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Doença Hepática: Aspectos Gerais

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Aspectos Gerais da Doença Hepática 
☼ O fígado é vulnerável a uma grande variedade de insultos metabólicos, 
tóxicos, microbianos, circulatórios e neoplásicos. As principais doenças 
primárias do fígado são as hepatites virais, a doença hepática gordurosa 
não alcoólica (DHGNA), a doença hepática alcoólica e o carcinoma 
hepatocelular (CHC). 
☼ A lesão hepática também ocorre secundariamente em algumas das 
doenças mais comuns em humanos, como a insuficiência cardíaca, o câncer 
disseminado e as infecções extra-hepáticas. 
☼ A enorme reserva funcional do fígado mascara o impacto clínico da lesão 
hepática leve, mas, com a progressão de doença difusa ou interrupção do 
fluxo biliar, as consequências da perturbação da função hepática podem 
causar risco de morte. 
☼ Com exceção da insuficiência hepática aguda, a doença hepática é um 
processo insidioso no qual a detecção clínica e os sintomas de 
descompensação hepática podem ocorrer semanas, meses ou muitos anos 
após o início da lesão. 
Mecanismos de Lesão e Reparo 
Hepatócitos e Respostas Parenquimatosas 
☼ Os hepatócitos podem ser submetidos a uma série de alterações 
degenerativas, mas potencialmente reversíveis, tais como o acúmulo de 
gordura (esteatose) e de bilirrubina (colestase). Quando a lesão não é 
reversível, os hepatócitos morrem principalmente por dois mecanismos: necrose 
ou apoptose. 
▪ Na necrose dos hepatócitos, as células sofrem tumefação devido à 
regulação osmótica defeituosa na membrana celular: o fluido flui para 
dentro da célula, que incha e se rompe. Os macrófagos se aglomeram em 
tais locais de lesão e marcam os locais de necrose dos hepatócitos, assim 
as células mortas se rompem e desaparecem. Esse tipo de lesão é o modo 
predominante de morte em lesões isquêmicas/hipóxicas e uma parte 
significativa da resposta ao estresse oxidativo. 
▪ A apoptose de hepatócitos é uma forma ativa de morte celular 
“programada” que resulta em encolhimento dos hepatócitos, 
condensação da cromatina nuclear (picnose), fragmentação (cariorrexe) 
e fragmentação celular em corpos apoptóticos acidófilos. Os hepatócitos 
apoptóticos têm sido muitas vezes chamados de corpúsculos de 
Councilman. Nas configurações mais frequentes em que os hepatócitos 
apoptóticos são vistos, (p. ex., na hepatite aguda e crônica), o termo 
corpúsculos acidófilo é utilizado devido às suas características de 
coloração profundamente eosinofílica 
☼ Quando há perda generalizada do parênquima, muitas vezes há 
evidências de necrose confluente, uma perda zonal severa de hepatócitos. 
Isso pode ser observado em lesões isquêmicas ou tóxicas agudas ou na 
hepatite viral ou autoimune grave. A necrose confluente pode começar como 
uma zona de perda de hepatócitos em torno da veia central. O espaço 
resultante é preenchido por detritos celulares, macrófagos, e os 
remanescentes da rede de reticulina. 
☼ Na necrose em ponte ocorre a necrose de hepatócitos, que se estende de 
um espaço portal a outro, de uma veia centro lobular a outra ou de um 
espaço portal a uma veia centro lobular (necrose porto-portal, centro-
central ou porto-central). 
☼ Representação esquemática da história natural de pequenas regiões de 
extinção hepatocelular e a cicatrização relacionada: 
 
▪ A: Fígado normal com as veias hepática e porta (em azul) patentes. 
 
 
▪ B: A extinção ocorre quando hepatócitos contíguos morrem, geralmente 
após lesão inflamatória ao suprimento sanguíneo (hepatócitos 
isquêmicos são mostrados em laranja; veias obstruídas, em preto). 
