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Universidade Federal do Rio Grande do Norte Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes Departamento de História Mestrado Profissional em Ensino de História IRAN ADRIANO SOUSA DE OLIVEIRA A HISTÓRIA QUE MARCA E ENSINA: PROTAGONISMO JUVENIL E ENSINO DE HISTÓRIA NAS ESCOLAS ESTADUAIS DO CEARÁ EM 2016 Natal – RN 2021 1 Iran Adriano Sousa de Oliveira A HISTÓRIA QUE MARCA E ENSINA: PROTAGONISMO JUVENIL E ENSINO DE HISTÓRIA NAS ESCOLAS ESTADUAIS DO CEARÁ EM 2016 Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado Profissional em Ensino de História do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito para obtenção do título de Mestre em Ensino de História. Orientador: Dr. José Evangelista Fagundes - UFRN Natal – RN 2021 Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes - CCHLA Oliveira, Iran Adriano Sousa de. A História que marca e ensina: protagonismo juvenil e ensino de História nas escolas estaduais do Ceará em 2016 / Iran Adriano Sousa de Oliveira. - Natal, 2021. 103f.: il. color. Dissertação (mestrado) - Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Programa de Mestrado Profissional em Ensino de História, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2021. Orientador: Prof. Dr. José Evangelista Fagundes. 1. História - Dissertação. 2. Protagonismo - Dissertação. 3. Ensino - Dissertação. I. Fagundes, José Evangelista. II. Título. RN/UF/BS-CCHLA CDU 94:37 Elaborado por Heverton Thiago Luiz da Silva - CRB-15/710 2 Iran Adriano Sousa de Oliveira A HISTÓRIA QUE MARCA E ENSINA: PROTAGONISMO JUVENIL E ENSINO DE HISTÓRIA NAS ESCOLAS ESTADUAIS DO CEARÁ DO ANO 2016 Banca Examinadora: ____________________________________________ Dr. José Evangelista Fagundes - UFRN Orientador ____________________________________________ Prof. Dr. Roberto Airon Silva - UFRN Membro Examinador Interno _____________________________________ Dra. Ana Carla Sabino Fernandes - UFC Membro Examinador Externo _____________________________________ Prof. Dr. Lígio José de Oliveira Maia - UFRN Membro Suplente Natal – RN 2021 3 AGRADECIMENTOS A vida da gente vai acontecendo e o tempo é implacável. Como ser reflexivo, pensante, deparo-me lembrando de agradecer a Deus pelo dom da vida. Agradecer por ter sido criado, cercado de amor e de bons exemplos, que herdo e carrego da trajetória dos meus pais. Sou o Adriano da Maria e do Raimundo, como se costuma ouvir nos interiores, longe da cidade grande. Essa grande herança não é de capital, mas no campo dos valores morais fundados no respeito, na humildade, da perseverança, mesmo sabendo o quanto esse casal se esforçou para me garantir o necessário para viver com dignidade. E sou muito grato aos meus pais. Muito obrigado! Agradeço a todos os professores e professoras que me fizeram chegar até aqui. Muitos e muitas de vocês foram grandes inspirações e transpirações, exemplos de luta e dedicação, que formaram centenas, milhares e, sem sombra de dúvidas, eu os/as observava e guardo no coração cada aprendizado, cada palavra boa dita mesmo com raiva ou com afeto. Muito obrigado, mestres. Agradeço também a cada escola que me abriu as primeiras portas para exercer com amor e dedicação essa profissão de professor que eu abracei quando ainda muito jovem. Agradeço a todos os colegas com quem compartilhei saberes, salas de professores, com o indispensável cafezinho. Aos que fizeram o cafezinho, limparam as salas e banheiros para o uso geral, meu afeto e respeito idêntico. Todos que estão na escola merecem nossa reverência, portam-se como educadores a tempo e a hora. E as boas resenhas! Professores, geralmente fora do serviço se pegam de repente falando de escola, de educação e, claro, dos nossos grandes sentidos de existência, os nossos alunos e alunas. Aos educandos, minha paixão maior. Quantos e quantas passaram por nós e deixamos e recebemos. Amizades boas construídas neste terreno escolar, como não deixar de citar com plena felicidade. Agora, minha família doméstica. A esposa, dona Gardênia, sempre incentivando, cobrando, lembrando da responsabilidade e dizendo umas verdades para o sujeito se orientar. Muito obrigado a ela, que me apoiou, acredita no meu potencial e vive de perto com nossas lutas, como professora também que é. As duas bênçãos do papai são Alycia, a primogênita, com doze anos e muito zelosa, sempre me alertava e cobrava que eu fosse estudar. Já a Marina, entre idas e vindas dessa pandemia de Covid-19 que o mundo atravessou, queria mais era a companhia do papai para comer, brincar, assistir filminho e ficar juntinha. Foi um tempo difícil, como sabemos, mas na vida dita normal, que não é nada disso, nunca teria tido tanto tempo 4 com qualidade para viver mais perto delas, das crianças e no cuidado com a família, meus pais e dividir ombro e chorar a perda de amigos e conhecidos. Agradeço até o fim e para sempre aos amigos e amigas do Rio Grande do Norte, que nos acolheram em sua cidade e foram companheiros e companheiras sempre gentis no cotidiano das atividades, refeições, companhia para tudo. Povo generoso e presente. Gratidão que estendo também aos conterrâneos cearenses que estiveram juntos nessa jornada, dividindo conhecimento, lanche, incentivando e puxando o outro pela mão para ninguém desistir de concluir esse projeto. Agradeço ainda aos professores e professoras desse mestrado profissional, que, com muita competência e empatia foram grandes aliados, compreensivos e incentivadores. Dedico menção especial aos professores que me deram condições de novos aprendizados, orientação e chance de prosseguir este mestrado. Obrigado Juliana Teixeira Souza, Vanessa Spinoza, Margarida Dias, Roberto Airon Silva, Lígio José de Oliveira Maia, Francisco Santiago Junior, Magno Francisco de Jesus Santos e, em especial, meu orientador, José Evangelista Fagundes, que deu condições de continuidade de orientação e aqui estamos na fé e esperança que tudo corra bem. Muito obrigado a todas e todos. Agradecimento especial também merecem todos os alunos e alunas da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Luiza Távora Promorar, onde estou há onze anos exercendo minha carreira pública de professor e uma experiência de gestor. Vocês me realizam e são parte muito significativa desse trabalho, pois acredito que pelas vossas existências, podemos mudar o mundo para melhor. E aos que não foram meus alunos, mas foram ocupantes de luta por outras escolas que pude ter convivência e contribuíram nesse trabalho com suas memórias e trajetórias. Obrigado e gratidão em servir. 5 RESUMO Este trabalho tem como objetivo refletir como a História ensinada tem a capacidade de inspirar e encorajar pessoas a fazerem intervenções práticas na sociedade. Para tal, observamos e analisamos criticamente as lutas históricas das juventudes brasileiras no contexto republicano mais recente e apresentamos a experiência de jovens estudantes cearenses no processo de ocupação das escolas estaduais em 2016. Buscamos em autoras, como SCHMIDT, 2009 e CHAUÍ, 2016, a compreensão de que o processo histórico é dinâmico, supõe troca de saberes e nunca imposição. A ideia de cidadão participante e educação cidadã (LAVILLE,1999), reforça o debate em torno do protagonismo juvenil e sua historicidade (SOUZA, 2006). No tocante aos documentos oficiais que norteiam o ensino de História,tomamos como referência a Base Nacional Comum Curricular (BNCC, 2018), o Documento Curricular Referencial do Ceará (DCRC) e Projetos Pedagógicos das escolas onde atuamos. Ou seja, a legislação educacional brasileira que traz ao campo das Ciências Humanas o incentivo ao protagonismo juvenil. Enfim, a proposta de intervenção pedagógica que chamamos de produto, seleciona cinco ementas de disciplinas eletivas elaboradas pela rede estadual do Ceará, que compõem o itinerário formativo, que coadunam com esses propósitos de formação de uma juventude disposta a compreender o presente e atuar como protagonista por meio de intervenções sociopolíticas elaboradas por eles. Palavras-Chave: Ensino de História. Protagonismo Juvenil. Movimento Estudantil. Cidadania. 6 ABSTRACT This work aims to reflect how the taught history has the ability to inspire and encourage people to make practical interventions in society. To this end, we observe and critically analyze the historical struggles of Brazilian youth in the most recent republican context and present the experience of young students from Ceará in the process of occupying state schools in 2016. We searched authors, such as SCHMIDT, 2009 and CHAUÍ, 2016, for the understanding that the historical process is dynamic, presupposes the exchange of knowledge and never imposition. The idea of participating citizen and citizen education (LAVILLE, 1999) reinforces the debate around youth protagonism and its historicity (SOUZA, 2006). Regarding the official documents that guide the teaching of History, we take as reference the Common National Curriculum Base (BNCC, 2018), the Reference Curriculum Document of Ceará (DCRC) and Pedagogical Projects of the schools where we work. That is, the Brazilian educational legislation that brings to the field of Human Sciences the encouragement of youth protagonism. Finally, the pedagogical intervention proposal that we call product, selects five menus of elective courses prepared by the state network of Ceará, which make up the training itinerary, which are consistent with these purposes of training a youth willing to understand the present and act as protagonists through sociopolitical interventions designed by them. Keywords: History Teaching. Youth Protagonism. Student Movement. Citizenship. 