	tais	transformações.	
Hoje	 podemos	 facilmente	 entender	 as	 rotinas	 de	 circulação,	 navegação	 e	
movimento	 do	 trânsito	 na	 cidade	 urbana,	 nas	 grandes	 metrópoles,	 porém	 naquele	
momento	 isso	 não	 era	 tão	 simples.	 Fatores	 como	 transporte	 e	 comunicação,	 por	
exemplo,	 eram	 importantes	dimensões	da	vida	social,	 pois	 interferiam	na	circulação,	
a	mobilidade	e	o	acesso	da	casa	ao	trabalho	na	vida	urbana,	à	época	serviços	como	
as	 linhas	de	bonde	eram	mais	popularizadas,	serviam	para	deslocar	os	trabalhadores	
em	 seus	 destinos	 e	 objetos	 como	 o	 telefone,	 os	 jornais	 impressos	 e	 a	 publicidade	
organizavam	a	comunicação	e	a	propagação	de	informações.	Tudo	isso	fazia	parte	de	
um	conjunto	muito	recente	de	objetos,	formas	de	viver	na	metrópole	ou	de	organizar	
o	tempo	que	não	faziam	parte	da	rotina	ou	dos	modos	de	viver	encontrados	na	vida	
rural.	Só	para	que	você,	acadêmico,	tenha	uma	ideia	mais	clara	do	que	significam	essas	
transformações,	tente	exercitar	o	pensamento	comparativo,	as	diferentes	maneiras	de	
se	comunicar	que	existiam	antes	e	que	temos	agora.	
Se	 antes	 da	 revolução	 industrial	 o	 uso	 de	 animais	 para	 transporte	 era	mais	
comum,	 com	 a	 chegada	 da	 indústria	 automobilística	 vamos	 aprimorando	 o	 uso	 de	
transportesintroduzindo	 o	 bonde,	 o	 ônibus,	 o	 carro	 particular,	 o	 carro	 de	 aluguel,	
o	táxi,	o	metrô,	o	trem,	dentre	outros.	Na	comunicação	ainda	é	mais	 interessante	se	
considerados	a	presença	dos	smartphones	que	tudo	podem	fazer	a	um	toque	das	mãos,	
mas	 antes	 a	 comunicação	 era	 por	 cartas,	 correspondências,	 anúncios	 públicos	 em	
jornais	impressos,	panfletos	ou	recados.	
12
A	 Revolução	 Industrial	 foi	 um	 acontecimento	 histórico	 que	 revolucionou	 as	
formas	de	viver	em	sociedade,	transformando	aspectos	físicos,	espaciais	e	coletivos	
como	também	aspectos	da	vida	mental,	da	subjetividade,	das	emoções	e	moralidades	
entre	 os	 indivíduos.	 De	 acordo	 com	o	 antropólogo	 brasileiro	Gilberto	Velho,	 no	Brasil,	 até	
mais	ou	menos	os	anos	1970	os	eixos	de	pesquisa	dominantes	na	antropologia	eram	a	
etnologia,	as	relações	interétnicas	e	os	estudos	camponeses	ou	estudos	tradicionais,	
todos	eles	estavam	dentro	dos	chamados	“estudos	de	comunidade”.	Conforme	veremos	
adiante	foi	mais	precisamente	neste	período	que	os	estudos	urbanos	ganharam	outro	
enfoque,	assim	a	cidade	passou	a	ser	um	objeto	de	 interesse	científico	e	um	campo	
fértil	de	estudos	para	antropólogos	brasileiros	 interessados	em	estudar	as	“redes”	e	os	
“sistemas	de	relações”	que	se	referem	às	interações	sociais	(VELHO,	2003,	p.	11-12).	
Diferente	das	etnografias	clássicas	entre	os	Trobriand	ou	os	Nuer,	na	antropologia	
urbana	a	descrição	das	práticas	culturais	se	torna	um	desafio	ao	antropólogo	porque	
nas	 cidades	 a	 cultura	 é	 organizada	 de	 formas	muito	 diferentes	 e	 concentram	 uma	
riqueza	 de	 conhecimento	 sobre	 pessoas,	 espaços	 e	modos	 de	 habitar	 centrais	 para	
o	 entendimento	 do	 meio	 urbano.	 Não	 por	 acaso	 Gilberto	 Velho	 (1987)	 escreve,	 em	
“Observando	o	familiar”,	a	respeito	da	dificuldade	em	estabelecer	métodos	e	técnicas	
de	pesquisa	que	captem	a	 riqueza	dessa	diversidade	pois	estamos	tão	 imersos	na	vida	
citadina,	 que	 é	muito	 provável	 que	 jamais	 pensemos	 sobre	 “o	 que	 sempre	vemos	 e	
encontramos	pode	ser	familiar,	mas	não	é	necessariamente	conhecido”.	
No	Brasil,	 após	 os	 anos	 1970	 a	 cidade	 passará	 a	 ser	 considerada	 um	objeto	
para	a	investigação	antropológica	que	se	orienta	pelo	estudo	das	relações	e	interações	
com	outros	atores	sociais.	De	acordo	com	o	antropólogo	brasileiro	Guilherme	Magnani	
embora	 a	 cidade	 fosse	 lugar	 de	 importantes	 etnografias	 antes	 desse	 período,	 seu	 foco	
estava	no	“estudo	de	culturas	indígenas	e	seus	contatos	com	a	civilização;	o	estudo	das	
culturas	caboclas;	e	o	estudo	da	aculturação	de	certos	grupos	étnicos	e	raciais,	como	
negros,	japoneses,	alemães	etc.”	(MAGNANI,	1996,	p.	8).	
As	cidades	se	tornariam	um	grande	desafio	científico,	pois	agora	tinha-se	um	
laboratório	 de	 estudos	 e	 problemáticas	 que	 poderiam	 ser	 investigadas	 a	 partir	 de	 uma	
perspectiva	antropológica.	Este	novo	espaço	social	trouxe	 junto	com	suas	modificações	
espaciais	as	mudanças	internas	na	vida	dos	próprios	indivíduos.	
É	 importante	 também	 termos	 clareza	 de	 que	 a	 cidade	 é	 uma	 categoria	
polissêmica,	 isto	 é,	 varia	 de	 um	 lugar	 para	 outro	 mesmo	 que	 possam	 ter	 aqueles	
elementos	comuns	a	cada	uma	delas,	sempre	encontraremos	singularidades	a	respeito	
de	cada	uma	delas.	
Nesse	sentido,	a	cidade	é	parte	de	uma	reflexão	antropológica	sobre	o	urbano	
e	 compreende	 um	 conjunto	 de	 informações	 de	 sequências	 da	vida	 urbana	 que	 são	
coletadas	pelo	 antropólogo	e	que	 representam	apenas	uma	 ínfima	parte	desse	 todo	
social	do	mundo	urbano.	Não	é	por	acaso	que	a	antropologia	urbana	brasileira	crescerá	
com	bastante	 fôlego	 em	pesquisas	 empíricas,	 pois	 há	 um	universo	 de	 conhecimento	
13
de	 narrativas,	 experiências,	 práticas,	 arranjos	 de	 organização	 social	 e	 de	 gestão	
administrativa	 que	 varia	 de	 uma	 cidade	 para	 outra.	 O	 conjunto	 dessas	 informações	
possibilita,	do	ponto	de	vista	antropológico,	um	conhecimento	vasto	e	diversificado	a	
respeito	dos	diferentes	modos	de	vida	no	meio	urbano.	Qual	seria,	então,	a	contribuição	
específica	da	antropologia	nesse	entendimento	da	cidade	e	o	meio	urbano?	Podemos	
definir	 dois	 critérios	 iniciais,	 a	 saber,	 o	 primeiro	 responde	 ao	 tipo	 de	 trabalho	 de	
investigação	científica	que	se	ocupa	das	relações	em	escala	microssociais.	
O	segundo,	está	mais	associado	ao	modo	de	fazer	pesquisa	etnográfica	em	que	
o	antropólogo	baseia	suas	atividades	de	pesquisa	em	uma	coleta	de	dados	de	primeira	
mão,	 isto	é,	 ele	está	em	campo	e	 faz	 suas	próprias	perguntas,	 observa	e	 interage	face	
a	face	com	a	população	e	o	 local	de	sua	observação.	Essa	prática	científica	oferece	
uma	percepção	mais	 apurada	 sobre	o	 contexto	pesquisado,	 pois	baseia-se	em	uma	
relação	direta	com	os	interlocutores	da	pesquisa.	Desse	modo,	a	cidade	aparece	como	
um	elemento	chave	para	a	compreensão	de	uma	realidade	cada	vez	mais	complexa	e	
heterogênea,	em	termos	de	indivíduos,	práticas	culturais	e	questões	sociais.	Conforme	já	
vimos	com	Simmel	(1979)	e	Wirth	(1979)	isso	pode	aparecer	na	descrição	de	aspectos	de	
personalidade	e	hábitos	culturais,	como	também	revela	nuances	da	vida	social.	
NOTA
Quando nos referimos ao termo microssocial, estamos falando dos 
processos por meio dos quais as pessoas constroem suas relações de 
interação, em perspectiva de escala, nos referimos às interações face 
a face entre pessoas de uma mesma família, grupo juvenil, vizinhança 
e assim por diante para estudar a integração do indivíduo e sociedade. 
São relações mais próximas, rotineiras, entre poucos parceiros. Para 
entender melhor, notem que usamos o termo macrossocial quando 
queremos designar outras relações, aquelas que dizem respeito ao 
Estado, sistema político ou modelo econômico, estas são relações 
estruturais, que estuda a estrutura da sociedade buscando entender 
o seu modo de funcionamento, quais os mecanismos e as partes que 
compõem uma sociedade e como se articulam.
A	 cidade	 não	 somente	 é,	 em	graus	 sempre	 crescentes,	 a	moradia	 e	
o	 local	de	trabalho	do	homem	moderno,	como	é	o	centro	 iniciador	
e	 controlador	 da	 vida	 econômica,	 política	 e	 cultural	 que	 atraiu	 as	
localidades	 mais	 remotas	 do	 mundo	 para	 dentro	 de	 sua	 órbita	 e	
interligou	as	diversas	áreas,	os	diversos	povos	e	as	diversas	atividades	
em	um	universo”	(WIRTH,	1979,	p.	91).
Para	 termos	 uma	 noção	 mais	 concreta	 dessas	 múltiplas	 percepções	 que	 a	
cidade	pode	revelar	da	vida	social,	consideremos	a	coexistência	de	práticas	individuais	
inseridas	 em	um	espaço	 social	 e	 culturalmente	diferente	daquele	 encontrado	na	vida	
rural.	Se,	por	um	lado,	aqueles	indivíduos	que	migram	da	zona	rural	para	o	meio	urbano	
14
veem	a	 cidade	 como	uma	 fonte	 de	 oportunidades,	 liberdade	 e	 futuro	 da	modernidade,	
noutros	termos,	“a	cidade	é	encarada	como	um	espaço	de	liberdade	e	possibilidades,	na	
medida	em	que	o	emprego	regular	é	visualizado	como	uma	segurança	e	independência,	
inexistentes	no	campo”	(OLIVEN,	2007,	p.	36).	
No	 Brasil,	 o	 fenômeno	 do	 êxodo	 rural	marcou	 significativamente	 o	 contexto	
e	a	organização	social	do	país,	traduzindo	um	longo	processo	entre	os	anos	de	1960	
e	 1980	em	que	 indivíduos	e	 famílias	 inteiras	 abandonaram	suas	 residências	fixas	na	
vida	 rural	com	destino	às	grandes	metrópoles	em	busca	de	melhores	oportunidades	
de	 sobreviver	 –	 principalmente	 aquelas	 populações	mais	 empobrecidas	 do	 interior	 do	
Brasil,	que	sofrendo	com	a	seca,	como	foi	o	caso	da	região	nordeste,	ou	com	a	escassez	
de	oportunidades,	como	é	o	caso	da	região	norte,	buscavam	nas	cidades	em	grande	
desenvolvimento	um	destino	para	modificar	sua	vida	e	de	sua	família.	Nesse	período,	em	
torno	de	27	milhões	de	brasileiros	saíram	da	zona	rural	para	a	zona	urbana.	
O	crescimento	da	indústria	e	das	próprias	cidades	eram	vistas	como	oportunidades	
de	trabalho	para	esses	trabalhadores	que	agora	estavam	despossuídos	de	oportunidades	
de	subsistência.	Sem	esquecermosque	também	nesse	período	o	 intenso	processo	de	
mecanização	das	atividades	produtivos	substituíram	a	mão	de	obra	humana	por	máquinas	
(ALVES;	SOUZA;	MARRA,	2011).	
Essas	 são	mudanças	 significativas	 da	 realidade	 brasileira	 e	 os	 antropólogos	 que	
antes	se	mostravam	preocupados	se	teriam	ou	não	o	que	pesquisar	após	os	 intensos	
processos	de	urbanização	da	vida	social,	passaram	a	perceber	que	agora	deveriam	lançar	
seu	 olhar	 sobre	 os	 acontecimentos	 do	 cotidiano	vivido	 nas	 grandes	 cidades,	 procurando	
entender	 como	 esses	 indivíduos	 que	 passam	 a	 habitar	 a	 cidade	 interpretam,	 agem,	
escolhem,	modificam	ou	guardam	traços	pessoais	de	sua	vida	rural	no	espaço	urbano.	
Nesse	sentido,	a	antropologia	urbana	dava	seus	primeiros	e	principais	passos	na	direção	de	
uma	renovação	da	própria	disciplina	que	agora	permitia	um	desafio	de	compreender	a	
realidade	urbana	assim	como	estavam	acostumados	a	fazer	em	relação	às	sociedades	
“simples”,	seu	clássico	objeto	de	estudo.	
Há	também	novidades	nesse	novo	fazer	antropológico	na	cidade,	em	que	pese	
o	ajuste	das	lentes	de	observação	e	pesquisa	sobre	os	acontecimentos	no	universo	de	
indivíduos	que	 compartilham	seu	 local	 de	vivência,	 fala	 o	mesmo	 idioma	e	 compartilha	
um	universo	de	práticas	culturais	comuns.	Assim,	os	antropólogos	urbanos	passaram	a	
aplicar	os	métodos	de	pesquisa	próprios	da	antropologia,	 a	etnografia	e	a	observação	
participante	(MALINOWSKI,	1978),	para	estudar	aspectos	da	vida	social	no	contexto	urbano.	
Assim,	 definiam	 duas	 importantes	 linhas	 de	 pesquisa:	 aquela	 que	 procurava	 colocar	
ênfase	nos	 indivíduos	e	suas	práticas	sociais	e	outra	que	dava	ênfase	nos	estudos	do	
território	onde	estavam	situados,	entendendo	a	cidade	e	o	urbano	como	aquele	espaço	
social	constitutivo	da	ação	desses	indivíduos.	
15
Caro	acadêmico,	você	já	pode	se	familiarizar	um	pouco	com	as	principais	re-
ferências	e	aspectos	das	mudanças	com	a	 introdução	da	vida	urbana,	olhamos	para	
os	fenômenos	sociais	mais	amplos	e	nos	aproximamos	de	um	conjunto	de	categorias	
conceituais	 importantes	para	entendermos	essas	mudanças	e	nos	aproximar	de	um	
exercício	reflexivo	em	que	de	forma	autônoma	você	possa	refletir	sobre	essas	transfor-
mações	usando	esse	mapa	conceitual.	Agora,	no	próximo,	vamos	fazer	um	mergulho	
nesse	sujeito	social,	aquele	indivíduo	que	chega	no	meio	urbano	e	como	ele	é	afetado	
por	esse	novo	lugar.
4 OS SUJEITOS 
Robert	Ezra	Park	 (1979,	p.	28),	proeminente	 representante	dos	estudos	urbanos	
desenvolvidos	 na	 renomada	 Escola	 de	 Chicago,	 afirmava	 em	 1916	 que	 “o	 homem	
civilizado	é	um	objeto	de	investigação	igualmente	interessante,	e	ao	mesmo	tempo	sua	
vida	é	mais	aberta	à	observação	e	ao	estudo”.	Nesse	sentido,	o	indivíduo	urbano	passou	
a	 ser	 visto	 como	 um	 sujeito	 dotado	 de	 diversidade	 cultural,	 e	 justamente	 por	 isso,	
renovava	o	interesse	e	a	atualidade	da	Antropologia	e	do	fazer	antropológico	que	em	
muito	poderia	contribuir	para	entender	os	problemas	urbanos	postos	com	a	chegada	
em	massa	de	indivíduos	às	grandes	cidades.	
Os	clássicos	estudos	de	Simmel	e	Wirth,	aqui	já	mencionados,	nutriam	pesquisas	
com	reflexões	a	respeito	desse	processo	de	individualização	nas	cidades,	considerando	a	
questão	do	individualismo	urbano	uma	importante	porta	de	entrada	para	compreender	o	
modo	de	vida	urbano.	
Se	tomarmos	o	exemplo	da	cidade	de	Chicago,	na	década	de	1930,	facilmente	
entenderemos	quais	as	motivações	de	estudos	nesse	segmento.	Ora,	nesse	período,	
Chicago	era	a	segunda	aglomeração	urbana	dos	Estados	Unidos	e	a	quinta	do	mundo	
com	uma	população	estimada	em	três	milhões	de	habitantes,	vindos	de	todas	as	partes	
do	 país	 e	 do	mundo.	 Problemas	 sociais	 como	 segregação,	 delinquência,	 criminalidade,	
desemprego,	formação	de	guetos,	logo	se	tornariam	temas	pungentes	de	investigação.	
O	que	caracteriza	o	fazer	etnográfico	no	contexto	da	cidade	é	o	duplo	movimento	
de	mergulhar	no	particular	para	depois	emergir	e	estabelecer	comparações	com	outras	
experiências	e	estilos	de	vida	–	semelhantes,	diferentes,	complementares,	conflitantes	–	
no	âmbito	das	instituições	urbanas,	marcadas	por	processos	que	transcendem	os	níveis	
local	e	nacional	(MAGNANI,	1996,	p.	3).	
	 Agora	falávamos	de	cidade	como	o	mundo	social	do	indivíduo	urbano,	
este	 não	 era	mais	 considerado	 um	mero	 estrangeiro	 individualista,	 e	 as	 etnografias	
passaram	 a	 mostrar	 a	 diversidade	 de	 sujeitos	 sociais	 que	 estavam	 reunidos	 em	
torno	 de	 uma	 mesma	 localidade.	 Os	 estudos	 antropológicos	 demonstrariam	 que	 a	
cidade	passaria	a	constituir	seu	próprio	modo	de	vida	urbano,	no	qual	há	uma	vasta	
heterogeneidade	de	sujeitos	como	o	migrante,	o	estrangeiro,	o	malandro,	o	criminoso,	
16
o	desviante,	o	 sofisticado,	o	burocrático,	 todos	tipos	sociais	de	um	 lugar	próprio	aos	
projetos	de	interação	do	mundo	urbano.	O	grau	de	sociabilidade	é	muito	variável	e	vai	
sendo	moldado	com	o	passar	do	tempo	e	o	habitar	das	cidades	urbanas,	se	no	início	do	
processo	de	 intensa	urbanização	os	 indivíduos	eram	percebidos	como	um	tanto	mais	
impessoais	em	relação	uns	aos	outros,	com	efeito,	o	passar	do	tempo	mostra	novas	
formas	de	estabelecer	sociabilidade	e	integração	afetiva	nesse	mundo	urbano.	
As	redes	de	parentesco	e	amizade	ganham	novos	contornos	sociais	disputando	
a	 intensa	 impessoalidade	 comum	 em	 lugares	 como	 aeroportos,	 estações	 de	 metrô	
ou	 rodovias,	 exemplos	 de	 uma	 intensa	 e	 concentrada	multidão.	 Nesse	momento	 já	
encontramos	espaços	de	convivência	para	a	sociabilidade	como	casas	de	show,	casa	
de	terreiro,	igrejas,	centros	comunitários,	clubes	de	lazer	que	se	organizam	e	ancoram	
as	 relações	 sociais	 de	 afinidade	 e	 pertencimento	 com	uma	 familiaridade	 já	 configurada	
do	espaço	urbano,	da	cidade	vivida.	Muitos	 jovens	passaram	a	compartilhar	espaços	
comuns	para	viverem	suas	práticas	de	lazer	e	afetividade.	
As	famílias	de	classe	média	acostumaram-se	com	a	 ida	frequente	aos	clubes	
de	lazer	particulares,	os	praticantes	de	religiões	de	matriz	africana	consolidavam	seus	
terreiros	e	casas	de	santo	como	espaços	de	sociabilidade	e	práticas	de	 rituais,	 jovens	de	
diferentes	sexualidade	passaram	a	frequentar	e	construir	espaços	para	práticas	de	uma	
sexualidade	livre	em	clubes	noturnos,	velhos	senhores	frequentemente	passaram	a	se	
encontrar	na	praça	do	bairro	para	jogar	dominó	e	cartas,	assim	como	foi	possível	notar	
a	formação	de	bairros	de	acordo	com	o	pertencimento	étnico,	a	exemplo	do	bairro	da	
Liberdade	em	São	Paulo.	
“A sociabilidade é a forma pela qual os indivíduos constituem uma unidade 
no intuito de satisfazer seus interesses, onde forma e conteúdo são na 
experiência concreta processos indissociáveis” (SIMMEL, 2006, p. 65).
NOTA
17
Que tal conhecer um pouco mais das questões de gênero, sexualidade e antropologia? 
Espia essa dica de Podcast: 
Gênero, Sexualidade, Antropologia, Quadrinhos | HQ Sem Roteiro Podcast: 
Monique Malcher estudou Jornalismo na Universidade da Amazônia 
(UNAMA) e se formou com um TCC sobre Superman. No entanto, muito 
do que ela lia nos quadrinhos de super-heróis não a tocavam em sua 
realidade, não por serem obas de ficção, mas por não dialogarem 
com quem ela era. Até que Fun Home, HQ da estadunidense Alison 
Bechdel, apareceu em suas mãos e sua vida mudou. Monique hoje faz 
mestrado em Antropologia pela Universidade Federal do Pará (UFPA) com 
um estudo sobre quadrinhos, gênero e sexualidade, focado principalmente 
nas graphic novels Fun Home e Azul é a Cor Mais Quente, da francesa Julie 
Maroh. No HQ Sem Roteiro Podcast de hoje, conversamos sobre etnografia, 
performance de gênero, heteronormatividade e muito mais. Taca o play!
Fonte: https://apple.co/3cLyc1D. Acesso em: 20 jul. 2022.
INTERESSANTE
O	que	se	percebe	com	a	 intensificação	da	urbanização	é	a	presença	de	novas	
estratégias	 de	 organização	 dos	 laços	 familiares	 e	 afetivos	 na	 cidade.	 Assim,	 surge	
também	 a	 necessidade	 dos	 citadinos	 de	 estabeleceruma	 relação	 com	 o	 espaço,	 a	
cidade,	o	urbano	e	suas	atividades	de	simbolização,	rituais	ou	festivas.	Para	os	sujeitos	
sociais	a	cidade	pode	ser	familiar,	mesmo	mantendo	uma	relação	descontinuada	entre	
o	conhecido	e	não	conhecido,	entre	o	familiar	e	o	distante.	Dessa	maneira,	a	tensão	
entre	 mundos	 que	 pareciam	 distantes	 e	 incompatíveis	 passará	 a	 determinar	 novas	
possibilidades	de	conexão,	relações	e	pertencimentos	que	determinam	à	nossa	maneira	
de	estar	na	cidade.	
Identidade	e	alteridade	passam	a	fazer	parte	de	um	binômio	característico	da	
antropologia	urbana,	onde	se	percebe	por	quais	condições	e	possibilidades	é	possível	
vivenciar	 a	 vida	 citadina	 com	 proximidade	 e	 criação	 de	 vínculos.	 A	 construção	 da	
identidade	e	a	criação	de	espaços	e	guetos	que	definem	um	grupo	social	também	é	
uma	forma	de	dar	sentido	e	apropriação	ao	espaço	da	cidade	onde	esses	sujeitos	vivem.	
As	 chamadas	 culturas	 urbanas	 revelam	 na	 verdade	 um	 conjunto	 robusto	 de	 diferenças	
entre	grupos	sociais	que	fazem	parte	desse	meio	urbano.	Eles	podem	aparecer	como	
estratégias	 de	 inclusão	 e	 participação	 ou	 como	 agrupamentos	 que	 se	 conectam	 e	
praticam	exclusão	por	meio	de	“bloqueios	culturais”.	Nesse	sentido,	cultura	seria	definida	
como	 todo	 o	modo	 de	 vida,	 seus	 hábitos,	 suas	 instituições,	 seus	 idiomas	 e	 formas	 de	
linguagem,	bem	como	uso	de	símbolos	e	códigos	escritos	e	morais.	Na	antropologia	
urbana,	a	partir	da	observação	dessas	mudanças	e	formação	das	metrópoles	urbanas,	era	
possível	descrever	e	conhecer	uma	riqueza	de	práticas,	grupos	e	comunidades	culturais	
ali	presentes.	
18
A	essa	altura	cabe	considerar	que	aspectos	foram	sendo	transformados	entre	
o	 contexto	 de	 surgimento	 das	 cidades	 industriais	 e	 as	 cidades	 urbanas	 da	maneira	
como	habitamos	hoje	em	dia.	No	 início,	as	pesquisas	colocavam	uma	ênfase	a	 respeito	
da	questão	macrossociológica	procurando	entender	 as	 instituições,	 a	 estrutura	 e	 os	
componentes	que	fazer	o	urbano	e	a	cidade,	deixando	de	lado	o	interesse	pelos	sujeitos	
em	sua	dimensão	microssociológica.	
A	maioria	das	descrições	davam	ênfase	ao	caráter	estrutural	que	modificava	
e	 introduzia	outros	modos	de	vida	no	mundo	urbano,	mas	a	antropologia	urbana	no	
Brasil	passou	a	dar	visibilidade	a	um	conjunto	de	vozes	de	moradores	da	cidade	que	são	
diferentes.	Assim,	o	enfoque	será	para	uma	análise	em	microescala	da	questão	urbana.	
Essa	 mudança	 de	 perspectiva	 fará	 com	 que	 a	 antropologia	 urbana	 revise	
questões	 epistemológicas	 a	 partir	 da	 diferença	 entre	 uma	 antropologia da cidade,	
aquela	 que	 se	 afina	 com	 à	 sociologia	 urbana	 e	 que	 pensa	 a	 cidade	 a	 partir	 de	 sua	
totalidade,	 e	 a	 antropologia na cidade	 que	 tentará	 mostrar	 as	 dinâmicas	 da	 vida	
urbana	e	seu	cotidiano	a	partir	das	relações	ali	contidas,	olhando	para	os	atores	sociais	
mais	do	que	para	a	estrutura	da	cidade.	
É	assim	que	há	uma	mudança	de	escalas	e	uma	consolidação	de	uma	agenda	de	
pesquisas	em	antropologia	urbana	no	Brasil	que	dará	revelo	às	múltiplas	manifestações	
culturais,	 a	 diversidades	de	grupos	e	 comunidades	 sociais	 no	meio	urbano,	 práticas	de	
resistências	e	aos	conflitos	urbanos.	
19
Neste tópico, você aprendeu:
•	 O	contexto	de	surgimento	dos	estudos	urbanos	com	o	advento	da	Revolução	Industrial	e	
do	Sistema	Capitalista	foi	modificando	o	campo	de	estudos	da	antropologia	clássica	
para	as	novas	formas	de	vida	no	meio	urbano.	
•	 Os	 principais	 conceitos	 da	 antropologia	 como	 sociedades	 simples	 e	 complexas,	
etnocentrismo,	 relativismo	 cultural,	 alteridade,	 assim	 como	 a	 importância	 do	método	
etnográfico	e	o	uso	da	etnografia	a	partir	das	contribuições	de	Bronislaw	Malinowski	e	a	
técnica	da	observação	participante.	
•	 A	definição	de	categorias	centrais	do	campo	da	antropologia	urbana	como	cidade	
e	urbano.	Além	disso,	 estudamos	as	mudanças	ocorridas	na	 formação	das	cidades	
e	do	modo	de	vida	urbano	interferindo	sobre	estratégias	de	organização	dos	laços	
familiares	e	afetivos	na	cidade	e,	como	apontado	por	George	Simmel,	os	impactos	da	
metrópole	sobre	a	vida	mental.	
•	 Algumas	das	principais	 influências	teóricas	do	campo	de	formação	da	Antropologia	
Urbana	americana	como	Robert	E.	Park	e	Louis	Wirth,	assim	como	as	contribuições	de	
George	Simmel	e	no	Brasil	a	importância	dos	estudos	de	Gilberto	Velho	e	Guilherme	
Magnani.	
•	 As	contribuições	da	Escola	de	Chicago	e	da	Escola	de	Manchester	na	construção	e	
consolidação	de	pesquisa	sobre	o	fenômeno	urbano	no	Brasil.	Estudamos	também	
a	 importância	 dos	 estudos	 de	 interacionismo	 simbólico,	 pragmatismo	 e	 as	 análises	
situacionais	e	de	redes	sociais,	respectivamente.
RESUMO DO TÓPICO 1
20
1	 Com	base	em	nossos	estudos,	há	uma	contribuição	específica	da	antropologia	para	o	
entendimento	da	cidade	e	o	meio	urbano.	Sobre	ela,	assinale	a	alternativa	CORRETA:
a)	 (			)	 A	antropologia	observa	e	interage	face	a	face	com	a	população	e	o	local	de	sua	
observação.	 Essa	 prática	 científica	 oferece	 uma	 percepção	 mais	 apurada	 do	
contexto	pesquisado,	pois	se	baseia	em	uma	relação	direta	com	os	interlocutores	
da	pesquisa.
b)	 (			)	 A	 antropologia	 propõe	 uma	 investigação	 etnográfica	 baseada	 em	 análise	 de	
dados	quantitativos.
c)	 (			)	 A	 antropologia	 inaugura	 o	método	 de	 pesquisa	 chamado	 grupo	 focal	 e	 suas	
primeiras	pesquisas	foram	realizadas	com	sociedades	primitivas.
d)	 (			)	 A	antropologia	trabalha	com	pesquisa	operacional,	conta	com	o	apoio	e	a	decisão	
de	um	único	entrevistado	para	definir	seu	campo	de	pesquisa.
2	 Em	 1903,	 o	 sociólogo	 alemão	 George	 Simmel	 publicou	 um	 interessante	 ensaio	
intitulado	“A	metrópole	e	a	vida	mental”,	e	trouxe	para	o	debate	científico	no	campo	das	
ciências	sociais	as	preocupações	em	torno	das	mudanças	do	modo	de	vida	entre	
mundos	rural	e	urbano.	Com	base	nas	definições	dos	enfoques	dessa	abordagem	de	
Simmel,	analise	as	sentenças	a	seguir:
I-	 Uma	das	principais	contribuições	está	na	maneira	de	observar	as	emoções	oriundas	da	
cidade	urbana	definida	pela	 intensa	 relação	de	 indivíduos	que	passam	a	naturalizar	
um	ritmo	de	vida	acelerado,	adotam	um	código	temporal	medido	em	relógios	para	
marcar	 o	 tempo	 do	 trabalho	 e	 afrouxa	 as	 relações	 sociais	 de	 amizade,	 família	 e	
vizinhança.	
II-	 A	 vida	 citadina	 é	 uma	 grande	 possibilidade	 de	 estreitamento	 dos	 laços	 sociais,	
segundo	 Simmel,	 os	 indivíduos	 tendem	 a	 exercer	 mais	 livremente	 os	 afetos	 e	
passam	a	maior	parte	de	seu	tempo	flanando	em	parques	e	caminhadas	para	estar	
por	estar	com	quem	pessoas	que	querem	se	relacionar.	
III-	 A	experiência	coletiva	de	deslocamento	e	o	inchaço	das	cidades	modernas,	favorecem	
o	excesso	de	individualismo	e	isso	passa	a	ser	dominante	na	formação	psíquica	e	
social	do	indivíduo,	quando	os	“egoísmos	econômicos”	emergem	e	o	sentimento	de	
indiferença	se	manifesta	em	atitude	blasé.
Assinale	a	alternativa	CORRETA:
a)	 (			)	 As	sentenças	I	e	II	estão	corretas.
b)	 (			)	 Somente	a	sentença	II	está	correta.
c)	 (			)	 As	sentenças	I	e	III	estão	corretas.
d)	 (			)	 Somente	a	sentença	III	está	correta.
AUTOATIVIDADE
21
3	 “O	 urbanismo	 como	modo	 de	 vida”	 do	 sociólogo	 estadunidense	 Louis	Wirth	 (1979)	 é	
considerado	 um	 importante	 estudo	 para	 a	 abordagem	 do	 urbano	 na	 antropologia	
brasileira.	 O	 autor	 é	 considerado	 um	 dos	mais	 notáveis	 estudiosos	 do	 fenômeno	
urbano	nos	 Estados	Unidos	 e	 foi	muito	 influenciado	 pela	 sociologia	 de	Simmel.	A	
partir	das	contribuições	de	Wirth,	classifique	V	para	as	sentenças	verdadeiras	e	F	para	as	
falsas:
Fonte: WIRTH. L. O urbanismo como modo de vida. In: VELHO, O. (org.). O fenômeno urbano. Rio de Janeiro, 
Zahar Editores, 1979. p. 89-112.
(			)	A	entidade	tem	como	objetivo	a	inserção	da	Engenharia	de	Produção	na	comunidade	
científica	e	produtiva	no	sentido	de	promover	o	desenvolvimento	social. 
(			)	A	ABEPRO	Jovem	é	responsável	pela	congregação	detodos	os	profissionais	inativos	
de	Engenharia	de	Produção	e	busca	articular	com	empresas	e	instituições	de	ensino.
(			)	A	ABEPRO	tem	como	missão	assegurar	à	sociedade	a	busca	permanente	de	uma	
prática	correta	e	responsável	dos	profissionais	de	Engenharia	de	Produção.
Assinale	a	alternativa	que	apresenta	a	sequência	CORRETA:
a)	 (			)	 V	–	F	–	F.
b)	 (			)	 V	–	F	–	V.
c)	 (			)	 F	–	V	–	F.
d)	 (			)	 F	–	F	–	V.
4	 A	antropologia	é	uma	ciência	social	que	pode	ser	definida	pelo	estudo	da	diversidade	das	
formas	de	vida.	Uma	das	grandes	áreas	de	concentração	é	a	Antropologia	Urbana	
que	surge	de	um	contexto	social	de	extrema	mudança.	A	partir	disso,	disserte	sobre	o	
fenômeno	que	deu	origem	ao	subcampo	da	antropologia	urbana.
5	 Existem	muitas	 estratégias	 de	 pesquisa	 possíveis	 de	 serem	adotadas	nas	 atividades	
de	 investigação	científica	da	 antropologia.	A	 etnografia	é	uma	delas.	Nesta	proposta,	
Bronislaw	Malinowski	é	considerado	um	dos	principais	autores	da	antropologia	e	é	
também	lembrado	pelo	seu	método	de	pesquisa.	Neste	contexto,	disserte	sobre	os	
princípios	que	fundamentam	as	 relações	de	pesquisa	em	antropologia,	citando	os	
principais	conceitos	antropológicos.
22
23
ENTRE ESCALAS E ESCOLAS DE 
ETNOGRAFIA URBANA
UNIDADE 1 TÓPICO 2 —
1 INTRODUÇÃO 
O	termo	“antropologia	urbana”	designa	uma	subárea	da	antropologia	que,	no	
Brasil,	tem	seus	primeiros	estudos	na	década	de	1940	com	os	chamados	“estudos	de	
comunidade”.	Tais	 estudos	 foram	 fortemente	 influenciados	 pela	 tradição	 de	 estudos	 da	
renomada	 “Escola	de	Chicago”,	 nos	Estados	Unidos,	 cuja	principal	 característica	era	o	
interesse	por	uma	investigação	antropológica	sobre	as	cidades	e	as	mudanças	a	partir	
da	 urbanização.	 Naquele	 contexto	 fatores	 relacionados	 às	 transformações	 sociais,	
econômicas	e	culturais	que	marcaram	o	final	da	Segunda	Guerra	Mundial,	sobretudo,	
após	 os	 anos	 1960,	 contribuíram	 para	 um	 inovador	 ponto	 de	 reflexão	 acerca	 das	
condições	de	vida	no	contexto	da	modernidade.	
Conforme	 vimos	 até	 aqui	 a	 ideia	 de	 uma	 antropologia	 urbana	 veio	 de	 uma	
preocupação	 com	 aspectos	 do	 dia	 a	 dia	 nas	 cidades	 industriais,	 principalmente	
relacionadas	com	fenômeno	urbano	em	amplo	desenvolvimento	que	acompanha	eventos	
históricos	 importantes	 como	 o	 enorme	 contingente	 populacional	 e	 a	 intensa	 migração	
de	europeus	na	passagem	do	século	XIX	para	o	século	XX.	A	partir	desse	crescimento	
uma	série	de	conflitos	e	mudanças	ocorrem	na	cidade	e	tais	manifestações	passam	a	ser	
chamadas	 de	 “patologia	 social”,	 exemplo	 delas	 são	 a	 delinquência,	 os	 conflitos	 entre	
grupos	 étnicos,	 assim	 como	 problemas	 de	 planejamento	 urbano	 como	 a	 circulação,	
mobilidade	 e	 as	 precárias	 habitações	 (VELHO,	 1979,	 p.	 7-8).	 Daí	 o	 renovado	 interesse	
por	pesquisas	empíricas	que	pudessem	nutrir	informações	e	diagnósticos	acerca	do	que	se	
consolidou	como	“fenômeno	urbano”.	
Nesse	contexto,	a	diversidade	cultural,	 formas	de	vida,	 religiões,	consumo,	arte,	
migração,	festas,	assim	como	a	“favela”	passam	a	ser	objetos	de	interesse	pelos	quais	
a	antropologia	pode	se	realizar.	Nota-se,	é	claro,	que	tais	mudanças	acompanham	uma	
influência	 por	 parte	 do	desenvolvimento	da	Antropologia	Urbana	que	 se	 faz	 a	 partir	 da	
Escola	de	Chicago	nos	Estados	Unidos	e	da	Escola	de	Manchester	na	 Inglaterra,	ambas	
foram	recepcionadas	no	Brasil	por	duas	 importantes	correntes	teóricas	capitaneadas	
pelos	antropólogos	Gilberto	Velho	(1987;	2003)	e	Guilherme	Magnani	(1996;	2003).	É	sobre	
essas	escolas	e	as	suas	contribuições	para	antropologia	urbana	brasileira	que	falaremos	
nos	próximos	subtópicos.	
24
Que tal conhecer um pouco mais dois importantes antropólogos 
brasileiros no campo da antropologia urbana? Olha, acadêmico, 
aqui você encontra uma entrevista com o antropólogo Gilberto 
Velho realizada em 13 de agosto de 2009 para o projeto Memória 
das ciências sociais no Brasil. Confira o seguinte endereço: https://
bit.ly/3otqICO.
E não para por aí! Acadêmico, conheça um pouco mais do perfil e 
da formação do antropólogo Guilherme Magnani nessa entrevista 
concedida em 9 de outubro de 2017, ao projeto Memória das 
Ciências Sociais no Brasil. Acesse: https://bit.ly/3cJdMpR.
DICA
2 ESCOLA DE CHICAGO 
A	 tradicional	 Escola	 de	 Chicago	 dominou	 os	 estudos	 de	 sociologia	 urbana	 logo	
das	primeiras	décadas	do	século	XX,	mais	precisamente	nos	anos	de	1920.	Surgiu	a	partir	
da	 iniciativa	 de	 um	 conjunto	 de	 professores	 e	 pesquisadores	 que	 estavam	 sediados	 na	
Universidade	de	Chicago,	onde	surgiu	também	o	primeiro	Departamento	de	Sociologia	
estabelecido,	 assim	 como	 o	 primeiro	 jornal	 sociológico,	 o	American	 Journal	 of	 Sociology,	
que	passou	a	ser	publicado	a	partir	de	 1895.	A	grande	doação	do	empresário	norte-
americano	John	Rockerfeller,	investidor	da	indústria	do	petróleo,	impulsionou	o	projeto	de	
formação	e	consolidação	de	um	proeminente	conjunto	de	pesquisadores	 reunidos	em	
torno	das	pesquisas	sobre	Chicago.
Figura 2 – Escola de Chicago
Fonte: https://bit.ly/3zaPBbu. Acesso em: 20 jul. 2022.
25
A	fundação	dessa	escola	está	 intimamente	 ligada	ao	processo	de	desenvol-
vimento	das	grandes	metrópoles	relacionadas	com	o	desenvolvimento	 industrial.	Até	
1830,	Chicago	tinha	cerca	de	350	habitantes	reunidos	em	torno	de	uma	pequena	comu-
nidade,	meio	século	depois	a	cidade	de	Chicago	expandiu-se	muito	rapidamente	che-
gando	a	ter	três	milhões	de	habitantes	–	e,	como	consequência	desse	intenso	processo	
de	urbanização	e	modernização,	vieram	também	problemas	sociais	como	o	aumento	da	
pobreza	e	do	desemprego,	bem	como	acentuada	criminalidade	e	delinquência	 juvenil,	
presença	de	imigração,	formação	de	guetos	sociais,	verticalização	e	gentrificação	urba-
nas,	segregação	e	violências	urbanas.	Todos	esses	problemas	foram	considerados	pelos	
estudiosos	da	Escola	de	Chicago	“patologias	sociais”	e	se	tornariam	objeto	de	interesse	
e	investigação	por	parte	de	seus	pesquisadores.	
Importantes	autores	que	estiverem	 reunidos	em	torno	da	Escola	de	Chicago	
construíram	 um	 programa	 e	 agenda	 de	 estudos	 do	 fenômeno	 urbano.	 A	 primeira	
geração	de	sociólogos	que	integravam	a	Escola	de	Chicago	era	formada	pelo	próprio	
Robert	Ezra	Park	(1864-1944),	além	de	nomes	como	Ernest	Watson	Burgess	(1886-1966),	
Roderick	McKenzie	 (1885-1940)	e	William	Thomas	 (1863-1947)	 e,	 posteriormente,	 Louis	
Wirth	 (1897-1952).	 Muitos	 conceitos,	 teorias,	 estudos	 e	métodos	 de	 pesquisa	 utilizados	
para	compreender	e	explicar	as	transformações	do	urbano	hoje	são	influenciados	pela	
produção	dessa	escola.	
William	Isaac	Thomas	(1863-1947)	realizou	um	trabalho	investigação	qualitativa	
que	privilegiava	“a	visão	dos	participantes	na	definição	das	situações	sociais”	a	partir	dos	
“polacos”,	em	1908	realizou	sua	pesquisa	sobre	migrantes	da	Europa	Oriental	nos	Estados	
Unidos.	Thomas	destacou-se	por	introduzir	uma	pesquisa	baseada	no	uso	de	documentos	
pessoais	como	diários,	cartas,	autobiografias,	dossiês	psiquiátricos,	bem	como	aqueles	
produzidos	por	outros	profissionais	como	assistentes	sociais	e	cientistas	sociais.	Um	dos	
seus	principais	conceitos	foi	elaborado	junto	com	Florian	Znaniecki	entre	1918	e	1920,	
quando	 afirmaram	 a	 partir	 de	 sua	 investigação	 que	 os	 processos	 de	 formação	 do	
pensamento	dos	indivíduos	são	determinados	pela	interação	entre	o	seu	comportamento	e	
a	sua	situação	social.	A	“desorganização	social”	sugeria,	assim,	que	a	vizinhança,	isto	é,	
as	relações	ali	contidas,	poderiam	atuar	na	probabilidade	de	um	indivíduo	cometer	um	crime.	
Robert	Ezra	Park	(1864-1944),	entrou	para	Escola	de	Chicago	em	1911,	trazendo	
sua	experiência	como	 jornalista	de	 investigação	e	a	 forte	 influência	das	publicações	
do	 sociólogo	 alemão	 Georg	 Simmel,	 formulou	 um	 programa	 de	 investigações	 que	
combinava	uma	análise	dos	grupos	de	minorias	sociais	e	a	sua	relação	com	o	fenômeno	
urbano.	 Sua	 principal	 característica	 era	 arealização	 de	 estudos	 por	meio	 de	 pesquisas	
qualitativas	combinando	ainda	conceitos	ecológicos	para	o	estudo	das	cidades	e	do	
urbano,	assim	a	sociedade	era	entendida	como	um	organismo	social.	
26
Para	Park	(1979),	a	cidade	era	um	grande	laboratório	social	a	ser	estudado,	a	partir	
dele	poderíamos	conhecer	o	homem	urbano	e	o	seu	“habitat	natural”.	O	estudo	qualitativo	
da	cidade	captaria	assim	as	relações	sociais	entre	os	cidadãos	ali	reunidos	bem	como	o	meio	
social	onde	vivem	e	sua	constante	transformação.	Foi	um	dos	primeiros	a	formar	seus	
alunos	 para	 aplicação	 de	 pesquisas	 com	métodos	 empregados	 pela	 antropologia,	 pois	
em	seu	entendimento	esse	método	possibilitava	a	investigação	dos	costumes,	crenças,	
valores,	práticas	sociais	e	culturais	da	vida	social	no	meio	urbano.	
Ernest	Watson	Burgess	(1886-1966)	foi	um	dos	pesquisadores	recrutados	por	
Park	 para	 a	 formação	 de	 uma	 equipe	 de	 pesquisadores	 empíricos	 em	Chicago.	 Juntos	
publicaram	o	 importante	 livro	 Introdução à Ciência da Sociologia,	em	1921,	abordando	
temas	 como	 natureza	 humana,	 história	 da	 sociologia,	 interação	 social,	 conflitos,	
assimilação,	dentre	outros.	Sua	contribuição	vai	ser	decisiva	para	contestar	o	argumento	
eugênico	que	definia	os	problemas	sociais	da	vida	urbana	como	traços	de	uma	herança	
genética.	Assim,	Burgess	vai	afirmar	que	é	a	“desorganização	social”	que	vai	produzir	
patologias	sociais	como	causas	de	doenças,	crimes	e	mazelas	sociais	do	meio	urbano.	
Sua	pesquisa	sobre	criminalidade	criou	uma	forma	de	medição	de	sucesso	e	fracasso	
com	 base	 na	 observação	 das	 práticas	 sociais	 de	 presidiários	 em	 liberdade	 condicional.	
Desse	modo,	Burgess	vai	demonstrar	que	um	presidiário	em	liberdade	provisória	sem	
habilidades	 profissionais	 teria	 uma	menor	 pontuação	 para	 contribuir	 com	o	 sucesso	 de	
ressocialização,	diferente	de	um	indivíduo	dotado	de	habilidades,	estudo	e	condições	
de	vida	que	o	afastem	da	possibilidade	de	reincidir	na	criminalidade.	
Roderick	 McKenzie	 (1885-1940),	 Park	 e	 Burgess	 elaboraram	 o	 conceito	 de	
ecologia	humana	formulado	a	partir	do	estudo	do	comportamento	humano	e	a	posição	
dos	indivíduos	no	meio	urbano.	Assim,	nessa	abordagem	o	habitat	do	homem	urbano,	
considerando	tanto	o	espaço	físico	onde	ele	mora	quanto	as	relações	que	ele	constrói	e	
mantém,	é	um	dos	elementos	que	que	determinará	ou	influenciar	o	seu	modo	de	viver	
e	o	seu	estilo	de	vida.	Tal	perspectiva	foi	muito	utilizada	para	estudos	da	criminalidade	
e	 bairros	 considerados	 “perigosos”,	 apontando	 para	 o	 entendimento	 de	 que	 os	
comportamentos	 considerados	 desviantes	 são	 produtos	 do	meio	 social	 no	 qual	 um	
indivíduo	ou	grupo	social	está	inserido.	
Considerado	um	dos	mais	destacados	sociólogos	da	Escola	de	Chicago,	Louis	
Wirth	(1897-1952)	procurou	desenvolver	uma	teoria	sobre	o	urbanismo	como	modo	de	
vida,	 entendendo	 que	 o	 urbano	 era	 uma	 forma	 ecológica	 particular	 que	 deveria	 ser	
estudada	 não	 só	 em	 sua	 dimensão	 econômica	 e	 geográfica,	mas	 fundamentalmente	
como	um	espaço	social	por	onde	irradiam	ideias	e	práticas	sociais.	
A	 cidade	 era	 pensada	 como	 um	 espaço	 por	 onde	 se	 exerce	 influência	 nos	
indivíduos	que	nela	habitam,	isto	porque	ela	agrega	diferentes	elementos	da	vida	social	
do	sujeito	moderno	como	a	moradia,	o	local	de	trabalho,	a	vida	econômica,	a	vida	política	
e	cultural	agregando	 inclusive	 indivíduos	em	sua	diversidade	de	atividades,	mas	também	
de	acordo	com	o	seu	pertencimento	de	gênero,	sexualidade,	raça	e	etnia.	Para	Wirth,	
quanto	maior	a	cidade	maior	será	a	 “diferenciação	social”	expressa	no	afrouxamento	
27
dos	 vínculos	 sociais,	 em	 uma	maior	 competitividade	 social,	 acentuado	 controle	 dos	
indivíduos	 e	 mais	 propensões	 às	 distorções	 da	 personalidade	 (anonimato,	 hiper	
individualismo,	 superficialidade,	 baixa	 afetividade,	menor	 participação	 social,	 ruptura	 de	
laços	comunitários).	
	 A	 relação	 de	 proximidade	 entre	 pesquisadores	 do	 campo	 da	 sociologia	 e	 da	
antropologia	se	faz	por	diferentes	razões,	uma	delas	está	associada	ao	grande	trabalho	
de	campo	e	estudos	empíricos	que	os	“etnógrafos	de	Chicago”,	como	também	ficaram	
conhecidos	 durante	 muito	 tempo,	 desenvolveram	 a	 partir	 desta	 consolidada	 escola	
de	 estudos.	 Sua	 tradição	 é	 fortemente	 influenciada	 pelo	 pragmatismo,	 articulando	 a	
observação	direta	da	realidade	à	análise	dos	processos	sociais	urbanos.	Tais	circunstâncias	
permitiram	aos	sociólogos	de	Chicago	inovar	em	teorias,	formulação	de	conceitos	além	de	
desenvolver	e	renovar	métodos	e	metodologias	de	análise	a	partir	do	urbano.	
 
O	 principal	 tema	 produzido	 em	Chicago	 era	 a	 questão	 urbana,	 assim	 como	 o	
surgimento	das	cidades,	as	mudanças	das	paisagens	das	cidades	e	as	transformações	
do	modo	de	vida	no	mundo	urbano.	Essa	escola	estava	comprometida	com	o	trabalho	
empírico,	a	pesquisa	de	campo	e	a	coleta	de	dados	em	primeira	mão.	Cientes	do	impacto	
das	transformações	pelas	quais	vivenciavam	no	cotidiano	da	própria	cidade	que	habitavam,	
esses	pesquisadores	investiram	em	um	projeto	de	pesquisa	empírica	que	deslocava	os	pés	
para	fora	dos	gabinetes	de	pesquisa	para	que	seus	pesquisadores	fossem	eles	próprios	
em	busca	das	singularidades,	mudanças	e	problemas	sociais	que	o	fenômeno	urbano	
evidenciava.	Nesse	 sentido,	 era	 considerável	 a	 experimentação	 realizada	 em	termos	de	
métodos	de	pesquisa	quando	serviram-se	fartamente	da	observação	participante	e	do	
método	de	estudo	de	caso	para	cobrir	um	grupo	heterogêneo	de	pesquisas	em	torno	da	
cidade	de	Chicago.	Era	aqui	que	sociólogos	e	antropólogos	se	encontravam	influenciados	
mutuamente.
Entretanto,	 é	 importante	 destacar	 que	 a	 Escola	 de	 Chicago	 foi	 pioneira	 na	
experimentação	e	combinação	de	métodos,	se	por	um	lado	não	tinha	pudor	em	aplicar	
métodos	da	antropologia	para	pensar	o	urbano,	por	outro	não	deixou	de	surpreender	
ao	 empreender	 as	 pesquisas	 estatísticas	 combinadas	 com	 pesquisas	 sociais	 baseadas	
em	estudo	de	comunidade,	quando	passou	a	 realizar	mapeamentos	quantitativos	de	
bairros	em	desenvolvimento,	grupos	sociais	de	imigrantes	e	registros	de	atividades	até	
então	consideradas	desviantes	naquele	contexto.	Assim	como	podemos	hoje	 identificar	
uma	 forte	 tradição	 de	 estudos	 etnográficos	 em	 Chicago,	 podemos	 reconhecer	 seu	
pioneirismo	no	trabalho	de	combinação	entre	pesquisas	quantitativas	e	qualitativas.	
Outro	importante	autor,	Everett	C.	Hughes,	destaca-se	como	um	dos	principais	
membros	 da	 Escola	 de	 Chicago	 e	 pioneiro	 nos	 estudos	 de	 ocupações	 e	 profissões	
na	década	de	 1940.	Hughes	escreveu	 inúmeros	artigos,	hoje	considerados	clássicos,	
investigando	as	consequências	subjetivas	do	trabalho	para	o	 indivíduo	e	demonstrando	
as	estratégias	utilizadas	para	buscar	status,	prestígio	e	ganhos	nos	locais	de	trabalho	
(HUGHES,	1958).	Hughes	foi	um	dos	primeiros	a	tratar	a	“carreira”	como	uma	categoria	
conceitual,	 informado	pela	perspectiva	 interacionista.	No	Brasil,	Gilberto	Velho	será	um	
dos	antropólogos	influenciados	pelo	trabalho	de	Hughes.
28
Figura 3 – Gilberto Velho
Fonte: https://bit.ly/3cGc9ZY. Acesso em: 20 jul. 2022.
Para	 Hughes	 (1937,	 p.	 404),	 a	 carreira	 deveria	 ser	 compreendida	 como	 uma	
“sequência	de	papéis,	 status	e	 cargos	 realizados	pelo	 indivíduo”.	Tal	 concepção	 incorpora	
duas	perspectivas	de	análise	de	uma	sociologia	das	profissões:	objetiva	e	subjetiva.	A	
primeira	é	aquela	que	corresponde	ao	estudo	do	status	e	dos	cargos	já	estabelecidos	
em	uma	determinada	sociedade	e	a	outra	coloca	em	evidenciar	a	própria	percepção	
dos	 indivíduos	sobre	a	sua	própria	vida,	 isto	é,	 “uma	perspectiva	dinâmica	pela	qual	a	
pessoa	concebe	sua	vida	como	um	conjunto	e	 interpreta	o	significado	de	suas	diversas	
características,	das	ações	e	das	coisas	que	lhe	ocorrem”	(HUGHES,	1937,	p.	409-410).	
Resumindo	 uma	 das	 principais	 características	 da	 Escola	 de	 Chicago	 era	 o	
interessepela	 relação	 indivíduo	 e	 sociedade.	 Embora	 circulassem	 diferentes	 influências	
teóricas,	o	 interacionismo e	o	pragmatismo	são	sempre	 lembrados	como	correntes	de	
pensamento	 que	 atravessa	 gerações	 de	Chicago	 e	mantem	 sua	 transdisciplinaridade.	
O	sociólogo	norte-americano	Howard	Becker	nos	alerta	para	as	concepções	polissêmicas	
do	conceito	de	interacionismo	simbólico,	destacando	que	essa	perspectiva	se	colocava	
em	oposição	a	noções	como	as	de	organização social e estrutura social,	categorias	
muito	 comuns	 no	 pensamento	 dos	 pesquisadores	 oriundos	 de	 Harvard	 ou	 Columbia,	
principalmente	aqueles	que	haviam	sido	alunos	de	Robert	Merton	e	Talcott	Parsons.	Assim,	
o	interacionismo	simbólico	de	Chicago	pode	ser	compreendido	nos	seguintes	termos:	
A	 unidade	 básica	 de	 estudo	 era	 a	 interação	 social,	 pessoas	 que	 se	
reúnem	para	fazer	coisas	em	comum	–	exemplificando	com	um	tema	
antropológico,	 para	 constituir	 uma	 família,	 para	 criar	 um	 sistema	
de	 parentesco.	 Disso	 decorre	 que	 um	 sistema	 de	 parentesco	 é	
formado	pelas	ações	de	pessoas	que	fazem	as	coisas	que	se	 supõe	
que	parentes	devam	fazer,	e	que,	enquanto	o	fizerem,	teremos	um	
sistema	 de	 parentesco.	 Quando	 não	 o	 fizerem	mais,	 o	 sistema	 de	
parentesco	 se	 torna	 outra	 coisa.	 Portanto,	 o	 que	 nos	 interessava	
eram	os	modos	de	interação,	especialmente	as	interações	repetitivas	
das	 pessoas,	modos	 estes	 que	 permanecem	os	mesmos	dia	 após	
dia,	semana	após	semana.	Às	vezes,	esses	modos	de	agir	se	alteram	
substancialmente,	devido	a	uma	 revolução	ou	desastre	natural,	mas,	
outras	vezes,	a	mudança	se	dá	muito	lentamente,	à	medida	que	as	
circunstâncias	se	modificam.	(BECKER,	1996,	p.	186)
29
O	 sociólogo	 norte-americano	 Herbert	 Blumer	 (1900-1987)	 chamou	 de	
interacionismo	 simbólico	uma	perspectiva	 teórica	que	considera	o	 caráter	processual	
da	ação	dos	 indivíduos.	Blumer	estaria	 interessado	na	ação	 interpessoal,	partindo	da	
premissa	de	que	o	indivíduo	tem	a	capacidade	única	de	criar	e	fazer	uso	de	símbolos,	por	
exemplo,	 linguagem	e	comunicação.	Nessa	perspectiva,	uma	teoria	da	ação	pressupõe	
que	o	 indivíduo	pode	 aprender	 e	 assumir	 papéis	moldando	o	 “self”	 em	uma	atividade	
reflexiva.	Assim,	ele	pode	apreender,	moldar,	formular	e	transformar	ações	sobre	o	seu	
próprio	comportamento.	Exemplar	disso	é	o	uso	das	redes	sociais	hoje	em	dia.	Pensa	bem,	
acadêmico,	ao	entrar	na	 internet	e	usar	as	redes	sociais	encontramos	uma	 infinidades	
de	 informações	 disponíveis,	 com	 o	 passar	 do	 tempo	 vamos	 aprendendo	 a	 utilizar	 a	
linguagem	virtual,	adotando	formas	de	nos	comunicar	melhor	e	de	maneira	mais	clara,	
também	vamos	aprendendo	que	nem	tudo	pode	ser	dito	ou	compartilhado	que	há	leis	e	
normas	sociais	que	vão	moldando	a	nossa	forma	de	nos	comunicar	nessa	nova	era.	