 
 
▪ C: Parênquima vazio entra em colapso e começa a cicatrizar (em 
marrom) e os tratos portais e veias hepáticas adjacentes se aproximam. 
 
 
▪ D: As cicatrizes nas regiões de extinção contraem-se e condensam-se, 
tornando-se septos fibrosos. A maior região de extinção (no lado 
esquerdo) formou uma pequena aderência entre o trato portal 
adjacente e a veia hepática. As pequenas veias obliteradas 
desapareceram. 
 
▪ E: Septos alongados pela tração causada por hiperplasia de 
hepatócitos adjacentes. Colágeno do trato portal (em cinza-claro) é 
inferior ao normal conforme a reabsorção começa. 
 
▪ F: Os septos são reabsorvidos. O tecido resultante possui aderência 
fibrosa venoportal, ou veias hepáticas que estão muito próximas dos 
tratos portais. Os tratos portais são remanescentes, muitas vezes sem 
veia porta. 
☼ A regeneração dos hepatócitos perdidos ocorre principalmente pela 
replicação mitótica dos hepatócitos adjacentes àqueles que morreram, 
mesmo quando há uma necrose confluente significativa. 
☼ Os hepatócitos são bastante semelhantes às células-tronco na sua 
capacidade de continuar a replicar mesmo durante anos de lesão crônica, 
e, desse modo, a participação de células-tronco geralmente não é 
significativa no reparo do parênquima. 
Formação e Regressão de Cicatrizes 
☼ A principal célula envolvida na formação de cicatrizes é a célula estrelada 
hepática. Na sua forma de repouso, ela é uma célula que armazena lipídio 
(vitamina A). No entanto, em várias formas de lesão aguda e crônica, as 
células estreladas podem ser ativadas e convertidas em miofibroblastos 
altamente fibrogênicos. 
☼ Ativação da célula estrelada e fibrose hepática: 
▪ A ativação da célula de Kupffer leva à secreção de diversas citocinas. 
▪ O fator de crescimento derivado de plaquetas (PDGF) e o fator de 
necrose tumoral (TNF) ativam as células estreladas, e a contração das 
células estreladas ativadas é estimulada pela endotelina-1 (ET-1). 
▪ A fibrose é estimulada pelo fator transformante do crescimento-β (TGF-
β). 
▪ A quimiotaxia das células estreladas ativadas até as áreas lesadas é 
promovida pelo PDGF e pela proteína-1 quimiotática de monócitos 
(MCP-1). 
Insuficiência Hepática 
☼ A consequência clínica mais severa da doença hepática é a insuficiência 
hepática. Ela pode ser o resultado de uma destruição hepática súbita e 
maciça, como no caso da insuficiência hepática aguda ou, mais 
frequentemente, a insuficiência hepática crônica, que se desenvolve após 
anos ou décadas de uma lesão crônica progressiva do fígado. 
Insuficiência Hepática Aguda 
☼ A insuficiência hepática aguda é definida como uma doença hepática 
aguda associada com encefalopatia e coagulopatia, que ocorre dentro de 
26 semanas após a lesão hepática inicial, na ausência de uma doença 
hepática preexistente. 
☼ A insuficiência hepática aguda é causada por necrose hepática maciça, 
na maioria das vezes induzida por fármacos ou toxinas. Suas causas incluem: 
▪ Acetaminofeno, hepatite A, hepatite autoimune; 
▪ Hepatite B; 
▪ Hepatite C criptogênica; 
▪ Medicamentos/toxinas, hepatite D; 
▪ Hepatite E, causas pouco compreendidas (doença de Wilson, Budd-
Chiari); 
▪ Alteração gordurosa do tipo microvesicular (fígado gorduroso da 
gravidez, valproato, tetraciclina, síndrome de Reye) 
☼ O mecanismo da necrose hepatocelular pode consistir em dano tóxico 
direto, porém na maioria das vezes consiste em uma combinação variável de 
toxicidade e destruição de hepatócitos mediada imunologicamente (p. ex., 
infecção pelo vírus da hepatite). 
