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GARANTIAS-NA-FASE-PREIü-PROCESSUAL---TCC---Ciro-Alexandre-Gomes-Beserra

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE 
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS 
CURSO DE DIREITO 
 
 
 
CIRO ALEXANDRE GOMES BESERRA 
 
 
 
 
 
 
 
GARANTIAS NA FASE PRÉ-PROCESSUAL: uma análise à 
luz do Estado Democrático de Direito 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
NATAL 
2022 
 
 
CIRO ALEXANDRE GOMES BESERRA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
GARANTIAS NA FASE PRÉ-PROCESSUAL: uma análise à 
luz do Estado Democrático de Direito 
 
 
 
 
 
 
Monografia apresentada ao curso de 
graduação em Direito, da Universidade 
Federal do Rio Grande do Norte, como 
requisito parcial à obtenção do título de 
Bacharel em Direito. 
 
Orientador: Prof. Dr. Walter Nunes da Silva 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
NATAL 
2022 
 
 
CIRO ALEXANDRE GOMES BESERRA 
 
 
 
GARANTIAS NA FASE PRÉ-PROCESSUAL: uma análise à luz do Estado 
Democrático de Direito 
 
 
 
 
Monografia apresentada ao curso de 
graduação em Direito, da Universidade 
Federal do Rio Grande do Norte, como 
requisito parcial à obtenção do título de 
Bacharel em Direito. 
 
Aprovada em: _____/_____ /_______ 
 
 
Banca Examinadora: 
 
 
___________________________________________ 
Prof. Dr. Walter Nunes da Silva Júnior (Orientador) 
Universidade Federal do Rio Grande do Norte 
 
 
___________________________________________ 
Prof. Dr. Fabio Wellington Ataide Alves (Examinador) 
Universidade Federal do Rio Grande do Norte 
 
 
___________________________________________ 
Prof. Dr. Paulo Roberto Dantas De Souza Leao (Examinador) 
Universidade Federal do Rio Grande do Norte 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico este trabalho à memória de 
Herculano Gomes Beserra, meu querido 
irmão, que apesar de uma breve 
passagem neste mundo terreno foi capaz 
de deixar lições incríveis e muito valorosas. 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
O Trabalho de Conclusão do Curso é o último ato da graduação em direito, mas 
mais do que isso é o encerramento de um ciclo e a concretização de um sonho, que 
só foi possível pela contribuição de várias pessoas que sempre estiveram ao meu 
lado. 
A Deus, em primeiro lugar, externo meus agradecimentos, pois sem suas 
bênçãos constantes não teria trilhado todos os caminhos até aqui. 
Agradeço a minha mãe, Ana Maria, mulher forte e batalhadora, que sempre me 
apoiou e viveu meus sonhos, e de igual forma essa conquista também é dela. Nunca 
mediu esforços para contribuir com meu crescimento pessoal e acadêmico, mesmo 
diante todas dificuldades da vida. Seu amor incondicional e sua força elevada é fonte 
de inspiração para ultrapassar todas as dificuldades diárias, sem ela nada disso seria 
possível. 
Agradeço ao meu pai, Evandro, por sempre batalhar e possibilitar as condições 
necessárias para percorrer toda trajetória pessoal e acadêmica. Sua honradez e 
retidão é espelho que guia meus princípios e virtudes. 
Estendo meus agradecimentos aos meus irmãos, Herculano (in memoriam) e 
Pedro Victor, que sempre estiveram me apoiando e celebrando minhas conquistas. 
Sou abençoado por tê-los em minha vida. 
Agradeço ao meu amor, Gabriella, por seu companheirismo e infinito amor. A 
ela devo meus sinceros agradecimentos por total apoio em todas conquistas 
alcançadas. Sua sabedoria é local de conforto que recorro quando as dificuldades 
surgem e é quem faz os fardos serem mais leves. Minha gratidão e meu amor serão 
eternos, o que faz querer que esteja sempre ao meu lado. 
Agradeço a toda minha família e amigos por estarem sempre presentes e 
serem fonte de carinho e companheirismo. Em especial, meus profundos 
agradecimentos à minha avó Lourdes Bezerra (in memoriam), em nome de todos os 
tios, tias, primos e primas. 
Agradeço à instituição IFRN, em especial o campus Natal Zona Norte, que me 
proporcionou o acesso à educação de qualidade, sem a qual não teria conseguido 
ingressar na universidade pública. Agradeço a todos professores que lá ensinaram 
conteúdos didáticos, além de lições que levarei comigo para sempre. 
 
 
Agradeço à UFRN, universidade pública, gratuita e de qualidade (que assim 
sempre seja). Sou eternamente grato a todo corpo de docentes que compõem o 
quadro da graduação em Direito, os agradecimentos estendem-se aos demais 
profissionais que desempenham suas atividades na instituição. 
Agradeço a todas instituições que estagiei, as quais possibilitaram o 
aprimoramento da formação acadêmica. A Procuradoria Geral do Estado e a 
Defensoria Pública do Estado são órgãos que realizam atividades de excelência e que 
proporcionaram experiências valiosas. 
 Por fim, e tão importante quanto, agradeço ao meu orientador, professor Walter 
Nunes, o qual tive a sorte de tê-lo como professor nas disciplinas de Direito Processual 
Penal I e II, de ter sido seu monitor e em seguida fui orientado na produção do TCC. 
Sua condução nas atividades de docência são ensinamentos que transmitem muito 
além do conteúdo didático da disciplina, as aulas são fontes de saber para a formação 
acadêmica, profissional e social. A UFRN e seus alunos são extremamente 
beneficiados por suas contribuições. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
A jurisdicionalização da fase pré-processual é providência necessária ao 
desenvolvimento da persecução penal que se alinha ao modelo acusatório. É 
imprescindível a atuação do juiz na fase de investigação como controlador e 
garantidor dos direitos fundamentais que são flexibilizados nesta fase. Essa previsão, 
por outro lado, faz surgir o comprometimento da imparcialidade objetiva do juiz, que 
em seguida atuará na fase de conhecimento. O juiz das garantias surge como 
conveniente a essa problemática, o qual tem como competência a atuação na fase 
pré-processual e que deve analisar e controlar a legalidade da investigação criminal, 
bem como os direitos fundamentais dos investigados. Diante dessa realidade, a Lei 
nº 13.964, de 2019, prevê o instrumento do juiz das garantias, o qual já havia sido 
idealizado no Projeto de Lei do Senado nº 156/2009, que discute acerca do novo 
Código de Processo Penal. O juiz das garantias é instrumento que representa um salto 
qualitativo na condução da persecução penal, que permite sua conformidade ao 
modelo do processo penal constitucional e ao modelo acusatório. 
 
Palavras-chaves: Juiz das garantias. Lei 13.964. Direitos fundamentais. Fase pré-
processual. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
The jurisdictionalization of the pre-procedural phase is a necessary measure for the 
development of criminal prosecution that aligns with the accusatory model. The judge 
needs to act in the investigation phase as a controller and guarantor of fundamental 
rights that are relaxed at this stage. This prediction, on the other hand, gives rise to the 
impairment of the objective impartiality of the judge, who will then act in the knowledge 
phase. The judge of the guarantees appears as convenient to this problem, which has 
the competence to act in the pre-procedural phase and which must analyze and control 
the legality of the criminal investigation, as well as the fundamental rights of those 
investigated. Because of this reality, Law nº 13.964, of 2019, provides for the 
instrument of the guarantee judge, which had already been conceived in the Senate 
Bill nº 156/2009, which discusses the new Code of Criminal Procedure. The judge of 
guarantees is an instrument that represents a qualitative leap in the conduct of criminal 
prosecution, which allows its conformity to the model of constitutional criminal 
procedure and the accusatory model. 
 
Keywords: Guarantee judge. Law 13.964. Fundamental rights. Pre-procedural phase. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................ 9 
2 PERSECUÇÃO PENALNO MODELO DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL 
DE 1941 ........................................................................................................ 12 
2.1 Os sistemas processuais e a investigação criminal ....................................... 20 
2.2 Fase pré-processual e o devido processo ..................................................... 26 
3 A INVESTIGAÇÃO CRIMINAL À LUZ DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE 
DIREITO ........................................................................................................ 35 
3.1 O juiz como garantidor da legalidade durante a investigação criminal ........... 37 
3.2 Prejuízos à imparcialidade do juiz.................................................................. 53 
4 A ATUAÇÃO DO JUIZ DAS GARANTIAS NA FASE PRÉ-PROCESSUAL . 58 
4.1 O juiz das garantias conforme a Lei nº 13.964 de 2019 ................................. 61 
4.2 A idealização do juiz das garantias no Processo Penal brasileiro .................. 64 
4.3 Análise crítica acerca do juiz das garantias conforme o sistema acusatório .. 67 
5 CONCLUSÃO ............................................................................................... 73 
 REFERÊNCIAS ............................................................................................ 76 
 
