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Aluno: Matrícula: Disciplina: Alfabetização 1 Curso: Licenciatura em Pedagogia Polo: RIBEIRO, Darcy (1996). O processo civilizatório. São Paulo, Cia. das Letras. Pp. 1-6 Povos Germinais “O processo civilizatório, acionado pela revolução tecnológica que possibilitou a navegação oceânica, transfigurou as nações ibéricas, estruturando-as como impérios mercantis salvacionistas.” (p.1) “(…) as teorias explicativas da história mundial não oferecem categorias teóricas capazes de explicar seja o poderio singular que alcançou a civilização Árabe por mais de um milênio de esplendor, seja a expansão ibérica, que criou a primeira civilização universal. Essa carência é que nos obrigou (...) a propor, com respeito ao mundo árabe, a categoria de império despótico salvacionista, enfatizando o caráter atípico de seu salvacionismo, que nunca quis converter ninguém. A certa altura, (...) entram em obsolescência e se feudalizam, abrindo espaço para um novo gênero de salvacionismo.” (p.1) “Os iberos, num primeiro movimento, se livraram da secular ocupação árabe e expulsaram seu contingente judeu, (…) através de um poder centralizado que não deixava espaço para qualquer autonomia feudal ou qualquer monopólio comercial.” (p.1) “Num segundo movimento, se expandiram pelos mares, lançando-se em guerras de conquista, de saqueio e de evangelização o sobre os povos da África, da Ásia e, principalmente, das Américas. Estabeleceram, assim, os fundamentos do primeiro sistema econômico mundial, interrompendo o desenvolvimento autônomo das grandes civilizações americanas.” (p.1) “Ao mesmo tempo, se plasmam a si mesmas como novas formações socioeconômicas e como novas configurações histórico-culturais, que cobrem áreas e subjugam populações infinitamente maiores que a européia (Ribeiro 1970).” (p.1) “É no curso dessa autotransformação que as populações indígenas das Américas, do Brasil inclusive, se vêem conscritas, a seu pesar, para as tarefas da civilização nascente. Viabilizando-a na base dos saberes indígenas, que permitiram a adaptação do europeu em outras latitudes, e provendo largamente a força de trabalho que as inseriu no mercado mundial em formação.” (p.1) “(…) a Alemanha, a França e a Itália, tão realizadas e plenas como ramos da civilização ocidental, não foram germinais. Fechadas em si, feudalizadas, ocupadas em dissensões com suas variantes internas, elas não se organizaram como Estados nacionais nem exerceram papel seminal.” (p.2) “Os ingleses se expandiram como operosos granjeiros puritanos ou como uma burguesia industrial e negocista, que calculava bem cada um dos seus lances. Empenhados em outro gênero de colonização, sua tarefa era a de transplantar sua paisagem mundo afora, recriando pequenas lnglaterras, desatentos ou indiferentes ao que havia aonde chegaram.” (p.2) “Os iberos, ao contrário, se lançaram à aventura no além-mar, abrindo novos mundos, atiçados pelo fervor mais fanático, pela violência mais desenfreada, em busca de riquezas a saquear ou de fazer produzir pela escravaria. (…). Desembarcavam sempre desabusados, acesos e atentos aos mundos novos, querendo fluí-los, recriá-los, convertê-los e mesclar-se racialmente com eles. Multiplicaram-se, em consequência, prodigiosamente, fecundando ventres nativos e criando novos gêneros humanos.” (p.2) “(…) a causa primeira da expansão ultramarina, e portanto dos descobrimentos, fora a precoce unificação nacional de Portugal e da Espanha, movidos por toda uma revolução tecnológica que lhes deu acesso ao mundo inteiro com suas naus armadas, gestando uma nova civilização.” (p.2) “Surgem, assim, entidades capazes de grandes empresas, como os descobrimentos e o enriquecimento aurido no além-mar, bem como sua implantação em império com hegemonia sobre a América, a Ásia e a África. Seu poderio cresce tanto que a certa altura a Espanha se propõe exercer sua soberania também sobre a Europa. Portugal se vê compelido a aliar-se à Inglaterra, para manter sua independência.” (p.2) (…) a Ibéria se debilita tanto, que acaba por sucumbir como cabeça do Império mundial sonhado tantas vezes. Sucumbe, porém, é lá nos conflitos com seus pares. Cá, nos novos mundos, seus sêmens continuam fecundando prodigiosamente a mestiçagem americana; sua língua e sua cultura prosseguem expandindo-se.” (p.2) A Inglaterra, (…) acaba por apossar-se da outra metade das Américas, sobre a qual se expandira como uma segunda macroetnia imensamente homogênea e neobritânica. (p.3) “No Brasil, de índios e negros, a obra colonial de Portugal foi também radical. […]. Seu produto real foi