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EstA-ticafotografiamoda-Oliveira-2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DA MÍDIA
LARISSA MARINHO DE OLIVEIRA
A ESTÉTICA DA FOTOGRAFIA DE MODA:
UMA ANÁLISE DA LINGUAGEM FOTOGRÁFICA
NA REVISTA NUMÉRO FRANCE
NATAL – RN
2018
LARISSA MARINHO DE OLIVEIRA
A ESTÉTICA DA FOTOGRAFIA DE MODA:
UMA ANÁLISE DA LINGUAGEM FOTOGRÁFICA
NA REVISTA NUMÉRO FRANCE
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Estudos da Mídia do
Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes
da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, como requisito parcial à obtenção do
título de mestre em Estudos da Mídia. Área de
Concentração: Práticas sociais.
Orientador: Prof. Dr. Daniel Rodrigo
Meirinho de Souza
NATAL – RN
2018
Oliveira, Larissa Marinho de.
 A estética da fotografia de moda: uma análise da linguagem
fotográfica na revista Numéro France / Larissa Marinho de
Oliveira. - 2018.
 98f.: il.
 Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande
do Norte. Centro de Ciência Humanas, Letras e Artes. Pós-
graduação em Estudos da Mídia. Natal, RN, 2018.
 Orientador: Prof. Dr. Daniel Rodrigo Meirinho de Souza.
 1. Fotografia - Dissertação. 2. Moda - Dissertação. 3.
Estética - Dissertação. 4. Linguagem - Dissertação. 5. Revista -
Dissertação. I. Souza, Daniel Rodrigo Meirinho de. II. Título.
RN/UF/BS-CCHLA CDU 77
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes -
CCHLA
Elaborado por Ana Luísa Lincka de Sousa - CRB-CRB-15/748
LARISSA MARINHO DE OLIVEIRA
A ESTÉTICA DA FOTOGRAFIA DE MODA:
UMA ANÁLISE DA LINGUAGEM FOTOGRÁFICA
NA REVISTA NUMÉRO FRANCE
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Estudos da Mídia do
Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes
da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, como requisito parcial à obtenção do
título de mestre em Estudos da Mídia. Área de
Concentração: Práticas sociais.
Aprovada em:
BANCA EXAMINADORA
Prof. Dr. Daniel Rodrigo Meirinho de Souza (Orientador)
Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN
Profa. Dra. Maria das Graças Pinto Coelho
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Prof. Dr. Osmar Gonçalves dos Reis Filho
Universidade Federal do Ceará - UFC
RESUMO
A fotografia de moda tem tido um papel importante na sociedade moderna, portanto torna-se
cada vez mais relevante a compreensão sobre a sua forma de produção. O presente trabalho visa
identificar e analisar as linguagens fotográficas que mais estão sendo utilizadas pelos fotógrafos
de moda da atualidade, mais especificamente dentro da revista Numéro France – publicação esta
que se dedica a falar sobre moda, arte e luxo com ênfase na imprensa alternativa. A pesquisa
objetiva utilizar a análise de conteúdo como base para a compreensão da produção desta plástica
fotográfica, identificando a sua estrutura por meio de definições de equipamentos e retoques,
além da composição cenográfica e temática. Como objeto empírico, foram utilizadas 6 edições
da revista – totalizando 39 editoriais de moda e 464 fotografias no total. As fotografias serão
analisadas, interpretadas e organizadas por meio de categorias objetivas (técnicas fotográficas) e
subjetivas (elementos estéticos), utilizando Martine Joly, Laurence Bardin, Donis A. Dondis e
Arlindo Machado como referenciais teóricos.
Palavras-chave: Fotografia; Moda; Estética; Linguagem; Revista.
ABSTRACT
Fashion photography has played an important role in the modern society, so it becomes incre-
asingly relevant to understand the way it is produced. The present work aims to identify and
analyze the photographic languages that are being used by fashion photographers in the present
time, more specifically in the magazine Numéro France - a publication dedicated to talk about
fashion, art, and luxury with emphasis in the alternative press. The research aims to use content
analysis as a basis for understanding the production of this photographic aesthetics, identifying
its structure through definitions of equipment and retouching, as well as the scenographic and
theme compositions. As an empirical object, 12 editions of the magazine were used - total
number of publications. From these magazines, an editorial of each edition was selected, totaling
12 fashion editorials, with a final number of 30 images. The photographs will be analyzed,
interpreted, and organized through objective categories (photographic techniques) and subjective
(aesthetics elements), using Martine Joly, Laurence Bardin and Donis A. Dondis as theoretical
references.
Keywords: Photography; Fashion, Aesthetics; Language; Magazine.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 – Condessa Virgínia Oldoini por Adolphe Braun, c. 1857-1859. . . . . . . . . 35
Figura 2 – Condessa Virgínia Oldoini por Adolphe Braun, c. 1857-1859. . . . . . . . . 35
Figura 3 – Foto por Man Ray para Vogue Itália 1926 . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43
Figura 4 – Foto por Man Ray para Vogue Itália 1937 . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43
Figura 5 – Foto por Richard Avedon para Harper’s Bazaar 1948 . . . . . . . . . . . . . 44
Figura 6 – Foto por Richard Avedon para Harper’s Bazaar 1950 . . . . . . . . . . . . . 45
Figura 7 – Foto por David LaChapelle para Vogue 2005 . . . . . . . . . . . . . . . . . 46
Figura 8 – Foto por David LaChapelle para Vogue 2001 . . . . . . . . . . . . . . . . . 46
Figura 9 – Foto por Carin Backoff para Love Magazine - 18 Ed. . . . . . . . . . . . . 47
Figura 10 – Foto por Carin Backoff para Love Magazine - 19 Ed. . . . . . . . . . . . . 48
Figura 11 – Foto por Elizaveta Porodina em editorial "Mirrorworld". . . . . . . . . . . . 49
Figura 12 – Foto por Elizaveta Porodina em editorial "The girl with the pearl". . . . . . 49
Figura 13 – Foto por Nhu Xuan Hua em editorial "Zephyr et Flore". . . . . . . . . . . . 50
Figura 14 – Foto por Nhu Xuan Hua em editorial "You and me, the fish and the moon". . 50
Figura 15 – Revista Numéro France - Capa da Edição 1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63
Figura 16 – Revista Numéro Chine - Capa da Edição 1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64
Figura 17 – Revista Numéro Russia - Capa da Edição 1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65
Figura 18 – Revista Numéro Thailand - Capa da Edição 1 . . . . . . . . . . . . . . . . 66
Figura 19 – Revista Numéro Tokyo - Capa da Edição 1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67
Figura 20 – Revista Numéro Homme - Capa da Edição 1 . . . . . . . . . . . . . . . . . 68
Figura 21 – Negras - Foto por Txema Yest - Edição 183 . . . . . . . . . . . . . . . . . 71
Figura 22 – Poses abstratas - Foto por Alice Rosati - Edição 184 . . . . . . . . . . . . . 72
Figura 23 – Nu em moda - Foto por Greg Kadel - Edição 183 . . . . . . . . . . . . . . . 74
Figura 24 – Colagem - Foto por Amanda Charchian - Edição 186 . . . . . . . . . . . . 75
Figura 25 – Orientação em foto - Foto por Anthony Mauler - Edição 184 . . . . . . . . 76
Figura 26 – Flores - Foto por Richard Avedon - Edição 182 . . . . . . . . . . . . . . . . 78
Figura 27 – Texturas - Foto por Markn - Edição 191 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79
Figura 28 – Animais - Foto por Txema Yest - Edição 184 . . . . . . . . . . . . . . . . . 80
Figura 29 – Água - Foto por Katja Mayer - Edição 187 . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81
Figura 30 – Fotos de respiro - Foto por Mauro Mongiello - Edição 187 . . . . . . . . . . 82
Figura 31 – Resumo da Linguagem Fotográfica da moda na revista Numéro France –
Grotesco . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 86
Figura 32 – Categoria de análise subjetiva: Modelos - Negras . . . . . . . . . . . . . . 96
Figura 33 – Categoria de análise subjetiva: Modelos - Nu em moda . . . . . . . . . . . 96
Figura 34 – Categoria de análise subjetiva: Modelos - Poses abstratas . . . . . . . . . . 96Figura 35 – Categoria de análise subjetiva: Paginação - Colagem . . . . . . . . . . . . . 97
Figura 36 – Categoria de análise subjetiva: Paginação - Orientação da imagem . . . . . 97
Figura 37 – Categoria de análise subjetiva: Objetos cênicos - Flores . . . . . . . . . . . 97
Figura 38 – Categoria de análise subjetiva: Objetos cênicos - Água . . . . . . . . . . . . 98
Figura 39 – Categoria de análise subjetiva: Objetos cênicos - Textura . . . . . . . . . . 98
Figura 40 – Categoria de análise subjetiva: Objetos cênicos - Animais . . . . . . . . . . 98
Figura 41 – Categoria de análise subjetiva: Objetos cênicos - Fotos de respiro . . . . . . 99
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Significantes plásticos (JOLY, 2012, p. 103). . . . . . . . . . . . . . . . . . 56
Tabela 2 – Categorias subjetivas: elementos estéticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59
Tabela 3 – Ensaios fotográficos separados por categorias subjetivas – quadro total . . . 83
Tabela 4 – Ensaios fotográficos separados por categorias subjetivas – quadro reduzido . 84
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
2 A FOTOGRAFIA E O FOTÓGRAFO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
2.1 O FOTÓGRAFO COMO FILTRO CULTURAL . . . . . . . . . . . . . . . 17
2.2 A FOTOGRAFIA NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA . . . . . . . . . 21
3 A MODA NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA . . . . . . . . . . . . 23
3.1 A HISTÓRIA DA MODA E A EVOLUÇÃO DO VESTUÁRIO . . . . . . . 23
3.1.1 A moda como expressão individual . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24
3.2 O SURGIMENTO DAS REVISTAS DE MODA . . . . . . . . . . . . . . . 26
4 A FOTOGRAFIA DE MODA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31
4.1 A ESTÉTICA DA FOTOGRAFIA DE MODA . . . . . . . . . . . . . . . . 34
4.1.1 Os editoriais de moda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
4.2 OS FOTÓGRAFOS DE MODA DA MODERNIDADE E DA PÓS-MODERNIDADE:
QUEM FAZ A FOTOGRAFIA DE MODA? . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
4.2.1 Man Ray . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42
4.2.2 Richard Avedon . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44
4.2.3 David LaChapelle . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44
4.2.4 Carin Backoff . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46
4.2.5 Elizaveta Porodina . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
4.2.6 Nhu Xuan Hua . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48
5 CATEGORIAS COMO METODOLOGIA PARA AS ANÁLISES . . . . 52
5.1 A CONSTRUÇÃO E A LEITURA DAS IMAGENS . . . . . . . . . . . . . 52
5.2 DEFINIÇÃO DAS CATEGORIAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57
5.2.1 Categorias subjetivas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58
5.3 O CORPUS DA PESQUISA: A REVISTA NUMÉRO FRANCE . . . . . . 58
5.3.1 A estética editorial da revista Numéro France . . . . . . . . . . . . . . . 60
6 ANÁLISE DAS LINGUAGENS FOTOGRÁFICAS DA MODA . . . . . 62
6.1 SOBRE FOTOGRAFIA E A REVISTA NUMÉRO FRANCE . . . . . . . . 62
6.2 AS CATEGORIAS SUBJETIVAS E A CONTEXTUALIZAÇÃO TEÓRICA 63
6.2.1 Modelos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69
6.2.1.1 Negras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70
6.2.1.2 Poses abstratas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71
6.2.1.3 Nu em moda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73
6.2.2 Paginação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73
6.2.2.1 Colagem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74
6.2.2.2 Orientação em foto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75
6.2.3 Objetos cênicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76
6.2.3.1 Flores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77
6.2.3.2 Texturas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77
6.2.3.3 Animais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79
6.2.3.4 Água . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80
6.2.3.5 Fotos de respiro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81
6.3 A LINGUAGEM FOTOGRÁFICA PUBLICADA NA REVISTA NUMÉRO
FRANCE ENTRE 2017 E 2018 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82
6.4 A ESTÉTICA DO ESTRANHO E DO GROTESCO NAS PÁGINAS DA
REVISTA NUMÉRO FRANCE . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 85
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88
REFERÊNCIAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 92
ANEXOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95
ANEXO A – Fotografias de moda da revista Numéro France . . . . . . 96
A.1 FOTOGRAFIAS DAS CATEGORIAS SUBJETIVAS . . . . . . . . . . . . 96
11
1 INTRODUÇÃO
A fotografia de moda tem feito parte do cotidiano da sociedade moderna durante
as últimas décadas. Entretanto, pouco ainda se sabe sobre ela: como ela funciona, quais as
tendências que ela segue e como ela se estrutura nesse mercado da moda. Como fotógrafa
profissional, o intuito desta pesquisa parte de uma curiosidade pessoal: quais são as tendências
estéticas utilizadas pelos fotógrafos de moda da atualidade?