9 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
A pesquisa científica desenvolvida surgiu a partir das instigações suscitadas 
pelos debates promovidos nas aulas de processo penal ministradas pelo professor 
que, em seguida, tive o privilégio de ter como orientador do Trabalho de Conclusão 
de Curso. 
O estudo do direito criminal e a leitura das obras pertinentes promovem 
reflexões que demonstram um sistema criminal que, por vezes, se põe distante dos 
padrões democráticos e garantistas que se espera na sociedade evoluída. Nesse 
sentido, algumas mudanças estruturais e profundas são necessárias a fim de 
proporcionar avanços que buscam solucionar ou amenizar os prejuízos aos direitos 
fundamentais, que são praticados no decorrer da persecução penal, mais 
especificamente na fase pré-processual, que é o campo de estudo deste trabalho. 
A doutrina e a prática forense demonstram que o ambiente pré-processual é 
tema de discussões e polêmicas e, que ainda se encontra resistência por parte de 
alguns atores jurídicos no que diz respeito aos padrões democráticos e garantistas 
decorrentes do Estado Democrático de Direito. Essa resistência reflete os traços 
inquisitivos e autoritários1 que ainda sobrevivem no sistema criminal, mesmo pós 
Constituição de 1988. 
Nessa toada, este trabalho tem como objetivo averiguar e entender a influência 
da mentalidade inquisitiva na fase pré-processual, além de analisar a utilização do juiz 
das garantias como meio hábil a superar as condutas contrárias ao modelo acusatório 
instituído no sistema criminal brasileiro. 
O Código de Processo Penal, constituído pelo Decreto-Lei n.º 3.689, de 03 de 
outubro de 1941, apresenta uma natureza ditatorial e policialesca, tendo em vista que 
fora desenvolvido na vigência da constituição de 1937, em época do estado novo, e 
tantas outras ideias autoritárias que sopraram por terras brasileiras, tais como 
influências fascistas. 
Não obstante sua longevidade e as reformas que foram impostas, ainda se tem 
um processo penal com fortes características inquisitivas, principalmente no que se 
refere à fase pré-processual. Assim, é de se observar que o sistema criminal brasileiro 
é constituído de uma forte contradição, tendo em vista que o texto constitucional adota 
 
1GLOECKNER, Ricardo Jacobsen. Processo Penal Pós-acusatório? Ressignificações do 
Autoritarismo no Processo Penal. R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, jan.- fev. 2015. 
10 
 
o sistema acusatório e observa diversas garantias que devem ser respeitadas e 
efetivadas durante toda a persecução penal, em conformidade com um processo 
penal constitucional. Por outro lado, tem-se o Código de Processo Penal, com fortes 
características inquisitivas, por toda sua essência, vigente. 
O entendimento atual do processo penal e a ideia de garantismo exige que os 
papeis dos atores da persecução penal devem ser delimitados, sobretudo, a atuação 
do juiz no decorrer da investigação criminal. O magistrado, na posição fundamental 
de garantidor dos direitos do investigado, deve, inclusive, na fase pré-processual, 
onde as garantias são facilmente ameaçadas, proteger os direitos fundamentais 
contra qualquer violação injusta e infundada que possa ocorrer de forma injustificada. 
A proteção faz-se necessária, sobretudo, através da jurisdicionalização de incidentes 
investigativos que demandem, com o fim de apurar fatos, a legítima mitigação de 
direitos constitucionalmente reconhecidos. 
Em meio a esse contexto se insere a criação do juiz das garantias, instituto que 
é previsto em outros ordenamentos jurídicos e, que fora idealizado no Código de 
Processo Penal Tipo para Ibero-América, e em seguida discutido no projeto que 
idealizou o novo código de processo penal, no PL de nº 156 de 2009, mas que só teve 
vida válida com a promulgação da Lei 13.964 (popularmente conhecida como Pacote 
Anticrime). 
Assim, o presente estudo tem o objetivo de analisar a conveniência e 
plausibilidade da adoção do juiz das garantias no processo penal pátrio. Logo, tem-se 
a fase pré-processual como ponto de partida da persecução penal, e que o considera 
como ambiente em que deve ser observada todas garantias previstas no texto 
constitucional, e em conformação com o Estado Democrático de Direito. 
Ademais, afirma-se que o trabalho tem como marco teórico a compreensão do 
direito criminal como meio apto a limitar o poder punitivo promovido pelo Estado, e 
tem o processo penal como forma de desenvolver procedimentos que buscam garantir 
direitos fundamentais tutelados. 
No tocante à metodologia utilizada, este trabalho será desenvolvido pela via 
descritiva. Quanto ao método de investigação baseado em revisão bibliográfica, legal 
e jurisprudencial será feita uma abordagem qualitativa das informações obtidas. Em 
face dos dados do direito, o método utilizado foi o jurídico-interpretativo, e quanto a 
11 
 
outros saberes que se alinham às ciências cognitivas, foi escolhido o hipotético-
dedutivo. 
O desenvolvimento do trabalho será dividido em três partes, que num primeiro 
momento buscará analisar a investigação preliminar e compreender sua influência na 
persecução penal a partir do sistema processual que predominou em cada época, 
bem como explorar a fase pré-processual e suas garantias inerentes. Em seguida, 
será desenvolvida a análise da condução da investigação criminal conforme o estado 
democrático de direito, com enfoque na atuação do juiz das garantias como garantidor 
da legalidade. Por fim, será desenvolvida uma análise crítica do juiz das garantias no 
ordenamento jurídico brasileiro, que perpassará desde sua idealização, passará pela 
sua materialização em lei e, concluirá, com as críticas e os inconvenientes inerentes 
desse novo instrumento inserido na persecução penal. 
Não se busca explicar que a instituição do juiz das garantias é causa eficaz a 
afastar por completo todo e qualquer traço inquisitivo que ainda exista na fase 
investigativa, mas sim, que é medida salutar a contribuir com o desenvolvimento de 
uma persecução criminal alinhada aos princípios democráticos e garantistas, em 
conformidade com a ordem constitucional vigente. 
 
12 
 
2 PERSECUÇÃO PENAL NO MODELO DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL DE 
1941 
 
O ser humano necessita viver em contato com seus pares. Os mais remotos 
relatos históricos demonstram que o homem é um ser coexistêncial e que devido a 
sua natureza faz-se necessário o intercâmbio de colaboração entre os iguais. 
Sendo assim, devido a necessidade de interação dos homens, isto é, de 
conviver em sociedade, há a necessidade do estabelecimentode regras em prol do 
desenvolvimento da coletividade. Surge, então, as regras do direito com a finalidade 
de controlar os desejos irracionais que coexistem nos indivíduos, de forma a 
possibilitar o convívio social pacífico. 
O direito criminal nasce como meio hábil para proteger a convivência em 
coletividade, sendo importante instrumento de manutenção da paz social. Surge, 
então, a possibilidade da prisão como meio de garantir o cumprimento de suas regras, 
o que representa uma característica particular do direito penal. 
Assim, o direito penal aponta como o ramo do direito que é marcado pelos 
princípios da fragmentariedade, subsidiariedade e da ultima ratio. Isto é, o direito penal 
só será aplicado quando não houver outros meios menos gravosos para punir as 
condutas socialmente danosas. A razão de ser reside no fato da pena de prisão ser 
bastante prejudicial à pessoa do condenado, excluindo-o da sociedade, o que produz 
severo dano social. Dito isso, as penas que causem consequências menos gravosas 
devem ser preferidas. 
No entanto, a mera previsão legal não é meio apto a impedir condutas 
violadoras dos dispositivos penais, porém, a prática contrária à norma faz surgir para 
o Estado o dever-poder de punir, o jus puniendi. 
O Estado, ente político e jurídico, exerce o direito e tem o dever de proteger a 
coletividade, o que inclui o próprio acusado. 
Segundo ensinamentos de Aury Lopes Jr., o insucesso do direito penal, com a 
finalidade preventiva, resulta no injusto típico, que representa uma conduta voluntária, 
finalisticamente dirigida, que produz dano ou ameaça bens e valores protegidos, o que 
sucede um juízo de desvalor do resultado. Conforme o autor, o juízo de valor externa-
se através da aplicação de uma sanção, o que traduz a função repressiva do direito 
13 
 
penal2. 
Dito isso, convém destacar que o direito penal não age automaticamente. 
Assim, para que a pena possa ser aplicada é necessário que exista um injusto típico, 
bem como que haja previamente o devido processo penal3. 
Ademais, o Estado tem o dever-poder de punir, contudo, não pode fazer de 
qualquer forma. Logo, o processo penal surge como o ramo do direito que exerce a 
função punitiva, justificando-se, conforme Luigi Ferrajoli, “precisamente em cuanto 
técnica de minimización de la reacción social frente al delito: de minimización de la 
violência, pero también del arbítrio que de outro modo se produciría com formas aun 
más salvajes y desenfrenadas”4. 
O Estado é detentor do monopólio da justiça, o que veda expressamente os 
particulares de agirem com suas próprias mãos, em busca de uma ilusória justiça. 
Não haveria tranquilidade social se fosse cabível, pelo uso da força, às próprias 
partes litigantes resolverem suas divergências no campo extraprocessual, 
principalmente no que tange à matéria penal, ou seja, na esfera repressiva. Assim 
fosse, excessos seriam praticados em face dos arbítrios que a parte titular do direito 
de punir, “cego e desenfreado”, passaria a cometer5. 
A partir dessa realidade, o Estado autolimitou o seu poder punitivo, com o uso 
do processo judicial, que por meio de um terceiro imparcial e sem interesse no conflito 
e que terá a resolução do litígio e o autor punido. Isso posto, “o processo, como 
instituição estatal, é a única estrutura que se reconhece como legitima para a 
imposição da pena”6. 
Conforme leciona Luigi Ferrajoli, o modelo garantista de direito penal não 
permite qualquer aplicação de pena sem que haja a comissão de um delito, sua 
previsão legal como delito, a exigência de sua proibição e respectiva punição, a 
necessidade de existência de efeitos lesivos a terceiros, o caráter externo ou material 
da ação delituosa, a culpabilidade e imputabilidade do autor e, mais, a prova produzida 
 