Para	Blumer	 (1969,	p.	2),	os	 indivíduos	agem	em	relação	às	coisas	com	base	
nos	 significados	 que	 essas	 coisas	 têm	 para	 eles,	 entendendo	 que	 tais	 significados	
derivam	da	interação	social	vivida	entre	os	próprios	indivíduos	e	esses	significados	são	
controlados	por	meio	dos	processos	de	interpretação	que	um	indivíduo	usa	para	lidar	
com	as	situações	e	as	coisas	com	as	quais	ele	interage.	
Em	essência,	 então,	 embora	 reconhecendo	que	as	definições	sociais	
orientam	 a	 ação,	 Blumer	 enfatizava	 que	 o	 processo	 interpretativo	
envolve	mais	do	que	uma	aplicação	reflexa	dessas	definições.	Ao	nos	
encontrarmos	em	uma	determinada	situação,	devemos	decidir	quais	
dentre	 as	muitas	 coisas	 presentes	 nessa	 situação	 são	 relevantes.	
Temos	 que	 determinar	 para	 que	 objetos	 ou	 ações	 precisamos	 dar	
sentido,	 e	 quais	 podemos	 negligenciar.	 Além	 disso,	 é	 necessário	
descobrir	 quais	 são,	 dentre	 os	muitos	 significados	 que	 podem	 ser	
atribuídos	a	uma	coisa,	aqueles	que	se	mostram	mais	apropriados	
nesse	contexto	(BLUMER,	1969,	p.	27).
Outra	influente	corrente	de	pensamento	da	Escola	de	Chicago	é	o	pragmatismo	
que	surge	no	final	do	século	XIX	com	Charles	Peirce,	William	James	e	John	Dewey.	
Peirce	 entendia	 a	 experiência	 (experience)	 como	 ‘experimento	
(experiment)’,	 ou	 seja,	 como	 prática	 de	 laboratório,	 onde	 os	
procedimentos	 aos	 quais	 se	 quer	 dar	 atenção	 são	 preparados,	
controlados	 e	 postos	 sob	 alta	 condição	 de	 verificabilidade.	 James	
considerou	a	noção	de	experiência	de	um	ponto	de	vista,	digamos,	
mais	psicológico.	Ele	não	desprezava	a	maneira	pela	qual	Peirce,	como	
‘homem	de	 laboratório’,	via	a	experiência,	mas	trouxe	o	termo	para	
perto	da	noção	de	‘vivência’.	John	Dewey,	por	sua	vez,	observando	
seus	dois	antecessores,	procurou	dissertar	sobre	o	termo	experiência	
de	modo	 a	 torná-lo	mais	 amplo	 e	 útil.	 Dewey	 reconduziu	 o	 termo	
a	seu	campo	primordial,	o	da	prática	social	 (GHIRALDELLI	JUNIOR,	
2007,	p.	16).
30
O	 pragmatismo	 se	 consolidou	 como	 uma	 importante	 filosofia.	 Talvez	 porque	
sua	 perspectiva	 sugere	 uma	diversidade	de	verdades	 que	podem	 surgir	 da	 experiência	
de	 interação	 social	 em	 que	 linguagem,	 regras,	 atitudes	 são	 avaliadas	 a	 partir	 das	
consequências	 e	 do	 valor	 de	 seu	 uso.	 Assim,	 para	 William	 James	 (1907),	 por	 exemplo,	
o	 pragmatismo	 é	 a	 tentativa	 de	 interpretar	 cada	 noção	 traçando	 suas	 respectivas	
consequências	práticas.	
Resumidamente,	este	tópico	trouxe	uma	 leitura	em	ampla	escala	daquela	que	
pode	 ser	 considerada	 a	mais	 proeminente	 escola	 sociológica	 de	 estudos	 urbanos	 no	
mundo.	Há	uma	rica	produção	empírica	que	merecidamente	poderia	ser	descrita	não	
fosse	 os	 objetivos	 que	 devemos	 cumprir	 com	 a	 nossa	 disciplina,	 isto	 é,	 conhecer	 a	
Antropologia	Urbana	sob	a	influência	dessa	escola	de	pensamento.	
Nesse	sentido,	antes	de	passarmos	para	o	próximo	tópico,	lembremos	pontos	
centrais	 desse	 estudo,	 por	 exemplo,	 os	 principais	 temas	 encontrados	 na	 produção	
empírica	 da	 Escola	 de	 Chicago	 foram	 os	 estudos	 de	 trajetórias	 sociais	 e	 urbano-
espaciais	de	 imigrantes,	as	mobilidades	urbanas	no	 interior	das	grandes	metrópoles,	
os	movimentos	 e	 agrupamentos	 de	multidões,	 as	 relações	 sociais	 de	 vizinhança,	 a	 vida	
associativa	e	modos	de	controle	social	nos	bairros,	a	segregação	espacial	das	minorias,	
a	criminalidade	e	delinquência	juvenis,	as	gangues	e	guetos,	as	pessoas	em	situação	
de	rua	e	a	prostituição.	Ao	realizar	investigações	desses	temas,	pretendia-se	conhecer	os	
efeitos	 do	 fenômeno	 urbano	 e	 suas	 diferentes	 características	mediante	 um	 registro	
feito	em	escalas:	local/global,	rural/urbano,	micro/macro,	campo/cidade.	
Desse	modo	percebemos	que	os	efeitos	do	urbanismo	também	alcançam	outras	
dimensões	da	vida	social,	exemplar	disso,	é	a	divisão	social	do	trabalho,	a	presença	de	
instituições	da	modernidade	e	a	nova	ordem	moral	em	vigor	nesses	grandes	centros.	
Com	isso	a	organização	social	da	cidade	também	vai	definir	“regiões	morais”	ou	“mundos	
sociais”,	 em	 que	 há	 intensa	 presença	 de	 pequenos	 mundos	 sociais	 que	 convivem,	
mas	podem	simplesmente	não	 interagir.	Assim,	 temos	duas	escalas	em	evidência,	 a	
cidade	também	abriga	uma	ordem	espacial	ou	noutros	termos,	a	ecologia	humana	e	ao	
observar	essas	nuances	entre	ordem	moral	e	espacial	conhecemos	as	diferentes	 lutas	
políticas	e	sociais	que	vão	emergir	dessa	competição	acirrada	pela	sobrevivência	em	
um	novo	contexto	urbano.	
Esse	desenho	ou	mapa	conceitual	do	espaço	da	cidade	vai	introduzir	a	divisão	
do	espaço	com	zonas	bem	caracterizadas	e	segmentadas,	por	onde	podemos	facilmente	
identificar	o	local	exato	do	centro	da	cidade	e	o	que	nele	vamos	encontrar,	bem	como	
qual	 a	 zona	 de	 bairros	 residenciais,	 dentro	 dessa	 escala	 de	 bairros	 os	 quais	 seriam	
aqueles	mais	verticalizados	e	os	mais	horizontais,	onde	estariam	os	moradores	da	classe	
trabalhadora,	 onde	 podemos	 encontrar	 os	 artistas	 de	 uma	 cidade,	 bancos,	 escolas,	
prefeituras,	 hospitais	 cada	 equipamento	 desse	 também	 agrega	 uma	 funçãoe	 está	 em	
uma	 zona	 da	 cidade,	 assim	 como	 os	 chamados	 bairros	 universitários,	 comunidades	
periféricas,	favelas,	morros,	estabelecimentos	como	bares,	restaurantes,	hotéis,	pousadas,	
supermercados	e	feiras	livres.	
31
Tudo	isso	é	parte	dessa	“ordem	espacial”	e	que	ao	pesquisador	interessado	em	
conhecer	a	cidade	pode,	por	meio	do	interacionismo	simbólico,	encontrar	suas	zonas	
fronteiriças,	suas	demarcações	imaginadas	e	os	sentidos	próprios	que	os	indivíduos	dão	
para	esses	contextos,	é	na	observação	das	pessoas,	das	relações	sociais,	que	podemos	nos	
aproximar	do	sentido	forte	de	uma	antropologia	urbana	a	partir	das	lentes	da	Escola	de	
Chicago.
Talvez	um	dos	principais	legados	dessa	escola	seja	a	utilização	da	etnografia	como	
método	de	pesquisa	empírica	para	pesquisar	a	cidade	e	o	urbano,	assim	como	o	fator	de	
aplicar	esse	método	por	meio	de	uma	investigação	coletiva.	Desse	modo,	os	“etnógrafos	
de	 Chicago”	 contribuíram	 de	 maneira	 significativa	 para	 entender	 a	 cidade	 como	 um	
complexo	cultural,	colocando	atenção	sobre	o	tempo,	o	espaço	e	as	formas	de	interação	
que	nela	serão	encontradas	e	dando	um	passo	muito	importante	em	direção	aos	estudos	
dos	conflitos	sociais	a	partir	da	análise	dos	desvios,	conflitos	étnicos,	disputas	por	espaço,	
luta	 de	 classes,	 comportamento	 político,	 vida	 associativa,	 ações	 coletivas,	 liberdade	
sexual,	expressões	culturais	e	a	heterogeneidade	da	vida	social	nas	grandes	cidades.
Agora	que	já	conhecemos	um	pouco	da	Escola	de	Chicago,	seus	principais	autores	
e	pesquisadores,	bem	como	seus	conceitos,	teorias	e	categoriais	centrais	passaremos	ao	
estudo	de	outras	 importante	corrente	de	pensamento	e	escola	que	vai	contribuir	para	a	
formação	do	campo	da	antropologia	urbana	no	Brasil:	a	Escola	de	Manchester.	
3 ESCOLA DE MANCHESTER 
Caro	 acadêmico,	 a	 Escola	 de	 Manchester	 foi	 considerada	 outra	 importante	
influência	 teórica	 e	metodológica	 para	 a	 formação	 do	 campo	 da	Antropologia	 Urbana,	 a	
Escola	de	Manchester	é	uma	das	principais	escolas	de	antropologia	do	mundo.	
Seu	surgimento	está	associado	com	as	pesquisas	desenvolvidas	no	 instituto	
Rhodes-Livingstone	(atualmente	Instituto	Nacional	de	Pesquisa	de	Zambia).	Fundado	
em	1938	seus	pesquisadores	realizaram	um	conjunto	robusto	de	pesquisas	etnográficas	
que	cobrem	o	período	final	do	colonialismo	britânico	e	 início	da	 independência	em	24	de	
outubro	de	1964.	O	instituto	reunia	estudos	a	respeito	da	África,	durante	muito	tempo	
foi	gerido	pelo	governo	e	representantes	de	segmentos	interessados	em	manter	o	regime	
colonialista.	
O	 estudo	dos	 fenômenos	 sociais	 e	 culturais	na	África	 foram	utilizados	como	
instrumento	de	estratégias	políticas	para	alimentar	o	aparelho	administrativo	colonial	
com	informações	de	regiões	de	interesse	econômico	e	político	definidas	como	cinturão	do	
cobre,	 região	 central	 da	 Zâmbia	 e	 da	República	Democrática	 do	Congo,	 que	 inclui	 a	
Rodésia	do	Norte,	hoje	Zâmbia,	Zimbabué	e	Malawi	e	as	cidades	de	Ndola,	Kitwe,	Chigala,	
Luanshya	e	Mufulira.	
32
Na	época,	 o	 comércio	 do	 cobre	 era	 intenso	 e	 com	ele	vieram	consequentes	
transformações	sociais	decorrentes	da	expansão	econômica	diante	da	maior	 jazida	de	
cobre	do	mundo.	A	mineração	do	cobre	em	larga	escala	nos	anos	de	1920	acentuou	o	
processo	de	urbanização	industrial	da	região	e	causou	uma	revolução.	
Godfrey	 Wilson	 foi	 o	 primeiro	 diretor	 do	 instituto	 e	 realizou	 pesquisas	 dos	
processos	de	urbanismo	e	urbanização	que	estavam	se	 intensificando	naquele	momento.	
Após	a	Segunda	Guerra	Mundial,	Wilson	se	afastou	do	cargo	por	vontade	própria	devido	
sua	preocupação	com	as	populações	colonizadas.	Ele	tinha	uma	visão	de	que	a	sociedade	
colonial	 africana	 tinha	um	espaço	 social	muito	 singular	 onde	havia,	 simultaneamente,	
a	 presença	 de	 chefes	 políticos,	 aldeões,	 administradores	 distritais	 e	 mineiros	 do	 cobre.	
Tal	 singularidade	 revelava	 também	 importantes	questões	a	 respeito	dos	processos	de	
mudança	urbana	e	interesses	políticos	contrários	aos	dos	administradores	coloniais.	
Naquele	 momento	 as	 mudanças	 sociais	 foram	 intensificadas	 e	 estavam	
relacionadas	também	com	o	surgimento	de	novas	nações	na	era	pós-colonial.	De	acordo	
com	o	antropólogo	Peter	Fry	(2011,	p.	2)	“a	independência	das	antigas	colônias	britânicas	
era	assunto	de	conversa,	mas	não	de	estudo	propriamente	dito”.	
Além	disso,	esse	período	marca	uma	tensão	política	com	a	própria	antropologia	
e	os	membros	da	Escola	de	Manchester	estavam	fortemente	unidos	contra	o	racismo	e	o	
sistema	 colonial,	 a	 participação	 deles	 no	 Rhodes-Livingstone	 assim	 como	 o	 fato	 de	
muitos	 serem	 de	 origem	 sul-africana	 refletem	 uma	 posição	 política	 de	 oposição	 à	
administração	colonial.	
A	história	da	Escola	de	Manchester	é	confundida	com	a	história	de	Max	Gluckman	
(1911-1975).	No	que	diz	 respeito	ao	método	de	pesquisa	e	às	questões	administrativas	
e	políticas	que	ardiam	na	época.	Gluckman	foi	um	proeminente	antropólogo	que	entre	
os	anos	1941	e	1947	esteve	à	frente	do	Instituto	Rhodes-Livingstone,	após	esse	período	
é	admitido	como	professor	da	Universidade	de	Oxford.	Em	1934,	Gluckman	vai	realizar	seu	
doutorado	na	Universidade	de	Oxford,	como	bolsista	da	Rhodes,	é	nesse	momento	que	
ele	se	aproxima	de	Radcliffe-Brown	e	Evans-Pritchard,	ele	estava	interessado	no	estudo	
da	 relação	entre	as	dinâmicas	de	equilíbrio	e	mudanças	sociais	na	África	Meridional.	
Entre	 os	 anos	 de	 1936	 e	 1938	 Gluckman	 desenvolve	 seu	 trabalho	 de	 pesquisa	 de	
campo	na	Zululândia,	a	partir	do	qual	publica	um	texto	considerado	fundamental	para	
os	 estudos	 antropológicos	 “Análise	 de	 uma	 situação	 social	 na	 Zululândia	 moderna”	
(FELDMAN-BIANCO,	1987).
Antes	de	falarmos	da	importância	e	as	contribuições	dessa	obra	para	os	estudos	
de	Antropologia	Urbana,	é	necessário	entender	que	sua	 ida	para	Oxford	em	1949	vai	
ser	determinante	para	o	sucesso	da	Escola	de	Manchester,	pois	será	nesse	momento	
o	surgimento	do	Departamento	de	Antropologia	Social	da	Universidade	de	Manchester,	
onde	 Gluckman	 reuniu	 um	 seleto	 grupo	 de	 alunos	 que	 viriam	 a	 contribuir	 para	 sua	
abordagem	política	dos	processos	sociais.	
33
Gluckman	foi	aluno	do	antropólogo	Radcliffe-Brown	de	quem	herdou	o	método 
estrutural-funcionalista que	serviu	de	base	para	suas	próprias	pesquisas,	no	entanto	
ele	foi	além	na	busca	por	uma	compreensão	da	mudança	social	concebida	como	criação	
contínua	de	uma	estrutura	social	dinâmica	(ERICKSON;	MURPHY,	2015).	
Gluckman	 estudou	 as	 principais	 transformações	 que	 ocorreram	 na	 região	
privilegiando	uma	 abordagem	comparativa	 das	 sociedades	 africanas	 antes	 e	 depois	 da	
urbanização	e	dos	processos	de	modernização,	dando	especial	atenção	aos	processos	
políticos	relacionados	à	gestão	do	território.	
Não	 se	 pode	 facilmente	 separar	 o	 desenvolvimento	 das	 ideias	 de	
Gluckman	e	a	obra	que	ele	inspirou	no	Instituto	Rhodes-Livingstone.	
Elas	 fundiram-se	 nas	 produções	 da	 “Escola	 de	 Manchester”,	 a	
qual,	na	década	de	1950,	tornou-se	uma	reconhecível	mutação	do	
estruturalismo	britânico	(KUPER,	1978,	p.	182-183).
A	preocupação	de	Gluckman	com	a	natureza	da	estabilidade	social	e,	do	seu	
par	 de	 oposição,	 a	 mudança	 social	 é	 traço	 característico	 de	 sua	 obra	 e	 da	 distinta	
Escola	de	Manchester,	especialmente	por	ser	partir	dessa	perspectiva	que	seus	alunos	
desenvolveriam	um	campo	de	estudos	original	em	torno	de	pesquisas	nas	áreas	urbanas	e	
nos	meios	rurais	tradicionais	etnografados	pelos	antropólogos.	
Na antropologia o método estrutural-funcionalista, baseado nos 
métodos das ciências naturais, postula que é possível identificar as leis 
que regulamentam e organizam o funcionamento de uma sociedade. 
A partir desse método Radcliffe-Brown dentre outros antropólogos 
procuravam identificar as estruturas e os sistemas de relações sociais 
que tornam uma sociedade integrada e estável.
NOTA
A	região	do	cinturão	do	cobre	(Copperbelt)foi	onde	esse	conjunto	de	pesquisadores	
se	 reuniram	para	 entender	 os	 processos	 sociais	migratórios	 entre	 o	 campo	 e	 a	 cidade.	
Observaram	 os	 impactos	 das	migrações	 no	 contexto	 rural,	 a	 consequência	 social	 da	
urbanização	na	vida	dos	trabalhadores	e	mostraram	como	as	“tribos”	concentravam	mão	
de	obra	na	divisão	social	do	trabalho,	interferindo	também	nos	costumes	locais.	
Gluckman	dividiu	seus	colaboradores	para	cobrir	a	África	central	a	partir	de	quatro	
eixos	de	pesquisa:	minas	e	cidades	mineiras,	áreas	rurais	isoladas,	áreas	rurais	próximas	
aos	centros	onde	concentravam	mão	de	obra	e	economia	monetarizada	e	áreas	agrícolas	
europeias.	A	partir	disso	foram	estudados	os	efeitos	da	migração	laboral	e	da	urbanização	
na	 organização	 familiar	 e	 de	parentesco,	 assim	como	na	vida	 econômica,	 nos	valores	
políticos,	nas	crenças	e	práticas	 religiosas	e	mágicas	presentes	em	cidades	e	aldeias.	
Além	disso,	estudos	dos	efeitos	de	monetarização	na	economia	e	formação	de	grupos	
34
sociais	a	partir	de	novas	relações	entre	o	mundo	urbano	e	o	mundo	rural	mostravam	a	
importância	das	minas,	das	lojas	e	das	missões	nos	novos	arranjos	relacionais,	agora	não	
eram	apenas	os	moradores	locais	se	deslocando	do	campo	para	a	cidade,	mas	uma	intensa	
migração	de	 europeus,	 indianos	 e	 outros	 grupos	 sociais	 em	torno	de	um	território	 de	
intensa	transformação.	
Figura 4 – Max Gluckman e John Barnes
Fonte: https://bit.ly/3Oyz7iP. Acesso em: 20 jul. 2022.
Um	 dos	 principais	 artigos	 de	 Gluckman,	 “Análise	 de	 uma	 situação	 social	 na	
Zululândia” moderna,	 publicado	 originalmente	 em	 1940,	 oferece	 uma	 rica	 descrição	
da	análise	de	situações	sociais	e	mudanças	rápidas.	O	artigo	realiza	uma	análise	das	
redes	 sociais	 entre	 brancos	 (equipe	 administrativa,	 policiais)	 e	 negros	 (zulus),	 dentro	
de	um	contexto	político	de	guerra,	 intensa	transformações	políticas	e	econômicas	e	forte	
divisão	 entre	 os	 dois	 grupos.	Ao	 observar	 a	 inauguração	 de	 uma	 ponte	 ele	 percebe	
que	 participavam	 daquele	 evento	 tanto	 o	 grupo	 de	 brancos	 com	 funcionários	 da	
administração	e	policiais,	quanto	o	grupo	de	negros	com	a	presença	de	chefes	locais	
zulus,	 trabalhadores	 que	 construíram	 a	 ponte	 e	 pessoas	 residentes,	 revelando	 uma	
situação	social	específica	para	a	análise	dos	conflitos.	
O	 ponto	 de	 vista	 defendido	 por	 Gluckman	 era	 que,	 embora	 os	
membros	 dos	 diferentes	 grupos	 de	 cor	 estivessem	 simbólica	 e	
concretamente	divididos	e	opostos	em	todos	os	aspectos,	eles	eram	
forçados,	 entretanto,	 a	 interatuar	 em	 esferas	 de	 interesse	 comum	
(KUPER,	1978,	p.	173).
A	recomendação	principal,	do	ponto	de	vista	metodológico,	para	o	antropólogo	é	
que	em	campo	reúna	observações	de	situações	sociais	ou	uma	série	de	situações	e	a	
partir	delas	possa	extrair	perguntas	para	realizar	sua	análise	de	profundidade.	O	chamado	
método	 de	 casos	 estendidos	 (extended case method),	 deslocava	 a	 antropologia	 da	
análise	de	normas	e	valores	para	o	foco	na	vida	social	“real”,	no	qual	esse	conjunto	de	
regras	era	frequentemente	utilizados	de	acordo	com	a	racionalidade	dos	 indivíduos	na	
35
ação,	em	situações	concretas.	Oxford	estimulou	em	Gluckman	o	interesse	pela	análise	dos	
conflitos	a	das	relações	de	grupos	em	oposição,	na	qual	o	equilíbrio	social	era	mantido	
pela	 incorporação	 da	 tensão	 por	meio	 de	 “rituais	 da	 rebelião”,	 atos	 convencionais	 e	
socialmente	 legitimados	para	manter	 a	estabilidade	 social,	 neles	o	 ritual	 detém	uma	
dimensão	 construtiva	para	 ajudar	 a	 evitar	 o	 conflito	 real.	Assim,	 em	Zululândia	 o	 grupo	
dominante	era	o	branco,	os	rituais	de	rebelião	era	uma	forma	de	alinhar	uma	unidade	
entre	 os	 grupos,	mesmo	 com	a	 presença	 de	 conflitos.	 Os	 rituais	 tinham	o	 poder	 de	
chamar	 a	 atenção	 para	 o	 conflito,	 reforçando	 a	 necessidade	 de	 autoridade	 legítima	
naquele	lugar	para	conter	os	distúrbios	da	ordem	social.	
A	 análise	 situacional	 propõe	 a	 utilização	 de	 casos	 como	 ilustrativos	 e	
demonstrativos	 da	 observação	 do	 antropólogo,	 servindo	 de	 elemento	 didático	 para	
falar	da	ordem	social	no	contexto	pesquisado.	Nesse	sentido,	vários	episódios	de	um	
mesmo	evento	podem	construir	uma	narrativa	ao	esmiuçar	e	analisar	as	relações	sociais	
presentes	no	contexto	e	assim	fazer	um	movimento	de	observação	entre	escalas,	isto	é,	
do	particular	chegar	ao	geral.	Assim,	a	noção	de	situação	implica	a	compreensão	de	que	
a	própria	noção	de	identidade	é	situacional,	um	africano	maquinista	de	trem	em	uma	
situação	pode	muito	bem	ser	um	 importante	 líder	político	ou	chefe	de	uma	tribo	em	
outra	situação.		
 
A	partir	 da	 interessante	pesquisa	do	 antropólogo	Jonh	Barnes	 e	 da	publicação	
do	artigo	clássico	 “Redes	 sociais	 e	processo	político”,	 em	 1987,	 o	 conceito	de	 “redes	
sociais”	para	os	estudos	de	comunidade	ficou	bastante	popular	na	antropologia.	Barnes	
demonstrou	as	relações	sociais	a	partir	da	 interação	entre	as	sociedades	africanas	e	
a	administração	colonial	por	meio	de	pesquisa	etnográfica	no	contexto	da	 recente	e	
intensa	modernização	no	continente	africano.	O	antropólogo	percebe,	e	por	meio	do	
conceito	de	redes	sociais	explica,	como	os	indivíduos	podem	e	de	fato	participam	de	
vários	grupos	sociais	ao	mesmo	tempo	como	família,	trabalho,	educação,	 lazer,	dentre	
outros	segmentos.	Com	isso	Barnes	evidencia	as	características	presentes	em	diferentes	
ligações	que	um	mesmo	indivíduo	possui	em	relação	a	outros	indivíduos	na	observação	
dos	diferentes	grupos	que	ele	pertence.	Assim,	é	possível	extrair	o	potencial	elucidativo	
da	ação	social,	entender	quais	motivos	e	o	contexto	específico	nos	quais	o	indivíduo	age	
de	uma	forma	e	não	de	outra	(FELDMAN-BIANCO,	1987).	Assim,	a	forma	de	apreensão	
da	 realidade	social	a	 rede	aparece	como	uma	categoria	de	análise	e	 resumidamente	
significa	um	conjunto	de	relações	interpessoais.	Jaap	van	Velsen,	em	seu	artigo	de	1987,	
“A	análise	situacional	e	o	método	de	estudo	de	caso	detalhado”,	aborda	diretamente	a	
“análise	situacional”	ou	o	“método	de	estudo	de	caso	detalhado”.	
Uma	 das	 suposições	 na	 qual	 a	 análise	 situacional	 está	 baseada	
é	 a	 de	 que	 as	 normas	 da	 sociedade	 não	 constituem	 um	 todo	
coerente	e	consistente.	São,	ao	contrário,	frequentemente	vagas	e	
discrepantes.	É	exatamente	este	fato	que	permite	sua	manipulação	
por	parte	dos	membros	da	sociedade	no	sentido	de	favorecer	seus	
próprios	 objetivos	 sem	 necessariamente	 prejudicar	 sua	 estrutura	
aparentemente	 duradoura	 de	 relações	 sociais.	 Por	 isso	 a	 análise	
situacional	 privilegia	 o	 estudo	 das	 normas	 em	 conflito	 (FELDMAN-
BIANCO,	1987,	p.	369)
36
Nessa	perspectiva	teórica,	os	antropólogos	priorizam	a	observação	dos	conflitos	
sociais	 entre	 indivíduos	 que	 fazem	 parte	 do	 mesmo	 grupo	 observado.	 A	 escala	 de	
observação	é	microssocial	e	não	desconsidera	variáveis	macrossociais	como	gênero,	
classe	ou	raça,	mas	integra	tais	escalas	na	análise	de	uma	situação	que	pode	revelar	
aspectos	de	uma	estrutura.	
Isto	se	refere	à	coleta	efetuada	pelo	etnógrafo	de	um	tipo	especial	
de	informações	detalhadas.	No	entanto,	isto	também	implica	o	modo	
específico	em	que	esta	 informação	é	usada	na	análise,	sobretudo	a	
tentativa	de	incorporar	o	conflito	como	sendo	‘normal’	em	lugar	de	
parte	 ‘anormal’	 do	 processo	 social	 (VELSEN	 in	 FELDMAN-BIANCO,	
1987,	p.	345).	
Entende-se	 que	 os	 indivíduos	 produzem	 diversas	 relações	 sociais	 em	 um	
determinado	contexto,	inclusive	em	um	conflito,	e	que	seu	estudo	aprofundado	das	normas	
e	valores	pode	favorecer	a	análise	do	que	se	passa	no	interior	de	uma	sociedade,	entendendo	
quais	estão	contidas	e	definem	as	interações	entre	os	indivíduos	presentes	ali.	
O	 conflito	 enquanto	 uma	 situação	 social	 com	 forte	 componente	 de	 análise	
permite	 perceber	 a	 diversidade	 de	 valores	 contraditórios	 que	 podem	 estar	 em	 um	
indivíduo,	mas	ao	deslocar	o	eixo	de	observação	do	comportamentosocial	para	uma	
situação	 específica	 é	 possível	 conhecer	 inúmeras	 regras	 e	 a	 maneira	 como	 cada	
indivíduo	faz	uso	delas.	A	análise	é	feita	a	partir	da	observação	do	comportamento	de	
um	mesmo	 indivíduo	em	diferentes	situações,	nas	quais	encontramos	modos	de	agir	e	
formas	de	pensar.	A	orientação	para	o	uso	da	análise	situacional	é	de	que	o	antropólogo	
faça	sua	observação	a	partir	de	casos	que	fazem	parte	de	um	processo	social,	trata-se	
de	uma	análise	baseada	na	observação	dos	processos	sociais.
O	 antropólogo	 polonês	 Bronislaw	 Malinowski	 será	 lembrado	 pela	 Escola	 de	
Manchester	 pelo	 método	 de	 observação	 participante,	 este	 privilegia	 a	 observação	
do	 contexto	 pesquisado	 a	 partir	 de	 uma	vivência	 integrada	 do	 pesquisador	 com	 os	
indivíduos	da	sociedade	ou	grupo	social	no	qual	irá	realizar	a	pesquisa,	considerando	a	
aceitação,	o	convite	e	a	integração	nessas	relações	como	definidoras	de	uma	potencial	
forma	de	relação	social	entre	pesquisador	e	grupo	em	longa	duração.	Para	compor	suas	
pesquisas,	 os	 antropólogos	 de	Manchester	 também	utilizaram	documentos	históricos,	
registros	escritos	e	dados	estatísticos	na	produção	de	suas	pesquisas	antropológicas.	
 
Gluckman	vai	 incorporar	 essa	metodologia	para	 sua	pesquisa	 em	Zululândia,	
tentando	estabelecer	uma	 relação	de	proximidade	e	 familiaridade	com	o	cotidiano	e	as	
práticas	 sociais	 comuns	 entre	 os	 zulus.	 Tal	 atitude	 levou	 Gluckman	 a	 vestir-se	 com	
trajes	tradicionais	zulus,	buscando	uma	pretensa	igualdade	naquele	lugar.	
Hoje	isso	não	é	recomendado	e	tem	levantado	inúmeras	críticas,	uma	vez	que	
ao	utilizar	roupas	específicas	de	uma	cultura	isso	não	vai	tornar	o	antropólogo	um	membro	
dela,	rotinizar	trajes,	linguagens	ou	técnicas	corporais	do	grupo	pesquisado	muitas	vezes	
é	interpretado	como	um	falseamento	da	relação	social	e	demonstra	uma	relação	mais	
instrumental	do	que	de	reconhecimento	e	respeito.	
37
Além	de	todos	esses	métodos	e	técnicas	de	pesquisas	empregadas	na	análise	
situacional,	 a	 Escola	 de	 Manchester	 por	 estar	 interessada	 em	 conhecer	 o	 contexto	
pesquisado	em	sua	totalidade	também	percebeu	que	há	uma	pluralidade	de	sentidos,	
normas	e	indivíduos	ali.	Por	isso,	a	etnografia	realizada	na	África	Central	era	tão	rica	e	
estimulante	ao	pensamento	antropológico,	pois	naquele	contexto	de	intensas	mudanças	
no	 espaço	 físico	 e	 social	 entre	 o	 rural	 e	 o	 urbano	 foi	 possível	 compreender	 aquela	
realidade	social	em	construção.	Uma	transição	entre	modos	de	vida,	práticas	sociais	
e	 redefinição	 de	 normas	 e	valores	 entre	 uma	modernidade	 e	 um	 sistema	 capitalista	
industrial	 que	 rapidamente	 alterou	 contextos	 como	 o	 da	África	 Central	 etnografada	
pelos	legendários	antropólogos	de	Manchester.	
A	 Escola	 de	Manchester	 por	 essas	 razões	 se	 tornou	 uma	 referência	 para	 os	
estudos	de	Antropologia	Urbana,	em	relação	à	Escola	de	Chicago,	a	dimensão	política	
se	mostrou	muito	mais	presente	fosse	na	análise	ou	na	posição	dos	seus	pesquisadores	
em	 face	 da	 contraposição	 aos	 interesses	 da	 administração	 colonial.	 Nesse	 sentido,	
destaca-se	 pelo	 interesse	 no	 estudo	 das	 cidades	 pós-coloniais	 africanas,	 que	 naquele	
momento	estavam	transitando	para	mudanças	de	bases	políticas	e	econômicas,	antes	
da	 intensa	modernização	 os	 indivíduos	 da	 África	 Central	 eram	membros	 de	 grupos	
tribais,	organizados	em	suas	próprias	dinâmicas	de	parentesco	e	práticas	sociais.	Após	
a	chegada	da	Revolução	Industrial	e	mudança	política	para	novas	formas	de	governos	
e	organização	do	espaço	com	os	traços	das	grandes	metrópoles	urbanas	esses	indivíduos	
passaram	 a	 enfrentar	 mudanças	 no	 seu	 modo	 de	 vida,	 tornando-se	 mão	 de	 obra,	
operários	 das	 grandes	 construções	 urbanas	 e	 distanciando-se	 de	 vários	 elementos	
constitutivos	de	sua	identidade	tribal.	
Além	 de	 Gluckman,	 outros	 importantes	 pesquisadores	 que	 consolidaram	 a	
“Escola	 de	 Manchester”	 foram	 Freddie	 Bailey,	 John	 Barnes,	 Elizabeth	 Colson,	 Arnold	
Epstein,	Philip	Mayer,	Clyde	Mitchell,	Victor	Turner,	Jaap	Van	Velsen,	Peter	Worsley,	 Ian	
Cunnison,	Max	Marwick,	Thomas	Watson	e	Bruce	Kapferer	e	Abner	Cohen.	Alguns	foram	
alunos	e	outros	colaboradores	de	Gluckman	e	podem	facilmente	serem	identificados	a	
partir	das	características	de	suas	pesquisa,	observando-se	sempre	a	presença	do	método	e	
o	tema	comum	a	todos	eles	conforme	destaca	Adam	Kuper	“a	fissão	na	aldeia	foi	o	tema	
escolhido	por	Turner;	a	integração	política	vertical	foi	o	de	Mitchell,	trabalhando	em	uma	
aldeia	Yao;	a	migração	de	mão	de	obra	foi	o	problema	abordado	por	Watson;	as	acusações	
de	bruxaria	serviram	à	pesquisa	de	Marwick,	e	assim	por	diante”	(KUPER,	1978,	p.	179).	
A	 antropologia	 Urbana	 terá	 sempre	 na	 Escola	 de	 Manchester	 uma	 fonte	
inesgotável	de	pesquisas,	métodos	e	teorias	para	renovar	a	 investigação	antropológica	
dos	indivíduos,	da	cidade	e	do	contexto	urbano.	Esse	conjunto	de	pesquisadores	tornou	
indispensável	uma	abordagem	focada	em	uma	escala	microssocial	da	observação	das	
situações	e	eventos	que	podem	ajudar	a	entender	a	complexidade	dos	indivíduos.	
38
A	ciência	 antropológica,	 embora	 tenha	 recebido	 inúmeras	 críticas	 quanto	 ao	
seu	uso	 para	fins	 coloniais,	 com	a	 experiência	 da	 Escola	 de	Manchester	 discutiu-se	
extensivamente	a	posição	política	e	as	questões	em	torno	da	relação	com	as	sociedades	
que	 estavam	 enfrentando	 processos	 de	 modernização	 marcados	 por	 exploração,	
precarização	 e	 descaracterização	 da	 vida	 social.	 Se,	 por	 um	 lado,	 o	 impacto	 da	
industrialização	revela	problemas	sociais	imediatos	como	aqueles	que	podem	ser	vistos	na	
observação	direta,	por	outro,	a	produção	antropológica	passou	por	transformações	que	
vão	moldar	os	modos	de	fazer	antropologia.	
A	Escola	de	Manchester	faz	parte	de	uma	tradição	da	antropologia	que	calibrou	
bem	essas	questões,	além	disso	deu	ênfase	ao	seu	método	de	estudo	consolidando	
a	investigação	antropológica	a	partir	da	análise	de	situações	sociais	focada	em	problemas	
particulares	 estabelecendo	 relação	 com	 o	 contexto	 cultural,	 político,	 econômico	 e	
social	mais	amplo.	Nesse	sentido,	as	contribuições	de	antropólogos	de	Manchester	nos	
estudos	do	desenvolvimento	no	contexto	de	expansão	do	capitalismo	trouxeram	uma	
perspectiva	do	estudo	das	condições	sociais	de	vida	no	curso	de	sua	transição,	entre	o	
rural	e	o	urbano.	
Ao	 conhecermos	 um	 pouco	 das	 influências	 e	 as	 contribuições	 etnográficas	
propostas	pela	Escola	de	Manchester	vamos	mudar	a	nossa	escala	de	conhecimento	para	
enxergar	os	desdobramentos	desses	potenciais	conflitos	do	mundo	urbano	por	meio	
de	outras	formas	de	organização	da	vida	social	por	meio	dos	ajuntamentos	coletivos,	das	
mobilizações	sociais	e	da	formação	coletiva.	Nosso	percurso	nos	conduzirá	para	a	análise	
de	 conflitos	 sociais	mais	 próximos	 ao	 tempo	contemporâneo,	 falo	 das	demandas	de	
cidadania,	das	lutas	sociais	por	direitos	à	moradia	e	das	diferentes	formas	de	associação.	
39
Neste tópico, você aprendeu:
•	 O	conceito	de	“antropologia	urbana”,	isto	é,	uma	subárea	da	antropologia	que,	no	Brasil,	
os	seus	primeiros	estudos	foram	na	década	de	1940,	com	os	chamados	“estudos	de	
comunidade”.	Tais	estudos	foram	fortemente	influenciados	pela	tradição	de	estudos	
da	renomada	“Escola	de	Chicago”,	nos	Estados	Unidos,	cuja	principal	característica	
era	o	interesse	por	uma	investigação	antropológica	sobre	as	cidades	e	as	mudanças	
a	partir	da	urbanização.	
•	 Os	conceitos	da	Escola	de	Chicago	e	seus	principais	autores,	além	de	suas	teorias	
e	 métodos	 de	 pesquisa.	 Estudamos	 aquela	 que	 pode	 ser	 considerada	 a	 mais	
proeminente	 escola	 sociológica	 de	 estudos	 urbanos	 no	 mundo.	 Estudamos	 uma	
rica	 produção	 empírica,	 que	 influenciou	 sobremaneira	 a	Antropologia	 Urbana	 não	
só	em	aspectos	teóricos,	como	também	o	interacionismo	e	pragmatismo.	Sobre	os	
métodos	e	técnicas	de	pesquisa,	estudamos	o	uso	das	metodologiasqualitativas	e	
quantitativas	no	que	se	relaciona	ao	fenômeno	urbano.
•	 Conceitos	 da	 Escola	 de	Manchester	 e	 seus	 principais	 autores,	 teorias	 e	métodos	
de	 pesquisa.	 As	 contribuições	 de	 antropólogos	 de	 Manchester	 nos	 estudos	 do	
desenvolvimento	no	contexto	de	expansão	do	capitalismo	trouxeram	uma	perspectiva	
do	estudo	das	condições	sociais	de	vida	no	curso	de	sua	transição,	entre	o	rural	e	
o	urbano.	Ao	conhecermos	um	pouco	das	influências	e	as	contribuições	etnográficas	
propostas	pela	Escola	de	Manchester	vamos	mudar	a	nossa	escala	de	conhecimento	
para	enxergar	os	desdobramentos	desses	potenciais	conflitos	do	mundo	urbano	por	
meio	 de	 outras	 formas	 de	 organização	 da	vida	 social	 por	meio	 dos	 ajuntamentos	
coletivos,	das	mobilizações	sociais	e	da	formação	coletiva.	
•	 Os	 diferentes	 contextos	 políticos	 nos	 quais	 se	 desenvolveram	 essas	 escolas	 de	
pensamento.	 Considerando	 os	 impactos	 dos	 processos	 de	 intensa	 urbanização	 e	
desenvolvimento	 capitalista	 para	mudanças	 culturais,	 políticas,	 econômicas	 e	 sociais	
em	 sociedades	 que	 vivenciaram	 a	 experiência	 abusiva	 do	 sistema	 colonial.	 Naquele	
contexto	 fatores	 relacionados	 às	 transformações	 sociais,	 econômicas	 e	 culturais	
que	marcaram	o	final	 da	Segunda	Guerra	Mundial,	 sobretudo,	 após	os	 anos	 1960,	
contribuíram	para	um	inovador	ponto	de	reflexão	acerca	das	condições	de	vida	no	
contexto	da	modernidade.
RESUMO DO TÓPICO 2
40
1	 Diferentes	 fatores	 relacionados	 às	 transformações	 sociais,	 econômicas	 e	 culturais	
que	marcaram	o	final	 da	Segunda	Guerra	Mundial,	 sobretudo,	 após	os	 anos	 1960,	
contribuíram	 para	 um	 inovador	 ponto	 de	 reflexão	 acerca	 das	 condições	 de	 vida	
no	contexto	da	modernidade.	O	 interesse	por	uma	 investigação	antropológica	nas	
cidades	e	as	mudanças	a	partir	da	urbanização	deu	origem	à	“antropologia	urbana”,	este	
termo	designa	uma	subárea	da	antropologia	que,	no	Brasil,	tem	seus	primeiros	estudos	
na	década	de	1940	com	os	chamados	 “estudos	de	comunidade”	e	são	fortemente	
influenciados	por	duas	escolas	de	pensamento	clássicas.	Sobre	estas	grandes	escolas	
do	conhecimento	da	Antropologia	Urbana,	assinale	a	alternativa	CORRETA:
a)	 (			)	 Autores	da	Escola	de	Chicago	construíram	um	programa	de	estudos	do	fenômeno	
urbano	a	partir	de	pesquisas	realizadas	em	Chicago	e	a	Escola	de	Manchester	
surge	vinculada	ao	Instituto	Nacional	de	Pesquisa	de	Zambia	que	desenvolveu	
pesquisas	na	África	Meridional.
b)	 (			)	 A	Escola	de	Chicago	se	desenvolveu	porque	estava	localizada	em	um	importante	
território	de	petróleo	que	influenciou	o	desenvolvimento	de	pesquisas	a	respeito	
dessa	 indústria,	enquanto	a	Escola	de	Manchester	nasceu	na	 Inglaterra	e	suas	
pesquisas	deram	origem	aos	estudos	da	escravidão.
c)	 (			)	 A	Escola	de	Chicago	e	a	Escola	de	Manchester	fazem	parte	da	Escola	de	Antropologia	
Urbana	Universal	que	produziu	pesquisas	quantitativas	ao	redor	do	mundo.
d)	 (			)	 Robert	 Park	 e	 George	 Simmel	 são,	 respectivamente,	 considerados	 os	 pais	
fundadores	 e	 os	 principais	 autores	 da	 Escola	 de	 Chicago	 e	 da	 Escola	 de	
Manchester.
2	 Considera-se	fundamental	a	relação	de	proximidade	entre	pesquisadores	do	campo	da	
sociologia	e	da	antropologia	nos	estudos	urbanos	e	isto	se	dá	por	diferentes	razões,	
uma	delas	está	associada	ao	grande	trabalho	de	campo	e	estudos	empíricos	que	os	
“etnógrafos	de	Chicago”,	como	também	ficaram	conhecidos	durante	muito	tempo,	
desenvolveram	a	partir	desta	consolidada	escola	de	estudos.	Com	base	nas	definições	e	
teorias	mobilizadas	pela	Escola	de	Chicago,	analise	as	sentenças	a	seguir:
I-	 Sua	tradição	é	fortemente	influenciada	pelo	pragmatismo,	articulando	a	observação	
direta	da	realidade	à	análise	dos	processos	sociais	urbanos. 
II-	 Na	 antropologia	 urbana	 o	 método	 estrutural-funcionalista	 de	 Chicago,	 baseado	
nos	métodos	das	ciências	naturais,	postula	que	é	possível	 identificar	as	 leis	que	
regulamentam	e	organizam	o	funcionamento	de	uma	sociedade.
III-	 No	 interacionismo	 simbólico	 a	 unidade	 básica	 de	 estudo	 é	 a	 interação	 social,	
pessoas	que	se	reúnem	para	fazer	coisas	em	comum.	Nessa	perspectiva,	a	teoria	
da	ação	pressupõe	que	o	indivíduo	pode	apreender,	moldar,	formular	e	transformar	
ações	sobre	o	seu	próprio	comportamento.
AUTOATIVIDADE
41
Assinale	a	alternativa	CORRETA:
a)	 (			)	 As	sentenças	I	e	II	estão	corretas.
b)	 (			)	 Somente	a	sentença	II	está	correta.
c)	 (			)	 As	sentenças	I	e	III	estão	corretas.
d)	 (			)	 Somente	a	sentença	III	está	correta.
3	 Considerada	 importante	 influência	teórica	e	metodológica	para	a	formação	do	campo	
da	Antropologia	Urbana,	 a	Escola	de	Manchester	é	uma	das	principais	escolas	de	
antropologia	do	mundo	e	se	destacou	por	estar	 interessada	em	conhecer	o	contexto	
pesquisado	 em	 sua	 totalidade,	 desenvolvendo	 métodos	 e	 técnicas	 de	 pesquisa	
percebeu	que	há	uma	pluralidade	de	sentidos,	normas	e	indivíduos	em	um	mesmo	
contexto	 social.	 De	 acordo	 com	 as	 contribuições	metodológicas	 de	 seus	 estudos	
etnográficos,	classifique	V	para	as	sentenças	verdadeiras	e	F	para	as	falsas:
(			)	A	análise	situacional	de	Max	Gluckman	propõe	a	utilização	de	casos	como	ilustrativos	
e	 demonstrativos	 da	 observação	 do	 antropólogo,	 servindo	 de	 elemento	 didático	
para	falar	da	ordem	social	no	contexto	pesquisado.	Nesse	sentido,	vários	episódios	
de	um	mesmo	evento	podem	construir	uma	narrativa,	depurando	as	relações	sociais	
presentes	no	contexto	pesquisado	é	possível	fazer	um	movimento	de	observação	
entre	escalas,	isto	é,	do	particular	ao	geral. 
(			)	O	 antropólogo	 Radcliffe-Brown	 foi	 a	 principal	 influência	 teórica	 da	 Escola	 de	
Manchester,	 seus	estudos	ensinam	como	os	antropólogos	devem	consolidar	sua	
visão	de	mundo	a	respeito	das	sociedades	estudadas,	seu	método	sugere	que	o	
pesquisador	em	campo	tome	seu	próprio	grupo	como	ponto	de	partida	para	avaliar	
e	 medir	 valores,	 hábitos	 e	 modelos	 de	 existências	 como	 se	 fossem	 superiores,	
melhores	ou	os	mais	corretos	a	serem	seguidos.
(			)	O	antropólogo	John	Barnes,	por	meio	do	conceito	de	redes	sociais,	explica	como	os	
indivíduos	podem	e	de	fato	participam	de	vários	grupos	sociais	ao	mesmo	tempo	
(família,	trabalho,	educação,	lazer).	Com	isso	evidencia	as	características	presentes	
em	 diferentes	 ligações	 que	 um	 mesmo	 indivíduo	 possui	 em	 relação	 a	 outros	
indivíduos	na	observação	dos	diferentes	grupos	que	ele	pertence.	Assim,	é	possível	
entender	quais	motivos	e	o	contexto	específico	nos	quais	o	indivíduo	age	de	uma	
forma	e	não	de	outra.
Assinale	a	alternativa	que	apresenta	a	sequência	CORRETA:
a)	 (			)	 V	–	F	–	F.
b)	 (			)	 V	–	F	–	V.
c)	 (			)	 F	–	V	–	F.
d)	 (			)	 F	–	F	–	V.
42
4	 Cientes	 do	 impacto	 das	 transformações	 pelas	 quais	 vivenciavam	 no	 cotidiano	 da	
própria	cidade	que	habitavam,	os	pesquisadores	da	Escola	de	Chicago	 investiram	no	
projeto	 de	pesquisa	 empírica	 que	os	 deslocava	para	 fora	 dos	gabinetes	 estimulando	
que	 fossem	 eles	 próprios	 em	 busca	 das	 singularidades,	 mudanças	 e	 problemas	
sociais	 que	 o	 fenômeno	 urbano	 evidenciava.	 Nesse	 sentido,	 era	 considerável	 a	
experimentação	 realizada	 em	termos	de	métodos	de	pesquisa	quando	 serviram-se	
fartamente	da	observação	participante	e	do	método	de	estudo	de	caso	para	cobrir	
um	grupo	heterogêneo	de	pesquisas	em	torno	da	cidade	de	Chicago.	Considerando	
a	 importância	das	pesquisas	de	Chicago,	 escolhas	pelo	menos	dois	de	 seus	autores	
e	disserte	 sobre	 suas	pesquisas	e	as	contribuições	para	o	estudo	da	cidade	e	do	
urbano.	
5	 A	história	da	Escola	de	Manchester	 é	 confundida	com	a	história	de	Max	Gluckman	
(1911-1975).	No	que	diz	respeito	ao	método	de	pesquisa	e	às	questões	administrativas	
e	 políticas	 que	 ardiam	na	 época	 de	 sua	 fundação.	 Gluckman	 foi	 um	proeminente	
antropólogo	 que	 entre	 os	 anos	 1941	 e	 1947	 esteve	 à	 frente	 do	 Instituto	 Rhodes-
Livingstone,	após	esse	período	é	admitido	comoprofessor	da	Universidade	de	Oxford	e	
foi	o	responsável	por	criar	o	Departamento	de	Antropologia	Social	na	Universidade	de	
Manchester.	Disserte	sobre	as	contribuições	científicas	de	Gluckman	a	partir	do	que	
ele	chamou	de	“análise	situacional”.
43
TÓPICO 3 — 
MOVIMENTOS SOCIAIS, SUBCULTURAS 
E IDENTIDADES URBANAS
UNIDADE 1
1 INTRODUÇÃO 
Aprendemos	 nos	 tópicos	 anteriores	 o	 contexto	 social	 no	 qual	 a	 Revolução	
Industrial	 e	 o	 intenso	 processo	 de	 modernização	 produziram	 impactos	 incontornáveis	
em	muitas	 regiões	do	mundo.	Fizemos	uma	 imersão	nas	contribuições	da	Escola	de	
Chicago	e	da	Escola	de	Manchester,	importantes	escolas	de	pensamento,	e	descobrimos	
como	ambas	vão	produzir	estudos	que	visem	demonstrar	como	o	espaço	social	vai	ser	
modificado	mediante	os	processos	de	construção	e	consolidação	do	mundo	urbano.	
Dado	 o	 caráter	 “desenvolvimentista”	 do	 capitalismo	moderno	 e	 os	 impactos	
sociais	a	partir	do	final	da	década	de	1960	no	Brasil,	experimentamos	uma	mudança	
no	 campo	de	 estudos	 e	 análise	 da	 cidade	 e	 do	 urbano.	Há	 uma	nítida	mudança	 de	
foco	na	análise	do	social,	mesmo	encontrando	um	conjunto	de	etnografias	do	mundo	
rural	 inspiradas	pela	Escola	de	Chicago,	ainda	nos	anos	 1940,	a	antropologia	passou	
a	 observar	 a	 diversidade	 e	 as	 transformações	 que	vinham	 acontecendo	 de	maneira	
intensa	nas	grandes	metrópoles	com	o	desenvolvimento	da	urbanização.	
É	notável	que	nessas	novas	relações	de	alteridade	também	estavam	presentes	uma	
certa	familiaridade	com	o	social,	com	os	indivíduos	e	mesmo	com	a	cidade	que	é	o	lócus	
de	observação,	mas	também	de	moradia	e	pertencimento	dos	próprios	antropólogos.	
Essa	proximidade	vai	colocar	algumas	questões	epistemológicas	em	perspectiva	para	o	
antropólogo	que	deseja	fazer	etnografia	na	cidade.	
Se	 a	 experiência	 de	 observação	 anterior	 reunia	 uma	 produção	 focada	 nas	
transformações	das	comunidades,	na	mudança	do	campo	para	a	cidade,	agora	é	possível	
observar	o	que	na	cidade	há	de	mudança,	quais	os	grupos	que	agora	fazem	parte	da	
construção	e	da	disputa	de	uma	cidade	urbana.	
Há	uma	intensa	mobilização	de	grupos	sociais	que	passam	a	constituir	o	lugar	
da	cidade,	negros,	 indígenas,	população	rural	que	migra	para	as	grandes	metrópoles,	
comunidades	 religiosas,	 grupos	 de	 diferentes	 sexualidades	 e	 gêneros,	 assim	 como	
as	chamadas	minorias	 sociais	 fazem	parte	desse	todo	urbano	que	está	presente	no	
cotidiano	das	grandes	cidades.	
A	antropologia	que	se	investe	da	tarefa	de	etnografar	e	conhecer	essas	diferenças	
tem	um	campo	fértil	de	estudos	que	passa	a	construir	uma	agenda	de	pesquisa	em	torno	
do	que	conhecemos	hoje	como	Antropologia	Urbana.	É	nessa	perspectiva	que	vamos	
abordar	o	surgimento	desse	campo	neste	tópico,	quando	aprenderemos	os	 indivíduos,	as	
coletividades	e	os	conflitos	que	fazem	parte	dos	estudos	de	antropologia	na	urbanidade.	
44
2 MOVIMENTOS SOCIAIS E SUBCULTURAS URBANAS 
Até	 aqui	 já	 deu	 para	 você,	 acadêmico,	 se	 aproximar	 e	 apreender	 conceitos,	
teorias	 e	 práticas	 antropológicas	 no	 mundo	 urbano.	 Neste	 tópico,	 caro	 acadêmico,	
vamos	conhecer	um	pouco	mais	dos	problemas	urbanos,	dos	conflitos,	das	mobilizações	e	
das	lutas	sociais	a	partir	da	análise	dos	movimentos	sociais.	
Parte	 importante	 do	 estudo	 antropológico	 do	 modo	 de	 vida	 urbano	 vem	 do	
interesse	de	pesquisadores	e	pesquisadoras	que	veem	os	inúmeros	grupos	sociais	que	
se	 desenvolvem	 e	 se	 organizam	 coletivamente	 a	 partir	 da	 cidade.	 Uma	 parte	 desses	
pesquisadores	lidam	com	a	categoria	cidade	como	um	lócus	de	observação	etnográfica,	
por	onde	antropólogos	podem	ver	a	diversidade	dos	modos	de	agrupamento,	manifestações	
sociais	e	ações	coletivas,	bem	como	registrar	a	alteridade	entre	os	sujeitos	que	se	agrupam	
e	lutam	pelo	direito	à	cidade,	à	moradia	e	aos	diferentes	modos	de	vida.		
Considerado	 um	 importante	 estudo	 que	 marca	 uma	 abordagem	 do	 urbano	
na	 antropologia	 brasileira	 é	 o	 texto	 “O	 urbanismo	 como	modo	de	vida”	 do	 sociólogo	
estadunidense	Louis	Wirth	(1979).	O	autor	é	considerado	um	dos	mais	notáveis	estudiosos	
do	 fenômeno	 urbano	 nos	 Estados	 Unidos	 e	muito	 influenciado	 Simmel.	Wirth	 elaborou	
sua	 interpretação	 do	 fenômeno	 urbano	 contribuindo	 para	 uma	 “teoria	 sociológica	 e	
sociopsicológica	do	urbanismo”	(VELHO,	1979,	p.	8).	