7 LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS BNCC Base Nacional Comum Curricular DCRC Documento Curricular Referencial do Ceará EEEP Escolas Estaduais de Educação Profissional EEFM Escola de Ensino Fundamental e Médio EEMTI Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral EJA Educação de Jovens e Adultos EMC Educação Moral e Cívica FUNDEB Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica GTN Grande Tancredo Neves LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação no Brasil LPJ Levante Popular da Juventude MCP Movimentos dos Conselhos Populares ME Movimento Estudantil OSPB Organização Social e Política do Brasil PCA Professor Coordenador de Área PDT Partido Democrático Trabalhista PEC Projeto de Emenda Constitucional PIB Produto Interno Bruto PMDB Partido do Movimento Democrático Brasileiro PNE Plano Nacional de Educação PNLD Programa Nacional do Livro Didático PPDT Projeto Professor Diretor de Turma PT Partido dos Trabalhadores PSDB Partido da Social Democracia Brasileira PSOL Partido Socialismo e Liberdade SEDUC Secretaria de Educação do Estado UBES União Brasileira dos Estudantes Secundaristas UFC Universidade Federal do Ceará UNE União Nacional dos Estudantes 8 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 9 CAPÍTULO 1 - PROTAGONISMO JUVENIL NA POLÍTICA ....................................... 14 1.1 De estudante a professor, o ambiente formativo das lutas que travamos ........... 16 1.2 Protagonismo juvenil, historicidade e realidades .................................................. 23 1.3 A disciplina escolar de História e a legislação do Ensino Médio em contexto .... 30 1.4 As ocupações estudantis nas escolas estaduais do Estado do Ceará em 2016 num contexto de greve dos professores ........................................................................... 40 CAPÍTULO 2 - PROTAGONISMO JUVENIL NA COMUNIDADE ESCOLAR .......... 45 2.1 A caminhada junto a escola e outros apontamentos .......................................................... 49 2.2 O conhecimento histórico e a legislação educacional inseridos nessa ideia da intervenção política e social ..................................................................................... 56 2.3 Reflexões sobre as entrevistas/formulários dos alunos no contexto das ocupações de 2016 ....................................................................................................................... 64 CAPÍTULO 3 – O DESENVOLVIMENTO DO PRODUTO ............................................ 73 3.1 Enfim, o produto....................................................................................................... 78 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................ 87 REFERÊNCIAS .................................................................................................................... 89 ANEXO A - QUANTIDADE DE VOTOS (ELEIÇÕES 2008) .......................................... 93 ANEXO B - QUANTIDADE DE VOTOS (ELEIÇÕES 2010) ........................................... 94 ANEXO C - INFORMATIVO APEOC: PAUTA DE REIVINDICAÇÕES DA GREVE DE 2016 ..................................................................................................................... 95 ANEXO D - TRECHOS DO PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO EEFM LUIZA TÁVORA PROMORAR .......................................................................................... 96 ANEXO E - PROGRAMA MAIS EDUCAÇÃO ................................................................. 98 ANEXO F - ATA DE ELEIÇÃO DA ÚLTIMA GESTÃO DO GRÊMIO ESTUDANTIL DA EEFM LUIZA TÁVORA PROMORAR ......................................................... 99 ANEXO G - ATA DA PRIMEIRA REUNIÃO DA ÚLTIMA GESTÃO DO GRÊMIO ESTUDANTIL DA EEFM LUIZA TÁVORA PROMORAR ............................ 100 ANEXO H - ATA DA SEGUNDA REUNIÃO E ÚLTIMO REGISTRO FEITO EM ATA ESCOLAR DO GRÊMIO ESTUDANTIL DA EEFM LUIZA TÁVORA PROMORAR EM JUNHO/2015 .......................................................................... 101 ANEXO I - QUESTIONÁRIO APLICADO AOS PARTICIPANTES ........................... 102 9 INTRODUÇÃO Este trabalho visa, antes de tudo, mostrar as pessoas em geral que se interessam por História que essa ciência inserida na educação formal escolar ou em meio aos debates públicos que há tempo se desenvolvem no seio da sociedade de diversas maneiras, por meio de filmes, livros, documentários, canais de internet, é mobilizadora de muitas paixões. Desde os que se dizem apenas apaixonados de alguma forma por essa ciência aos que vivem dela profissionalmente, como eu, não há dúvidas quanto ao seu poder transformador e potencial de mover as pessoas. Fui criado por pais semianalfabetos, que vieram do interior do Estado do Ceará para tentarem uma vida melhor na cidade grande que é Fortaleza. Composta a família de um único filho, que sou eu, meus pais fizeram grandes esforços para bancar meus estudos, mesmo como bolsista de uma escola confessional católica aqui na capital. O bom de narrar minha trajetória escolar de formação e estudar História é que nas leituras que fazemos sobre a educação no Brasil, passo a entender hoje os motivos dessa situação, como podemos observar em (FONSECA,1995, p.20): Desde meados dos anos 70, o aumento das verbas públicas para o ensino constitui-se uma das principais bandeiras de luta dos educadoresbrasileiros. Na Constituição aprovada pelo Congresso Nacional em 1988, prevaleceu o reconhecimento da necessidade de elevação do percentual de verbas para educação. No seu artigo 212, a atual Constituição Federal estabeleceu que a União aplicará nunca menos de 18%, e os Estados e Municípios, 25% no mínimo, da arrecadação de impostos no setor educacional. Entretanto, em seu artigo 213, fica assegurada a aplicação destes recursos públicos não só nas escolas públicas, mas também em escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas que “comprovem finalidade não-lucrativa”. Perfazendo minha trajetória como estudante e como cidadão em construção, defendo a escola como espaço de uma formação propedêutica e humanística sem precedentes. Sabendo que nos constituímos como pessoas, a partir das relações que desenvolvemos em meio às instituições sociais, credibilizo aos pais e, sobretudo, professores e professoras, pelo bem que geram seus saberes e esforços para a construção de um país mais justo. E assim, nessa busca na qual os jovens são parte essencial de qualquer mudança ou transformação social, minha pesquisa procura demonstrar que me apoio na ideia de valorizar toda forma de protagonismo juvenil que, a meu ver, tem na escola terreno muito fértil para o seu desenvolvimento. Mesmo eu sendo filho de uma geração que iniciava a década de oitenta, saindo e se safando de um regime ditatorial civil militar, tínhamos o autoritarismo ainda pujante, mas também o grande desejo de liberdade. Escolhi amar e exercer a segunda parte. Fiz-me jovem e minhas escolhas caminharam nesse horizonte, da justiça, da fraternidade e da crença de que podemos fazer a 10 diferença. Portanto, na minha escrita do primeiro capítulo, o/a leitor/a mais atento vai perceber a minha jornada de me formar professor e as descrições e exemplos que trago sobre a participação política da juventude na história republicana mais recente, com destaques para o movimento estudantil em pleno regime civil militar e as conquistas mais atuais das juventudes em nossa Nova República, num período de redemocratização. Para aprofundar um pouco mais o debate acerca do protagonismo juvenil, a autora Regina Magalhães traz um enfoque que busca mostrar o enquadramento das elites dirigentes do país, no trato com uma parcela da juventude. Em nome do protagonismo juvenil, jovens e ONGs espalhados por todo o Brasil têm prestado serviços gratuitos à coletividade, prática nomeada, geralmente, de trabalho voluntário e explicada por meio da valorização da cidadania, da educação e da solidariedade. (SOUZA, 2006, p.8). No entanto, não é esse protagonismo que vislumbro para nossa juventude. O discurso da solidariedade, cidadania e educação são muito convincentes, mas desenho a ideia de que as juventudes se apresentem e proponham seus projetos, seus sonhos. Para tal, fomos buscar outras formas de protagonismo juvenil, estudantil, que ou começavam nas escolas, sendo potencializadas nelas, ou nas ruas ou em outras experiências de coletivos de mulheres, negros, LGBTQI+, organização popular, que a juventude se deparava no seu convívio social. E não faltaram experiências para se referenciar. Então, a História, em suas composições mais atualizadas, passando a incluir novas didáticas e olhares de pesquisa, desde algum tempo incluindo novos personagens, novos objetos, traz a possibilidade de explorarmos