A fotografia surgiu em meio ao processo de transformação social e econômica
advinda da Revolução Industrial e, de acordo com Kossoy (2014, p. 30), "o mundo tornou-se de
certa forma "familiar"após o advento da fotografia", gerando um conhecimento mais profundo e
detalhado das realidades que, até então, lhes eram desconhecidas. O mundo se tornou ilustrado e
portátil.
A fotografia tem feito parte da cultura da sociedade contemporânea desde o
início do século XIX. E, por mais que alguém tente negar, acabamos transferindo
o nosso interesse do real e do concreto para o mundo das imagens (FLUSSER,
1983 - não publicado).
A fotografia de moda tem, desde a sua criação, o objetivo de induzir o consumo
e gerar desejo nas pessoas. Essa forte sensação de consumo foi ampliada, na verdade, com a
afirmação da moda na sociedade contemporânea; a moda em si pressupõe mudança, tendo em
vista que a manutenção de um estilo deixa de ser moda – que faz a roda do consumo girar a cada
nova coleção.
A moda tem feito parte da sociedade, de forma consciente e proposital, desde o
fim do período medieval ou início do Renascimento. Inicialmente tratava-se de uma forma de
divisão entre as classes sociais, sendo, posteriormente, elevada ao patamar de estilo de vida –
lifestyle –, como afirma Svendsen (2010). Se nos aprofundarmos no conceito, tudo é moda –
e a moda é definida pela classe alta da sociedade. "A roupa que vestem é roupa em moda; a
linguagem que usam em sua conversa é o estilo em moda; o porte e as maneiras que exibem são
o comportamento em moda"(SVENDSEN, 2010, p. 26).
Atualmente, o segmento feminino representa a maior fatia das publicações no mer-
cado de revistas (SCALZO, 2014). A união entre a fotografia e a moda tem sido responsável pelo
grande desenvolvimento desse mercado nos últimos 50 anos. Desde o surgimento das revistas
femininas até os dias atuais, as fotografias de moda têm influenciado gerações de mulheres pela
simples forma como tais imagens expõem o vestuário.
12
Bourdieu (1974) explicita em seu artigo Alta Costura e Alta Cultura, o preconceito
existente sobre a pesquisa científica no mundo da moda e fala da importância de valorizar a
dignidade de tal tema no mundo acadêmico também.
A moda é um assunto muito prestigiado na tradição sociológica e, ao mesmo
tempo, aparentemente um pouco frívolo. Um dos vieses através dos quais se
exercem as censuras sociais é precisamente esta hierarquia de objetos consi-
derados como dignos ou indignos de serem estudados (BOURDIEU, 1974,
p. 1).
Como foco deste trabalho, foi escolhidaa publicação internacional Numéro France1,
uma revista francesa com foco no luxo, na moda e na arte. Ela traz em sua essência a ideia
de imprensa alternativa, mas com uma visão inovadora do luxo para as pessoas que criam e
projetam as tendências, além de levar também uma comunicação diferenciada em decorrência
desse mix de culturas. A sua fotografia e a escrita gráfica trazem uma mistura única da moda,
beleza, arte e design, transformando uma revista de moda tradicional em um must-read para
quem quer fazer parte dessa pirâmide da moda. A revista conta com uma média de publicação
de 80 mil exemplares por mês, sem mencionar o site online que apresenta diferentes artigos e
fotografias sobre moda, arte, cultura, beleza, acessórios, estilo de vida, além de informações
atualizadas sobre vídeos e músicas que estão em alta no momento. A revista dispõe atualmente
de três outras publicações: a Numéro Japan2, a Numéro Germany3 e a Numéro Art4.
Para o recorte da pesquisa, foram utilizadas 6 edições da Numéro France – entre
março de 2017 e março de 2018. Destas publicações, foram selecionadas apenas as páginas da
editoria de moda da revista, totalizando 39 editoriais de moda e com um total de 464 imagens. O
foco do trabalho passar por encontrar um ponto comum entre os editoriais e traçar uma linha para
identificação da linguagem fotográfica que esteja sendo mais utilizada na atualidade. Para isto, as
imagens foram analisadas, interpretadas e organizadas por meio de categorias objetivas (técnicas
fotográficas) e subjetivas (elementos estéticos), utilizando Martine Joly (2012), Laurence Bardin
(2016) e Donis A. Dondis (2015) como referenciais teóricos para a análise de conteúdo das
imagens.
A pesquisa foi desenvolvida a partir de categorias subjetivas, com foco nos elementos
estéticos. Neste momento, foram definidas 10 categorias distintas entre as macrocategorias de
modelo, paginação e objetos cênicos. Como exemplos das subcategorias, separamos as imagens
1 Disponível em: https://www.lagardere-pub.com/marques/numero#calendar ; Acesso em: 27 Fev. 2018
2 Disponível em: https://numero.jp/
3 Disponível em: http://www.numeroberlin.de/
4 Disponível em: https://www.numero.com/en/art
13
em modelos negras, colagem, nu em fotografia, flores, texturas, água, entre outros. Após este
passo, as fotografias foram identificadas e definidas de acordo as subcategorias e contabilizadas
em uma tabela quantitativa. Desta forma foi possível identificar quantas fotografias continham
características estéticas e quais eram essas particularidades.
Esta pesquisa tem como objetivo geral investigar as linguagens fotográficas que
estão sendo utilizadas na revista de moda Numéro France. E, para chegar a esse ponto na
pesquisa, alguns objetivos específicos são respondidos em consequência da pesquisa; sendo estes
os objetivos específicos: 1. Analisar as formas de construção dessas imagens e as influências
estéticas produzidas e/ou sofridas por estas; 2. Categorizar os elementos estéticos que estão
sendo mediados pelos editoriais de moda; 3. Identificar a forma como as categorias subjetivas
são utilizadas nas fotos; 4. Apontar dados quantitativos sobre os estilos de composição das
imagens fotográficas na revista Numéro France.
A problemática gerada para esta pesquisa é a seguinte pergunta: qual é a linguagem
fotográfica atual mais utilizada na moda? Para identificar tal linguagem estética fotográfica,
a pesquisa foi realizada com o corpus sendo a revista de moda Numéro France, assim, com
os dados finais, foi possível definir o estilo e proporcionar uma ampla compreensão dessas
linguagens para o campo acadêmico com uma consciência da estética utilizada da produção
imagética de moda.
Com autores como Rahde e Cauduro (2005) e Entler (2009) foi possível identifi-
car características de composição das imagens contemporâneas e sua junção e separação da
arte. Além disso, Jameson (1985) surge para ajudar na compreensão da pós-modernidade e as
consequências dessa nova forma de economia nas imagens.
De acordo com Roland Barthes (2009, p. 41), "a imagem provoca fascinação". E é
na tentativa de compreender a produção dessas imagens que este trabalho se baseia: na tentativa
de decifrar as fotografias de moda, tanto pelo meio técnico quanto pelo meio estético. Sobre este
tema, Vilém Flusser (1998, p. 61) afirma que:
Para decifrar fotografias, não preciso de mergulhar até o fundo da intenção
codificadora, no fundo da cultura, da qual as fotografias, como qualquer símbolo,
são pontas de icebergs. Basta-me decifrar o processo codificador que se passa
durante o gesto fotográfico, no movimento do complexo "fotógrafo-aparelho".