☼ Morfologia: 
▪ A insuficiência hepática aguda geralmente apresenta necrose hepática 
maciça, com amplas regiões de perda do parênquima, em torno de ilhas 
de hepatócitos em regeneração. Esses fígados são pequenos e 
encolhidos. 
▪ Nesses quadros, geralmente relacionados à disfunção mitocondrial 
primária, os hepatócitos são incapazes de desempenhar suas funções 
metabólicas normais. 
☼ A insuficiência hepática aguda se manifesta primeiramente com náuseas, 
vômitos e icterícia, seguidos por encefalopatia potencialmente fatal e 
alterações na coagulação. Porém, existem também outras manifestações, que 
são: 
▪ As alterações da formação e fluxo de bile tornam-se clinicamente 
evidentes como uma coloração amarela da pele e da esclera (icterícia 
e icterus, respectivamente), devida à retenção de bilirrubina,e como 
colestase devida à retenção sistêmica não apenas de bilirrubina, mas 
também de outros solutos eliminados na bile. 
▪ A encefalopatia hepática é um espectro de alterações da consciência, 
variando de anormalidades comportamentais sutis, passando por 
confusão acentuada e estupor, até coma profundo e morte. 
▪ O fígado é responsável pela produção de fatores de coagulação 
dependentes e independentes de vitamina K. Desse modo, com a função 
de síntese hepática extremamente prejudicada, a coagulopatia se 
desenvolve. 
▪ A hipertensão portal surge quando há diminuição do fluxo através do 
sistema venoso portal, o que pode ocorrer devido à obstrução nos 
níveis pré-hepático, intra-hepático ou pós-hepático. 
▪ A síndrome hepatorrenal é uma forma de insuficiência renal que ocorre 
em indivíduos com insuficiência hepática nos quais não há causas 
intrínsecas morfológicas ou funcionais para a disfunção renal. Retenção 
de sódio, excreção de água livre prejudicada e diminuição da taxa 
de perfusão renal e filtração glomerular são as principais alterações 
funcionais renais. 
Insuficiência Hepática Crônica e Cirrose 
☼ As principais causas de insuficiência hepática crônica em todo o mundo 
incluem hepatite B crônica, hepatite C crônica, doença hepática gordurosa 
não alcoólica e doença hepática alcoólica. 
☼ A insuficiência hepática na doença hepática crônica é associada mais 
frequentemente com a cirrose, uma condição marcada pela transformação 
difusa de todo o fígado em nódulos parenquimatosos regenerativos, 
circundados por faixas fibrosas e graus variáveis de derivações (shunts) 
vasculares (muitas vezes portossistêmicos). 
No entanto, nem todas as cirroses levam inexoravelmente à insuficiência 
hepática crônica, e nem todas as doenças hepáticas crônicas de estágio 
final são cirróticas. 
☼ A classificação de Child-Pugh da cirrose distingue entre a classe A(bem 
compensada), B (parcialmente descompensada) e C (descompensada), que 
se correlacionam, histologicamente, com diferentes características 
morfológicas. 
☼ Na doença hepática crônica, as reações ductulares aumentam com o 
estágio avançado da doença e são geralmente mais proeminentes na cirrose. 
 ☼ Há dois correlatos de reações ductulares: 
▪ O papel das células-tronco do fígado na regeneração do parênquima 
aumenta à medida que os hepatócitos preexistentes sofrem 
envelhecimento replicativo após anos a décadas de replicação. 
▪ Reações ductulares podem incitar cicatrizes na doença hepática 
crônica e, portanto, podem ter um efeito negativo sobre a doença 
hepática progressiva. 