esse campo da juventude e suas lutas. Quanto a isso, trago pequenas demonstrações de como alunos da escola que trabalho, EEFM Luiza Távora Promorar, desenvolveram nestes últimos anos ações protagonistas em prol de suas vidas e suas causas. Na sequência, faço a defesa de que o componente curricular de História, seja na sua parte explícita ou oculta, constitui-se como elemento necessário para fazer essa juventude escolar despertar, entender que estudar História jamais será meramente memorizar ou decorar fatos e datas, mas nosso exercício de magistério, em comunhão e consonância com os estudantes, só tem sentido quando se compreende pensar historicamente e que a nossa ação coletiva se volte para o enfrentamento de tantas injustiças e processos de exclusão e miséria que nos cercam. Se não tivermos condições de reclamar, propor, mesmo que inicialmente na nossa escola ou no nosso bairro, como poderemos estar aptos, preparados para embates mais 11 audaciosos para toda uma vida? Essa passagem em Laville (1999, p. 125) dá uma certa mudança de sentidos ao se estudar uma nova História. A ideia de cidadão participante começou a substituir a de cidadão-súdito. O ensino da história não deixou de ganhar com isso. Ao contrário, viu a função de educação para a cidadania democrática substituir sua função anterior de instrução nacional. Ademais, nossa legislação educacional é campo de disputa entre aqueles que querem manter privilégios para setores privados que tratam a educação como mercadoria e outros que defendem a lógica da valorização do serviço público e do aprofundamento da maior participação política e emancipação. Estes últimos não fogem do bom combate e são estes dos que mais precisamos para que o processo educacional seja cada vez mais democrático, participativo e inclusivo, certos de que não são batalhas fáceis ou que decorreram da noite para o dia. Entre governos autoritários, passando por outros mais neoliberais e/ou populares progressistas, os educadores brasileiros que estiveram nas construções de nossa Constituição Cidadã de 1988, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996, das Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica de 2013, do Novo Ensino Médio de 2017 e da Base Nacional Comum Curricular de 2018, lançaram modelos, propostas e encaminhamentos que precisaram ser trilhados e percorridos por todos nós que fazemos a educação neste país. E avaliar, experimentar e, se preciso, corrigir rotas é um exercício preciso, pois temos uma dinamicidade como nunca vista no mundo. “É preciso estar atento e forte”. E trago à tona um debate da necessidade e composição do grêmio estudantil em qualquer unidade escolar. Esse colegiado, que tem uma historicidade, proibido de se organizar na ditadura civil militar, adentrou com galhardia as ruas, praças e corações, mesmo diante das adversidades de outrora. E no presente, com todas as possibilidades de fazer História, por hora se encontra desarticulado na escola Luiza Távora Promorar, mesmo com o apoio institucional da secretaria de educação do Estado (SEDUC). A Coordenadoria de Protagonismo Estudantil é uma estrutura de gestão e operacionalização de ações e iniciativas para a promoção do protagonismo estudantil nas escolas da rede estadual de ensino. Entende-se o protagonismo como elemento fundamental na formação dos estudantes como pessoas humanas, futuros profissionais, cidadãos e potenciais agentes de transformações positivas em suas comunidades, na medida em que compreendem seu papel na sociedade atual. (SEDUC, 2021). Esse protagonismo juvenil mais materializado nesta pesquisa também se apresenta ao leitor quando discorro sobre o contexto do movimento de ocupações de dezenas de escolas estaduais em 2016 no Ceará, quando ao mesmo tempo nos ocorria uma greve de professores da 12 rede estadual. Daí, estudantes e professores com pautas em comum e diferentes tocamos nossos movimentos em tom de solidariedade. Como um professor/pesquisador que teve que lidar com algo considerado como fato histórico tão do presente, reportei-me ao uso de fontes históricas de jornais online, imagens de mídias ou redes sociais, como o Facebook ou Instagram, entrevistas via formulários respondidos por oito alunos ocupantes e, confesso, que esse campo da história digital é muito novo e recente, mas uma realidade que deve ser considerada. No capítulo dois, proponho-me a fazer uma descrição mais minuciosa de como vejo minhacomunidade escolar e apresento um panorama muito afetuoso e subjetivo sobre os alunos e alunas com quem lido diariamente por volta de onze anos numa relação de ensino/aprendizagem que teve momentos que estive como professor e como gestor escolar, na função de diretor. Utilizando entre tantos documentos legislativos e normativos de nossa educação, reporto-me à Base Nacional Comum Curricular (BNCC), na qual encontro conforto e entusiasmo para me jogar nos objetivos de alcançar propor uma formação baseada no conhecimento histórico, que encoraje estudantes ao protagonismo e inquietação com as injustiças que nos rodeiam. E parto do pressuposto que só mudamos o que conhecemos. Então, compreender os processos históricos, se tornam urgentes. Valorizar a diversidade de saberes e vivências culturais e apropriar-se de conhecimentos e experiências que lhes possibilitem entender as relações próprias do mundo do trabalho e fazer escolhas alinhadas ao exercício da cidadania e ao seu projeto de vida, com liberdade, autonomia, consciência crítica e responsabilidade. (BNCC, 2018). Assim, vou buscando fundamentação em autores do campo do saber histórico como (SCHMIDT, 2009, pág.34), que me alerta e relata como a História enquanto disciplina escolar, “demanda um processo de internalização de conteúdos e categorias históricas viabilizadores de processos de subjetivação, isto é, de interiorização dos sujeitos, com vistas às ações transformadoras e mudança da realidade”. Na esteira da compreensão de que somos professores profissionais e porta vozes de saberes históricos, (CHAUÍ,2016) nos observa categoricamente que nosso conhecimento histórico não deva ser impositivo, pois ninguém é classicamente, dono de nenhuma verdade. Há o risco ideológico de diferenciar o aluno (e a classe social) do professor (e da vanguarda) em termos de imaturidade/maturidade, ignorância/saber, alienação/verdade, em suma, diferenciar hierarquizando e fazendo com que um dos pólos seja uma espécie de receptáculo vazio e dócil no qual venha depositar-se um conteúdo exterior trazido pelo outro polo. Com isso, sob o nome de conscientização, reedita-se sob nova roupagem o conservadorismo e o autoritarismo da educação que se pretendia combater.” (CHAUÍ, 2016, p. 255). 13 O trabalho reforça a necessidade de o professor ter uma relação muito segura dos saberes históricos, considerando as experiências de vida e expectativas dos estudantes, nunca sendo panfletário ou vulgar. A finalização do capítulo ocorreu com a análise das respostas de alunos que passaram pela experiência da ocupação da escola Walter de Sá Cavalcante, espaço esse que abrigou além dos seus alunos, uns/umas voluntariosos/as da escola que eu trabalho, o Luiza Távora Promorar. Neste espaço de reflexão e entrevista, foi enriquecedor ouvir pontos de vista diferentes e concepções de História, luta política, legados para uma vida, da parte deles e delas. No terceiro e último capítulo se propõe a ideia de um produto a ser trabalhado com os estudantes, tomando como referência o Catálogo de Componentes Eletivos das Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral (EEMTI) da rede estadual do Ceará para o ano de 2021, mesmo minha escola não adotando ainda o tempo integral. Porém, ao se desenhar a nova proposta do Novo Ensino Médio, que vai apresentar um aumento de carga horária mesmo nas escolas regulares, irá chegar um momento que alunos, professores, gestão e família terão que escolher o percurso de itinerários formativos, pelos quais parte da carga horária dos alunos do ensino médio será composta de uma base comum e outra parte eletiva e complementar. Para tanto, selecionei ementas que combinam com os propósitos deste trabalho e de minha prática docente, de elevar a compreensão sobre o pensar e fazer histórico, com vistas a construção de um ambiente propício ao reforço das lutas por um mundo mais justo de se viver. 