2LOPES JR., Aury. Sistemas de Investigação Preliminar no Processo Penal. Rio de Janeiro: Lumen 
Juris, 2001. 
3Ibid. 
4FERRAJOLI, Luigi. Derecho y razón. Teoría del garantismo penal. 4. ed. Trad. Perfecto Andrés 
Ibáñez, Alfonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradillos Basoco e Rocío Cantarero 
Bandrés. Madrid: Editorial Trotta, 2000, p. 604. 
5TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 
2009. 
6LOPES JR., Aury. Sistemas de Investigação Preliminar no Processo Penal. Rio de Janeiro: Lumen 
Juris, 2001, p. 6-7. 
14 
 
por uma acusação diante um juiz distante das partes e imparcial, em um processo 
público, que permita o contraditório em face da defesa e por meio de procedimentos 
legalmente previstos7. 
Desta maneira, e em consonância com a dignidade humana e o direito à 
liberdade individual é que o Estado estabelece o seu poder repressivo não apenas em 
pressupostos jurídicos-penais materiais, mas também garante a aplicação da 
legislação penal ao caso concreto, seguindo as formalidades previstas nas leis, 
mediante a atuação dos órgãos jurisdicionais. 
O direito processual penal caracteriza-se como conjunto de regras em que se 
estabelece a instituição dos órgãos jurisdicionais e que orienta o desenvolvimento da 
apuração das condições que permitem a aplicação em concreto do direito penal. 
Não obstante, conforme ensinamentos de Silva Júnior, observa-se que a 
dimensão do neoconstitucionalismo ou do Estado democrático-constitucional 
desenvolveu-se de modo que o ordenamento jurídico criminal tem sua história 
confundida com a dos direitos fundamentais8. Assim, o processo penal é, acima de 
tudo, o garantidor dos direitos fundamentais delineados na Constituição de 1988. 
A estrutura requer um íntimo e indispensável vínculo entre delito, processo e 
pena. “Não existe delito sem pena, nem pena sem delito e processo, nem processo 
penal senão determinar o delito e impor uma pena”9. 
Conforme ensinamentos de Antonio Scarance Fernandes, há destaque para 
dois direitos fundamentais e que são caros ao processo criminal: o direito à liberdade 
e o direito à segurança, os dois estão contidos no caput do art. 5º da Constituição. 
Ademais, decorre de tais direitos fundamentais, a garantia que o Estado tem que atuar 
positivamente para estruturar seus órgãos e criar procedimentos que garantam 
segurança e assegure a liberdade. 
Segundo Luigi Ferrajoli, o que distingue o processo promovido pelo órgão 
público imparcial da justiça e aquele exercido com as próprias mãos ou qualquer outro 
meio de vindita sumária é devido ao fim preventivo dual do direito penal: a punição 
dos culpados, bem como a proteção dos inocentes. A execução de um ilícito gera o 
 
7FERRAJOLI, Luigi. Derecho y razón. Teoría del garantismo penal. 4. ed. Trad. Perfecto Andrés 
Ibáñez, Alfonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradillos Basoco e Rocío Cantarero 
Bandrés. Madrid: Editorial Trotta, 2000. p. 103-104. 
8SILVA JÚNIOR, Walter Nunes da. Curso de direito processual penal: teoria (constitucional) do 
processo penal. 3. ed. Revista, ampliada e atualizada. Natal: OWL, 2021. 
9LOPES JR., Aury. Sistemas de Investigação Preliminar no Processo Penal. Rio de Janeiro: Lumen 
Juris, 2001, p. 6. 
15 
 
dever do Estado encontrar o culpado, e não apenas um culpado. Desta maneira, é 
partindo do dever de proteção dos inocentes que se fundamenta as diversas garantias 
processuais que estão presentes no processo e que reflete de várias maneiras nas 
instâncias repressivas10. 
Assim, nota-se o contraste existente no processo penal, qual seja a efetividade 
da coerção penal de um lado e os direitos fundamentais de outro. Contudo, para se 
alcançar uma coerção mais eficaz faz-se necessária a limitação de direitos 
fundamentais. Nesse sentido, Silva Júnior explica, ainda, que o processo penal é 
desenvolvido pela tensão ou colisão entre direitos fundamentais, tanto na perspectiva 
objetiva quanto subjetiva, logo, o sistema criminal deve se pautar em buscar o 
equilíbrioentre esses interesses11. 
A colisão entre o poder punitivo e o exercício da defesa não se resolve com 
uma escolha rígida que uma prevalece sobre a outra, tendo em vista que o Estado 
tem tanto o dever de punir os culpados quanto absolver os inocentes. Demonstra-se 
assim a difícil tarefa que o Estado tem em realizar de forma eficiente a punição dos 
culpados e absolver os inocentes. 
Por outro lado, o reconhecimento dos mais diversos direitos fundamentais traz 
restrições à efetividade da coerção. Portanto, o que se deseja é uma eficiência na 
atividade coercitiva, que seja exercida com respeito às garantias. 
O processo penal na sua evolução histórica não atingiu um procedimento 
perfeito que permite um equilíbrio desejado entre a segurança e a liberdade, até 
porque o processo penal se apresenta sob diversas faces a depender do contexto 
social, político, histórico. No entanto, de forma geral, algumas diretrizes foram 
estabelecidas de maneira a fundamentar a formação de procedimentos12. 
Desse modo, o Estado organizou-se de maneira a estruturar e criar órgãos 
direcionados à eficiente condução do direito punitivo, seja por meio dos 
procedimentos, atos e fases dirigidos a garantir a ação de tais órgãos. 
 
10FERRAJOLI, Luigi. Derecho y razón. Teoría del garantismo penal. 4. ed. Trad. Perfecto Andrés 
Ibáñez, Alfonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradillos Basoco e Rocío Cantarero 
Bandrés. Madrid: Editorial Trotta, 2000, p. 224. 
11SILVA JÚNIOR, Walter Nunes da. Curso de direito processual penal: teoria (constitucional) do 
processo penal. 3. Edição. Revista, ampliada e atualizada. Natal: OWL, 2021. 
12FERNANDES, Antonio Scarance. Teoria Geral do Procedimento e O Procedimento no Processo 
Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 41. 
16 
 
O Estado enquanto titular do direito de punir só pode aplicar determinada pena 
quando por meio de órgãos jurisdicional e através de regular processo, que tem início 
com a propositura da ação. É o que se entende por persecução penal. 
O direito à persecução penal consiste em investigar um fato contrário à norma 
e em seguida requerer o julgamento da pretensão punitiva. O Estado tem como 
obrigação alcançar os fins que sustentam sua razão de ser: segurança e restauração 
da ordem jurídica13. 
A prerrogativa de persecução penal é cabível ao Estado, que por meio da busca 
em realizar o jus puniendi, quando há crime e que daí decorra a necessidade de infligir 
ao acusado a correspondente sanção penal. 
Apesar de não apresentar uma regra rígida, a persecução penal se mostra, em 
regra, em duas fases: a investigação preliminar e o processo judicial, sendo este 
formado, normalmente, por três etapas: postulatória, instrutória e decisória14. Essa 
divisão da persecução penal subsiste para quando seja necessária, antes das fases 
processuais, um momento necessário à investigação, que não integra, portanto, o 
processo15. 
É válido observar que a cisão da persecução em duas fases se trata de regra 
que não é absoluta porque a investigação preliminar não representa fase necessária 
e indispensável à conclusão da culpa. Tal observação compreende característica da 
investigação, que pode ser representada pelo inquérito, na qual é dispensável, tendo 
em vista que as informações necessárias já são de conhecimento e a ação já pode 
ser requerida. 
O processo penal, em si mesmo, representa uma sanção negativa, resultando 
em efeitos permanentes, mesmo que ao final do processo o réu seja considerado 
inocente16. Desde o início da persecução penal, seja quando houver a investigação 
preliminar ou não, o processo penal já é uma pena17. Desde o início gera-se uma onda 
de incertezas, medos e angústias. Ainda, há de se deparar com órgãos judiciários que 
 
13TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 
2009. 
14FERNANDES, Antonio Scarance. Teoria Geral do Procedimento e O Procedimento no Processo 
Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. 
15“É o que sucede nos processos criminais e nos processos relativos às ações civis públicas, nos quais 
deve ser instaurado, previamente, um inquérito. O inquérito, por isso, não faz parte da unidade 
procedimental”. FERNANDES, Antonio Scarance. Teoria..., p. 35. 
16SAAD, Marta. O direito de defesa no inquérito policial. São Paulo: RT, 2004. 
17O processo criminal é uma pena. O início da persecução penal já é o cumprimento da pena. A aflição 
que toma conta do indivíduo não permite mais que o mesmo tenha a vida que levava. 
17 
 
não apresentam uma resposta rápida ao cometimento do delito, o que deveria se dar 
o quanto antes, porquanto só o fato de deixar no réu, a incerteza e obscuridade que 
uma persecução criminal causa, isso já seria estender sua pena de modo prejudicial, 
conforme afirmou Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria18. 
A prática jurídica demonstra que uma prévia apuração dos fatos, anteriormente 
a apresentação da ação penal, revelou ser necessária. Sendo assim, quem acusa 
necessita obter provas por meio de uma apuração preliminar à ação penal, 
condenatória, que apresente, suficientemente, a materialidade do fato ilícito e típico, 
bem como indícios de autoria, coautoria ou participação, quando possível, assim como 
indícios sobre a provável culpabilidade do indiciado19. 
Segundo os ensinamentos de Aury Lopes Jr., “o processo penal sem 
investigação preliminar é um processo irracional, uma figura inconcebível segundo a 
razão e os postulados da instrumentalidade garantista”20. A razão de ser é devida o 
processo penal ser composto por um conjunto de penas processuais que direcionam 
para que o agente seja acusado ou não. Nesse sentido o primeiro ato é investigar e 
reunir elementos que permitam o processo ou não21. 
Assim, é imperioso que haja um mínimo suporte probatório, que anteceda a 
ação penal de natureza condenatória. 
Essa etapa preliminar representa uma garantia, isso porque dificulta que o 
indivíduo seja acusado de ter praticado algum ilícito, sem que esteja apresentado 
indícios mínimos. Dessa forma, a fase prévia de investigação consiste na forma como 
o direito processual penal desenvolveu para que haja uma acusação justa e que não 
faça imputações apressadas22. 
A investigação preliminar é definida por Aury Lopes Jr. Como o conjunto de 
atividades realizadas em sequência por órgãos do Estado, com início numa notitia 
criminis, que tem caráter prévio e natureza preparatória em face da fase judicial, cuja 
finalidade é a apuração da autoria e materialidade, de modo a fundamentar o processo 
 