☼ Aproximadamente 40% dos indivíduos com cirrose são assintomáticos até 
os estágios mais avançados da doença. Quando sintomáticos, eles 
apresentam manifestações não específicas: anorexia, perda de peso, 
fraqueza e, na doença avançada, sinais e sintomas de insuficiência hepática. 
Hipertensão Portal 
☼ A hipertensão portal surge quando há diminuição do fluxo através do 
sistema venoso portal, que pode desenvolver-se em uma variedade de 
circunstâncias, sendo divididas em causas pré-hepáticas, intra-hepáticas e 
pós-hepáticas. 
▪ As principais condições pré-hepáticas consistem em trombose 
obstrutiva, estreitamento da veia porta antes de sua ramificação no 
interior do fígado ou esplenomegalia maciça com aumento do fluxo 
sanguíneo venoso esplênico. 
▪ A causa intra-hepática dominante é a cirrose, representando a maioria 
dos casos de hipertensão portal. Causas intra-hepáticas muito menos 
frequentes consistem em esquistossomose, alteração gordurosa maciça, 
doenças granulomatosas fibrosantes difusas, como a sarcoidose, e 
doenças que afetam a microcirculação portal, como hiperplasia 
nodular regenerativa. 
▪ As principais causas pós-hepáticas são insuficiência cardíaca direita 
severa, pericardite constritiva e obstrução do fluxo da veia hepática. 
☼ Fatores importantes no desenvolvimento da hipertensão portal: 
▪ Maior resistência ao fluxo portal ao nível dos sinusoides, que é causada 
pela contração de células da musculatura lisa vascular e 
miofibroblastos e pela interrupção do fluxo sanguíneo por cicatrização 
e formação de nódulos parenquimatosos. 
▪ Aumento no fluxo de sangue venoso portal: resultante de uma 
circulação hiperdinâmica. Isso é causado pela vasodilatação arterial, 
principalmente na circulação esplâncnica. O maior fluxo sanguíneo 
arterial esplâncnico, por sua vez, provoca o aumento do efluxo venoso 
para o sistema venoso portal. 
☼ As quatro principais consequências clínicas da hipertensão portal são: 
▪ Ascite: Ocorre devido ao acúmulo de líquido, geralmente seroso, em 
excesso na cavidade peritoneal. Em 85% dos casos, a ascite é causada 
por cirrose. 
▪ Formação de derivações venosas portossistêmicas: Com a elevação da 
pressão no sistema portal, o fluxo é invertido da circulação portal para 
a sistêmica pela dilatação de vasos colaterais e pelo desenvolvimento 
de novos vasos. Circuitos venosos secundários se desenvolvem em 
qualquer local onde as circulações sistêmica e portal compartilhem de 
leitos capilares comuns. 
▪ Esplenomegalia congestiva: consiste no aumento do tamanho do baço, 
pode induzir secundariamente anormalidades hematológicas atribuíveis 
ao hiperesplenismo, como trombocitopenia ou até mesmo pancitopenia. 
▪ Encefalopatia hepática 
Hepatites Virais 
☼ Vírus hepatotrópicos (hepatites A, B, C, D e E) que possui uma afinidade 
específica para o fígado. 
Hepatite A 
☼ O vírus da hepatite A (HAV, do inglês, hepatitis A virus) causa uma doença 
normalmente benigna e autolimitada, com um período de incubação de 2 a 
6 semanas. O HAV não causa hepatite crônica ou um estado de portador e 
apenas raramente causa insuficiência hepática aguda, por isso a taxa de 
fatalidade associada ao HAV corresponde apenas de 0,1% a 0,3%. 
☼ Os indivíduos afetados apresentam sintomas inespecíficos, como fadiga e 
perda do apetite, e frequentemente desenvolvem icterícia. 