14 CAPÍTULO 1 - PROTAGONISMO JUVENIL NA POLÍTICA Numa das frases atribuídas a Ernesto Guevara de La Serna, um dos maiores ícones revolucionários do século XX, “Che” cravou: “ser jovem e não ser revolucionário é uma contradição genética”. Haverei de concordar em muito grau com esta afirmativa, pois compreendo que a fase da nossa juventude é de fato inquietante. Estamos postos à prova num mundo adulto em construção, com sua cultura, sistema e situações diversas. E isto posto nos desafia a pensar e agir sobre que mundo herdamos, o que queremos que permaneça e o que se modifique. Talhados pela sociedade, seio familiar, escola e demais instituições, vemo-nos em contato com a realidade, que pode nos confortar ou inquietar a partir de onde estejamos inseridos. Versando um pouco sobre minha trajetória, desde criança situado numa cidade como Fortaleza, crescendo num bairro periférico e cercado por situações de injustiças sociais, observava uma cidade apartada, de bairros diferentes, casarões e casebres, pessoas empregadas e bem remuneradas, outras em situações de vulnerabilidade, sem moradia e sem trabalho, pedintes e desprovidos de estudos, enfim, um cenário da década de oitenta e noventa do século passado, no qual eu crescia observando atentamente este cotidiano que pulsava ainda uma violência urbana, diria menor do que temos hoje, mas que também assustava. Usuário de transporte público, percorrendo paisagens na ida e vinda de casa para a escola, eu via uma Fortaleza bela, mas muito desigual. Como ser jovem e não se inquietar com tudo isso? Na escola em que estudei durante quase toda minha educação básica, à época chamado primário e ginásio, Colégio Pio X, que era particular, eu fui bolsista, refletindo que mesmo no ambiente privado de estudo, lembro dos meus amigos como filhos de pais da classe trabalhadora. Importante afirmar esta memória para situar que o meu convívio se deu com pessoas de origens e hábitos simples, bem diferentes e distantes do que seria uma classe média alta com padrões de consumo e frequentadores de locais mais adequados a uma burguesia média. Neste tempo que recordo, não era comum as pessoas mais descapitalizadas frequentarem churrascarias, restaurantes finos, barracas de praia e nem mesmo pizzarias. Comprar roupas em shoppings centers era para a classe média que tinha mais dinheiro ou crédito. Aos populares como eu, o centro da cidade e seu comércio de rua eram possibilidades. Um cineminha nas férias, especialmente o Cine São Luiz da Praça do Ferreira, coração da cidade, uma ida ao interior para visitar parentes e muita brincadeira de rua nos arredores de casa e no bairro: bila (ou bola de gude), bola, raia e outras diversões nos era comuns. Todo esse relato se faz importante para mim e o leitor, para situar qual seria o meu universo, meu dito lugar no mundo. 15 A escola em questão foi muito importante para provocar em mim esse tipo de sentimento humanitário de quem se preocupa e deseja um mundo mais justo. Era uma escola da ordem dos capuchinhos, com uma tradição franciscana e lembro bem da força das Campanhas da Fraternidade sobre minha formação cristã e humanista com forte apelo ao social. Estudei além de História e Geografia, no chamado campo que hoje denominamos de Ciências Humanas, as disciplinas de Organização Social e Política do Brasil (OSPB) e Educação Moral e Cívica (EMC). O que poderia parecer passível de crítica ou doutrinamento intencional, para reproduzir os ditames que o sistema educacional brasileiro pretendia naquele período, me reporto a ALMEIDA (2009), que afirma: O objetivo de nosso trabalho foi investigar o papel da EMC e OSPB na formação de posturas de consentimentos e de consonância ao pensamento do regime militar. Tentaremos evidenciar nos manuais didáticos os argumentos que serviram aos ideais do estado implantado com o golpe de 1964. [...] a compreensão de como os argumentos dos manuais de moral e civismo searticularam com as justificativas ideológicas do discurso institucional. (ALMEIDA, 2009, p.1). Assim, creio que pela minha vivência de mundo, pelos conhecimentos adquiridos com meus professores da dita área de humanas e pelo contexto de estudar essas disciplinas num período de enfraquecimento do regime militar em meados da década de oitenta, esses propósitos institucionais fizeram em mim efeitos diferentes. Quis sempre compreender os mecanismos da política, como eles se processam e porque não seria possível, por meio dela, inverter a lógica de uma sociedade brasileira tão desigual. Sentia que a escola era o lugar propício para minha formação intelectual e ali, crescendo, inquietava-me para tentar mudar, um pouco que fosse, o mundo para melhor. Bom reforçar que a escola em questão tinha uma formação cristã católica, sendo considerada uma escola respeitável nos círculos sociais da cidade. Desta feita, posso afirmar que minha formação de valores foi sedimentada pela família, escola e outros espaços, neste horizonte de ter e ver um mundo socialmente mais justo. No universo escolar me tornei um aluno apaixonado pelas letras, em especial pelas disciplinas chamada Estudos Sociais, nas quais hoje se encaixam História, Geografia e afins. Como aluno, recordo-me de sempre estar disposto a integrar as composições de lideranças de sala, sendo também envolvido no campo dos esportes e atividades culturais, como teatro e outras atividades. Essa minha trajetória estudantil, engajada a princípio na escola, fez despertar em mim esse sentimento e desejo de ação também aplicada a uma maior participação e atuação para além dela, como na igreja católica, em movimentos de grupos de jovens, pastorais e, posteriormente, movimentos sociais, sindicais e partido político. Assimilei desde cedo que, para mudarmos algo que nos afeta, temos de estar inseridos na luta pelo processo de mudança. 16 1.1 De estudante a professor, o ambiente formativo das lutas que travamos Com essa compreensão de termos outras perspectivas sociais de um mundo melhor para viver, haveria a necessidade de unir estudantes, trabalhadores e trabalhadoras, do campo e da cidade, donas de casa, num relato não misógino de minha parte, mas realmente concreto pelo fato de muitas mulheres naqueles idos anos oitenta e noventa ainda se encontrarem muito dedicadas ao lar e à família, tendo como exemplo minha própria mãe e as mulheres da vizinhança. Como estudante, considerava-me numa posição privilegiada de estar no meio escolar com acesso ao saber geral, tão necessário e útil para entender que nós todos, dotados dessa compreensão do que nos cerca, tínhamos um papel fundamental para a mudança desse quadro social, idealizando a estudantada como grandes mobilizadores dessa transformação social numa espécie de agenda formativa de educação política do campo popular. Na minha cabeça, o protagonismo estudantil era uma realidade necessária e possível. A instituição da lei federal 7.398/1985, de autoria do deputado Aldo Arantes, membro do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), que fora inclusive presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE) no biênio 1961/1962, garantiu a possibilidade formal dos estudantes secundaristas organizarem seus grêmios estudantis livres a partir daquela data, numa continuidade protagonista, em que muitos já se encontravam mobilizados. Com o fim da ditadura civil-militar, o movimento estudantil voltou às ruas para defender suas bandeiras históricas e a consolidação da democracia no país. Em 1984, a UNE participou ativamente da campanha das “Diretas Já”, com manifestações e intervenções nos principais comícios populares daquele período. A entidade também apoiou a candidatura de Tancredo Neves à Presidência da República. Em 1985, foi aprovado pelo Congresso Nacional o projeto, de autoria do deputado e ex-presidente da UNE Aldo Arantes, que trazia a entidade de volta para a legalidade. (CREATIVE COMMONS, [s.d.]). Na segunda metade da década de oitenta, os processos de maior participação política das agremiações estudantis se evidenciaram nas escolas e universidades. Os grêmios livres, centros acadêmicos e diretórios centrais dos estudantes se incorporaram à dinâmica das cidades e tem-se como grande símbolo e marco da força desse movimento juvenil os “caras pintadas”, que serão decisivos em atos de rua pela disputa e força colocada na narrativa pela deposição/impeachment do então presidente Fernando Collor de Mello (1990-1992). Durante as eleições de 1989, a UNE se posicionou contra a candidatura de Fernando Collor de Melo, criticando seu aspecto neoliberal e distante das reformas históricas defendidas pelos movimentos sociais nacionais. Quando o presidente envolveu-se em escândalos sucessivos de corrupção, o movimento estudantil teve papel predominante 17 na mobilização dos brasileiros com o movimento dos jovens de caras pintadas na campanha “Fora Collor”. (CREATIVE COMMONS, [s.d.]). Essa minha participação mais engajada na escola e nos movimentos de igreja me puseram a estar mais atento aos problemas do bairro e da cidade. Depois, mais assíduo aos noticiários e às leituras da realidade, comecei a perceber o país, que encaminha uma nova Constituição chamada cidadã em conjunto com setores organizados da sociedade civil, e o mundo, que vivia e respirava o final de uma Guerra Fria e a composição de uma nova ordem mundial nessa dimensão mais globalizante. Além de ter sido catequista na igreja católica como monitor de Crisma, o que se fez um belo exercício para pensar em ser professor, confesso que não foi nada revolucionário, mas revelador. Em seguida, engajei-me na Pastoral da Comunicação, mas a agenda mais progressista que eu vislumbrava não encontrou muito eco naquele meio. A militância no bairro se caracterizava em encontros de núcleos, círculos de leitura e estudo dos Movimentos dos Conselhos Populares (MCP) apresentadas pelo pai de um amigo de infância, que era dirigente do sindicato dos gráficos do Estado do Ceará. De tradição marxista e filiado ao Partido dos Trabalhadores (PT), esse senhor, misturado a jovens estudantes, sindicalistas, professoras/es e outras/os, encontrava-se