18BECCARIA, Cesar Bonesana, Marchesi di, 1738-1793. Dos Delitos e das Penas; tradução J. Cretella 
Jr. E Agnes Cretella I. 2. ed. Ver., 2. Tir – São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. 
19SAAD, Marta. O direito de defesa no inquérito policial. São Paulo: RT, 2004. 
20LOPES JR., Aury. Sistemas de Investigação Preliminar no Processo Penal. Rio de Janeiro: Lumen 
Juris, 2001, p.1. 
21Ibid. 
22FERNANDES, Antonio Scarance. Teoria Geral do Procedimento e O Procedimento no Processo 
Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. 
18 
 
ou o não-processo23. 
Há duas funções que compõe a persecução preliminar, a preservadora e a 
preparatória. A preservadora consiste na proteção contra acusações infundadas, 
precipitadas ou caluniosas, o que evita prejuízos de acusações formais incabíveis 
diante o juízo criminal; a preparatória propõe-se a acautelar prováveis meios de prova, 
que, eventualmente, podem ser prejudicados com o tempo24. 
Ademais, também está presente na função preservadora, o que se entende por 
juízo de acusação, ou seja, um julgamento prévio dos elementos acusatórios, a fim de 
proteger a inocência dos indivíduos contra ações imprudentes, assim como garantir 
que a administração pública produza gastosinúteis e incabíveis de tempo e de 
trabalho. 
No mesmo sentido, Francesco Carnelutti descreve que a investigação 
preliminar não visa comprovar o ilícito, mas sim, afastar acusações aventuradas25. 
Ainda há de perceber que a investigação preliminar exerce função cautelar, 
podendo haver diferentes contornos a depender da necessidade da tutela, assim 
poderá existir medidas de caráter pessoal, patrimonial ou probatória26. 
Há de se destacar a discussão acerca da atuação do juiz e seus limites na fase 
preliminar de investigação e a eventual influência que venha existir tendo em vista o 
contato com os autos do inquérito policial. Essa relação compromete a imparcialidade 
do juiz27 para realizar o julgamento. 
Observa-se que a primeira etapa da persecução penal, que antecede a 
instauração do processo, não compreende o esquema procedimental. No entanto, é 
inegável que os atos realizados provocam efeitos no desenvolvimento da relação 
jurídica processual. Nesse sentido, cabe destacar que o papel do magistrado pode se 
apresentar sob diferentes condutas, a depender do sistema vigorante à época, seja o 
acusatório, o inquisitório ou o misto. 
 
23LOPES JR., Aury. Sistemas de Investigação Preliminar no Processo Penal. Rio de Janeiro: Lumen 
Juris, 2001. 
24SAAD, Marta. O direito de defesa no inquérito policial. São Paulo: RT, 2004. 
25CARNELUTTI, Francesco. Principi del Processo Penale. Napoli: Morano Editore, 1960. 
26LOPES JR., Aury. Sistemas de Investigação Preliminar no Processo Penal. Rio de Janeiro: Lumen 
Juris, 2001. 
27Leite, Luiz Claudio da Silva. Juiz das Garantias: uma crítica à Mentalidade Inquisitorial conduzida 
pela Teoria da Dissonância Cognitiva. Orientador: Walter Nunes. 2020. 155 f. TCC (graduação) – Curso 
de direito, Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 
2020. Disponível em: https://antigo.monografias.ufrn.br/jspui/handle/123456789/11264. Acesso em: 04 
de janeiro de 2022. 
19 
 
Outra fase da persecução criminal, denominada de judicial, em que o processo 
penal tem seu início com a proposição da ação penal, isto é, o pedido de julgamento 
da pretensão punitiva e que dá partida à fase jurídica da persecução criminal. 
A denominação “processo penal” consiste na sequência cronologicamente 
ordenada e fundamental de atos que têm como ponto de partida a ação penal, ou seja, 
o pedido, direcionado ao juiz, de decidir sobre a imputação. Esse conjunto de atos 
corresponde à uma fração da persecução penal. O período inicial do processo 
representa o exercício da ação penal, por outro lado, o momento final está 
representado quando do momento que se tem a sentença imutável. 
Dessa feita, ao existir uma infração penal surge para o Estado, enquanto titular 
do dever-poder de punir, o compromisso de ingressar em juízo por meio do Ministério 
Público, a fim de apresentar sua pretensão acusatória. 
Uma vez instaurado o processo penal, haverá o julgamento da pretensão 
punitiva. Em seguida, considerando-se a pretensão punitiva válida, o processo 
caminhará até o fim, o qual se refletirá com a aplicação coercitiva da sanção penal. 
Portanto, o teor do processo penal consiste na averiguação judicial das 
condições determinantes ou que possam afastar a viabilidade da pretensão punitiva 
do Estado. 
De mais a mais, importante compreender que a acusação, por meio de um 
processo, se desenvolve com a sequência de atos, sempre com respeito às 
formalidade e regras que devem ser cumpridas. 
A instrução criminal terá início com o recebimento da acusação, pelo juiz, para 
que assim possam ser apresentadas as provas pelas partes, bem como para que o 
réu seja ouvido28. 
Conforme afirma Antonio Scarance Fernandes, a verificação do ilícito e sua 
autoria não se restringe à apenas uma fase do processo, tendo em vista que as 
diligências realizadas desde os primeiros atos investigatórios podem evidenciar a 
realização do delito e demonstrar seu autor. Ademais, afirma que a fase de instrução 
consiste na etapa que pretende produzir provas relevantes ao julgamento. Nesse 
sentido, não se pode concluir que as provas constituídas na fase preliminar não 
possam ser consideras na decisão final, isso porque a depender da urgência ou 
 
28FERNANDES, Antonio Scarance. Teoria Geral do Procedimento e O Procedimento no Processo 
Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. 
20 
 
impossibilidade de repetição de eventuais provas é impossível que haja uma regra 
rígida que não admita aquelas provas que sejam produzidas fora da fase judicial. 
Dito isto, é importante destacar que apesar da imprescindibilidade da fase 
judicial, a instrução preliminar consiste em uma etapa dispensável, tendo em vista que 
o Estado, por meio do Ministério Público, pode exercer a pretensão punitiva, indicando 
fato aparentemente criminoso e seu autor, sem que para isso haja uma investigação 
prévia, isto é, essa possibilidade é prevista quando o órgão acusador já detém as 
informações necessárias à ação penal. 
 
2.1 Os sistemas processuais e a investigação criminal 
 
É notório que o direito criminal pode tornar-se mais evidente e exposto que os 
demais ramos do direito, a depender da ideologia imposta ou vigente pelo poder 
exercido à época, contudo essa percepção é ainda mais notável no direito processual 
penal, de modo que é neste ramo do direito que há a concretização das limitações de 
garantias fundamentais, isto é, aqui há a real aplicação de prejuízos ao indivíduo. O 
que não ocorre no direito penal, pois este não tem materialidade fora do processo 
penal, tendo em vista que são as regras do processo penal que concretizam 
diretamente o poder penal do Estado. Nessa toada, Maier explica que é no processo 
penal que as ações do poder político são frequentes e destacadas, até pela finalidade 
da tensão existente – punir x liberdade29. 
A partir do modelo adotado pode haver o endurecimento que se manifesta no 
utilitarismo judicial, em que os atos são dotados de segredo, predomina a forma 
escrita, enxerga-se como medida eficaz o aumento das penas processuais, inversão 
da atividade probatória e, inclusive, os juízes são detentores da função investigatória. 
Nessa linha, Aury Lopes Jr. explica que o sistema acusatório predomina nos 
países que respeitam mais as liberdades individuais e que se fundamentem nos 
princípios democráticos. De outro modo, o sistema inquisitivo tem sua base nos países 
que desenvolvem seus preceitos sancionatórios por meio da repressão, 
caracterizados pelo totalitarismo e autoritarismo, assim, o estado tem sua hegemonia 
em detrimento dos direitos individuais30. 
 