☼ O HAV é transmitido pela ingestão de água e alimentos contaminados e 
é eliminado nas fezes por 2 a 3 semanas antes e 1 semana após o início da 
icterícia. Portanto, o contato pessoal próximo com um indivíduo afetado ou 
a contaminação fecal-oral durante esse período são responsáveis pela 
maioria dos casos e explicam os surtos em ambientes institucionais, como 
escolas e creches, e as epidemias transmitidas pela água em locais onde as 
pessoas vivem em condições de aglomeração, sem saneamento. 
☼ A vacina contra HAV, disponível desde 1992, é eficaz para prevenir a 
infecção. 
☼ O HAV pode ser detectado no soro e na saliva. Uma vez que a viremia 
por HAV é transitória, a transmissão do HAV pelo sangue ocorre apenas 
raramente; portanto, o sangue doado não é examinado especificamente 
para esse vírus. 
Hepatite B 
☼ O vírus da hepatite B (HBV) pode produzir 
▪ Hepatite aguda seguida por recuperação e eliminação do vírus; 
▪ Hepatite crônica não progressiva; 
▪ Doença crônica progressiva terminando em cirrose 
▪ Insuficiência hepática aguda com necrose hepática maciça; 
▪ Estado de portador assintomático “saudável”. 
☼ A doença hepática crônica induzida por HBV é também um fator precursor 
importante para o desenvolvimento de carcinoma hepatocelular, mesmo na 
ausência de cirrose. 
☼ O modo de transmissão do HBV varia com as áreas geográficas: 
▪ Em regiões do mundo com alta prevalência, a transmissão durante o 
parto representa 90% dos casos. 
▪ Em áreas com prevalência intermediária, a transmissão horizontal, 
especialmente no início da infância, é o modo de transmissão 
dominante. Esse tipo de disseminação ocorre por pequenas lacerações 
da pele ou das membranas mucosas entre crianças com contato 
corporal próximo. 
▪ Em áreas de baixa prevalência, a relação sexual sem proteção e o 
abuso de drogas intravenosas (compartilhamento de agulhas e 
seringas) constituem os principais modos de disseminação. 
☼ O HBV tem um período de incubaçãoprolongado (2 a 26 semanas). Ao 
contrário do HAV, o HBV permanece no sangue até e durante episódios ativos 
de hepatites aguda e crônica. 
☼ Em quase todos os casos, a infecção é autolimitada e cede sem 
tratamento. 
☼ Aproximadamente 65% dos adultos que adquiriram o HBV não são 
sintomáticos ou apresentam sintomas leves e não desenvolvem icterícia. 
☼ 25% apresentam sintomas constitucionais inespecíficos, como anorexia, 
febre, icterícia e dor no quadrante superior direito. 
☼ A doença crônica ocorre em 5% a 10% dos indivíduos infectados. 
☼ A hepatite fulminante (insuficiência hepática aguda) é rara, ocorrendo em 
aproximadamente 0,1% a 0,5% dos indivíduos infectados de forma aguda. 
☼ A idade no momento da infecção é o melhor preditor de cronicidade. 
Quanto menor a idade no momento da infecção por HBV, maior é a 
probabilidade de cronicidade. 
☼ Apesar do progresso no tratamento de infecção crônica por HBV, é 
extremamente difícil alcançar a cura completa, mesmo quando tratada com 
agentes antivirais altamente eficazes. 
☼ A hepatite B pode ser prevenida por vacinação e pela triagem de sangue, 
órgãos e tecidos de doadores. A vacinação induz uma resposta protetora 
de anticorpos anti-HBs em 95% dos lactentes, crianças e adolescentes. 
Hepatite C 
☼ O vírus da hepatite C (HCV) é uma importante causa de doença hepática 
em todo o mundo 
☼ Os fatores de risco mais comuns para infecção por HCV são: 
▪ Abuso de drogas intravenosas (54%). 
▪ Múltiplos parceiros sexuais (36%). 
▪ Realização de cirurgia nos últimos 6 meses (16%). 
▪ Ferimento por picada de agulha (10%). 
▪ Contatos múltiplos com uma pessoa infectada por HCV (10%). 