às vezes na sede da associação do bairro, outrora em algum sindicato parceiro e ainda nas casas de algum membro, criando aquele clima de camaradagem e irmandade nas lutas. Bom ressaltar que, com as vitórias do campo popular progressista, representado principalmente pelo Partido dos Trabalhadores (PT) em algumas importantes cidades do Brasil como Porto Alegre, São Paulo, Recife, Belém e aqui também em Fortaleza, descobri e estudei uma literatura política que versava sobre democracia mais direta e participativa através dos debates em torno do orçamento participativo, por exemplo. Esses encontros militantes de estudo, a participação nas assembleias do orçamento público da cidade, a ação de rua direta do movimento dos conselhos populares, reivindicando semáforos, passarelas, em alguns cruzamentos pela melhoria da mobilidade urbana e prevenção a acidentes recorrentes nas vias, puseram-me em contato com políticos de mandato, como o Professor Pinheiro (PT), que fora inclusive meu professor na faculdade de História, e diversos/as lutadores/as sociais abraçados em muitas pautas, da educação, da saúde, do trabalho e renda, ao meio ambiente e segue ampla lista. No entanto, nesse período de anos finais da década de noventa e início dos anos dois mil, continuei fazendo militâncias sazonais em campanhas eleitorais, estudando na faculdade de História da Universidade Federal do Ceará (UFC) e trabalhando no comércio de supermercado como operador de caixa, meu primeiro emprego formal. Inegavelmente, esse enlace com a companheirada se fez didático. Às vezes mais próximo, mais orgânico como se diz, outrora mais afastado, a vida era tocada e eu vinha 18 avaliandoa conjuntura. Enfim, em dois mil e sete (2007), procurei a filiação partidária em Fortaleza, junto ao Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), para me organizar coletivamente para as lutas e formação política. Estudante graduado em História e lançado no meio profissional já nas escolas particulares, em 2008, fui candidato a vereador em Fortaleza, recebendo 634 votos (ANEXO A) com a alcunha de Professor Adriano, Fazendo História, numa referência particularmente muito significativa, propondo-me a ser um candidato com a marca da educação, firme no programa partidário e que buscou votos sobretudo de estudantes e professores, além de amigos e familiares, de forma bem razoável. No Brasil, a redemocratização cria expectativas de aprofundamento de mais democracia e participação popular, num país historicamente comandado por elites agrárias e empresariais. Novos partidos políticos, como o Partido Democrático Trabalhista (PDT), o Partido dos Trabalhadores (PT), citando apenas alguns, de forte base social, movimentos eclesiais, sindicais e presente também no meio acadêmico e da classe média mais letrada e intelectualizada, potencializam um maior engajamento de setores da sociedade antes excluídos e/ou amedrontados devido ao fim de um período sombrio de violência e repressão pelos agentes da ditadura. Isto posto, diria que no meio familiar, muitos me orientavam quanto ao cuidado de entrar e participar assim de movimentos contestatórios, que remavam no sentido oposto de uma sociedade brasileira tão elitista, conservadora e contrária aos novos ventos que sopravam num Brasil que buscava libertação e cura de tantas chagas de uma ditadura civil militar. Aos dezesseis anos, fiz questão de votar e fazer campanha. Desde 1996, numa eleição municipal, dirijo meus votos a candidaturas proporcionais e majoritárias no campo da esquerda ou propriamente. Candidatei-me, como em mais uma oportunidade, em 2010, para deputado estadual, mais uma vez usando a referência de nome nas urnas, Professor Adriano, agora, Juntos Fazendo História, obtendo 768 votos (ANEXO B). Era o ano em que eu acabara de ingressar como professor efetivo e concursado na rede estadual do Ceará, considerando essa uma das maiores conquistas e realizações de minha vida pessoal e profissional. Voltando um pouco nessa história de vida narrada, desenhava-se em minha mente seguir uma carreira profissional que guardasse identidade com o campo das Ciências Humanas. Não restava dúvidas que este seria o meu campo de atuação profissional. Pensei na ciência do Direito como forma de ser uma espécie de defensor público, um agente da justiça em defesa dos “fracos e oprimidos''. Aos 14 anos, em 1992, quando assisti a série Anos Rebeldes, exibida pela TV Globo, o jornalismo foi outra paixão que acendeu em mim. Relatar os fatos, pesquisar nas fontes, compreender o funcionamento social e explorar a linguagem escrita e falada em defesa de uma sociedade mais justa e igualitária, seria meu foco. No entanto, nem no Direito e 19 nem no Jornalismo prestei vestibular. Foi para a licenciatura em História que lancei esses meus objetivos e aspirações e joguei minhas forças e energia para tal empreitada de forma muito convicta. Aprovado então na Universidade Federal do Ceará (UFC) para o primeiro semestre da turma de 1997, iniciei minha trajetória formativa como estudante desta ciência que, desde os bancos escolares já vividos, mexia com meu imaginário. Ser educador é uma das profissões mais nobres que se possa ter. Estudar, pensar a sociedade e acreditar que temos um potencial de transformação é muito significativo. Não somos meros narradores do que passou. No nosso presente, somos carregados da realidade que temos e, ao viajar no tempo, vamos refazendo narrativas e olhando para o presente que está posto, mas não imutável. O que queremos afinal fazer aqui nessa passagem? Reproduziremos o que deseja uma parcela desta sociedade? Resistiremos a ela? O que temos para construir coletivamente? Estamos a fim de fazer esse esforço? Deixaremos a vida nos levar? Enfim, as possibilidades sempre estarão postas. E a História e sua dinâmica nos mostram que a vida, como um jogo, está aí para ser vivido e jogado. Nos meus quarenta e dois anos de vida, pouco mais de vinte anos de magistério, venho observando e participando com interesse da vida política do nosso país. Tenho a convicção de que a minha escolha pela formação em História se deu por acreditar que esse conhecimento, que eu nem fazia ideia que era uma ciência, poderia me ajudar a entender melhor o funcionamento da política em nosso país e, por extensão, do mundo. Como observador do que estava em minha volta, tinha a impressão, mesmo que parcialmente do meu local de existência, que boa parcela da juventude brasileira, pelo menos a que eu conhecia e que via espelhado nas mídias, sobretudo televisiva àquela época, não se interessava por política como creio que eu me interessava. Aliás, levanto esse debate parcial, sobre o interesse na política eleitoral, por entender que, erroneamente, a visão que construí a princípio do que era a política, naquele momento, passava muito pelo aspecto da via eleitoral que se concretizava em nosso meio de dois em dois anos em pleitos, num país recém-saído de uma ditadura civil militar (1964-1984). Não é de se estranhar, portanto, que aquela frase dita “a eleição é a festa da democracia” me chamava muita atenção. Já com o amadurecimento e a caminhada intelectual, percebi a dimensão de que a política vai muito além de uma simples eleição. Ela é o todo e essencial da nossa vida em sociedade. Outro debate com que me defrontei em algumas leituras e observações sociais, sobretudo na sala de aula e com o suporte dos textos dos livros didáticos, é o de que recai sobre nós, povo brasileiro, sermos avaliados e julgados por sermos pouco ou muito participativos nas principais decisões e conflitos inerentes a nossa História, seja na luta anticolonial, no processo de independência ou abolição da escravatura, na Proclamação da República e demais lutas 20 sociais. Este, no entanto, é um longo debate que se pode fazer e, ainda assim, encontra-se aberto e sujeito a inúmeras defesas e justificativas. Pela nossa Constituição Federal e código eleitoral, o voto se tornou facultativo aos 16 anos de idade. Assim, tomando como base essa premissa de que a busca pelo direito de votar a partir desta idade seja um demonstrativo de interesse do jovem pela política no Brasil, mesmo assim, esse dado não será o único parâmetro e ainda será insuficiente para se afirmar que a nossa juventude seja menos ou mais interessada pelos processos políticos. E esse legado do voto aos dezesseis anos foi bandeira de luta dos estudantes do Brasil após a ditadura civil militar, como podemos atestar na página da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES), listado como uma das sete importantes conquistas dos estudantes brasileiros ao longo da História. Os secundaristas tiveram uma expressiva participação nas manifestações de abertura democrática do país na década de 1980. Para aumentar a participação política da juventude em um momento em que o Brasil caminhava para a redemocratização, a UBES lançou a campanha “Se liga 16”, que pedia o voto facultativo aos jovens de 16 e 17 anos. Segundo o IBGE, o Brasil contava naquele ano com quase seis milhões de jovens que poderiam usufruir desse direito. Graças à pressão dos secundaristas, os deputados incluíram a proposta na Constituição de 1988. Desde então, a UBES realiza campanhas de incentivo