29MAIER, Julio B. J. Derecho procesal penal. 2. ed. Buenos Aires: Editorial Del Puerto, 2002. 
30LOPES JR, Aury. Fundamentos do processo penal: introdução crítica. 3. ed. – São Paulo: 
Saraiva, 2017. 
21 
 
Historicamente, o sistema acusatório destacou-se até meados do século XII, e 
em seguida o modelo inquisitório o substituiu, de forma gradativa, tendo sua atuação 
prevalecendo até o final do século XVIII31. A doutrina nacional, em sua maioria, 
descreve que o sistema brasileiro tem como sistema prevalecente o misto, o qual se 
divide em inquisitivo na fase pré-processual e acusatório no processo judicial. 
De acordo com os ensinamentos de Aury Lopes Jr. o sistema misto não passa 
de um reducionismo ilusório, tendo em vista que não existe o sistema puro, todos são 
mistos32. Nesse sentido, o objetivo é identificar o princípio norteador de cada sistema, 
e a partir de então classificar como acusatório ou inquisitivo, pois como explica o autor, 
a classificação é a partir do núcleo definidor. 
O princípio acusatório tem estreita relação nos pensamentos filosófico-liberal 
produzidos por Cesare Beccaria33 na obra Dos delitos e das penas, o qual marca oinício da ciência criminal. As mudanças produzidas se deram pós período do Estado 
absoluto, em que a persecução penal fora reconhecida como mero ritual, isto é, seu 
desenvolvimento não reconhecia garantias, nem mesmo limites ou regras à busca da 
dita verdade. Nesse sentido, conforme explica Silva Junior34, as circunstâncias da 
condução da persecução penal permitiam arbitrariedades, e a defesa do acusado era 
deficiente, se dava por meio de julgamentos secretos, com o uso de tortura e penas 
cruéis e infamantes. 
Os ensinamentos de Beccaria almejava a processualização do direito punitivo, 
de modo que houvesse uma limitação à persecução criminal. Essa limitação proposta 
foi responsável por mudanças importantes na seara criminal, o que foi determinante 
na inserção da declaração de direitos fundamentais na Constituição Americana, de 
1787, bem como ainda teve forte influência na declaração de direitos da Revolução 
Francesa, em 1789. 
Ainda, o sistema acusatório consiste no sistema processual penal baseado no 
princípio dialético, tendo em vista que a verdade é melhor apurada quando houver 
maior embate entre as partes. Ademais, destaca-se que o processo acusatório tem 
 
31LOPES JR, Aury. Fundamentos do processo penal: introdução crítica. 3. ed. – São Paulo: 
Saraiva, 2017. 
32Ibid. 
33BECCARIA. Cesare. Dos delitos e das penas. Tradução J. Cretella Jr. e Agnes Cretella. São Paulo: 
Editora Revista dos Tribunais, 1999. 
34SILVA JÚNIOR, Walter Nunes da. Curso de direito processual penal: teoria (constitucional) do 
processo penal. 3. Edição. Revista, ampliada e atualizada. Natal: OWL, 2021. 
22 
 
como principais características a separação entre as funções de quem acusa, defende 
e julga, bem como a observância do princípio do contraditório na constituição da prova. 
As principais características que qualificam o sistema acusatório são, seguindo 
rol exposto por Lopes Jr.35: 
a) clara distinção entre as atividades de acusar e julgar; b) a iniciativa 
probatória deve ser das partes (decorrência lógica da distinção entre as 
atividades); c) mantém-se o juiz como um terceiro imparcial, alheio a labor de 
investigação e passivo no que se refere à coleta da prova, tanto de imputação 
como de descargo; d) tratamento igualitário das partes (igualdade de 
oportunidades no processo); e) procedimento é em regra oral (ou 
predominantemente); f) plena publicidade de todo o procedimento (ou de sua 
maior parte); g) contraditório e possibilidade de resistência (defesa); h) 
ausência de uma tarifa probatória, sustentando-se a sentença pelo livre 
convencimento motivado do órgão jurisdicional; i) instituição, atendendo a 
critérios de segurança jurídica (e social) da coisa julgada; j) possibilidade de 
impugnar as decisões e o duplo grau de jurisdição. 
 
A separação das funções no processo penal é estrutura basilar para o 
desenvolvimento do sistema acusatório, nesse sentido é a jurisprudência do STF36, 
em que veda a extrapolação das funções das partes processuais. 
Conforme Luigi Ferrajoli37, o sistema acusatório considera o juiz como sujeito 
equidistante das partes, assim o processo representa uma disputa entre acusação e 
defesa, sendo daquela o ônus da prova. Além disso, o procedimento é desenvolvido 
por meio do debate contraditório, oral e público. E, por fim, o magistrado decide 
segundo sua livre convicção. 
Essa divisão de funções é a característica fundamental do sistema processual 
acusatório. Logo, de um lado, tem-se o acusador que identifica e através do poder 
postulatório realiza as demandas cabíveis. Por outro lado, a defesa resiste à 
imputação. E distante das partes, o juiz detém o poder decisório. 
 
35LOPES JR, Aury. Fundamentos do processo penal: introdução crítica. 3. ed. – São Paulo: Saraiva, 
2017, p. 162. 
36Veja-se o RHC de nº 144615 de relatoria do Exmo. Min Edson Fachin, que consigna em ementa, com 
maestria: Penal e Processual Penal. Imparcialidade judicial e sistema acusatório. Postura ativa e 
abusiva do julgador no momento de interrogatório de réus colaboradores. Atuação em reforço da tese 
acusatória, e não limitada ao controle de homologação do acordo. As circunstâncias particulares do 
presente caso demonstram que o juiz se investiu na função persecutória ainda na fase pré-processual, 
violando o sistema acusatório. Imparcialidade judicial como base fundamental do processo. Sistema 
acusatório e separação das funções de investigar, acusar e julgar. Pressuposto para imparcialidade e 
contraditório efetivos. Precedente: ADI 4.414, Plenário, Rel. Min. Luiz Fux, j. 31.5.2012. Agravo 
regimental parcialmente provido para declarar a nulidade da sentença condenatória proferida por 
violação à imparcialidade do julgador. 
37FERRAJOLI, Luigi. Derecho y razón. Teoría del garantismo penal. 4. ed. Trad. Perfecto Andrés 
Ibáñez, Alfonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradillos Basoco e Rocío Cantarero 
Bandrés. Madrid: Editorial Trotta, 2000. 
23 
 
O sistema inquisitivo teve seus primeiros passos na Roma Imperial, sendo 
permitido que o juiz iniciasse o processo de ofício. Ainda, na Idade Média, por meio 
da igreja, o sistema se disseminou por toda Europa Continental. Desde já o processo 
inquisitivo serviu como instrumento de dominação a serviço dos soberanos38. 
A inquisição corresponde a um sistema processual que se desenvolve sob a 
ideia do poder central absoluto, ou seja, o poder está centralizado de forma que todos 
atributos correlatos à soberania estão concentrados nas mãos de uma única pessoa. 
Ao considerar a relevância da ordem social frente à individualidade da pessoa 
humana o procedimento penal reduz o acusado a um instrumento de investigação. 
Nesse sentido, prevalece a ideia de que qualquer meio pode ser utilizado para 
que se possa reprimir a perturbação social e quem a pratica, mesmo que se use de 
meios cruéis. É daí que se deriva as máximas do sistema inquisitivo: persecução penal 
pública, que tem objetivo final de descobrir a verdade, o que se dá com a utilização 
dos meios mais eficazes para se alcançar este fim39. 
Entende-se, assim, que há reunião de poderes processuais penais nas mãos 
de apenas um órgão. Desta feita, investigar, acusar e julgar são ações exercidas por 
um indivíduo. 
O modelo inquisitivo se destaca pela razão do acusado ser um objeto da 
persecução, e não um sujeito detentor de direitos fundamentais. Ainda, o 
procedimento se desenvolve por meio de uma investigação secreta, escrita, o que 
exclui a oralidade. Tem-se a confissão do acusado como prova cabal à acusação, isto 
é o que se chama de rainha das provas. 
De mais a mais, o contraditório é inexistente e a figura da defesa consiste em 
mera formalidade40. 
Segundo Antonio Scarance Fernandes, no sistema inquisitorial a competência 
para a investigação recaía sobre o juiz, que agia após prévia investigação da polícia. 
Quando finalizada a investigação pelo juiz, iniciava-se o processo, que tinha pouco 
espaço destinado à atividade da defesa. O fim do processo era induzir o réu a 
confessar e confirmar com os elementos de provas produzidos durante a investigação 
preliminar, sendo, inclusive, permitido o uso da tortura para que o réu confessasse. 
 
38TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 
2009. 
39MAIER, Julio B. J. Derecho procesal penal. 2. ed. Buenos Aires: Editorial Del Puerto, 2002. 
40NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 14. ed. São Paulo: 
Editora Forense, 2017. 
24 
 
Essa permissividade existe em razão do ideal da busca da verdade material, presente 
no sistema inquisitivo. 
Conforme Jacinto Nelson de Miranda Coutinho, o modelo inquisitório se 
destaca pela gestão da prova, que tem o magistrado como ponto chave. O autor 
aponta como vantagem o fato do juiz tero conhecimento da verdade dos fatos, isto é, 
aqueles que são penalmente relevantes, inclusive os que não estão relatados na 
acusação41. 
Nessa toada, Leite42 afirma que a manutenção de um sistema inquisitivo não é 
compatível com o Estado Democrático de Direito, em razão da inexistência de limites 
ao poder do órgão acusador. Afirma, ainda, que no sistema inquisitivo há uma 
constante inobservação dos limites que devem ser impostos ao poder punitivo. 
A atividade investigativa também é competência do juiz, o qual pode ter 
iniciativa na produção da prova, tendo como fundamento o alcance da pretensão 
punitiva. 
Nas palavras de Lopes Jr.43, o processo inquisitório estaria dividido em duas 
fases, que seriam a inquisição geral e a especial. Sendo aquela destinada à 
comprovação da autoria e materialidade, o que representava a investigação preliminar 
e preparatória para o seguimento da outra fase, a inquisição especial, que era 
responsável pelo processo condenatório e a aplicação da sanção. 
O sistema inquisitivo concentra a atividade de investigação preparatória e de 
instrução processual na figura do juiz. Contudo, a distinção entre essas fases não era 
tarefa fácil, tendo em vista que todos elementos produzidos eram tratados como 
provas, desde que hábeis para formar o convencimento do magistrado. Nesse período 
o actus trium personarum não se materializa, como afirma Jacinto Coutinho44, “ao 
 
41COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. O papel do novo juiz no processo penal. Empório do 
direito, 2015. Disponível: https://emporiododireito.com.br/leitura/o-papel-do-novo-juiz-no-processo-
penal#:~:text=Ademais%2C%20compondo%20a%20rela%C3%A7%C3%A3o%20processual,%C3%A
9%20de%20%C3%B3rg%C3%A3o%20super%20partes. Acesso em: 03 de maio de 2022. 
42Leite, Luiz Claudio da Silva. Juiz das Garantias: uma crítica à Mentalidade Inquisitorial conduzida 
pela Teoria da Dissonância Cognitiva. Orientador: Walter Nunes. 2020. 155 f. TCC (graduação) – Curso 
de direito, Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 
2020. Disponível em: https://antigo.monografias.ufrn.br/jspui/handle/123456789/11264. Acesso em: 04 
de janeiro de 2022. 
43LOPES JR, Aury. Fundamentos do processo penal: introdução crítica. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 
2017. 
44COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. O papel do novo juiz no processo penal. Empório do 
direito, 2015. Disponível: https://emporiododireito.com.br/leitura/o-papel-do-novo-juiz-no-processo-
penal#:~:text=Ademais%2C%20compondo%20a%20rela%C3%A7%C3%A3o%20processual,%C3%A
9%20de%20%C3%B3rg%C3%A3o%20super%20partes. Acesso em: 03 de maio de 2022. 
25 
 
inquisidor cabe o mister de acusar e julgar, transformando-se o imputado em mero 
objeto de verificação, razão pela qual a noção de parte não tem nenhum sentido”. 
Ademais, a estrutura do processo inquisitório foi desenvolvida sob o 
fundamento da busca da “verdade real ou absoluta”. Lopes Jr.45 destaca, ainda, que 
a busca da verdade real permite que a prisão cautelar seja tratada como regra, tendo 
em vista que o inquisidor necessita do corpo do herege. Com ele sob seu domínio, a 
fim de buscar a verdade real, pode-se aplicar a tortura de modo a conduzir o suspeito 
à confissão. Com o alcance da confissão do acusado não era necessário mais 
nenhuma ação, tendo em vista que a confissão era considerada a rainha das provas 
(sistema de prova tarifada). 
Nesse ínterim faz mister relembrar os ensinamentos de Beccaria46, o qual 
explica a ineficiência do método da tortura, como fim de obtenção da confissão, pois 
entre dois homens, igualmente inocentes ou igualmente culpados, o mais robusto e 
corajoso será absorvido; o mais débil, contudo, será condenado. 
No sistema inquisitório, os indivíduos são tidos como objetos do poder 
soberano. Não obstante, não restam dúvidas que o modelo de estado de Direito 
influência fortemente de maneira direta e imediata o processo criminal. Dito isso, 
pode-se deduzir que o início do Estado de Direito é íntimo da organização do 
procedimento penal47. 
De forma absoluta, o sistema inquisitivo foi desacreditado, mormente por recair 
no erro psicológico de acreditar que um mesmo indivíduo possa ser capaz de exercer 
funções tão incompatíveis como investigar, acusar, defender e julgar. 
O modelo misto teve sua primeira aparição na França, pós reforma do sistema 
inquisitivo em razão da Revolução Francesa. A origem remete ao Code d’instruction 
criminelle de 1808 e se propagou rapidamente para os mais diversos códigos penais. 
Com o fracasso do sistema inquisitivo e a gradual mudança para o sistema 
acusatório, o poder estatal manteve a titularidade absoluta do poder punitivo, o que 
ao mesmo tempo não podia entregar ao particular a atividade de punir e função de 
conduzir a persecução. Sendo assim, fez-se necessário entregar a atividade de 
 
45LOPES JR, Aury. Fundamentos do processo penal: introdução crítica. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 
2017, p. 170. 
46 BECCARIA. Cesare. Dos delitos e das penas. Tradução J. Cretella Jr. e Agnes Cretella. São Paulo: 
Editora Revista dos Tribunais, 1999. 
47LOPES JR, Aury. Fundamentos do processo penal: introdução crítica. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 
2017. 
26 
 
acusar e julgar a titulares distintos. Nesse momento nasce o Ministério Público, com 
fim de garantir a imparcialidade do juiz. 
A doutrina processual penal classifica como sistema misto quando há a divisão 
do processo penal em duas fases, que são a pré-processual e a processual 
propriamente dita, o que em regra ocorre com a forma inquisitória na primeira fase e 
acusatória na fase do processo. 
Contudo, defende-se que o critério hábil para definir o sistema é a separação 
das funções de acusar e julgar, que existe apenas no modelo acusatório. Noutra 
inteligência, Sendra48 afirma que o fato do processo estar dividido em duas fases (pré-
processual e processual) e que em cada fase haja atuação de um juiz distinto é que 
seria suficiente para defender que o processo está sob o regime do modelo acusatório. 
Esse entendimento é visto com ressalvas por Lopes Jr.49, que identifica nessa 
classificação do sistema misto não há a identificação do núcleo fundante do sistema. 
Na sua construção didática, a mera separação da atividade de acusar e julgar não é 
núcleo fundante do sistema, logo, é insuficiente para sua qualificação. Faz-se 
necessário que a gestão das provas esteja afastada da atividade jurisdicional, isto é, 
cabem às partes a iniciativa probatória. 
Ainda, o autor retrata como um reducionismo a ideia que a mera separação da 
função de acusar e julgar seja necessário para se ter o processo acusatório. Faz-se 
necessário que a separação seja mantida, para isso a iniciativa probatória deve 
sempre estar com as partes. Assim, será possível a imparcialidade do julgador. 
 
2.2 Fase pré-processual e o devido processo 
 
Transcorrida a análise da investigação preliminar nos sistemas processuais 
desenvolvidos até então, a partir deste tópico far-se-á o estudo da investigação 
criminal à luz do devido processo, além de observar as garantias que estão previstas 
ao investigado, tendo como fonte geradora a Constituição da República Federativa do 
Brasil (CRFB) de 1988. 
 
48SENDRA, Vicente Gimeno; CATENA, Victor Moreno; DOMINGUEZ, Valentín Cortes. Derecho 
procesal penal. Madrid: Colex, 1996. 
49LOPES JR, Aury. Fundamentos do processo penal: introdução crítica. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 
2017. 
27 
 
A CRFB produziu a expansão de dispositivos garantidores, bem como 
desenvolveu o que se conhece por processo penal constitucional50. Essas garantias 
que inicialmente foram reservadas ao processo jurisdicional, mas que passaram a ser 
observadas na investigação criminal. 
Nesse ínterim, no processo penal garantista deve observar o contraditório 
tambémna fase investigatória. O que não representa, contudo, que a permissibilidade 
de aplicação de medidas cautelares com o contraditório diferido nesta fase da 
persecução penal represente uma violação à garantia do contraditório. 
O que ocorre é que a Constituição não determina que o contraditório seja prévio 
ou de forma concomitante ao ato. As partes que compõe o processo são dotadas de 
funções responsáveis por atos privativos. Logo, conforme explica Greco Filho51, o 
ponto nevrálgico consiste na oportunização de contrapor atos por meio de 
manifestações dotadas de eficiência. 
Ademais, a segurança do contraditório na sua forma garantista-defensiva deve 
observar o direito do acusado em participar, manter uma contraposição em face à 
acusação, bem como estar informado de todos os atos desenvolvidos em seu 
desfavor no trâmite procedimental, assim desenvolve Lopes Jr52. 
O entendimento de Scarance Fernandes é no sentido de que a previsão de 
normas garantidoras de direitos fundamentais frente ao poder estatal decorre da 
relação indivíduo-Estado53. 
Normas de garantia individual constam nas Constituições brasileiras desde o 
período imperial, no entanto, a atual apresenta extenso rol que prevê expressamente 
direitos de ordem individual e coletivos. 
É com a carta de 1988 que os direitos humanos ganham destaque, o que se 
permite exalta-la como documento mais amplo e discriminado acerca dos direitos 
humanos no Brasil. 
Contudo, a constituição não apresenta um rol exaustivo de garantias. Assim, 
os que estão previstos expressamente não excluem outros que possam derivar de 
princípios adotados, ou que decorra tratados internacionais. 
 
50O processo penal constitucional consiste no desenvolvimento de uma persecução penal que respeite 
as normas do garantismo, de modo que se preserve tudo que emana da Constituição Republicana. 
51GRECO FILHO, Vicente. Tutela constitucional das liberdades. São Paulo: Saraiva, 1989. 
52LOPES JR., Aury. Introdução crítica ao processo penal: fundamentos da instrumentalidade 
garantista. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. 
53FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 6. ed. São Paulo: Revista dos 
Tribunais, 2010. 
28 
 
A CRFB de 1988 reconheceu como sistema processual o acusatório, o que o 
fez de forma implícita, mas que através da Lei 13.964, de 2019, houve mudança para 
tornar expresso no Código de Processo Penal a adoção no ordenamento brasileiro do 
sistema acusatório54. 
A evolução do processo penal brasileiro, considerando este numa visão 
processualística penal, remete a um contexto de direitos e garantias fundamentais, o 
que representa um filtro aos excessos do Estado em desfavor dos indivíduos. 
Tem-se, então, o que se entende por direito processual constitucional, com 
enfoque que viabiliza a análise do processo e suas relações com a Constituição. 
Assim, é firmado que o processo penal constitucional é responsável por realizar a 
interpretação processual penal conforme à Constituição55. 
Essa evolução em matéria de direito permitiu que as normas constitucionais do 
processo superassem a ideia de que os princípios possuíssem caráter meramente 
programático, assim, passou a assumir uma natureza de norma jurídica e, ainda, de 
orientação para edição de normas que direcionam o processo penal. O 
descumprimento desses preceitos resulta na ocorrência de inconstitucionalidade 
material. 
Sendo assim, o Estado Democrático de Direito não permite outro 
direcionamento que não seja a análise do processo penal à luz da Constituição da 
República Federativa do Brasil, e que seja conforme os princípios constitucionais e 
sob a perspectiva dos direitos fundamentais, isso representa direitos públicos 
subjetivos que limitam os excessos do Estado em face da liberdade individual56. 
Em decorrência dessa mudança, o indivíduo submetido ao inquérito policial 
deve ser identificado como titular de direitos e o sujeito do procedimento, não apenas 
sujeito ao procedimento. Portanto, o indivíduo deve sempre figurar na posição de 
sujeito e titular de direitos, independentemente da fase em que a persecução penal se 
encontre. 
Logo, o reconhecimento dos princípios constitucionais na persecução penal, 
como um todo, é meio hábil a garantir que o sistema processual seja condizente com 
 