um povo-nação, aqui plasmado principalmente pela mestiçagem, que se multiplica prodigiosamente como uma morena humanidade em flor, à espera do seu destino.” (p.3) “No afã de gastar gentes e matas, bichos e coisas para lucrar, acabam com as florestas mais portentosas da terra. Desmontam morrarias incomensuráveis, na busca de minerais.” (p.3) “[…] a classe dirigente, permaneceu igual a si mesma, exercendo sua interminável hegemonia. Senhorios velhos se sucedem em senhorios novos, super-homogêneos e solidários entre si, numa férrea união superarmada e a tudo predisposta para manter o povo gemendo e produzindo” (p.3) “Hoje, seu desígnio é forçar-nos à marginalidade na civilização que está emergindo.” (p.3) Atualização Histórica “Em contraste com as etnias tribais que sobreviveram algum tempo a seu lado, a sociedade colonial nascente, bizarra e precária, era e atuava como um rebento ultramarino da civilização européia, em sua versão portuguesa. (...) era já uma sociedade bipartida em uma condição rural e outra urbana, estratificada em classes, servida por uma cultura erudita e letrada, e integrada na economia de âmbito internacional que a navegação possibilitara.” (p.3) “Essa posição evolutiva mais alta não representava, obviamente, uma ascensão das sociedades indígenas originais (…). Era uma simples projeção dos avanços civilizatórios alcançados pelos europeus” (p.3) “Estamos diante do resultado de um processo civilizatório que, interrompendo a linha evolutiva prévia das populações indígenas brasileiras, depois de subjugá-las, recruta seus remanescentes como mão-de-obra servil de uma nova sociedade (…) esse passo se dá por incorporação ou atualização histórica que supõe a perda da autonomia étnica dos núcleos engajados, sua dominação e transfiguração. (p.4) “Tais bases se definiriam com claridade com a implantação dos primeiros engenhos açucareiros que, vinculando os antigos núcleos extrativistas ao mercado mundial, viabilizava sua existência na condição socioeconômica de um "proletariado externo", estruturado como uma colônia mercantil-escravista da metrópole portuguesa” (p.4) No plano adaptativo (…) se estabeleceram nas seguintes bases: (p.4) - a incorporação da tecnologia européia (…) , com uso de instrumentos de metal e de múltiplos dispositivos mecânicos; - a navegação transoceânica que integrava os novos mundos em uma economia mundial (…) - o estabelecimento do engenho de cana - a introdução do gado - a adoção e difusão de novas espécies de plantas cultiváveis, - tecnologia portuguesa de produção de tijolos e telhas, sapatos e chapéus, sabão, cachaça, rodas de carros, pontes e barcos etc No plano associativo quer dizer, no que concerne aos modos de organização da vida social e econômica (…) (p.4) - substituição da solidariedade elementar fundada no parentesco - • introdução da escravatura indígena, logo substituída pelo tráfico de escravos africanos, que permitiu aos setores mais dinâmicos da economia prescindir da população original no recrutamento de mão-de-obra; - integração de todos os núcleos locais em uma estrutura sócio-política única, que teria como classe dominante um patronato de empresas e uma elite patrícia] dirigente, cujas funções principais eram tornar viável e lucrativa (…) - a empresa colonial e defendê-la da insurgência dos escravos, dos ataques indígenas e das invasões externas; - disponibilidade de capitais financeiros para custear a implantação das empresasNo plano ideológico (…): (p.5) - a língua portuguesa, que se difunde lentamente, século após século, até converter-se no veículo único de comunicação das comunidades brasileiras entre si e delas com a metrópole; - uma Igreja oficial, associada a um Estado salvacionista, que depois de intermediar a submissão dos núcleos indígenas através da catequese impõe um catolicismo de corte messiânico e exerce um rigoroso controle sobre a vida intelectual da colônia, para impedir a difusão de qualquer outra ideologia e até mesmo do saber científico; (p.6) “Aquelas inovações tecnológicas, somadas às referidas formas mais avançadas de ordenação social e a esses instrumentos ideológicos de controle e expressão proporcionaram as bases sobre as quais se edificou a sociedade e a cultura brasileira como uma implantação colonial européia.” (p.6) “Isso explica a ausência de uma classe dominante nativa.” (p.6) “Com base nessa comunidade atípica e em seu acervo sociocultural, as novas entidades puderam enfrentar prontamente dois desafios cruciais. Um foi aniquilar os grupos indígenas (…). Outro foi manter a regência colonial portuguesa sobre os núcleos neobrasileiros (…).” (p.6)