Para	esse	autor,	uma	característica	marcante	do	modo	de	vida	urbano	na	vida	
dos	 indivíduos	da	 idade	moderna	 é	 a	 alta	 concentração	 em	agregados	gigantescos,	
quando	 um	 maior	 número	 de	 indivíduos	 passa	 a	 viver	 em	 centros	 cada	 vez	 mais	
inchados	de	pessoas,	atividades	econômicas	e	instituições	da	modernidade,	em	torno	dos	
quais	“irradiam	as	ideias	e	as	práticas	que	chamamos	civilização”.	
Assim,	 Wirth	 (1979,	 p.	 90-92)	 define	 a	 importância	 de	 entender	 o	 urbano	 e	
conhecer	 a	 cidade,	 para	 ele	 “uma	 definição	 sociologicamente	 significativa	 do	 que	 seja	
cidade	 procura	 selecionar	 aqueles	 elementos	 do	 urbanismo	 que	marcam	 como	 um	
modo	distinto	de	vida	dos	agrupamentos	humanos”.	
Em	maior	ou	menor	escala	a	vida	social	no	meio	urbano	ainda	se	 relaciona	com	
práticas	e	sentidos	do	mundo	rural,	há	uma	influência	histórica	da	vida	rural	que	segue	com	
o	indivíduo	que	foi	morar	na	cidade	urbana.	Dessa	forma,	Wirth	nos	estimula	a	perceber	que	
estamos	conectados	por	práticas	sociais	herdadas	de	uma	vida	anterior	que	não	desaparece,	
mas	se	ajusta,	se	modifica	e	produz	algo	entre	esses	dois	mundos	em	interação.	
Sobre	 esse	 modo	 de	 vida	 urbano,	 Wirth	 (1979)	 destaca	 os	 desenvolvimentos	
tecnológicos	 no	 transporte	 e	 no	 sistema	 de	 comunicação	 como	 marcas	 concretas	
dessa	nova	época	na	história	humana	que	estende	sua	atuação	para	além	do	contorno	
geográfico	da	cidade,	 levando	suas	práticas	e	valores	para	o	ambiente	rural.	Destaca	
ainda	a	presença	de	uma	enorme	concentração	de	 instalações	e	atividades	relativas	
à	 indústria,	assim	como	atividades	comerciais,	econômicas,	administrativas,	políticas,	
45
sem	 esquecer	 dos	 equipamentos	 culturais	 e	 de	 lazer	 como	 imprensa,	 estações	 de	
rádio,	 teatros,	 bibliotecas,	museus,	 salas	 de	 concerto,	 óperas,	 hospitais,	 instituições	
educacionais	de	nível	superior,	como	faculdades	e	universidades,	centros	e	institutos	
de	 pesquisa,	 organizações	 profissionais,	 instituições	 religiosas	 e	 filantrópicas,	 grupos	
recreativos,	dentre	outros	presentes	nesse	aglomerado	urbano.	
É	 notável	 que	 as	 descrições	 realizadas	 por	 esses	 autores	 mobilizam	 uma	
perspectiva	mais	negativa	acerca	da	vida	urbana,	reconhecendo	sempre	os	aspectos	da	
falta	ou	da	dificuldade	que	estão	presentes	na	rotina	de	uma	grande	metrópole	urbana.	
Ao	reconhecer	o	significado	social	desses	aspectos	Simmel	(1979)	e	Wirth	(1979)	
nos	possibilitam	um	exercício	comparativo	com	as	práticas	e	o	modo	de	vida	rural,	ambos	
consideram	 importante	 o	 registro	 dessas	 novas	 práticas	 de	 sociabilidade	 que	 serão	
encontradas	no	meio	urbano,	mas	apontam	para	a	baixa	dos	vínculos	sociais	primários,	
que	na	vida	urbana	tendem	a	ser	substituídos	por	vínculos	sociais	secundários.	
Ora,	com	muitos	habitantes	e	a	densidade	demográfica	elevada	as	relações	sociais	
de	vizinhança,	amizade	e	parentesco	na	cidade	tendem	a	perder	elo.	Isto	acontece	em	face	
da	própria	modificação	das	 relações	 sociais	marcadas	pelas	mudanças	quanto	ao	 tempo	
disponível	para	convivência	com	familiares	ou	estar	por	estar	com	amigos	e	namorados,	
assim	como	o	tempo	disponível	para	passeios	e	atividades	de	lazer	sempre	muito	reduzidos	
em	face	das	extensas	jornadas	de	trabalho,	pelo	menos	nas	classes	populares.	
Na	cidade	os	contatos	pessoais	podem	ser	face	a	face,	mas	também	reduzidos,	
impessoais,	superficiais,	transitórios	e	fragmentários,	 lembrando	aqui	aspectos	citados	por	
Simmel,	a	“reserva”,	a	“indiferença”	e	o	“ar	blasé”	são	características	que	os	habitantes	do	
meio	urbano	tendem	a	manifestar	em	suas	relações	sociais(WIRTH,	1979,	p.	101).	
Além	 disso,	 o	 caráter	 transitório	 das	 relações	 urbano-sociais	 pode	 explicar	
outros	 signos	 importantes	 da	 vida	 urbana	 como	 a	 “sofisticação”	 e	 a	 “racionalidade”,	
elementos	que,	em	geral,	são	utilizados	para	caracterizar	positivamente	uma	pessoa	ou	
grupo	social	pertencente	ao	meio	urbano.	
É	fato	que	no	meio	urbano	nosso	contato	físico	é	mais	estreito,	os	edifícios	com	
aglomerados	de	apartamentos	reúnem	um	grande	contingente	de	pessoas	no	mesmo	
perímetro,	mas	 isso	não	significa	contatos	sociais	mais	 íntimos,	pelo	contrário,	notamos	
uma	vida	cada	vez	mais	distante	de	uma	relação	com	a	vizinhança.	
Podemos	nos	ver	todos	os	dias,	dividir	o	elevador	na	mesma	hora	ou	pegar	o	
mesmo	 ônibus	 para	 ir	 ao	 trabalho,	 no	 entanto,	 esse	 alto	 reconhecimento	 facial	 que	
opera	 no	 cotidiano	 da	vida	 urbana	 não	 é	 convertido	 em	 uma	 experiência	 autêntica	 de	
reconhecimento	 ou	 amizade.	A	 partir	 disso	 é	 possível	 que	 tenhamos	 cada	vez	mais	
afinidade	com	signos	que	estão	presentes	em	nosso	cotidiano	do	que	com	as	pessoas	
que	cruzam	nosso	caminho.	É	nesse	ponto	que	as	subculturas,	os	movimentos	sociais	e	
as	identidades	urbanas	ganham	nosso	interesse.	
46
A	 urbanização	 do	 mundo	 é	 um	 evento	 notável	 da	 vida	 moderna,	 insere	
um	 conjunto	 de	 modificações	 profundas	 em	 diferentes	 esferas	 da	 vida	 social,	 por	
exemplo,	 família,	 educação,	 trabalho,	 lazer,	moradia,	 educação,	 consumo,	 transporte,	
comunicação.	No	entanto,	não	podemos	deixar	de	lembrar	que	esse	processo	aconteceu	
de	forma	muito	 intensa	e	desordenada	e	foi	 responsável	pelo	aumento	dos	problemas	
urbanos	do	contexto	presente.	
O	 urbanismo	 como	modo	 de	 vida	 revela	 uma	 tendência	 a	 adquirirmos	 uma	
sensibilidade	 ao	 universo	 dos	 artefatos	 e	 com	 isso	 progressivamente	 vamos	 nos	
distanciando	das	pessoas,	acumulando	mais	objetos	e	produtos	fabricados	pela	indústria	
capitalista	 que	 tem	 sempre	 algo	 novo	 para	 nos	 satisfazer.	Assim,	 relacionando	 aspectos	
desse	período	de	formação	do	mundo	urbano	e	do	contexto	social	atual	não	podemos	
perder	de	vista	que	as	modificações	no	urbano	transformaram	para	o	bem	ou	para	o	mal	
não	só	o	espaço	físico,	as	cidades	urbanas,	como	também	a	maneira	de	nos	relacionar	
entre	si	e	estabelecer	vínculos	sociais	e	construir	a	nossa	identidade.	
A	heterogeneidade	de	grupos	e	pessoas	na	vida	urbana	permite	que	possamos	
nos	relacionar	com	maior	mobilidade,	mas	também	com	maior	instabilidade	e	insegurança	
em	nossas	relações	sociais,	embora,	de	fato	possamos	participar	de	vários	grupos,	tribos	
urbanas	ou	associações	que	podem	nutrir	 experiências	de	pertencimento	diferentes	 isso	
tende	a	deslocar	os	indivíduos	para	relações	cada	vez	mais	impessoais	e	distantes.	Esta	
seria	uma	forma	de	perceber	o	urbanismo	como	modo	de	vida	com	Louis	Wirth.	Mas	há	
outras.	Vejamos.	
A	 presença	 massificada	 de	 pessoas	 na	 cidade	 também	 poderá	 favorecer	 a	
formação	de	agrupamentos	do	espaço	urbano	e	a	 investigação	antropológica	permite	
compreender	 as	 diferentes	 formas	 de	 expressão,	 pertencimento	 e	 identidades	 que	
compõem	essa	cidade.	Michel	de	Certeau	(1994)	chamou	a	esse	tipo	social	de	“cidade	
praticada”,	uma	maneira	de	olhar	para	os	sujeitos	que	vivenciam	e	percebem	a	cidade	
ao	seu	modo.	
Considerando	essa	vastidão	de	possibilidades	e	formação	de	novas	identidades	no	
meio	urbano,	a	antropóloga	Andressa	Morais	 (2012)	 realizou	uma	etnografia	com	um	
grupo	social	urbano	chamado	“okupas”,	escrito	com	“k”	por	se	tratar	de	uma	identidade	
associada	com	a	filosofia	anarquista	que	protesta	contra	o	sistema	capitalista,	pois	este	
produz	intensa	verticalização	e	urbanização	em	que	sujeitos	sociais	de	classe	populares	
são	empurrados	para	as	franjas	da	cidade	e	 lhes	são	negados	sua	 identidade	política	e	
cultural.	Dialogando	com	Certeau	 (1994,	p.	 174)	a	cidade-conceito	é	pensada	como	“um	
lugar	de	transformações,	objetos	de	intervenções,	mas	sujeito	sem	cessar	enriquecido	
com	novos	atributos:	ela	é	ao	mesmo	tempo	maquinaria	e	o	herói	da	modernidade”.	
Para	Morais	Lima	(2012,	p.	40)	a	cidade	a	partir	dos	seus	interlocutores	okupas	
“não	deve	ser	lida	apenas	como	um	lugar	estratégico	para	uma	ação	contínua	da	economia	
capitalista,	 uma	 ação	 orientada	 pelos	 interesses	 dos	 especuladores	 imobiliários	 e	 dos	
investidores	da	construção	civil”.	Nesse	sentido,	o	movimento	social	urbano	conhecido	
47
como	 “okupa”	 aborda	 a	 cidade	 de	 uma	 outra	 perspectiva,	 aquela	 na	 qual	 é	 possível	
encontrar	 modos	 de	 viver	 que	 sejam	 diferentes.	 Para	 os	 “okupas”	 interlocutores	 da	
pesquisa	de	Morais	Lima	(2012)	a	cidade	é	um	palco	de	disputas	pelo	direito	de	morar,	
viver	e	cultivar	práticas	e	formas	de	vida	que	sejam	diferentes.	Assim,	 “ocupar”	seria	
uma	forma	de	praticar	a	cidade,	uma	reinvenção	do	social,	do	urbano	e	dos	sujeitos	que	
nela	vivem.	Há	entre	os	diferentes	grupos	okupas	práticas	de	lazer,	solidariedade	e	cultivo	
de	formação	política	orientadas	pela	filosofia	anarquista	e	 libertária,	mas	a	cada	casa	
“ocupada”	há	um	conjunto	de	sujeitos	que	são	diferentes,	que	procuram	 intervir	no	meio	
urbano	para	afirmar	um	protesto	contra	o	capitalismo	que	gentrifica	(isola)	e	aumenta	a	
camada	de	despossuídos	na	vida	urbana.	
O	movimento	okupa	surgiu	na	Londres	da	década	de	1960	para	contestar	um	
modo	 de	 vida	 urbano	 que	 priorizava	 o	 desenvolvimento	 via	 intensa	 industrialização	
(processo	 aqui	 já	 apresentado	 a	 partir	 das	 contribuições	 de	 Simmel	 e	 Wirth).	 Os	
movimentos	sociais	de	 juventude	diante	de	um	cenário	de	vida	urbana	 intensa	e	sem	
possibilidade	de	respeito	à	diversidade	dos	modos	de	ser,	bem	como	pela	falta	de	espaço	
para	moradia	e	boas	condições	de	trabalho	passam	a	ocupar	espaços	vazios	que	servem	
para	especulação	imobiliária	a	fim	de	transformá-los	em	espaços	culturais,	comunidades	
de	pessoas	que	lutam	pelo	direito	de	um	modo	de	vida	libertário.
	Naquela	época	de	surgimento	do	movimento	okupa	o	foco	das	ocupações	eram	
as	 antigas	 fábricas	 que	 fechavam	decretando	 falência	 ou	 que	 tiveram	 algum	 acidente	 e	
produziu	um	vazio	urbano,	 isto	é,	o	prédio	ficava	exposto	ao	abandono	e	permanecia	
na	paisagem	da	cidade	apenas	nutrindo	o	valor	acumulativo	do	terreno,	o	proprietário	
sequer	fazia	manutenção	para	garantir	a	limpeza	e	prevenir	acidentes.	
Figura 5 – Símbolo e bandeira Okupa
Fonte: https://bit.ly/3J6w2FG. Acesso em: 21 jul. 2022.
48
Dadas	as	especificidades	históricas	e	contextuais,	no	Brasil,	há	também	esse	
perfil	de	ocupação	urbana	em	que	os	okupas	fazem	sua	 intervenção	em	lugares	que	
possuem	dívidas	 com	o	 poder	 público	 ou	 com	os	 trabalhadores	 que	 empregavam	e	
deixaram	 sem	 restituição	 trabalhista.	 Esse	 é	 um	 vínculo	 que	 cruza	 uma	 identidade	
política	 com	 uma	 identidade	 estética,	 valorização	 de	 uma	 vida	 cultural	 diferente,	
considerando	que	o	perfil	 dos	 okupas	 são	de	 jovens	 anarquistas	 e	 punks,	 nos	quais	
a	maioria	 se	veste	 de	 preto,	 com	 signos	 de	 uma	 cultura	 punk,	 tatuagens,	 piercings,	
coturnos,	 moicanos,	 dentre	 outras	 características	 temos	 um	 bom	 exemplo	 de	 uma	
identidade	urbana.		
No	 Brasil	 esse	 movimento	 chegou	 primeiro	 no	 sul,	 devido	 ao	 contato	 com	
outros	 jovens	 libertários	 que	 se	 comunicavam	 e	 pertenciam	 a	 grupos	 de	 música	
anarcopunks	e	compartilhavam	experiencias	coletivas	de	ocupar	esses	espaços	para	
realizar	manifestações	culturais	como	shows	de	garagem,	exposições	de	arte,	saraus	
poéticos	e	transformar	espaços	ociosos	em	“zonas	livres	autônomas”,	plantando	hortas,	
fazendo	compostagem,	adotando	uma	dieta	alimentar	vegana	e	praticando	diferentes	
maneiras	de	habitar	a	vida	no	meio	urbano.	
Se	por	um	lado,	podemos	identificar	as	diferentes	transformações	na	paisagem	
urbana	 com	 a	 presença	 cada	vez	mais	 intensa	 de	 prédios	 e	 edifícios	verticalizados,	
por	outro	também	é	possível	identificarmos	o	vazio	urbano,	a	degradação,esqueletos	
arquitetônicos	que	ficam	espalhados	em	zonas	centrais	e	em	bairros	considerados	de	
elite.	Esses	vazios	são	agentes	de	um	tipo	de	prática	capitalista	chamada	especulação	
imobiliária,	 quando	 os	 proprietários	 não	 reparam	 ou	 fazem	 a	 manutenção	 daquele	
espaço	e	deixam	acumular	 lixo,	 insetos	 e	dívidas	 com	o	poder	público,	 esperando	o	
bairro	e	o	entorno	se	desenvolver	e	aumentar	o	valor	do	metro	quadrado	para	vender	o	
terreno	e	investir	em	um	poder	de	mercado	imobiliário.	
Os	okupas	contestam	a	prática	da	especulação	imobiliária	por	duas	vias,	a	saber,	
primeiro	por	questionar	o	abandono	e	a	função	social	da	propriedade	privada	que	gera	
para	a	população	maior	insegurança	e	prejuízos	quanto	ao	valor	de	habitação	nas	zonas	
centrais	da	cidade,	onde	a	maior	parte	da	população	trabalha,	empurrando	essas	pessoas	
para	uma	habitação	precária	e	longe	dos	centros	urbanos,	gerando	maior	dependência	de	
transportes	coletivos	e	ampliando	a	vulnerabilidade	desses	sujeitos	ao	mercado	privado.	
Por	outro	 lado,	 sua	herança	cultura	está	vinculada	com	um	tipo	de	subcultura	 jovem,	
urbana,	marginalizada	que	promove	uma	intervenção	também	na	esfera	cultural,	tem	um	
estilo	de	vida	minimalista,	produzem	um	tipo	de	música	de	protesto,	adotam	a	perspectiva	
de	 uma	 vida	 livre	 de	 violência,	 por	 isso	 são	 associados	 ao	 veganismo,	 isto	 é,	 não	 se	
alimentar	de	nada	que	provoque	violência,	dentre	outras	características	que	podem	ser	
bem	visualizadas	na	etnografia	intitulada	“Okupar,	resistir	e	insistir:	etnografia	das	práticas	
de	ocupação	urbana	em	Fortaleza-CE”	(MORAIS	LIMA,	2012).	
49
Acadêmico, quer saber mais desse 
tipo de movimento ou conhecer outras 
referências sobre o tema? Fique de olho 
nessa dica de série argentina da Netflix 
chamada Okupas. Foi uma série muito 
popular na Argentina que ganhou quatro 
prêmios Martín Fierro (Emmy argentino), 
incluindo o de melhor minissérie.
DICA
Fonte: http://twixar.me/DmMm. 
Acesso em: 21 jul. 2022.
Esse	tipo	social	de	movimento	se	caracteriza	sobretudo	pela	prática	autônoma,	
libertária,	que	reivindica	um	modo	de	ser	diferente,	que	valoriza	a	autonomia,	construir	
espaços	 com	 pessoas	 que	 nutrem	 afinidades	 políticas,	 afetivas	 e	 sociais.	 De	 certa	
forma,	ao	insistir	na	construção	de	um	espaço	libertário	do	meio	de	um	espaço	investido	
de	interesses	econômicos	do	capitalismo	financeiros,	entendemos	que	há	uma	alógica	
distinta	que	nega	um	único	modo	de	viver	no	urbano	e	tenta	imprimir	uma	existência	
diferente,	politizando	essa	ocupação	urbana	e	navegando	socialmente	construindo	uma	
boa	relação	com	a	vizinhança.	Morais	Lima	demonstra	em	sua	etnografia	que	os	vizinhos	
dessa	okupa	se	relacionavam	bem	com	os	moradores	da	casa,	ajudavam	com	doações	
de	água,	 roupas	e	comida.	Também	quando	entrevistados	 revelavam	que	a	chegada	
no	grupo	no	local	mudou	a	paisagem	urbana,	pois	a	presença	de	usuários	de	drogas	e	
praticantes	de	furtos	e	roubos	da	vizinhança	que	utilizam	esse	prédio	abandonado	assim	
como	o	acúmulo	de	lixo	e	insetos	gerava	desconforto	e	insegurança	para	os	moradores	que	
diante	de	um	grupo	diferente,	com	uma	identidade	bem-marcada,	mesmo	produzindo	
estranhamentos	com	o	passar	do	tempo,	gerava	uma	nova	sociabilidade.	
As	chamadas	subculturas	urbanas	ou	tribos	urbanas	são	grupos	de	pessoas	que	
compartilham	gostos,	valores,	códigos,	práticas	e	uma	estilo	de	vida	semelhantes	e	que	
estão	reunidas	na	metrópole.	O	conceito	“tribo	urbana”	foi	criado	pelo	sociólogo	francês	
Michel	Maffesoli	em	1985,	o	livro	“Le temps des tribus: le déclin de l'individualisme dans les 
sociétés postmodernes”	 publicado	 em	 1988,	 apontou	para	 a	 criação	de	uma	nova	 forma	
de	agrupamento	social	na	sociedade	moderna,	na	qual	a	necessidade	de	um	grupo	era	
definida	por	estar	em	um	estrato	de	geração	particular	e	criaram	formas	de	convivência	
e	interesse	comum	constituindo	um	conjunto	de	valores,	práticas	e	ajuntamento	coletivo	
para	a	formação	de	uma	identidade	própria.	Trata-se	de	um	fenômeno	urbano	que	com	o	
desenvolvimento	das	grandes	metrópoles	acompanhou	a	dinâmica	dos	grandes	centros	e	
se	multiplicam	continuamente	em	microgrupos,	que	diante	de	um	 intenso	processo	de	
massificação	ancoradas	no	hiperindividualismo	e	homogeneidade	para	o	sujeito	urbano,	
optam	 por	 contestar	 e	 inserir	 novos	 elementos	 para	 a	 formação	 de	 uma	 identidade	
50
heterogênea.	 Assim,	 cada	 “subcultura	 social	 urbana”	 possui	 uma	 estrutura	 interna	
particular	 que	 pode	 definir	 hábitos	 alimentares,	 condutas	 políticas,	 pensamos	 filosóficos,	
vocabulário	 e	 linguagem	 próprias	 (gírias),	 gosto	 musical	 compartilhado,	 engajamento	
político,	religião,	maneiras	de	vestir	ou	andar,	dentre	outros	fatores.	
O	 fato	 é	 que	 esse	 subgrupo	 urbano	 surgiu	 junto	 com	 a	 formação	 dos	 centros	
urbanos,	 muitos	 nascem	 como	 movimentos	 de	 contracultura,	 como	 os	 punks	 ou	
hippies,	mas	há	uma	diversidade	desses	grupos	no	meio	urbano	e	eles	organizam	um	
modo	de	vida	diferente	da	maioria	do	que	é	compartilhado	socialmente,	assim	como	
criticam	a	política	e	economia	que	sustentam	o	sistema	capitalista.	As	tribos	urbanas	
são	fenômenos	sociais	comuns	a	contextos	urbanos	distintos.	
No	 Brasil,	 o	 antropólogo	 paranaense	 Guilherme	 Magnani	 (1992)	 foi	 um	 dos	
autores	que	partiu	dessa	linha	analítica	construída	pelo	francês	Michel	Maffesoli	e	em	
uma	perspectiva	antropológica	criticou	o	uso	do	conceito	de	 “tribo	urbana”,	gerando	
grande	 produção	 etnográfica	 e	 interesse	 por	 parte	 de	 pesquisadores	 brasileiros	
interessados	 em	 questionar	 o	 uso	 dessa	 categoria	 para	 compreender	 as	 dinâmicas	 do	
meio	urbano,	para	Magnani	(1992,	p.	50),	o	uso	do	termo	estaria	associado	"primitivo,	
selvagem,	 natural,	 comunitário"	 e	 empobreceria	 a	 visão	 da	 diversidade	 de	 grupos	 e	
identidades	da	metrópole.	
Um	dos	clássicos	textos	de	José	Guilherme	Cantor	Magnani	é	o	 “Antropologia	
urbana	e	os	desafios	na	metrópole”	em	que	o	autor	trata	da	aplicação	da	antropologia	
para	o	entendimento	do	fenômeno	urbano,	adotando	como	ponto	de	partida	as	dinâmicas	
culturais	 e	 as	 diferentes	 formas	 de	 sociabilidades	 encontradas	 na	 grande	metrópole.	
Parte	 da	 crítica	 que	 Magnani	 apresenta	 ao	 conceito	 de	 “tribos	 urbanas”	 vem	 a	 ser	
melhor	desenvolvido	nesse	texto,	quando	o	autor	vai	abordar	a	noção	de	 “escala”	que	
tende	a	 reproduzir	um	padrão	de	 investigação	antropológica	na	metrópole	como	aqueles	
desenvolvidos	nas	clássicas	etnografias	realizadas	em	comunidades	e	sociedades	pré-
industriais,	 assim	 a	 dimensão	 da	 “aldeia”,	 da	 “comunidade”	 e	 do	 “pequeno	 grupo”	 são	
termos	que	se	apresentam	como	um	desafio	para	o	entendimento	do	contexto	urbano,	pois	
teriam	de	ser	contextualizados	e	problematizados	em	relação	ao	modo	de	vida	urbano.	
Além	 disso,	 outra	 importante	 característica	 apresentada	 pelo	 autor	 sugere	
ferramentas	metodológicas	que	permitam	ao	antropólogo	estabelecer	o	que	pretende	
analisar	a	partir	de	um	“ponto	de	vista”	que	pode	ser	de	longe	e	fora	(macro),	o	pesquisador	
externo	 indo	observar	uma	comunidade	diferente	da	sua	e	de	um	ponto	de	vista	de	
perto	e	de	dentro	(micro),	quando	o	pesquisador	parte	para	a	observação	da	sua	própria	
comunidade	de	pertencimento,	seu	grupo	social.	Magnani	(1992)	chama	a	atenção	para	
a	grande	produção	e	 interesse	da	antropologia	pelo	estudo	de	sociedades	“primitivas”,	
com	isso	considera	que	uma	investigação	do	meio	urbano	e	as	transformações	sociais	
que	nele	acontecem	devem	receber	 igual	atenção	e	 interesse	dos	antropólogos,	pois	
a	vida	está	aberta	à	observação	e	ao	estudo,	os	problemas	e	a	 riqueza	cultural	está	
também	presente	no	meio	urbano.	
51
A	 produção	 desse	 autor	 foi	 responsável	 por	 fornecer	 um	 grupo	 diversificado	 de	
categorias	de	análise	da	antropologia	urbana,	só	para	termos	uma	ideia,	algumas	delas	
são:	 pedaço,	 trajeto,	 circuito,	mancha,	pórtico.	Todas	essas	categorias	de	análise	 fazem	
parte	 deum	vocabulário	 dos	 interlocutores	 de	 pesquisa	 do	 antropólogo,	 quando	 ao	
observar	e	interagir	com	esses	sujeitos	apreendeu	os	sentidos	e	as	palavras	que	eles	
utilizam	para	falar	de	sua	experiência	de	habitar	a	metrópole	urbana.	
Vamos	agora	conhecer	um	pouco	melhor	a	formação	e	construção	das	identidades	
urbanas,	 como	 a	 antropologia	 pode	 auxiliar	 a	 ver	 as	 diferenças	 e	 compreender	 que	
estamos	todos	habitando	um	mundo	em	que	a	alteridade	é	uma	condição	da	existência	
humana.	Neste	tópico,	já	nos	aproximamos	um	pouco	dessa	discussão	a	partir	do	caso	
dos	Okupas,	teremos	pela	frente	novos	atores.	
3 IDENTIDADES URBANAS 
Caro	acadêmico,	o	estudo	do	urbano	pela	antropologia	se	dá	em	face	de	um	
contexto	de	época	quando	muitos	antropólogos	percebem	que	as	mudanças	provocadas	
pela	 industrialização	 e	 urbanização	 eram	 inevitáveis	 e	 que	 as	 transformações	 estavam	
acontecendo	diante	de	si	mesmos,	como	sujeitos	que	vivenciavam	o	urbano,	a	cidade	
e	 suas	 mudanças.	 Uma	 primeira	 movimentação	 vem	 desse	 interesse	 por	 parte	 de	
pesquisadores	 das	 ciências	 sociais	 em	 observação	 da	 cidade,	 investigar	 e	 analisar	 as	
mudanças	em	curso	na	sua	própria	sociedade.	
Um	dos	primeiros	livros	que	ainda	permanece	uma	importante	referência	no	campo	
da	Antropologia	Urbana	 é	 “O	 fenômeno	urbano”,	 organizado	pelo	 antropólogo	Otávio	
Velho,	e	publicado	originalmente	em	1967.	O	livro	é	uma	coletânea	de	textos	assinados	por	
pesquisadores	da	Escola	de	Chicago	e	que	foram	traduzidos	para	o	português.	Diversos	
pesquisadores	incorporam	as	suas	análises	a	respeito	da	cidade	e	do	urbano,	aquilo	que	
vem	a	ser	o	conteúdo	dessa	coletânea.	As	mudanças	e	os	problemas	enfrentados	pelas	
grandes	cidades	em	contínua	 transformação	 são	 reunidos	em	temas	amplos	que	eram	
encontrados	nas	grandes	metrópoles,	como	a	criminalidade,	as	subculturas	juvenis,	as	
migrações	do	rural	para	o	urbano,	a	formação	e	inchaço	das	favelas,	assim	como	outros	
assuntos	como	o	desemprego,	as	culturas	dissidentes,	a	falta	de	moradia,	estavam	no	
centro	de	problemas	sociais	da	cidade	urbana	em	desenvolvimento.	
A	década	de	1970	é	um	marco	na	consolidação	da	subárea	Antropologia	Urbana	
no	campo	disciplinar	da	antropologia	brasileira.	O	estudo	cada	vez	mais	crescente	das	
populações	 urbanas	 despertaram	 interesse	 de	muitos	 pesquisadores	 e	 o	 campo	 de	
estudos	só	fez	crescer	diante	de	um	contexto	político,	econômico,	cultural	e	acadêmico	
que	 marcou	 o	 país	 naquele	 momento.	 Contexto	 de	 intensa	 efervescência	 política	
e	 cultural	 em	 vista	 da	 repressão	 e	 perseguição	 trazidas	 pelos	 chamados	 “anos	 de	
chumbo”	 da	ditadura	militar.	Os	 conflitos	 sociais	 estavam	em	evidência,	 a	 repressão	
política	 acompanhava	 o	 crescimento	 urbano,	 a	 pobreza	 e	 a	 marginalização	 de	 grupos	
sociais	vulnerabilizados.	As	ciências	sociais	tinham	muito	a	 investir	em	suas	análises	
52
de	um	período	 de	 tamanho	 registro	 de	mudanças.	Não	 por	 acaso,	muitos	 cientistas	
sociais	passaram	a	se	engajar	mais	politicamente	em	face	da	intensa	repressão	contra	
pesquisas	que	falavam	dos	problemas	sociais	que	o	Brasil	 enfrentava,	 assim	como	dos	
grupos	sociais	que	viviam	a	experiência	de	exclusão	tanto	econômica	quanto	social.	
Cabra Marcado Para Morrer – Filme de Eduardo 
Coutinho
Em 1962, o líder da liga camponesa de Sapé (PB), João 
Pedro Teixeira, é assassinado por ordem de latifundiários. 
Um filme sobre sua vida começa a ser rodado em 1964, 
com a reconstituição ficcional da ação política que levou 
ao assassinato e direção de Eduardo Coutinho. As 
filmagens são interrompidas pelo Golpe Militar de 1964. 
Dezessete anos depois, em 1981, Eduardo Coutinho 
retoma o projeto e procura Elizabeth Teixeira e outros 
participantes do filme interrompido.
DICA
Data de lançamento: 3 de dezembro de 1984 (Brasil).
Diretor: Eduardo Coutinho.
Roteiro: Eduardo Coutinho.
Produtora: Mapa Filmes do Brasil.
Produção: Eduardo Coutinho, Zelito Viana.
Disponível em: https://youtu.be/VxzgLPyLIf4. 
Fonte: https://bit.ly/3cKrXe4. Acesso em: 26 jul. 2022.
Assim,	o	estudo	aprofundado	da	cidade	permitiria	ao	antropólogo	a	investigação	
desse	sujeito	social	habitante	da	cidade	urbana	e	que	estava	inserido	nesse	contexto	
social.	Enquanto	para	a	sociologia	e	a	ciência	política	a	dimensão	privilegiada	de	análise	
estava	 concentrada	 na	 divisão	 social	 do	 trabalho,	 na	 estrutura	 de	 classes,	 para	 os	
antropólogos	o	 interesse	agora	se	projetava	nos	sujeitos	que	habitam	e	dão	sentido	
a	essa	experiência	de	viver	e	disputar	a	cidade,	o	urbano,	nas	condições	adversas	que	
marcavam	a	época.	
Nesse	sentido,	o	estudo	aprofundado	e	em	longa	duração,	próprio	da	investigação	
antropológica	 procurava	 conhecer	 os	 grupos	 urbanos,	 assim	 como	 compreender	 a	
maneira	 como	 estavam	 organizados,	 como	 davam	 sentido	 às	 manifestações	 que	
realizavam,	 como	 classificam	 e	 constroem	 sua	 organização	 e	 mobilização	 no	 meio	
urbano.	A	etnografia	se	mostrava	uma	ferramenta	metodológica	de	grande	relevância	
para	apreender	essas	diferentes	nuances,	pois,	ao	mesmo	tempo,	a	partir	do	método	
etnográfico,	é	possível	conhecer	o	contexto	social	e	a	realidade	do	sujeito	em	interação,	
https://youtu.be/VxzgLPyLIf4
https://bit.ly/3cKrXe4
53
condição	 de	 pesquisa	 própria	 da	 observação participante	 (MALINOWSKI,	 1978).	
Considerando	essa	perspectiva	também	podemos	defender	que	a	etnografia	permite	
ao	pesquisador	visibilizar	e	valorizar	as	experiências	de	grupos	sociais	vulnerabilizados	
pela	desigualdade.		
Parte	significativa	do	crescimento	desses	estudos	está	associada	à	ampliação	
do	 espaço	 acadêmico	 universitário	 com	 a	 pós-graduação	 em	 antropologia.	 Assim,	
programas	de	pós-graduação	vinculados	às	universidades	como	Universidade	Federal	
do	Rio	de	Janeiro	(Museu	Nacional)	e	a	Universidade	de	São	Paulo	estavam	fortemente	
empenhados	no	estudo	dessas	dinâmicas	do	urbano.	No	caso,	alguns	temas	tornaram-
se	 presentes	 entre	 os	 pesquisadores	 vinculados	 a	 esses	 programas,	 por	 exemplo,	
o	desvio	e	o	comportamento	social,	moradias	e	unidades	habitacionais,	 região	moral	
e	estudo	de	favelas	e	comunidades,	práticas	 festivas	e	de	 lazer,	 estudos	de	escolas	
de	 samba	 e	manifestações	 culturais,	 assim	 como	 o	 estudo	 de	movimentos	 sociais,	
associações	e	ações	coletivas,	gênero,	sexualidade,	questões	raciais,	relações	sociais	e	
famílias	no	meio	urbano,	migrações	e	religiões.	
A	Antropologia	Urbana	aos	poucos	foi	consolidando	um	subcampo	de	estudos	
que	 passou	 a	 receber	 cada	 vez	mais	 reconhecimento	 e	 prestígio	 da	 esfera	 pública	
pelo	trabalho	de	pesquisa	 realizado	com	os	sujeitos	sociais	do	contexto	pesquisado,	
assim	não	só	as	 instituições	se	 interessavam	pelo	conteúdo	dessas	pesquisas	como	
os	 próprios	 entrevistados	 (interlocutores	 da	 pesquisa)	 passaram	 a	 se	 interessar	 pelos	
estudos	 e	 o	 trabalho	 desenvolvido	 com	eles,	 seus	 grupos	 e	 suas	 comunidades.	 Um	
tipo	de	vínculo	e	reconhecimento	do	trabalho	científico	passou	a	dar	outro	olhar	para	o	
urbano	para	o	modo	de	fazer	pesquisa	e	antropologia	no	modo	de	vida	urbano.	
A	Antropologia	Urbana	aparece	muitas	vezes	como	um	contraponto	dos	estudos	
clássicos	da	disciplina,	 em	que	o	objeto	de	 investigação	e	análise	antropológica	eram	
as	 sociedades	 isoladas,	 tradicionais	 ou	 de	 pouco	 contato	 com	 as	 características	 de	
uma	modernidade	em	intenso	desenvolvimento	(MARCUS,	1991).	No	entanto,	no	Brasil,	
especialmente,	 após	 esse	 processo	 de	 intensa	 investigação	 e	 estudos	 das	 populações	
urbanas	a	própria	Antropologia	Urbana	se	consolidou	como	a	área	que	cobre	os	estudos	
dos	grupos	urbanos,	sua	complexidade	e	as	sociedade	modernas.	
Os	 sujeitos,	 identidades	 e	 agrupamentos	 são	 cada	 vez	 mais	 diferentes	 e	
ocupam	o	mesmo	espaço	 social	 na	 cidade	urbana,	 soma-se	 a	 este	 fato	 o	 processo	
de	globalização	que	envolve	uma	 intensa	e	vasta	 rede	de	 relações	 sociais,	 políticas,	
econômicasque	ensejam	as	relações	no	mundo	urbano.	
A	globalização	da	qual	fala	Ulf	Hannerz	(1999)	dá	outros	contornos	às	relações	
sociais,	 agora	 marcadas	 por	 uma	 intensa	 interconectividade	 entre	 indivíduos,	 mas	
também	 uma	 efervescente	 mistura	 de	 relações	 sociais	 entre	 grupos	 e	 identidades	
diversas.	As	formas	de	comunicação	e	 linguagem	tornam-se	globalizadas,	a	diversidade	
social	 ganha	 precedência	 nas	 grandes	 metrópoles	 que	 se	 tornam	 cada	 vez	 mais	
cosmopolitas	produzindo	novas	dinâmicas	culturais.	
54
O	sujeito	urbano	é	heterogêneo,	passa	a	constituir	 sua	 identidade	marcada	por	
diferentes	 pertencimentos	 sociais.	 Sua	 identidade	 pode	 se	 associar	 por	 afinidades	 com	
relação	ao	pertencimento	 local,	 isto	é,	morar	no	mesmo	bairro	ou	condomínio,	por	um	
identificação	com	 relação	a	um	gosto	musical,	 samba	ou	punk	 rock,	 assim	como	ao	
estabelecer	vínculos	religiosos,	ser	candomblecista	ou	católico,	ter	um	grupo	de	trabalho,	
reuniões	de	happy	hour	com	os	colegas	do	mesmo	escritório	ou	encontros	regulares	com	
profissionais	da	mesma	área	de	trabalho,	assim	como	pode	se	definir	por	pertencer	ao	
mesmo	estrato	social	de	classe	e	frequentar	espaços	de	lazer	e	consumo	comuns,	bem	
como	por	pertencer	a	mesma	identidade	racial,	gênero	ou	sexualidade.	
A	 crescente	 complexificação	 das	 relações	 sociais	 se	 tornam	 assim	 um	
interessante	modo	de	observar	e	entender	as	mudanças	da	vida	social	a	partir	do	meio	
urbano	e	como	essas	mudanças	 impactam	em	diferentes	modos	de	vida,	suas	forças	
produtivas,	 a	maneira	 de	 deslocar	 ou	 se	 comunicar,	 a	 inserção	 de	 novos	 processos	
administrativos	ou	políticos,	 tudo	 isso	é	parte	de	uma	maneira	de	estar	na	cidade	e	
no	urbano.	 “Deterioração	dos	espaços	e	equipamentos	públicos	com	a	consequente	
privatização	 da	 vida	 coletiva,	 segregação,	 evitação	 de	 contatos,	 confinamento	 em	
ambientes	e	redes	sociais	restritos,	situações	de	violência	etc.”	(MAGNANI,	2002,	p.	12).
Essas	 são	 características	 que	 influenciam	 na	 escolha	 da	 cidade	 como	 objeto	
de	análise	e	investigação	por	parte	de	antropólogos	brasileiros.	Os	povos	indígenas	e	as	
populações	 rurais	 agora	estão	em	contato	com	o	aquilo	que	foi	nomeado	 “progresso”	
e	o	mundo	urbano	se	apresenta	como	esse	contexto	social	de	grande	 interação	entre	
grupos	que	antes	não	habitavam	ou	compartilhavam	os	mesmos	gostos	ou	modos	de	
vida.	 Dois	 antropólogos	 brasileiros	 contribuíram	 significativamente	 para	 expansão	 e	
desenvolvimento	dessa	subárea	de	estudos,	são	eles:	Gilberto	Velho	e	Guilherme	Magnani.	
O	antropólogo	brasileiro	Gilberto	Velho,	consolidou	o	campo	de	pesquisas	do	
urbano	 abordando	 diferentes	 temas,	mas	 seu	 diferencial	 eram	 os	 estudos	 de	 classes	
médias	urbanas,	especialmente	aquelas	que	estavam	no	Rio	de	Janeiro,	onde	ele	morava	
e	 era	 professor	 no	 Programa	 de	 Pós-Graduação	 em	 Antropologia	 Social	 do	 Museu	
Nacional/	UFRJ.	Em	1972,	Velho	publica	“A	Utopia	Urbana:	um	estudo	de	antropologia	
social”,	considerado	um	clássico	nos	estudos	de	Antropologia	Urbana.	A	 investigação	de	
Velho	concentra-se	no	estudo	antropológico	do	bairro	de	Copacabana	no	Rio	de	Janeiro,	
habitante	de	um	prédio	de	apartamentos	conjugados,	ele	tornou	a	experiência	familiar	
de	habitar	aquele	lugar	um	objeto	de	análise	a	respeito	da	vida	social	no	meio	urbano.	
A	antropologia	tem	a	grande	vantagem	de	ter	uma	saudável	tradição	de	
ceticismo	e	critica	que	pode	nos	ajudar	a	ver	e	superar	as	ideias	velhas	
e	 preconceituosas.	 Não	 creio	 que	 o	 estudo	 da	 própria	 sociedade	
seja	uma	heresia	dentro	da	trajetória	de	reflexão	antropológica,	mas	
significa	 sem	 dúvida,	 uma	 ampliação	 e	 complexificação	 de	 nosso	
campo	de	estudo.	Logo	é	uma	tarefa	a	ser	assumida	com	todos	os	
riscos	e	desgaste	que	envolve	(VELHO,	1987,	p.	20).
55
Gilberto	Velho	procurou	demonstrar	como	viviam	os	moradores	de	Copacabana	em	
relação	ao	bairro,	o	sentido	de	pertencimento,	a	afirmação	positiva	de	estar	e	morar	em	
um	bairro	de	fama	internacional	e	revelou	suas	incongruências,	considerando	também	a	
abordagem	socioespacial	que	Velho	realiza	naquele	 lugar,	demonstrando	a	precariedade	
de	espaço,	o	custo	de	vida,	a	relação	de	vizinhança	e	os	desafios	de	estranhar	aquela	
familiaridade.	Do	ponto	de	vista	antropológico,	o	estudo	do	antropólogo	carioca	fornece	
não	só	boas	pistas	para	entender	as	mudanças	no	estilo	de	vida,	modos	de	habitação	
e	ocupação	da	cidade,	mas	é	extremamente	rico	em	termos	metodológicos,	pois	será	
a	 partir	 desta	 experiência	 etnográfica	 que	Velho	 vai	 postular	 a	 observação	 participante	
mediante	 o	 equilíbrio	 entre	 a	 dimensão	 da	 familiaridade	 e	 do	 estranhamento	 como	
perspectivas	epistemológicas	da	antropologia	feita	na	cidade,	no	urbano.	
Influenciado	 pela	 Escola	 de	 Chicago,	 Gilberto	 Velho	 parte	 da	 perspectiva	
interacionista	 para	 desenvolver	 sua	 análise	 do	 contexto	 pesquisado,	 observando	 as	
crenças,	valores,	normas,	visões	de	mundo,	classe	social,	região,	religião,	escolaridade	
como	 elementos	 constitutivos	 da	 experiência	 do	 indivíduo	 no	 meio	 urbano.	 Nessa	
perspectiva,	 o	 antropólogo	 pretende	 compreender	 como	 os	moradores	 do	 bairro	 de	
Copacabana,	 residentes	 no	 prédio	 em	 que	 o	 estudo	 foi	 realizado,	 dão	 significado	 e	
sentido	 às	 suas	práticas	 sociais,	 seus	 comportamentos,	 bem	como	eles	 se	 apropriam	
do	espaço	social	e	dos	arranjos	urbanos	nos	quais	se	 inserem	na	cidade,	sejam	eles	
físicos	ou	culturais.	Por	 isso	a	 importância	do	método	etnográfico,	pois	ele	permite	que	o	
antropólogo	descreva	esses	sujeitos,	seus	comportamentos,	sua	visão	de	mundo,	seu	
idioma	e	formas	de	linguagem,	bem	como	aspectos	gênero,	raça,	classe,	sexualidade,	
religião,	 trabalho	 e	 tantas	manifestações	materiais	 e	 imateriais	 de	 seu	modo	 de	vida.	
Sempre	a	partir	de	uma	interação	que	se	faz	com	os	sujeitos	urbanos,	os	interlocutores	
de	pesquisa	do	antropólogo.	
Gilberto	 Velho,	 em	 seu	 estudo	 de	 Copacabana,	 destaca	 os	 indivíduos	 que	
moram	no	prédio	a	partir	de	suas	interações	com	o	bairro,	os	vizinhos	e	suas	relações	
para	fora	dali,	situando	a	construção	de	seu	modo	de	vida	em	interface	com	a	cultura	
do	bairro,	a	cultura	da	cidade	e	a	cultura	urbana	de	forma	geral.	O	antropólogo	oferece	
diferentes	maneiras	de	olhar	para	a	cidade,	evidencia	as	sociabilidades	constitutivas	
desse	todo	social	urbano,	aborda	os	conflitos	e	a	experiência	de	desvio,	dá	importância	aos	
movimentos	sociais	e	articula	diferentes	dimensões	da	vida	urbana	e	suas	singularidades.	
As	 etnografias	 desenvolvidas	 por	 Gilberto	 Velho	 são	 ricas	 para	 o	 campo	 da	
antropologia,	mas	 também	para	 o	 leitor	 interessado	 em	 conhecer	 a	 diversidade	 dos	
modos	de	ser	que	estão	na	cidade.	O	antropólogo	sempre	perspicaz	em	suas	descrições	
nos	 fornece	 um	modo	 de	 deslocarmos	 nosso	 olhar	 sobre	 os	 sujeitos,	 a	 cidade	 e	 a	
vida	 social	 que	 ele	 observou.	Atento	 aos	 padrões	 de	 comportamentos,	 assim	 como	
às	 normas	 sociais	 em	momentos	 de	 interação	 dos	 sujeitos	 pesquisados,	 Velho	 nos	
permite	um	exercício	constante	de	relativismo,	isto	é,	de	entender	aos	nossos	vizinhos	
em	 seus	 próprios	 termos,	 assim	 nos	 aproximamos	 de	 um	 olhar	 atento	 àqueles	 que	
cruzam	com	a	gente	na	rua,	que	dividem	o	metrô	ou	ônibus	e	que	passam	por	nós	no	
56
shopping.	A	etnografia	da	sociedade	complexa,	essa	que	compõe	a	cidade	urbana	e	
suas	singularidades,	é	uma	maneira	do	pesquisador	enxergar	nossas	diferenças,	nossas	
singularidades	 e	 compreender	 o	 quanto	 somos	 diferentes	mesmo	 estando	 em	 uma	
mesma	cidade	ou	bairro,	como	é	o	caso	de	Copacabana.	
Se	 olharmos	 para	 expressões	 culturais	 regionais	 o	 volume	 de	 informações,	
práticas	e	sujeitos	se	amplia	ainda	mais.	Teremos	um	conjunto	ainda	mais	diverso	de	
nossas	singularidades,	no	qual	aparecem	a	diversidade	étnica,	a	diversidade	religiosa,	a	
vida	cultural	ou	até	mesmo	os	nossos	hábitos	alimentares,	 tudoisso	pode	ser	visto	a	
partir	de	diferentes	registros	etnográficos.	No	campo	religioso,	por	exemplo,	no	Brasil	
há	 diferentes	 manifestações	 como	 o	 Candomblé,	 a	 Umbanda,	 o	 Protestantismo,	 o	
Catolicismo,	o	Espiritismo,	dentre	outras	manifestações	religiosas.	
O	 estudo	etnográfico	dessas	 religiões	 e	 suas	práticas	 auxiliam	a	 entender	 suas	
normas,	 seus	 valores,	 suas	 práticas	 e	 compreender	 a	 diversidade	 dos	 rituais	 de	 fé	
que	 fazem	parte	 da	 identidade	 brasileira.	Ao	 colocar	 em	evidência	 essa	 diversidade,	
a	antropologia	auxilia	no	conhecimento	daquilo	que	não	se	conhece	e	que	pode	ser	
objeto	de	preconceito	e	ofensa.	Assim,	os	trabalhos	que	versam	sobre	essas	temáticas	
permitem	entender	como	sujeitos	sociais	expressam	sua	espiritualidade	e	que	podem	
ter	 suas	práticas	 reconhecidas	 sem	se	 tornarem	objeto	de	 agressão	ou	violência	na	
forma	da	intolerância	religiosa.	
Todos	esses	são	fenômenos	que	estão	presentes	no	meio	urbano	e	que	fazem	
parte	da	cultura	complexa	da	cidade.	Essa	diversidade	de	estilos	de	vida,	práticas	culturais	
e	visões	de	mundo	não	determinam	uma	cultura	única,	mas	ressaltam	a	pluralidade	que	
compõe	a	vida	urbana	e	os	sujeitos	sociais	que	nela	habitam.	Por	outro	 lado,	Gilberto	
Velho	também	vai	chamar	a	atenção	para	os	processos	de	“massificação”	da	sociedade	
complexa,	isto	é,	com	a	intensa	modernização	e	industrialização	o	desenvolvimento	da	vida	
nas	metrópoles	também	produz	transformações	que	geram	padrões	de	comportamento,	
sociabilidade,	interação,	costumes	e	rotinas.	
Um	 interessante	 costume,	 exemplar	 desse	 processo	 de	 massificação	 das	
sociedades	complexas,	é	o	consumo	de	telenovelas,	assim	como	de	redes	sociais.	Cada	
segmento	de	classe	social	compartilha	elementos	comuns	de	 interesse,	assim	como	
interpretações	particulares	 daquilo	 que	 está	 consumido,	mas	 todos	 estão	usando.	A	
partir	 das	 telenovelas	 podemos	 acessar	 conteúdos	 diversificados	 do	modo	 de	 vida	 em	
diferentes	metrópoles	urbanas	brasileiras,	as	novelas	que	destacam	os	sujeitos	e	sua	
vida	 no	 bairro	 do	 Leblon,	 aquelas	 que	 fazem	 referência	 ao	 período	 de	 escravização	
e	 a	 luta	da	população	negra	para	 exercer	 sua	 liberdade	no	contexto	de	uma	cidade	
moderna,	algumas	destacam	práticas	religiosas,	outras	evidenciam	conflitos	familiares	e	a	
diversidade	dos	sujeitos	e	das	identidades	urbanas.	Lembra	de	alguma	novela	marcante	
a	respeito	desses	temas?	Reflita.	
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Quem não lembra dos inúmeros comentários na rua, em casa ou no trabalho sobre 
a trama de Avenida Brasil? Não conhece? Não assistiu? Pega essa dica, acadêmico, 
e nos intervalos de estudo aproveite para assistir à novela e lembrar dos conceitos 
antropológicos.
DICA
Disponível em: https://bit.ly/3S4c2rc
O	meio	 urbano	 estudado	 por	 Gilberto	Velho	 nos	 apresenta	 as	 influências	 que	
mídias	sociais,	produtos	e	instituições	exercem	na	formação	e	construção	do	nosso	estilo	
de	vida,	dos	nossos	costumes	e	nossos	valores	socialmente	compartilhados.	
A	escola,	a	universidade,	o	trabalho,	a	vizinhança,	a	igreja,	o	clube,	a	comunidade,	
o	 bar,	 o	 shopping	 ou	 o	 teatro	 são	 expressões	 desse	 conjunto	 de	 instituições	 da	vida	
complexa	que	agencia	e	produz	 identidades	sociais	na	vida	urbana.	É	a	partir	dessa	
percepção	 que	 o	 antropólogo	 vai	 postular	 a	 importância	 da	 “metamorfose”,	 isto	 é,	
a	 recepção	dessas	 informações.	Além	disso,	Gilberto	Velho	vai	 demonstrar	 que	essa	
recepção	não	é	a	mesma	para	todos	que	a	veem,	elas	são	interpretadas	socialmente	de	
maneira	diferente	e	muitos	de	nós	podem	se	afetar	por	elas	enquanto	outros	não.	Nesse	
sentido,	destacamos	os	sujeitos	urbanos	e	a	construção	de	suas	identidades,	como	eles	
são	heterogêneos	em	suas	possibilidades	de	ação,	 interpretação	e	conhecimento	de	
mundo,	 podendo	 assumir	 papéis	 distintos	 em	 contextos	 situacionais	 diferentes.	 Para	
entender	melhor	 essa	 dimensão,	 convidamos	 você	 à	 leitura	 do	 texto	 complementar	
sobre	a	população	em	situação	de	rua	e	seus	direitos.	
58
LEITURA
COMPLEMENTAR
POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA E O “DIREITO A TER DIREITOS”
Tomás	Henrique	de	Azevedo	Gomes	Melo
Ao	 longo	dos	últimos	anos,	venho	me	dedicando	a	uma	pesquisa	da	trajetória	
social	do	Movimento	Nacional	da	População	de	Rua	 (MNPR).	Em	2009,	 iniciei	 trabalho	de	
campo	com	pessoas	que	moravam	nas	ruas	da	cidade	de	Curitiba	-Paraná,	momento	em	
que	a	cidade	se	destacava	por	ser	dotada	de	uma	rede	de	atendimento	socioassistencial	
relativamente	complexa,	com	diversos	agentes	e	secretarias	envolvidas	no	trabalho	com	
essa	população.	Havia,	sobretudo,	um	momento	de	ebulição	política	em	torno	da	questão	
“população	de	rua”,	com	o	envolvimento	de	diversos	agentes,	entre	ONGs,	grupos	religiosos	
de	 distintas	 congregações,	 agentes	 estatais	 de	 diversas	 secretarias	municipais,	 além	 do	
Ministério	Público	do	Estado	e	pessoas	em	situação	de	 rua	que	se	encontravam	para	
debater	publicamente	os	desafios	de	uma	política	adequada	para	este	segmento.	
Desde	este	período,	acompanhei	diversas	atividades	do	MNPR	e	pude	presenciar	
o	 fortalecimento	 institucional	 de	 uma	 pauta	 que	 começou	 a	 ganhar	 notoriedade	 e	
visibilidade	pública	em	algumas	cidades	do	país.	Um	importante	marcador	social	desse	
contexto	se	estabeleceu	quando	o	ex-presidente	Luiz	Inácio	“Lula”	da	Silva	assinou	o	
Decreto	nº	7.053/2009,	que	institui	a	Política	Nacional	para	a	População	em	Situação	
de	 Rua,	 documento	 que	 define	 as	 características	 do	 segmento	 populacional	 a	 ser	
atendido.	Deste	processo	 recente,	um	dos	 resultados	que	mais	me	chamou	atenção	
foi	o	fortalecimento	político	de	pessoas	que	se	reconhecem	enquanto	população	de	rua,	
que	passam	a	fazer	parte	ativa	dessa	rede	e	que	começam	a	atuar	no	MNPR,	principal	
núcleo	aglutinador	de	proposições	no	plano	da	ação	pública	por	parte	do	segmento.
	Ainda	que	os	antecedentes	que	forjam	os	termos	e	definições	do	que	se	tornou	
a	 “população	 em	 situação	 de	 rua”	mostrem	 seus	 primeiros	 contornos	 na	 década	 de	
1950	na	cidade	de	São	Paulo,	é	na	década	de	1990	que	estas	iniciativas	ganham	força	
e	 se	 configura	 uma	 atividade	mais	 intensa,	 com	mobilizações	voltadas	 a	 questionar	
a	ausência	de	políticas	públicas	para	o	segmento.	Do	final	da	década	de	noventa	em	
diante,	a	politização	em	torno	da	questão	“população	de	rua”	se	acentua,	com	um	intenso	
processo	que	 resulta	na	constituição	de	manifestações,	 fóruns,	 seminários,	encontros	
e	demais	espaços	específicos	para	a	organização.	Um	dos	resultados	fundamentais	deste	
período	 foi	 a	 criação	 do	 referido	Movimento	Nacional	 da	 População	 de	 Rua	 (MNPR),	
lançado	publicamente	em	2005,	 a	partir	 do	entendimento	da	necessidade	de	 se	 criar	
um	movimento	de	bases	sólidas,	com	atuação	em	nível	nacional	e	organizado	pelas	
próprias	pessoas	em	situação	de	rua	na	defesa	de	seus	direitos.	