54Art. 3º-A. O processo penal terá estrutura acusatória, vedadas a iniciativa do juiz na fase de 
investigação e a substituição da atuação probatória do órgão de acusação. 
55FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 6. ed. São Paulo: Revista dos 
Tribunais, 2010. 
56 DIMOULIS, Dimitri; MARTIS, Leonardo. Teoria Geral dos Direitos Fundamentais. 5. ed. São Paulo: 
Atlas, 2014. 
29 
 
os ideais acusatórios e, ainda, que os resquícios inquisitórios sejam suprimidos. 
Não obstante o reconhecimento do processo penal constitucional, tem-se o 
impasse encontrado no processo penal, que consiste no denominador entre os valores 
de segurança e liberdade. 
Portanto, a aplicação das garantias constitucionais na fase preliminar, no que 
for cabível com a natureza e finalidade, representa um avanço no desenvolvimento de 
um processo penal que tenha viés garantidor, isto é, uma forma básica de proteção 
do indivíduo frente ao arbítrio do Estado. 
A construção do devido processo legal remete à constituição norte-americana 
do due process of law, cuja origem tem como fonte as garantias suplantadas na Magna 
Carta, especialmente aquela prevista no artigo 3957. 
Conforme lições de José Joaquim Gomes Canotilho, o due process of law 
consiste: 
Processo devido em direito significa a obrigatoriedade da observância de um 
tipo de processo legalmente previsto antes de alguém ser privado da vida, da 
liberdade e da propriedade. Nestes termos, o processo devido é o processo 
previsto na lei para a aplicação de penas privativas da vida, da liberdade e da 
propriedade. Dito ainda por outras palavras: ‘due process’ equivale ao 
processo justo definido por lei para se dizer o direito no momento jurisdicional 
de aplicação de sanções criminais particularmente graves58. 
 
Ademais, essa interpretação do devido processo permitiu ir além, resultando 
na ideia de que também deve ser respeitado o devido processo legal na criação das 
normas jurídicas, sobretudo das normas privativas de liberdade. 
A Constituição de 1988 que trouxe, expressamente, a previsão do devido 
processo legal, em seu artigo 5º, LIV59. 
Ainda, seguindo a ideia da garantia ao devido processo, faz-se necessário 
observar que no cenário de garantias que regulamentam as relações entre o Estado 
e o indivíduo, especialmente no âmbito jurisdicional penal, há conveniência que exista 
o devido processo penal60. 
No campo do processo penal, no que tange ao instrumento de persecução 
penal, vê-se a necessidade da limitação da atividade estatal. Essa narrativa faz-se 
 
57No freemen shall be taken or imprisoned or disseised, or outlawded, or exiled, or in any way destroyed, 
nor will we go upon him nor will we send upon him, except by the legal judgment of his peers or by the 
law of the land. 
58CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 4. ed. 
Coimbra: Almedina, 2000, p. 481. 
59LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; 
60GOMES, Luiz Flávio; PIOVESAN, Flávia (Coord). O sistema interamericano de proteção dos 
direitos humanos e o direito brasileiro. São Paulo: RT, 2000. 
30 
 
necessária diante da dialética que está presente no campo jurisdicional penal, a 
segurança e o direito à liberdade. Assim, os direitos de personalidade e corolários se 
tornam fonte de um sistema de liberdades públicas. 
O processo deve proporcionar ao réu a verdadeira defesa de seus direitos. A 
defesa deve ser efetivamente plena, bem como o processo deveser na sua forma 
devida e com respeito às garantias legais que a caracterizam. 
O julgamento precisa ser realizado com todas garantias processuais: 
contraditório, ampla defesa, presença do juiz e promotor naturais, presunção de 
inocência, etc. 
O direito de defesa representa uma máxima que deve ser obedecida quando 
se há um conflito de interesses. Esse direito está presente, inclusive, naqueles 
conflitos não jurisdicionais, porque não há como se decidir uma contenda sem ter 
conhecimento sobre as demandas das partes que integram a ocasião. 
Essa máxima, que tem previsão expressa na CRFB, em seu artigo 5º, LV61, 
assegura às partes litigantes no processo o direito ao contraditório e a ampla defesa, 
com os meios e recursos legais. 
A garantia da ampla defesa consiste numa exigência que concretiza o devido 
processo legal. E sua existência na constituição atual não representa uma inovação, 
tendo em vista que as constituições anteriores já previam tal garantia. 
Prevista já na Constituição imperial até a atual: 1824, 1891, 1934, 1937, 1946, 
1967, e, com a Emenda de 1969 no art. 153, § 15, pôde-se observar a similitude com 
a nota de culpa, como ocorreu em 1824, 1891, 1937 e 1946, ou ligando-se à instrução 
criminal, como em 1937 e 1946. 
Há de se observar que a relação com a nota de culpa ou a instrução criminal 
transmitia a concepção que sua aplicação era apenas no âmbito do processo penal, 
contudo a redação da Constituição de 1988 ampliou, expressamente, a qualquer 
processo judicial ou administrativo, bem como a quem esteja sendo acusado em geral. 
A garantia da ampla defesa representa a oportunidade de o réu contraditar a 
acusação, com base em atos processuais previstos legalmente, de modo a possibilitar 
a eficiência da defesa, isto é, dá-se por meio de soluções técnicas no âmbito do 
processo que proporcionam maior efetividade ao direito de defesa. 
 
61LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados 
o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; 
31 
 
Sendo assim, a ampla defesa se desenvolve por meio: do claro conhecimento 
da imputação; da apresentação das alegações frente à acusação; da supervisão da 
produção da prova e a oportunidade de constituir a contraprova; da realização de 
defesa técnica por advogado; e oportunidade de acionar o direito ao duplo grau de 
jurisdição.62 
Ademais, a ampla defesa tem como corolários as demais garantias mínimas: 
direito à informação pessoal do inteiro conteúdo da acusação; autodefesa; 
constituição de advogado; ao prazo razoável para elaboração da defesa e todos meios 
inerentes; vedação ao cerceamento da defesa; e por fim, a não autoincriminação63. 
O direito de defesa, na acertada explicação de Lopes Jr. e Gloeckner64, 
consiste em um direito-réplica, que surge com a agressão que representa para o 
sujeito passivo o início de uma imputação ou que será objeto de diligências policiais. 
Merece observar o grande erro disseminado pela doutrina brasileira que 
advoga pela inaplicabilidade do art. 5º, LV, da CRFB ao inquérito policial, tendo como 
argumento que nessa fase não há a figura do acusado, pois não foi oferecida a 
denúncia ou queixa. O que não merece prosperar, tendo em vista que a existência de 
uma notícia-crime que impute um fato delitivo ao indivíduo faz surgir no plano 
processual uma necessidade de resistência. 
Ainda, no que tange ao estudo mais aprofundado do direito à ampla defesa há 
de se observar que esse direito tem íntima relação com o binômio autodefesa–defesa 
técnica. Assim, o adequado procedimento requer que o direito à defesa técnica seja 
efetivo durante todo o processo, assim como o direito de autodefesa. Ambos 
coexistem com suas diferenças e de modo a se complementarem. 
A autodefesa tem previsão no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos65, 
bem como na Convenção Americana de Direitos Humanos66. Essa garantia é 
 
62GRECO FILHO, Vicente. Tutela Constitucional das Liberdades. São Paulo: Saraiva, 1989. 
63GOMES, Luiz Flávio; PIOVESAN, Flávia (Coord). O sistema interamericano de proteção dos 
direitos humanos e o direito brasileiro. São Paulo: RT, 2000. 
64LOPES JR. A.; GLOECKNER, R. J. Investigação preliminar no processo penal. 6. ed. rev., atual. 
e ampl. São Paulo: saraiva, 2014. E-book Kindle. 
65Artigo 14.3. “Toda pessoa acusada de um delito terá direito, em plena igualmente, a, pelo menos, as 
seguintes garantias: (...) d) De estar presente no julgamento e de defender-se pessoalmente ou por 
intermédio de defensor de sua escolha; de ser informado, caso não tenha defensor, do direito que lhe 
assiste de tê-lo e, sempre que o interesse da justiça assim exija, de ter um defensor designado ex-
offício gratuitamente, se não tiver meios para remunerá-lo (...)”. 
66Artigo 8.2.d. “(...) Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes 
garantias mínimas: d) direito do acusado de defender-se pessoalmente ou de ser assistido por um 
defensor de sua escolha e de comunicar-se, livremente e em particular, com seu defensor; (...)”. 
32 
 
composta por direitos mínimos, como podem ser citados: o direito à audiência, 
inclusive no interrogatório; o direito de presença durante os ritos processuais; o direito 
de participação em audiência; o direito de comunicar-se em sigilo com o advogado; 
assim como, o direito de postular pessoalmente67. 
Observa-se, ainda, que a autodefesa se desenvolve na sua forma ativa, quando 
o indivíduo apresenta sua versão dos fatos, ou passiva, por meio da não 
autoincriminação. 
A não autoincriminação se apresenta de duas formas, por meio do direito de 
não fazer alegações contra si, e o direito de não constituir confissão68. Tanto o Pacto 
internacional dos Direitos Civis e Políticos69, bem como a Convenção Americana sobre 
Direitos Humanos70 consagram esse direito. 
No mesmo sentido, a CRFB, em seu artigo 5º, LXIII71, assegura ao preso, e 
qualquer acusado de forma geral, o direito ao silêncio. 
Conforme leciona Aury Lopes Jr., o direito ao silencio expressa uma garantia 
mais ampla, presente no princípio nemo tenetur se detegere, tendo em vista que o 
indivíduo não deve ter sobre si prejuízos decorrentes da não colaboração com o 
desenvolvimento da atividade probatória da acusação, ou ainda, por optar pelo 
exercício do direito ao silêncio72. Ainda ensina o autor, que a opção por exercer o 
direito ao silêncio não pode se transformar numa presunção de culpabilidade, ou 
acarretar prejuízos jurídicos ao indivíduo73. 
Acerca da garantia da defesa técnica há de se observar sua previsão nos 
ordenamentos legais internacionais, tais como a Declaração Universal dos Direitos 
 