à participação da juventude nos debates eleitorais. [...] (GUAGLIANOME, 2018). Portanto, é bem difícil cravar se a nossa juventude atual está interessada ou desligada dos processos políticos. Nenhuma resposta pode ser afirmativa, negativa ou conclusiva para um lado ou outro. Não vejo e nem pretendo ter uma régua que meçaesses graus de interesse, pois aprendemos que temos juventudes no seu aspecto plural e geracional. Aqui, apresento uma reflexão que fala um pouco dessa juventude que se aproxima de minha geração: A juventude nascida na década de 1980 integra, de acordo com alguns estudiosos e analistas, a chamada geração “Z”. O uso desta letra vem do termo inglês “zapping”, ou seja, dar “uma volta”. Essa tal volta, por conseguinte, simboliza a enxurrada de tecnologias que colocaram esses jovens em contato simultâneo com a TV, telefone celular e internet. A facilidade de acesso à informação transforma essa nova geração, de certa maneira, um pouco mais acomodada. (SOUSA, s/d). O parâmetro que me norteou enquanto jovem em idade escolar não convém para medir se os meus alunos da educação básica e especificamente do Ensino Médio, são menos ou mais politizados e engajados. Repito, não tenho esse interesse comparativo. Uma forte convicção que tenho é que o conhecimento histórico escolar exerceu influência sobre mim para escolher ser historiador e, no mínimo, um cidadão atento e participativo ao desenrolar dos fatos políticos à minha volta. Quais serão as chamadas causas e bandeiras que meus alunos e alunas impunham e/ou empunharão? Ou se eles e elas sequer fazem ideia do que sejam bandeiras, causas ou 21 movimentos sociais e coletivos de luta organizada? Não se trata aqui de qualificar ou adjetivar as juventudes de diferentes tempos históricos, de menos ou mais engajadas ou revolucionárias, mas de observar e compreender como a dinâmica da História nos apresenta outras preocupações e dilemas, como os processos de adaptação e resistência estão postos e as pessoas reagem diante dos fatos. É ainda bem razoável que as nossas juventudes do tempo presente tenham suas pautas e, mesmo que estas causas e bandeiras não arrastem a todos e todas para as trincheiras das lutas, os movimentos existem e estão materializados em nosso meio, como se pode observar nessa reflexão: Em contrapartida, essa nova situação da juventude não indica uma morte das utopias e da ação direta do jovem na sociedade. Por mais que não possamos ver claramente a ascendência de novos movimentos juvenis politizados, não podemos desconsiderar a presença de uma juventude que possui e demonstra suas demandas sob as mais diferentes formas. Enquanto isso, as gerações futuras nos reservam a transformação que os adultos de amanhã talvez não imaginassem. (SOUSA, s/d). Há amplas possibilidades de demonstrarmos o quanto as juventudes, mesmo em um cenário de desilusões e terra arrasada no qual a política, sobretudo a institucional e considerada profissional pelos engravatados, é apresentada destroçada por inúmeros escândalos, que criam uma dita ojeriza, expressões como “tenho nojo”, “isso não me importa”, “detesto política”, ainda são comuns de se ouvir, contudo, ainda possuímos exemplos concretos de lutas ocorridas. Em um tempo bem recente, as chamadas Jornadas de Junho do ano de 2013 ganharam notoriedade e pautas nas mídias, por demonstrarem a força de parte de uma juventude que refletia e agia muito além do voto, como defini anteriormente nesse texto, sobre a dimensão da política em nossas vidas. Eram pautas de passe livre estudantil, movimentos de luta por moradia e contra as remoções, reivindicações da existência de escolas e hospitais com alto padrão de qualidade, se comparado ao que se desenhava o tal padrão FIFA de qualidade das arenas – estádios de futebol - que sediariam, em 2014, a Copa do Mundo de Futebol no Brasil. A matéria aqui extraída representa bem o que acabamos de afirmar, segundo relato de Nataly Santiago, militante do Levante Popular da Juventude (LPJ) Obviamente os protestos no Brasil não começaram em 2013, obviamente a gente tem um quadro de movimentos sociais muito bem organizado, que sempre tiveram sua luta muito bem desenhada, porém, a gente sabe que o estado brasileiro é, historicamente, repressor em relação a esses movimentos sociais. O que aconteceu depois de 2013 foi um cenário em que o Estado pegou todos os instrumentos de repressão que sempre existiram e aprimorou. (SANTIAGO, 2018 apud GUIMARÃES; RIBEIRO, 2018). 22 Enquanto jovens militantes organizados afirmam e reforçam que as lutas sempre estiveram no seu ideal de um país mais socialmente democrático e justo, políticos tradicionais como o ex-presidente Michel Temer, nesta ocasião abrigado na sigla partidária do Partido Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), apresenta outro ponto de vista e cenário. Na ocasião, o citado ocupava a cadeira de deputado e presidente da Câmara Federal. Infelizmente, esse universo se encontra muito afastado da vida política do país. E as razões são plausíveis. Escândalos, descalabros administrativos, máquinas burocráticas emperradas, partidos sem identificação popular constituem, entre outros, fatores que afastam os jovens do processo político. Na ausência de projeto ético e de uma sinalização comprometida com mudanças, os jovens acabam destinando sua atenção para outras prioridades. É triste verificar que milhares de jovens, levados pela atração dos bens materiais e do consumismo, passaram a ver a política como algo desimportante. Afinal, a política é a arena central da construção do futuro coletivo. (TEMER, 2010). Essas diferentes concepções sobre a participação política da juventude na sociedade, observando o ponto de vista de uma jovem militante das Jornadas de Junho de 2013 e do ex- presidente Michel Temer (2016-2018), evidenciam muitas possibilidades de compreensão. A jovem militante afirma que há um histórico de movimentos sociais organizados pelo povo brasileiro mesmo antes de 2013 e que isto deve ser celebrado e valorizado, mesmo acusando o estado brasileiro de aperfeiçoar as medidas opressoras nos anos em curso. Recordo aqui, da lei antiterrorismo 13.260/2016, sancionada pela ex-presidenta Dilma Rousseff (2011-2016), do Partido dos Trabalhadores (PT), por exemplo, que causou muito furor e mal-estar entre militantes sociais por ocasião dos Jogos Olímpicos Rio 2016 e da sequência de manifestações de rua que se acentuaram no país a partir das jornadas de junho de 2013. Embora as discussões datem de anos anteriores, a Lei Antiterrorismo (Lei 13.260/2016) foi sancionada em Março de 2016 pela então presidenta Dilma Rousseff. A aprovação dessa lei nessa época foi impulsionada pelo fato de ser o ano dos Jogos Olímpicos no Brasil, o que motivou as autoridades a quererem conter manifestações e ações consideradas violentas de alguns grupos que pudessem colocar em risco a segurança dos convidados durante os jogos. O objetivo era evitar que se repetisse o que aconteceu durante a Copa das Confederações de 2014, em que, desde o ano anterior, o país se via diante de uma forte onda de manifestações contra o governo e, por conta do histórico violento de algumas delas, acabou por causar pânico em grande parte dos visitantes. (CARDOSO, 2019). O dito político profissional e de carreira, Michel Temer, tendo passado por várias instâncias do poder instituído e burocrático, lamenta com o termo “infelizmente” que muitos jovens se encontram afastados da vida política do país devido a uma série de escândalos, aberrações e descalabros cometidos e comprovados pela classe política e “partidos sem identificação popular”. Além disso, justifica que, assim, esses jovens passam a se preocupar http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Lei/L13260.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Lei/L13260.htm https://congressoemfoco.uol.com.br/especial/noticias/quem-grita-nao-vai-ter-copa/ https://congressoemfoco.uol.com.br/especial/noticias/quem-grita-nao-vai-ter-copa/ 23 mais com o consumismo e atração pelos bens materiais, dando a entender que isso é uma preocupação individualista que não se reconhece uma preocupação coletiva.Assim, vemos que a leitura política é diversa e que há consensos e dissensos. 