59
Concordando	 com	 Costa	 (2007:	 19),	 afirmo	 que	 a	 situação	 de	 rua	 ganhou	
nuances	na	medida	em	que	cresceu	e	se	expandiu,	tornando-se	algo	cada	vez	mais	
presente	no	cotidiano	das	cidades.	Junto	a	isto,	entrelaçam-se	novos	discursos,	práticas	e	
instituições	que	 refletem	sua	presença	marcante.	No	bojo	dessas	transformações	nos	
grandes	centros,	o	fenômeno	torna-se	uma	questão	a	ser	amplamente	debatida.	No	
entanto,	o	que	considero	fundamental	apontar	é	que	a	existência	do	MNPR	 incide	e	
transforma	 diretamente	 o	modo	 como	 o	 debate	 estava	 organizado:	 o	 estabelecimento	
do	MNPR	marca	 em	definitivo	 a	 existência	 de	 um	espaço	 de	 fala	 e	 reconhecimento	
das	pessoas	em	situação	de	rua	enquanto	interlocutores	válidos	no	campo	de	disputas	
políticas	e	nas	questões	que	se	referem	à	vida	em	situação	de	rua.	
Os	 esforços	 em	 torno	 do	 movimento	 produzem	 a	 mobilização	 de	 diversos	
segmentos	da	sociedade,	o	que	culmina	em	percepções	 renovadas	da	questão	–	não	
apenas	como	foco	de	políticas	setoriais	ou	objeto	de	debates,	mas	como	 interlocutores	
possíveis	 na	 arena	 pública.É	 importante	 ressaltar,	 antes	 de	 tudo,	 que	 a	 população	
de	 rua	não	tem	uma	tradição	de	organização	por	 reivindicação,	a	exemplo	de	outros	
segmentos	sociais.	
Dentre	 as	 principais	 razões	 indicadas	 pelos	 militantes	 do	 MNPR	 da	 dificuldade	
de	 “organizar	 esse	 povo”,	 a	 primeira	 delas	 diz	 respeito	 aos	 desafios	 concernentes	 à	
“redistribuição”,	 visto	 que	 existem	 dificuldades	 materiais	 inegáveis	 para	 “organizar”	 um	
segmento	social	que	vive	em	situação	de	extrema	vulnerabilidade	social.	
Segundo	militantes	que	entrevistei	e	acompanhei	em	diversas	atividades,	esses	
desafios	fariam	parte	do	que	se	referem	por	“imediatismo	da	rua”.	Ou	seja,	é	absolutamente	
difícil	aproximar	pessoas	de	atividades	de	organização	e	militância	quando	elas	estão	
o	 tempo	 todo	 vivendo	 em	 função	 de	 atender	 suas	 necessidades	 primordiais,	 o	 que	
só	é	possível	a	partir	de	dinâmicas,	temporalidades	e	circuitos	que	muitas	vezes	não	
concedem	 grande	 autonomia	 aos	 sujeitos	 (tais	 como	 rotinas	 institucionais	 de	 albergues,	
centros	de	convivência	diurnos	e	demais	serviços	de	acolhimento).	
Mesmo	as	pessoas	que	não	se	utilizam	desse	tipo	de	serviço	e	passam	a	maior	
parte	de	seu	tempo	na	rua,	têm	suas	agendas	determinadas	por	outras	atividades	tão	
ou	 mais	 “imediatistas”:	 a	 ocupação	 e	 salvaguarda	 dos	 espaços	 de	 suas	 “malocas”	
ou	 “mocós”	e	seus	pertences;	os	horários	de	atendimento	dos	serviços	prestados	por	
voluntários	 que	 servem	 alimentação	 (as	 chamadas	 “bocas	 de	 rango”);	 as	 rotinas	 de	
trabalhos,	 como	 a	 catação	 de	materiais	 recicláveis;	 as	 atividades	 dos	 “flanelinhas”,	 que	
cuidam	de	carros	em	pontos	que	precisam	ser	ocupados	e	defendidos	para	não	serem	
perdidos	para	a	concorrência,	dentre	outros	exemplos.	
Todas	essas	atividades	e	rotinas	 institucionais,	seja	na	rua	ou	nos	chamados	
equipamentos	da	assistência	social,	têm	em	comum	o	fato	de	que	não	se	organizam	
mediante	uma	programação	de	longo	prazo,	já	que	não	existem	garantias	de	vaga	em	
albergues	ou	de	alimentação.	Para	garantir	qualquer	coisa	é	necessário	se	auto-organizar	
diariamente	para	o	acesso	à	alimentação,	ao	local	de	pernoite,	até	ao	banheiro	ou	ao	
60
banho.	Desta	forma,	a	questão	que	se	coloca	é:	como	chamar	à	organização	pessoas	
com	 tal	 nível	 de	 vulnerabilidade,	 com	 toda	 a	 sua	 rotina	 orientada	 para	 a	 resolução	
imediata	de	suas	necessidades,	sem	garantias	futuras	e	pouquíssima	margem	para	auto-
organização?	
Posto	de	outro	modo,	trata-se	do	desafio	de	aproximar	pessoas	para	atividades	
que	visam	à	construção	de	melhorias	para	o	futuro	–	das	quais	ninguém	tem	garantias	
–	 enquanto	 todas	 as	 atividades	 cotidianas	 para	 a	 sobrevivência	 são	 organizadas	 para	
atender	 as	 necessidades	mais	 imediatas.	 Outra	 parte	 do	 problema,	 também	 indicado	
frequentemente	pelos	militantes	do	MNPR,	diz	respeito	às	demais	especificidades	desse	
modo	de	vida,	tais	como	o	fato	de	grande	parte	dessa	população	ter	chegado	à	situação	
de	rua	em	virtude	do	desenvolvimento	de	quadros	de	depressão,	consumo	de	drogas	e	de	
trajetórias	apresentadas	como	situações	de	desamparo,	processos	de	ruptura	de	vínculos	
familiares	e	demais	elos	comunitários	com	as	 localidades	de	origem,	além	da	privação	
econômica.	Estes	processos,	muitas	vezes	indicados	como	motivos	para	o	início	da	vida	
nas	 ruas,	 são	 compreendidos	 como	 fatores	 de	 forte	 cunho	 emocional	 que	 fragilizam	
as	energias	e	motivações	dos	sujeitos.	Uma	vez	na	rua,	há	um	novo	mundo	a	ser	visto,	
repleto	de	novas	regras,	etiquetas	e	uma	moralidade	própria	que	inspira	as	condutas.	Este	
amplo	e	complexo	cenário	indicado	rapidamente	aqui,	é	o	pano	de	fundo	a	partir	do	qual	
os	militantes	do	MNPR	analisam	a	situação	de	seus	“companheiros	de	rua”.	
Tal	 formulação	 poderia	 ser	 resumida	 a	 partir	 da	 concepção	 de	 que	 “a	 rua”,	
enquanto	um	espaço	abstrato	(ruas,	praças,	vielas,	equipamentos	de	atendimento	em	
que	moradores	de	rua	convivem),	com	regras	e	lógica	própria,	é	marcada	por	experiências	
de	sofrimento	e	traumas	profundos	que	determinam	irremediavelmente	a	vida	 individual,	
processo	frequentemente	sintetizado	por	frases	como:	“Você	sai	da	rua,	mas	a	rua	não	sai	
de	você”.	O	que	gostaria	de	apontar	aqui,	portanto,	é	que	se	a	situação	de	rua	é	marcada	
por	faltas	e	fragilidades,	ela	também	se	estabelece	como	um	mapa	de	possibilidades	
renovadas,	condutas	marcadas	pela	necessidade	e	criatividade	para	dar	resolução	ao	
leque	de	dificuldades	que	se	a	figura.	Compõe	um	contexto	de	privação	material	que	
também	 estabelece	 marcadores	 e	 fronteiras	 identitárias,	 pertencimentos	 e	 diferenças.	
No	entanto,	 se	estes	aspectos	estão	 intimamente	 ligados,	especialmente	no	que	diz	
respeito	às	ditas	dificuldades	de	organização	política,	eles	estão	 igualmente	presentes	
no	que	tange	à	inclusão	desse	segmento	em	grande	parte	das	políticas	sociais.	Pois,	
pelo	menos	em	sua	produção	inicial,	a	maioria	das	políticas	não	foi	idealizada	de	modo	a	
garantir	a	essas	pessoas	o	acesso	aos	bens	sociais.	
A	 falta	de	uma	 referência	habitacional	 e	de	um	documento	que	comprove	a	
residência	 foi	 um	 dos	 maiores	 impedimentos	 para	 acessar	 praticamente	 tudo:	 do	
Programa	Bolsa	Família	ao	atendimento	no	Sistema	Único	de	Saúde	(SUS),	passando	pela	
inclusão	em	programas	de	habitação	popular	 (Minha	Casa,	Minha	Vida)	até	mesmo	para	
a	matrícula	dos/as	filhos/as	no	ensino	público	ou,	ainda,	em	casos	em	que	indivíduos	
em	conflito	com	a	 lei	 recebem	liberdade	provisória	ou	prisão	domiciliar	e	acabam	sendo	
61
punidos	novamente	por	não	terem	uma	referência	domiciliar.	Nos	últimos	anos,	o	MNPR	
travou	uma	grande	 luta	para	fazer	com	que	certas	especificidades	da	vida	na	rua	fossem	
reconhecidas	enquanto	tal,	para	então	criar	alternativas	para	 inclusão	em	programas	
sociais	ou	mesmo	para	assegurar	o	acesso	à	saúde.	
A	partir	da	 Instrução	Operacional	Conjunta	Senarc/SNAS/MDS	nº	 7	de	22	de	
novembro	de	2010,	 estabelece-se	uma	modalidade	de	 inclusão	facilitada	no	Cadastro	
Único	para	Programas	Sociais	do	Governo	Federal	 (CadÚnico).	Esta	 instrução	tornou	
possível	o	cadastramento	sem	a	necessidade	da	documentação	anteriormente	exigida	
para	a	inclusão	nos	Programas	Sociais	como	o	Bolsa	Família,	dentre	outros	benefícios	
para	 os	 quais	 o	 CadÚnico	 se	 faz	 necessário,	 tais	 como	 a	 isenção	 de	 inscrição	 em	
concursos	 públicos,	 a	 inclusão	 no	BPC	 (Benefício	 por	 Prestação	Continuada)	 e	 para	
candidatar-se	 a	 programas	habitacionais.	A	 resolução	 para	 a	 questão	 se	 deu	 de	 uma	
forma	que	poderíamos	considerar	“simples”	e	foi	composta	basicamente	por	duas	ações:	
a	primeira	delas	era	criar	uma	categoria	específica	para	pessoas	em	situação	de	 rua	na	
primeira	parte	do	cadastramento,	no	qual	normalmente	a	pessoa	deveria	caracterizar	
seu	domicílio	(a	natureza	do	material	da	construção,	quantidade	de	cômodos	etc.).	A	
outra	ação	foi	considerar	que	estas	pessoas	sem	endereço	fixo	poderiam	ter	como	local	
de	referência	algum	equipamento	ou	serviço	da	assistência	social	no	município	em	que	
se	encontram.	Exemplo	semelhante	é	o	da	Portaria	n°	940,	de	28	de	abril	de	2011,	que	
regulamenta	o	Sistema	do	Cartão	Nacional	de	Saúde	e	em	um	de	seus	artigos	dispensa	
à	 população	 de	 rua	 e	 os	 ciganos	 da	 apresentação	 do	 comprovante	 de	 residência	 para	
cadastramento	no	SUS:	Ciranda	no	II	Congresso	do	Movimento	Nacional	da	População	
de	Rua	(MNPR).
Tais	 ações,	 em	 um	 primeiro	 momento,	 foram	 destacadas	 como	 se	 fossem	
meramente	 problemas	 técnicos	 a	 serem	 resolvidos,	 alcançando-se	 o	 público	 que	
até	então	estava	de	fora	dos	programas	sociais	a	partir	de	alguns	pequenos	ajustes.	
É	 importante	 notar	 que	 esse	 tipo	 de	 formulação	 vai	 de	 encontro	 àquilo	 que	 Ferguson	
(2009,	p.	256)	se	refere	como	um	processo	de	despolitização	presente	na	redução	da	
pobreza	a	um	problema	técnico,	com	a	consequente	promessa	de	resolução	técnica	
para	questões	políticas.	A	fabricação	destetipo	de	separação	entre	técnica	e	política	
ou	entre	mercado	e	Estado,	por	sua	vez,	tem	como	um	de	seus	resultados	a	reificação	do	
“Estado”,	apagando	sua	dimensão	política	e	obliterando	os	efeitos	de	poder	produzido	
pela	própria	distinção	entre	esses	domínios	(VIANNA,	2013,	p.	16-17).
Em	 última	 instância,	 trata-se	 de	 um	 tipo	 de	 “efeito	 de	 reconhecimento”	 da	
existência	de	um	segmento	populacional	pela	precariedade	material	de	seu	modo	de	
vida	e	que,	portanto,	passa	a	ser	aceito	em	tais	programas.	De	todo	modo,	esta	 inclusão	
mediada	pela	atenção	a	determinadas	especificidades,	sem	as	quais	o	atendimento	não	
seria	possível,	produz	 legibilidade,	 tal	 como	compreendido	por	Das	e	Poole	 (2004,	p.	
16).	No	entanto,	mais	do	que	a	forma	como	o	estado	torna	uma	população	 legível,	o	
que	interessa	saber	é	o	alcance	que	isso	pode	ter	nas	práticas	engendradas	por	este	
“reconhecimento”.	
62
O	 que	 se	 percebe	 é	 que	 boa	 parte	 dos	 esforços	 recentes	 por	 uma	 inclusão	
qualitativa	 da	 população	 de	 rua	 em	 programas	 sociais	 e	 por	 acesso	 a	 direitos	 tem	
sido	 realizado	 nesse	 plano,	 o	 que	 torna	 absolutamente	 necessário	 reconhecer	 as	
especificidades	de	um	modo	de	vida	para	tentar	 impactar	positivamente	o	segmento	em	
termos	 de	 redistribuição.	 Redistribuir,	 pelo	menos	 no	 caso	 da	 população	 em	 situação	
de	 rua,	 significa	 necessariamente	 reconhecer	 especificidades	 de	 um	 modo	 de	 vida	
historicamente	estigmatizado,	criminalizado	e	não	raramente	massacrado.
Fonte: MELO, T. H. A. G. População em situação de rua e o "direito a ter direitos". Novos Debates, Brasília, 
DF, v. 1, n. 2, p. 198-206, 2015.
63
Neste tópico, você aprendeu:
•	 Conhecer	 as	 diferentes	 manifestações	 sociais	 presentes	 no	 meio	 urbano	 e	 as	
novas	 relações	de	 alteridade	que	estavam	presentes.	 Identificou	que	há	uma	certa	
familiaridade	com	o	social,	com	os	indivíduos	e	mesmo	com	a	cidade	que	é	o	lócus	de	
observação,	mas	também	de	moradia	e	pertencimento	dos	próprios	antropólogos.	
•	 Identificou	questões	metodológicas	no	campo	das	pesquisas	em	antropologia	urbana	
a	partir	da	experiência	de	observação	etnográfica	que	reúne	uma	produção	focada	
nas	transformações	das	comunidades,	na	mudança	do	campo	para	a	cidade	e	percebeu	
que	o	antropólogo	busca	observar	o	que	na	cidade	há	de	mudança,	quais	os	grupos	
que	agora	fazem	parte	da	construção	e	da	disputa	de	uma	cidade	urbana.	
•	 Aprendeu	 a	 reconhecer	 a	 diversidade	 de	 grupos	 sociais	 no	 meio	 urbano	 e	 suas	
demandas,	 assim	 como	 passou	 a	 conhecer	 os	 diferentes	 modos	 de	 mobilização	
de	 grupos	 sociais	 que	 passam	 a	 constituir	 o	 lugar	 da	 cidade	 (negros,	 indígenas,	
população	 rural	 que	 migra	 para	 as	 grandes	 metrópoles,	 comunidades	 religiosas,	
grupos	de	diferentes	sexualidades	e	gêneros),	e	foram	chamados	de	minorias	sociais	ou	
grupos	e	tribos	urbanas.
•	 Percebeu	 como	 as	 mudanças	 do	 espaço	 social	 interferem	 na	 subjetividade	 dos	
indivíduos	 no	 meio	 urbano.	 Aprendeu	 as	 diferentes	 identidades	 e	 construção	 de	
grupos	sociais	na	cidade	que	 reivindicam	não	só	o	 reconhecimento	dos	seus	modos	
de	 vida	 mas	 também	 reivindicam	 melhores	 condições	 de	 vida	 na	 cidade	 diante	
de	problemas	sociais	que	surgem	no	meio	urbano	com	o	 inchaço	das	cidades	e	a	
infraestrutura	precária	para	lidar	com	grandes	aglomerados	de	pessoas.
RESUMO DO TÓPICO 3
64
1	 O	texto	 “O	urbanismo	como	modo	de	vida”	do	sociólogo	estadunidense	Louis	Wirth	
(1979)	é	um	 importante	estudo	que	marca	uma	abordagem	do	urbano	na	antropologia	
brasileira.	 O	 autor	 é	 considerado	 um	 dos	mais	 notáveis	 estudiosos	 do	 fenômeno	
urbano	 nos	 Estados	 Unidos.	 Wirth	 elaborou	 sua	 interpretação	 do	 fenômeno	 urbano	
contribuindo	 para	 uma	 “teoria	 sociológica	 e	 sociopsicológica	 do	 urbanismo”.	 Sobre	
estas	 grandes	 contribuições	 ao	 conhecimento	 da	 Antropologia	 Urbana,	 assinale	 a	
alternativa	CORRETA:
Fonte: WIRTH. L. O urbanismo como modo de vida. In: VELHO, O. (org.). O fenômeno urbano. Rio de Janeiro, 
Zahar Editores, 1979. p. 89-112.
a)	 (			)	 Uma	 definição	 sociologicamente	 significativa	 do	 que	 seja	 cidade	 procura	
selecionar	 aqueles	 elementos	 do	 urbanismo	 que	 marcam	 como	 um	 modo	
distinto	de	vida	dos	agrupamentos	humanos.
b)	 (			)	 Uma	característica	marcante	do	modo	de	vida	urbano	na	vida	dos	 indivíduos	da	
idade	moderna	é	a	alta	criação	de	vínculos	sociais	primários,	famílias	e	parentes.
c)	 (			)	 Para	Wirth	 não	 estamos	 conectados	 por	 práticas	 sociais	 herdadas	 de	 uma	vida	
anterior,	pois	quando	vamos	para	a	cidade	a	nossa	cultura	desaparece	e	produz	
algo	totalmente	urbano.
d)	 (			)	 A	heterogeneidade	de	grupos	e	pessoas	na	vida	urbana	permite	que	possamos	nos	
relacionar	com	maior	mobilidade,	estabilidade	e	segurança	em	nossas	 relações	
sociais.
2	 Com	 a	 Revolução	 Industrial	 e	 o	 acerelado	 processo	 de	 urbanização,	 tornou-
se	 crescente	 a	 população	da	 cidade	 e	 isto	 complexificou	 as	 relações	 sociais.	Tais	
mudanças	 se	 tornam	assim	um	 interessante	modo	de	 observar	 e	 entender	 o	 novo	
modo	de	vida	urbano.	Com	base	nessas	mudanças,	analise	as	sentenças	a	seguir:
I-	 Essas	mudanças	 impactam	 diferentes	modos	 de	vida,	 suas	 forças	 produtivas,	 a	
maneira	de	deslocar	ou	se	comunicar,	a	inserção	de	novos	processos	administrativos	
ou	políticos,	tudo	isso	é	parte	de	uma	maneira	de	estar	na	cidade	e	no	urbano. 
II-	 Segundo	Gilberto	Velho,	os	sujeitos	urbanos	e	a	construção	de	suas	 identidades	
são	homogêneos,	porque	os	indivíduos	urbanos	interpretam	e	conhecem	o	mundo	
somente	como	as	telenovelas	mostram	e	assim	aprender	a	se	tornar	todos	iguais,	
não	há	espaço	para	mudança.
III-	 Para	 Guilherme	 Magnani	 é	 parte	 da	 maneira	 de	 estar	 na	 cidade	 e	 no	 urbano	
perceber	a	deterioração	dos	espaços	e	equipamentos	públicos	com	a	consequente	
privatização	da	vida	coletiva,	segregação,	evitação	de	contatos,	confinamento	em	
ambientes	e	redes	sociais	restritos,	situações	de	violência	etc.
AUTOATIVIDADE
65
Assinale	a	alternativa	CORRETA:
a)	 (			)	 As	sentenças	I	e	II	estão	corretas.
b)	 (			)	 Somente	a	sentença	II	está	correta.
c)	 (			)	 As	sentenças	I	e	III	estão	corretas.
d)	 (			)	 Somente	a	sentença	III	está	correta.
3	 Parte	importante	do	estudo	antropológico	do	modo	de	vida	urbano	vem	do	interesse	
de	 pesquisadores	 e	 pesquisadoras	 que	 veem	 os	 inúmeros	 grupos	 sociais	 que	 se	
desenvolvem	e	 se	organizam	coletivamente	a	partir	 da	cidade.	Uma	parte	desses	
pesquisadores	lidam	com	a	categoria	cidade	como	um	lócus	de	observação	etnográfica,	
por	 onde	 antropólogos	 podem	 ver	 a	 diversidade	 dos	 modos	 de	 agrupamento,	
manifestações	 sociais	 e	 ações	 coletivas,	 bem	 como	 registrar	 a	 alteridade	 entre	 os	
sujeitos	que	se	agrupam	e	 lutam	pelo	direito	à	cidade,	à	moradia	e	aos	diferentes	
modos	 de	vida.	A	 partir	 desse	 olhar	 antropológico,	 classifique	V	 para	 as	 sentenças	
verdadeiras	e	F	para	as	falsas:
(			)	O	 urbanismo	 como	 modo	 de	 vida	 revela	 uma	 tendência	 a	 adquirirmos	 uma	
sensibilidade	 ao	 universo	 dos	 artefatos	 e	 com	 isso	 progressivamente	 vamos	 nos	
distanciando	 das	 pessoas,	 acumulando	mais	 objetos	 e	 produtos	 fabricados	 pela	
indústria	capitalista	que	tem	sempre	algo	novo	para	nos	satisfazer.
(			)	O	 conceito	 de	 tribos	 urbanas	 se	 refere	 aos	 grupos	 sociais	 formados	 por	 etnias	
indígenas	que	migram	das	aldeias	mãe	para	morar	na	cidade	urbana	e	assim	formam	
novos	grupos	indígenas.
(			)	 As	 chamadas	 subculturas	 urbanas	 ou	 tribos	 urbanas	 são	 grupos	 de	 pessoas	 que	
compartilham	gostos,	valores,	códigos,	práticas	e	uma	estilo	de	vida	semelhantes	e	que	
estão	reunidas	na	metrópole.
Assinale	a	alternativa	que	apresenta	a	sequência	CORRETA:
a)	 (			)	 V	–	F	–	F.
b)	 (			)	 V	–	F	–	V.
c)	 (			)	 F	–	V	–	F.
d)	 (			)	 F	–	F	–	V.
4	 A	presença	massificada	de	pessoas	na	cidade	também	poderá	favorecer	a	formação	de	
agrupamentosdo	espaço	urbano	e	a	investigação	antropológica	permite	compreender	
as	diferentes	formas	de	expressão,	pertencimento	e	 identidades	que	compõem	essa	
cidade.	Michel	de	Certeau	(1994)	chamou	a	esse	tipo	social	de	“cidade	praticada”,	uma	
maneira	de	olhar	para	os	sujeitos	que	vivenciam	e	percebem	a	cidade	ao	seu	modo.	
Disserte	sobre	um	tipo	social	de	grupo	urbano	citado	no	texto.
Fonte: CERTEAU, M. A Invenção do Cotidiano: artes de fazer. Petrópolis, Vozes, 1994.
66
5	 Existem	muitas	estratégias	de	pesquisa	e	de	observação	possíveis	de	serem	adotadas	
nas	atividades	etnográficas.	A	observação	participante	é	uma	delas.	Nesta	proposta,	 a	
relação	entre	os	pesquisadores	e	os	 interlocutores	se	torna	mais	próxima,	pois	existe	
uma	mudança	de	atitude	e	 atenção	maior	no	aspecto	de	qualidade	e	na	 forma	de	
criação	de	vínculos	entre	sujeitos	em	 interação.	Neste	contexto,	disserte	sobre	as	
principais	contribuições	dos	estudos	de	Gilberto	Velho	e	Guilherme	Magnani	para	a	
Antropologia	Urbana.
67
REFERÊNCIAS
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Rio	de	Janeiro,	Zahar	Editores,	1979.	p.	89-112.
70
71
ANTROPOLOGIA RURAL
UNIDADE 2 — 
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
PLANO DE ESTUDOS
 A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
•	 compreender	especificidades	das	pesquisas	sobre	o	mundo	rural	para	a	formação	do	
subcampo	da	antropologia	rural;
•	 familiarizar-se	com	os	conceitos	de	“rural”	e	“novas	ruralidades”	a	partir	dos	estudos	
das	escolas	de	pensamento;
•	 perceber	as	interligações	entre	os	diferentes	sistemas	de	produção	social,	econômica	e	
política	no	mundo	rural;
•	 conhecer	 a	 diversidade	de	grupos	 sociais	 e	 suas	diferentes	 formas	de	organização	
social	 ao	 abordarmos	 os	modos	 de	 produção,	 formação	 de	 identidades	 sociais	 e	 os	
conflitos	que	ensejam	o	campo.
A	cada	tópico	desta	unidade	você	encontrará	autoatividades	com	o	objetivo	de	
reforçar	o	conteúdo	apresentado.
TÓPICO 1 – CONCEITOS E TRADIÇÕES TEÓRICAS NOS ESTUDOS DE CAMPESINATO E DA 
RURALIDADE
TÓPICO 2 – POVOS TRADICIONAIS E SEUS MODOS DE USO E OCUPAÇÃO DO ESPAÇO 
RURAL
TÓPICO	3	–	 ORGANIZAÇÕES	 ECONÔMICAS,	 RELAÇÕES	 SOCIAIS	 E	 MORALIDADES	 NO	
MUNDO RURAL
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure 
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.
CHAMADA
72
CONFIRA 
A TRILHA DA 
UNIDADE 2!
Acesse o 
QR Code abaixo:
73
TÓPICO 1 — 
CONCEITOS E TRADIÇÕES TEÓRICAS NOS 
ESTUDOS DE CAMPESINATO E 
DA RURALIDADE
UNIDADE 2
1 INTRODUÇÃO
Caro	 acadêmico,	 estamos	 numa	 travessia	 de	 conhecimento	 antropológico	 e	
etnográfico	 que	 navega	 pelos	 estudos	 da	 antropologia	 considerando	 suas	 subáreas,	
rural	 e	 urbana,	 já	 vimos	 na	 primeira	 unidade	 aqueles	 conceitos	 mais	 elementares	 da	
antropologia	 e	 fizemos	 um	 mergulho	 nos	 estudos	 da	 vida	 urbana,	 passando	 pelas	
principais	escolas	de	pensamento	e	considerando	alguns	estudos	etnográficos	que	nos	
permitiram	conhecer	um	pouco	melhor	como	se	faz	uma	 investigação	antropológica	no	
mundo	urbano.
Figura 1 – Batizado na Roça, Anita Malfatti
Fonte: https://bit.ly/3Q1FyeY. Acesso em: 19 ago. 2022
Além	disso,	também	foi	possível	dialogar	com	alguns	autores	que	se	dedicaram	
ao	estudo	sistemático	das	transformações	sociais	a	partir	da	Revolução	Industrial	e	da	
implementação	do	sistema	capitalista,considerando	as	diferentes	mudanças	ocorridas	
com	a	formação	das	cidades	urbanas,	grandes	metrópoles	e	modos	de	vida	que	foram	
afetados	por	essas	dinâmicas	de	interação	que	passaram	a	surgir	nesse	no	modo	de	
vida	urbano.
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Pois	bem,	você	já	deve	ter	percebido	que	há	inúmeras	transformações	políticas,	
sociais,	 econômicas	 e	 culturais.	 Nossa	 abordagem	 anterior	 destacou	 apenas	 alguns	
aspectos	desse	novo	modo	de	vida	urbano,	mas	você	sabe	que	é	apenas	um	pedaço	de	
um	vasto	conhecimento	em	termos	de	pesquisas	sociais	sobre	essas	mudanças.	Então,	
renovamos	agora	o	compromisso	de	partir	desses	estudos	e	procurar	conhecer	cada	
vez	mais	o	mundo	social	e	suas	transformações	para	chegar	exatamente	no	ponto	que	
estamos	vivendo	agora:	a	vida	contemporânea.
Autores,	escolas	e	estudos	são	como	mapas	conceituais,	que	servirão	a	você	
para	aprofundar	o	seu	conhecimento.	Acadêmico,	você	 já	percebeu	até	aqui	o	quanto	
é	 instigante	e	sedutor	conhecer,	aprender	e	entender	tantos	aspectos	da	vida	social	
através	das	lentes	de	análise	da	antropologia.
Agora	nossa	travessia	de	conhecimento	vai	nos	 levar	à	subárea	Antropologia	
Rural,	 vamos	mergulhar	 em	 pesquisas,	 autores	 e	 teorias	 que	 se	 dedicaram	 a	 estudar	
e	 investigar	as	diferentes	formas	de	vida	que	compõem	o	mundo	 rural,	 esse	habitat	
social	que	também	foi	palco	de	transformações	importantes	em	decorrência	das	novas	
atividades	produtivas	que	surgem	com	a	Revolução	Industrial	e	o	Sistema	capitalista.
Mas	antes	de	nos	aprofundarmos	no	estudo	sistemático	da	antropologia	rural	é	
importante	que	você	entenda	que	as	populações	rurais	estão	sempre	em	interação	com	
outros	grupos	sociais,	 inclusive	do	meio	urbano,	que	é	fundamental	compreendermos	
que	o	mundo	rural	não	é	um	lugar	“isolado”,	distante	de	mudanças	sociais	ou	“atrasado”,	
ao	 ter	 essa	 compreensão	 você	 está	 exercitando	 o	 pensamento	 antropológico	 de	
relativizar	essas	distâncias	sociais	entendendo	de	forma	 rigorosa	e	contextualizada	que	
apenas	existem	diferenças	nos	modos	de	ser	e	de	viver	seja	no	ambiente	urbano	ou	no	
ambiente	rural.
Um	 passo	 importante	 nessa	 dimensão	 de	 aprendizado	 que	 a	 antropologia	
sugere	é	perceber	que	existem	influências	sociais	do	mundo	rural	no	mundo	urbano	e	
do	mundo	urbano	no	mundo	rural.
Se	 você	 lembrar	 bem,	 logo	 no	 início	 da	 primeira	 unidade,	 nós	 fizemos	 uma	
curiosa	 imersão	 nos	 estudos	 clássicos	 de	 antropologia	 para	 falar	 das	 mudanças	 e	
perspectivas	que	a	própria	ciência	antropológica	vai	vivenciar	na	medida	em	que	a	vida	
vai	se	transformando.	Exemplo	disso	foi	o	entendimento	acerca	dos	primeiros	estudos	
antropológicos	que	estavam	interessados	em	“catalogar”	e	“preservar”	os	conhecimentos	
dos	“povos	primitivos”,	era	o	principal	objeto	de	estudo	da	antropologia	clássica	e	só	
mais	tarde	a	antropologia	passa	a	se	interessar	pelo	estudo	das	“sociedades	complexas”	
ao	dar	início	ao	estudo	e	às	novas	pesquisas	em	populações	rurais.
Então,	acadêmico,	fique	atento	e	preste	muita	atenção	que	nesta	unidade	nós	
aprofundaremos	o	nosso	conhecimento	na	antropologia	 rural	e,	 já	de	partida,	 lembre-
se	que	durante	um	bom	tempo	a	antropologia	chamou	essa	 subárea	de	estudos	de	
75
campesinato.	Também	vamos	entender	o	porquê	e	quais	são	os	demais	eixos	de	pesquisa,	
seus	principais	autores	e	etnografias	sobre	esse	campo.	Ao	longo	desta	unidade,	você	
encontrará	 alguns	 autores	 que	 estudaremos	 aqui,	 mas	 sempre	 terão	 outras	 dicas	 que	
podem	levar	você	a	explorar	outros	campos	de	pesquisa	por	meio	de	recomendações	
de	livros,	revistas,	podcasts,	vídeos,	documentários	e	muito	mais.
2 OS ESTUDOS DO RURAL NA FORMAÇÃO DA 
ANTROPOLOGIA BRASILEIRA
Os	primeiros	trabalhos	relacionados	ao	estudo	do	ambiente	rural	ou	do	campo	
acontecem	numa	 época	 em	que	 a	 antropologia	 ainda	 não	 era	 uma	 área	 acadêmica	
bem	estruturada	no	Brasil.	Sobre	isso,	cabe	aqui	fazermos	uma	breve	contextualização	
desse	período	de	formação	da	antropologia	brasileira	e	vamos	partir	das	contribuições	
do	trabalho	intitulado	“A	Antropologia	no	Brasil:	um	roteiro”	que	foi	publicado	em	1983	
(republicado	em	2007)	pelo	antropólogo	Júlio	Cezar	Melatti	 (2007).	Preste	bem	atenção,	
acadêmico,	 este	 autor	 procurou	 traçar	 uma	 genealogia	 da	 formação	 do	 campo	 da	
antropologia	brasileira	destacando	três	principais	períodos	dos	estudos	antropológicos	
no	Brasil:	o	primeiro	reconstrói	os	trabalhos	produzidos	até	1930,	o	segundo	momento	
se	dá	a	partir	de	1930	e	vai	até	1960	e	o	terceiro	momento	é	aquilo	que	vem	após	1960	e	
chega	aos	anos	1980	período	de	escrita	e	publicação	do	referido	artigo.
Nesse	primeiro	momento	destacado	por	Melatti	(2007),	 isto	é,	até	os	anos	1930,	a	
antropologia	brasileira	ainda	não	era	um	campo	bem	delimitado	no	Brasil,	não	havia,	
por	 exemplo,	 uma	 formação	 acadêmica	 em	Antropologia	 e	 era	 um	momento	 em	que	
começava	a	surgir	como	um	subcampo	das	ciências	humanas	na	Europa.	Parte	curiosa	do	
registro	de	material	que	serviria	aos	estudos	antropológicos	começa	com	uma	grande	
contribuição	de	viajantes,	cronistas,	missionários	e	de	outros	profissionais	como	médicos,	
militares,	 juristas	 e	 engenheiros	 que	 interessados	nos	 relatos	 compartilhados	de	 viagens	
passavam	a	descrever	aspectos	dessas	experiências.	Seus	relatos	serviram	como	material	
de	pesquisa	documental	para	os	antropólogos	e	outros	estudiosos.
Esses	 pesquisadores,	 quase	 todos	 autodidatas	 em	Antropologia,	 a	
par	de	 seus	 levantamentos	a	 respeito	de	 índios,	negros,	 sertanejos,	
mostravam	na	maior	parte	dos	casos	um	certo	 interesse	no	destino	
das	 populações	 que	 estudavam	e	 seu	 lugar	 na	 formação	 do	 povo	
brasileiro,	 cujo	 futuro	 era	 objeto	 de	 suas	 preocupações	 (MELATTI,	
2007,	p.	5).
76
O romance de Daniel Defoe, Robinson Crusoé, é considerado um marco cronológico e 
conceitual na definição da modernidade. A obra, publicada em 1719, concentra diversas 
características da Era Moderna (1453-1789) e é sempre lembrada como uma referência 
para entender o contexto de transição para a Modernidade. Além disso, para nossos 
interesses aqui do livro é um exemplo interessante das contribuições da literatura e dos 
relatos de viagem como fontes para interpretação do mundo social. São duas dicas em 
uma, o romance foi recentemente reeditado e ganhou uma versão belíssima da Editora 
Ubu (https://www.ubueditora.com.br/robinson-crusoe.html).
DICA
E, em 1954 também ganhamos uma produção cinematográfica (dirigida por Luis Buñuel, 
México, Estados Unidos, 1954. Drama/Aventura), a qual você poderá assistir em: https://bit.
ly/3Kxb4k4.
SINOPSE: a história clássica de Robinson Crusoé, um homem que foi arrastado para 
uma ilha deserta depois de um naufrágio. O único filme de Luis Buñuel financiado por 
um estúdio americano.
PREMIAÇÕES E FESTIVAIS
Venice Film Festival 1954.
Academy Awards 1955 | Nomeado: Best Ator in a Leading Role.
Locarno International Film Festival 1960.
BAFTA Awards 1955 | Nomeado: Best Film from any Source.
Fonte: https://bit.ly/3CIZAIu. Acesso em: 30 ago. 2022.
Figura – Contribuições da literatura
Alguns	 desses	 colaboradores	 que	 serão	 lembrados	 por	 Melatti	 (2007)	 são	
Roquette	 Pinto,	 Nina	 Rodrigues,	 Sílvio	 Romero	 e	 Euclides	 da	 Cunha.	 Estes	 autores	
contribuíram	 com	 registros	 a	 respeito	 dos	 povos	 indígenas,	 negros	 e	 sertanejos	 no	
período	 que	vai	 do	 final	 do	 século	 XIX	 ao	 início	 do	 século	 XX,	 tendo	 como	 principal	
afinidade	teórica	compartilhada	entre	eles	o	uso	das	teorias	de	“determinismo	geográfico”	
e	“determinismo	biológico”	para	pensar	a	formação	da	nação	brasileira.
https://bit.ly/3CIZAIu
77
Esses	 autores	 foram	 duramente	 criticados	 por	 afirmarem	 em	 seus	 argumentos	
a	 hierarquia	 entre	 raças,	 estabelecendo	 que	 haveria	 sociedades	 superiores	 e	 outras	
inferiores,	no	caso	brasileiro	o	argumento	elaborado	por	eles	afirmava	que	a	formação	da	
nossa	 sociedade	com	base	na	mestiçagem	seria	 ruim	para	o	país,	 pois	 apartir	 dessa	
mistura	aquelas	características	associadas	à	raça	negra	ou	indígenas	eram	vistas	como	
prejudiciais	e	inferiores	em	relação	ao	branco,	muitos	pesquisadores	brancos	reforçavam	
esses	 estereótipos	 com	 teorias	 racialistas	 que	 tenderia	 enfatizar	 as	 supremacias	
genéticas	 de	 uns	 grupos,	 grupos	 brancos,	 sobre	 outros,	 negros	 e	 indígenas,	 e	 tal	
premissa	estava	 inspirada	em	teorias	racialistas	europeias	que	viam	na	mestiçagem	um	
bloqueio	ao	desenvolvimento	da	nação.
A	 rigor	o	conceito	de	mestiçagem	ou	miscigenação	 refere-se	aos	processos	de	
mistura	ou	composição	racial	entre	diferentes	raças,	etnias	e	culturas.	Sobre	o	termo	
você	poderá	aprofundar	sua	leitura	a	partir	das	contribuições	de	Sergio	Costa	(2001):
No	 presente	 contexto,	 só	 pode	 ser	 apresentado	 com	 o	 status	 de	
hipótese	é	que	a	mestiçagem,	como	 ideologia	de	Estado,	deixa	de	
existir	 no	 Brasil	 contemporâneo,	 verificando-se	 que	 elementos	
essenciais	desse	construto	político	são	crescentemente	colocados	
em	questão.	Trata-se	aqui	da	busca	de	novos	canais	de	expressão	de	
identidades	culturais	e	da	redescoberta	de	raízes	étnicas,	ofuscadas	
ou	neutralizadas	no	período	de	vigência	da	 ideologia	da	mestiçagem.	
A	 observação	 das	 transformações	 no	 espaço	 público	 brasileiro	
nas	 últimas	 três	 décadas	 evidencia	 um	 processo	 de	 pluralização	
cultural	 e	 política	 expresso	 em	 desenvolvimentos	 muito	 variados,	
destacando-se	 entre	 esses:	 etnicização	 de	 muitas	 identidades	
políticas,	 vertiginoso	 crescimento	 do	 associativismo	 étnico,	 um	 novo	
direito	indígena	que	pressupõe	não	mais	uma	paulatina	assimilação	
dos	grupos	indígenas	mas	a	permanente	preservação	de	suas	formas	
de	vida.	Detalhasse	três	fenômenos	particularmente	representativos	
de	tais	transformações	(COSTA,	2001,	p.	149).
Além	 disso,	 conforme	 explica	 o	 pesquisador	 Flávio	 Raimundo	 Giarola,	 essas	
teorias	 foram	 amplamente	 compartilhadas	 e	 difundidas	 por	 meio	 da	 ciência	 que	
“recebeu	largo	espaço	no	Brasil,	questionando	e	disputando	espaços	inclusive	com	a	
religião	e	a	 Igreja,	até	então	grandes	fontes	dos	discursos	fechados”	e	“competentes	da	
época”,	afirma	o	pesquisador	da	Universidade	Federal	de	São	João	del-Rei	(UFSJ),	no	
artigo	 “Racismo	 científico:	 o	 legado	 das	 teorias	 bioantropológicas	 na	 estigmatização	 do	
negro	como	delinquente”.
O	que	se	observa	entre	as	críticas	elaboradas	sobre	essa	abordagem	precon-
ceituosa	e	limitada	é	que	essas	ideias	vão	produzir	um	conjunto	de	interpretações	distor-
cidas	de	pessoas	negras	e	indígenas,	compartilhadas	por	meio	de	“exposições	antropo-
lógicas”,	nas	quais	indígenas	e	negros	eram	transportados	de	suas	terras	originárias	
e	 levados	para	espaços	de	exposição	publicas	onde	eram	exibidos	publicamente,	como	
mostra	a	imagem	a	seguir.
78
Figura 2 – Exposições públicas
Fonte: https://bit.ly/3pSk3Tw. Acesso em: 21 ago. 2022.
Sobre as teorias racialistas você pode ler este interessante artigo:
• COSTA, S. A mestiçagem e seus contrários – etnicidade e 
nacionalidade no Brasil contemporâneo. Tempo Social – Rev. 
Sociol, S. Paulo, v. 13, n. 1, p. 143-158, maio 2001.
IMPORTANTE
A	 rigor,	 o	 único	 dentre	 os	 citados	 que	 não	 compartilhava	 dessa	 visão	
estereotipada	da	mestiçagem	era	Roquette	Pinto,	pois	em	sua	argumentação	a	mistura	
entre	raças	poderia	fornecer	o	melhor	de	cada	uma	delas	para	a	formação	do	país,	da	
nação	brasileira.	Nesse	sentido,	cabe	ainda	destacar	que	Pinto	atribuía	força	explicativa	
ao	 argumento	 de	 que	 a	 educação	 estabeleceria	maior	 contribuição	 social	 do	 que	 a	
eliminação	de	raça.
Nina	Rodrigues,	por	outro	lado,	reforçava	a	hierarquia	afirmando	a	supremacia	
racial	 branca	 como	 superior	 e	 atribuindo	 aos	 negros	 um	 perfil	 inferior,	 seus	 trabalhos	
serviram	 para	 reforçar	 estereótipos	 racializados	 negativos	 sobre	 pessoas	 negras	 e	
será	 duramente	 criticado	 por	 suas	 posições.	 Os	 problemas	 sociais	 do	 Brasil	 eram	
explicados	 com	 bases	 nessas	 teorias	 racialistas	 que	 atribuíam	 aos	 próprios	 negros,	
indígenas	e	sertanejos	a	responsabilidade	pelas	desigualdades	e	as	condições	sociais	
que	vivenciavam	sem	considerar	os	impactos	do	processo	escravocrata,	da	colonização	
e	 da	 ausência	 de	 um	projeto	 político	 que	 de	 fato	 abrigasse	 a	 diversidade	 de	 povos,	
culturas	e	formas	de	vida	da	nação	brasileira.
Agora,	 acadêmico,	 veja	 que	 o	 determinismo	 geográfico	 é	 uma	 teoria	 elaborada	
pelo	geógrafo	alemão	Friedrich	Ratzel	[1882]	(MORAES,	1994),	que	afirma	que	as	condições	
espaciais,	isto	é,	geográficas,	exercem	influência	das	características	pessoais	de	um	grupo	
social.	O	determinismo	biológico	parte	de	outro	pressuposto	que	afirma	que	as	características	
79
genéticas	definem	as	capacidades	físicas,	psicológicas	e	biológicas	de	um	ser	humano	de	
acordo	com	o	grupo	ao	qual	pertence	(etnia).	Ambos	se	assemelham	por	afirmarem	que	as	
diferenças	culturais	podem	ser	explicadas	pela	origem	genética,	isto	é,	biológica.
Contestando	essa	abordagem,	o	antropólogo	brasileiro	Roque	de	Barros	Laraia	
(2001)	afirmou	que	qualquer	criança	poderá	ser	educada	em	qualquer	cultura,	tendo	
uma	situação	em	que	possa	ser	socializada	e	ter	acesso	ao	aprendizado.	Com	isto,	o	
autor	 reforça	o	argumento	de	que	as	diferenças	de	comportamento	entre	as	pessoas	
não	são	determinadas	biologicamente,	mas	devem	ser	entendidas	antes	de	tudo	pela	
história	cultural	de	cada	um.	O	comportamento	do	ser	humano	depende	de	um	processo	de	
enculturação,	isto	é,	um	processo	de	aprendizado	social.	Não	é	a	raça	que	determina	o	
comportamento,	mas	o	processo	de	aprendizagem	cultural.
Sabemos	 que	 as	 teorias	 deterministas	 têm	 um	 componente	 racista	 em	 sua	
elaboração,	assim,	muitos	antropólogos	contestaram	tais	pressupostos,	o	antropólogo	Franz	
Boas	 (2004;	 2010),	 por	 exemplo,	 critica	 veementemente	 essas	 afirmações	 deterministas	
apresentando	dados	empíricos	de	suas	pesquisas	em	que	mostrará	que	há	uma	diversidade	
cultural	muito	mais	ampla	e	que	pode	ser	vista	empiricamente	quando	enxergamos	práticas	
diferentes	entre	grupos	sociais	que	vivem	em	localidades	geográficas	parecidas,	exemplar	
disso	são	os	grupos	distintos	como	os	esquimós	e	os	lapões.
No	Brasil,	Gilberto	Freyre	será	lembrado	como	um	autor	que	supera	essa	visão	das	
teorias	deterministas	após	a	publicação	da	obra	clássica	Casa Grande & Senzala	em	1933.
Freyre	havia	convivido	com	Franz	Boas	em	sua	passagem	pela	Universidade	de	
Columbia,	seu	argumento	vai	no	sentido	inverso	ao	dos	autores	filiados	ao	“determinismo”	
quando	afirmou,	a	partir	de	uma	análise	do	processo	histórico	de	formação	do	Brasil,	
que	 a	miscigenação	 não	 representava	 atraso	 ao	 desenvolvimento	 do	 país,	 mas	 um	
componente	 rico	de	diversidade	cultural	 em	que	as	 três	 raças	contribuem	de	 forma	
virtuosa	para	a	integração	do	país.
Em	1936,	Freyre	publicou	outro	 importante	 livro Sobrados e Mucambos,	no	qual	
analisa	as	contribuições	culturais	particulares	dessa	matriz	de	formação	do	Brasil	que	
é	 definida	 pelos	 seus	 processos	 históricos	 e	 pela	 interação	 dessas	 diferentes	 raças.	
Mais	tarde	este	autor	também	será	criticado	pelo	excesso	de	romantização	dessa	teoria	
da	harmonia	entre	as	“três	raças”	(indígenas,	negros	e	brancos),	a	principal	crítica	ao	
pensamento	deste	autor	está	no	fato	dele	não	reconhecer	as	implicações	do	racismo	
na	 sociedade	 brasileira	 ao	 camuflar	 essas	 desigualdades	 com	uma	visão	 “romanceada”	
baseada	 numa	 hierarquia	 entre	 brancos	 e	 não	 brancos	 (negros	 e	 indígenas).	 No	
presente,	não	deixa	de	ser	interessante	olhar	para	as	contribuições	de	Gilberto	Freyre	a	
partir	da	perspectiva	de	Silvio	Almeida	(2018)	que	nos	convida	a	imaginar	o	futuro	do	
Brasil	livre	de	racismo,	respeitando	os	povos	indígenas	e	convivendo	harmoniosamente	
na	construção	de	uma	nação	que	respeita	a	diversidade	e	enaltece	a	construção	dessa	
integração	interracial.
80
Muita	 informação	 interessante	atéaqui,	não	é,	acadêmico?	Mas	não	para	por	
aí,	voltemos	nosso	olhar	para	essas	etapas	de	formação	da	antropologia,	 localizando	os	
estudos	 clássicos	do	 campo.	Na	continuidade	do	que	é	proposto	por	Melatti	 (2007)	 o	
segundo	período	definido	é	aquele	que	vai	de	1930	até	1960	e	é	considerado	um	marco	
para	 a	 profissionalização	 da	 área,	 isto	 porque	 foi	 nesse	 período	 que	 a	 Antropologia	
passou	a	ser	uma	área	das	Ciências	Sociais	e	um	campo	de	estudos	com	formação	
acadêmica.
No	ano	de	1934	a	Faculdade	de	Filosofia,	Ciências	e	Letras	do	Brasil	foi	criada	
na	 Universidade	 de	 São	 Paulo	 (USP).	 Entre	 seus	 quadros	 profissionais	 destacam-se	
os	nomes	de	Claude	Lévi-Strauss,	Roger	Bastide	e	Emílio	Willems.	As	Ciências	Sociais	
estavam	em	pleno	desenvolvimento	na	época,	 no	mesmo	ano	a	Escola	de	Sociologia	
e	 Política	 também	 foi	 fundada,	 destacando-se	 entre	 seus	 professores	 os	 nomes	 de	
Donald	Pierson	e	Herbert	Baldus.
Conforme	destacado	por	Melatti	(2007,	p.	11)	“sem	dúvida	foi	em	São	Paulo,	pelo	
número	de	professores,	pelo	número	de	alunos	e	pelo	espírito	de	renovação,	o	principal	
foco	de	 irradiação	da	Etnologia	nesse	período”.	Além	dessas	escolas,	 fora	do	espaço	
acadêmico	universitário,	foram	criadas	em	1937	a	Sociedade	de	Etnografia	e	Folclore	e	em	
1941	a	Sociedade	Brasileira	de	Antropologia	e	Etnologia.
Na antropologia falamos em etnologia para nos referir aos estudos que se dedicam à 
análise de situações sociais e documentos registrados pela etnografia de forma detalhada 
para descrever grupos sociais, etnias ou culturas de um povo de forma comparada. A 
etnografia estuda um grupo particular em minucia, enquanto a etnologia se serve de 
diferentes etnografias para realizar um estudo comparado desses dados etnográficos das 
diferentes sociedades. A Etnologia tem um interesse maior sobre o estudo de sociedades 
consideradas “nativas”, como os povos indígenas de diferentes partes do mundo, povos 
africanos ou povos asiáticos, por exemplo. Você pode aprofundar um pouco mais as 
perspectivas em etnologia a partir da conferência realizada em 29 de agosto de 1994 na 
Faculdade de Ciências e Letras de Assis, com promoção do Programa de Pós-Graduação 
em História com a conferencista: Joanna Overing (Escola de Economia – Universidade de 
Londres). A antropóloga Joanna Overing apresenta uma palestra sobre 
a sociedade indígena Piaroa, cuja área se estende pela Amazônia, 
Venezuela e Colômbia. Joanna fala da cultura desse povo e como 
eles veem o homem branco. Também fala da importância da 
cosmologia e a cosmovisão promovida dentro daquele 
grupo. Este vídeo integra o acervo audiovisual do Centro de 
Documentação e Apoio à Pesquisa (CEDAP) da Faculdade 
de Ciências e Letras de Assis (UNESP-FCL). O conteúdo pode 
ser acessado na íntegra por meio de solicitação. 
Acesse: http://www.assis.unesp.br/#!/cedap.
Você pode fazer uma visita virtual ao Museu de Arqueologia 
e Etnologia da Universidade de São Paulo clicando nesse link: 
https://mae.usp.br/.
INTERESSANTE
https://www.youtube.com/redirect?event=video_description&redir_token=QUFFLUhqbjE4SVJfM0JmZkRXWEtDT0VQMENTbjlXYVRaZ3xBQ3Jtc0tuRVJzdFg5UXZZUTQ3QTUyWTljMk8ySXVMN2M4RXZpZnFOR0p1SWtKSDR2ZTNHVnZPenNzbWszNEpoMk8xeURuQTRYdkM0cWo3QWlKZE1PU1VZc1hSYm5jbGh2VDBvbTVSMUdVWDRoVi1hRFBrb0hmOA&q=http%3A%2F%2Fwww.assis.unesp.br%2F%23%21%2Fcedap&v=MyC3r4w3kYE
https://mae.usp.br/
81
É	a	partir	da	década	de	 1930	que	há	uma	forte	 influência	de	estudos	norte-
americanos	no	país	com	a	vinda	de	antropólogos	do	calibre	de	Ruth	Landes,	Charles	
Wagley	 e	 Donald	 Pierson.	A	 chegada	 desses	 pesquisadores	 influenciará	 fortemente	 o	
campo	da	antropologia	no	Brasil	até	o	final	da	década	de	1960.	Esses	autores	contribuem	
para	 fortalecer	 perspectivas	 teóricas	 e	 metodológicas	 por	 meio	 de	 estudos	 sobre	
mudança	social,	mudança	cultural	e	processos	de	aculturação.	De	acordo	com	Melatti	
(2007,	 p.	 13),	 estes	 antropólogos	 ampliaram	 a	 pesquisa	 em	 grupos	 de	 comunidade.	
“[...]	tiveram	por	objeto	tanto	a	população	negra,	como	os	grupos	indígenas,	bem	como	
imigrantes	europeus	e	asiáticos	e	seus	descendentes	e	ainda	a	população	de	áreas	de	
povoamento	antigo	e	economicamente	estagnadas”.
Todavia,	a	década	mais	importante	para	nossa	abordagem	aqui	neste	livro	é	a	
década	de	1940,	pois,	segundo	Melatti	(2007),	os	estudos	chamados	de	“aculturação”	
envolvendo	 as	 relações	 entre	 indígenas	 e	 brancos	 são	 um	 marco	 para	 época	 por	
utilizar	 a	 teoria	 funcionalista	para	 estudar	 a	 cultura	 indígena	em	sua	 totalidade,	 a	 partir	
principalmente	da	sua	organização	social,	sua	religião	e	sua	cosmologia.
Dentre	os	principais	autores	desse	período	destacam-se	Charles	Wagley,	Eduardo	
Galvão	 e	 Egon	Schaden.	Nessa	 época,	 os	 trabalhos	 de	 pesquisa	 desses	 antropólogos	
caracterizavam-se	pelo	circuito	de	expedições	que	tinham	por	finalidade	abranger	o	maior	
número	possível	de	territórios	e	diferentes	grupos	indígenas	(MELATTI,	2007).
Entretanto,	veja	bem,	acadêmico,	conforme	aponta	Melatti	(2007)	tinham	grupos	
de	pesquisadores	que	estavam	interessados	em	estudar	a	população	negra,	também	
nesse	período,	alguns	deles	são	Roger	Bastide,	Edson	Carneiro,	Ruth	Landes	e	Arthur	Ramos,	
cujo	interesse	de	pesquisa	estava	focado	na	análise	das	práticas	culturais	africanas	que	
continuaram	a	existir	no	Brasil,	 após	o	processo	colonial	de	escravização.	Para	estes	
autores,	mesmo	enfrentando	o	deslocamento	forçado	com	a	perda	de	várias	referências	
de	sua	própria	cultura	de	origem	em	detrimento	da	alta	exposição	às	crenças	e	valores	
culturais	do	grupo	dominante,	ainda	era	possível	encontrar	traços	culturais	africanos	
presentes	nas	práticas,	valores	e	hábitos	desses	remanescentes.
É	nesse	contexto	de	pesquisa	e	nesse	período	que	os	estudos	de	antropologia	
urbana	se	cruzam	com	os	estudos	de	comunidade	por	efeitos	do	deslocamento	de	
análises	para	o	campo	das	cidades	brasileiras	onde	estarão	grupos	religiosos,	grupos	
étnicos	e	formas	de	vida	em	interação	ou	os	chamados	estudos	de	contato	interétnicos	
que	envolve	também	os	estudos	de	grupos	de	imigrantes,	exemplar	disso	são	os	estudos	
de	Emílio	Whillems	sobre	os	alemães,	os	trabalhos	de	Ruth	Cardoso	sobre	os	japoneses,	
assim	como	os	estudos	de	Eunice	Durham	sobre	os	italianos.	Esses	trabalhos	discutiam	
aculturação	a	partir	dos	estudos	de	comunidade.
Porém,	 a	 partir	 de	 1952,	 chegam	 sucessivamente	 três	 missões	 científicas	 da	
Universidade	de	Tóquio	para	estudar	os	 japoneses	e	 seus	descendentes	no	Brasil	 em	
colaboração	 com	 pesquisadores	 brasileiros.	 O	 primeiro	 a	 chegar,	 em	 1952,	 foi	 Seiichi	
Izumi,	que	volta	outra	vez	ao	Brasil	em	1955	à	frente	de	uma	equipe;	em	1957	chega	uma	
82
equipe	dirigida	por	Fumio	Tada.	Ao	mesmo	tempo	em	que	esses	pesquisadores	japoneses	
atuavam,	desenvolviam-se	os	trabalhos	de	Hiroshi	Saito,	em	colaboração	com	eles,	e,	
ainda,	os	de	Egon	Schaden	e	de	Ruth	Correia	Leite	Cardoso	(MELATTI,	2007,	p.	14-15).