[...] No entanto, o deciframento de fotografias é possível, porque, embora
inseparáveis, as intenções do fotógrafo e do aparelho podem ser distinguidas
(FLUSSER, 1998, p. 61).
Entre as hipóteses para a linguagem fotográfica mais recorrente, apresentamos como
14
possibilidades estéticas a serem analisadas os seguintes estilos: a estética boho5 – focada na
iluminação dourada e alaranjada, com temas florais, campestres e hippies, além de pouco
contraste e luz suave–; outra possibilidade é a estética film noir – inspirada nos filmes policiais
dos anos 50, apresentam contraste alto, fotos em preto e branco e sombras com grafismo–; a
estética romântica – influenciada pelos grandes pintores do romanticismo, com luzes suaves,
poses rígidas e modelos com aparência de realeza–; além da estética feminista – criada para se
opor ao androginismo, ela traz a feminilidade, tecidos e iluminação suaves, poses naturais e
pouco contraste.
Para a presente pesquisa, o trabalho foi dividido em seis capítulos. No primeiro,
intitulado A fotografia e o fotógrafo, é explicitada a história da fotografia, sua importância para a
sociedade moderna e a influência da indústria cultural no processo de democratização da imagem.
Em adição, uma rápida discussão foi feita sobre o futuro da sociedade imagética. Para esta parte
da pesquisa, utiliza-se os conceitos dos estudiosos da fotografia, da imagem e da linguagem
visual, como Aumont (2012), Barthes (2012), Dondis (2015), Kossoy (2014), Santaella e Nöth
(2015), Sontag (2004) e Sougez (2001); e para embasar a pesquisa nas áreas de comunicação e
mediação, traremos os autores Adorno e Horkheimer (1985), Benjamin (2013), Martín-Barbero
(2013), Santaella (1985) e Silverstone (2014).
No segundo capítulo, intitulado A moda na sociedade contemporânea, é explanada a
história da moda, a moda no contexto da cultura – como expressão individual– e no contexto do
consumo, além de falar sobre o surgimento das revistas de moda e a história e criação da revista
Numéro France. Para esta parte da pesquisa, utiliza-se autores da área da moda, como Barthes
(2009), Lipovetsky (2009), Svendsen (2010); além de estudiosos da comunicação com o foco
em revistas, como Scalzo (2014) e Ali (2009).
No terceiro capítulo, intitulado A fotografia de moda, é explicada a estética da
fotografia de moda, como ela é pensada e estruturada, é explicitada o que é um editorial de moda
e quais as diferenças entre ela e os outros estilos de fotografia de moda, quem são os fotógrafos
da área e será feita uma comparação entre os fotógrafos mais antigos e a nova geração focando na
estética old school e a atual. Para esta parte da pesquisa, utiliza-se autores da área da fotografia
de moda, como Marra (2008), Hall-Duncan (1979) e Wolfenson (2009).
No quarto capítulo, intitulado Categorias como metodologia para as análises, é
5 "Boho vem de Bohemian of Soho, movimento francês da década de 20, no qual um grupo de intelectuais
acreditava na simbiose da moda e da arte. Já na década de 60 e 70, o movimento tomou força no bairro de
Soho, em Londres. O estilo mistura o hippie chic – visual sessentista – com o boêmio e elementos étnicos".
Disponível em: http://gnt.globo.com/moda-e-beleza/materias/gypsy-folk-e-boho-entenda-as-diferencas-dos-
estilos.htm#galeria3045 = 4.Acessoem : 15.ago2018.15
explicitada a metodologia que será utilizada nesta pesquisa e serão definidas as categorias
objetivas e subjetivas. Para esta parte da pesquisa, utiliza-se autores da área da comunicação
com foco em análise de conteúdo, como Joly (2012), Bardin (2016), Dondis (2015) e Lencastre
e Chaves (2007).
No quinto capítulo, intitulado Análise das linguagens fotográficas da moda, é
explanado o corpus da pesquisa – a publicação de moda Numéro France – e são analisadas
as fotografias de moda selecionadas anteriormente com o intuito de comparar e categorizar
os elementos técnicos e criativos presentes nas imagens. A partir dessas análises, é possível
entender qual a tendência estética mais utilizada nas fotografias de moda na atualidade.
No capítulo final, são explicitadas as conclusões finais que resultaram desta pes-
quisa, mostrando os resultados alcançados e comparando criticamente conceitos-chave para esta
investigação.
16
2 A FOTOGRAFIA E O FOTÓGRAFO
Celulares, câmeras compactas, câmeras semiprofissionais e profissionais estão ao
alcance de uma grande parte da população na atualidade. A corrida tecnológica e científica
decorrente da Revolução Industrial, no século XIX, acarretou na criação da fotografia. Mas,
naquele momento, não se havia o conhecimento do tamanho da mudança que tal invenção iria
causar no mundo no século XXI. Em menos de 200 anos, o mundo se transformou em um
universo de imagens técnicas – criadas por aparelhos automatizados (FLUSSER, 2008). Agora,
o mundo é vivido e experimentado por meio de fotografias de todas as áreas do conhecimento.
De acordo com Boris Kossoy (2014, p. 29), "a fotografia, uma das invenções que
ocorre naquele contexto, teria papel fundamental enquanto possibilidade inovadora de informação
e conhecimento, instrumento de apoio à pesquisa nos diferentes campos da ciência e também
como forma de expressão artística".
Inicialmente, a fotografia apresentou uma semelhança alta com os quadros pintados à
mão, mas tudo isso foi consequência da tentativa de não-exclusão dessa nova ferramenta. Borges
(2011, p. 42) afirma em seus estudos que os "fotógrafos daquela época passaram a produzir
imagens fotográficas a partir de critérios que norteavam o universo da pintura. Dialogar com
a tradição era, talvez, o caminho mais seguro para validar a nova forma de olhar e dar a ver o
mundo". Entretanto, com o passar do tempo e com o uso desta nova tecnologia, os fotógrafos
foram criando os seus próprios estilos e linguagens.
Com a evolução técnica da fotografia, essa automaticidade dos aparelhos ajudou
também na divulgação do mundo por meio de imagens. Durante séculos a sociedade progrediu
com muita dificuldade em terrenos desconhecidos, pois, para se obter informações de um
novo lugar, era necessário se deslocar para aquele espaço. Mas a partir desta nova invenção
essas fronteiras se estreitaram e foi possível revelar culturas e hábitos, antes desconhecidos e
inacessíveis, à uma grande parcela da sociedade.
A expressão cultural dos povos exteriorizada através de seus costumes, habi-
tação, monumentos, mitos e religiões, fatos sociais e políticos passou a ser
gradativamente documentada pela câmera. O registro das paisagens urbana e
rural, a arquitetura das cidades, as obras de implantação das estradas de ferro, os
conflitos armados e as expedições científicas, a par dos convencionais retratos
de estúdios [...] são alguns dos temas solicitados aos fotógrafos do passado
(KOSSOY, 2014, p. 30).
A fotografia se tornou sinônimo de informação e de registro, ao comemorar momen-
tos familiares importantes, popularizando assim o uso da fotografia. A partir desse momento
17
de exploração dos interesses da sociedade em conhecer e representar o mundo, a população
começou a documentar e fotografar como modo de guardar a recordação de dado momento ou
local. Kossoy (2014), em seu livro Fotografia & História, afirma que:
Das excursões daguerreanas às primeiras tentativas de conquista do espaço
sideral, por onde quer que o homem tem se aventurado nos últimos 170 anos, a
câmara o tem acompanhado, comprovando sua trajetória, suas realizações. Seja
como meio de recordação e documentação da vida familiar, seja como meio de
informação e divulgação dos fatos, seja como forma de expressão artística, ou
mesmo enquanto instrumento de pesquisa científica, a fotografia tem feito parte
indissociável da experiência humana (KOSSOY, 2014, p. 171).
Isso tudo significou um avanço na sociedade documental, mas, ao mesmo tempo,
significou o nascimento da mentira imagética por meio dos retratos em estúdio. A criação
desta nova área da fotografia, possibilitou à população de classe social mais baixa se vestir e se
imaginar em um mundo mais luxuoso. E, com isto, surgiram os estúdios fotográficos.
Como pequenas fábricas de ilusão, seus estúdios atraiam homens e mulheres
que, individualmente ou em grupos, davam vazão às suas fantasias. Para tal,
os estúdios ofereciam uma variedade de apetrechos utilizados na montagem
de cenários de acordo com o desejo de autorrepresentação de seu público. [...]
eram disponibilizados aos clientes interessados em atribuir realidade a seus
desejos e sonhos (BORGES, 2011, p. 51).
A fotografia de moda se inspira muito nesse contexto da criação, da imaginação e da
ilusão para criar os seus conceitos. A câmera fotográfica se tornou, sim, um grande companheiro
do homem e um grande aliado da evolução. O fotógrafo define intencionalmente os planos, focos
e a iluminação que irão compor a cena fazendo disso a sua forma de produzir mundos, como
afirma Borges (2011, p. 92): "a partir de seus códigos culturais ele põe as lentes de suas máquinas
a registrar as paisagens e as interferências do homem na vida social e natural. Quando dispara
sua câmera, o fotógrafo cria e produz mundos". É a partir desses filtros culturais utilizados pelos
fotógrafos que vamos moldando a nossa percepção com relação à fotografia e ao mundo.
2.1 O FOTÓGRAFO COMO FILTRO CULTURAL
A maior parte das fotografias produzidas no mundo no segundo de um bater de
asas de uma borboleta têm algo em comum: foram mediadas pelo fotógrafo, ou seja, foram
criadas a partir de entendimentos técnicos, das experiências vividas ou do repertório visual desse
produtor. Para Kossoy (2014), toda a fotografia sofre a influência de um filtro cultural, pois
depende do fotógrafo para ser feita – não importando com qual equipamento ou qual tecnologia
seja utilizada.