67GOMES, Luiz Flávio; PIOVESAN, Flávia (Coord). O sistema interamericano de proteção dos 
direitos humanos e o direito brasileiro. São Paulo: RT, 2000. 
68Ibid. 
69ARTIGO 14. 3. Toda pessoa acusada de um delito terá direito, em plena igualdade, a, pelo menos, 
as seguintes garantias: g) de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada. 
70Artigo 8. 2. Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não 
se comprove legalmente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, 
às seguintes garantias mínimas: g) direito de não ser obrigado a depor contra si mesma, nem a declarar-
se culpada (...). 
71LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe 
assegurada a assistência da família e de advogado; 
72LOPES JR, Aury. Fundamentos do processo penal: introdução crítica. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 
2017. 
73 O autor explica ainda, que apesar de não acarretar presunção de culpabilidade em decorrência do 
estado de silêncio, mas o acusado perde sua chance de se defender,logo assume a chance de ter 
contra si uma sentença desfavorável. 
33 
 
Humanos74, Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos75 e Convenção 
Americana sobre Direitos Humanos76. 
No mesmo sentido há previsão no ordenamento jurídico pátrio. A CFRB 
assegura o direito de defesa durante toda persecução penal77, ainda mesmo que o 
indivíduo não obtenha recursos financeiros para constituir defensor, logo fará jus à 
defesa gratuita78. No âmbito infraconstitucional há previsão no mesmo sentido79. 
Apesar de parecer óbvio, mas essa garantia visa promover o equilíbrio 
funcional entres as partes acusação e defesa, que em regra não detém conhecimento 
necessário a confrontar a acusação estatal, isto é, de forma a ser feita em condições 
técnicas paritárias com o órgão acusador80. 
O binômio defesa técnica e autodefesa apresenta substancial diferença, tendo 
em vista o caráter indisponível daquele direito, que além de ostentar o status de 
garantia do sujeito passivo há um interesse coletivo na efetiva apuração do fato81. 
O Código de Processo Penal prevê, em seu artigo 261, a necessidade da 
constituição de defensor: “Nenhum acusado, ainda que ausente ou foragido, será 
processado ou julgado sem defensor”. 
Por outro lado, a autodefesa que pode se manifestar de diferentes formas, seja 
por meio do direito de audiência, direito de presença, além do direito a postular 
 
74Artigo XI. 1. Toda pessoa acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente até 
que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe 
tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa. 
75Artigo 14.3. “Toda pessoa acusada de um delito terá direito, em plena igualmente, a, pelo menos, as 
seguintes garantias: (...) d) De estar presente no julgamento e de defender-se pessoalmente ou por 
intermédio de defensor de sua escolha; de ser informado, caso não tenha defensor, do direito que lhe 
assiste de tê-lo e, sempre que o interesse da justiça assim exija, de ter um defensor designado ex-
offício gratuitamente, se não tiver meios para remunerá-lo (...)”. 
76Artigo 8.2.d. “(...) Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes 
garantias mínimas: d) direito do acusado de defender-se pessoalmente ou de ser assistido por um 
defensor de sua escolha e de comunicar-se, livremente e em particular, com seu defensor; (...)” 
Artigo 8.2.e. direito irrenunciável de ser assistido por um defensor proporcionado pelo Estado, 
remunerado ou não, segundo a legislação interna, se o acusado não se defender ele próprio, nem 
nomear defensor dentro do prazo estabelecido pela lei; 
77Artigo 5º, LXIII: “o preso será informado de seus direitos (...) sendo-lhe assegurada a assistência da 
família e de advogado”. 
78Artigo 5º, LXXIV: “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem 
insuficiência de recursos”. 
79CPP, artigo 263: “Se o acusado não o tiver, ser-lhe-á nomeado defensor pelo juiz, ressalvado o seu 
direito de, a todo tempo, nomear outro de sua confiança, ou a si mesmo defender-se, caso tenha 
habilitação”. 
80LOPES JR., Aury. Introdução crítica ao processo penal: fundamentos da instrumentalidade 
garantista. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. 
81Ibid. 
34 
 
pessoalmente, consiste numa garantia que pode ser renunciável, não sendo imposta 
ao réu. 
A ampla defesa, e tudo a ela inerente, representa a garantia mais importante 
para o andamento e a formação do processo penal. 
Em conformidade com o que já foi exposto, o exercício do direito de defesa 
consiste na garantia que abrange os acusados em geral, ainda que em processos 
administrativos. 
A CFRB optou pela nomenclatura acusados, contudo não há óbice a extensão 
dessa garantia à fase de investigação preliminar, apenas por não estar mencionado 
indiciados82. Isso pois a opção legislativa não fora por apenas “acusados”, e sim 
“acusados em geral”, o que abrange o indiciamento, que consiste na imputação em 
sentido amplo83. 
Consoante Marta Saad, a denominação “acusados em geral” compreende 
diversos níveis de incriminação, e o que determina sua existência é a ocorrência da 
acusação, a figura do acusado e a atribuição de prática de fato ilícito a uma pessoa, 
ainda que por meio informal84. 
Ademais, há de compreender a expressão “processo administrativo” como 
equiparado a “procedimento administrativo”, que abarca o inquérito policial, o qual 
representa o meio por onde se desenvolve a investigação preliminar, conforme 
modelo adotado no Brasil. 
De mais a mais, o direito de defesa precisa ser analisado à luz do novo 
paradigma constitucional, de valorização dos direitos fundamentais e difusão da força 
normativa constitucional85. A Constituição de 1988 trouxe a ideia da supremacia da 
dignidade da pessoa humana, em sintonia com ordenamentos internacionais que 
adotam como principal pilar esse direito fundamental. Nesse sentido, o modelo 
garantista de processo penal ascende e se desenvolve para conter os abusos e 
arbitrariedades presentes no modelo inquisitório. 
O comentário de Aury Lopes Jr. é lúcido ao apontar que a postura do 
 
82LOPES JR., Aury. Introdução crítica ao processo penal: fundamentos da instrumentalidade 
garantista. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. 
83Ibid. 
84SAAD, Marta. O direito de defesa no inquérito policial. São Paulo: RT, 2004. 
85BATALHA, Sergio Fedato. Principiologia Para um Devido Processo Penal Constitucional: A 
Ampla defesa e o contraditório. Disponível em: www.conteudojuridico.com.br. Consulta realizada em 
05.02.2022. 
35 
 
constituinte no artigo 5º, LV86, tem viés totalmente garantista, e o que há é uma 
imprecisa escolha terminológica (falar em processo administrativo ao invés de 
procedimento), logo, essa construção não pode servir como obstáculo para aplicação 
no inquérito policial87. 
Outrossim, faz-se necessário interpretar o Código de Processo Penal lado a 
lado com a máxima eficácia do artigo 5º, LV, da CFRB, com isso, torna-se inevitável 
a incidência do direito de defesa na investigação preliminar88. 
Não obstante o inquérito policial ser um processo administrativo, faz-se 
necessário que os direitos fundamentais do indiciado sejam observados, sobretudo os 
que são inerentes ao direito de defesa. 
Os direitos fundamentais garantidos na CRFB constituem um sistema de 
proteção que visa, em sua maioria, assegurar violações em face de ilegalidades no 
que tange à matéria processual penal. 
Portanto, observa-se que o devido processo penal possui diversas garantias 
reunidas que buscam produzir um processo que se afaste de ilegalidades e injustiças. 
 
3 A INVESTIGAÇÃO CRIMINAL À LUZ DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO 
 
Tem-se a investigação criminal como conjunto de atividades produzidas de 
forma sistemática pelo Estado, através dos seus órgãos. O ponto de partida é com o 
conhecimento da notitia criminis, o qual é dotado de caráter prévio e de natureza 
preparatória à fase de conhecimento. Sua pretensão reside na averiguação da autoria 
e análise das circunstâncias de um fato aparentemente ilícito, de modo a justificar ou 
não o processo. 
A investigação criminal tem como fundamento três pilares básicos: o primeiro 
representa a necessidade de esclarecimento de um fato que está oculto. O segundo 
fundamento consiste numa função simbólica, em que a instauração da investigação 
pode representar uma ruptura na ação delituosa e impedir a consumação da ação, ou 
até mesmo amenizar os efeitos decorrentes. Assim, há uma promoção da paz social, 
inclusive a sensação de paz, que também consiste num aspecto importante da função 
 
86LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados 
o contraditório e ampla defesa, com os meios

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