Os	chamados	estudos	de	comunidade	vão	se	consolidar	entre	as	décadas	de	
1940	e	 1950,	encontrando	ainda	bastante	produção	até	a	década	de	1970.	Autores	como	
Emílio	Willems,	Oracy	Nogueira,	Donald	Pierson	e	Antônio	Cândido	são	 lembrados	como	
expoentes	desse	período,	de	acordo	com	Melatti	(2007).		Estes	estudos	empregavam	
como	atividade	de	pesquisa	 o	 convívio	 e	 a	 inserção	do	 antropólogo	na	 comunidade	
pesquisada,	 ao	 estabelecer	 essa	 relação	 de	 pesquisa	 o	 antropólogo	 teria	 uma	visão	
ampliada	e	de	maior	duração	com	a	comunidade.	Esses	estudos	foram	utilizados	como	
referência	 fundamental	 no	 desenvolvimento	 das	 etnografias	 realizadas	 em	 contextos	
urbanos,	 pesquisadores	 tomaram	 esses	 trabalhos	 como	 modelo	 metodológico	 para	
realizar	estudos	urbanos.
Roberto Cardoso de Oliveira (1928-2006) formou-se em Filosofia na Universidade de 
São Paulo (USP) no início da década de 1950, mas é na Antropologia que sua carreira 
se consolida. Seu primeiro contato com a disciplina ocorreu ainda naUSP, por meio 
das aulas ministradas pelo sociólogo Florestan Fernandes (1920-1995), que anos mais 
tarde orientaria sua tese de doutorado intitulada Urbanização e Tribalismo: a interação 
dos índios Terena em uma sociedade de classes  (1966). Após a graduação, constrói 
sua trajetória antropológica em quatro instituições: primeiramente no Museu do Índio 
em 1954, onde iniciou um trabalho junto aos índios Terena, localizados no estado do 
Mato Grosso (atual Mato Grosso do Sul), e participou dos cursos de especialização em 
Antropologia Cultural ministrados por Darcy Ribeiro (1922-1997).
Em 1958 torna-se professor no Museu Nacional, onde continua seus trabalhos em 
Etnologia, junto aos Terena e aos Ticuna, do Alto Solimões, desenvolvendo o conceito 
de fricção interétnica. Ali cria o curso de especialização em teoria e pesquisa em 
Antropologia Social, baseado em um modelo que alia dedicação integral a ensino teórico 
e prático. Posteriormente, organiza com David Maybury-Lewis (1929-2007) o Programa 
de Pós-Graduação em Antropologia Social na mesma instituição. Em 1972 transfere-se 
para a Universidade de Brasília (UnB), com a missão de criar o programa de mestrado e 
doutorado em Antropologia.
Nesse período dedica-se a outros temas de pesquisa, voltando-se para uma reflexão 
epistemológica sobre o fazer antropológico. Esse retorno à Filosofia aprofunda-se com a 
mudança e contribuição para o curso de doutorado em Ciências Sociais da Universidade 
Estadual de Campinas (Unicamp), em 1985. Seu objetivo era desenvolver uma reflexão 
sobre o fazer antropológico no Brasil e em outros países considerados “periféricos”.
Ao final da década de 1990 retorna à UnB, onde permanece trabalhando no Centro de 
Pesquisa e Pós-Graduação sobre as Américas (atualmente Departamento de Estudos 
Latino-Americanos) até a sua morte em 2006. O breve apanhado de sua trajetória 
mostra que Cardoso de Oliveira participou ativamente do processo de institucionalização 
da disciplina antropológica no país, liderando a criação de programas de mestrado e 
doutorado.
INTERESSANTE
83
É importante destacar que ele tomaria parte nos primeiros trabalhos de avaliação da 
pós-graduação na área, participando de comissões da Coordenação de Aperfeiçoamento 
de Pessoal de Nível Superior (CAPES); o antropólogo contribuiu decisivamente para o 
aprimoramento da pós-graduação no Brasil.
Este engajamento institucional veio acompanhado de intenso trabalho intelectual e 
docente, que resultou em uma significativa produção acadêmica. Seus principais livros 
publicados são: O Índio e o Mundo dos Brancos (1964), A Sociologia do Brasil Indígena 
(1972), Sobre o Pensamento Antropológico (1988) e O Trabalho do Antropólogo (1998). O 
projeto intelectual de Roberto Cardoso de Oliveira pode ser dividido em dois momentos: 
as pesquisas sobre fricção interétnica e aquelas sobre o fazer antropológico no Brasil, 
em países que denominou “centrais” e “periféricos”.
Os primeiros estudos projetam uma reflexão sobre as relações entre 
indígenas e sociedade nacional. O antropólogo propõe olhar para esse 
contato como uma disputa dos elementos da cultura a serem incorporados 
e da interdependência de recursos materiais e naturais; uma 
situação de contato entre sociedades e culturas, por meio 
de interesses opostos e interdependentes. Tal abordagem 
surge como alternativa ao conceito de aculturação, ou seja, 
da progressiva incorporação dos índios à cultura do mundo 
dos brancos, conceito então predominante no Brasil.
A abordagem política em relação às sociedades indígenas, iniciada 
pelos estudos de aculturação encontra na crítica de Cardoso de 
Oliveira um espaço para ir além da associação corrente entre política 
e dominação: ele insere aí a noção de identidade étnica pensada como 
irredutível às mudanças sociais e culturais decorrentes do contato.
Gostou da leitura, acadêmico? Se desejar continuar lendo sobre esse 
autor, confira a referência da Enciclopédia de Antropologia, onde 
consta o texto completo.
Fonte: https://bit.ly/3ASXbsf. Acesso em: 26 ago. 2022.
A	década	de	1950	será	 importante	para	os	estudos	 indígenas	e	nomes	como	
Darcy	 Ribeiro	 e	 Roberto	 Cardoso	 de	 Oliveira	 serão	 destacados	 como	 aqueles	 principais	
pesquisadores	 desse	 período,	 suas	 contribuições	 imprimem	 um	 novo	 olhar	 para	 a	
antropologia.	 Isto	 acontece	 em	 face	 dos	 trabalhos	 destes	 pesquisadores	 se	 voltarem	
para	o	uso	de	pesquisa	de	campo	etnográfica	com	trabalho	fortemente	dirigido	para	
a	análise	da	relação	e	integração	entre	povos	indígenas	e	sociedade	nacional.	Melatti	
(2007)	lembra	que	esse	período	foi	determinante	para	consolidação	da	antropologia	no	
Brasil,	mas	mais	importante	ainda	foi	para	a	agenda	de	estudos	indígenas	tornando	a	
Etnologia	um	ramo	de	pesquisa	de	grande	fôlego	na	antropologia	brasileira.
84
Figura 3 – Consolidação da antropologia no Brasil
Fonte: https://bit.ly/3pWCyGd. Acesso em: 26 ago. 2022.
Seguindo	a	abordagem	de	Melatti	 (2007),	 o	 terceiro	período	é	definido	como	
a	partir	da	década	de	1960	e	todas	as	iniciativas	institucionais	mencionadas	anteriormente	
vão	consolidar	e	impulsionar	a	produção	científica	em	diferentes	ramos	e	subáreas	da	
antropologia,	exemplo	disso	são	a	antropologia	rural	e	a	antropologia	urbana.
Em	1968	é	criado,	então,	o	Programa	de	Pós-Graduação	em	Antropologia	Social	
do	Museu	Nacional	na	Universidade	Federal	do	Rio	de	Janeiro	que	será	um	destacado	
centro	 de	 estudos	 e	 pesquisas	 com	 área	 de	 concentração	 em	 Etnologia,	 logo	 em	
seguida	no	ano	de	1971	é	criado	o	Programa	de	Pós-Graduação	em	Antropologia	Social	
da	Universidade	de	Campinas	e	em	1972	é	criado	o	Programa	de	Pós-Graduação	em	
Antropologia	Social	da	Universidade	de	Brasília.
Com	 a	 expansão	 do	 campo	 acadêmico	 os	 estudos	 de	 comunidade	 foram	
perdendo	força	e	passaram	a	dar	 lugar	para	outras	áreas	de	pesquisa	como	os	estudos	
regionais,	 com	destaque	para	 os	 estudos	 de	 campesinato,	 trabalhadores	 rurais	 e	 os	
impactos	diante	da	expansão	do	mundo	urbano	e	a	formação	de	outro	grupo	social:	os	
trabalhadores	urbanos	(MELATTI,	2007,	p.	22).
Há,	por	exemplo,	uma	mudança	de	perspectiva	teórica	entre	os	antropólogos	
dos	estudos	etnológicos,	quando	passam	a	substituir	o	estudo	da	aculturação	na	relação	
entre	 indígenas	e	brancos	pelo	estudo	da	fricção	 interétnica,	proposta	elaborada	por	
Roberto	Cardoso	de	Oliveira	(1962,	p.	86).
Chamamos	 ‘fricção	 Inter	 étnica’	 o	 contato	 entre	 grupos	 tribais	 e	
segmentos	 da	 sociedade	 brasileira,	 caracterizados	 por	 seus	 aspectos	
competitivos	e,	no	mais	das	vezes,	conflitais,	 assumindo	esse	contato	
muitas	vezes	proporções	‘totais’,	i.e.,	envolvendo	toda	a	conduta	tribal	
e	não	 tribal	 que	passa	a	 ser	moldada	pela	 situação	de	 fricção	 Inter	
étnica.
85
	Assim,	não	era	mais	o	interesse	da	perda	de	traços	e	da	identidade	indígena	no	
contato	com	o	branco,	agora	a	etnologia	interessava-se	por	evidenciar	os	conflitos	entre	
valores	dissonantes	dos	indígenas	e	da	sociedade	nacional.	Em	1960,	Roberto	Cardoso	
de	Oliveira	publicou	seu	livro	“O	processo	de	assimilação	dos	Terena”,	em	seguida,	em	
1964,	publicou	“O	Índio	no	Mundo	dos	Brancos:	a	situação	dos	Tukúna	do	Alto	Solimões”	
e,	logo	depois,	“Identidade,	etnia	e	estrutura	social”	(1976).	Estas	obras	representam	um	
marco	para	os	estudos	etnológicos	com	foco	na	análise	da	presença	de	indígenas	na	
sociedade	nacional.	Essa	subárea	de	pesquisa	vai	influenciar	fortemente	a	atuação	dos	
antropólogos	na	defesa	dos	direitos	indígenas,	fazendo	do	seu	trabalho	de	pesquisa	uma	
fonte	de	produção	de	conhecimento	das	necessidades,	direitos	e	demandas	 indígenas.	
Ainda	nos	anos	de	1960	o	antropólogo	Roberto	Cardoso	de	Oliveira	(1963)	introduz	uma	
nova	maneira	de	realizar	pesquisa	no	Brasil	a	partir	do	projeto	“Estudo	de	áreas	de	fricção	
interétnica	no	Brasil”,	no	qual	o	pesquisador	vai	 investir	nas	 relações	entre	as	sociedades	
indígenas	e	a	sociedade	nacional.	A	noção	de	poder	ganha	visibilidade	na	elaboraçãode	pesquisas	sobre	povos	indígenas	levando	em	conta	as	posições	de	dominação	e	de	
subordinação	 que	 tomam	os	membros	 das	 sociedades	 em	 contato,	 o	 conflito	 entre	 as	
técnicas,	regras,	valores	das	mesmas	sociedades	colocados	em	perspectiva.
Na	década	de	1970	a	atuação	da	ABA	passa	a	se	intensificar	no	trabalho	com	a	
atuação	no	mundo	acadêmico	e	na	mobilização	de	direitos	e	interesses	de	populações	
indígenas,	isto	porque	os	estudos	antropológicos	realizados	com	populações	indígenas	foi	
um	importante	instrumento	que	combinou	o	conhecimento	científico	com	a	luta	social	
para	 defender	 direitos	 dessas	 populações,	 “como	 demarcação	 de	 terras,	 assistência	
médica,	instrução,	administração	direta	pelos	índios	de	sua	produção	para	mercado	e	
outros”	(MELATTI,	2007,	p.	24).
Será	nesse	período	que	os	estudos	de	estrutura	social	das	sociedades	indígenas	
com	uso	da	teoria	estruturalista	ganham	força	com	a	contribuição	de	David	Melbury-Lewis	
Projeto	Harvard-Brasil	Central	que	estabelecia	parceria	entre	a	Universidade	de	Harvard	e	
o	Programa	de	Pós-Graduação	em	Antropologia	Social	do	Museu	Nacional	(PPGAS/MN).
A	 influência	desse	projeto	se	dá	na	realização	das	pesquisas	em	que	“há	um	
esforço	 no	 sentido	 de	 captar	 os	 modelos	 nativos,	 a	 fim	 de	 também	 submetê-los	 à	
interpretação	geral	do	pesquisador”	 (MELATTI,	2007,	p.	26).	De	acordo	ainda	com	este	
autor,	alguns	pesquisadores	como	Roque	Laraia,	Júlio	Cezar	Melatti	e	Roberto	DaMatta	
fizeram	parte	desse	projeto.	 Inclusive,	a	teoria	estruturalista	vai	fornecer	uma	nova	base	
conceitual	com	o	foco	nos	estudos	de	mitos	e	ritos	que	será	utilizada	pelo	antropólogo	
Roberto	 DaMatta	 para	 refletir	 sobre	 a	 sociedade	 brasileira	 em	 seu	 livro	 “Carnavais,	
malandros	e	heróis”	publicada	pela	primeira	vez	em	1979.
Pretendia-se	 chegar	 a	 uma	 visão	 geral	 da	 sociedade	 brasileira	
através	 da	 soma	 de	 muitos	 exemplos	 distribuídos	 pelas	 diversas	
regiões	 do	 Brasil.	 Além	 desse	 objetivo	 geral,	 tais	 estudos	 estavam	
quase	 sempre	voltados	para	 objetivos	 específicos,	 como	mudança	
cultural,	 persistência	 da	 vida	 tradicional,	 problemas	 de	 imigrantes,	
educação	e	vários	outros	(MELATTI,	2007,	p.	18).
86
Para	 finalizar	 este	 subtópico,	 é	 importante	 que	 você,	 acadêmico,	 lembre-
se	que	até	a	década	de	1970	a	realização	de	pesquisas	em	pequenas	cidades	utilizando	
uma	abordagem	qualitativa	com	observação	direta	vai	continuar	alimentando	o	campo	
da	 antropologia	 com	 os	 estudos	 de	 comunidade,	 tendo	 inclusive	 forte	 influência	 sobre	
pesquisas	em	sociedades	indígenas,	conforme	apontado	por	Júlio	Cezar	Melatti.
Atualmente, estima-se que existam 305 povos indígenas do Brasil, o que significa 0,4% da 
população e aproximadamente 900.000 pessoas, segundo o Censo de 2010. Usamos o 
termo “povos indígenas” para fazer referência ao grupo de pessoas que são descendentes 
dos povos que habitavam o Brasil quando houve a invasão europeia. Naquela época 
contabilizavam-se sete milhões de indígenas de várias etnias. Há uma diversidade de povos 
indígenas e os guajajaras e os guaranis são os maiores grupos.
Observe, acadêmico, que usei o termo “povos indígenas” de forma proposital, pois o termo 
"índio" tem cada vez mais entrado em desuso, isto acontece porque há uma compreensão 
de que o termo “índio” reforça estereótipos e os próprios indígenas articulam uma crítica 
ao uso desse termo, pois se sentem aprisionados numa compreensão distorcida de si 
mesmos e que reforça desigualdades e a negação de sua identidade e sua pluralidade. 
Os povos indígenas fazem parte também dos povos e comunidades tradicionais”, que se 
refere aos povos que ocupam ou reivindicam seus territórios com base na sua ocupação 
permanente ou temporária, por isso “territórios tradicionalmente ocupados”.
Os membros dessas comunidades tradicionais têm uma forma de vida própria e em geral 
diferente daquela encontrada na sociedade nacional, isto que caracteriza esses grupos 
como aqueles detentores de uma identidade e de direitos que lhes são próprios. Para 
você ter uma ideia dessa diversidade observe as contribuições do etnólogo alemão Curt 
Nimuendajú (1883-1945) que foi considerado o pai da etnologia brasileira. A seguir, você 
encontra um recorte do famoso Mapa Etno-Histórico do Brasil e Regiões Adjacentes, 
elaborado por ele e que dá uma dimensão dessa diversidade dos povos indígenas.
INTERESSANTE
Fonte: https://bit.ly/3wJanOV. Acesso em: 26 ago. 2022.
87
VERSÃO DIGITAL DO MAPA ETNO-HISTÓRICO DE NIMUENDAJÚ
Iphan	com	colaboração	do	Museu	Goeldi
Em	2017,	houve	o	lançamento	de	uma	reedição	do	Mapa	Etno-Histórico	do	
Brasil	e	Regiões	Adjacentes,	de	Curt	Nimuendajú	e	versão	digital	do	mapa	original.	O	
lançamento	do	mapa	fez	parte	da	programação	do	aniversário	de	80	anos	do	Iphan.	
Veja	o	texto	da	Agência	Museu	Goeldi,	que	fala	do	etnólogo,	sua	produção	e	o	mapa.
Agência	 Museu	 Goeldi	 –	 Uma	 das	 mais	 célebres	 obras	 cartográficas	
produzidas	 no	Brasil,	 e	 considerada	 um	marco	 dos	 estudos	 das	 línguas	 e	 culturas	
indígenas,	estará	disponível	na	internet	a	partir	do	dia	27	de	setembro,	no	portal	do	
Instituto	do	Patrimônio	Histórico	e	Artístico	Nacional	(Iphan).
São	mais	de	900	referências	sobre	etnias	e	línguas	indígenas,	coletadas	entre	
os	séculos	XVI	e	XX,	e	catalogadas	em	1943	no	Mapa	Etno-Histórico	do	Brasil	e	Regiões	
Adjacentes	pelo	etnólogo	alemão	Curt	Unckel,	conhecido	mundialmente	como	Curt	
Nimuendajú.	 “Curt	Nimuendajú	desenhou,	 à	nanquim,	 três	versões	não	 idênticas	para	
o	mapa-etnográfico.	A	primeira	versão	 foi	 elaborada	para	 a	Smithsonian	 Institution	
(EUA),	em	1942;	a	segunda,	em	1943,	para	o	Museu	Paraense	Emílio	Goeldi	(Belém	–	
BR),	a	pedido	de	Carlos	Estevão	de	Oliveira;	e	a	última	versão,	provavelmente	a	mais	
completa,	foi	traçada	em	1944	para	o	Museu	Nacional	(RJ	–	BR).
“Acho	 uma	 iniciativa	 louvável	 disponibilizar	 na	 internet	 este	 trabalho	
grandioso,	 meticuloso	 e	 que	 exigiu	 de	 seu	 construtor	 profundos	 conhecimentos	
de	Etnologia,	de	História,	de	localização	de	povos	indígenas	e	seus	deslocamentos	
pelo	Brasil	da	época.	Com	certeza,	contribuirá	e	muito	com	a	pesquisa	nas	áreas	
de	antropologia,	etnologia,	história	e	tantas	outras	áreas	afins”,	destaca	a	pesquisadora	
da	Coordenação	de	Ciências	Humanas	do	Museu	Goeldi,	Alegria	Benchimol,	que	há	
anos	se	dedica	ao	estudo	e	documentação	do	acervo	etnológico	do	Goeldi.
Figura – Monumento à Curt Nimuendajú no Parque Zoobotânico do Museu Goeldi
http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4784439Z7
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Utilizando	a	técnica	de	restauração	digital,	a	versão	original	do	mapa,	que	
mede	quatro	metros	quadrados,	foi	fotografada	quadrante	por	quadrante,	em	alta	
resolução.	Com	isso,	será	possível,	na	versão	digital,	visualizar	as	 informações	em	
tamanho	ainda	maior	que	em	sua	versão	física.	Além	da	versão	digital	do	mapa,	será	
lançada	também	uma	edição	 revisada	e	ampliada	da	obra	–	um	mapa	e	um	 livro	
(impresso	e	digital).
	A	digitalização	do	mapa	é	parte	do	projeto	Plataforma Interativa de Dados 
Geo-Históricos, Bibliográficos e Linguístico-Culturais da Diversidade Linguística no 
Brasil,	realizado	pela	Universidade	Federal	do	Pará	(UFPA)	e	pelo	Iphan,	por	meio	da	
equipe	técnica	do	Inventário	Nacional	da	Diversidade	Linguística	do	Departamento	do	
Patrimônio	Imaterial	(INDL/DPI/Iphan).
Um	dos	 objetivos	do	projeto	 é	 utilizar	 novas	 tecnologias	 da	 informação	e	
da	comunicação	para	promover	o	acesso	a	conteúdo	como	a	restauração	digital	do	
mapa	original,	a	versão	digital	na	 íntegra	dos	documentos	históricos	e	etnográficos	
mencionados	por	Curt	Nimuendajú,	além	de	mapas	e	informações	contemporâneas	
da	diversidade	linguística	no	Brasil.
Os	coordenadores	editoriais,	Marcus	Vinicius	Carvalho	Garcia	(Iphan)	e	Jorge	
Domingues	 Lopes	 (UFPA),	 contam	 que	 lançar	 a	 publicação	 de	 uma	 nova	 edição	
do	 Mapa	 Etno-Histórico	 do	 Brasil	 e	 Regiões	 Adjacentes	 e	 disponibilizar	 a	 versão	
digitalizadado	 original	 na	 internet	 é	 tornar	 acessível	 à	 sociedade	 um	 dos	 mais	
importantes	documentos	etnográficos	produzidos	no	Brasil.	A	 reedição	apresenta	
uma	 revisão	 completa	do	documento,	 contendo,	 inclusive,	 pequenos	 ajustes	que	
foram	identificados	no	processo	de	pesquisa.
A	publicação,	 de	 120	páginas,	 está	organizada	em	forma	de	coletânea,	 com	
textos	que	servem	como	guias	para	a	 leitura	do	mapa.	O	projeto	conta	com	o	apoio	
técnico	e	institucional	do	Museu	Paraense	Emílio	Goeldi,	Museu	Nacional	da	Universidade	
Federal	do	Rio	de	Janeiro	(UFRJ)	e	Instituto	Brasileiro	de	Geografia	e	Estatística	(IBGE).
Figura – Curt Nimuendajú e o Mapa Etno-Histórico
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Curt	Nimuendajú	e	o	Mapa	Etno-Histórico	–	Curt	Unckel	(1883-1945)	nasceu	
na	cidade	alemã	de	Jena	e	tornou-se	etnólogo	a	partir	da	experiência	de	contato	
e	 de	 pesquisa	 com	 povos	 indígenas	 no	 Brasil.	 Foi	 batizado	 pelos	 guaranis	 como	
Nimuendajú	(“o	que	fez	seu	assento”,	“o	que	se	estabeleceu”,	conforme	tradução	livre	
do	linguista	Aryon	Rodrigues).	Foi	um	dos	principais	pesquisadores	da	diversidade	
social	e	cultural	da	Amazônia	e,	além	de	uma	vasta	obra	intelectual,	também	produziu	
três	versões	do	mapa	etno-histórico.	Após	Nimuendajú	fixar	 residência	na	Amazônia,	
passou	a	colaborar	com	o	Museu	Goeldi,	como	pesquisador	e	curador	pioneiro	até	
seu	falecimento.	“Nimuendajú,	naturalizado	brasileiro	em	1922,	foi	considerado	como	
a	principal	figura	da	etnologia	brasileira	do	seu	tempo.
Foi	 um	 autodidata	 fecundo	 intelectualmente	 que	 se	 destinou	 a	 coletar,	
pesquisar,	 ensinar	 e	 disseminar	 os	 conhecimentos	 que	 adquiriu	 em	 40	 anos	
de	 atividades	 dedicadas	 aos	 povos	 indígenas	 do	 Brasil”,	 acrescenta	 Benchimol.	
Elaborado	artesanalmente,	o	mapa,	considerado	como	uma	obra	fundamental	para	
o	conhecimento	das	terras	baixas	da	América	do	Sul,	classifica	40	famílias	linguísticas	
e	 identifica	cada	uma	delas	com	tonalidades	ou	cores	específicas.	Para	o	antropólogo	
George	Zarur,	o	mapa	de	Nimuendajú	é	uma	obra	clássica	da	antropologia	brasileira,	
síntese	de	todo	um	conhecimento	antes	fragmentado	e	disperso.
Fonte: https://bit.ly/3crl81D. Acesso em: 26 ago. 2022.
3 OS ESTUDOS DE COMUNIDADE
Os	chamados	estudos	de	comunidade	foram	marcantes	nas	décadas	de	1940	
e	1950,	quando	os	pesquisadores	passaram	a	utilizar	o	método	de	observação	direta	
para	pesquisar	pequenas	cidades	ou	vilas	tendo	como	inspiração	os	estudos	clássicos	
da	etnologia	focados	em	sociedades	“tribais”.	Este	grupo	de	pesquisas	pensa	o	grupo	
social	como	uma	unidade	de	análise	para	apreender	uma	realidade	social.
Os	estudos	de	comunidade	foram	bastante	populares	nesse	período	por	fornecer	
uma	metodologia	que	permitiria	aos	pesquisadores	elaborar	uma	compreensão	ampliada	
da	 sociedade	 brasileira.	 A	 ideia	 central	 era	 que	 muitos	 pesquisadores	 associados	 a	 essa	
perspectiva	metodológica	poderiam	 realizar	 inúmeras	pesquisas	ao	 redor	do	Brasil	 e	
juntas	elas	forneceriam	um	olhar	sobre	o	que	define	a	sociedade	brasileira,	apontando	
suas	 diferenças,	 traços	 culturais,	 manifestações	 religiosas	 e	 estruturas	 sociais	 dos	
grupos	estudados.	Naquele	período	buscava-se	explicações	e	conceitos	que	definissem	
o	 Brasil,	 na	 perspectiva	 de	 alguns	 autores	 desse	 período	 isso	 seria	 possível	 se	 eles	
reunissem	o	maior	número	de	informações	por	meio	dos	estudos	de	comunidade	em	
todas	as	regiões	do	país.
http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4784439Z7
90
Para	além	dessa	dimensão	há	outras	que	 reúnem	esses	pesquisadores,	como	
o	interesse	no	estudo	das	mudanças	culturais	considerando	por	exemplo	a	migração	
do	campo	para	a	cidade,	os	 impactos	das	novas	 formas	de	produção	no	meio	 rural,	
a	 persistência	 da	 vida	 tradicional	 mesmo	 com	 o	 desenvolvimento	 do	 meio	 urbano,	
processos	 de	 educação,	 imigração,	 dentre	 outros.	 Estes	 estudos	 representam	 uma	
importante	 relação	 entre	 os	 estudos	 clássicos	 e	 os	 estudos	 urbanos,	 na	 definição	
proposta	por	Oracy	Nogueira,	tais	estudos	assumem:
O	sentido	 restrito	de	estudo	de	um	grupo	 local,	de	base	territorial,	
integrado	 numa	 mais	 ampla	 e	 complexa	 estrutura	 social,	 de	 que	
é	 tomado	 como	 amostra,	 pelo	 autor,	 para	 o	 conhecimento	 de	
determinadas	situações	ou	problemas.	Tais	estudos	implicam,	pois,	
a	transferência,	para	o	campo	de	 investigação	das	sociedades	mais	
complexas,	 de	 uma	 perspectiva	 metodológica	 que	 de	 há	 muito	
pouco	os	antropólogos	e	etnólogos	vinham	aferindo	e	enriquecendo,	
no	estudo	das	sociedades	mais	simples,	pré-letradas	ou	primitivas	
(NOGUEIRA,	2018,	p.	126).
Aliás,	destacamos	o	estudo	de	Oracy	Nogueira	que	trouxe	como	tema	Família 
e comunidade,	estudo sociológico de Itapetininga	 (1962),	 realizado	em	uma	cidade	do	
interior	de	São	Paulo.
Por	estudos	de	comunidades	temos	em	vista	aqueles	levantamentos	
de	 dados	 sobre	 a	 vida	 social	 em	 seu	 conjunto,	 relativos	 a	 uma	
área	 cujo	 âmbito	 é	 determinado	 pela	 distância	 a	 que	 se	 situam	
nas	 várias	 direções,	 os	 moradores	 mais	 afastados	 do	 centro	 local	
de	maior	 densidade	 demográfica,	 havendo	 entre	 os	moradores	 do	
núcleo	 central	 e	 os	 da	 zona	 circunjacente,	 assim	 delimitada,	 uma	
interdependência	direta	para	a	satisfação	de,	pelo	menos,	parte	de	
suas	necessidades	fundamentais	(NOGUEIRA,	2018,	p.	127).	
Por	 um	 lado,	 os	 estudos	 de	 comunidade	 permitiram	 um	 olhar	 em	 escala	
microssocial	 sobre	 uma	 comunidade	 específica,	mas	por	 outro	 era	 criticado	por	 não	
fornecer	uma	boa	análise	em	perspectiva	macrossocial,	conectando	as	observações	de	
um	grupo	particular	aos	problemas	e	desafios	encontrados	na	estrutura	social	nacional.	As	
comunidades	ou	grupos	sociais	estudados	poderiam	ter	alguns	poucos	habitantes	até	
aglomerados	urbanos	com	mais	de	15	mil	habitantes	urbanos,	assim	como	habitantes	de	
pequenos	aglomerados	rurais.	Inclusive	destaca-se	no	campo	da	antropologia	trabalhos	
que	investigam	a	economia	como	uma	subárea	onde	encontramos	uma	“antropologia	
rural”,	 isto	 porque	 parte	 desses	 estudos	 estavam	 interessados	 em	 compreender	 a	
agricultura,	 a	 pecuária,	 as	 atividades	 da	 indústria	 em	 ascensão	 de	 extrativismo	vegetal	
e	 animal.	 Nesse	 sentido,	 os	 estudos	 de	 comunidade	 se	 tornaram	 um	 importante	
movimento	teórico	no	Brasil	 por	estarem	engajados	no	 levantamento	de	 informações	e	
dados	de	pesquisa	da	realidade	brasileira	de	maneira	mais	ampla.
91
As	observações	diretas	poderiam	fornecer	informações	do	comportamento	social	
de	um	grupo,	qual	a	sua	linguagem	comum,	suas	atitudes,	seus	hábitos	alimentares,	suas	
práticas	religiosas,	suas	festividades,	sua	economia,	a	maneira	como	ocupam	a	terra,	
o	modo	como	se	relacionam	entre	si	e	com	os	animais	e	os	espíritos	da	floresta,	enfim,	
inúmeras	formas	de	aprender	aquela	realidade	social.	Segundo	Nogueira,	os	estudos	de	
comunidade	possibilitam	uma	diferenciação	significativa	em	relação	aos	estudos	de	grande	
escala	(com	dados	estatísticos),	pois	permitem	acessar	o	conhecimento	das	pessoas	em	
relação	às	suas	subjetividades,	seus	valores,	seus	costumes,	ampliando	a	compreensão	
dos	aspectos	interindividuais	socialmente	compartilhados.
O	próprio	Oracy	Nogueira	chama	a	nossa	atenção	para	estudos	de	comunidade	
clássicos,	são	eles:
•	 O	de	Emílio	Willems,	Cunha,	tradição	e	transição	em	uma	cultura	rural	do	Brasil,	São	
Paulo:	Diretoria	de	Publicidade	Agrícola	da	Secretaria	da	Agricultura,	1947.
•	 O	de	Lucila	Herrmann,	Evolução	da	estrutura	social	de	Guaratinguetá	num	período	de	
trezentos	anos.	Revista	de	Administração,	a.	II,	n.	5-6,	p.	1-326,	março-junho	de	1948.
•	 O	de	Donald	Pierson,	Cruz	das	Almas,	a	brazilian	village.	Washington:	Smithsonian	
Institution,	Institute	of	Social	Anthropology,	publicação	n.	12,	1951.
•	 O	de	Charles	Wagley,	Amazon	town,	 a	 study	of	man	 in	 the	 tropics.	New	York;	The	
Macmillan	Company,	1953.
 
Para	Nogueira,	os	estudos	de	comunidade	contribuíram	porser	agente	de	uma	
mudança	social	e	cultural,	mas	também	por	fornecer	uma	“visão	realista	sobre	a	vida	
dos	pequenos	e	rústicos	aglomerados	do	interior	e	da	população	rural,	mostrando	o	seu	
lado	dramático	e	humano,	seus	problemas	e	suas	dificuldades,	suas	condições	reais	e	
suas	aspirações,	seus	recursos	e	sua	experiência”	(NOGUEIRA,	2018,	p.	130).
Entretanto,	 conforme	 destacado	 por	 Julio	 Cezar	 Melatti	 (2007)	 os	 estudos	
de	 comunidade	 receberam	 algumas	 críticas	 como	 o	 fato	 de	 não	 darem	 a	 devida	
importância	 à	 análise	 dos	 documentos	 e	 registros	 históricos,	 recebendo	 uma	 crítica	
por	não	considerarem	a	análise	da	vida	social	desses	grupos	como	um	processo,	que	
pode	haver	mudanças.	Tais	críticas	ainda	apontam	para	a	dificuldade	desses	autores	
em	articular	a	dimensão	das	relações	sociais	que	existem	entre	essas	comunidades	e	a	
sociedade	nacional,	contribuindo	para	uma	visão	reducionista,	limitada	e	artificial	que	
congela	e	isola	esses	grupos	dentro	do	seu	próprio	contexto.
O	 que	 torna	 esse	 subtópico	 especial	 é	 maneira	 que	 a	 antropologia	 vai	 se	
transformando	a	partir	do	estudo	e	da	pesquisa	com	essas	populações	e	vai	modificando	
sua	perspectiva	teórica,	metodológica	e	política.
92
Pense	bem,	se	os	estudos	clássicos	focavam	no	determinismo	para	sustentar	
suas	 posições	 preconceituosas	 a	 respeito	 de	 grupos	 e	 populações	 étnicas	 que	 são	
diferentes,	 com	 o	 renovado	 olhar	 da	 investigação	 antropológica	 brasileira	 essas	
perspectivas	vão	se	mostrando	 limitadas	e	o	exercício	de	 relativismo	e	afirmação	da	
alteridade	se	coloca	em	primeiro	plano	no	fazer	antropológico.
Também	 é	 notável	 o	 fato	 de	 que	 estudos	 clássicos	 que	 davam	 ênfases	 em	
aspectos	econômicos,	políticos	e	culturais	de	grupos	indígenas	passam	a	introduzir	novas	
formas	de	olhar	para	as	relações	sociais	em	determinados	territórios	e	a	perceber	outros	
grupos	sociais	não	indígenas	presentes	nesses	contextos.	É	a	partir	desse	deslocamento	
que	os	estudos	de	populações	camponesas	se	encontram	com	os	estudos	de	etnológicos,	
mostrando	 sua	 relação,	 seus	 conflitos,	 a	 diversidade	 que	 há	 quando	 se	 considera	 o	
aspecto	regional,	pois	este	também	vai	revelar	outras	nuances	da	vida	social	em	torno	do	
conflito	de	posse	e	usos	da	terra.
A	seguir	você	terá	a	oportunidade	de	aprender	e	conhecer	um	pouco	de	alguns	
desses	 grupos	 sociais	 aqui	 mencionados,	 na	 leitura	 complementar	 você	 o	 desafio	 de	
exercitar	a	“alteridade”,	preste	bem	atenção	ao	texto	de	Horace	Miner,	nele	encontramos	
uma	rica	maneira	de	perceber	como	nossos	olhares	sobre	outro	mundo,	ou	grupo	social	
pode	ser	condicionado	e	preconceituoso.
Nos	 próximos	 tópicos	 vamos	 avançar	 um	 pouco	 mais	 em	 alguns	 desses	
estudos,	conheceremos	formas	de	uso	e	subsistência	dessas	populações,	em	seguida,	
no	último	tópico,	abordaremos	aqueles	confrontos	e	formas	de	vida	que	estão	no	nosso	
tempo,	faremos	uma	atualização	acerca	dos	estudos	das	populações	rurais	no	Brasil	
contemporâneo.
Então,	acadêmico,	aproveite	bem	as	 leituras	e	faz	uma	 revisão	 respondendo	as	
autoatividades,	nos	vemos	no	Tópico	2.
93
Neste tópico, você aprendeu:
•	 O	contexto	que	envolve	a	formação	da	Antropologia	brasileira.
•	 As	principais	pesquisas	que	contribuíram	para	a	formação	do	campo	Antropologia	Rural.
•	 Estudou	o	contexto	histórico	e	marcos	teóricos	do	campo	da	Antropologia	Rural.
•	 Aprendeu	 os	 autores	 clássicos	 e	 sua	 abordagem	 acerca	 das	 identidades	 e	
territorialidades	no	mundo	rural.
•	 Aprendeu	o	marco	dos	estudos	de	comunidade	e	sua	influência	teórica	e	metodológica	
para	as	pesquisas	sobre	as	populações	do	mundo	rural	no	Brasil.
RESUMO DO TÓPICO 1
94
1	 Os	 primeiros	 trabalhos	 relacionados	 ao	 estudo	 do	 ambiente	 rural	 ou	 do	 campo	
acontecem	numa	época	em	que	a	antropologia	ainda	não	era	uma	área	acadêmica	bem	
estruturada	no	Brasil.	Sobre	isso,	importantes	contribuições	foram	catalogadas	no	trabalho	
intitulado	“A	Antropologia	no	Brasil:	um	roteiro”,	que	foi	publicado	em	1983	(republicado	
em	2007)	do	antropólogo	Júlio	Cezar	Melatti	(2007).	Assim,	este	autor	procurou	traçar	
uma	 genealogia	 da	 formação	 do	 campo	 da	 antropologia	 brasileira,	 destacando	 três	
principais	períodos	dos	estudos	antropológicos	no	Brasil.	Sobre	esses	grandes	períodos	
do	conhecimento	da	Antropologia,	assinale	a	alternativa	CORRETA:
Fonte: MELATTI, J. C. A Antropologia no Brasil: Apresentação. Anuário Antropológico, v. 7, n. 1, p. 227, 2007. 
Disponível em: http://twixar.me/gmMm. Acesso em: 6 set. 2022.
a)	 (			)	 O	 primeiro	 período	 reconstrói	 os	 trabalhos	 produzidos	 até	 1930,	 o	 segundo	
momento	se	dá	a	partir	de	1930	e	vai	até	1960	e	o	terceiro	momento	é	aquele	
que	vem	após	1960	e	chega	aos	anos	1980.
b)	 (			)	 O	 primeiro	 período	 é	 definido	 por	 aquelas	 etnografias	 publicadas	 até	 1830,	 o	
segundo	período	marca	a	produção	dos	relatos	de	viagem	entre	1830	e	1960,	o	
último	período	é	definido	por	antropologia	contemporânea	e	marca	o	conjunto	de	
trabalhos	realizados	após	1980.
c)	 (			)	 Roberto	Cardoso	de	Oliveira,	Julio	Cezar	Melatti	 e	Franz	Boas	são	as	principais	
referências	de	cada	um	desses	períodos.
d)	 (			)	 Nina	 Rodrigues,	 Roque	 Barros	 Laraia	 e	 Roger	 Bastide	 são	 representantes	 do	
primeiro	período	definido	por	Melatti.
2	 Considera-se	 fundamental	 a	 mudança	 de	 perspectiva	 teórica	 e	 metodológica	 de	
acordo	com	os	três	períodos	assinalados	por	Melatti	(2007).	Com	base	nas	definições	e	
teorias	mobilizadas	pelo	autor,	analise	as	sentenças	a	seguir:
Fonte: MELATTI, J. C. A Antropologia no Brasil: Apresentação. Anuário Antropológico, v. 7, n. 1, p. 227, 2007. 
Disponível em: http://twixar.me/gmMm. Acesso em: 6 set. 2022.
I-	 A	 formação	 da	 antropologia	 brasileira	 foi	 marcada	 por	 influências	 de	 autores	
estrangeiros,	alguns	principais	dos	autores	do	período	dos	estudos	de	“aculturação”	
foram	Charles	Wagley,	Eduardo	Galvão	e	Egon	Schaden. 
II-	 Os	 trabalhos	 de	 pesquisa	 desses	 antropólogos	 citados	 acima	 caracterizavam-se	
pelo	circuito	de	expedições	que	tinham	por	finalidade	abranger	o	menor	número	
possível	de	territórios	e	similares	grupos	indígenas.
III-	 Na	década	de	1940	os	chamados	estudos	de	“aculturação”	envolvendo	as	relações	
entre	indígenas	e	brancos	são	um	marco	para	época	por	utilizar	a	teoria	funcionalista	
para	estudar	a	cultura	 indígena	em	sua	totalidade,	a	partir	principalmente	da	sua	
organização	social,	sua	religião	e	sua	cosmologia,
AUTOATIVIDADE
95
Assinale	a	alternativa	CORRETA:
a)	 (			)	 As	sentenças	I	e	II	estão	corretas.
b)	 (			)	 Somente	a	sentença	II	está	correta.
c)	 (			)	 As	sentenças	I	e	III	estão	corretas.
d)	 (			)	 Somente	a	sentença	III	está	correta.
3	 Considerada	 importante	 influência	teórica	e	metodológica	para	a	formação	do	campo	
da	Antropologia	 Rural,	 os	 estudos	 de	 comunidade	 é	 uma	 das	 principais	 áreas	 de	
antropologia	e	se	destacou	por	estar	interessada	em	conhecer	o	contexto	pesquisado	
em	sua	totalidade.	De	acordo	com	as	contribuições	de	seus	estudos	etnográficos,	
classifique	V	para	as	sentenças	verdadeiras	e	F	para	as	falsas:
(			)	 Os	chamados	estudos	de	comunidade	vão	se	consolidar	entre	as	décadas	de	1940	e	
1950,	encontrando	ainda	bastante	produção	até	a	década	de	1970.	Autores	como	
Emílio	Willems,	 Oracy	 Nogueira,	 Donald	 Pierson	 e	Antônio	 Cândido	 são	 lembrados	
como	expoentes	desse	período. 
(			)	O	 antropólogo	 Radcliffe-Brown	 foi	 a	 principal	 influência	 teórica	 da	 Escola	 de	
Comunidade,	 seus	 estudos	 ensinam	 como	 os	 antropólogos	 devem	 consolidar	
sua	visão	de	mundo	sobre	as	sociedades	estudadas,	seu	método	sugere	que	o	
pesquisador	em	campo	tome	seu	próprio	grupo	como	ponto	de	partida	para	avaliar	
e	 medir	 valores,	 hábitos	 e	 modelos	 de	 existências	 como	 se	 fossem	 superiores,	
melhores	ou	os	mais	corretos	a	serem	seguidos.
(			)	 É	nesse	período	que	os	estudos	de	antropologia	urbana	se	cruzam	com	os	estudosde	comunidade	por	efeitos	do	deslocamento	de	análises	para	o	campo	das	cidades	
brasileiras	onde	vão	estar	grupos	 religiosos,	grupos	étnicos	e	formas	de	vida	em	
interação	ou	os	chamados	estudo	de	contato	interétnicos	que	envolve	também	os	
estudos	de	grupos	de	imigrantes,	exemplar	disso	são	os	estudos	de	Emílio	Whillems	
sobre	os	alemães,	os	trabalhos	de	Ruth	Cardoso	sobre	os	japoneses,	assim	como	os	
estudos	de	Eunice	Durham	sobre	os	italianos.
Assinale	a	alternativa	que	apresenta	a	sequência	CORRETA:
a)	 (			)	 V	–	F	–	F.
b)	 (			)	 V	–	F	–	V.
c)	 (			)	 F	–	V	–	F.
d)	 (			)	 F	–	F	–	V.
4	 Cientes	 do	 impacto	 das	 transformações	 pelas	 quais	 o	 cotidiano	 do	 mundo	 rural	
apresentava,	 diferentes	 abordagens	 e	 pesquisadores	 tentaram	 entender	 a	
multiplicidade	 de	 termos,	 conceitos	 e	 categorias	 que	 procuram	 dar	 conta	 desse	
universo	imenso	de	conhecimento	que	envolve	as	populações	que	vivem	no	campo.	
Assim,	 a	Antropologia	Rural	pode	ser	definida	como	uma	subárea	da	antropologia	
que	se	dedica	ao	estudo	dessas	populações	a	partir	da	investigação	antropológica	
e	 do	 uso	 da	 etnografia.	Alguns	 antropólogos	 se	 dedicaram	 ao	 estudo	 dos	modos	
de	 vida	 com	 destaque	 para	 as	 relações	 de	 parentesco,	 etnicidade,	 alimentação,	
práticas	festivas,	rituais	religiosos,	territorialidade,	economia,	saúde,	moradia,	novas	
96
tecnologias	 no	 campo,	 dentre	 outras	 áreas	 de	 estudos.	 Considerando	 a	 importância	
dessas	 pesquisas	 no	 contexto	 brasileiro,	 disserte	 sobre	 duas	 influências	 teóricas	 do	
primeiro	período	mencionadas	por	Melatti	(2007)	que	contribuíram	para	o	estudo	da	
diversidade	do	rural	e	das	populações	rurais	no	Brasil	(indígenas,	negros,	sertanejos).
Fonte: MELATTI, J. C. A Antropologia no Brasil: Apresentação. Anuário Antropológico, v. 7, n. 1, p. 227, 2007. 
Disponível em: http://twixar.me/gmMm. Acesso em: 6 set. 2022.
5	 Os	antropólogos	rurais	observam	a	maneira	como	se	formam	as	famílias,	os	grupos	
sociais,	suas	formas	de	interagir	entre	si	e	com	outros	grupos,	assim	como	é	importante	
registrar	as	condições	de	vida	dessas	populações,	considerando	 inclusive	o	grupo	
étnico	ao	qual	pertencem	os	moradores	que	vivem	na	área	estudada.	Disserte	sobre	a	
importância	da	reforma	agrária	no	contexto	de	enfrentamento	às	desigualdades	sociais,	
lembre-se	da	diversidade	de	grupos	sociais	que	são	atingidos	por	essa	política	social	e	
cite	alguns	deles.
97
POVOS TRADICIONAIS E SEUS MODOS DE 
USO E OCUPAÇÃO DO ESPAÇO RURAL
UNIDADE 2 TÓPICO 2 — 
1 INTRODUÇÃO
Caro	 acadêmico,	 a	 seguir,	 faremos	 algumas	 considerações	 dos	 itinerários	
percorridos	 por	 algumas	 temáticas	 do	 campo.	 Embora	 mantenha	 como	 referência	
os	dados	da	criação	distribuição	e	desenvolvimento	das	diferentes	 linhas	de	pesquisa,	
apresento	a	você	exemplos	de	modos	de	ocupação	e	uso	do	espaço	rural.
Figura 4 – Espaço rural
Fonte: https://bit.ly/3AxlnzV. Acesso em: 26 ago. 2022.
No	 entanto,	 primeiro,	 nessa	 seção	 introdutória	 gostaria	 de	 retomar	 dois	 temas	
tradicionais	na	antropologia	brasileira,	pois	se	trata	de	áreas	de	extrema	relevância	histórica	
e	social,	 já	mencionei,	por	exemplo,	quando	apresentei	a	formação	da	antropologia	no	
Brasil,	a	etnologia	indígena	e	os	estudos	de	comunidade	aplicados	a	diferentes	contextos	
(rural	e	urbano)	desempenharam	forte	influência	na	formação	da	antropologia.
A	 etnologia	 indígena	 é	 considerada	 uma	 grande	 tradição	 de	 estudos	 e	 foi	
articulada	 com	 outra	 área	 de	 conhecimento	 chamada	 Antropologia	 da	 Sociedade	
Nacional,	de	acordo	com	o	antropólogo	Roberto	Cardoso	de	Oliveira	 (1988)	essa	área	
organizou	 e	 definiu	 as	 bases	 de	 formação	 do	 campo	 acadêmico	 e	 de	 produção	 em	
pesquisa	na	antropologia	desde	seus	primórdios.
98
Para	 Roberto	 Cardoso	 de	 Oliveira	 (1988)	 há	 uma	 área	 chamada	 Identidade,	
Território	 e	 Relações	 Interétnicas	 que	 se	 ocupou	 substancialmente	 de	 uma	 subárea	 de	
estudos	da	Etnologia	Indígena	quando	se	interessou	pelos	estudos	de	contato	interétnico,	
da	etnicidade	e	do	indigenismo.
Conforme	apontado	pela	antropóloga	Alcida	Rita	Ramos	(1990),	foi	assim,	por	
exemplo,	que	essas	duas	subáreas	passaram	a	 representar	duas	perspectivas	ao	mesmo	
tempo	complementares	e	distintas,	em	algumas	situações,	até	oponentes	quando	se	
trata	de	estudos	sobre	populações	indígenas.	Por	um	lado,	uma	se	voltou	para	os	estudos	
de	organização	social	e	política,	religião,	arte	e	cosmologia,	enquanto	a	outra	dedicou-se	
aos	estudos	das	relações	sociais	e	políticas	das	populações	 indígenas	com	a	sociedade	
nacional.
No	 contexto	 atual,	 se	 olharmos	 para	 as	 pesquisas	 nessa	 área	 veremos	 que	
essa	bifurcação	categorizada	em	Etnologia	 Indígena	e	 Identidade,	Território	e	Relações	
Interétnicas	espelham	essa	dualidade	e	ruptura.
A	Etnologia	Indígena,	por	exemplo,	tem	pesquisas	mais	concentradas	no	Sudeste	
do	país,	mas	com	alguma	ocorrência	no	Nordeste.	Isso	acontece	pelo	renovado	estado	de	
colaboração	que	as	pesquisas	possibilitam	quando	diferentes	instituições	e	pesquisadores	
constroem	e	alimentam	redes	de	trabalho	e	pesquisa	voltados	a	temas	comuns.
No	atual	cenário	nacional	essa	colaboração	se	tornou	ainda	mais	intensa	em	face	
do	foco	da	etnologia	para	as	temáticas	que	envolvem	o	meio	ambiente,	território,	gênero,	
sexualidade,	 educação	 escolar	 indígena,	 saúde	 da	 população	 indígena,	 experiências	
de	 deslocamentos	 de	 indígenas	 para	 o	 ambiente	 urbano,	 assim	 como	 outros	 temas	
(AMOROSO;	SANTOS,	2013;	BELTRÃO;	LACERDA,	2017).
Cabe	 ainda	 destacar	 que	 no	 contexto	 contemporâneo	 essa	 temática	 tem	
adquirido	novo	fôlego	em	pesquisas	a	partir	das	contribuições	de	antropólogos	 indígenas,	
como	Gersem	Baniwa	(2016)	e	Tonico	Benites	(2014),	assim	como	da	instigante	e	renovada	
contribuição	que	surge	da	experiência	de	colaboração	entre	 indígenas	e	antropólogos,	
exemplo	recente	desse	tipo	de	colaboração	é	o	trabalho	de	colaboração	que	resultou	num	
excelente	livro	intitulado	“A	queda	do	céu”	de	Bruce	Albert	e	Davi	Kopenawa	(2015).
99
Figura 5 – Filme “A queda do céu”
Fonte: https://bit.ly/3CIxnkM. Acesso em: 26 ago. 2022.
O	 livro	é	uma	escrita	colaborativa	entre	o	 líder	xamã	yanomami	Davi	Kopenawa	
junto	 com	 o	 antropólogo	 Bruce	Albert,	 tendo	 como	 fonte	 os	 relatos	 colhidos	 na	 língua	
nativa	Yanomami	 e	 traz	um	 registro	único	do	 testemunho	da	cultura	desse	povo	na	
perspectiva	de	um	alerta	global	sobre	a	Amazônia.
Conheça, agora, alguns dos indígenas que decidiram se tornar antropólogos:
• Gersem  Baniwa  nasceu em São Gabriel da Cachoeira (AM), graduado em Filosofia 
pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM) em 1995, tornou-se mestre em 
Antropologia Social pela Universidade de Brasília (UnB) em 2006, onde também 
obteve seu doutorado em Antropologia em 2010. Atualmente, tornou-se o primeiro 
professor indígena do Departamento de Antropologia da Universidade de Brasília.
INTERESSANTE
Figura – O primeiro professor indígena
Fonte: https://bit.ly/3TsN7yn. Acesso em: 26 ago. 2022.
100
•	 Indígena	Ava	Kaiowá,	nasceu	na	aldeia	de	Sassoró-Tacuru,	no	Mato	Grosso	do	Sul.	Tonico	
Benites	 é	 graduado	 em	Pedagogia	 na	 Universidade	 Estadual	 de	Mato	 Grosso	 do	 Sul	
(UFMS)	em	2004,	obteve	seu	mestrado	em	Antropologia	Social	pela	Universidade	Federal	
do	Rio	de	Janeiro	(Museu	Nacional/	UFRJ)	em	2009	e	doutorado	em	Antropologia	Social	
pela	 mesma	 universidade	 em	 2014.	 Atualmente	 é	 professor	 visitante	 e	 pesquisador	
do	Programa	de	Pós-Graduação	em	Sociedade	e	Fronteiras	PPGSOF	da	Universidade	
Federal	de	Roraima	–	UFRR.
Figura – Professor visitante e pesquisador
• Nascida na terra indígena umutina, próxima à cidade de Barra dos Bugres, Mato Grosso, 
Eliane Boroponepa Monzilar possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade do 
Estado de Mato Grosso (UNEMAT), Especialização em Educação Escolar Indígena pela 
Faculdade Intercultural Indígena e é mestra em Desenvolvimento Sustentável Juntos 
a Povosde Terras Indígenas pela Universidade de Brasília, onde também obteve seu 
doutorado em Antropologia Social em 2019. Atualmente é gestora da Escola Estadual 
Indígena Jula Paré, Secretaria de Estado de Educação e Cultura-Seduc/MT.
Fonte: https://bit.ly/3Tuxwys. Acesso em: 26 ago. 2022.
Figura – Gestora da Escola Estadual Indígena Jula Paré
Fonte: https://bit.ly/3Tuxwys. Acesso em: 26 ago. 2022.
101
Identidade,	Território	e	Relações	 Interétnicas	é	de	 longe	a	área	de	pesquisas	
que	agrega	o	maior	número	de	antropólogos,	é	a	temática	mais	abordada	na	disciplina,	
sem	dúvida,	acadêmico,	você	já	deve	ter	percebido	a	partir	das	leituras	anteriores	que	
esse	 interesse	 de	 pesquisa	 está	 diretamente	 associado	 ao	 nosso	 passado	 histórico,	
assim	como	a	sua	herança	e	os	desdobramentos	sociais	que	se	dão	a	partir	de	eventos	
históricos,	situações	de	contato	e	confronto	e,	sobretudo,	relacionados	à	vulnerabilidade	
que	 grupos	 sociais	 étnicos	 enfrentam	 diante	 de	 projetos	 econômicos	 exploratórios	 que	
desrespeita	esses	grupos.
Cabe	ainda	destacar	na	Etnologia	Indígena	a	temática	da	identidade,	território	
e	 relações	 interétnicas	 aparecem	 no	 Brasil	 hoje	 concentradas	 em	 duas	 perspectivas	
antropológicas,	 a	 saber,	 os	 estudos	 ameríndios	 cujo	 foco	 se	 dá	 sociocosmologia	
indígenas,	 concentradas	 no	 Sudeste	 e	 Sul,	 tendo	 como	 referência	 as	 produções	 do	
antropólogo	Eduardo	Viveiros	de	Castro	(1999)	e	os	estudos	que	dão	ênfase	às	questões	
de	etnicidade	e	contexto	multiétnico,	predominante	no	Nordeste,	a	partir	de	contribuições	
do	antropólogo	João	Pacheco	de	Oliveira	(2004).
As	 pesquisas	 antropológicas	 nessa	 área	 têm	 ampliado	 cada	 vez	 mais	 sua	
produção,	 sobretudo,	 considerando	 as	 questões	 de	 territorialização	 e	 ambiente	 que	
afetam	não	somente	as	populações	indígenas,	mas	também	quilombolas,	camponeses	
e	“tradicionais”	de	modo	mais	amplo.	O	que	essa	área	tem	nos	mostrado,	e	auxiliado	
a	 entender	 o	 Brasil	 contemporâneo,	 é	 o	 renovado	 olhar	 sobre	 o	 Campesinato,	 as	
questões	 de	 desenvolvimento	 e	 o	 meio	 ambiente.	 Sobretudo,	 conforme	 destacado	
pela	 antropóloga	 Andrea	 Zhouri	 (2012)	 a	 articulação	 dessas	 temáticas	 possibilita	 o	
tratamento	adequado	das	questões	que	vulnerabilizam	esses	grupos	sociais.