18
Cabe observar, entretanto, que ambas as tecnologias fotográficas, de base
química como a de base eletrônica, produzem imagens que seguem sendo
obtidas por um sistema de representação visual desenhado segundo os cânones
da perspectiva renascentista e, em conformidade com o olhar e a mediação do
fotógrafo, o filtro cultural (KOSSOY, 2014, p. 23).
Em seu livro intitulado Sobre fotografia, a filósofa e crítica de arte Susan Sontag
(2004) pesquisou sobre os modos de produção e os usos da fotografia e ela concorda com Kossoy
(2014) ao afirmar que mesmo quando há o interesse em retratar o real, ainda há a questão da
escolha e do interesse do fotógrafo. Para que haja a produção de uma fotografia é necessária a
ação de um mediador que ditará as regras para tal produção.
Mesmo quando os fotógrafos estão muito mais preocupados em espelhar a
realidade, ainda são assediados por imperativos de gosto e de consciência. [...]
Ao decidir que aspecto deveria ter uma imagem, ao preferir uma exposição a
outra, os fotógrafos sempre impõem padrões a seus temas (SONTAG, 2004,
p. 16-17).
Essa imposição que Sontag (2004) explicita vem determinada pela bagagem cultural
presente em cada indivíduo. Se duas pessoas diferentes forem chamadas a fotografarem um
mesmo tema em um mesmo espaço e ao mesmo tempo, ainda assim serão entregues duas
fotografias totalmente diferentes, pois a realidade em que cada uma se encontra e o conhecimento
técnico e estético são diferentes. A forma com que cada uma aprende o mundo é diferente,
por isso que cada seré único – e cada fotografia é única também. "Assim como a palavra é a
expressão de uma ideia, de um pensamento, a fotografia – embora se trate de uma imagem técnica
produzida por meio de um sistema de representação visual – é também a expressão de um ponto
de vista, de uma visão particular do mundo de seu autor, o operador da câmera"(KOSSOY, 2014,
p. 54). Entretanto, essa visão de seres únicos com experiências únicas encontra um ponto de
divergência, o qual foi amplamente estudado por autores como Merleau-Ponty (1999) e Gebauer
e Wulf (2004).
Maurice Merleau-Ponty é um filósofo francês que aliou "à sua formação marxista a
adesão à fenomenologia de Edmund Husserl, como método de análise"(MARCONDES-FILHO,
2014, p. 337). Em sua obra Fenomenologia da percepção, Merleau-Ponty (1999) se dedicou a
entender como se constrói o conhecimento, por meio da percepção e a partir da corporeidade do
sujeito. Mas, logo ao iniciar o capítulo sobre Sentir, ele se questiona sobre como nós percebemos.
De acordo com Marcondes-Filho (2014, p. 375), a palavra percepção vem do latim
perpectio e é o ato de sentir o mundo através dos órgãos do sentido. Para Merleau-Ponty (1999),
cada pessoa é única, pois cada uma tem o seu próprio mundo formado por experiências únicas
19
vividas pelo seu corpo por meio dos órgãos do sentido. Ninguém vê algo como você vê e
ninguém sente algo como você sente, portanto, as experiências deixadas em cada indivíduo são
únicas e singulares.
O fotógrafo era visto como um observador agudo e isento – um escrivão, não
um poeta. Mas, como as pessoas logo descobriram que ninguém tira a mesma
foto da mesma coisa, a suposição de que as câmeras propiciam uma imagem
impessoal, objetiva, rendeu-se ao fato de que as fotos são indícios não só do
que existe, mas daquilo que um indivíduo vê; não apenas um registro mas uma
avaliação do mundo (SONTAG, 2004, p. 104-105).
A partir dos estudos da fenomenologia, o conceito de testemunho visual foi modifi-
cado, tendo que vista que não é possível determinar que algo é real – já que outra pessoa tem a
experiência de outra realidade. A verdade, para a fenomenologia, é o momento vivido em carne
e osso. Uma fotografia representa algo que aconteceu no passado e que não existe mais, mas só
existiu de fato para aquele que sentiu o "algo"ali representado.
Essas sensações e percepções só se transformam em conhecimento se forem incorpo-
rados, ou seja, se tornem parte do meu corpo. "Sem dúvida, o conhecimento me ensina que a
sensação não aconteceria sem uma adaptação de meu corpo"(MERLEAU-PONTY, 1999, p. 290)
O meu corpo é o meu ponto de vista sobre o mundo e o mundo é somente aquilo existe para o
homem. A percepção e o conhecimento só se efetivam a partir da individualidade das pessoas,
das experiências e vivências acumuladas e desse mundo cultural particular; por isso cada um
tem seu mundo singular.
Günter Gebauer e Christoph Wulf (2004) são estudiosos alemães da Filosofia e da
Antropologia com foco no conhecimento das pessoas em um mundo globalizado caracterizado
pela diversidade cultural. Em seu livro Mimese na cultura (2004), eles investigam como a
mimese e os processos miméticos foram entendidas em várias épocas e em vários contextos
diferentes no mundo. O conceito geral da mimese é que esta é uma ação inconsciente e que
ocorre em um nível corporal. Há uma apropriação da cultura por meio da mimese, que funciona
como uma "imitação"que não é perfeita, uma reelaboração das ideias/ações divulgadas por outros
sujeitos. Antes de haver uma simbolização – uma produção de sentido–, a gente mimetiza, pois
ela ocorre antes da cognição. Desta forma, os outros são parte do eu e eu sou parte dos outros –
os fotógrafos de moda se inspiram em arte e na própria fotografia de moda para a sua produção,
tudo acaba por se misturar, há uma mimese, mesmo que involuntária nos editoriais –; quase tudo
é mimese, só não o EU original.
O sujeito-agente sofre influências de outras pessoas com as quais ele entrou
em contato. Os outros possuem uma presença extraordinariamente efetiva no
20
mundo do sujeito na medida em que eles lhe fornecem imagens, exemplos,
modelos entre outras coisas. [...] Enquanto ele se constitui, ele é ao mesmo
tempo constituído pelos outros (GEBAUER; WULF, 2004, p. 118).
Internaliza-se a cultura por meio de experiências vividas e conhecimentos adquiridos,
por isso o corpo tem papel fundamental na mimese. "Os homens fazem do mundo o seu próprio
com a ajuda do corpo"(GEBAUER; WULF, 2004, p. 15)
Complementando o que Merleau-Ponty afirma sobre a questão da unicidade dos
mundos e que tudo isso ocorre de forma carnal e corporal, Gebauer e Wulf (2004, p. 118) afirmam
que "os outros são parte do eu. Por todo lugar existe tal relação: alguém age referindo-se a
um mundo já existente e construindo ele mesmo um mundo". Portanto, Gebauer e Wulf (2004)
explicitam que os mundos estão se juntando em consequência das influências que o sujeito afeta
e se deixa ser afetado pelo outro. O homem se utiliza das ideias do outro para representar no seu
mundo sua criação própria.
A realidade é algo construído, inacabado e turvo; cada um tem a sua própria realidade
e seu próprio mundo, pois depende totalmente de como o seu corpo reage a cada ideia/ação que
lhe é mostrado.
Levando em consideração a realidade dos fotógrafos contemporâneos da qual a
globalização faz com que as pessoas vejam milhares de imagens diariamente – aumentando a
quantidade de processos miméticos que sofremos e alterando as nossas percepções –, é difícil
limitar essa influência e essa "imitação"de outros fotógrafos de diferentes partes do mundo,
que participam de outras realidades e que têm as suas verdades individuais. O fotógrafo se
utiliza dessas imagens mentais para produzir imagens física, mas tudo isso numa relação de
causa e consequência da troca simbólica que ele realiza dos os objetos e sujeitos da sociedade
contemporânea. Mesmo com a mimese cultural, cada pessoa tem seu mundo individual, cada
fotógrafo tem a sua visão única e isso acarreta em imagens únicas também. Entretanto, não
podemos utilizar o fato as imagens serem únicas para usar como comprovante de uma realidade
passada, pois o que foi para mim pode ser não sido para você; por isso fotografias são verdades
individuais.
A importância do estudo da percepção e da mimese para esta pesquisa se baseia na
questão da bagagem cultural do fotógrafo. A fotografia de moda, assim como toda fotografia no
mundo, é baseada em temas, em experiências e em criatividade – muitas vezes as de fotografias
de moda que foram vistas pelos profissionais em outras publicações e, automaticamente, essas
imagens são gravadas no seu "álbum de inspirações"que será revisitada e reutilizada em outro
21
projeto editorial futuro. A partir disso, começa-se a identificar uma linha de produção de imagens,
uma estética fotográfica amplamente utilizada em um período de tempo – a moda da fotografia
de moda, a linguagem central mais utilizada naquela época, a estética que todos os fotógrafos
estão buscando – consciente ou inconscientemente.
2.2 A FOTOGRAFIA NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA
Essa sensação de absorver o mundo por meio de imagens veio como consequência
da grande produção e dispersão das imagens e o grande número de reproduções distribuídas pelo
mundo. A presente globalização faz com que a gente interprete a realidade por meio de imagens.
Uma sociedade capitalista requer uma cultura com base em imagens. Precisa
fornecer grande quantidade de entretenimento a fim de estimular o consumo
e anestesiar as férias de classe, de raça e de sexo. [...] As câmeras definem a
realidade de duas maneiras essenciais para o funcionamento de uma sociedade
industrial avançada: como um espetáculo (para as massas) e como um objeto
de vigilância (para os governantes) (SONTAG, 2004, p. 195).
Esta falta de indagação gera como consequência a alienação das pessoas e tudo
isso vindo do entretenimento e do consumo, provocando um grande cicloinfinito. A indústria
cultural se baseia nessa diversão para controlar os consumidores, que entendem esse ‘divertir-
se’ como ‘estar de acordo’. Na realidade atual, sabe-se que “o mundo inteiro é forçado a
passar pelo filtro da indústria cultural” (ADORNO; HORKHEIMER, 1985, P. 4). Então, tudo é
transformado em negócios e mercadorias, completamente baseado no capitalismo. E, com isto,
são só disponibilizadas duas opções: participar da indústria cultural e aceitar essa influência em
nossas vidas, ou nos omitir e ficar alheio a esta realidade contemporânea.