▪ Atividade profissional na área médica ou odontológica (1,5%). 
▪ Desconhecido (32%). 
☼ Os pacientes podem apresentar múltiplos fatores de risco (o total dos 
riscos listados anteriormente mencionados é superior a 100%), mas um terço 
dos indivíduos não apresenta fatores de risco identificáveis, um mistério 
hepatológico que persiste. 
☼ Dentro de um determinado indivíduo, o HCV existe como variantes 
genéticas estreitamente relacionadas, conhecidas como quasispécies 
☼ Um aspecto característico da infecção por HCV, consiste em surtos 
repetidos de lesão hepática, resultantes da reativação de uma infecção 
preexistente ou da emergência de uma cepa endógena que tenha sofrido 
uma mutação recente. 
☼ O período de incubação da hepatite por HCV varia de 4 a 26 semanas, 
com uma média de 9 semanas. Em aproximadamente 85% dos indivíduos, o 
curso clínico da infecção aguda é assintomático e normalmente ignorado. 
☼ O curso clínico da hepatite aguda por HCV é mais leve que com o HBV; 
raros casos podem ser severos e indistinguíveis da hepatite por HAV ou HBV. 
Não se sabe porque apenas uma pequena minoria de indivíduos é capaz 
de curar-se da infecção por HCV. 
☼ Infecção persistente e hepatite crônica são as marcas registradas da 
infecção por HCV, apesar da natureza geralmente assintomática da doença 
aguda. Em contraste com o HBV, a doença crônica ocorre na maioria dos 
indivíduos infectados por HCV (de 80% a 90%), e a cirrose eventualmente 
ocorre em 20% dos indivíduos com infecção crônica por HCV. 
☼ Uma característica única para a infecção da hepatite C é a associação 
com a síndrome metabólica. Aparentemente, o HCV pode dar origem à 
resistência à insulina e à doença hepática gordurosa não alcoólica. 
☼ A infecção por HCV é potencialmente curável. Até recentemente, o 
tratamento tinha sido baseado na combinação de IFN-α peguilado e 
ribavirina, e as taxas de cura dependiam do genótipo viral; desse modo, 
pacientes com infecção por genótipo 2 ou 3 geralmente apresentavam a 
melhor resposta. 
☼ Novos medicamentos direcionados a polimerase e protease virais já foram 
aprovados ou estão em fase de desenvolvimento. Com os medicamentos 
atualmente disponíveis, uma resposta virológica sustentada (definida como 
um RNAde HCV indetectável no sangue do paciente 24 semanas após o final 
do tratamento) pode ser conseguida em 50% a 80% dos pacientes. 
Hepatite D 
☼ Também conhecido como “o agente delta”, o vírus da hepatite D (HDV) é 
um vírus de RNA único que depende do seu ciclo de vida no HBV. A infecção 
por HDV surge nas seguintes situações: 
▪ Uma coinfecção aguda ocorre após a exposição a soro contendo 
tanto HDV quanto HBV. O HBV deve se estabelecer primeiro para 
fornecer o HBsAg necessário para o desenvolvimento de virions de HDV 
completos. A coinfecção de HBV e HDV resulta na hepatite aguda, que 
é indistinguível da hepatite aguda B. Ela é autolimitada e é normalmente 
seguida pela eliminação de ambos os vírus. No entanto, há uma maior 
taxa de insuficiência hepática aguda em usuários de drogas 
intravenosas. 
▪ A superinfecção ocorre quando um portador crônico de HBV é exposto 
a um novo inóculo de HDV. Isso resulta em doença 30 a 50 dias após, 
apresentando-se como uma hepatite aguda grave em um portador de 
HBV não reconhecido anteriormente, ou como uma exacerbação de 
infecção preexistente da hepatite B crônica. A infecção crônica por 
HDV ocorre em praticamente todos esses pacientes. A superinfecção 
pode ter duas fases: uma fase aguda, com replicação ativa de HDV e 
supressão de HBV com altos níveis de transaminase, e uma fase crônica, 
na qual a replicação de HDV diminui, a replicação de HBV aumenta, os 
níveis de transferase flutuam e a doença progride para cirrose e, 
algumas vezes, carcinoma hepatocelular. 