1.2 Protagonismo juvenil, historicidade e realidades O uso do termo protagonismo juvenil, muito construído nas narrativas que tratam da educação de nossa juventude ao longo dos últimos anos, merece ser mais bem compreendido. Quando pensei em protagonismo juvenil com vistas a pensar e refletir sobre as práticas dos estudantes da escola pública como a que eu trabalho, pensei em situações de como os alunos, além de assumirem suas responsabilidades elementares de estudantes, também pudessem e devessem estar mais atentos aos problemas na escola e seu entorno. E ainda, como estes agiriam em determinadas situações, numa ação-reflexão, inclusive experimentada na escola, de como interferir socialmente com vistas a melhorarem sua qualidade de vida, sua comunidade e tudo mais que julguem necessário. No entanto, pesquisando a trajetória do uso do termo protagonismo juvenil, percebemos em sua historicidade que muito fortemente na década de 1990 essa narrativa ganhou muito impulso em meio a uma forte onda expressada por governos neoliberais que se materializavam nos Estados Unidos, Inglaterra e outros países, sendo no Brasil representado pelo governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). A lógica neoliberal do Estado mínimo e potencialização da iniciativa privada no investimento e busca da lucratividade em setores estratégicos e vindouros como a educação começam a ser percebidos. Inclusive, o combate a lógica das privatizações e sucateamento da educação pública está citado como parte das memórias de lutas da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES): Na década de 1990, os jovens resistiram ao projeto neoliberal, às privatizações em setores estratégicos do país e ao sucateamento da educação nacional nos governos Fernando Henrique Cardoso. Os estudantes cobraram a expansão e reformulação do ensino técnico, e também ampliaram a luta por outros direitos estudantis como a meia- entrada em eventos culturais e esportivos. (UBES, 2016). No campo da pesquisa acadêmica, merece destaque o trabalho da socióloga Regina Magalhães de Souza (2006) no enfoque dessa perspectiva protagonista do jovem brasileiro nessa onda bem neoliberal Desde meados da década passada, tem sido possível observar, na mídia, nos programas partidários, nas propostas de trabalhos de diversas organizações não- 24 governamentais (ONGs), nos depoimentos de líderes de grupos de jovens, nos encontros, seminários e congressos de educação, a referência ao que tem sido denominado protagonismo juvenil. Em nome do protagonismo juvenil, jovens e ONGs espalhados por todo o Brasil têm prestado serviços gratuitos à coletividade, prática nomeada, geralmente, de trabalho voluntário e explicada por meio da valorização da cidadania, da educação e da solidariedade. Veiculam a ideia de que iniciativas particulares podem ser bem sucedidas na solução dos problemas sociais”, e tentam desmentir a imagem da juventude apática e alienada, predominante na sociedade desde o arrefecimento do movimento estudantil. (SOUZA, 2006. p.8). Dialogando com essa observação pesquisada e refletida, problematizo que essa historicidade sobre protagonismo juvenil guarda muitas expectativas em mim, professor, militante e pesquisador do campo histórico. Construí uma perspectiva de juventude balizada como bem mais participativa e presente em momentos de nossa História republicana, sobretudo nos chamados anos de chumbo, do período da ditadura civil-militar, e essa percepção de jovens que lutam e se engajam nas pelejas de uma sociedade brasileira tão injusta e desigual se manifesta sobretudo em uma juventude que geralmente estuda, seja nos bancos da educação básica ou superior. Em seguida, na década de 1990, o ideário neoliberal buscou o enquadramento do segmento juventude numa perspectiva de controle e menção de oportunidades a tantos e tantas que, inseridos/as num processo de sociabilização carente de políticas públicas, vão encontrar apoio em iniciativas de promoção de ações ditas cidadãs com base em voluntariado e estímulos que partem de empresas ou parcerias público-privadas numa assertiva de formação de mão de obra, afinal, um dos pilares da formação do jovem estudante no Ensino Médio versa sobre essa capacitação e preparação para o mundo do trabalho, no contexto de nossa sociedade capitalista. No meu entendimento, estas juventudes estão em disputa. Se por hora, temos uma juventude de classe média que historicamente se estabeleceu nos assentos das escolas privadas, tendo de boa a ótima formação propedêutica com vistas a cumprir essa etapa da educação básica e entrar nas universidades de forma direta ou com apoio de cursinhos pré-vestibulares, outra parte da juventude mais periférica, das escolas públicas principalmente, teve que conviver com as limitações de uma escola desassistida, que a colocou na encruzilhada de estudar e também trabalhar de forma muitas vezes precarizadas como mão de obra desqualificada e barata. Esse reflexo do neoliberalismo então se ocupou de encaixar e dar uma dita assistência a essa parcela da juventude, que incorre no risco da marginalização e delinquência, o que geraria e agravaria ainda mais os problemas e desigualdades sociais já existentes em nosso meio. Seria a chamada paz social que não perturba a ordem estabelecida e desejada, nem sempre alcançada, pelos estratos mais elevados e privilegiados da sociedade brasileira. Sem querer cair em 25 generalizações, pois a vida das pessoas, sobretudo as jovens, não estão assim tão determinadas, mas o nosso quadro social nos aponta um tanto dessa realidade descrita. As juventudes, no entanto, não se esquivaram das lutas sociais que as desafiaram no campo da educação, do trabalho e das práticas sociais. É bem notável que nem toda juventude está organizada politicamente nas estruturas partidárias ou de agremiações institucionalizadas como grêmios estudantis, centros acadêmicos ou diretórios centrais de estudantes, mas é justo ressaltar o histórico de lutas elencadas por entidades estudantis brasileiras organicamente mobilizadas, como a União Nacional dos Estudantes (UNE) e a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES) nas últimas décadas, sobretudo no contexto das eleições vitoriosas de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) e Dilma Rousseff (2010-2016), ambos do PT, em que foi possível estabelecer maiores canais de diálogo e apoio para demandas da juventude brasileira neste período de governos mais populares e progressistas. Podemos listar as lutas e conquistas, tais como reserva de vagas nas universidades: Em 2012, os estudantes obtiveram mais uma vitória na luta pelo acesso ao ensino superior ao conquistar a destinação de 50% das vagas em universidades e institutos federais para estudantes de escolas públicas. A lei é um passo inédito e transformador da democratização do acesso à universidade, fruto da mobilização da juventude secundarista, universitária e do movimento negro. Metade das vagas oferecidas são de ampla concorrência, já a outra metade é reservada por critério de cor, rede de ensino e renda familiar. Estudantes negros, pardos e índios têm o número de vagas reservadas definido de acordo com a proporção dessas populações. Nos últimos anos, o número de universidades e institutos federais que ampliaram a porcentagem de cotas, foi grande. A medida tenta corrigir o descompasso histórico da desigualdade social na educação do país. (UBES, 2016). Outras bandeiras e frentes de luta continuaram insistindo em mais robustez ao financiamento da educação pública no Brasil, como a defesa de um fundo de recursos permanentes, o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB), a destinação dos royalties do petróleo e do fundo social do pré-sal vinculadosà educação, à elaboração e execução decenal do Plano Nacional de Educação (PNE), com mobilização horizontal nos Estados em seminários e debates recorrentes com as universidades e coletivos de luta organizados, com a incorporação de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para a educação e a ampliação do ensino em tempo integral. Algumas conquistas e outras lutas seguiram em campanha. Na política, as variantes, arranjos, emendas às leis sempre estão em disputa, como foi o caso do congelamento do teto de gastos públicos aprovado no governo do então presidente Michel Temer (2016-2018), apelidada de Projeto de Emenda Constitucional (PEC) do “fim do mundo”. Narrativas em disputas permanentes, os estudantes, jovens trabalhadores/as ou 26 desempregados/as, diversos atores/atrizes sociais, seguem mobilizados, em meio a tantos embates e pautas, ainda bradada por mais direitos sociais. A UNE ampliou as suas tradicionais Jornadas de Lutas, com a integração aos diversos grupos de juventude dos movimentos sociais brasileiros, aumentando seu volume nas ruas por bandeiras como o passe livre nos transportes, a democratização dos meios de comunicação e o fim do extermínio da população jovem negra nas periferias. Em 2013, o movimento estudantil teve participação central na histórica onda de manifestações brasileiras, a partir do mês de junho, reivindicando mais direitos e mudanças na estrutura da sociedade. Como desdobramento desse processo, a UNE desenvolveu lutas como a defesa da desmilitarização da Polícia Militar no Brasil e da reforma política no país, com o fim do financiamento de empresas a campanhas como principal reivindicação. (CREATIVE COMMONS, [s.d.]). Assim, o que podemos perceber é que as lutas das juventudes na sociedade brasileira não ficaram mais restritas apenas ao plano dos movimentos de estudantes organizados. Outras manifestações que merecem destaque são as novas pautas de coletivos juvenis que se organizaram em torno do eixo da questão de gênero, raça, diversidade sexual e agenda ambiental. Finalmente, a terceira linha dialoga com as formas organizativas de jovens não necessariamente articuladas à condição estudantil, mas ligadas a temáticas e repertórios de ação consolidados tanto no campo dos movimentos de tradição socialista como aqueles de feitio autonomista e da ação direta em suas várias expressões. Integram esse bloco, também, as lutas em torno do reconhecimento e das identidades (gênero, diversidade