A democratização das imagens, mesmo com a diminuição do senso crítico por
parte da população, trouxe um sentimento de pertencimento. Mas, ao mesmo tempo, essa
popularização das fotografias faz com que sejam consumidas em um nível exorbitante e, mais
ainda, que se tenha que produzir essas imagens em velocidade ainda mais rápida para que haja
esse consumo.
A sociedade contemporânea tem passado por uma grande mudança na sua forma de
produzir e de ver/ler essas imagens. A quantidade de fotografias que são publicadas nas redes
sociais em apenas um dia ultrapassa a marca de fotografias que foram feitas nos primeiros 80
anos de criação da fotografia. Estima-se que durante a década de 1980 foram feitas 25 bilhões de
fotografias no mundo inteiro, enquanto somente no ano 2000 foram clicadas cerca de 85 bilhões
22
de fotografias6.
Este número só continua a crescer. No ano de 2015, cerca de 1 trilhão de fotografias
foram feitas7 – levando em consideração todas as fotografias feitas para Instagram, Facebook,
Snapchat e outras mídias sociais atuais. Desse total de 2015, 24 bilhões de selfies8 foram
carregadas dentro da plataforma Google. E, para o ano de 2017, a previsão é que esse número
continue subindo e atinja o número recorde de 1,2 trilhões de imagens registradas no mundo9.
É uma sociedade imersa em imagens e que, para ter um diferencial dessas outra milhares de
imagens, trazem o belo, o feio ou o estranho como destaque.
6 Disponível em: https://www.theglobeandmail.com/life/humanity-takes-millions-of-photos-every-day-why-are-
most-so-forgettable/article12754086/ . Acesso em: 18 Março 2018
7 Disponível em: http://mylio.com/true-stories/tech-today/one-trillion-photos-in-2015-2 . Acesso em: 14 Abril
2017.
8 Disponível em: http://http://www.dailymail.co.uk/sciencetech/article-3619679/What-vain-bunch-really-24-
billion-selfies-uploaded-Google-year.html . Acesso em: 14 Abril 2017.
9 Disponível em: http://mylio.com/true-stories/tech-today/how-many-digital-photos-will-be-taken-2017-repost .
Acesso em: 14 Abril 2017.
23
3 A MODA NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA
3.1 A HISTÓRIA DA MODA E A EVOLUÇÃO DO VESTUÁRIO
O vestuário tem feito parte da cultura humana há séculos, entretanto não é possível
afirmar que a moda estivesse em conexão com o vestuário nos primórdios da história. Dita-se
que não é possível falar da moda na Antiguidade dentro das sociedades grego e romana por eles
não terem autonomia e nem estética individual na escolha das roupas. Todas as classes sociais
usavam trajes semelhantes e não existia o impulso de se enfeitar. Os vikings já levavam com si a
vontade de colocar adornos em suas vestimentas como símbolo de posição social – mas ainda
não era considerado moda como conhecemos atualmente.
Estudiosos como Svendsen (2010) afirmam que a moda não faz parte da essência
humana como muitos podem pensar. Ela teve início em um ponto específico da história, no
final da Era Medieval com suas extravagâncias e suas rápidas mudanças. Mas a moda teve seu
momento de ascensão durante o Renascimento – entre os séculos XIV e XVI – em consequência
da expansão do capitalismo mercantil e da corrida do descobrimento de novas terras.
Nesta época é possível perceber que as constantes navegações, trazendo outro e
tecidos nobres de outras localidades, fizeram com que a nobreza se inspirasse em criar vestuá-
rios chamativos e autênticos como forma de diferenciação entre a alta sociedade e os novos
trabalhadores.
Só a partir do final da Idade Média é possível reconhecer a ordem própria
da moda, a moda como sistema, com suas metamorfoses incessantes, seus
movimentos bruscos e suas extravagâncias. A renovação das formas se torna
um valor mundano, a fantasia exibe seus artifícios e seus exageros na alta
sociedade, a inconstância em matéria de formas e ornamentações já não é
exceção mas regra permanente: a moda nasceu (LIPOVETSKY, 2009, p. 24).
Só se pode considerar a moda como moda – conceito da modernidade – quando
há mudança frequente. E foi durante o Renascimento que essas trocas de vestuários foram
observadas com alta constância.
Como foi mencionado, em geral se associa a origem da moda à emergência
do capitalismo mercantil no período medieval tardio. A Europa experimentava
então um desenvolvimento econômico considerável, e as mudanças econômi-
cas criaram a base para mudanças culturais relativamente rápidas. Foi nesse
momento que modificações na maneira como as pessoas se vestiam adquiriram
pela primeira vez uma lógica particular: deixaram de ser raras e aleatórias, pas-
sando a ser cultivadas por si mesmas. As formas básicas das roupas passaram a
mudar rapidamente, e os detalhes superficiais mais ainda. Os trajes começaram
também a se parecer com os modernos por serem adaptados ao indivíduo, e
24
o corte passou a ser modificado de quando em quando sem nenhuma razão
aparente exceto a própria mudança (SVENDSEN, 2010, p.14).
Em seu livro Moda: uma filosofia, Lars Svendsen (2010, p. 5) explicita que "no
século XV, a moda já era considerada tão importante na França que pediram a Carlos VII que
criasse um ministério só para ela."
Por volta de meados do século XV, cortes criativos, novas cores e texturas
começaram a emergir, com variações na amplitude nos ombros e no peito, no
comprimento total, no modelo de chapéus e sapatos e outras mudanças. Essa
tendência se tornou mais intensa, ganhando talvez sua forma mais extrema na
maneira, evidente no século XVI, como as roupas passaram a divergir cada vez
mais dos contornos reais do corpo. A mudança nas roupas tornou-se uma fonte
de prazer em si mesma. Sem dúvida durante séculos essa mudança consciente
de estilos foi acessível apenas a um grupo restrito, os ricos, mas pouco a pouco,
com a emergência da burguesia e o desejo concomitante de estar "na moda", foi
se espalhando (SVENDSEN, 2010, p.14).
A moda era um assunto frequente na Europa, em especial nas altas sociedade, pois o
modo de se vestir da realeza era o que ditava a estética daquela sociedade.
3.1.1 A moda como expressão individual
A moda foi considerada por estudiosos como um dos fenômenos de maior influência
na civilização ocidental. Compreender a moda é contribuir com o entendimento dos homens e
seus modos de pensar e agir. Ela é peça central e fundamental no mundo moderno e tem deixado,
desde o século XVIII, de ser apenas de interesse da elite e passado por uma democratização.
"Moda é assunto sério, não é frescura. Tem a ver com a vida das pessoas, sua
autoestima, imagem profissional e posição social; tem a ver também com cultura e com economia
– movimenta uma indústria enorme (ALI, 2009, p. 218).
A moda tem se tornado um fenômeno cada vez mais importante e essencial em nossa
vida. E não só como assunto da elite e das mulheres, mas da sociedade contemporânea como um
todo. "A moda é claramente vista como importante o suficiente para justificar esse generoso grau
de atenção – ou talvez, ao contrário, seja toda essa atenção que a torne importante."(SVENDSEN,
2010, p. 5). Cada vez mais as pessoas de baixa renda estão sendo incluídos no mundo da moda,
mesmo tendo consciência de que o consumo desta é feita por forma de gotejamento – com o
consumo das sobras da alta elite.
"Moda"é um termo notoriamente difícil de definir com precisão, e é extre-
mamente duvidoso que seja possível descobrir as condições necessárias e
suficientes para que possamos considerar, de forma embasada, que alguma
25
coisa está"na moda". De maneira geral, podemos distinguir duas categorias
principais em nossa compreensão do que é a moda: podemos afirmar que ela se
refere ao vestuário ou que é um mecanismo, uma lógica ou uma ideologia geral
que, entre outras coisas, se aplica à área do vestuário (SVENDSEN, 2010, p. 7).
Como afirma Lipovetsky (2009) em seu livro O império do efêmero, a moda é um
mecanismo social utilizado para gerar mudanças na vida coletiva por meio de mudanças em
breves intervalos de tempo.
Entretanto, nem tudo que significa mudança é necessariamente moda ou parte da
moda. A moda não precisa de fato introduzir um objeto novo; ela pode dizer respeito igualmente
ao que não se está usando, como quando se tornou moda não usar chapéu. Portanto, um outro
conceito da moda não diz respeito aos vestuários e, sim, a tudo o que é comumente utilizado pela
sociedade como, por exemplo, a moda das festas eletrônicas ou a moda da fotografia analógica
da Lomography. São ações e assunto que estão in ou out, que fazem parte de uma grande parcela
da realidade do ser humano e está diretamente relacionado aos gostos – e sempre em constante
mudança.
As pessoas consomem a moda em seu dia-a-dia e acabam por influenciar e afetar a
atitude em uma grande parcela da população na relação em como elas se veem e como elas veem
os outros. Por isso ela funciona como peça central para o entendimento do mundo. A identidade
está diretamente ligada à moda e ao consumo da moda.
As roupas são uma parte vital da construção social do eu. A identidade não é mais
fornecida apenas por uma tradição, é também algo que temos de escolher em virtude do fato
de sermos consumidores. A moda não diz respeito apenas à diferenciação de classes, como
afirmaram análises sociológicas clássicas de Veblen a Bourdieu, mas está relacionada à expressão
da nossa individualidade. O vestuário é parte do indivíduo, não algo externo à identidade pessoal.
[...] Todos nós temos de expressar de alguma maneira quem somos através de nossa aparência
visual. (SVENDSEN, 2010, p. 11-12).
A modernidade teve o seu rumo modificado depois do advento da moda, sendo
considerado um dos eventos mais decisivos da história mundial, de acordo com Svendsen (2010,
p. 15). Ela é considerada por ele como um divisor de águas, o qual é capaz de nos emancipar.
Em decorrência da moda e da sua constante mudança pela mudança, surgiu o conceito
de "novo", por ela ser movida por essa ânsia de inovar sempre e por ter essa obrigação de ser
novo.