 
Note,	acadêmico,	que	a	antropologia	rural	como	uma	categoria	nem	sempre	é	
articulada	 pelos	 antropólogos,	 a	maioria	 das	 linhas	 de	 pesquisa	 aqui	 apresentadas	 dão	
conte	de	um	conjunto	muito	diverso	de	pesquisas	e	os	grupos	sociais	contemplam	o	que	
pode	nos	auxiliar	a	definir	e	entender	esse	“rural”.	Os	estudos	etnológicos	 indígenas	é	um	
caminho,	mas	há	outros,	conforme	vimos.	Nos	próximos	subtópicos	vamos	analisar	outras	
contribuições	que	nos	possibilitem	entender	essas	diferentes	formas	de	agrupamento	
social,	identidade,	territorialização	e	ocupação	dos	espaços	com	seus	usos.
Entretanto,	acadêmico,	não	esqueça	que	o	diferencial	da	antropologia	é	a	ênfase	
na	diferença,	na	diversidade	dos	modos	de	ser	e	de	viver,	assim	o	método	etnográfico	é	
uma	 importante	ferramenta	de	pesquisa	porque	nos	fornece	uma	maneira	particular	de	
apreender	 a	 diferença	 ao	 estabelecer	 relações	 por	 meio	 de	 pesquisa	 intensa,	 densa	 e	
localizada,	desenvolvendo	no	antropólogo	uma	capacidade	de	conhecer,	aprender	e	renovar	
seu	entendimento	do	outro	e	de	si	mesmo,	multiplicando	sempre	suas	perspectivas	e	seus	
horizontes	 de	 pesquisa.	 Foi	 assim	 que	 ao	 estudar	 as	 populações	 indígenas	 percebeu-
se	outras	formas	não	 indígenas	de	habitar	o	espaço	social	do	campo,	do	mundo	rural	e	
assim	 reconhecer	a	diversidade	de	grupos	que	estão	nesse	meio	e	em	contato.	Vamos	
conhecer	um	pouco	sobre	eles.	A	seguir,	após	esta	introdução,	você	aprenderá	o	campo	
da	Antropologia	Rural,	Campesinato	e	formas	de	uso	e	ocupação	de	território.
102
2 ANTROPOLOGIA RURAL NO BRASIL
Caro	acadêmico,	há	uma	multiplicidade	de	termos,	conceitos	e	categorias	que	
tentam	dar	 conta	desse	universo	 imenso	de	conhecimento	que	envolve	as	populações	
que	vivem	no	campo.	Assim,	a	Antropologia	Rural	pode	ser	definida	como	uma	subárea	
da	antropologia	que	se	dedica	ao	estudo	dessas	populações	a	partir	da	 investigação	
antropológica	e	do	uso	da	etnografia.
Alguns	antropólogos	se	dedicaram	ao	estudo	dos	modos	de	vida	com	destaque	
para	as	relações	de	parentesco,	etnicidade,	alimentação,	práticas	festivas,	rituais	religiosos,	
territorialidade,	economia,	 saúde,	moradia,	novas	tecnologias	no	campo,	dentre	outras	
áreas	 de	 estudos	 que	 apenas	 com	 livro	 não	 seria	 possível	 dar	 conta.	 Logo,	 a	 nossa	
tarefa	é	conhecer	os	principais	conceitos	e	teorias	que	definem	esse	campo,	assim	como	
será	 importante	aprender	alguns	desses	estudos	etnográficos	e	a	partir	deles	despertar	o	
interesse	para	que	você	possa	buscar	cada	vez	mais	informações,	conteúdo	diversificado	e	
conhecimento	aprofundado	a	respeito	de	uma	dessas	áreas	que	desperte	sua	curiosidade.
O	termo	“antropologia	rural”	nem	sempre	foi	utilizado	pelos	antropólogos	para	
definir	um	campo	de	pesquisa,	mas	os	fenômenos	que	eles	estudavam	eram	próprios	
do	mundo	 rural.	A	 antropologia	 rural	 estuda	 os	modos	 de	vida	 rural	 que	 não	 fazem	
parte	da	vida	citadina,	em	contraposição	ao	modo	de	vida	urbano.	Exemplar	disso	são	
estudos	 de	 comunidade	 e	 os	 estudos	 de	 campesinato,	 que	 são	 termos	mais	 usuais	
encontrados	 na	 antropologia.	 Enquanto	 uma	 agenda	 disciplinar	 a	 antropologia	 rural	
é	bem	mais	recente,	mas	em	termos	de	pesquisa,	como	podemos	ver	no	Tópico	1,	 já	
existiam	estudos	 antropológicos	 focados	na	 análise	 dessas	 formas	de	vida	 tradicionais.	
Muitos	pesquisadores	que	aqui	já	foram	citados	não	usam	o	termo	antropologia	rural,	
entretanto	o	universo	de	suas	pesquisas	caracteriza	seus	estudos	de	comunidade	e/ou	
de	campesinato.	Falaremos	em	detalhes	de	cada	um	desses	termos	adiante.
Uma	 das	 principais	 características	 da	 antropologia	 rural	 é	 o	 foco	 no	 estudo	
qualitativo	que	essa	área	oferece,	 isto	é,	utiliza	um	método	de	pesquisa	empírica,	na	
qual	o	uso	da	etnografia	é	feito	para	observar	as	condições	sociais	das	populações	que	
vivem	no	campo.	Os	antropólogos	rurais	observam	a	maneira	como	se	formam	as	famílias,	
os	grupos	sociais,	suas	formas	de	interagir	entre	si	e	com	outros	grupos,	assim	como	
é	importante	registrar	as	condições	de	vida	dessas	populações,	considerando	inclusive	o	
grupo	étnico	ao	qual	pertencem	os	moradores	que	vivem	na	área	estudada.
Acadêmico,	 para	 tornar	 mais	 claro	 o	 entendimento	 desse	 tipo	 de	 pesquisa,	
pense	na	desigualdade	econômica	e	de	acesso	às	terras	produtivas	em	áreas	 rurais	
onde	 trabalhadores	 rurais	 buscam	 a	 reforma	 agrária.	 Cabe	 destacar	 aqui	 o	 que	
significa	 a	 reforma	 agrária	 no	 Brasil,	 por	 exemplo,	 para	 Cardart,	 Pereira	 e	 Frigotto	
(2012)	 o	 reconhecimento	 do	valor	 social	 da	 terra	 está	 no	 centro	 da	 reforma	 agrária,	
entendendo	que	o	acesso	à	terra	precisa	vir	acompanhado	de	um	conjunto	de	políticas	
de	infraestrutura	que	alcance	os	pequenos	agricultores,	como	é	o	caso	da	educação,	saúde	
e	transporte,	assim	como	é	importante	uma	política	que	favoreça	o	campesinato,	com	oferta	
de	crédito,	assistência	técnica	e	acesso	aos	mercados.
103
Para saber mais dos conflitos e as perspectivas da reforma agrária no contexto atual, te 
convido para assistir esse vídeo documentário produzido em 2021 e que pode auxiliar 
a compreender a complexidade presente no tema. E você já sabe, basta clicar e se abrir 
para o conhecimento: https://bit.ly/3R2qj74.
• Documentário: Parou por quê? A reforma agrária no governo Bolsonaro.
• SINOPSE do documentário, que recebeu menção honrosa no Prêmio Vladimir Herzog 
2021:
A reforma agrária saiu da lista de prioridades do governo federal há mais de uma 
década, entretanto, na gestão de Jair Bolsonaro, a criação de novos assentamentos para 
alojar famílias sem-terra foi totalmente paralisada. Para este ano, o orçamento do Incra– o órgão responsável pela política de reforma agrária – sofreu uma redução de 90%. 
Paralelamente a esse desmonte, cresce a violência no campo. No sul do Pará, região 
notória pelos conflitos por terra, uma avalanche de despejos deve sair do papel em 
2021. E milhares de famílias podem ser retiradas de ocupações de terra consolidadas 
há anos.
DICA
CRÉDITOS
• Direção e roteiro: Carlos Juliano Barros.
• Direção de fotografia, montagem e finalização: Caue Angeli.
• Produção executiva: Ana Magalhães.
• Produção: Juliana Fuhrmann / Marília Ramos / Marta Vieira 
Santana.
• Técnico de som: Eduardo Rodrigues de Souza.
• Design e animação: Toca Hub.
• Mixagem de som: Pedro Penna.
• Pesquisa: Guilherme Zocchio.
• Imagens adicionais: Arquivo Repórter Brasil.
• Fotos: Leonardo Sakamoto / Folha de S. Paulo / O Globo / 
Revista Exame / TV Globo / UOL.
• Uma realização do reporterbrasil.org.br.
• Este documentário foi realizado com o apoio da DGB 
Bildungswerk. O conteúdo é de responsabilidade exclusiva 
da Repórter Brasil.
A	 reforma	 agrária	 no	 Brasil	 é	 executada	 pela	 União	 por	 meio	 da	 compra	 e	
desapropriação	 de	 latifúndios	 particulares	 que	 são	 considerados	 improdutivos,	 quando	 o	
Instituto	Nacional	de	Colonização	e	Reforma	Agrária	(INCRA)	executa	esse	processo	ao	
distribuir	e	lotear	essas	terras	desapropriadas	para	as	famílias	que	desejam	cuidar	e	tornar	
essa	terra	produtiva.
O	INCRA	também	atua	nas	políticas	públicas	de	assistência	a	esses	pequenos	
produtores	 rurais,	 prestando	 assistência	 financeira,	 consultorias	 e	 viabilizando	 insumos	
para	que	essas	famílias	possam	produzir	nessas	terras.	O	INCRA	é	vinculado	ao	Governo	
Federal	e	foi	criado	em	1970,	sua	principal	função	é	gerir	a	reforma	agrária	de	maneira	
justa	e	sistematizada,	assim	como	atualizar	e	manter	o	cadastro	nacional	de	 imóveis	
rurais,	bem	como	identificar,	demarcar	e	titular	terras	destinadas	aos	assentamentos	e	
comunidades	tradicionais	quilombolas.
104
Aqui,	acadêmico,	você	já	deve	ter	percebido	que	há	uma	diversidade	de	grupos	
sociais	que	foram	mencionados	durante	nossa	abordagem	sobre	a	antropologia	rural.	Note	
que	a	categoria	“povos	e	comunidades	tradicionais”	implica	o	reconhecimento	da	presença	
de	 indígenas,	 comunidades	 remanescentes	 de	 quilombos,	 pescadores	 artesanais,	
ribeirinhos,	 povos	 ciganos,	 trabalhadores	 rurais,	 povos	 de	 terreiros,	 os	 pantaneiros,	 os	
faxinalenses	do	Paraná	e	região,	as	comunidades	de	fundo	de	pasto	da	Bahia,	os	caiçaras,	
dentre	outros,	 juntos	eles	 representam	uma	parcela	significativa	da	população	brasileira	
que	ocupam	o	território	nacional,	segundo	dados	do	Ministério		cada	um	desses	grupos	
tem	suas	próprias	formas	de	vida,	de	cuidar	e	preservar	a	terra,	seus	costumes	e	bem-
viver.	 Entre	 esses	 povos	 e	 comunidades	 tradicionais	 há	 também	 aspectos	 singulares	
que	determinam	e	caracterizam	como	próprios	seus	modos	de	ser	e	de	viver,	como	por	
exemplo:	territórios	tradicionalmente	ocupados,	produção	e	organização	social.
O	 uso	 do	 método	 etnográfico	 nessas	 áreas	 de	 estudo	 serve	 também	 para	
prevenir	 impactos	socioambientais,	assim	como	orientar	o	desenho	de	políticas	públicas	
que	visem	reduzir	desigualdades	sociais	e	ampliar	a	cidadania	para	as	populações	que	
enfrentam	problemas	para	manter	sua	subsistência	e	a	continuidade	de	suas	famílias.
Um	 antropólogo	 fazendo	 pesquisa	 nesses	 contextos	 tende	 a	 observar	 todas	
as	áreas	que	compõem	a	vida	desse	grupo	social,	adotando	uma	perspectiva	holística	
como	a	obra	Argonautas do Pacífico Ocidental,	etnografia	clássica	escrita	por	Bronislaw	
Malinowski	(1884-1942)	e	publicada	em	1922,	é	bom	exemplo	de	uma	etnografia	com	uma	
visão	de	holística,	uma	vez	que	observa	os	diferentes	aspectos	da	vida	social	de	um	grupo.
Embora	você	já	tenha	tido	contato	com	o	método	etnográfico	cabe	aqui	chamar	a	
sua	atenção	para	o	uso	de	diferentes	ferramentas	metodológicas	na	construção	de	uma	
pesquisa	etnográfica	em	contextos	rurais.	Assim,	o	estudo	do	campo	será	feito	por	meio	
da	observação	direta	da	 realidade	naquela	comunidade	ou	grupo	social,	mas	também	
será	utilizado	o	recurso	das	entrevistas	e	pesquisa	documental.
O	uso	de	diferentes	recursos	auxilia	o	antropólogo	a	dar	maior	rigor	na	sua	prática	
científica,	 a	 “observação	 participante”	 (MALINOWSKI,	 1978)	 permite	 que	 esse	 pesquisador	
vivencie	por	um	tempo	maior	de	convivência	com	o	grupo	pesquisado	e	aprenda	sua	
forma	de	viver	no	cotidiano	e	nas	interações,	por	outro	lado	a	análise	de	documentos	
como,	 por	 exemplo,	 os	 registros	 de	 viagens	 permitem	 acessar	 características	 daquela	
sociedade	ao	longo	do	tempo	anterior	ao	do	pesquisador.
No	Brasil	temos	uma	tradição	muito	forte	de	estudos	antropológicos	nessa	área	
de	conhecimento,	um	desses	estudos	é	considerada	uma	importante	referência	desse	
período	e	se	trata	da	tese	de	doutorado	de	Florestan	Fernandes	 intitulada	 “A	função	
social	 da	 guerra	 na	 sociedade	 tupinambá”	 (1952),	 neste	 trabalho	 o	 autor	 desenvolve	
uma	análise	a	partir	de	materiais	produzidos	por	cronistas	sobre	a	sociedade	indígena	
Tupinambá,	dando	relevo	a	aspectos	como	o	função	social	da	guerra	e	a	organização	
social	nesta	sociedade.	Trabalhos	como	este	é	uma	iniciativa	de	aprofundar	uma	análise	
fazendo	uso	de	materiais	documentados	por	cronistas,	ensaístas	e	viajantes.
105
A	pesquisa	empírica	envolve	um	esforço	e	um	trabalho	minucioso	de	diferentes	
aspectos	das	diferentes	sociedades	e	sua	organização	social.	A	partir	desses	trabalhos	
sabemos	 que	 há	 uma	 diferença	 entre	 grupos	 indígenas	 que	 eles	 não	 são	 homogêneos,	
compreendemos	 que	 cada	 etnia	 tem	 suas	 características	 próprias	 e	 necessidades	
específicas	para	a	sua	manutenção	e	reprodução	social.	Exemplo	disso	é	observar	o	uso	
do	tempo,	a	divisão	do	trabalho,	os	rituais	funerais,	as	formas	de	nomear	animais,	espíritos	
e	 pessoas,	 bem	 como	 as	 diferentes	 práticas	 de	 alimentação	 e	 medicina	 tradicional	
aparecem	na	“descrição	densa”	(GEERTZ,	2013)	desses	grupos	sociais	pelos	antropólogos	
que	se	interessam	por	fazer	atividade	científica	com	essas	comunidades.
Fala-se em descrição densa como Descrição densa  para se referir ao trabalho do 
antropólogo Clifford Geertz (1926-2006), a partir do texto Uma Descrição Densa: Por uma 
Teoria Interpretativa da Cultura (Thick Description: The Interpretation of Cultures 1973), 
que propõe um conceito inspirado nos escritos do filósofo  Gilbert 
Ryle (1900–1976), principalmente em "What is le Penseur Doing?" (1971).
Geertz elabora princípios metodológicos para a  etnografia como o 
registro qualitativo, visual, sonoro e escrito, da cultura. Para conhecer 
um pouco mais do conceito de descrição densa articulado 
pelo antropólogo Clifford Geertz assista ao vídeo do Professor 
Bernardo Lewgoy, disponível em: https://bit.ly/3R26ugh.
Fonte: GEERTZ, C. Uma descrição densa: por uma teoria interpretativa 
da cultura. In: GEERTZ, C. A Interpretação das culturas. Rio de Janeiro: 
Zahar, 2008. p. 3-24.
INTERESSANTE
Uma	das	principais	atividades	de	pesquisa	é	a	realização	da	árvore	genealógica	de	
uma	comunidade	quilombola,	ao	fazer	estudo	segmentado	por	gênero,	 idade	e	etnia,	
o	antropólogo	pode	selecionar	um	grupo	específico	para	desenvolver	sua	investigação	e	
assim	apresentar	padrões	de	cultura,	formação	familiar,	divisão	de	trabalho	ou	mesmo	
aspectos	de	vulnerabilidade	quanto	à	saúde	ou	acesso	à	educação.
As	 comunidades	 remanescentes	 de	 quilombo	 geralmente	 estão	 vulneráveis	
quanto	ao	acesso	às	políticas	públicas	e	ao	documento	de	titulação	de	suas	terras.	Assim,	
a	 pesquisa	 etnográfica	 auxilia	 na	 reconstrução	 social	 de	 eventos	 importantes	 sobre	
uma	comunidade	desse	tipo,	por	exemplo,	dados	como	em	que	período	aquele	grupo	
social	chegou	àquela	localidade,	quais	as	famílias	que	pertencem	à	comunidade,	qual	a	
extensão	de	suas	atividades	produtivas,	onde	plantam,	o	que	plantam,	qual	o	tempo	de	
colheita,	quais	os	recursos	disponíveisnaquela	localidade,	não	havendo	acesso	facilitado	à	
água,	por	exemplo,	o	estudo	irá	indicar	o	grau	de	vulnerabilidade	que	a	comunidade	está	
exposta	quanto	a	sua	subsistência	e	também	a	exposição	às	doenças	e	à	fome.
https://pt.wikipedia.org/wiki/Clifford_Geertz
https://pt.wikipedia.org/wiki/1926
https://pt.wikipedia.org/wiki/2006
https://pt.wikipedia.org/wiki/1973
https://pt.wikipedia.org/wiki/Gilbert_Ryle
https://pt.wikipedia.org/wiki/Gilbert_Ryle
https://pt.wikipedia.org/wiki/1900
https://pt.wikipedia.org/wiki/1971
https://pt.wikipedia.org/wiki/Etnografia
106
Também	 podemos	 olhar	 por	 outro	 ângulo,	 nos	 perguntarmos	 como	 uma	
população	pode	sobreviver	tanto	tempo	em	um	mesmo	espaço	social	em	condições	de	
vulnerabilidade	com	a	exposição	de	invasores	de	territórios	indígenas.	Muitas	etnografias	
que	 são	 realizadas	no	Brasil	visam	não	só	conhecer	essas	dinâmicas	 territoriais	que	
marcam	a	vida	dessas	populações,	mas	recontar	sua	história,	sua	cosmologia	e	qual	o	
sentido	que	aquele	lugar	tem	para	a	comunidade.
O	 conteúdo	 das	 etnografias	 realizadas	 com	 as	 populações	 do	 campo	 busca	
também	colocar	 em	 relevo	 aspectos	 relacionados	 à	 economia	 e	 aos	 conflitos	 e	 disputas	
territoriais	como	uma	forma	de	dar	visibilidade	a	essas	populações.
Conforme	vimos,	 a	década	de	 1960	foi	um	marco	nos	estudos	antropológicos	
de	 populações	 rurais.	 Momento	 importante	 porque	 há	 uma	 reorientação	 de	 base	
metodológica	 de	 e	 teórica.	 O	 antropólogo	 brasileiro	 Roberto	 Cardoso	 de	 Oliveira	 foi	
fundamental	na	inserção	da	perspectiva	de	estudos	interétnicos,	pois	não	só	deslocou	
o	campo	teórico	de	estudos	como	também	inseriu	um	olhar	que	substitui	os	estudos	
de	aculturação	–	em	que	se	acreditava	que	a	cultura	dominante	englobava	a	cultura	
dominada,	no	caso	sociedade	nacional	e	povos	indígenas	–,	pelos	estudos	de	fricção	
interétnica	nos	quais	os	conflitos	sociais	ganham	visibilidade	demonstrando	a	resistência	
de	grupos	indígenas,	por	exemplo,	a	projetos	exploração	e	expansão	territorial.
 
Passaremos	 agora	 ao	 estudo	 do	 campesinato,	 assim	 como	 abordaremos	 os	
diferentes	grupos	que	estão	presentes	nesses	estudos	e	que	fazem	parte	das	chamadas	
comunidades	 tradicionais,	 momento	 em	 que	 também	 você	 terá	 a	 oportunidade	 de	
conhecer	o	conceito	e	as	suas	características.
3 CAMPESINATO
Caro	 acadêmico,	 você	 deve	 ter	 percebido	 que	 é	 um	 movimento	 comum	 na	
ciência	 construir	 argumentos	 e,	 em	 seguida,	 eles	 passarem	 por	 revisões	 conceituais,	
aprimoramentos	e	algumas	teorias	ou	metodologias	 também	podem	entrar	 em	desuso.	
Foi	mais	ou	menos	o	que	aconteceu	com	os	estudos	de	comunidade,	com	as	críticas	
elaboradas	aos	estudos	de	comunidade,	as	pesquisas	guiadas	por	esse	tipo	de	abordagem	
vão	perdendo	 lugar	 e	 cedendo	espaço	para	 outros	 temas,	 substituídos	por	 pesquisas	de	
caráter	mais	regional,	nas	quais	se	analisam	problemas	como	o	do	campesinato,	o	dos	
assalariados	rurais,	dos	trabalhadores	urbanos	e	das	frentes	de	expansão	da	indústria	e	da	
modernidade.
Os	estudos	de	fricção	interétnica	e	etnologia,	aqui	já	mencionados	em	tópico	de	
introdução,	assim	como	os	estudos	de	comunidade,	conduziram	a	interpretações	de	que	
certos	grupos	étnicos	foram	tomados	como	camponeses	como	é	o	caso	do	trabalho	de	
Paulo	Marcos	Amorim	que	estudou	os	Potiguara	da	Paraíba	em	“Índios	camponeses”	
(AMORIM apud	 MELATTI,	 2007).	 Além	 disso,	 essas	 pesquisas	 acabam	 conduzindo	
diferentes	pesquisadores	para	o	interesse	nos	estudos	de	campesinato	não	indígena.
107
Agora,	 os	 “estudos	 de	 comunidade”	 passariam	 a	 dar	 lugar	 para	 os	 “estudos	
regionais”	e	parte	dessa	visibilidade	e	mudança	de	perspectiva	veio	a	partir	das	críticas	
acionadas	no	 período	 anterior.	 “O	 projeto	 liderado	por	Roberto	Cardoso	de	Oliveira	 e	
Maybury-Lewis,	 em	 1968,	 teve	 por	 objetivo	 comparar	 duas	 regiões	 brasileiras	 expostas	 a	
mudanças	 motivadas	 pelos	 modernos	 programas	 de	 desenvolvimento:	 o	 Nordeste,	
de	população	densa,	 estabelecida	há	muito	 e	 foco	de	emigração;	 e	 o	Centro-Oeste,	
de	 população	mais	 recente,	 alvo	 de	 frentes	 de	 expansão”	 (MELATTI,	 2007,	 p.	 28).	 Esse	
projeto	foi	realizado	por	professores	e	alunos	do	então	recém-criado	Programa	de	Pós-
Graduação	em	Antropologia	Social	do	Museu	Nacional.
No	entanto	o	trabalho	realizado	na	zona	da	mata	nordestina	vai	produzir	uma	
intensa	 e	 rica	 linha	de	 estudos	que	 investigou	 os	 trabalhadores	nas	 zonas	 açucareiras,	
nesse	contexto	a	dimensão	do	trabalho	ganha	precedência	na	análise	dos	antropólogos	
que	 por	meio	 desses	 estudos	 apontam	 as	mudanças	 que	 os	 trabalhadores	 enfrentam	
diante	de	um	contexto	de	urbanização	e	 inovação.	Nesse	 sentido,	 os	pesquisadores	
vão	mostrar	que	esses	trabalhadores	foram	expulsos	dos	engenhos,	a	dificuldade	que	
eles	encontram	para	se	estabelecer	nas	cidades,	a	mudança	no	modo	de	trabalho	que	
flexibiliza	 os	 acordos	 entre	 trabalho	 assalariado	 e	 trabalho	 temporário	 nas	 empresas	
açucareiras,	o	trabalho	familiar	em	terras	de	criação	de	gado	no	 interior	do	nordeste,	
o	aparecimento	e	desenvolvimento	das	feiras	nas	cidades	da	zona	da	mata,	o	sentido	que	
os	próprios	trabalhadores	dão	para	o	seu	trabalho,	a	organização	familiar	nesse	novo	
contexto,	dentre	outros	aspectos.
Alguns	 desses	 trabalhos	 que	 podem	 exemplificar	 esse	 tipo	 de	 estudo	 são:	
“Emprego	e	mudança	socioeconômica	no	Nordeste”,	elaborado	por	Moacir	Palmeira	et al. 
(1977)	e	“Mudança	social	no	Nordeste”	(1979),	“A	arte	do	ouro”	(1979),	“Trabalho	assalariado	
e	 trabalho	 familiar	 no	 Nordeste”,	 de	 Lygia	 Sigaud	 (1981),	 o	 projeto	 “Campesinato	 e	
plantation	 no	 Nordeste”,	 de	Afrânio	 Garcia	 Júnior,	 Beatriz	 Alasia	 de	 Heredia	 e	 Marie	
France	Garcia	 (1980).	Os	 livros	de	José	Sérgio	Leite	Lopes	 “O	vapor	do	diabo”	 (1978),	
Beatriz	Maria	Alasia	de	Heredia	“A	morada	da	vida”	(1979),	Doris	Rinaldi	Meyer	“A	terra	do	
santo	e	o	mundo	dos	engenhos”	(1980)	e	Lygia	Sigaud	com	“A	nação	dos	homens”	(1980)	e	
“Os	clandestinos	e	os	direitos”	(1979).
Além	 disso,	 Melatti	 (2007)	 menciona	 outra	 frente	 de	 trabalho	 na	 área	 do	
campesinato	que	vai	se	desenvolver	na	margem	oriental	da	Amazônia,	onde	se	destacam	
os	trabalhos	de	Otávio	Guilherme	Velho	sobre	as	frentes	que	afetaram	a	área	de	Marabá	
“Frentes	de	expansão	e	estrutura	agrária”	(1972),	de	Francisca	Isabel	Vieira	Keller	sobre	
a	 região	 de	 Imperatriz	 “O	 homem	da	 frente	 de	 expansão”	 (1975),	 de	Teresinha	Helena	
de	Alencar	Cunha	sobre	essa	mesma	região,	além	das	pesquisas	de	Laís	Mourão	Sá	e	
Alfredo	Wagner	Berno	de	Almeida	sobre	o	campesinato	maranhense.
108
Outro	 conjunto	 de	 pesquisas	 foram	desenvolvidas	 entre	 no	 leste	 e	 no	 norte	
de	Mato	Grosso	como	“A	dinâmica	regional	do	Centro-Oeste”,	de	Mireya	Suárez	et	al.	
(1977),	 o	 projeto	 “Campesinato	 e	 peonagem	numa	 área	 de	 expansão	 capitalista”	 reuniu	
pesquisadores	 como	 Mireya	 Suárez,	 Eurípedes	 da	 Cunha	 Dias,	 Neide	 Esterci	 e	 Luís	
Roberto	Cardoso	de	Oliveira,	na	época	era	aluno	de	pós-graduação	do	Museu	Nacional.	O	
foco	das	pesquisas	nessa	região	estava	concentrado	nos	“problemas	enfrentados	pelo	
avanço	das	frentes	de	expansão”	(Melatti,	2007,	p.	29).
Serão	consideradas	dentro	dos	estudos	regionais	outro	conjunto	de	pesquisas	
que	 tratam	 de	 “Hábitos	 e	 ideologias	 alimentares	 em	 grupos	 sociais	 de	 baixa	 renda”,	
conduzido	por	 Klaas	Woortmann	e	Otávio	Guilherme	Velho	 e	 que	 se	distribuiu	 em	onze	
pesquisas	de	campo,	por	áreas	rurais	e	urbanas,	nos	estados	do	Pará,	Maranhão,	Paraíba,	
Rio	de	Janeiro,	Minas	Gerais,	Goiás	e	Distrito	Federal.	Klaas	Woortmann	publicou,	como	
produto	 dessa	 pesquisa,	 “Hábitos	 e	 ideologias	 alimentares	 em	 grupos	 sociais	 de	 baixa	
renda”	em	1978.
Além	desses	trabalhos	surge	outro	campo	de	deslocamento	que	se	concentra	
em	temas	específicos	e	procura	se	diferenciar	dos	anteriores	estudos	de	comunidade,	
que	não	busca	a	análise	da	totalidadede	uma	comunidade,	mas	o	foco	em	um	aspecto.
Assim,	teríamos	agora	os	“estudos	em	comunidade”	caracterizados	pelo	exercício	
comparativo,	um	exemplo	desse	tipo	de	pesquisa	é	aquele	que	se	realizam	em	comunidades	
de	pescadores	como	o	de	Raimundo	Heraldo	Maués	“A	 ilha	encantada”	 (1983),	que	vai	
tratar	das	formas	tradicionais	de	medicina	numa	comunidade	de	pescadores	do	Pará	e	
Maria	Angélica	Maués	que	discutiu	os	status	das	mulheres	nessa	mesma	comunidade.
A	antropóloga	Mariza	Peirano	investigou	as	proibições	alimentares	e	publicou	a	
respeito	em	“A	reima	do	peixe”	(1979).
Há	 uma	 série	 de	 trabalhos	 que	 não	 foram	 mencionados	 aqui,	 mas	 o	 que	
desejamos	 que	você	 aprenda	 é	 a	 diversidade	 de	 pesquisas	 e	 como	 elas	vão	 produzir	
conteúdos	 que	 falam	 também	 de	 outras	 áreas	 da	 antropologia,	 como,	 por	 exemplo,	
desigualdade	 social,	 identidade	 étnica,	 sistemas	 de	 classificação,	 reprodução	 social,	
saúde,	religião,	trabalho,	dentre	outros.
A	antropóloga	Giralda	Seyferth	(2011,	p.	399)	destaca	algumas	características	
do	campesinato	no	Brasil:
 
Assim,	a	questão	do	"trabalho	familiar"	é	central	na	discussão	sobre	a	
pequena	produção	camponesa	que	não	é	necessariamente	geradora	
de	uma	formação	(econômica)	particular,	pois	adapta	e	interioriza	a	seu	
modo	princípios	 econômicos	mais	 gerais.	 Daí	 a	 controvérsia	 sobre	
as	vantagens	e	as	desvantagens	em	relação	à	exploração	capitalista	
na	agricultura,	com	a	configuração	de	uma	"questão	agrária",	iniciada	
em	fins	 do	 século	 XIX	 na	 Europa,	 quando	 também	 começaram	 os	
vaticínios	sobre	o	fim	do	campesinato.
 
109
Se	no	 início	 da	 formação	da	 antropologia	 o	 foco	das	 atividades	de	pesquisa	
estava	 concentrado	 nos	 povos	 “primitivos”	 com	 a	 revolução	 industrial	 e	 a	 formação	
do	mundo	urbano,	as	mudanças	que	 implicam	as	populações	rurais	passaram	a	ser	um	
objeto	de	atenção	dos	antropólogos.	Até	aqui,	acadêmico,	já	foi	possível	perceber	que	as	
populações	 rurais	 estão	 em	contínuo	processo	de	mudança	e	 interação	 com	outros	
grupos	sociais.
O	fato	de	identificar	essa	relação	de	interação	com	outros	grupos	sociais	serve	
também	para	explicar	as	influências	que	uns	exercem	sobre	os	outros,	não	por	acaso	já	
vimos	como	os	estudos	de	comunidade	e	os	estudos	 regionais	foram	 importantes	para	
perceber	a	diversidade	de	grupos	sociais	que	fazem	parte	do	mundo	rural.
No	 próximo	 subtópico	vamos	 conhecer	 o	 conceito	 de	 povos	 e	 comunidades	
tradicionais,	assim	como	vamos	poder	nos	aproximar	de	algumas	dessas	comunidades	
a	 fim	 de	 conhecer	 suas	 características	 e	 situar	 suas	 perspectivas	 para	 o	 estudo	 da	
antropologia	brasileira.
4 COMUNIDADES TRADICIONAIS
A	 política	 nacional	 de	 desenvolvimento	 sustentável	 de	 povos	 e	 comunidades	
tradicionais	 tem	 como	marco	 referencial	 o	 Decreto	 nº	 6.040/2007	 que	 estabeleceu	 os	
critérios	para	definir	um	povo	ou	grupo	de	indivíduos	que	possa	ser	classificado	como	uma	
comunidade	tradicional.	Assim,	podemos	resumir	em	quatro	aspectos	principais	que	podem	
ser	 utilizados	 para	 caracterizar	 um	 grupo	 como	 comunidade	 tradicional,	 a	 saber:	 a)	 as	
práticas	culturais;	b)	a	organização	social;	c)	o	território	específico;	e	d)	a	tradição	ancestral.
Assim,	as	práticas	culturais	próprias	que	significa	que	esse	grupo	tem	atividades	
e	características	e	formas	de	uso	e	manuseio	de	artefatos	que	são	constitutivas	daquele	
grupo,	isto	é,	são	elementos	que	os	identificam	como	pertencentes	a	um	grupo	específico	e	
que	cria	uma	relação	de	identificação	entre	indivíduos	que	pertencem	ao	mesmo	grupo	
e	 cria	 uma	 identificação	 deles	 para	 grupos	 externos	 que	 não	 compartilham	 dessas	
características.	 Logo,	 uma	 comunidade	 indígena	 pode	 ser	 definida	 como	 tradicional	
com	base	nessa	descrição.
A	 sociedade	 nacional	 reconhece	 os	 Tupinambás	 como	 um	 grupo	 indígena	
baseado	nessa	definição,	por	estabelecer	com	esse	grupo	uma	relação	que	reconhece	
suas	diferenças.
Já	quando	se	fala	em	organização	social	de	comunidades	tradicionais	é	para	
lembrar	o	modo	como	esse	grupo	se	organiza	politicamente,	entendendo	que	muitos	
deles	possuem	um	tipo	de	liderança	que	se	constrói	com	base	nas	relações	de	parentesco	
ou	de	práticas	econômicas	ou	se	tem	grupos	específicos	que	compõem	um	grupo	mais	
amplo,	mas	que	mantem	algum	grau	de	diferenciação	entre	suas	atividades.	Exemplo	
disso	são	os	povos	indígenas	do	Brasil,	que	compõem	um	grupo	social,	mas	que	cada	
110
etnia	possui	suas	características	particulares	e	formas	de	se	organizar	socialmente,	isto	
é,	tem	variação	de	grupo	a	grupo.
O	 terceiro	 elemento	 importante	nessa	definição	é	 ter	um	território	 específico	
para	essa	população,	em	geral,	a	maioria	das	comunidades	e	povos	tradicionais	tem	uma	
forte	marcação	identitária	com	o	seu	território.
Essa	definição	se	constrói	com	base	na	relação	que	essa	comunidade	estabelece	
com	aquele	território	específico,	por	exemplo,	pescadores	que	vivem	próximo	a	um	rio	
ou	uma	praia,	a	 identidade	dele	é	definida	em	relação	com	o	ambiente	territorial	que	
eles	ocupam,	pois,	sua	forma	de	existir	passa	por	se	relacionar	com	aquele	território,	
seus	modos	de	usos	e	ocupação	daquele	lugar	definem	também	seu	pertencimento	e	
influenciam	em	sua	subsistência.
O	 território	 pode	variar,	 estar	 situado	 numa	 região	 litorânea,	 no	 sertão,	 próximo	
aos	rios,	dentro	das	florestas,	na	foz	de	um	rio,	na	caatinga,	dentre	outros	espaços.	Assim,	
é	compreensível	que	essa	comunidade	estabeleça	uma	relação	específica	com	o	território	
ocupado,	 pois	 é	 a	 respeito	 dele	 que	 seus	 habitantes	 aprendem	 a	 viver	 e	 sobreviver,	
respeitando	e	preservando	seu	uso	e	ocupação	como	uma	forma	de	manutenção	de	uma	
relação	com	este	território	que	não	seja	violenta,	exploratória	e	destrutiva,	pois	eles	possuem	
conhecimentos	tradicionais	para	um	uso	e	um	modo	de	ocupação	de	convivialidade	com	o	
meio	ambiente,	os	animais	e	tudo	que	há	naquele	território	de	maneira	sustentável.
Por	último	destacamos	a	tradição	ancestral	aquela	cultura	e	suas	características	de	
ocupação	e	reprodução	social	foram	transmitidas	de	geração	em	geração,	entendendo	que	
a	coesão	daquele	grupo,	suas	características,	seus	artefatos,	sua	política,	sua	economia	
não	 foram	criadas	no	contexto	presente,	mas	dentro	de	um	processo	histórico	 com	
base	no	aprendizado	socialmente	compartilhado	de	gerações	anteriores	para	as	novas	
gerações.	Logo,	a	geração	atual	tem	o	papel	social	de	preservar	as	práticas	culturais	
passadas	com	o	 intuito	de	permanecer	estabelecendo	uma	boa	relação	com	o	território	
socialmente	ocupado	por	ela.	Estas	são	características	determinam	a	formação	do	que	se	
entende	conceitualmente	como	comunidades	ou	povos	tradicionais	no	Brasil.
Já	vimos	que	existem	inúmeras	comunidades	tradicionais,	em	nossa	análise	neste	
livro	vamos	dividir	entre	comunidades	 indígenas	e	não	 indígenas	(quilombolas,	 ribeirinhos,	
caiçaras,	 ciganos,	 dentre	 outros),	 porque	 sabemos	 que	 há	 um	 volume	 expressivo	 de	
comunidades	 indígenas	 no	 Brasil	 e	 com	 características	 muito	 diferentes	 entre	 si.	 No	
que	se	refere	às	comunidades	não	 indígenas	podemos	ainda	encontrar	características	
comuns	em	relação	às	indígenas,	por	estarem	próximas	entre	si,	compartilharem	algumas	
práticas	comuns,	mas	não	são	pertencentes	a	mesma	comunidade.
Nesse	sentido,	acredito	que	o	quadro	geral	apresentado	é	suficientemente	complexo	
e	exige	de	nós	um	exame	mais	detalhado	acerca	de	exemplos	que	possam	auxiliar	você,	
acadêmico,	a	realçar	essas	características,	desafiar	limites	e	entender	as	dinâmicas	sociais	
que	compõem	essas	diferenças.	Assim,	que	tal	avançar	em	alguns	exemplos?
111
4.1 INDÍGENAS
A	população	 indígena	no	Brasil	 representa	cerca	de	900	mil	pessoas,	segundo	
dados	coletados	pelo	Instituto	de	Geografia	e	Estatística	(IBGE)	no	último	censo	realizado	
em	2010,	que	neste	ano	de	2022	será	atualizado.
Naquele	período	de	levantamento	de	dados,	572.083	desses	indígenasviviam	
na	 zona	 rural	 enquanto	 324.834	 estavam	 morando	 nas	 zonas	 urbanas,	 totalizando	
896.917	indígenas	vivendo	em	todas	as	regiões	do	país,	 inclusive	no	Distrito	Federal.	Um	
acordo	entre	a	FUNAI	e	o	 IBGE,	celebrado	em	2018	criou	um	site	para	 registrar	censo	
indígena	e	tem	o	propósito	de	auxiliar	na	realização	do	censo	que	é	importante	como	
elemento	para	auxiliar	na	construção	e	 implementação	de	políticas	públicas	voltadas	
para	essas	populações.
O	Amazonas	é	o	estado	com	a	maior	população	 indígena	do	Brasil,	 284,5	mil,	
seguido	por	Mato	Grosso	com	145,3	mil,	Pará	com	105,3	mil	e	Roraima	com	83,8	mil.	
Além	disso,	 estados	 como	Pernambuco	e	Mato	Grosso	do	Sul	 registraram	um	maior	
número	de	pessoas	em	áreas	indígenas,	respectivamente,	80,3	mil	e	78,1	mil.
Dentre	as	regiões	com	o	maior	número	de	indígenas	destaca-se	a	Região	Norte	
com	560,4	mil,	seguido	pela	Região	Nordeste	com	234,7	mil,	Centro-Oeste	com	224,2	
mil,	Sul	com	59,9	mil	e	Sudeste	com	29,8	mil.	Segundo	o	Censo	IBGE	(2010),	estima-se	
que	haja	305	povos	indígenas	no	Brasil	e	isso	representa	0,47	%	da	população	brasileira.
Os	 povos	 indígenas	 ou	 povos	 originários	 são	 aqueles	 que	 já	 habitavam	 aqui	
antes	 da	 chegada	 dos	 colonizadores	 europeus,	mesmo	 após	 o	 reconhecimento	 em	
matéria	de	lei,	com	a	Promulgação	da	Constituição	Federal	de	1988	que	reconheceu	a	
organização	social,	os	costumes,	as	línguas,	as	crenças,	as	tradições	e	o	direito	originário	
desses	povos	em	relação	ao	seu	local	de	moradia	e	ocupação,	ainda	hoje	essa	parcela	da	
população	brasileira	sofre	com	invasões,	violências	e	a	demora	na	demarcação	de	suas	
terras.	A	luta	pela	terra	segue	sendo	uma	constante	para	os	povos	indígenas.
No	Brasil	 há	 274	 línguas	 indígenas	 faladas,	 em	 termos	 linguísticos	 fazem	parte	
do	Tronco	Tupí	as	famílias	linguísticas	Tupí	Guaraní,	Arikém,	Awetí,	Jurúna,	Mawé,	Mondé,	
Mundurukú,	 Puroborá,	 Ramaráma	 e	 Tupar.	 Já	 as	 famílias	 linguísticas	 Jê,	 Maxacalí,	
Sobre o acordo firmado entre FUNAI e IBGE, que trata de destacar o 
segmento indígena nas bases de dados sobre a população, confira: 
https://indigenas.ibge.gov.br/.
DICA
https://indigenas.ibge.gov.br/
112
Krenák,	Yathê,	Karajá,	Ofayé,	Guató,	Rokbabtsá	e	Boróro	compõem	o	Tronco	Macro-Jê.	
Esses	305	povos	indígenas	possuem	cultura,	 língua	e	organização	política	próprias,	o	que	
os	 reúne	entorno	do	uso	da	categoria	povo,	no	entanto,	o	termo	“etnia”	é	utilizado	para	
valorizar	o	aspecto	cultural	que	diferencia	esses	povos.
Os	povos	originários	 sofreram	com	a	violência	 física,	 com	a	espoliação	de	suas	
terras,	mas	também	com	o	genocídio	em	decorrência	de	doenças	e	da	morte	social	e	
cultural,	isto	é,	o	etnocídio	de	seus	saberes,	sua	cultura,	seu	conhecimento,	de	sua	visão	de	
mundo	e	de	sua	filosofia.
Enquanto	 os	 povos	 indígenas	 estabelecem	 uma	 relação	 de	 afinidade	 e	
proximidade	 intensas	com	a	terra,	que	está	associada	à	concepção	de	vida	e	nada	tem	
a	ver	com	mercadoria,	a	sociedade	nacional,	baseada	em	valores	ocidentais,	parte	da	
ideia	de	terra	como	posse	e	mercadoria,	uma	propriedade	estabelecendo	uma	relação	
de	distanciamento	com	a	natureza	e	 com	 isso	oferecendo	um	modo	de	vida	diferente,	
baseado	na	extração	e	exploração	de	recursos	naturais	para	acumulação	e	não	para	
subsistência	ou	respeito	ao	meio	ambiente.
O	termo	comunidades	 indígenas	é	um	marco	 importantíssimo	na	configuração	
social	 do	 nosso	 país	 que	 vem	 a	 ser	 utilizado	 para	 demarcar	 políticas	 sociais	 de	
reconhecimento	e	de	implementação	de	políticas	públicas	voltadas	a	essa	parcela	da	
população,	 isto	porque	os	povos	 indígenas	são	pré-coloniais,	 significa	que	eles	habitam	
e	ocupavam	o	território	brasileiro	antes	da	chegada	dos	europeus	colonizadores	aqui	
em	nosso	país	 e	 ao	considerar	 essas	dimensões	pretende-se	criar	mecanismos	que	
promovam	o	reconhecimento	de	sua	identidade,	de	suas	terras,	de	seus	direitos	e	de	
suas	epistemologias.
Ao	falarmos	em	reconhecer	suas	epistemologias,	significa	que	os	diferentes	povos	
indígenas	 estavam	 organizados	 à	 sua	 maneira,	 já	 moravam,	 ocupavam	 e	 dominavam	 as	
práticas	de	uso	e	ocupação	para	seu	próprio	consumo	e	subsistência	e	tinham	domínio	
de	seu	espaço	social,	lembrando	que	eles	estavam	divididos	em	inúmeras	tribos	e	etnias.
A	chegadas	das	expedições	europeias	representam	um	processo	doloroso	da	
nossa	história,	pois	significa	a	 invasão	e	o	uso	de	formas	de	exploração	e	violência	para	
tomar	o	território	dos	povos	indígenas.	Para	você	ter	uma	ideia,	acadêmico,	veja	o	que	
está	acontecendo	com	os	números	povos	e	comunidades	 indígenas	em	uma	escala	
histórica	e	demográfica.	A	população	diminuiu	expressivamente.
Os	índices	demográficos	estão	cada	vez	mais	diminuindo	e	se	você	pensar	bem,	
acadêmico,	 aqueles	 poucos	 povos	 que	 ainda	 resistiram	 ao	 tempo	 enfrentam	 hoje	 a	
vulnerabilidade	da	pandemia	de	covid-19	e	a	invasão	de	suas	terras	por	práticas	ilegais	
de	 exploração	de	minério,	 desmatamento	 de	 árvores	 e	 construção	de	hidrelétricas	 que	
ameaçam	o	ecossistema	de	subsistência	dessas	populações.
113
É	 muito	 importante	 que	 nós	 lembremos	 da	 grande	 diversidade	 de	 povos	
indígenas,	a	variação	de	grupos	também	está	associada	com	os	modos	de	ocupação	e	uso	
do	território,	 isto	é,	aqueles	povos	que	habitavam	as	profundezas	da	floresta	amazônica,	
os	povos	 indígenas	que	estavam	 localizados	nas	margens	 litorâneas,	cada	grupo	em	
regiões	diferentes	de	todo	o	território	brasileiro	produzia	características	diferentes	entre	
eles.
Significa	que,	ainda	que	todos	sejam	 indígenas,	há	diferenças	e	variações	entre	
cada	grupo.	 Inclusive	muitos	mantinham	 relações	 rivalidade	e	outros	associavam-se	
em	alianças.
As	 pesquisas	 antropológicas	 como	 as	 de	 Roberto	 Cardoso	 de	 Oliveira	 e	 Darcy	
Ribeiro	 contribuíram	muito	 na	 consolidação	 de	 uma	 antropologia	 engajada	nas	 lutas	 dos	
povos	indígenas	diante	do	Estado	brasileiro	que	não	via	suas	necessidades,	demandas	e	
riscos	de	desaparecimento.
Assim,	uma	 importante	 instituição	 foi	 fundada	para	 contribuir	 com	preservação	
dos	 territórios	 indígenas	 e	 segurança	 dos	 povos	 indígenas.	 Estamos	 falando	 da	
Fundação	Nacional	do	Índio	(FUNAI).	Esta	instituição	tem	por	objetivo	a	proteção	dos	
povos	 indígenas	e	dos	seus	territórios,	ao	colocar	em	ação	as	atividades	de	proteção,	
a	FUNAI	 foi	 alvo	de	 inúmeros	ataques	–	 fosse	 internamente,	 sofrendo	com	cortes	e	
sucateamento	de	sua	estrutura	organizacional,	fosse	pelas	ações	de	grupos	invasores	
e	de	latifundiários,	que	tentavam	cada	vez	mais	invadir	e	ampliar	as	áreas	de	exploração.
Conflitos	entre	 indigenistas	e	 invasores	acontecem	até	hoje	o	mais	recente	deles	
chocou	o	mundo	quando	um	indigenista	da	FUNAI,	Bruno	Pereira,	e	um	jornalista	britânico,	
Dom	Phillips,	desapareceram	e	foram	encontrados	mortos	na	região	do	Vale	do	Javari.
Sobre o caso Bruno Pereira e Dom Phillips, leia a seguinte matéria: 
http://glo.bo/3KzcOJq.
DICA
Para entender melhor o conceito de etnogênese, leia o artigo do historiador 
e antropólogo José Mauricio Arruti. Disponível em: https://bit.ly/3AYOX2Q.
INTERESSANTE
114
4.2 QUILOMBOLAS
As	 comunidades	 quilombolas	 são	 formadas	 por	 grupos	 de	 pessoas	 que	 são	
descendentes	de	africanos	que	foram	escravizados	durante	o	período	colonial.	Significa	
que	a	maioria	dessas	comunidades	se	formaram	a	partir	da	 luta	de	escravizados	pelo	
direito	à	liberdade,	estas	comunidades	são	registros	da	resistência	e	a	memória	ancestral.
Figura 7 – Luta de escravizados
Fonte: https://bit.ly/3AYBurP. Acesso em: 26 ago. 2022.
As	 comunidades	 de	 remanescentes	 de	 quilombo	 representam	 também	
uma	forma	de	mobilização	e	 luta	de	negros	que	foram	escravizados	para	escapar	do	
sistema	 colonial	 de	 escravização.	 Assim,	 os	 negros	 que	 na	 época	 foram	 escravizados	
fugiam	 e	 formavam	 pequenas	 comunidades	 em	 territórios	 que	 pudessem	 abrigar	 com	
maior	segurança	e	dificultasse	a	ação	de	seusperseguidores	coloniais.	Esse	 lugar	foi	
chamado	de	quilombo,	lugar	de	resistência	política,	cultural	e	religiosa,	onde	formavam	
uma	 comunidade	 quilombola.	 O	 encontro	 entre	 essas	 pessoas	 nesse	 novo	 lugar	 foi	
marcado	por	um	modo	de	vida	em	que	as	práticas	de	resistência	política,	assim	como	
hábitos	 alimentares,	 formas	 de	 professar	 sua	 fé,	 núcleos	 familiares	 e	 afetivos	 foram	 se	
constituindo	para	a	construção	de	uma	vida	livre	de	violência	e	com	alguma	perspectiva	
de	subsistência	interna.
A	vida	nesses	quilombos	nutria	outras	formas	de	convivência,	numa	tentativa	
de	manter	tradições	de	seus	lugares	de	origem,	atualizar	sua	língua,	reforçar	suas	práticas	
religiosas,	compartilhar	suas	experiências	de	dor	e	sofrimento	e	articular	uma	formação	
coletiva	para	a	resistência	ao	sistema	colonial.
A	 necessidade	 de	 se	 esconder	 para	 sobreviver	 era	 tão	marcante	 e	vital	 que	
muitas	comunidades	demoraram	muito	tempo	para	serem	descobertas	mesmo	após	
a	abolição	da	escravatura	em	1888,	no	entanto,	atualmente	essas	pessoas	enfrentam	
novos	problemas	para	se	manterem	em	comunidade.	E,	então,	acadêmico,	agora	você	
deve	se	perguntar:	quais	seriam	esses	problemas	hoje	em	dia?
115
Vamos	lembrar	que	essas	comunidades	quilombolas	estão	espalhadas	por	todo	o	
território	brasileiro,	que	é	imenso,	para	regularizar	a	situação	social	de	reconhecimento	
do	 território	 como	 remanescente	 de	 quilombo	 é	 preciso	 um	 trabalho	 de	 elaboração	 e	
pesquisa	da	comunidade,	suas	práticas	e	modos	de	vida,	o	desenho	de	sua	genealogia,	a	
demarcação	do	território	mediante	processos	de	reconhecimento	de	suas	fronteiras,	o	
registro	de	suas	atividades	políticas	e	de	organização	social,	seu	sistema	de	parentesco,	
seus	hábitos	alimentares,	usos	e	modos	de	ocupação	do	lugar,	dentre	outros	aspectos.	
Mesmo	após	o	reconhecimento	público	de	que	se	trata	de	uma	comunidade	quilombola	
há	ainda	problemas	quanto	à	infraestrutura	básica,	por	exemplo,	acesso	à	água	potável,	
rede	de	esgotos,	energia	elétrica,	acesso	à	educação,	saúde	e	condições	de	trabalho.	Além	
dessa	dimensão	da	estrutura	da	comunidade,	há	que	se	observar	as	políticas	de	assistência	
governamentais	para	a	criação	e	manutenção	dessas	áreas	em	condições	dignas	de	vida.
Quer saber um pouco mais dos direitos das comunidades 
quilombolas no Brasil? Então, acadêmico, se liga nesse podcast: 
https://spoti.fi/3pTHETK.
DICA
4.3 CAIÇARAS
A	comunidade	caiçara	é	um	grupo	social	tipicamente	 litorâneo	que	se	formou	
a	 partir	 das	 relações	 miscigenas	 entre	 populações	 indígenas,	 populações	 negras	 e	
colonos	europeus	em	torno	do	bioma	Mata	Atlântica	ocupando	a	faixa	de	terra	seca	que	
fica	entre	o	Mar	do	Atlântico	e	a	Serra.	Em	geral,	são	comunidades	encontradas	no	litoral	
sudeste	do	Brasil	–	São	Paulo,	Rio	de	Janeiro,	Paraná	até	Santa	Catarina	-,	mas	também	
está	no	nordeste	do	país,	em	regiões	da	Bahia	com	os	jangadeiros	e	do	Maranhão	com	os	
balseiros.	Sua	marca	predominante	é	o	território	limiar	entre	a	terra	e	a	água.
O	que	os	define	como	uma	comunidade	tradicional	é	sua	forma	de	vida	baseada	
no	tipo	de	agricultura	chamada	 itinerante,	na	qual	a	pesca,	o	extrativismo	vegetal	e	o	
artesanato	são	predominantes.	Duas	atividades	predominantes	nessas	comunidades	
são	a	pesca	marítima	artesanal,	não	predatória,	 e	a	agricultura	primitiva,	 isto	é,	 sem	
utilizar	 tecnologias	mecanizadas	 para	 suas	 práticas	 agrícolas,	 sendo	 assim	 cultivam	
práticas	mais	tradicionais	e	de	agricultura	e	pesca,	como	a	coivara	e	a	pesca	de	tipo	
puçá,	para	o	próprio	consumo.	Assim	como	o	modo	de	preparar,	armazenar	e	utilizar	
alimentos	como	farinha	e	o	peixe	traduzem	uma	marca	cultural	de	herança	indígena,	em	
que	se	destaca	um	uso	diverso	da	mandioca,	o	preparo	do	peixe	defumado	e	cozidos	
lentos	para	feitura	de	pirão.
116
Entre	 suas	 manifestações	 culturais	 podemos	 destacar	 aqui	 aquelas	 que	 os	
caiçaras	mantém	vivas,	por	exemplo,	o	fandango	português	que	se	tornou	Patrimônio	
Imaterial	Cultural	em	2012,	o	tamanqueado	e	a	Folia	do	Divino	 (que	acontece	em	Paraty-
RJ)	e	virou	Patrimônio	Imaterial	Cultural	do	Brasil	em	2013	e	o	Boi	mamão	que	é	uma	
variação	do	boi	bumbá	e	combina	o	som	da	rabeca,	da	viola	branca	de	sete	cordas	e	do	
machetinho.
Dentre	 as	 dificuldades	 encontradas	 pelas	 comunidades	 caiçaras	 para	 sua	
sobrevivência	estão	as	mudanças	que	começaram	a	surgir	ainda	na	década	de	1950	
quando	as	 regiões	onde	essas	populações	 residiam	passaram	a	ser	objeto	de	 interesse	
comercial	com	o	crescimento	da	especulação	imobiliária	em	face	de	sua	proximidade	
com	o	mar	e,	por	outro	 lado,	por	estar	entre	um	faixa	de	terra	entre	o	mar	e	serra,	seus	
limites	 encontram	zonas	de	proteção	ambiental	 bem	preservadas	da	Mata	Atlântica.	
Entre	os	anos	de	1970	e	1980	essas	populações	passaram	a	se	mobilizar	coletivamente	
e	se	organizaram	para	lutar	pelo	reconhecimento	cultural	e	territorial	da	cultura	caiçara.
Quer saber mais a respeito dos caiçaras? Conheça o trabalho de 
pesquisa de Gabriel Bertolo (2015) em: https://bit.ly/3wJaGtc.
DICA
4.4 RIBEIRINHOS
Povos	ribeirinhos	ou	comunidades	ribeirinhas	são	aqueles	grupos	sociais	que	
estão	situados	nas	proximidades	de	 rios,	 igarapés,	 igapós	e	 lagos	da	floresta,	utilizando	a	
prática	da	pesca	artesanal	como	sua	principal	fonte	de	subsistência	e	sobrevivendo	as	
variações	sazonais	da	água	e	do	clima	no	seu	cotidiano	de	vida	e	de	trabalho.	Em	geral,	
cultivam	pequenos	 roçados	para	seu	próprio	consumo	e	praticam	atividades	extrativistas	
para	sua	sobrevivência,	nutrindo-se	das	condições	oferecidas	pela	natureza.