☼ O RNA do HDV é detectável no sangue e no fígado imediatamente antes 
e nos primeiros dias de doença sintomática aguda. 
☼ Na hepatite delta crônica originada da superinfecção por HDV, HBsAg 
está presente no soro, e os anticorpos anti-HDV (IgG e IgM) persistem por 
meses ou mais. 
☼ A vacinação contra HBV também evita a infecção por HDV. 
Hepatite E 
☼ O vírus da hepatite E (HEV) é uma infecção transmitida entericamente pela 
água, que ocorre principalmente em jovens e adultos de meia-idade. 
☼ O HEV é uma doença zoonótica com hospedeiros animais, como macacos, 
gatos, porcos e cães. 
☼ Um aspecto característico da infecção por HEV é a alta taxa de 
mortalidade entre gestantes, chegando a 20%. 
☼ Na maioria dos casos, a doença é autolimitada; o HEV não está associado 
à doença hepática crônica ou viremia persistente em pacientes 
imunocompetentes. 
☼ A infecção crônica por HEV ocorre em pacientes com AIDS e pacientes 
transplantados imunossuprimidos. O período médio de incubação após a 
exposição corresponde a 4 a 5 semanas. 
☼ Os vírus são eliminados nas fezes durante a doença aguda. 
☼ Antes do início da doença clínica, o HEV do RNAe virions de HEV podem 
ser detectados por PCR nas fezes e no soro. 
☼ As primeiras manifestações de elevação das aminotransferases séricas, 
doença clínica e elevação dos títulos de IgM antiHEV são praticamente 
simultâneas. 
☼ Os sintomas cedem em 2 a 4 semanas, e nesse período a IgM é substituída 
por anticorpos persistentes de IgG anti-HEV. 
☼ Geralmente, se cura por conta própria em quatro a seis semanas. O 
tratamento se concentra em cuidados médicos e paliativos, reidratação e 
repouso. 
Doenças Colestáticas 
☼ A bile tem duas funções principais: 
▪ Emulsificação da gordura alimentar na luz intestinal pela ação 
detergente dos sais biliares; 
▪ Eliminação de bilirrubina, excesso de colesterol, xenobióticos e outros 
produtos residuais que não são suficientemente hidrossolúveis para que 
sejam excretados na urina. 
☼ A icterícia ocorre quando há superprodução de bilirrubina, hepatite, ou 
obstrução do fluxo da bile, alterando o equilíbrio entre a produção e 
eliminação de bilirrubina. 
☼ O metabolismo da bilirrubina pelo fígado consiste em quatro eventos 
separados, mas inter-relacionados: a absorção da circulação; o 
armazenamento intracelular; a conjugação com ácido glicurônico e a 
excreção biliar. 
 
Fisiopatologia da Icterícia 
☼ Tanto a bilirrubina não conjugada quantoa bilirrubina conjugada 
(glicuronídeos de bilirrubina) podem sofrer acúmulo sistêmico. 
☼ Existem duas diferenças fisiopatológicas importantes entre as duas formas 
de bilirrubina: 
▪ A bilirrubina não conjugada é praticamente insolúvel em água em pH 
fisiológico e existe na forma de complexos estáveis com albumina sérica. 