Em princípio, um objeto em moda não precisa de nenhuma qualidade particular
além de ser novo. O princípio da moda é criar uma velocidade cada vez maior,
26
tornar um objeto supérfluo o mais rapidamente possível, para que um novo
tenha uma chance. [...] A moda é irracional no sentido de que busca a mudança
pela mudança, não para "aperfeiçoar"o objeto, tornando-o, por exemplo, mais
funcional (SVENDSEN, 2010, p. 18).
Essa alta velocidade da moda foi intensificada e valorizada pelas revistas de moda e
pelas publicações da área. O novo é visto como melhor e quem publica o novo primeiro está na
frente e acaba por comandar o rumo da moda.
3.2 O SURGIMENTO DAS REVISTAS DE MODA
A moda surge como ponto importante na sociedade e, com o passar das décadas,
ela migra para a mídia imprensa como suporte para a sua massificação e o seu consumo. Neste
momento, surgem as revistas segmentadas – sendo uma delas voltadas para o público feminino e
depois se caracterizando especificamente pelo tema da moda.
A palavra "revista"vem do inglês "review", que quer dizer, entre outras coisas,
"revista", "resenha"e "crítica literária". A palavra "review"era comum em várias revistas literárias
inglesas, que eram os modelos imitados em todo o mundo nos séculos 17 e 18. Daí a origem
da palavra "revista"na língua portuguesa. Entretanto, na Inglaterra, nos Estados Unidos e em
outros países de língua inglesa, revista é chamada de "magazine", que vem da palavra árabe
"al-mahazen", que significa "armazém"ou "depósito de mercadorias variadas". Isso porque,
diferentemente do livro que geralmente é monotemático, a revista apresenta uma variedade de
assuntos. De mesma origem é a palavra francesa "magazin", que, além de revista, significa "loja
de departamentos"(ALI, 2009, p. 19).
A primeira revista da qual se tem notícia foi publicada em 1663, na Alemanha, e
chamava-se Edificantes Discussões Mensais. Nesta época, as publicações tinham um caráter
científico, sendo assim monotemáticas e direcionadas à um público específico. As revistas
dedicadas às mulheres surgiram alguns anos depois, em 1693, sendo este primeiro periódico
intitulado The Ladies’ Mercury, mas durou apenas quatro semanas. Este periódico era feito de
uma folha frente e verso e nele continham informações sobre comportamento, casamento, amor,
afazeres domésticos, moda e humor.
Depois de algumas décadas, outras revistas como a Lady’s Magazine e a Journal des
Luxus und der Moden surgiram ao redor do mundo, provando a importância desse tipo de revista
especializada para o universo feminino.
Nas décadas de 1770 e 1780 apareceram as primeiras revistas de moda, como a
27
inglesa Lady’s Magazine (1770) e a alemã Journal des Luxus und der Moden
(1786). [...] Essas revistas sem dúvida serviram para aumentar a rapidez com
que a moda circulava, já que a informação sobre o que estava "in"e "out"era
difundida muito mais depressa e para mais pessoas do que antes (SVENDSEN,
2010, p. 14-15).
Além destas publicações, outras revistas francesas como a Les modes nouvelle, de
1785, e a Le journal des dames et des modes, de 1797, já utilizavam imagens de moda em seus
conteúdos.
Durante cinco décadas, a revista Godey’s Lady’s Book foi a maior revista feminina
dos Estados Unidos. Lançada em 1830, a revista publicava reproduções de artigos de revistas
francesas com o foco na arte, música, história, viagens, personalidades, culinária e outros temas
pertinentes à mulher na época. "Ele [Louis Godey] rompeu com a fórmula clássica das revistas
femininas de seu tempo ao introduzir matérias que refletiam o que as leitoras sentiam e pensavam,
e as encorajava a enviar suas histórias e poemas"(ALI, 2009, p. 321).
Seguindo o caminho da evolução, em novembro de 1867, a Harper’s Bazaar foi
criada pelos irmãos Harper – editores Norte-Americanos de livros e revistas – com o intuito de
ser uma revista feminina diferenciada. A revista foi inspirada na publicação alemã Der Bazar
após um dos irmãos Harper ter conhecido a revista em uma viagem à Europa. Sempre com foco
na qualidade gráfica, a revista foi lançada inicialmente com diversas ilustrações de moda, só
depois de algumas décadas sendo adicionada a fotografia de moda ao seu design gráfico.
Durante as primeiras décadas da revista, especialmente entre os anos de 1898 e
1912, a Bazaar 10 já publicou as primeiras fotografias de moda. Em 1933, Carmel Snow foi
escolhida como editora-chefe e elevou o nível das fotografias de moda da época – antes as
modelos posavam em estúdios fotográficos e no seu reinado, Carmel levou os ensaios para a
rua e deu para a revista um senso mais aventureiro. Durante essas três décadas, Snow trabalhou
juntamente com Diana Vreeland, que posteriormente se tornou editora de moda da revista.
Bazar liderou o mercado até o fim dos anos 1890, quando a editora dos irmãos
Harper foi à falência e a revista foi assumida pelo banqueiro J. P. Morgan, que
também perdeu muito dinheiro, até que, em 1913, foi comprada pelo grupo
Hearst, pertencente ao magnata William Randolph Hearst (ALI, 2009, p. 332).
Depois dessa mudança administrativa, a revista trouxe mais sofisticação às suas
páginas, passando a ditar tendência de moda e design e focada nas classes mais altas da sociedade.
10 Harper’s Bazaar - Wikipedia. Acesso em: 14 fev. 2018. Disponível em:
https://en.wikipedia.org/wiki/Harper%27s_Bazaar
28
Até hoje, mais de 150 anos depois, a Harper’s Bazaar ainda é uma das mais importantes
publicações de moda do mundo, juntamente com arevista Vogue.
Em seu livro intitulado Glamour, Vreeland (2011) teve o seu prefácio escrito pelo
estilista Marc Jacobs no qual ele afirma que a importância de Vreeland para a história da moda
no século XX é enorme. De acordo com Jacobs, Diana virou um símbolo por acreditar sempre
na mudança e na alegria da descoberta de algo novo, descartando o que era velho e enaltecendo
essa abordagem inovadora.
Ainda em seu livro, Vreeland (2011) afirma que nem o fato de trabalhar com
inúmeros fotógrafos de renome, como Richard Avedon, Cecil Beaton e Irving Penn a fizeram
aceitar só o que era bonito; ela sempre percebeu as fotografias de outra forma.
Você não faz ideia do que é trabalhar só com fotógrafos como eu fiz. Durante
todos esses anos lidando com fotógrafos de moda, minha reputação entre eles
era a de que não dava a mínima para as fotos – somente para as imagens. Nunca
me interessei apenas por uma boa foto. Gosto de ter uma perspectiva. Sem
perspectiva, não há imagem (VREELAND, 2011, p. 24).
Um dos fotógrafos com quem trabalhava, David Bailey, afirmou uma vez que o mais
importante para Vreeland era valorizar a roupa em detrimento de ter uma fotografia somente
bonita em que mal se podia ver a vestimenta.
Décadas depois, em 1892, surgiu a revista Vogue, presente na casa de milhares de
mulheres em todo o mundo até hoje. A publicação, desde a sua criação, foi focada no luxo e nos
prazeres da vida da alta elite de Nova York. Após a Vogue ter sido comprada pela Condé Nast,
em 1909, ela passou de ser uma revista semanal para ser mensal e este foi um grande passo que
impactou as revistas femininas de um modo geral. Com fotografias de alta qualidade e textos
refinados, a revista se transformou em uma elegante revista de moda, além de se transformar na
revista mais importante da Editora Condé Nast.
De acordo com Ali (2009), após a Segunda Guerra Mundial, surgiu na França a Elle,
revista focada em recuperar a feminilidade das moças que fora tirada delas durante os anos de
combate – e tudo isso com pouco dinheiro; o seu lema é "muito charme, com muito bom gosto e
pouco dinheiro". O casal Pierre Lazareff e Hélène Lazareff emigraram para os Estados Unidos
na época se 2a Guerra Mundial e Hélène trabalho na Harper’s Bazaar durante esse período. No
seu retorno à França, no pós-guerra, decidiu criar a revista pra trazer a alegria de volta à uma
Europa devastada. A consequência não poderia ter sido outra: é um sucesso absoluto até os dias
atuais.
29
Um pouco mais de uma década depois, Ali (2009) afirma em seu livro que nasceu no
Brasil a primeira revista focada somente em moda. A Manequim surge com o intuito de informar
tendências e publicar moldes para a produção de roupas – como forma de promover um diálogo
entre a indústria têxtil e as leitoras. Logo em seguida, em 1961, nasce a Claudia, trouxe uma
qualidade editorial até então desconhecida no Brasil – com fotografias bonitas, design gráfico
moderno e impressão de qualidade. Com a Claudia nasceu também a produção fotográfica
nacional de moda e beleza, fato marcante para as publicações, pois, até este ponto, todas as
fotografias de estilo eram importadas de revistas estrangeiras. Seu principal objetivo era ser a
amiga, a parceira da mulher casada da época, trazendo desde temas polêmicos até as novidades
de eletrodomésticos.
Em 1965, renasceu nos Estados Unidos a Cosmopolitan (no Brasil, lançada em
1973, é intitulada como Nova), com o foco nos problemas e anseios das jovens em busca da
independência, carreira e relacionamentos. Ali (2009) explica que esta foi a primeira revista
feita por mulheres que falam diretamente para as mulheres. O sucesso foi tão estrondoso que a
publicação existe até hoje, com 58 edições internacionais em 34 idiomas e presente em mais de
100 países 11.
A revista Setenta, publicada em 1970, foi um marco no design gráfico e na fotografia
de moda no Brasil. Mesmo só tendo durado por 9 edições, a revista deixou um legado na área
imagética das publicações impressas – revista esta que teve a própria Ali (2009) como diretora
da publicação.