A	proximidade	com	o	rio	vai	se	mostrar	essencial	na	maneira	como	a	cultura	
ribeirinha	vai	 se	desenvolver,	 isto	porque	essa	 localização	exerce	 influência	 sobre	 sua	
identidade	e	 subsistência.	Entre	 suas	atividades	essenciais	 estão	a	pesca,	 a	 caça	e	o	
extrativismo	vegetal	 e	 é	 uma	população	predominante	na	 região	 amazônica.	O	 rio	 é	
elemento	constitutivo	da	identidade	dessa	comunidade.
Um	dos	 acontecimentos	 históricos	 que	marcou	profundamente	 as	 comunidades	
ribeirinhas	foi	o	período	do	Ciclo	da	Borracha,	quando	esses	povos	se	deslocavam	para	
fazer	a	extração	do	látex	e	retirar	a	seringa	dos	seringais	para	a	produção	da	borracha.
117
Estima-se	que	existem	350	comunidades	 ribeirinhas	na	 região	amazônica,	 a	
Cuiú-cuiú	é	uma	delas.	Cerca	de	37	mil	habitantes	dessas	comunidades	vivem	isolados	à	
beira	de	rios,	com	pouco	ou	nenhum	acesso	às	políticas	de	assistência.
Um	dado	característico	dessas	comunidades	envolve	sua	relação	com	a	natureza,	
no	sentido	de	que	mesmo	estando	ali	essas	pessoas	estabelecem	uma	relação	de	respeito	
com	a	natureza,	procurando	preservar	esse	território	em	uma	relação	de	sustentabilidade	
com	o	meio	ambiente.	Aliás,	a	rigor,	esta	relação	de	sustentabilidade	com	a	natureza	
é	 uma	marca	 de	 todas	 essas	 comunidades	 tradicionais	 aqui	mencionadas	 (indígenas,	
quilombolas,	caiçaras,	ribeirinhas),	todavia,	cabe	ainda	falarmos	das	palafitas,	um	tipo	
de	construção	feita	pelos	ribeirinhos	que	são	casas	que	resistem	a	variação	do	nível	dos	
rios,	quanto	ao	seu	período	de	seca	e	de	cheia,	uma	espécie	de	construção	flutuante,	
embora	 seja	 construída	 num	nível	 acima	 daquele	 considerado	 a	 cheia	 do	 rio,	 assim	
quando	o	rio	sobe	a	casa	fica	preservada	e	não	corre	o	risco	de	alagamento.
Figura 8 – Comunidades
Fonte: https://bit.ly/3wGytty. Acesso em: 21 ago. 2022.
Vale a pena conferir o trabalho das pesquisadoras Talita de Melo 
Lira e Maria do Perpétuo Socorro Rodrigues Chave intitulado 
“Comunidades ribeirinhas na Amazônia: organização sociocultural e 
política”. Confira em: https://bit.ly/3AyUPP1.
DICA
118
Por	 fim,	 é	 relevante	 destacar	 que	 as	 comunidades	 tradicionais	 estabelecem	
formas	de	relação	com	o	seu	espaço,	cada	uma	delas	estabelece	à	sua	maneira	um	valor	
e	uma	 importância	sobre	o	espaço	vivido	e	é	observando	essa	vivência	e	os	processos	
sociais	que	se	desenvolvem	a	partir	dali	que	podemosidentificar	as	relações	culturais,	
existenciais	que	um	grupo	estabelece	com	o	espaço.
Finalizamos	este	tópico	rico	em	informações	a	respeito	de	diferentes	comunidades	
tradicionais,	conceitos,	autores	e	um	pouco	da	antropologia	das	populações	rurais	do	
Brasil.	Claro,	o	conhecimento	é	 inesgotável	e	aqui	você,	acadêmico,	tem	sempre	um	
mapa	para	buscar	aprofundamento	e	novos	conhecimentos	com	as	Gio	Dicas.
Em	nosso	próximo	tópico	vamos	abordar	as	organizações	econômicas,	as	dife-
rentes	relações	sociais	e	as	moralidades	presentes	no	mundo	rural	trazendo	contribuições	
de	outro	conjunto	de	pesquisas	das	relações	agrárias	e	ruralidades.
Lembre-se,	 antes	 de	 partir	 para	 um	 novo	 percurso	 de	 leituras,	 passe	 este	
conteúdo	em	revisão	e	faça	a	sua	autoatividade.
119
Neste tópico, você aprendeu:
•	 A	história	de	formação	da	antropologia	rural	no	Brasil.
•	 Os	 diferentes	 estudos	 e	 pesquisas	 que	 consolidaram	os	 estudos	de	 antropologia	 rural	
como	o	Campesinato.
•	 Aprendeu	o	conceito	de	povos	e	comunidades	tradicionais.
•	 Conheceu	diferentes	povos	tradicionais	como	indígenas	e	não	indígenas
RESUMO DO TÓPICO 2
120
1	 Conforme	 apontado	 pela	 antropóloga	 Alcida	 Rita	 Ramos	 (1990),	 nos	 estudos	 das	
populações	indígenas	no	Brasil,	duas	subáreas	passaram	a	representar	perspectivas	
ao	mesmo	tempo	complementares	e	distintas	–	em	algumas	situações,	até	oponentes.	
Quando	se	trata	de	estudos	das	populações	indígenas	essa	área	organizou	e	definiu	as	
bases	de	formação	do	campo	acadêmico	e	de	produção	em	pesquisa	na	Antropologia	
desde	 seus	 primórdios.	 Sobre	 estas	 grandes	 contribuições	 ao	 conhecimento	 da	
Antropologia	Rural,	 essa	autora	chama	a	atenção	para	duas	bifurcações	que	dela	
derivam.	Sobre	o	exposto,	assinale	a	alternativa	CORRETA:
Fonte: RAMOS, A. R . Memórias Sanumá: Espaço e Tempo em uma sociedade Yanomami. Brasília: Editora 
UnB, 1990.
a)	 (			)	 Etnologia	Indígena	e	Identidade,	Território	e	Relações	Interétnicas	espelham	essa	
dualidade	e	ruptura.
b)	 (			)	 Antropologia	dos	Índios	rurais	e	Estudos	de	conflitos	e	pacificação.
c)	 (			)	 Antropologia	 Rural	 da	 Cosmologia	 Indígena	 e	 Estudos	 de	 Territorialidade	 e	
Desterritorialização.
d)	 (			)	 Etnologia	Ameríndia	e	Antropologia	da	Terra	e	Mundo	Rural.
2 A	 Antropologia	 Rural	 pode	 ser	 definida	 como	 uma	 subárea	 da	 antropologia	 que	 se	
dedica	 ao	 estudo	 das	 populações	 do	 campo	 a	 partir	 da	 investigação	 antropológica	
e	do	uso	da	etnografia.	Alguns	antropólogos	se	dedicaram	ao	estudo	dos	modos	de	
vida	 com	 destaque	 para	 as	 relações	 de	 parentesco,	 etnicidade,	 alimentação,	 práticas	
festivas,	rituais	religiosos,	territorialidade,	economia,	saúde,	moradia,	novas	tecnologias	
no	campo,	dentre	outras	áreas	de	estudos.	Com	base	nessas	definições,	analise	as	
sentenças	a	seguir:
I-	 A	Antropologia	Rural	estuda	os	modos	de	vida	rural	que	não	fazem	parte	da	vida	
citadina,	em	contraposição	ao	modo	de	vida	urbano. 
II-	 Segundo	João	Pacheco	de	Oliveira,	os	sujeitos	indígenas	e	a	construção	de	suas	
identidades	 são	 homogêneos,	 porque	 os	 indivíduos	 indígenas	 interpretam	 e	
conhecem	o	mundo	somente	de	forma	limitada	e	não	há	espaço	para	mudança.
III-	 O	termo	“antropologia	rural”	nem	sempre	foi	utilizado	pelos	antropólogos	para	definir	
um	campo	de	pesquisa,	mas	os	fenômenos	que	eles	estudavam	eram	próprios	do	
mundo	rural.
Assinale	a	alternativa	CORRETA:
a)	 (			)	 As	sentenças	I	e	II	estão	corretas.
b)	 (			)	 Somente	a	sentença	II	está	correta.
c)	 (			)	 As	sentenças	I	e	III	estão	corretas.
d)	 (			)	 Somente	a	sentença	III	está	correta.
AUTOATIVIDADE
121
3	 Parte	 importante	 do	 estudo	 antropológico	 do	modo	de	vida	 rural	vem	do	 interesse	
de	 pesquisadores	 e	 pesquisadoras	 que	 veem	 os	 inúmeros	 grupos	 sociais	 que	 se	
desenvolvem	e	se	organizam	coletivamente	a	partir	do	campo	e	das	comunidades.	Uma	
parte	desses	pesquisadores	 lidam	com	a	categoria	campesinato	como	um	lócus	de	
observação	etnográfica,	por	onde	antropólogos	podem	ver	a	diversidade	dos	modos	de	
agrupamento,	manifestações	sociais	e	ações	coletivas,	bem	como	registrar	a	alteridade	
entre	os	sujeitos	que	se	agrupam	e	lutam	pelo	direito	à	terra	e	aos	diferentes	modos	de	
vida.	A	partir	das	contribuições	da	antropóloga	Giralda	Seyferth	(2011),	classifique	V	para	
as	sentenças	verdadeiras	e	F	para	as	falsas:
Fonte: SEYFERTH, G. Campesinato e o Estado no Brasil. Mana [on-line]. 2011, v. 17, n. 2, p. 395-417, 2011.
(			)	 A	 autora	 destaca	 como	uma	 característica	 do	 campesinato	 no	Brasil	 a	 questão	 do	
"trabalho	familiar"	que	pensada	como	central	na	discussão	sobre	a	pequena	produção	
camponesa	 que	 não	 é	 necessariamente	 geradora	 de	 uma	 formação	 (econômica)	
particular,	pois	adapta	e	interioriza	a	seu	modo	princípios	econômicos	mais	gerais.
(			)	O	 conceito	 de	 campesinato	 se	 refere	 aos	 grupos	 sociais	 formados	 por	 etnias	
indígenas	 que	 migram	 das	 aldeias-mãe	 para	 morar	 na	 cidade	 urbana	 e	 assim	
formam	novos	grupos	indígenas.
(			)	Daí	a	controvérsia	sobre	as	vantagens	e	as	desvantagens	em	relação	à	exploração	
capitalista	na	agricultura,	com	a	configuração	de	uma	"questão	agrária",	iniciada	em	
fins	do	século	XIX	na	Europa,	quando	também	começaram	os	vaticínios	sobre	o	fim	do	
campesinato.
Assinale	a	alternativa	que	apresenta	a	sequência	CORRETA:
a)	 (			)	 V	–	F	–	F.
b)	 (			)	 V	–	F	–	V.
c)	 (			)	 F	–	V	–	F.
d)	 (			)	 F	–	F	–	V.
4	 A	 política	 nacional	 de	 desenvolvimento	 sustentável	 de	 povos	 e	 comunidades	
tradicionais	tem	como	marco	referencial	o	decreto	6040/2007	que	estabeleceu	os	
critérios	para	definir	um	povo	ou	grupo	de	indivíduos	que	possa	ser	classificado	como	
uma	comunidade	tradicional.	Apresente	os	critérios	definidos	nesta	normativa	e	que	
estão	citados	no	texto.
5	 Existem	 inúmeras	 comunidades	 tradicionais,	 em	 nossa	 análise	 vimos	 que	 estas	 se	
dividem	entre	comunidades	indígenas	e	não	indígenas.	Neste	contexto,	disserte	sobre	o	
conceito	de	comunidades	tradicionais	citando	pelo	menos	dois	exemplos.
122
123
TÓPICO 3 — 
ORGANIZAÇÕES ECONÔMICAS, 
RELAÇÕES SOCIAIS E MORALIDADES 
NO MUNDO RURAL
UNIDADE 2
1 INTRODUÇÃO
	 Caro	 acadêmico,	 vimos	 até	 aqui	 que	 expansão	 de	 estudos	 e	 pesquisas	
antropológicas	 das	 populações	 rurais	 se	 desenvolveram	 de	 forma	 intensa	 e	 cobriam	
temas	focados	na	questão	territorial	e	de	reconhecimento	da	identidade.	No	Tópico	1,	você	
pôde	aprender	o	processo	histórico	de	formação	da	antropologia	e	seus	desdobramentos	
em	 estudos	 dos	 grupos	 sociais	 situados	 no	 mundo	 rural.	 Até	 então	 os	 estudos	 de	
comunidades	 e	 a	 etnologia	 indígena	 foram	 os	 principais	marcos	 de	 referência	 para	 o	
desenvolvimento	desse	campo.	Assim,	entre	as	décadas	de	1940	e	1970	esses	estudos	
representaram	fortemente	o	campo	de	estudos	em	torno	de	comunidades	e	grupos	que	
eram	lidos	e	definidos	com	base	na	sua	 localização	espacial,	seus	traços	culturais	e	em	
contraposição	ao	modo	de	vida	urbano.
Figura 9 – Modo de vida urbano
Fonte: https://bit.ly/3AYAunt. Acesso em: 26 ago. 2022.
Na	 década	 de	 1980	 os	 estudos	 das	 comunidades	 rurais	 estavam	 associados	
com	 a	 identidade	 negra	 e	 camponesa	 e	 exerceram	muita	 influência	 sobre	 os	 processos	
de	reconhecimento	de	territórios	e	regularização	de	terras.	Nesse	período,	o	campo	de	
estudos	 em	 etnologia	 indígena	 já	 estava	 consolidado	 como	 um	 campo	 expressivo	 e	 o	
volume	de	pesquisas	nessa	área	permitiu	uma	especialização	de	estudos	em	que	essas	
comunidades	tradicionais	foram	estudadas	de	forma	mais	 independente	umas	das	outras	
ressaltando	 aspectos	 epistemológicos	 e	 ontológicos	 em	 torno	 das	 reinvindicações	 de	
direitos	 territoriais,	 jurídicos,	 educacionais,	 de	 saúde	e	nesse	 sentido	vão	constituindo	
diferenças	 em	 que	 pese	 um	 processo	 de	 afastamento	 da	 identidade	 camponesa	 ou	
noutros	termos	do	campesinato	brasileiro.
124
Aponta-se	para	uma	diferença	significativaentre	aquelas	comunidades	tradi-
cionais	apresentadas	no	Tópico	2,	das	comunidades	e	grupos	que	falaremos	aqui.	As	lutas	
sociais	por	territórios	foram	constitutivas	de	comunidades	tradicionais	como	indígenas,	
quilombolas,	caiçaras	e	ribeirinhos,	e	se	destacam	justamente	por	terem	sido	posicionadas	
como	fenômenos	do	mundo	 rural	brasileiro.	Nesse	sentido,	a	abordagem	acerca	dos	
conceitos	de	terra,	 território	e	 territorialidade	proposta	por	Dominique	Galllois	 (2004)	
que	veremos	no	próximo	subtópico	faz	referência	exatamente	a	este	ponto.
Entretanto,	 para	 uma	 visão	 mais	 plural	 ainda	 é	 preciso	 localizar	 alguns	
componentes	 desse	 percurso	 historiográfico,	 sobretudo	 considerando	 a	 categoria	 terra,	
que	geralmente	está	associada	a	 identidade	do	camponês.	Assim,	 teríamos	dois	campos	
de	entendimento	a	respeito	dos	grupos	sociais	e	sua	relação	com	o	rural,	as	comunidades	
tradicionais	estariam	situadas	no	polo	das	lutas	por	território,	enquanto	os	camponeses	
se	estabelecem	nas	 lutas	pela	terra.	As	 lutas	por	território	nas	quais	situam-se	 indígenas,	
quilombolas	e	demais	comunidades	tradicionais	 reivindicam	a	demarcação	coletiva	de	
suas	terras,	 isto	é,	o	 reconhecimento	formal	de	que	determinados	espaços	compõem	a	
identidade	coletiva	de	um	grupo	social	e	representa	uma	luta	por	direitos	culturalmente	
diferenciados,	assim	a	relação	com	esse	território	é	uma	relação	de	pertencimento	coletivo	
e	 responsabilidade	 coletiva	 pelo	 território,	 não	 como	 uma	 posse	 ou	 uma	 propriedade	
individual.	Por	outro	lado,	as	dinâmicas	que	envolvem	as	lutas	por	terra	se	caracterizam	
por	demandas	políticas	cujo	centro	de	suas	discussões	destacam	a	categoria	 “classe”	
que	mobiliza	 direitos	universais	 e	 constitui	 sujeitos	políticos	 como	trabalhadores	 sem-terra	
ou	mulheres	rurais,	por	exemplo,	 implicando	em	uma	relação	de	meio	de	produção,	no	
entanto,	 grupos	 rurais	 estabelecem	 uma	 relação	 com	 a	 terra	 por	meio	 de	 elementos	
constitutivos	 de	vínculos	materiais,	 espirituais	 e	 simbólicos,	 conforme	destacado	 pelo	
antropólogo	André	Dumas	Guedes	(2016).
Vejamos,	no	próximo	tópico,	 a	abordagem	conceitual	de	categorias	como	terra,	
território	e	territorialidade.
2 TERRITÓRIO E TERRITORIALIDADE
O	território	pode	ser	definido	com	base	nas	relações	de	poder	que	o	atravessam	
e	é	um	conceito	muito	importante	para	compreender	adequadamente	todos	os	conflitos	
e	a	história	de	formação	e	desenvolvimento	dessas	comunidades	tradicionais	que	você	
acabou	de	conhecer.
Assim,	acadêmico,	quando	você	leu	a	respeito	dos	povos	indígenas	percebeu	que	
havia	ali	uma	diversidade	de	etnias	que	ocupavam	de	forma	diferente	espaços	dentro	do	
que	sabemos	ser	o	Brasil.	Então,	com	a	chegada	dos	europeus	os	limites	entre	essas	etnias,	
bem	como	o	espaço	do	território	brasileiro	 já	ocupado	pelos	povos	 indígenas	é	alvo	de	
interesses	econômicos	e	invasão,	desrespeitando	sua	cultura,	seu	espaço	e	suas	fronteiras.
125
Essa	 relação	 de	 poder	 é	 desigual	 e	 hierárquica	 e	 busca	 expansão	 do	 poder	
econômico,	político	e	cultural.	Essa	relação	de	poder	vem	sempre	marcada	pela	dimensão	
política,	 não	 por	 acaso,	 parte	 da	 antropologia	 que	 desenvolveu	 estudos	 de	 etnologia	
indígena	vai	 chamar	 nossa	 atenção	 para	 as	 relações	 entre	 povos	 indígenas	 e	 sociedade	
nacional,	procurando	estabelecer	uma	noção	de	cidadania	ampliada,	em	que	se	respeite	
as	 formas	de	 ser	 e	 de	 habitar	 dessas	 populações	 que	possuem	sentidos,	 linguagens	 e	
organização	 social	 diferentes	 da	 sociedade	nacional,	 basta	 lembrar	 o	 conceito	 de	 fricção	
interétnica	do	antropólogo	Roberto	Cardoso	de	Oliveira	que	vimos	no	subtópico	anterior.
Estudos	 antropológicos	 evidenciam	 que	 há	 diferentes	 lógicas	 espaciais	 entre	
essas	 comunidades	 tradicionais.	 Por	 exemplo,	 entre	 povos	 indígenas	 há	 noções	 de	
organização	 territorial	 que	 se	 estruturam	 de	 acordo	 com	 as	 formas	 de	viver	 e	 usar	 o	
espaço	 (GALLOIS,	2004).	Logo,	a	dinâmica	fluida	de	mobilidade	espacial	encontrada	em	
diferentes	comunidades	indígenas	explicaria	também	a	ausência	de	uma	estrutura	fixa	
como	a	noção	de	fronteira.	Na	verdade,	o	que	a	literatura	antropológica	mostra	é	que	
essa	dimensão	de	limites	e	fronteiras	vem	a	ser	constituída	no	momento	de	contato,	
quando	 o	 Estado	 passa	 a	 impor	 processos	 de	 regularização	 fundiária	 no	 intuito	 de	
delimitar	territórios.
Para	Dominique	Gallois	(2004,	p.	40)	“nenhuma	sociedade	existe	sem	imprimir	
ao	espaço	que	ocupa	uma	lógica	territorial”	e,	acadêmico,	é	exatamente	nessa	perspectiva	
que	você	pode	compreender	o	sentido	social	de	um	território	para	uma	comunidade	
indígena.	Cada	comunidade	tem	sua	própria	 lógica	territorial	a	 respeito	do	espaço	e	ela	é	
constitutiva	do	modo	de	vida	dessas	populações.
A	antropóloga	coloca	em	discussão	as	diferentes	perspectivas	dos	conceitos	
de	terra,	 território	e	 territorialidade.	Nesse	sentido,	 a	 autora	nos	convida	a	pensar	nas	
descontinuidades	territoriais	que	podem	surgem	diante	do	tempo	e	da	função	que	cada	
grupo	social	desenvolve	com	a	região.	Refletindo	sobre	a	realidade	de	povos	indígenas,	
Gallois	(2004)	nos	mostra	que	essas	regiões	podem	ser	mutáveis	pela	ação	do	tempo,	
pela	 relação	de	proximidade	e	distanciamento	entre	grupos,	seja	pelos	processos	de	
extinção	de	grupos	ou	de	surgimento	de	outros	grupos,	e	por	isso	mais	correto	é	partir	
da	abordagem	da	territorialidade.
As	noções	de	terra	e	território	 já	foi	objeto	de	diferentes	estudos	antropológicos	
como	os	de	Seeger	e	Viveiros	de	Castro	(1979)	e	de	Oliveira	Filho	(1989;	1996),	todos	eles	
vão	nos	mostrar	que	essas	categorias	são	acionadas	de	maneira	distinta	pelos	atores	
envolvidos	no	processo	de	reconhecimento	e	demarcação	de	uma	Terra	Indígena.	Logo,	o	
conceito	 de	 “terra	 indígena	diz	 respeito	 ao	 processo	 político-jurídico	 conduzido	 sob	 a	
égide	do	Estado,	enquanto	território	remete	à	construção	e	à	vivência,	culturalmente	
variável,	da	relação	entre	uma	sociedade	específica	e	sua	base	territorial”	(2004,	p.	4).
126
Nesse	sentido,	é	necessário	 levar	em	consideração	aspectos	 importantes	dessa	
relação	entre	povos	e	território,	para	isso	a	autora	sugere	a	abordagem	da	territorialidade	
uma	vez	que	esta	permite	uma	avaliação	cuidadosa	das	relações	entre	terras	que	foram	
ocupadas	 em	 caráter	 permanente,	 aquelas	 terras	 que	 são	 utilizadas	 para	 atividades	
produtivas	e	as	terras	imprescindíveis	à	preservação	dos	recursos	ambientais	necessários	
ao	bem-estar	e	a	reprodução	física	e	cultural	dos	povos	indígenas	(GALLOIS,	2004).
Tais	 formas	 de	 olhar	 para	 dimensão	 territorial	 revela	 em	 muitos	 casos	 as	
sobreposições	de	umas	sobre	as	outras,	quando	na	verdade	essas	dimensões	devem	
ser	 lidas	 a	 partir	 das	 formas	 de	 organização	 territorial	 de	 cada	 comunidade	 indígena.	
Assim,	 se	 por	 acaso	 desconsiderar	 as	 singularidades	 de	 cada	 grupo	 na	maneira	 como	
organização	 sua	 territorialidade,	 elas	 relações	 de	 sobreposições	mencionadas	 acima	
podem	 interferir	 na	 delimitação	 de	 uma	 terra	 indígena	 de	 maneira	 errônea	 e	 como	
consequência	desse	erro	reduzir	a	abrangência	das	relações	territoriais	à	produção	e	às	
atividades	de	subsistência	(GALLOIS,	2004).	
Terra	não	é	o	mesmo	que	território,	de	acordo	com	estudos	antropológicos	aqui	
mencionados,	 considera-se	 que	 cada	 comunidade	 indígena	 possui	 uma	 lógica	 própria	
espacial	 e	 social,	 em	 sendo	 assim	 há	 diferentes	 formas	 de	 organização	 territorial	 e	 é	
nesses	termos	que	o	território	de	um	grupo	pode	ser	pensado	como	substrato	de	sua	
cultura	(GALLOIS,	2004).
No	 próximo	 subtópico,	 faremos	 uma	 exposição	 da	 formação	 das	 identidades	 a	
partir	do	território	e	seus	sentidos	sociais.
3 IDENTIDADE, TERRITÓRIO E NOVAS QUESTÕES DO 
MUNDO RURAL
Existe	uma	literatura	baseada	na	análise	de	movimentos	sociais	contemporâneos	
que	demonstram	os	diferentes	sentidos	sociais	que	a	terra	e	o	território	adquirem	emrelação	 aos	 grupos	 sociais	 que	 que	 lutam	 por	 ela.	 Ao	 longo	 deste	 subtópico	 você,	
acadêmico,	pode	se	familiarizar	um	pouco	com	as	demandas	e	os	sentidos	múltiplos	
que	essas	categorias	assumem	para	grupos	indígenas	e	não	indígenas.	Também	pode	
entender	que	esses	diferentes	grupos	 são	muito	maiores	do	que	aqueles	que	estão	
mencionados	nesse	livro,	portanto,	fica	o	convite	para	que	você	busque	o	conhecimento	
vasto	que	há	nesses	diferentes	grupos.
Além	 disso,	 você	 também	 aprendeu	 a	 diferenciar	 categorias	 analíticas	
importantes	ao	estudo	do	campo	da	Antropologia	Rural,	entendendo	como	e	quando	ela	
começa	e	quais	as	etnografias	que	foram	importantes	no	processo	de	formação	desse	
subcampo	de	estudos.	Ainda	é	relevante	destacar	a	maneira	como	categorias	analíticas	
como	terra,	território	e	territorialidade	auxiliam	em	nosso	processo	de	entendimento	da	
diversidade	de	grupos,	suas	demandas	de	reconhecimento	e	de	acesso	e	respeito	ao	
seu	modo	de	vida	quando	se	parte	da	luta	por	acesso	à	terra.
127
Para	 encerrar	 nossa	 unidade,	 vamos	 aprofundar	 um	 pouco	 a	 questão	 dos	
sentidos	sociais	das	lutas	por	terra	e	território,	para	então	quando	avançarmos	ao	último	
capítulo	deste	 livro	você	possa	entender	a	complexidade	das	dinâmicas	entre	o	rural	
e	o	urbano	nas	suas	intersecções.	Aqui	foi	privilegiado	o	olhar	sobre	as	comunidades	
tradicionais,	consideramos	mesmo	que	brevemente	a	exposição	de	diferentes	grupos	a	
fim	de	permitir	um	olhar	mais	plural	sobre	essas	identidades	e	lutas	sociais.
Em	 conformidade	 com	 o	 que	 aponta	 o	 antropólogo	 André	 Guedes	 (2016)	 o	
“território”	 é	 percebido	 como	 elemento	 central	 às	 lutas	 de	 diferentes	 movimentos	
sociais	 e	 deve	 ser	 pensado	 sempre	 em	 referência	 à	 sua	 capacidade	 de	 abarcar	 e	
evidenciar	particularidades	e	 identidades	específicas.	Essa	categoria	assume	também	um	
papel	 importante	 na	 esfera	 pública	 quando	 em	 situações	 de	 conflito	 ela	 é	 acionada	
para	 denunciar	 limites	 e	 abusos	 quanto	 aos	 impactos	 e	 efeitos	 sociais	 de	 projetos	 de	
acumulação	e	espoliação	capitalista,	 tendo	como	 referência	as	ameaças	à	vida	de	povos	
indígenas	e	demais	povos	tradicionais	ameaçados	de	terem	o	bioma	onde	vivem	e	de	
onde	dependem	para	viver	atravessados	por	exploração,	violências	e	esgotamento	das	
fontes	naturais	de	subsistências.
Dentro	dessa	perspectiva	uma	outra	 categoria	 analítica	 é	 acionada,	 isto	 é,	 a	
“desterritorialização”,	que	visa	dar	conta	de	um	modo	de	enunciar	um	conjunto	de	efeitos	
negativos	 promovidos	 por	 empreendimentos	 distintos	 dos	 modos	 de	 vida	 tradicionais.	
Guedes	 (2016)	defende	que	essa	categoria	 é	 extremamente	 relevante	para	 a	dimensão	
política	dessas	 lutas	sociais	para	pensar	nos	efeitos	sociais	de	grandes	projetos	que	
impacto	 negativamente	 na	 vida	 de	 diversas	 populações	 tradicionais.	 Esse	 termo	
implica	análises	empobrecidas	que	não	dão	conta	de	efeitos	possíveis	e	pensáveis	não	
imediatamente,	mas	em	longa	escala	(GUEDES,	2016).
Veja,	 acadêmico,	 todos	 esses	 autores	 aqui	 mencionados	 têm	 contribuído	 para	
entender	 uma	 diferença	 importante	 quanto	 ao	 sentido	 de	 terra	 e	 território	 quando	
acionadas	 dimensões	 sociais	 e	 econômicas,	 por	 um	 lado,	 evidenciando	 um	 sentido	
particular	de	um	tipo	de	expressão	espacial	em	que	um	modo	de	vida	se	desenvolve	e	
necessita	para	sua	reprodução	e	existência.	Por	outro	lado,	há	um	esforço	em	demonstrar	
os	 impactos	e	efeitos	nocivos	quando	há	uma	 imposição	de	projetos	econômicos	que	
veem	a	terra	e	o	território	apenas	como	um	recurso	econômico.
Assim,	 é	possível	 levarmos	a	 sério	 as	demandas	mobilizadas	pelas	 comunidades	
tradicionais	acerca	de	sua	territorialidade,	 frequentemente	 lembrada	como	algo	para	
além	 da	 posse	 individual	 e	 do	 sentido	 estritamente	 econômico	 que	 compõe	 a	 ideia	
de	 propriedade.	 Logo,	 é	 importante	 evocar	 toda	 a	 dinâmica	 que	 está	 inserida	 no	
reconhecimento	das	demandas	de	povos	e	comunidades	tradicionais	que	 resulta	de	
uma	 inter-relação	 entre	 aspectos	 como	 organização	 social,	 concepções	 naturais	 e	
ecológicas,	biológicas	e	culturais.
128
Assim	 as	 lutas	 territoriais	 de	 povos	 e	 comunidades	 tradicionais	 nas	 últimas	
décadas	 ganharam	maior	 protagonismo	 na	 esfera	 pública	 brasileira,	 se	 comparado	 com	
as	 lutas	 por	 “terra”	 de	 movimentos	 camponeses	 (ALMEIDA,	 2007).	 Alguns	 projetos	
econômicos	 e	 políticos	 hegemônicos	 tem	 contribuído	 para	 uma	 consolidação	 de	 lutas	
sociais	que	tem	por	objetivo	o	enfrentamento	mais	direto	aos	projetos	modernizantes	
que	 exploram	 e	 dizimam	 populações	 sem	 respeito	 às	 legislações	 ou	 ao	 direito	 das	
comunidades	e	povos	tradicionais.
Os	contextos	são	complexos,	os	grupos	são	 inúmeros	e	os	sentidos	sociais	que	
cada	um	deles	atribuem	às	suas	demandas	também	são	singulares.	É	preciso	entender	
a	coexistência	de	diferentes	sentidos	nessas	disputas,	no	sentido	de	ampliar	a	nossa	
capacidade	de	reconhecer	a	diferença,	preocupados	com	os	impactos	e	os	efeitos	que	
um	empreendimento	econômico	pode	suscitar	toda	uma	comunidade	de	pessoas.
Certamente	 no	 próximo	 capítulo	 quando	 falaremos	 dessas	 imbricações	 entre	 a	
dimensão	rural	e	urbana	em	fricção	poderemos	entender	melhor	quais	esses	efeitos,	
quais	os	limites	e	as	potencialidades	que	essas	lutas	sociais	despertam	no	tempo	presente.
A	década	de	1980	trouxe	uma	infinidade	questões	em	disputa	na	arena	pública	
brasileira,	conforme	já	foi	dito	aqui	um	dos	seus	acontecimentos	mais	marcantes	é	a	
promulgação	 da	Constituição	 Federal	 de	 1988	 que	 trouxe	 em	 seus	marcos	 jurídicos	
o	reconhecimento	de	sujeitos	políticos	como	os	indígenas	e	não	indígenas,	no	entanto,	
é	também	nesse	período	que	outras	lutas	e	conflitos	sociais	espaço	contexto	do	campo,	
organizações	pautadas	na	defesa	ambiental	e	étnica.
De	 acordo	 com	 o	 antropólogo	 Mauro	 Almeida	 (2007)	 nesse	 período	 vamos	
encontrar	 uma	mudança	nas	 “narrativas	 agrárias”,	Almeida	é	 enfático	 ao	 afirmar	que	não	
significa	que	a	luta	camponesa	perdeu	lugar,	mas	que	está	não	será	a	única	luta	presente	
nesse	contexto.	Também	nesse	período	falou-se	no	fim	da	“antropologia	das	sociedades	
agrárias”,	razão	pela	qual	você,	acadêmico,	já	deve	ter	percebido	nos	subtópicos	anteriores	
quando	vimos	o	surgimento	e	o	desenvolvimento	da	antropologia	brasileira.	O	que	este	
autor	tenta	enfatizar	é	que	este	fim	é	meramente	artificial,	pois	na	prática	um	enorme	
contingente	 de	 populações,	 comunidades	 e	 organizações	 vão	 emergir	 mobilizando	
categorias	 analíticas	 e	 políticas	 do	 campesinato,	 por	 exemplo,	 “barrancos	 e	 florestas,	
ilhas	e	praias,	 chapadas	e	brejos,	babaçuais	e	açaizais,	 canaviais	e	cafezais,	 ribeirinhos	e	
seringueiros,	quilombolas	e	caiçaras,	sertanejos	e	montanheses,	coletores	e	plantadores,	
saberes,	tradições	e	memórias,	fazeres”	(ALMEIRDA,	2007,	p.	177).
	 No	 caso	 dos	 povos	 indígenas	 destaca-se	 reivindicações	 e	 organizações	 de	
novos	sujeitos	que	não	estavam	registrados	na	 literatura	antropológica	ou	mesmo	eram	
reconhecidos	 em	matéria	 de	 serviços	 especializados	 como	é	 o	 caso	da	FUNAI,	 povos	
como	os	Tinguí-Botó,	os	Karapótó,	os	Kantaruré,	Jenipancó,	os	Tapeca	e	os	Wassu,	que	
nesse	momento	passam	a	serem	chamados	de	“índios	emergentes”	ou	“novas	etnias”,	
segundo	aponta	o	antropólogo	João	Pacheco	de	Oliveira	(1998).
129
Assim	 aparece,	 por	 exemplo,	 o	 termo	 “etnogênese”,	 empregado	
por	Gerald	Sider	(1976),	no	contexto	de	uma	oposição	ao	etnocídio.	
Não	caberia	 tomá-la	como	conceito	ou	mesmo	noção,	pois	este	e	
outros	 autores,	 que	 também	aplicam	a	mesma	 ideia	 na	 etnografia	
de	 populações	 indígenas	 (como	 Goldstein,	 1975),	 sequer	 sentem	 a	
necessidade	 de	 melhor	 defini-la,	 tomando-a	 como	 evidente.	 Em	
termos	 teóricos,	 a	 aplicação	 dessa	 noção	 –	 bem	 como	 de	 outras	
igualmente	 singularizantes	 a	 um	 conjunto	 de	 povos	 e	 culturas	
pode	acabarsubstantivando	um	processo	que	é	histórico,	dando	a	
falsa	 impressão	 de	 que,	 nos	 outros	 casos	 em	que	não	 se	 fala	 em	
“etnogênese”	 ou	 de	 “emergência	 étnica”,	 o	 processo	 de	 formação	 de	
identidades	estaria	ausente	(OLIVEIRA,	1998,	p.	62).
O	que	Pacheco	de	Oliveira	chama	atenção	e	com	razão	é	para	o	fato	de	que	é	um	
erro	classificar	esses	povos	indígenas	que	foram	reconhecidos	tardiamente	entre	os	anos	
1970	e	1980	como	sendo	pertencentes	a	“novas	etnias”	ou	“índios	emergentes”	quando	
na	verdade	as	transformações	sociais	que	ocorreram	no	Brasil	nesse	período	interferem	
de	forma	 intensa	sobre	esses	processos,	 sobretudo	quando	do	encontro	com	outras	
culturas	e	povos	que	fazem	parte	dessa	trajetória,	como	é	o	caso	dos	povos	indígenas	do	
Nordeste	que	no	século	XVI	foram	submetidos	à	escravização,	pacificação	e	aldeamentos	
forçados	diante	de	alianças	ou	guerras	em	contatos	com	os	colonizadores	(OLIVEIRA,	
2006;	2010).
O	que	se	destaca	mais	fortemente	nesse	período	é	que	há	uma	inserção	étnica	
na	agenda	pública	de	 lutas	políticas	e	 isto	representa	um	deslocamento	de	concepções	
políticas	na	maneira	como	os	movimentos	sociais	em	que	vigoram	as	demandas	étnicas	
passa	a	mobilizar	 como	uma	categoria	 central	 “identidade	étnica”	 e	um	conjunto	de	
categorias	como	as	descritas	acima	que	valorizam	esse	lugar	da	etnicidade	nas	lutas	
políticas	por	sujeitos	tradicionais.
Essa	pluralidade	de	atores	e	novos	sujeitos	políticos	em	que	passam	a	afirmar	de	
forma	positiva	 sua	 identidade,	 por	 exemplo,	 indígenas,	 quilombolas,	 quebradeiras	de	
coco	babaçu,	 seringueiros,	 caiçaras,	 ribeirinhos,	 ressignificam	o	conteúdo	de	 suas	 lutas	
afirmando	positivamente	sua	identidade	étnica	frente	ao	modo	como	tais	identidades	
foram	estigmatizadas	socialmente.	Nesse	caso,	conforme	destacado	por	Pacheco	de	
Oliveira	(1998,	p.	64)	é	que	nesses	contextos	sociais	“a	atualização	histórica	não	anula	o	
sentimento	de	referência	à	origem,	mas	até	mesmo	o	reforça.	É	da	resolução	simbólica	
e	coletiva	dessa	contradição	que	decorre	a	força	política	e	emocional	da	etnicidade”.
O	que	explica	porque	não	houve	uma	consolidação	de	um	subcampo	com	o	nome	
de	Antropologia	Rural,	tendo	em	vista	que,	num	primeiro	momento,	as	pesquisas	a	respeito	
desses	sujeitos	sociais	estavam	inseridas	na	categoria	“camponês”,	como	esses	os	processos	
de	 efervescência	 política	 ocorridos	 na	 década	 de	 1980	 na	 luta	 pela	 redemocratização	
muitos	 grupos	 que	 estavam	 invisíveis	 dentro	 da	 categoria	 camponês	 passam	a	 afirmar	
suas	identidades	até	então	estigmatizadas	e	invisibilizadas,	demandando	inclusive	a	sua	
afirmação	também	no	território	e	então	redefinindo	“o	padrão	de	conflitividades	e	o	campo	
relacional	de	antagonismos”,	conforme	sugere	Cruz	(2011,	p.	7).
130
O	que	complexifica	a	questão	agrária	é	que	nesse	momento	categorias	como	
identidade,	etnia	e	território	passam	a	vigorar	como	principais	demandas	articuladas	
nessas	novas	 lutas	sociais,	 revelando	uma	série	de	outros	conflitos	 inseridos	no	campo,	
sobretudo	quando	se	fala	em	limites	e	fronteiras	agrícolas	na	região	da	Amazônia.
É	assim	que	Vianna	Jr,	(2008)	vai	argumentar	sobre	as	diferenças	entre	pautas	
e	demandas	do	passado	com	as	desse	período,	quando	as	afirmações	étnicas	e	sobre	o	
uso	tradicional	da	terra	e	dos	seus	recursos	naturais	vão	impactar	as	políticas	públicas	de	
acesso	à	terra,	fazendo	um	deslocamento	de	políticas	redistributivas	de	terra	no	âmbito	da	
reforma	agrária	para	políticas	de	demarcação	 indígenas,	quilombolas	e	de	comunidades	
tradicionais.	 Noutros	 termos,	 não	 de	 utilizar	 instrumentos	 redistributivos	 da	 Reforma	
Agrária	 para	 atender	 demandas	 por	 terra	 para	 povos	 tradicionais,	mas	 agora	 passa	 a	
vigorar	uma	demarcação	adequada	dos	territórios	dessas	comunidades	tradicionais.
Ocorre	 uma	diversificação	 os	 novos	 ciclos	 de	 lutas	 sociais	 no	 campo,	 quando	
a	questão	étnica	passa	a	ganhar	mais	fôlego	diante	da	questão	agrária	novas	demandas	
surgem,	outros	valores	sociais	aparecem	e	mobilizam	novos	reportórios	de	luta	política,	
entre	 eles	 o	 direito	 ao	meio	 ambiente	 –	 com	 forte	 ênfase	 na	 preservação	 da	floresta	
amazônica	–,	à	identidade	e	ao	território	destacam-se	junto	a	reivindicações	pela	Reforma	
Agrária,	direitos	trabalhistas	e	as	lutas	de	pequenos	produtores	rurais	e	sem-terra.
As questões sobre campesinato, reforma agrária, agronegócio, êxodo 
rural, lutas camponeses e sem-terra veremos com maiores detalhes na 
próxima unidade quando falaremos das relações urbano e rural.
ESTUDOS FUTUROS
Agora,	acadêmico,	você	 já	conheceu	diversos	aspectos	das	 lutas	sociais	que	
envolve	 o	 campo	 e	 as	 questões	 de	 identidade	 e	 cultura	 na	 luta	 pela	 demarcação	
territorial.	Também	viu	algumas	das	principais	 referências	em	pesquisas	nessa	área,	o	
próximo	passo	é	 fazer	uma	boa	 leitura	de	 revisão	do	conteúdo	dessa	unidade	e	 em	
seguida	praticar	o	seu	conhecimento	com	o	auxílio	das	autoatividades.
Ah,	não	 se	esqueça	de	aproveitar	 a	 leitura	complementar,	 pois	 é	uma	forma	
diferente	de	exercitar	alteridade,	estranhamento,	 relativismo	e	 raciocínio	comparativo.	O	
texto	escolhido	possibilita	outras	formas	de	conhecer	esses	temas.	Bons	estudos!	Até	a	
Unidade	3!
131
LEITURA
COMPLEMENTAR
RITOS CORPORAIS ENTRE OS NACIREMA
Horace	Miner
O	antropólogo	está	tão	familiarizado	com	a	diversidade	das	formas	de	comporta-
mento	que	diferentes	povos	apresentam	em	situações	semelhantes,	que	é	 incapaz	de	
surpreender-se	mesmo	em	face	dos	costumes	mais	exóticos.	De	fato,	se	nem	todas	
as	combinações	 logicamente	possíveis	de	comportamento	foram	ainda	descobertas,	
o	antropólogo	bem	pode	conjeturar	que	elas	devam	existir	em	alguma	tribo	ainda	não	
descrita.	Deste	ponto	de	vista,	as	crenças	e	práticas	mágicas	dos	Nacirema	apresentam	
aspectos	tão	inusitados	que	parece	apropriado	descrevê-los	como	exemplo	dos	extremos	
a	que	pode	chegar	o	comportamento	humano.
Foi	o	Professor	Linton,	em	1936,	o	primeiro	a	chamar	a	atenção	dos	antropólogos	
para	os	rituais	dos	Nacirema,	mas	a	cultura	desse	povo	permanece	insuficientemente	
compreendida	ainda	hoje.	Trata-se	de	um	grupo	norte-americano	que	vive	no	território	
entre	os	Cree	do	Canadá,	os	Yaqui	e	os	Tarahumare	do	México,	e	os	Carib	e	Arawak	
das	Antilhas.	Pouco	se	sabe	de	sua	origem,	embora	a	 tradição	 relate	que	vieram	do	
Leste.	Conforme	a	mitologia	dos	Nacirema,	um	herói	cultural,	Notgnihsaw,	deu	origem	
à	sua	nação;	ele	é,	por	outro	 lado,	conhecido	por	duas	façanhas	de	força:	ter	atirado	
um	colar	de	conchas,	usado	pelos	Nacirema	como	dinheiro,	através	do	rio	Po-To-Mac	e	
ter	derrubado	uma	cerejeira	na	qual	residiria	o	Espírito	da	Verdade.	A	cultura	Nacirema	
caracteriza-se	por	uma	economia	de	mercado	altamente	desenvolvida,	que	evolui	em	
um	rico	habitat.	Apesar	do	povo	dedicar	muito	do	seu	tempo	às	atividades	econômicas,	
uma	 grande	 parte	 dos	 frutos	 deste	 trabalho	 e	 uma	 considerável	 porção	 do	 dia	 são	
dispensados	em	atividades	 rituais.	O	foco	destas	atividades	é	o	corpo	humano,	cuja	
aparência	e	saúde	surgem	como	o	interesse	dominante	no	ethos	deste	povo.
Embora	tal	tipo	de	interesse	não	seja,	por	certo,	raro,	seus	aspectos	cerimoniais	
e	a	filosofia	a	eles	associadas	são	singulares.	A	crença	fundamental	subjacente	a	todo	o	
sistema	parece	ser	a	de	que	o	corpo	humano	é	repugnante	e	que	sua	tendência	natural	é	
para	a	debilidade	e	a	doença.	Encarcerado	em	tal	corpo,	a	única	esperança	do	homem	é	
desviar	estas	características	por	meio	do	uso	das	poderosas	influências	do	ritual	e	do	
cerimonial.	Cada	moradia	tem	um	ou	mais	santuários	devotados	a	este	propósito.	Os	
indivíduos	mais	poderosos	desta	sociedade	têm	muitos	santuários	em	suas	casas	e,	de	
fato,	 a	 alusão	à	opulência	de	uma	casa,	muito	 frequentemente,	 é	 feita	em	termos	do	
número	de	tais	centros	rituais	que	possua.	Muitas	casas	são	construções	de	madeira,	
toscamente	pintadas,	mas	as	câmeras	de	culto	das	mais	ricas	têm	paredes	de	pedra.
132As	 famílias	 mais	 pobres	 imitam	 as	 ricas,	 aplicando	 placas	 de	 cerâmica	 às	
paredes	de	seu	santuário.	Embora	cada	família	tenha	pelo	menos	um	de	tais	santuários,	
os	rituais	a	eles	associados	não	são	cerimônias	familiares,	mas	sim	cerimônias	privadas	e	
secretas.	Os	ritos,	normalmente,	são	discutidos	apenas	com	as	crianças	e,	neste	caso,	
somente	durante	o	período	em	que	estão	 sendo	 iniciadas	em	seus	mistérios.	 Eu	pude,	
contudo,	estabelecer	contato	suficiente	com	os	nativos	para	examinar	estes	santuários	e	
obter	descrições	dos	rituais.	O	ponto	focal	do	santuário	é	uma	caixa	ou	cofre	embutido	
na	parede.
Neste	cofre	são	guardados	os	 inúmeros	encantamentos	e	poções	mágicas	sem	
os	quais	nenhum	nativo	acredita	que	poderia	viver.	Tais	preparados	são	conseguidos	
por	meio	de	uma	série	de	profissionais	especializados,	os	mais	poderosos	dos	quais	são	
os	médico-feiticeiros,	cujo	auxílio	deve	ser	 recompensado	com	dádivas	substanciais,	
contudo,	 os	 médico-feiticeiros	 não	 fornecem	 a	 seus	 clientes	 as	 poções	 de	 cura;	
somente	 decidem	 quais	 devem	 ser	 seus	 ingredientes	 e	 então	 os	 escrevem	 em	 sua	
linguagem	antiga	e	secreta.	Esta	escrita	é	entendida	apenas	pelos	médico-feiticeiros	
e	pelos	ervatários,	os	quais,	em	troca	de	outra	dadiva,	providenciam	o	encantamento	
necessário.	 Os	 Nacirema	 não	 se	 desfazem	 do	 encantamento	 após	 seu	 uso,	mas	 os	
colocam	na	caixa-de-encantamento	do	 santuário	doméstico.	Como	tais	 substâncias	
mágicas	são	especificas	para	certas	doenças	e	as	doenças	do	povo,	reais	ou	imaginárias,	
são	muitas,	a	caixa-de-encantamentos	está	geralmente	a	ponto	de	transbordar.
Os	pacotes	mágicos	são	tão	numerosos	que	as	pessoas	esquecem	quais	são	
suas	finalidades	e	temem	usá-los	de	novo.	Embora	os	nativos	sejam	muito	vagos	quanto	
a	este	aspecto,	só	podemos	concluir	que	aquilo	que	os	leva	a	conservar	todas	as	velhas	
substâncias	é	a	 ideia	de	que	sua	presença	na	caixa-de-encantamentos,	em	frente	à	
qual	são	efetuados	os	ritos	corporais,	irá,	de	alguma	forma,	proteger	o	adorador.
Abaixo	da	caixa-de-encantamentos	existe	uma	pequena	pia	batismal.	Todos	os	
dias	cada	membro	da	família,	um	após	o	outro,	entra	no	santuário,	inclina	sua	fronte	ante	
a	caixa-de-encantamentos,	mistura	diferentes	tipos	de	águas	sagradas	na	pia	batismal	
e	procede	a	um	breve	rito	de	ablução.	As	águas	sagradas	vêm	do	Templo	da	Água	da	
comunidade,	onde	os	sacerdotes	executam	elaboradas	cerimônias	para	tornar	o	 líquido	
ritualmente	 puro.	 Na	 hierarquia	 dos	mágicos	 profissionais,	 logo	 abaixo	 dos	médico-
feiticeiros	no	que	diz	 respeito	ao	prestígio,	estão	os	especialistas	cuja	designação	pode	
ser	traduzida	por	"sagrados	homens-da-boca".	Os	Nacirema	têm	um	horror	quase	que	
patológico,	e	ao	mesmo	tempo	fascinação,	pela	cavidade	bucal,	cujo	estado	acreditam	
ter	uma	influência	sobre	todas	as	relações	sociais.
Acreditam	 que,	 se	 não	 fosse	 pelos	 rituais	 bucais	 seus	 dentes	 cairiam,	 seus	
amigos	 os	 abandonariam	 e	 seus	 namorados	 os	 rejeitariam.	 Acreditam	 também	 na	
existência	 de	 uma	 forte	 relação	 entre	 as	 características	 orais	 e	 as	 morais:	 Existe,	 por	
exemplo,	uma	ablução	ritual	da	boca	para	as	crianças	que	se	supõe	aprimorar	sua	fibra	
moral.	O	ritual	do	corpo	executado	diariamente	por	cada	Nacirema	inclui	um	rito	bucal.	
Apesar	 de	 serem	 tão	 escrupulosos	 no	 cuidado	 bucal,	 este	 rito	 envolve	 uma	 prática	
133
que	 choca	 o	 estrangeiro	 não	 iniciado,	 que	 só	 pode	 considerá-lo	 revoltante.	 Foi-me	
relatado	que	o	ritual	consiste	na	inserção	de	um	pequeno	feixe	de	cerdas	de	porco	na	
boca	 juntamente	com	certos	pós	mágicos,	e	em	movimentá-lo	então	numa	série	de	
gestos	altamente	formalizados.	Além	do	 ritual	bucal	privado,	as	pessoas	procuram	o	
mencionado	sacerdote-da-boca	uma	ou	duas	vezes	ao	ano.
Estes	 profissionais	 têm	 uma	 impressionante	 coleção	 de	 instrumentos,	
consistindo	em	brocas,	furadores,	sondas	e	aguilhões.	O	uso	destes	objetos	no	exorcismo	
dos	demônios	bucais	envolve,	para	o	cliente,	uma	tortura	ritual	quase	inacreditável.	O	
sacerdote-da-boca	abre	a	boca	do	cliente	e,	usando	os	 instrumentos	acima	citados,	
alarga	todas	as	cavidades	que	a	degeneração	possa	ter	produzido	nos	dentes.	Nestas	
cavidades	são	colocadas	substâncias	mágicas.	Caso	não	existam	cavidades	naturais	nos	
dentes,	grandes	seções	de	um	ou	mais	dentes	são	extirpadas	para	que	a	substância	
natural	possa	ser	aplicada.	Do	ponto	de	vista	do	cliente,	o	propósito	destas	aplicações	é	
tolher	a	degeneração	e	atrair	amigos.
O	 caráter	 extremamente	 sagrado	 e	 tradicional	 do	 rito	 evidencia-se	 pelo	 fato	
de	os	nativos	voltarem	ao	sacerdote-da-boca	ano	após	ano,	não	obstante	o	fato	de	
seus	dentes	continuarem	a	degenerar.	Esperemos	que	quando	for	realizado	um	estudo	
completo	dos	Nacirema	haja	um	inquérito	cuidadoso	sobre	a	estrutura	da	personalidade	
destas	pessoas.	Basta	observar	o	fulgor	nos	olhos	de	um	sacerdote-da-boca,	quando	
ele	enfia	um	furador	num	nervo	exposto,	para	se	suspeitar	que	este	rito	envolve	certa	
dose	de	sadismo.	Se	isto	puder	ser	provado,	teremos	um	modelo	muito	interessante,	pois	
a	maioria	 da	 população	 demonstra	 tendências	masoquistas	 bem	 definidas.	 Foi	 a	 estas	
tendências	que	o	Prof.	Linton	(1936)	se	referiu	na	discussão	de	uma	parte	específica	
dos	ritos	corporal	que	é	desempenhada	apenas	por	homens.	Esta	parte	do	rito	envolve	
raspar	e	lacerar	a	superfície	da	face	com	um	instrumento	afiado.
Ritos	especificamente	femininos	têm	lugar	apenas	quatro	vezes	durante	cada	mês	
lunar,	mas	 o	 que	 lhes	 falta	 em	 frequência	 é	 compensado	 em	barbaridade.	Como	parte	
desta	cerimônia,	 as	mulheres	ousam	colocar	 suas	cabeças	em	pequenos	fornos	por	
cerca	de	uma	hora.	O	aspecto	teoricamente	interessante	é	que	um	povo	que	parece	ser	
preponderantemente	masoquista	tenha	desenvolvido	especialistas	sádicos.
Os	 médico-feiticeiros	 têm	 um	 templo	 imponente,	 ou	 latipsoh,	 em	 cada	
comunidade	de	certo	porte.	As	cerimônias	mais	elaboradas,	necessárias	para	tratar	de	
pacientes	muito	 doentes,	 só	 podem	 ser	 executadas	 neste	 templo.	 Estas	 cerimônias	
envolvem	não	apenas	o	taumaturgo,	mas	um	grupo	permanente	de	vestais	que,	com	
roupas	e	toucados	específicos,	movimentam-se	serenamente	pelas	câmaras	do	templo.
As	 cerimonias	 latipsoh	 são	 tão	 cruéis	 que	 é	 de	 surpreender	 que	 uma	 boa	
proporção	de	nativos	realmente	doentes	que	entram	no	templo	se	recupere.	Sabe-se	que	
as	crianças	pequenas,	cuja	doutrinação	ainda	é	incompleta,	resistem	às	tentativas	de	
levá-las	ao	templo,	porque	"é	lá	que	se	vai	para	morrer".	Apesar	disto,	adultos	doentes	
não	 apenas	 querem	 mas	 anseiam	 por	 sofrer	 os	 prolongados	 rituais	 de	 purificação,	
134
quando	possuem	 recursos	para	 tanto.	Não	 importa	quão	doente	esteja	o	 suplicante	ou	
quão	grave	seja	a	emergência,	os	guardiões	de	muitos	templos	não	admitirão	um	cliente	
se	ele	não	puder	dar	uma	dádiva	valiosa	para	a	administração.	Mesmo	depois	de	ter	se	
conseguido	a	admissão,	e	sobrevivido	às	cerimônias,	os	guardiães	não	permitirão	ao	
neófito	abandonar	o	local	se	ele	não	fizer	outra	doação.	O	suplicante	que	entra	no	templo	é	
primeiramente	despido	de	todas	as	suas	roupas.	Na	vida	cotidiana	o	Nacirema	evita	a	
exposição	de	seu	corpo	e	de	suas	funções	naturais.	As	atividades	excretoras	e	o	banho,	
enquanto	 parte	 dos	 ritos	 corporais,	 são	 realizados	 apenas	 no	 segredo	 do	 santuário	
doméstico.	Da	perda	súbita	do	segredo	do	corpo	quando	da	entrada	no	latipsoh,	podem	
resultar	 traumas	 psicológicos.	 Um	 homem,	 cuja	 própria	 esposa	 nunca	 o	 viu	 em	 um	
ato	excretor,	 acha-se	 subitamente	nu	e	 auxiliado	por	uma	vestal,	 enquanto	executa	
suas	funções	naturais	num	 recipiente	 sagrado.	Este	tipo	de	tratamento	cerimonial	 é	
necessário	porque	os	excreta	são	usados	por	um	adivinho	para	averiguar	o	curso	e	a	
natureza	da	enfermidade	do	cliente.