Essa forma não pode ser excretada na urina, mesmo que os níveis 
sanguíneos estejam elevados. Normalmente, uma quantidade muito 
pequena de bilirrubina não conjugada está presente como um ânion 
livre de albumina no plasma. Essa fração de bilirrubina não ligada 
pode se difundir para os tecidos, particularmente o cérebro em 
lactentes, e produzir lesão tóxica. A fração plasmática não ligada 
pode aumentar na doença hemolítica severa ou quando medicamentos 
deslocam a bilirrubina da albumina. Consequentemente, a doença 
hemolítica do recém-nascido (eritroblastose fetal) pode levar ao 
acúmulo de bilirrubina não conjugada no cérebro, o que pode causar 
uma lesão neurológica grave, conhecida como kernicterus; 
▪ Em contraste, a bilirrubina conjugada é hidrossolúvel, atóxica e está 
ligada apenas frouxamente à albumina. Em virtude de sua solubilidade 
e fraca associação com a albumina, o excesso de bilirrubina 
conjugada no plasma pode ser excretado na urina. 
☼ A icterícia torna-se evidente quando os níveis séricos de bilirrubina 
aumentam acima de 2 a 2,5 mg/dL; níveis de até 30 a 40 mg/dL podem 
ocorrer com uma doença severa. 
☼ Causas de Icterícia 
Hiperbilirrubinemia não conjugada Produção excessiva de bilirrubina 
• Anemias hemolíticas 
• Reabsorção de sangue de hemorragia 
interna (p. ex., sangramento do trato 
alimentar, hematomas) 
• Eritropoiese ineficaz (p. ex., anemia 
perniciosa, talassemia) 
Redução da captação hepática 
• Interferência de fármacos com os sistemas de 
transportes das membranas 
• Alguns casos de síndrome de Gilbert 
Alteração na conjugação de bilirrubina 
• Icterícia fisiológica do recém-nascido 
(atividade diminuída de UGT1A1, diminuição 
da excreção) 
• Icterícia do leite materno (ß-glicuronidases 
no leite) 
• Deficiência genética da atividade de 
UGT1A1 (síndrome de Crigler-Najjar tipos I e 
II) 
• Síndrome de Gilbert 
• Doença hepatocelular difusa (p. ex., hepatite 
viral ou induzida por fármaco, cirrose) 
Hiperbilirrubinemia Conjugada • Deficiência de transportadores da 
membrana canalicular (síndrome de Dubin-
Johnson, síndrome de Rotor) 
• Alteração no fluxo biliar por obstrução ou 
colangiopatias autoimunes 
• UGT1A1, família da uridina difosfato-
glucuronil-transferase, peptídio A1 
 
Colestase 
☼ A colestase é causada por defeitos na formação de bile e no fluxo biliar, 
originando o acúmulo de pigmento biliar no parênquima hepático. Ela pode 
ser causada pela obstrução extra-hepática ou intra-hepática dos canais 
biliares, ou por defeitos na secreção biliar dos hepatócitos. 
☼ Os pacientes podem apresentar icterícia, prurido, xantomas cutâneos 
(acúmulo focal de colesterol) ou sintomas relacionados à má absorção 
intestinal, incluindo deficiências nutricionais das vitaminas lipossolúveis A, D ou 
K. 
☼ Um achado laboratorial característico é a elevação dos níveis séricos de 
fosfatase alcalina e γ-glutamil transpeptidase (GGT), enzimas presentes nas 
membranas apicais (canaliculares) de hepatócitos e células epiteliais do 
ducto biliar. 
☼ Os aspectos morfológicos da colestase dependem de sua severidade, 
duração e causa subjacente. Uma característica comum, tanto à colestase 
obstrutiva quanto à não obstrutiva, é o acúmulo de pigmento biliar no interior 
do parênquima hepático. 
☼ Tampões verde-acastanhados alongados de bile são visíveis nos 
canalículos biliares dilatados 
☼ A ruptura dos canalículos leva ao extravasamento de bile, que é 
rapidamente fagocitada pelas células de Kupffer. 
☼ Gotículas de pigmento biliar também se acumulam nos hepatócitos, que 
podem assumir uma aparência fina, espumosa, conhecida como 
“degeneração plumosa”.

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