Fechando o ciclo de criações de revistas femininas voltadas para a moda está a Vanity
Fair. Criada em 1983, a revista apresentou um desgin gráfico arrojado e contratou os fotógrafos
mais famosos da época para criarem suas imagens de moda – fotógrafos como Annie Leibovitz,
Bruce Weber e Mario Testino. A revista é uma das maiores do mundo e com mais sucesso até os
dias atuais.
Desde os seus primórdios, as revistas serviam para informar e educar grandes
parcelas da população que não tinham acesso aos livros ou outras fontes de informação. Cada
publicação tinha o seu público-alvo, mas com a modernização elas passaram de monotemáticas
para multitemáticas.
Com o aumento dos índices de escolarização, havia uma população alfabetizada
que queria ler e se instruir, mas não se interessava pela profundidade dos livros,
11 No dia 06 de Agosto de 2018, a Editora Abril anunciou ao público o encerramento das atividades para 10 revistas
do grupo, entre elas a Elle e a Cosmopolitan. Disponível em: https://pleno.news/economia/grupo-abril-demite-
500-jornalistas-e-cancela-producao-de-revistas.html . Acesso em: 10 Agosto 2018.
30
ainda vistos como instrumentos da elite e pouco acessíveis. Com o avanço
técnico das gráficas, as revistas se tornaram o meio ideal, reunindo vários
assuntos em um único lugar e trazendo belas imagens para ilustrá-los. Era uma
forma de fazer circular diferentes informações concentradas sobre os novos
tempos, a nova ciência e as possibilidades que se abriam para uma população
que começava a ter acesso ao saber. A revista ocupou, assim, um espaço entre o
livro (objeto sacralizado) e o jornal (que só trazia o noticiário ligeiro) (SCALZO,
2014, p. 20).
A evolução das revistas femininas e das revistas de moda nos mostram que o que
importa, além do entretenimento, é a oferta de informação por um baixo preço e com uma leitura
mais acessível. Independente de qual for o tema, a revista amplia o conhecimento do leitor e o
faz refletir, mesmo que seja sobre uma forma de economizar com vestuário.
"A revista é mais forte e atraente se tiver um jeito próprio de ver e interpretar a
moda, um ponto de vista particular diante da vasta e contínua oferta disponível; criatividade,
imaginação e inovação para inspirar o leitor a desenvolver o próprio estilo, em vez de apenas
’estar na moda’"(ALI, 2009, p. 220).
O diferencial de todas essas revistas é o fato de sempre levarem consigo algo único e
exclusivo ao seu modo de pensamento. A inovação é a palavra-chave para as revistas de moda.
Infelizmente, o mercado está sendo transportado para internet, mas como ponto positivo, isso
está fazendo com que a informação esteja cada vez mais perto dos leitores.
31
4 A FOTOGRAFIA DE MODA
A moda se baseia no comportamento humano para compor a sua estrutura e a
fotografia é utilizada nesse meio como forma de propagar o estilo de vida que está sendo
utilizado como conceito para aquele ensaio. A moda, por si, se baseia também na mudança e na
novidade como base para a sua formação; portanto, esse casamento entre moda e fotografia traz
consigo uma alta rotatividade de coleções e sugestões de comportamento.
Certamente, ninguém pretende negar o fato de que a fotografia tenha sido e
continue a ser também a simples documentação de um fenômeno já definido
em si. As fotografias servem também para "fazer com que se veja"a roupa, não
há dúvida.
...
Diante da fotografia de moda nós substancialmente experimentamos uma possi-
bilidade de comportamento, ou pelo menos a imaginamos, a desejamos, porque
a imagem propõe-nos uma espécie de protótipo de vida, uma experiência de
estilos e de modos de ser (MARRA, 2008, p. 15-16).
A fotografia de moda é o meio mais livre de expressar ideias e sonhos. A fotografia
pode revelar instantes e fixar para sempre detalhes significativos, mas o seu poder de manipulação
gerou grande curiosidade na sociedade moderna. "A notícia de que a câmerapodia mentir tornou
muito mais popular o ato de se deixar fotografar"(SONTAG, 2004, p. 102).
Em seu livro intitulado Nas sombras de um sonho: história e linguagens da fotografia
de moda, Marra (2008) explicou que a pesquisa foi feita para que ele pudesse verificar qual a
moda que vive dentro da fotografia, ou seja, a estética da fotografia de moda. Nesta publicação
ele explica a mudança das linguagens fotográficas de acordo com o período histórico e também
com os principais fotógrafos de moda que fizeram parte das revistas Vogue, Vanity Fair e Harper’s
Bazaar, em especial na América do Norte e na Europa.
Esta estética da fotografia de moda, como Marra (2008) se aprofunda em seu texto,
também é estudada – mas mais pela visão da moda como filosofia – pelo estudioso Lars Svendsen
(2010). Ele afirma, com suporte de estudos de Lipovetsky (2009), que a moda pode tratar de
dois conceitos: um seria a moda como vestuário, como as pessoas vestem os seus corpos físicos
e o porquê dessas escolhas; e o outro caminho seria a moda como ideologia social no qual
tudo que sofre mudanças em breves intervalos de tempo por mero "capricho"seria considerada
moda, inclusiva a área dos vestuários como sendo apenas uma parcela desse mundo de modas
interligadas.
Certamente existem modas também entre acadêmicos e intelectuais. Elas têm
a ver com quais assuntos estão "in"e quais estão "out", quais abordagens são
32
"sexy"e quais não são. Seria ingênuo acreditar que tudo isso é governado
por considerações completamente racionais, pois se trata igualmente de uma
questão de gosto em constante mudança (SVENDSEN, 2010, p. 9)
Com este mesmo pensamento filosófico, Svendsen (2010) afirma que existe moda
– neste conceito mais abrangente – até nas práticas dos trabalhos científicos. Segue-se o que
está na "crista da onda", aproveita-se o que está sendo mais comentado e discutido nas áreas
científicas para criar a sua própria ideia e garantir o seu espaço nesse grande guarda-chuva.
Claudio Marra (2008, p. 15) concorda com o Svendsen (2010) e afirma que:
a moda é algo mais articulado, que não se limita à simples roupa: é um fenômeno
complexo que concerne e relaciona entre si comportamentos, modos de ser,
formas de linguagem e qualquer outra escolha graças à qual estruturamos o
nosso ser no mundo (MARRA, 2008, p. 15).
O fotógrafo deve ter a consciência de que ele é um profissional ativo na sociedade,
que para toda imagem criada é construído um discurso, o fotógrafo toma possa do elemento
fotografado e que ele é um criador ativo da sociedade e não um mero observador passivo. Susan
Sontag (2004) afirma que essa passividade não existe, tendo em vista que cada fotógrafo tem a
imagem já dentro de si: "Para se tirar uma boa foto, reza a regra comum, é preciso que a pessoa
esteja vendo a foto. Ou seja, a imagem deve existir na mente do fotógrafo, no momento, ou antes
do momento, em que o negativo é exposto"(SONTAG, 2004, p. 133).
Em decorrência dessa visão da foto que está sendo registrada, cada fotógrafo traz
consigo um estilo, uma estética e uma linguagem que transforma a imagem em uma visão
particular. De acordo com Ronaldo Entler (2009), "com contornos escorregadios, resta apreender
que, mais do que um procedimento, uma técnica, uma tendência estilística, a fotografia contem-
porânea é uma postura". Entretanto, com a jorrada de imagens que são produzidas atualmente,
observa-se que a estética das imagens está se aproximando, os fotógrafos estão mimetizando
estilos e experiências para poderem se encaixar em um propósito – seja uma exposição ou uma
publicação.
A evolução dos processos fotográficos impôs, identicamente, padrões formais tí-
picos ao produto fotográfico como um todo. Esses padrões foram imediatamente
absorvidos pelos fotógrafos em todo o mundo, disto resultando uma estética
internacionalmente homogênea e peculiar aos diferentes períodos (KOSSOY,
2014, p. 88).
Atualmente, a fotografia tem um papel central na sociedade imagética em que se vive;
ela nunca foi tão onipresente como é agora. A sua utilização na moda não é novidade, mas para
Marra (2008, p. 189), a fotografia de moda gera uma sensação de liberdade tão grande que acaba
33
retirando os limites de atitudes e comportamentos das pessoas – em especial nas redes sociais;
como o autor chama, é a era do "bordel sem paredes", na qual há a sensação de estar sempre
sendo observado e de participar da vida do outro. Marshall McLuhan (2005), estudioso da
comunicação, criou esse conceito de "bordel sem paredes"em detrimento da fotografia ter como
principal característica a transformação das pessoas em objetos, em mercadorias produzidas em
massa. Ele também foca no aspecto de prostituição decorrente dos produtos comercializados em
massa. "Ninguém pode desfrutar uma fotografia solitariamente. Ao ler e escrever, pode-se ter a
ilusão de isolamento, mas a fotografia não favorece uma tal disposição (MCLUHAN, 2005).
Cada imagem é feita a partir de três elementos essenciais: o fotógrafo, o assunto a
ser registrado e a tecnologia a ser utilizada nesse registro. Porém, o mais importante de tudo é ter
um observador que compreenda o sentido daquela fotografia. Sem isso, a imagem é apenas ruído,
se torna desnecessária. Para a fotografia de moda, se utiliza muito as relações com o cinema, a
arte e a literatura no processo de construção das imagens; e isso tudo sempre focado no estilo de
vida e nas relações de comportamentos humanos.
Com essa grande produção de imagens no mundo, o fotógrafo Bob Wolfenson (2009)
afirma que nem tudo que é produzido é de qualidade, foi pensado criticamente ou tem a beleza
como ponto principal.
"Não há tantas fotografias ruins quanto as fotografias ruins de moda."Por ser
uma atividade para onde aflui grande parte dos que escolhem a fotografia como
profissão, a moda gera um excesso de clichês sem precedentes em outras áreas.
Basta folhear as revistas e catálogos publicados no mundo todo – pouca coisa
se salva (WOLFENSON, 2009, p. 28).
Sontag contradiz um pouco essa proposta de Wolfenson (2009) ao dizer que é por
meio da fotografia que a beleza é descoberta: "Ninguém jamais descobriu a feiura por meio de
fotos. Mas muitos, por meio de fotos, descobriram a beleza. [...] o que move as pessoas a tirar
fotos é descobrir algo belo"(SONTAG, 2004, p. 101).