Clientes	 do	 sexo	 feminino,	 por	 sua	 vez,	 têm	 seus	 corpos	 nus	 submetidos	 ao	
escrutínio,	manipulação	eaguilhadas	dos	médico-feiticeiros.	Poucos	suplicantes	no	templo	
estão	suficientemente	bons	para	fazer	qualquer	coisa	além	de	jazer	em	duros	leitos.	As	
cerimônias	diárias,	 como	os	 ritos	do	 sacerdote-da-boca,	 envolvem	desconforto	e	 tortura.	
Com	precisão	 ritual	as	vestais	despertam	seus	miseráveis	fardos	a	cada	madrugada	e	os	
rolam	em	seus	 leitos	de	dor	enquanto	executam	abluções,	com	os	movimentos	formais	
nos	quais	estas	virgens	são	altamente	treinadas.	Em	outras	horas,	elas	inserem	bastões	
mágicos	na	boca	do	suplicante	ou	o	forçam	a	engolir	 substâncias	que	se	supõe	serem	
curativas.	 De	 tempos	 em	 tempos	 o	médico-feiticeiro	 vem	 ver	 seus	 clientes	 e	 espeta	
agulhas	magicamente	tratadas	em	sua	carne.	O	fato	de	que	estas	cerimônias	do	templo	
possam	não	curar,	e	possam	mesmo	matar	o	neófito,	não	diminui	de	modo	algum	a	fé	das	
pessoas	no	médico	feiticeiro.	Resta	ainda	um	outro	tipo	de	profissional,	conhecido	como	um	
"ouvinte".	Este	"doutor-bruxo"	tem	o	poder	de	exorcizar	os	demônios	que	se	alojam	nas	
cabeças	das	pessoas	enfeitiçadas.
Os	Nacirema	acreditam	que	os	pais	enfeitiçam	seus	próprios	filhos;	particular-
mente,	 teme-se	que	as	mães	 lancem	uma	maldição	 sobre	as	crianças	enquanto	 lhes	
ensinam	os	ritos	corporais	secretos.	A	contra	magia	do	doutor-bruxo	é	inusitada	por	sua	
carência	de	ritual.	O	paciente	simplesmente	conta	ao	"ouvinte"	todos	os	seus	problemas	
e	temores,	principalmente	pelas	dificuldades	iniciais	que	consegue	rememorar.	A	memória	
demonstrada	pelos	Nacirema	nestas	sessões	de	exorcismo	é	verdadeiramente	notável.	
Não	é	incomum	um	paciente	deplorar	a	rejeição	que	sentiu,	quando	bebê,	ao	ser	des-
mamado,	 e	 uns	 poucos	 indivíduos	 reportam	 a	 origem	de	 seus	 problemas	 aos	 feitos	
traumáticos	de	seu	próprio	nascimento.	Como	conclusão,	deve-se	fazer	 referência	a	
certas	práticas	que	têm	suas	bases	na	estética	nativa,	mas	que	decorrem	da	aversão	
profunda	ao	corpo	natural	e	suas	funções.
135
Existem	 jejuns	 rituais	 para	 tornar	 magras	 pessoas	 gordas,	 e	 banquetes	
cerimoniais	 para	 tornar	 gordas	pessoas	magras.	Outros	 ritos	 são	usados	para	 tornar	
maiores	os	seios	das	mulheres	que	os	têm	pequenos	e	torná-los	menores	quando	são	
grandes.	A	insatisfação	geral	com	o	tamanho	do	seio	é	simbolizada	no	fato	de	a	forma	
ideal	estar	virtualmente	além	da	escala	de	variação	humana.	Umas	poucas	mulheres,	
dotadas	de	um	desenvolvimento	hipermamário	quase	inumano,	são	tão	idolatradas	que	
podem	levar	uma	boa	vida	simplesmente	indo	de	cidade	em	cidade	e	permitindo	aos	
embasbacados	nativos,	em	troca	de	uma	taxa,	contemplarem-nos.	Já	fizemos	referência	
ao	fato	de	que	as	funções	excretoras	são	ritualizadas,	rotinizadas	e	relegadas	ao	segredo.	
As	 funções	 naturais	 de	 reprodução	 são,	 da	mesma	 forma,	 distorcidas.	 O	 intercurso	
sexual	 é	 tabu	 enquanto	 assunto,	 e	 é	 programado	enquanto	 ato.	 São	 feitos	 esforços	
para	evitar	a	gravidez,	pelo	uso	de	substâncias	mágicas	ou	pela	limitação	do	intercurso	
sexual	 a	 certas	 fases	da	 lua.	A	 concepção	é	na	 realidade,	 pouco	 frequente.	Quando	
grávidas	as	mulheres	vestem-se	de	modo	a	esconder	o	estado.	O	parto	tem	lugar	em	
segredo,	sem	amigos	ou	parentes	para	ajudar,	e	a	maioria	das	mulheres	não	amamenta	
seus	 rebentos.	 Nossa	 análise	 da	 vida	 ritual	 dos	 Nacirema	 certamente	 demonstrou	
ser	 este	povo	dominado	pela	 crença	na	magia.	 É	 difícil	 compreender	 como	tal	 povo	
conseguiu	sobreviver	por	tão	longo	tempo	sob	a	carga	que	impôs	sobre	si	mesmo,	mas	
até	 costumes	 tão	 exóticos	 quanto	 estes	 aqui	 descritos	 ganham	 seu	 real	 significado	
quando	são	encarados	sob	o	ângulo	relevado	por	Malinowski,	quando	escreveu:
Olhando	de	longe	e	de	cima	de	nossos	saltos	postos	de	segurança	na	
civilização	desenvolvida,	é	fácil	perceber	toda	a	crueza	e	irrelevância	
da	magia.	Mas	sem	seu	poder	de	orientação,	o	homem	primitivo	não	
poderia	ter	dominado,	como	o	fez,	 suas	dificuldades	práticas,	nem	
poderia	ter	avançado	aos	estágios	mais	altos	da	civilização.
Fonte: https://bit.ly/2H24xPq. Acesso em: 26 ago. 2022.
136
Neste tópico, você aprendeu:
•	 Conheceu	os	principais	conceitos	do	campo	da	antropologia	rural	no	Brasil.
•	 Aprendeu	as	diferentes	comunidades	e	povos	tradicionais.
•	 Aprendeu	 que	 as	 lutas	 territoriais	 de	 povos	 e	 comunidades	 tradicionais	 nas	 últimas	
décadas	ganharam	maior	protagonismo	na	esfera	pública	brasileira.
•	 Conheceu	a	importância	da	luta	social	pela	terra	na	afirmação	dos	diferentes	modos	de	
vida.
RESUMO DO TÓPICO 3
137
1	 As	 lutas	 sociais	 por	 territórios	 são	 constitutivas	 de	 comunidades	 tradicionais	 como	
indígenas,	quilombolas,	caiçaras	e	 ribeirinhos,	e	 se	destacam	 justamente	por	terem	
sido	posicionadas	como	fenômenos	do	mundo	rural	brasileiro.	Nesse	sentido,	a	partir	
da	abordagem	acerca	dos	conceitos	de	terra,	território	e	territorialidade	proposta	por	
Dominique	Galllois	(2004),	assinale	a	alternativa	CORRETA:
a)	 (			)	 Terra	 indígena	diz	 respeito	 ao	processo	político-jurídico	 conduzido	 sob	 a	 égide	
do	Estado,	enquanto	território	 remete	à	construção	e	à	vivência,	culturalmente	
variável,	da	relação	entre	uma	sociedade	específica	e	sua	base	territorial.
b)	 (			)	 A	 terra	 é	 uma	 categoria	 conceitual	 exclusiva	 das	 comunidades	 e	 povos	
tradicionais	e	diz	respeito	às	políticas	de	reconhecimento	da	reforma	agrária.
c)	 (			)	 A	territorialidade	é	uma	categoria	semelhante	ao	conceito	de	campo,	ela	significa	
uma	 emaranhado	 de	 terras	 em	 que	 há	 diferentes	 grupos	 sociais	 habitando	
conjuntamente.
d)	 (			)	 O	 território	 é	 o	 conceito	 central	 para	 definir	 do	 direitos	 dos	 latifundiários,	 é	
importante	porque	a	partir	dele	é	possível	 invadir	espaços	e	se	apossar	deles	
para	o	desenvolvimento	econômico.
2	 Considera-se	os	estudos	de	comunidades	e	a	etnologia	 indígena	como	os	principais	
marcos	 de	 referência	 para	 o	 desenvolvimento	 do	 subcampo	Antropologia	 Rural	 no	
Brasil.	Com	base	nas	definições	dos	enfoques	das	pesquisas	nessa	área,	analise	as	
sentenças	a	seguir:
I-	 Dentre	as	décadas	de	1940	e	1970	os	estudos	em	etnologia	indígena	representaram	
fortemente	o	campo	em	torno	de	comunidades	e	grupos	que	eram	lidos	e	definidos	
com	base	na	sua	localização	espacial,	seus	traços	culturais	e	em	contraposição	ao	
modo	de	vida	urbano.	
II-	 Exemplos	de	modalidades	tradicionais	de	Etnologia	 Indígena	são	o	Campesinato	e	a	
Estudos	de	Comunidade.
III-	 Na	 década	 de	 1980,	 os	 estudos	 a	 respeito	 das	 comunidades	 rurais	 estavam	
associados	com	a	identidade	negra	e	camponesa	e	exerceram	muita	influência	dos	
processos	de	reconhecimento	de	territórios	e	regularização	de	terras.
Assinale	a	alternativa	CORRETA:
a)	 (			)	 As	sentenças	I	e	II	estão	corretas.
b)	 (			)	 Somente	a	sentença	II	está	correta.
c)	 (			)	 As	sentenças	I	e	III	estão	corretas.
d)	 (			)	 Somente	a	sentença	III	está	correta.
AUTOATIVIDADE
138
3	 Conforme	 apontado	 pela	 antropóloga	 Dominique	 Gallois	 (2004)	 os	 estudos	
antropológicos	 evidenciam	 que	 há	 diferentes	 lógicas	 espaciais	 entre	 essas	
comunidades	tradicionais.	De	acordo	com	os	princípios	e	as	normativas	elencadas	
nos	estudos	antropológicos,	classifique	V	para	as	sentenças	verdadeiras	e	F	para	as	
falsas:
Fonte: GALLOIS, D. T. Terras ocupadas? Territórios? Territorialidades? In: FANY, R. (org.) Terras Indígenas & Uni-
dades de Conservação da natureza: o desafio das sobreposições. São Paulo, Instituto Socioambiental, 2004.
(			)	As	noções	de	terra	e	território	 já	foi	objeto	de	diferentes	estudos	antropológicos	
como	os	de	Seeger	e	Viveiros	de	Castro	(1979)	e	de	Oliveira	Filho	(1989;	1996),	todos	
eles	vão	nos	mostrar	que	essas	categorias	são	acionadas	de	maneira	distinta	pelos	
atores	 envolvidos	 no	 processo	 de	 reconhecimento	 e	 demarcação	 de	 uma	 Terra	
Indígena. 
(			)	 O	conceito	mais	importante	para	as	comunidade	indígenas	é	o	desterritorialidade	que	
se	refere	aos	processos	de	deslocamentos	dos	povos	indígenas	do	campopara	a	
cidade.
(			)	 Para	Gallois	 (2004)	o	conceito	de	“terra	 indígena	diz	respeito	ao	processo	político-
jurídico	conduzido	sob	a	égide	do	Estado,	enquanto	território	remete	à	construção	e	
à	vivência,	culturalmente	variável,	da	relação	entre	uma	sociedade	específica	e	sua	
base	territorial.
Assinale	a	alternativa	que	apresenta	a	sequência	CORRETA:
a)	 (			)	 V	–	F	–	F.
b)	 (			)	 V	–	F	–	V.
c)	 (			)	 F	–	V	–	F.
d)	 (			)	 F	–	F	–	V.
4	 Os	conflitos	que	se	relacionam	às	comunidades	tradicionais	têm	relação	com	a	noção	
de	poder	que	nesse	contexto	é	uma	marca	desigual	e	hierárquica	predominante	na	
busca	pela	expansão	do	poder	econômico,	político	e	cultural	por	projetos	econômicos	
da	sociedade	moderna.	Uma	das	grandes	áreas	de	estudos	desse	tema	é	a	Etnologia	
Indígena.	Disserte	sobre	esta	área	de	concentração	e	sobre	as	temáticas	envolvendo	
os	conflitos	de	territorialidade	a	partir	de	dois	autores	com	publicações	na	área.
5	 Existe	 uma	 literatura	 baseada	na	 análise	 de	movimentos	 sociais	 contemporâneos	que	
demonstram	os	diferentes	sentidos	sociais	que	a	terra	e	o	território	adquirem	em	relação	
aos	grupos	sociais	que	 lutam	por	ela.	Neste	contexto,	disserte	sobre	os	princípios	que	
fundamentam	as	lutas	dos	camponeses	e	as	lutas	dos	povos	e	comunidades	tradicionais	
pela	terra	a	partir	da	década	de	1980.
139
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http://jpoantropologia.com.br/pt/wp-content/uploads/2021/02/JPOA-cidadania-racismo-e-pluralismo.pdf
http://jpoantropologia.com.br/pt/wp-content/uploads/2021/02/JPOA-cidadania-racismo-e-pluralismo.pdf
142
143
RELAÇÃO ENTRE O RURAL E 
O URBANO
UNIDADE 3 — 
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
PLANO DE ESTUDOS
 A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
• compreender a formação das identidades sociais que se constituem entre o campo e a 
cidade;
• conheceras formas de viver, os sentidos sociais do ambiente e do habitar entre o 
rural e o urbano;
• desnaturalizar o “rural” e o “urbano”;
•	 identificar	as	disputas	entre	sistemas	de	produção	e	modos	de	viver.
A cada tópico desta unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de 
reforçar	o	conteúdo	apresentado.
TÓPICO 1 – O CONTINUUM ENTRE O URBANO E O RURAL NA PRODUÇÃO DE 
 IDENTIDADES SOCIAIS
TÓPICO 2 – MODOS DE PRODUÇÃO, CONSUMO E USO DE RECURSOS
TÓPICO 3 – A QUESTÃO AMBIENTAL: TENSÕES, FRONTEIRAS E DISPUTAS
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure 
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.
CHAMADA
144
CONFIRA 
A TRILHA DA 
UNIDADE 3!
Acesse o 
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145
TÓPICO 1 — 
O CONTINUUM ENTRE O URBANO 
E O RURAL NA PRODUÇÃO DE 
IDENTIDADES SOCIAIS
UNIDADE 3
1 INTRODUÇÃO
Caro acadêmico, conforme vimos na unidade anterior, comunidades ou povos 
tradicionais como indígenas e quilombolas (dentre outros) são grupos sociais que 
fazem parte e constituem de modo ativo o espaço rural brasileiro tanto na maneira como 
constituem suas referências socioculturais na manutenção de suas territorialidades 
quanto o modo como produzem e nutrem o ambiente, de acordo com as práticas 
sustentáveis.
Nessa relação entre o rural e o urbano, tivemos a oportunidade de enxergar a 
formação de novas identidades no ambiente urbano a partir do intenso processo 
de	 urbanização	 e	 construção	 das	 cidades.	 Agora,	 poderemos	 compreender	 outras	
dinâmicas imersas nesse processo que aqui chamaremos de “continuum”, para fazer 
referência a uma maneira de olhar para os diferentes processos e acontecimentos que 
se dão a partir da relação sequencial entre o rural e o urbano de forma contínua, isto é, há 
elementos do rural que podem se manter presentes no urbano, assim como acontece 
com	o	inverso.	Adiante	veremos	exemplos	disso.
Mesmo considerando as legislações em matéria de reconhecimento dos 
territórios	 tradicionalmente	 ocupados,	 também	 podemos	 identificar	 a	 distância	 que	 há	
para salvaguardar esses territórios, suas práticas e seus modos de viver no contexto 
contemporâneo em que há uma diversidade de ataques aos povos e ao seu território: os 
conflitos	envolvendo	a	disputa	de	terras	insiste	em	não	reconhecer	essas	identidades	
e marcam essa relação entre o rural e o urbano naquilo que se faz mais notável aos 
nossos	olhos:	os	conflitos,	as	invasões	e	as	violências	que	incidem	sobre	essa	parcela	da	
sociedade	brasileira	em	todas	as	regiões	do	país	onde	quer	que	elas	se	encontrem.
No Brasil, devido ao nosso passado histórico marcado pelas práticas coloniais, foi 
implantado	um	sistema	de	concentração	de	terras	sob	o	poder	de	poucos	 indivíduos.	O	
conceito de latifúndio foi durante muito tempo utilizado para se referir ao acúmulo de 
grandes	extensões	de	terra	por	um	proprietário.	Mais	tarde,	com	o	Estatuto	da	Terra,	a	
dimensão	da	propriedade	privada	foi	articulada	com	a	função	social	de	sua	ocupação.	
Benedito	Marques	(2015,	p.	62)	conceitua	latifúndio,	partindo	do	Estatuto	da	Terra,	como	
“imóvel rural que tem área igual ou superior ao módulo rural e é mantido inexplorado ou 
146
com	exploração	inadequada	ou	insuficiente	às	suas	potencialidades”.	Agora	a	dimensão	de	
“uso”	vai	flexionar	o	conceito	de	modo	a	refletir	sobre	potencialidades	da	terra	que	pode	
sofrer por se manter improdutiva apenas para especular, isto é, acumular um valor de 
monetário,	desvinculado	de	um	valor	social.		
Você pode se interrogar sobre o papel do Estado na preservação, na autonomia 
ou no reconhecimento desses territórios, logo poderá lembrar que viu na Unidade 
anterior que em matéria de legislação e instituições tivemos alguns avanços sobre essas 
questões,	mas	também	puderam	ver	os	 limites	em	conter	a	expansão	de	conflitos	e	
ataques aos povos e seus territórios e é nesse o ponto que o Estado precisa estar atento 
para conter essas violências contra os povos tradicionais e contra seus territórios, 
atualizando	 legislações,	 fiscalizando	 o	 cumprimento	 das	 fronteiras	 e	 fortalecendo	
aquelas instituições que são responsáveis pela valorização, reconhecimento e apoio a 
esses	povos,	por	exemplo,	a	FUNAI	e	o	INCRA.
Os estudos em antropologia do espaço rural muito têm contribuído para 
demonstrar de que maneira o sentido de terra, território e territorialidade incidem para 
o reconhecimento pleno dos direitos dessas comunidades e como uma fonte empírica 
de produção em pesquisa sobre os impactos que o descumprimento dessas fronteiras 
causam	na	vida	dessas	populações.		
Conforme estudamos, a antropologia tem um número expressivo de trabalhos 
voltados para os estudos dessas comunidades tradicionais ao longo do tempo e fornece 
uma	 importante	 contribuição	 científica	 para	 entender	 as	 lutas	 e	 os	 direitos	 sociais	
mobilizados por esses grupos para o cumprimento de leis, para o respeito ao seu modo de 
vida	e	para	o	reconhecimento	de	sua	existência.
Olhando para uma perspectiva histórica tivemos a oportunidade de nos 
aproximar de estudos clássicos, categorias e teorias do campo da antropologia que 
foram	determinantes	para	a	compreensão	dessa	subárea	de	estudos.	Agora,	acadêmico,	
nós vamos nos deter um tempo presente, o mundo contemporâneo e as dinâmicas e 
conflitos	sociais	que	alcançam	o	mundo	rural	e	como	o	urbano	se	conecta	com	elas.
Até aqui, acadêmico, você já deve ter aprendido que a construção das identidades 
nos espaços rurais passa por uma compreensão do modo como os povos e comunidades 
tradicionais	articulam	entre	suas	práticas	sociais	a	relação	com	a	natureza	e	a	cultura.	
Desse modo, é possível que você já esteja familiarizado com a ideia central de que os povos 
e comunidades tradicionais não devem ser entendidos como “sociedades atrasadas” 
(qualquer	dúvida	sobre	este	ponto	volte	à	 introdução	da	Unidade	1),	mas	como	parte	
do movimento de interação da sociedade no compartilhamento dos seus saberes e das 
suas formas de vida para o entendimento acerca de questões econômicas, produtivas 
ou	de	projeto	de	desenvolvimento	rural.
147
Nesse sentido, os conhecimentos tradicionais assim como os saberes populares 
compartilhados a partir das experiências múltiplas de uso, ocupação e construção de 
territórios por povos e comunidades tradicionais perdem referência para o “novo” e a 
promessa	 “moderna”	de	Revolução	 Industrial.	 Logo,	 aqueles	 saberes	que	prosperaram	
durante séculos entre essas comunidades perdem espaço para uma visão etnocêntrica da 
ciência	moderna	que	passa	a	vigorar	sobre	o	domínio	do	campo	científico	tornando	essas	
práticas	e	saberes	tradicionais	irrelevantes	e	“atrasados”	para	o	desenvolvimento	da	nação.	
Além disso, há outro movimento de exploração por parte desse novo espírito econômico 
que se expande cada vez mais rápido ao redor do mundo, a chamada biopirataria, que 
consiste na extração e exploração ilegais de recursos naturais, como plantas, animais 
e materiais genéticos presentes nos biomas brasileiros, e dos saberes tradicionais para 
transformar em monopólio econômico de grandes industriais estrangeiras por meio 
do	 registro	 de	patentes.	Como	consequência	 dessa	 ação	devastadora	há	 extinção	de	
espécies, perda da biodiversidade, prejuízos socioeconômicos, desequilíbrio ecológico e 
subdesenvolvimento	em	matéria	de	inovação,	ciência	e	tecnologia	nacional.
Nos próximos tópicos vamos falar um pouco dessas dinâmicas entre o rural e 
o	urbano	no	contexto	do	desenvolvimento	global	e	dos	processos	de	disputas	e	conflitos	
territoriais	que	se	dão	no	mundo	contemporâneo.	Alguns	conceitos	e	teorias	ganharão	
destaque e algumas pesquisas empíricas serão essenciais para nosso processo de 
aprendizagem	sobre	essa	diversidade.
2 ALGUMAS CATEGORIAS ANALÍTICAS
Caro acadêmico, há diversos estudos antropológicos das populações do campo, 
muitos	 deles	 foram	 apresentados	 na	 Unidade	 anterior.	 Nesta	 Unidade,	 você	 conhecerá	
os recentes estudos na perspectiva dodesenvolvimento econômico, a partir de outro 
olhar sobre o mundo rural, agora abordando questões agrárias, as noções de rural e 
ruralidades, bem como outros grupos sociais que estão inseridos nessa possibilidade 
de abordagem do universo que transita entre rural e urbano, seus impactos, suas 
continuidades,	 seus	deslocamentos	e	 seus	conflitos.	Antes	de	passar	 para	 a	 análise	
e abordagem dos modos de produção, consumo e uso de recursos nesse segmento 
(continuum) entre rural e urbano, bem como avançar sobre as questões ambientais a 
partir	da	análise	dos	conflitos	e	das	tensões	em	torno	das	disputas	por	outros	sujeitos,	
será	necessário	aprender	algumas	categorias	comuns	a	esse	campo	de	análise.
De acordo com Maria Nazaré Wanderley, “a grande propriedade patronal no 
Brasil	 está	 na	 origem	 de	 uma	 ruralidade	 dos	 espaços	 vazios”	 (WANDERLEY,	 2001,	 p.	
36).	A	modernização	do	campo	teve	como	projeto	as	novas	configurações	produtivas,	
onde destacam-se as seguintes características: o intenso uso de máquinas, inovações 
tecnológicas,	 uso	de	adubos	e	 fertilizantes	químicos	e	 aplicação	de	capital	financeiro.	
Esses são traços de um processo contemporâneo no mundo econômico capitalista que 
148
introduz novas demandas de produção em escala maior: o desenvolvimento de recursos 
comunicacionais e de meios de transporte mais rápidos também possibilitaram mudanças 
nos modos de produção no espaço rural, interferindo no modo de vida da população do 
campo.
Sobre	o	conceito	de	rural,	a	própria	Maria	Nazaré	Wanderley	sugere	que.
Do ponto de vista sociológico, quando se fala em “rural”, aponta-se 
para duas características que são consideradas fundamentais: por um 
lado,	uma	relação	específica	dos	habitantes	do	campo	com	a	natureza,	
com a qual o homem lida diretamente, sobretudo por meio de seu 
trabalho	e	do	seu	habitat.	Trata-se,	sem	dúvida,	das	representações	
do espaço natural e do espaço construído, visto que a “natureza rural”, 
precisamente porque é rural, isto é, “objeto de múltiplas atividades e 
usos	humanos,	é	a	menos	natural	possível”.	Por	outro	lado,	relações	
sociais,	 também	diferenciadas,	 que	Mendras	definiu	como	 “relações	
de interconhecimento”, resultantes da dimensão e da complexidade 
restritas	das	“coletividades”	rurais	(MENDRAS,	1976).	Destas	relações	
resultam práticas e representações particulares a respeito do espaço, do 
tempo,	do	trabalho,	da	família	etc.	(MATHIEU;	JOLLIVET,	1989,	p.	15	
apud	WANDERLEY,	2000,	p.	88).
Para	Oliveira	(2001,	p.	75),	em	outras	palavras:
A lógica do desenvolvimento do modo capitalista de produção é 
contraditória	e	combinada,	pois	ao	mesmo	tempo	em	que	[...]	constrói/
destrói formações territoriais em diferentes partes do mundo, faz com 
que frações de uma mesma formação territorial conheçam processos 
desiguais	de	valorização,	produção	e	reprodução	do	capital.
O que esses autores argumentam é que há inúmeras mudanças nesse mundo 
rural, que tornam cada vez mais vaga a imagem de um ambiente agrícola e tradicional, 
passando	a	incorporar	atividades	e	práticas	consideradas	tipicamente	do	mundo	urbano.	
As implicações serão acompanhadas pela expansão e concentração de terras, lavouras 
com	investimentos	de	capital	financeiro	e	uma	mudança	na	perspectiva	onde	as	atividades	
de produção tradicionais comumente conhecidas como “camponesas” passam a sofrer 
com	a	produção	de	commodities.	A	população	do	campo	passa	viver	a	experiência	de	
escassez, desemprego, falta de oportunidades, pauperização e como consequência 
dessa intensa industrialização do campo ocorre o fenômeno do êxodo rural: o impacto 
inicial é dessa transição de pessoas da zona rural para as zonas urbanas, chegando em 
um	novo	contexto	de	intensa	industrialização	encontra	dificuldades	para	se	habitar	aos	
novos ritmos da intensa vida urbana, cujos laços sociais, como vimos na outra Unidade, 
tendem a afrouxar e uma perspectiva cada vez mais individual se sobressai nessas 
relações.	Além	disso,	as	atividades	de	trabalho	também	serão	diferentes,	o	manejo	da	
terra,	a	plantação	não	será	a	atividade	principal	mas	sim	atividades	próprias	da	indústria.
149
Caro acadêmico, quer saber um pouco mais dos impactos do êxodo rural no contexto 
de transformações sociais do Brasil com o avanço da urbanização e acirramento das 
desigualdades sociais vividas pelas populações do campo? Assista ao documentário 
O Êxodo Rural, o qual faz parte do acervo do Laboratório de Imagem e Som em 
Antropologia da Universidade de São Paulo.
Título Original: O Êxodo Rural.
Direção: Mario Kuperman.
Sinopse: atraídos pelas cidades os habitantes do campo perdem a sua vinculação com 
o meio rural, provocando migrações internas. A legislação trabalhista rural vigente e a 
conquista, cada vez maior, de áreas de pastagens são responsáveis pelo êxodo rural.
Duração: 24'.
Ano de produção: 1989.
Produção: Futura Filmes.
País: Brasil.
Idioma: português.
Fonte: https://lisa.fflch.usp.br/node/342. Acesso em: 13 set. 2022.
DICA
Nesse	sentido,	as	condições	de	vida	são	modificadas	e	a	própria	compreensão	de	
rural se atualiza em relação aos impactos da urbanização que alcança esse espaço 
social.	As	diferenças	espaciais	e	sociais	entre	o	 rural	e	o	urbano	passam	a	se	tornar	
cada vez mais diluídas, novas dinâmicas surgem e é o momento em que passamos a 
interpretar	essas	transformações	a	partir	do	conceito	de	ruralidades.
Um processo dinâmico em constante reestruturação dos elementos 
da cultura local mediante a incorporação de novos valores, hábitos e 
técnicas.	Tal	processo	implica	um	movimento	em	duas	direções,	nas	
quais	se	 identificam,	de	um	 lado,	a	 reapropriação	de	elementos	da	
cultura local a partir de uma releitura possibilitada pela emergência 
de novos códigos e, de outro lado, a apropriação pela cultura urbana 
de bens culturais e naturais do mundo rural, produzindo, assim, uma 
situação que pode contribuir para alimentar a sociabilidade e reforçar 
os	laços	com	a	localidade	(CARNEIRO,	2012,	p.	50).
 Nesse processo de conhecer as dinâmicas entre o rural e o urbano 
uma categoria que ganha sentido para o entendimento deste campo de estudos 
é desenvolvimento: o conceito quando localizado em período histórico como o do 
surgimento do capitalismo e da Revolução Industrial se associa a uma compreensão de 
processo	de	evolução,	crescimento,	progresso,	em	uma	perspectiva	de	mudança.		
O	desenvolvimento	enquanto	conceito	e/ou	abordagem	teórica,	ainda	
que possa ser datado no século XX, concentra-se, mais precisamente, 
ao conjunto de transformações pelas quais as sociedades europeias 
passaram tanto no padrão e estilo de capitalismo como pela 
necessidade	de	 reconstrução	no	pós-guerra	 (Primeira	e	Segunda).	
Nesse	 sentido,	 o	 desenvolvimento	 como	 ideia	 central	 para	 se	 refletir	
sobre o mundo (capitalista) passa necessariamente pela questão da 
industrialização	(LEME,	2015,	p.	496).
https://lisa.fflch.usp.br/node/342
150
Isto se dá em face das transformações ocorridas com a Revolução Industrial (a 
qual abordamos na Unidade 1) e, em especial, as mudanças que decorrem dela no espaço 
rural.	Assim,	diante	de	uma	nova	forma	de	produzir	as	inovações	tecnológicas,	passam	
a	vigorar	nesse	novo	sistema	produtivo	e	o	território	brasileiro	passa	por	diversas	mudanças.	
Dentre algumas dessas mudanças, podemos destacar o uso mais comum de máquinas 
na produção de lavouras, a substituição de mão de obra humana pelas máquinas, o uso 
cada vez mais intenso de adubos e fertilizantes químicos, uso cada vez mais rotineiro de 
agrotóxicos,	e	à	integração	desse	sistema	produtivo	ao	mercado	financeiro.
Figura 1 – Sistema produtivo
Fonte: https://bit.ly/3RTJpwo. Acesso em 31 ago. 2022.
Tais transformações são resultados de um avanço cada vez maior do sistema 
capitalista em direção ao campo, resultado de um processo chamado mundialização.	
Essas transformações, que ocorrem de maneira acentuada a partir da segunda 
metade do século XX, fazem parte da modernidade e como projeto transformador suas 
implicaçõesvão	 desde	 uma	 nova	 concepção	 de	 ciência	 e	 método	 científico	 com	 a	
ruptura do pensamento medieval e introdução do iluminismo, que prega a razão como 
a única maneira de acessar o conhecimento, até mudanças nas estruturas da vida 
social quando as relações de trabalho e economia capitalista passam a vigorar sobre a 
organização das sociedades, no que se refere ao acelerado processo de industrialização 
e a intensa urbanização, que fornecem um olhar sobre o mundo rural e agrário como 
atrasados	e	obstáculos	ao	desenvolvimento	nos	moldes	capitalistas.	A	mundialização	
acelera o crescimento da relação de dependência entre povos e nações, sobretudo, 
com o advento da comunicação e desenvolvimento tecnológico que tende a encurtar 
distâncias	 e	 diminuir	 fronteiras	 culturais.	 Exemplar	 disso	 é	 a	 chegada	 de	 internet	 e	
sistemas de telefonia nas zonas rurais, incorporando novas formas de comunicação 
e informação, assim como a busca cada vez maior de produtos orgânicos por parte 
daquelas pessoas que moram na cidade urbanizada e deseja um alimento cultivado longe 
de	agrotóxicos	e	preservando	uma	relação	de	sustentabilidade	com	a	terra.
151
Nesse sentido, podemos compreender adequadamente o conceito de 
mundialização	a	partir	daquilo	que	foi	proposto	pelo	sociólogo	Octavio	Ianni	(1994),	em	
seu famoso artigo “Globalização: Novo paradigma das ciências sociais”, no qual o autor 
analisa	os	processos	e	estruturas	sociais	a	partir	dos	dilemas	vigentes.		
As noções de espaço e tempo, fundamentais para todas as ciências 
sociais,	 estão	 sendo	 revolucionadas	 pelos	 desenvolvimentos	 científi-
cos e tecnológicos incorporados e dinamizados pelos movimentos 
da	sociedade	global.	As	 realidades	e	os	 imaginários	 lançam-se	em	
outros horizontes, mais amplos que a província e a nação, a ilha e 
o	arquipélago,	a	região	e	o	continente,	o	mar	e	o	oceano.	As	redes	
de articulações e as alianças estratégicas de empresas, corporações, 
conglomerados, fundações, centros e institutos de pesquisas, uni-
versidades, igrejas, partidos, sindicatos, governos, meios de comuni-
cação impressa e eletrônica, tudo isso constitui e desenvolve tecidos 
que agilizam relações, processos e estruturas, espaços e tempos, 
geografias	e	histórias:	o	local	e	o	global	estão	distantes	e	próximos,	
diversos	e	mesmos.	As	identidades	embaralham-se	e	multiplicam-se.	
As articulações e as velocidades desterritorializam-se e re-territorializam-
-se	 em	outros	 espaços,	 com	outros	 significados:	 o	mundo	 se	 tor-
na mais complexo e mais simples, micro e macro, épico e dramático 
(IANNI,	1994,	p.	155).
O	processo	de	urbanização,	como	vimos	na	Unidade	1,	é	intensificado	e	muito	
rápido, pois produz transformações no ambiente e as relações: o Estado se torna um 
aliado ao avanço dessa ideologia do mundo moderno como progresso, alimentado pela 
crença no desenvolvimento econômico como horizontes possíveis de vencer a pobreza 
e	oferecer	uma	“vida	melhor”	ao	reduzir	as	desigualdades	sociais.
No entanto, o desenvolvimento tecnológico almejado como mudança radical 
de vida e transformação para as diferentes sociedades vai se mostrando limitada: o 
mundo mundializado, globalizado e moderno alimenta uma lógica “predatória” em que 
prevalece uma perspectiva economicista baseada no lucro, na produção em massa e no 
trabalho	assalariado	sem	perspectivas	de	direito	e	dignidade	trabalhista.	Não	por	acaso	
as transformações com o sistema de transporte e comunicações serão determinantes 
para	esse	fio	“continuum”	entre	o	urbano	e	o	rural	que	passa	a	ser	cada	vez	mais	objeto	
de intervenções que servem ao processo de mundialização, isto é, um fenômeno social 
em que a Europa, berço da Revolução Industrial, passa a aglutinar mercados com a 
expansão do capitalismo e integrando espaços tradicionais de produção, subsistência 
e formas de vida sustentáveis pela lógica da expansão econômica orientada pelo 
uso exploratório, radical e violento dos territórios e das populações neles inseridas: o 
projeto de desenvolvimento capitalista foi tornado possível com a exploração e invasão 
de terras e populações inúmeras ao redor do mundo pelos europeus, por meio do 
projeto	expansionista	baseado	no	sistema	colonial.	A	concepção	de	desenvolvimento	
que nos foi apresentada está ancorada nesta perspectiva, a qual hoje discutimos os 
impactos	e	consequências	que	nos	foi	deixada	como	legado.	Na	Unidade	2,	nós	tivemos	
a oportunidade de conhecer um pouco da realidade de diferentes comunidades 
tradicionais, considerando aspectos como a relação que esses povos estabelecem com 
152
a natureza e o ambiente onde vivem, de modo que fazem um uso sustentável das riquezas 
sem comprometer os biomas, desaparecimento de povos indígenas, escravização dos 
povos africanos, exploração dos recursos nativos, usurpação de minerais e saberes 
tradicionais	para	fins	predatórios	são	algumas	dessas	consequências.
Quando se trata de desenvolvimento para os nossos estudos aqui, acadêmico, 
devemos ter em mente as mudanças ocorridas com a urbanização e a industrialização, 
conforme pontuado na Unidade 1 deste livro, assim como é importante considerar o 
conceito de desenvolvimento rural, por sua vez implica um conjunto de práticas e 
tecnologias aplicadas ao ambiente rural, utilizadas para exploração e utilização dos 
recursos naturais ali disponíveis e se associa a construção de novos mercados, novos 
produtos	e	novas	formas	de	trabalho.
Em outro momento, o conceito vem a ser atualizado associando-se a dimensões 
mais amplas como a ambiental, a social, a cultural e a econômica para associar o uso 
adequado do rural para ampliar a capacidade de subsistência dos pequenos produtores, 
afastando-se de uma compreensão de modernização agrícola, industrialização ou 
urbanização	do	campo.	Momento	em	que	passa	a	circular	o	conceito	de	desenvolvimento 
rural sustentável, empregado para estimular nas áreas de agricultura familiar, reforma 
agrária, terras indígenas ou comunidades tradicionais um uso adequado da terra e dos 
recursos dela provenientes, atentando-se para o ecossistema respeitando a necessidade 
de reprodução das próximas gerações, isto é, respeitando o meio ambiente é possível 
melhorar a qualidade de vida da população, do solo, da alimentação e da economia sem 
esgotar a capacidade daquele ambiente com um uso desordenado e exploratório que 
extraí o máximo de recursos até esgotar a capacidade de recuperação do ambiente e 
assim impedindo sua produção para futuras gerações, bem como causando impactos 
desastrosos	no	meio	ambiente.
Para avançarmos mais nessa relação entre o rural e o urbano a partir dessas 
questões aqui apresentadas, cabe ainda lembrar umas das categorias elementares da 
antropologia que vai guiar você, acadêmico, ao conhecimento antropológico de uma outra 
perspectiva, aquela que vai valorizar o contexto e a realidade dos sujeitos sociais e onde 
vivem, procurando sempre se colocar em perspectiva com o Outro, esse que é diferente 
de você, que está em situação de desvantagem por efeito desse processo exploratório que 
destruiu suas terras, dizimou seu povo, explorou mão de obra e extorquiu suas fontes 
de	significado,	isto	é,	o	sentido	socialmente	compartilhado	pelos	povos	tradicionais	que	
ocupam	um	determinado	lugar.	Para	os	Guarani	e	kaiowá,	por	exemplo,	a	sua	territorialidade	
se constitui como um elemento fundamental da sua identidade e do sentido da própria 
vida.	Eles	dão	significado	a	sua	existência	na	experiência	de	viver,	habitar	e	entender	o	
mundo	a	partir	da	terra.	Não	por	acaso,	diante	de	conflitos	intensos	e	processos	de	invasão	
de suas terras muitos deles passaram a praticar o suicídio, vivenciando uma experiência 
de	perda	de	sentido	e	significado	diante	da	violência	e	da	supressão	de	seu	território.	
Abandonar	o	etnocentrismo	é	crucial	para	entender	os	conflitos	e	as	disputas	que	estão	
presentes	na	relação	rural	e	urbano.
153
Antes de passarmos para o próximo tópico, assista a este vídeo 
sobre a situação dos Guarani-Kaiowáno Momento Agroecológico que 
mostra as práticas de cura do povo Guarani-Kaiowá e a importância 
da retomada do território para a preservação dos saberes. Acesse: 
https://bit.ly/3U8fWAI.
DICA
Acadêmico, no próximo tópico, abordaremos situações do presente nas quais 
impactam os modos de produção, as formas de consumo e uso de recursos entre o rural 
e	o	urbano.
3 O RURAL E O MODERNO
Caro acadêmico, a partir dos anos de 1970 as ciências sociais brasileiras passaram 
a se interessar cada vez mais pelo estudo das mudanças na vida social rural a partir do olhar 
sobre a modernização da agricultura, bem como a formação das classes sociais nesse 
campo	 social	 em	 torno	do	mundo	 agrário.	Nesse	 período	 os	 estudos	 do	 campesinato	
estavam marcados pelo interesse numa análise das transformações das sociedades 
modernas.
O campesinato nesse período foi lido como um modo de produção pré-capitalista, 
cujas formas de funcionamento não poderiam ser entendidas a partir das teorias e 
explicações do sistema capitalista, mas de uma forma de produção pré-capitalista 
que	nas	afirmações	mais	enfáticas	compartilhadas	da	época	viam	no	campesinato	seu	
desaparecimento.	Mesmo	que	uma	boa	parte	dos	estudos	da	época,	conforme	vimos	
nas Unidades anteriores, demonstrassem a vitalidade desses modos de produção, a tese 
mais	difundida	entre	autores	clássicos	das	ciências	sociais	afirmava	que	se	tratava	de	
um pequeno contingente de grupos, que em consequência da expansão cada vez maior 
e mais rápida do capitalismo desapareceria, era apenas um resíduo do campesinato e 
“penetração	do	capitalismo	no	campo”	(WANDERLEY,	2001,	p.	12).
Os camponeses desse período eram vistos como inimigos do progresso e do 
desenvolvimento, anticapitalistas que num contexto de transição entre sociedades 
rurais e urbanas, detinham alto potencial de mobilização e luta social se colocando 
enfaticamente	contra	às	classes	dominantes	agrárias,	bem	como	os	proprietários	de	terra	
e	 os	 empresários	 da	 agricultura.	 No	 entanto,	 conforme	 argumenta	 Wanderley	 (2001),	
na verdade esse conjunto de atores sociais estavam mais empenhados em defender sua 
identidade, seu modo de vida e enfrentar as guerras anticolonialistas que nutriam a ideia 
do progresso baseada no apagamento dessas populações do campo em nome de uma 
suposta	emancipação	nacional.
154
 Os estudos do mundo rural nos anos 1970 tentaram entender em que 
medida ainda era possível haver uma reprodução do campesinato tendo em vista 
que havia uma “persistência” de uma gama de pequenos produtores familiares que 
combinavam uma agricultura tradicional com traços de modernização e capitalismo, não 
demorou e os pesquisadores passaram a perceber que o campesinato não desapareceu 
e	a	 “classe	dos	bárbaros”,	 como	foram	chamados	 (WANDERLEY,	2001,	 p.	 13),	fizeram	
inúmeros pesquisadores se voltarem ao estudo da natureza social e econômica desse 
campesinato persistente, que passou a se reproduzir em diferentes contextos das 
sociedades	modernas.
Wanderley	 (2001)	 afirmará	 que	 o	 processo	 de	 desenvolvimento	 econômico	
e social do Brasil longe de uniformizar a nossa sociedade, produziu uma diversidade 
de	 atores,	 modos	 de	 produção	 e	 relações	 sociais	 diversificados	 demonstrando	 uma	
complexidade	cada	vez	maior	dessas	fronteiras	relacionais.	Logo	perceberíamos	que	com	
o desenvolvimento do urbano e a aceleração do capitalismo seria necessário entender o 
campesinato	no	interior	das	sociedades	modernas	capitalistas	e	não	fora	delas.
De acordo com as pesquisas de Wanderley (2001), o campesinato contribuiu e 
continua contribuindo fortemente para a sociedade, não só na condição de um pequeno 
proprietário de terra (quando isso pode acontecer) ou pequeno “empresário”, mas como 
um	trabalhador.
Porém, ao contrário da relação direta entre o capital e o trabalho, que 
define	a	condição	do	assalariado,	a	reprodução	do	campesinato	nas	
sociedades capitalistas tem como fundamento uma relação indireta, 
cujos termos são dados pela polarização autonomia-subordinação, 
isto é, a busca incessante de um espaço de autonomia pelos 
camponeses,	 face	 aos	 mecanismos	 de	 subordinação	 do	 capital.	
Indireta, precisamente, porque reproduz, nas circunstâncias dadas, 
um	produtor	de	mercadorias	(WANDERLEY,	2001,	p.	15).
O que a autora enfatiza é a diversidade de situações de reprodução do 
campesinato	 no	 contexto	 da	América	 Latina.	 Dito	 isso,	 afirma-se	 que	 esse	 perfil	 de	
produção teve grande capacidade de adaptação frente a expansão capitalista, resistindo 
aos	contextos	de	mudanças	econômicas,	sociais,	políticas	e	ambientais.	No	entanto,	
Wanderley é assertiva em dizer que essa capacidade de adaptação é resultado de 
inúmeras estratégias familiares, isto é, “mais do que as diferenças quanto aos níveis de 
renda	auferida,	que	apenas	reconstrói	o	perfil	momentâneo	dos	agricultores	familiares,	
é a diferenciação das estratégias familiares que está na origem da heterogeneidade das 
formas	sociais	concretas	da	agricultura	familiar”	(WANDERLEY,	2001,	p.	15).
A agricultura familiar se manteve persistente ao longo da história porque 
nela há um conjunto de atores sociais que protagonistas de suas próprias vivências, 
situados em sua dimensão espacial, política, econômica, social e ambiental renovam 
suas	estratégias	e	modos	de	produção	e	se	mantém	resistentes	em	meio	às	imposições	
externas	com	inovações.
155
Wanderley (2001) desenvolveu uma importante pesquisa sobre os produtores 
de algodão do município do Leme, em São Paulo, em que demonstrou que uma parte 
significativa	dos	agricultores	 familiares	que	 residiam	na	 sede	municipal,	 à	 época,	uma	
cidade de aproximadamente 70 mil habitantes, situada num eixo considerado urbano 
e industrial, mantinham residência em sítios relativamente próximos, tendo como aporte 
para esse trânsito “rural e urbano” um sistema de transporte acessível que ajudou a 
manter	 um	fio	 continuum	entre	 o	meio	 rural	 e	 a	 cidade	urbana.	 Em	geral,	 a	maioria	
dos agricultores, homens adultos, serviram-se dessa acessibilidade do sistema de 
transporte para continuar a manter suas maneiras tradicionais de interação e contato 
com o meio rural, além da produção, eram fortemente apegados aos hábitos culturais 
expressos em suas formas de lazer, por exemplo, pescarias, festas e rituais religiosos e 
encontros	informais	com	amigos	dos	sítios.
Nesse sentido, a pesquisadora continuava a fortalecer a tese de que o mundo 
rural não deveria ser compreendido de forma isolada da sociedade moderna, mas em 
interação com ela, uma vez que as relações entre campo-cidade estavam cada vez 
mais	complementares	entre	si.	Assim,	para	Wanderley	(2001,	p.	18),	“o	mundo	rural	pode	
ser	entendido	como	um	lugar	de	vida,	que	se	define	enquanto	um	espaço	singular	e	
um	ator	coletivo”.	Ao	colocar	sua	afirmação	nesses	termos,	Wanderley	mostra	que	as	
tramas espaciais e sociais, assim como as trajetórias de desenvolvimento vividas pelos 
habitantes desse universo dão o sentido social a uma relação campo-cidade, vivida 
como	complementariedade	e	integração.
Esse tipo de relação se expressa por meio de dinâmicas internas e externas da 
vida	social	do	mundo	rural	em	sua	diversidade.	Assim,	o	acesso	da	população	rural	a	bens	
de consumo, eletrodomésticos, bens e serviços são indicadores do grau de interação e 
complementariedade	sobre	o	qual	Wanderley	(2001)	afirma.	Por	outro	lado,	a	autora	vai	
afirmar	que	a	vida	social	local	vai	ser	marcada	pelo	acesso	a	bens	que	são	considerados	
essenciais para sua permanência no campo, destaca-se nesse sentido as oportunidades 
de	trabalho	que	parecem	sempre	mais	escassos	nas	áreas	rurais.	O	que	ocasionaria	uma	
precariedade das condições no meio rural seria a necessidade de deslocamento, acesso a 
serviços	e	bens	que	não	se	realizam	ou	quando	acontece	é	de	forma	precarizada.
 
Assim, mais do que acentuar as diferenças entre o campo e a cidade, Wanderley 
(2001,	 p.	 57)	 nos	 mostrará	 que	 há	 um	 conjunto	 de	 contradiçõesencontradas	 na	
agricultura	brasileira	em	torno	da	propriedade	da	terra.	Assim,	Afrânio	Garcia	Jr.	(1990)	
também vai argumentar nessa mesma direção, mostrando que:
tomar a presença crescente de trabalhadores pagos em dinheiro 
na diária ou por tarefa realizada em todos os tipos de explorações 
agrícolas por desenvolvimento do trabalho assalariado, por processo 
de	 proletarização,	 por	 desenvolvimento	 capitalista,	 não	 especifica	
nada, não proporciona o conhecimento das determinações desse 
processo	(GARCIA	JR.,	1990,	p.	276).
156
A formação desse contingente de trabalhadores está associada diretamente a 
condição	de	concentração	fundiária	vivida	em	nosso	país.	E	parte	desses	trabalhadores	
foram precarizados em face de terem uma vida concentrada no mundo rural e nos modos 
de produção da agricultura cuja principal fonte de subsistência é o trabalho na terra e 
ao se deparar com uma expansão do capital produtivo, secas, falta de políticas públicas 
e ampliação da concentração de terras vão se tornar uma massa de trabalhadores com 
baixa	remuneração	e	perda	de	suas	terras.	Essas	frágeis	condições	vão	converter	aqueles	
que eram pequenos produtores e pequenos proprietários de terras em uma massa de 
assalariados	precarizados,	cuja	fonte	de	renda	principal	é	o	trabalho	na	agricultura.
A	 passagem	 de	 colono/morador	 para	 trabalhador	 assalariado	 não	
significou,	 necessariamente,	 nem	 uma	 mudança	 de	 patrão	 (não	
me	refiro	aqui	à	pessoa	 individual	de	cada	patrão,	mas	à	categoria	
social, cujo elemento permanente é precisamente a propriedade da 
terra),	nem	mesmo	uma	mudança	da	natureza	do	trabalho	efetuado.	
Expulso da terra enquanto morador, o assalariado a ela retorna para 
realizar, na maioria das vezes, trabalho semelhante ao que já fazia 
anteriormente.	 atividades	 fragmentadas,	 não	 qualificadas,	 ligadas	
às	 tarefas	manuais	que	a	modernização	das	grandes	culturas	não	
conseguiu	superar	(WANDERLEY,	2001,	p.	58).
Essa mudança deve ser percebida como uma incapacidade da agricultura 
brasileira, em especial, os setores mais modernos, de incorporar o progresso técnico e 
as	inovações	tecnológicas	e	de	se	libertar	da	concepção	parcial	de	propriedade	da	terra.	
Um dos resultados mais expressivos dessas transformações sociais é o emprego do 
trabalho compulsório ou de semiescravidão em grandes empresas agropecuárias, uma 
superexploração do trabalho que alimenta a reprodução da propriedade fundiária e se 
distancia de uma visão associada a um processo de moderno de divisão social do trabalho 
ou	de	 unificação	dos	mercados	 de	 trabalho	 rural	 e	 urbano.	 Sobre	 as	 consequências	
dessas	 relações	 sociais	presentes	no	 rural	 brasileiro,	Wanderley	 (2001,	 p.	 59)	 afirma	 “a	
base	da	 extrema	exploração	de	uma	 força	de	 trabalho	 sem	qualificação	profissional,	
sem garantia de proteção efetiva das leis trabalhistas e com acesso precário aos bens e 
serviços	fundamentais	ao	cidadão”.
Assim a “pobreza rural” virou tema de inúmeras pesquisas a exemplo daquela 
realizada	 por	 Eugênia	 Trancoso	 Leone,	 em	 1994,	 quando	 demonstrou	 o	 aumento	
expressivo	da	proporção	de	pobres	no	mundo	rural.
As famílias que residem em áreas urbanas, mas dependem de uma 
baixa renda do trabalho do chefe na agricultura, têm uma série de 
dificuldades	 para	 materializar	 as	 possibilidades	 oferecidas	 pela	
vida	na	cidade.	Essas	dificuldades	têm	a	ver	com	as	deficiências	de	
infraestrutura	de	serviços	urbanos	e	com	a	insuficiência	do	nível	de	
renda	de	boa	parte	dessas	famílias.	Em	consequência,	elas	não	têm	
acesso a um mínimo de condições básicas que são imprescindíveis a 
qualquer	morador	das	cidades.	Por	esse	motivo,	apesar	de	se	notar	
uma diferença substancial de estilo de vida entre os residentes de 
áreas rural e urbana, não é em absoluto claro que tais diferenças 
impliquem uma condição de vida melhor para os que moram na 
157
cidade.	A	vida	nas	cidades	requer	um	nível	de	renda	que	a	agricultura	
não	tem	proporcionado	à	maioria	daqueles	que	nela	trabalham	ainda	
que	já	tenham	residência	urbana	(LEONE,	1994,	p.	124).
Após conhecer, aprender e compreender contextos, teorias e categorias 
analíticas pertinentes em nossos estudos da relação rural e urbano você já está 
familiarizado com as interfaces e diversidades de relações e práticas que fazem parte 
desse	universo	da	vida	social.	Assim,	para	finalizar	esse	tópico	que	tal	fazer	um	exercício	
de	 revisão?	O	objetivo	é	que	você,	 acadêmico,	 também	faça	um	movimento	 reflexivo	de	
deslocamento para contextos mais próximos que evoquem relações entre esse continuum 
rural	e	urbano	no	tempo	contemporâneo.	Aproveite.	Nos	vemos	no	próximo	tópico!
158
Neste tópico, você aprendeu:
• As dinâmicas entre o rural e o urbano no contexto do desenvolvimento global e dos 
processos	de	disputas	e	conflitos	territoriais	que	se	dão	no	mundo	contemporâneo.
• Alguns conceitos e teorias essenciais para o entendimento do contexto analisado, 
que ganharão destaque a partir de algumas pesquisas empíricas sobre os temas 
essenciais para nosso processo de aprendizagem no entendimento da diversidade 
cultural	que	envolve	o	rural	e	o	urbano.
•	 Há	 inúmeras	 mudanças	 vividas	 no	mundo	 rural,	 que	 tornam	 cada	 vez	 mais	 vaga	 a	
imagem de um ambiente agrícola e tradicional, passando a incorporar atividades e 
práticas consideradas tipicamente do mundo urbano, distanciando-se, assim, de 
uma	visão	etnocêntrica	do	rural	como	atrasado.		
•	 Há	 implicações	 acompanhadas	 pela	 expansão	 e	 concentração	 de	 terras,	 lavouras	
com	 investimentos	 de	 capital	 financeiro	 e	 uma	mudança	 na	 perspectiva	 onde	 as	
atividades de produção tradicionais comumente conhecidas como “camponesas” 
passam	a	sofrer	com	a	produção	de	commodities.
• A expansão econômica desenfreada interferiu na qualidade de vida e as formas de 
subsistência encontradas na população do campo, reconhecendo como essas pessoas 
passam a viver a experiência de escassez, desemprego, falta de oportunidades, 
pauperização e como consequência dessa intensa industrialização do campo ocorre o 
fenômeno	do	êxodo	rural.
RESUMO DO TÓPICO 1
159
1 De acordo com Maria Nazaré Wanderley, “a grande propriedade patronal no Brasil está 
na	 origem	de	 uma	 ruralidade	 dos	 espaços	vazios”	 (2001,	 p.	 36).	 Parte	 importante	
dos	processos	de	modernização	do	campo	teve	como	projeto	as	novas	configurações	
produtivas	 nos	 espaços	 rurais,	 onde	 destacam-se	 algumas	 características.	 Sobre	
essas características assinale a alternativa CORRETA:
WANDERLEY, M. N. B. A ruralidade no Brasil moderno. Por um pacto social pelo desenvolvimento rural. In: 
Giarraca, N. Una nueva ruralidad en América Latina? Buenos Aires: clacso, 2001. p. 31-44. 
a) ( ) O intenso uso de máquinas, inovações tecnológicas, uso de adubos e fertilizantes 
químicos	e	aplicação	de	capital	financeiro.
b) ( ) A intensa migração dos moradores da cidade para o campo em busca de trabalho; 
o uso de agrotóxicos para melhorar a produção e a inclusão de novas legislações 
trabalhistas.
c) ( ) As perspectivas da sustentabilidade foram centrais para esse contexto, onde 
prevaleceram	as	operações	e	processos	da	produção	da	agricultura	familiar.
d) ( ) Inovações tecnológicas no campo ampliaram a preservação dos biomas, o 
reconhecimento	da	diversidade	e	o	respeito	às	comunidades	tradicionais.
2 Considerando os processos de mudanças sociais e as dinâmicas entre o rural e o 
urbano, uma categoria que ganha sentido para o entendimento deste campo de 
estudos	 é	 desenvolvimento.	 Com	 base	 nas	 definições	 dos	 enfoques	 do	 referido	
conceito, analise as sentenças a seguir:
I- Tal conceito quando localizado em período histórico como o do surgimento do 
capitalismo e da Revolução Industrial se associa a uma compreensão de processo de 
evolução,	crescimento	e	progresso.
II- A agricultura familiar e o roçado são considerados exemplos de inovações tecnológicas 
da produção agrícola que marcam o progresso no campo, representando

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