E Sontag (2004, p. 120-121) vai mais longe ao dizer que o belo nem sempre é o que
entendemos na vida real como o mais bonito, muitas vezes o fotógrafo vai em busca do "feio", ou
do não-fotogênico – como ela explica – para mostrar o bonito. Para que haja informação dentro
dessa fotografia, para que ela não seja apenas um clichê bonito, é necessário que o conceito seja
bem estruturado, de forma que, ao ver a imagem, a pessoa se transforme com a sua força e a sua
ideia.
Uma grande fotografia de moda deve nos impactar com sua força, nos emocionar
com as questões propostas por ela, nos envolver em seu teatro de situações
34
fragmentadas, nos jogar nas viagens de sonho que ela sugere, não nos deixa
passar em branco diante dela (WOLFENSON, 2009, p. 67).
Boris Kossoy (2014, p. 40), em seus estudos, afirma que "Toda fotografia tem sua
origem a partir do desejo de um indivíduo que se viu motivado a congelar em imagem um aspecto
dado do real, em determinado lugar e época".
Quando se fotografa a moda, a roupa em si não é o elemento mais importante da
imagem e, sim, o estilo de vida e o posicionamento dos indivíduos no mundo. O conceito de
atitude que foi criado, o cenário que foi imaginado e o tema que foi proposto são os pontos que
realmente importam naquela construção imagética. "A moda, porém (e cada vez mais), não
fotografa apenas seus significantes, mas também seus significados."(BARTHES, 2009, p. 444).
É criada uma ilusão para que os consumidores possam acreditar e desejar aquele estilo de vida.
O público acaba mergulhando nessa realidade abstrata, construída por um agente da
moda que se aproveita do uso da imaginação para criar aquela imageme, assim, tornar aquela
proposta crível para os seus leitores. É um jogo de poder e dominação que o fotógrafo de moda
revela em suas imagens.
4.1 A ESTÉTICA DA FOTOGRAFIA DE MODA
A fotografia é causa e consequência do Iluminismo. Após o seu surgimento, com a
criação e disseminação do Daguerreótipo 12 e, com ela, o domínio da fotografia documental, os
artistas aderem à fotografia para usá-la como ferramenta produtora de imagens contendo ideias e
opiniões sobre o que se passava pelo mundo.
a "verdadeira"fotografia de moda passou a existir no último decênio do século
XIX, quando o surgimento do procedimento de fotogravura permitiu imprimir
sobre a mesma página foto e texto. E é mais exatamente em 1892, na revista
parisiense La mode pratique, que aparece pela primeira vez a reprodução direta
de uma fotografia Marra (2008, p. 69).
Após o domínio da fotografia documental, ela foi reutilizada também para a moda
com as primeiras imagens sendo feitas por Adolphe Braun da Condessa de Castiglione, Virgínia
12 "Inicialmente a imagem foi impressa por meio de processo químico a partir de superfície coberta com substância
contendo prata, graças à sua sensibilidade à luz. O daguerreótipo foi anunciado oficialmente em 1839, na
Academia de ciências, em Paris, como o primeiro processo para fixar imagens por meio da ação da luz em
uma câmera escura. O procedimento foi inventado pelos franceses J. Nicéphore Niépce e Louis Jacques M.
Daguerre. Como o primeiro já havia falecido na ocasião do anúncio do invento, a descoberta levou o nome do
último. O daguerreótipo consistia de uma placa de cobre coberta com fina camada de prata e exposta ao vapor
de iodeto de prata. Depois de exposta, a imagem latente na placa era revelada com vapor de mercúrio e fixada
com hipossulfito de sódio (MARCONDES-FILHO, 2014, p. 201).
35
Oldoini, provavelmente em 1857, sendo essas fotos uma forma de catálogo do seu vestuário
oficial da corte. Marra (2008) afirma que é correto afirmar que essas 188 fotografias podem ser
consideradas como o primeiro caso da fotografia de moda.
Feitos no requintado ateliê parisiense de Héribert Mayer e Louis Pierson, prova-
velmente entre 1857 e 1859, os retratos da condessa de Castiglione podem ser
efetivamente considerados um prólogo da fotografia de moda, não tanto por sua
destinação e uso, evidentemente distantes daquilo que hoje entendemos quando
falamos desse gênero, mas porque foram elaborados sobre um dos dois eixos
que, como tínhamos afirmado, caracterizam esse tipo de prática fotográfica. En-
tre imagem e imaginário, Virginia preferia, obviamente, a segunda perspectiva.
Para ela a fotografia não era a oportunidade para ilustrar, de modo formalmente
impecável, vestidos e toaletes diferentes, mas sim o instrumento ideal para
construir um sonho com os olhos abertos, um fantástico mundo imaginário no
qual entrava sozinha, na primeira pessoa, ou na companhia de muitos de seus
admiradores (MARRA, 2008, p. 77).
Figura 1 – Condessa Virgínia Oldoini por Adolphe Braun, c. 1857-1859.
Figura 2 – Condessa Virgínia Oldoini por Adolphe Braun, c. 1857-1859.
Dois álbuns fotográficos foram feitos tendo a condessa como modelo: em um deles,
conservado no Museus of Art de Nova York, contém 288 fotografias dela com vestuários criativos
e modernos para a sua época; e o segundo, preservado no Museu Nazionale del Risorgimento de
36
Turim, com mais 25 fotografias (MARRA, 2008).O imaginário foi o principal ponto de criação
desses álbuns, focada mais no lado artístico das imagens do que na parte técnica em si. A autora
Nancy Hall-Duncan (1979, p. 14) afirma que "a Condessa figure entre as primeiras mulheres a
serem seduzidas pela câmera, pois nenhuma coleção anterior de fotografias revela um desejo
compulsivo em ser fotografada".
Ainda nesse período, se falava muito do poder mimético da fotografia, a sua capaci-
dade de documentar e registrar a realidade de modo muito preciso. Com isto, muito fotógrafos
em seu início usavam a fotografia como material de revistas, mas também como imagem-base
para desenhistas e pintores em seus quadros. Por este motivo, Marra (2008, p. 81) afirma que "o
início da fotografia de moda se entrelaça intimamente com a fotografia de retrato, partilhando
com ela modalidades e procedimentos artísticos". Como o retrato era um estilo fotográfico muito
solicitado na época pelos artistas, os fotógrafos utilizavam esse estilo como base para a fotografia
de moda, ao ponto que Marra (2008) ainda chama a fotografia de moda nesse período como
"fotografia de gente na moda", pela forma como elas eram retratadas nas imagens.
Após a democratização da fotografia com a invenção da Kodak, um grupo de fotó-
grafos amadores avançados reagiram ao grande número de imagens que estavam sendo criadas
na época. Esse fator desencadeou no primeiro movimento estético da fotografia chamado de
Pictorialismo Internacional do fim do século XIX. O Pictorialismo foi organizado e estruturado
por fotoclubes e associações presentes nas principais da Europa e da América do Norte. Ela
nasce como uma reação à avalanche de usuários naif, contra a vulgarização da democratização
da fotografia. Os pictorialistas tinham a intenção de diferenciar a fotografia artística da fotografia
banal do dia a dia; eles queriam reivindicar o lado artístico da fotografia. Os artistas faziam
parte do Pictorialismo acreditavam que uma boa foto era aquela que mais se parecia com a
pintura e com quadros; sendo este um grande paradoxo tendo em vista que eles negavam a
documentalidade, a mecanicidade e a reprodutibilidade da fotografia.
Durante essa fase, entre os anos de 1880 e 1945, inúmeros artísticas utilizaram
a fotografia como sua principal ferramenta; como sua profissão. Dentre as especificações da
linguagem na era do Pictorialismo estavam as técnicas de distanciamento do real antes da captura
da fotografia – com o uso de filtros, desenfoques e objetiva flou, além de escolha de temas como
raios, natureza e tudo que relembrasse o estilo clássico – e as técnicas utilizadas no momento da
captura e depois da captura – tudo feito da forma mais tradicional e nobre, resultando em uma
imagem o mais perto possível de um quadro pintado.
Um dos protagonistas da fotografia de moda no mundo foi o barão Adolf De Mayer
37
por ter sido um dos responsáveis pelo sucesso de revistas como Vogue e Harper’s Bazaar.
Com De Meyer, a fotografia começou a definir de modo mais apropriado o
seu papel em relação à moda, funcionando como ponte entre esta e o estilo de
um determinado período, a ponto de poder apresentar-se não somente como
um instrumento capaz de criar uma atmosfera fundada sobre uma dimensão
material e mercantil, a do vestido, e sobre uma dimensão conceitual, a da arte
(MARRA, 2008, p. 85).
Nesse período do Pictorialismo, De Meyer se une aos fotógrafos ingleses do grupo
Linked Ring Britherhood, formado exclusivamente por novos fotógrafos, em contraponto ao
grupo Photographic Society of Great Britain. Esse grupo é exatamente um desses fotoclubes que
estavam incentivando o Pictorialismo. Com isto, a linguagem fotográfica de De Meyer muda,
como afirma Marra (2008, p. 87):
É nesse contexto que De Meyer elabora a própria linguagem; inicialmente, sem
grandes originalidades, deve-se dizer, já que a sua característica é a técnica,
muito difundida entre os pictorialistas, do flou, o foco suave com o qual se
queria contrastar a precisão anatômica da fotografia. De Meyer obtinha esse
efeito utilizando uma objetiva especial, a Pinkerton-Smith, ou então, de modo
mais artesanal, antepondo uma fina gaze de seda à objetiva normal (MARRA,
2008, p. 87).
De Meyer focava a produção das suas imagens mais no imaginário do que na imagem,
portanto a roupa não era documentada objetivamente, ele criava sim o desejo e o sonho em
suas imagens. Como Marra (2008, p. 94) afirma, "DeMeyer começa a construir aquela que
denominamos a "moda da fotografia", isto é, aquele mundo virtual que efetivamente não existe,
senão no sonho materializado

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