sexual, étnico-raciais), bem como as iniciativas de organização da juventude rural. (SPOSITO; ALMEIDA; CORROCHANO, 2020, p.3). Enquanto vivermos no Brasil sob o signo das desigualdades sociais e injustiças, pessoas das mais diversas camadas da sociedade estarão mobilizados para o enfrentamento e resistência dessas tantas pautas tão caras e necessárias ao nosso povo. Não se trata de algo restrito ou exclusivo aos estudantes, mas sem desprezar obviamente a capacidade de auto- organização destes e sua experiência histórica de se mover nesse terreno acidentado que é a injusta sociedade brasileira. E se torna muito bom perceber que toda luta social deve mobilizar o maior número de sujeitos e sujeitas possíveis, pois toda luta, quanto mais cercada de solidariedade e compreensão do conjunto dos que são oprimidos, tende a se fortalecer e construir possibilidades de vitória. Assim, temos como reforço, mais exemplos de lutas abraçadas pelas nossas juventudes em tempo mais recente, que começam inclusive a ser alvo de estudos acadêmicos. As novas possibilidades de ação dos jovens no espaço público, por meio de produções culturais, são apreendidas nos estudos que buscam analisar os chamados “coletivos”. A emergência e a multiplicação desses agrupamentos juvenis, ao obterem reconhecimento no mundo acadêmico e também junto às instituições do sistema https://youtu.be/KJyOudleLCg https://youtu.be/M7oON1BfjNY https://youtu.be/M7oON1BfjNY 27 político e de organizações da sociedade civil, têm conduzido pesquisadores dos estudos da juventude a esforços de classificação desses novos formatos aglutinadores, em virtude da heterogeneidade de suas configurações e formas de ação (SPOSITO; ALMEIDA; CORROCHANO, 2020, p.8). Aqui mesmo em Fortaleza identifico e reconheço a presença de alguns de nossos alunos e alunas nesses novos agrupamentos de juventude e acredito que em outros centros urbanos, e possivelmente rurais, essas movimentações culturais se manifestam de várias formas, através da música, por exemplo, sobretudo de origem afrodescendente como o rap e o hip hop. Cito aqui o movimento Nós por Nós, do qual um camarada, também professor de História, faz parte e constrói junto a essa galera da periferia, da quebrada ou da favela, belas manifestações e produções culturais, combatendo o racismo estrutural, denunciando a violência policial, enfim, é arte em movimento e resistência. Na própria escola que trabalho, Escola de Ensino Fundamental e Médio Luiza Távora Promorar, tivemos momentos de apresentação desse modelo de atividade de engajamento e apresentação dos alunos por meio da dança e do canto (FIGURA 1). Figura 1 – Apresentação de dança dos alunos da escola Luiza Távora. Fonte: Arquivo pessoal As rodas de poesia em seus saraus, os clubes de leitura, as bibliotecas comunitárias, o Cine Humanidades (FIGURA 2), trazendo películas para o debate com a moçada, as expressões artísticas das pinturas do grafite, a luta racial e o movimento feminista na luta contra diversas formas de misoginia e do patriarcado são formas de fazer política, resistir e se inserir nas pautas, na agenda do cotidiano. 28 Figura 2 – Publicação de divulgação do Cine Humanidades no Facebook Fonte: Facebook Cito também o movimento LGBTQI+, com agenda conquistada e celebrada, como a parada da diversidade sexual organizada por vários coletivos, mas em constantes e duras lutas contra a homofobia. Na Imagem 3, é possível ver a participação dos alunos da escola Luiza Távora Promorar em um bloco do desfile cívico em setembro de 2019. 29 Figura 3 – Desfile cívico de 2019 - EEFM Luiza Távora Promorar. Fonte: Facebook Temos, inclusive, aqui em Fortaleza, por meio da lei municipal 9.548/2009 de autoria do então vereador João Alfredo Telles de Mello, do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e no estado do Ceará, a instituição legislativa da Semana Janaína Dutra, lei 269/2017, de autoria do deputado estadual Renato Roseno, também do PSOL. Uma vitória dos que defendem a tolerância, o respeito e a civilidade. O plenário da Assembleia Legislativa aprovou na semana passada o projeto de lei 269/2017, de autoria do deputado estadual Renato Roseno (PSOL), que cria a Semana Janaína Dutra de Promoção do Respeito à Diversidade Sexual e de Gênero no Estado do Ceará. A homenagem faz referência a um dos ícones da luta contra o vírus HIV e contra as violências e estigmas vividos pela população LGBT. Janaína foi presidente do Grupo de Resistência Asa Branca (GRAB) e foi a primeira travesti a exercer a função de advogada com registro na OAB. A história da cearense Janaína Dutra nos remete a uma vida dedicada ao combate à violência de gênero e pelo respeito à Diversidade Sexual, bem como à luta pela cidadania plena da comunidade LGBT e pelo acesso à saúde e à qualidade de vida das pessoas vivendo com HIV/AIDS, fossem elas LGBTs ou não", defende Renato Roseno. (RENATOROSENO, 2017). Assim, continuamos nossa exposição intelectual pautada em observações e experiências vividas como educador, que revelam que, no universo de nossa juventude, que se encontra em meio escolar, na formação da educação básica, é possível revelar que as juventudes se movimentam, inclusive, permito-me a fazer um relato um pouco fora do propósito destes movimentos que ensejo destacar neste trabalho, a respeito da grande inserçãode enormes parcelas dessa galera jovem estudantil que está mergulhada e inserida nos movimentos de igrejas cristãs, no meu entendimento, na comunidade que trabalho, menos na igreja católica e muito mais forte o movimento destes e destas nas igrejas protestantes ou evangélicas. Neste ambiente espiritual, eles desenvolvem fortes laços de convivência ligados aos ministérios de 30 música e louvor, de intercessão e conseguem, a partir desses lugares, criar correntes e identidade com o movimento puxado por suas igrejas e lideranças. 1.3 A disciplina escolar de História e a legislação do Ensino Médio em contexto Feitas essas reflexões e observações, proponho-me a dizer que este trabalho tem a pretensão de se fazer compreender e apresentar o quanto o conhecimento histórico escolar deve ser parte do instrumento que visa impulsionar e contribuir, junto aos estudantes do Ensino Médio, a refletir historicamente sobre a urgente necessidade de ampliarem suas participações nos espaços decisórios da sociedade e cuja porta de entrada pode ser a escola no seu conjunto de vivências e experiências, no qual a possível constituição e a formação do grêmio estudantil experimentada numa convivência diária e estendida por anos de formação integral nas escolas públicas seja espaço privilegiado para o exercício da cidadania de forma muito prática. A escola, por ser parte da sociedade, carrega em seu histórico e em seu corpo, constituído pelas pessoas que lá estão, a diversidade democrática de pensamentos e ações que se revelam como parte dela. Vamos encontrar conformados e inconformados, progressistas e reacionários, pessoas de diversas posições políticas. Enfim, quem conhece a escola como micro espaço de poder sabe que as disputas de narrativas e práticas cotidianas que ali se travam não são muito diferentes do embate e debate público e político que temos nos parlamentos, na família, nas rodas de conversa, nas igrejas, nos meios de comunicação e redes sociais. Muito tenho percebido ao fazer parte da rotina escolar que se faz necessário incentivar, promover e dar vazão ao que podemos compreender como protagonismo juvenil. Vivemos diante de uma geração que dispõe de meios e recursos de estudo e informações que lhes conferem muito mais acessos e possibilidades de melhor gerenciarem seus estudos e projetos de vida, do que, provavelmente, as gerações anteriores ao presente possuíam. As escolas articuladas em rede, aqui no Estado do Ceará, têm se constituído como um bom suporte aos nossos alunos no sentido de unir a formação propedêutica com a estudantil, social e política, numa visão muito integralizada com os propósitos da conclusão da educação básica, que articula a formação para a cidadania com a preparação da juventude também para o mercado de trabalho ou quem sabe, para muitos e muitas, o prosseguimento dos estudos de nível superior. O que se chama categoricamente de projeto de vida não se deve tratar de uma busca pelo sucesso individual, mas sempre compreendendo e atuando socialmente para conquistas coletivas enquanto sociedade, do local ao global. Investigando os documentos oficiais que norteiam a composição do Novo Ensino Médio no Brasil, a partir do documento da Base 31 Nacional Comum Curricular (BNCC/Brasil, 2018), escolho destacar a passagem que faz referência à subjetividade de afirmar que tipo de jovem pretende-se formar sobretudo no que tange às competências específicas ao espectro das Ciências Humanas Sociais e aplicadas de número seis, a qual afirma que “Participar do debate público de forma crítica, respeitando as diferentes posições e fazendo escolhas alinhadas ao exercício da cidadania e ao seu projeto de vida, com liberdade, autonomia, consciência crítica e responsabilidade.” (BRASIL, 2018). Respirando ares de uma democracia ainda nova, pulsante, que amadurece e, por vezes, se encontra ameaçada no nosso país, por arroubos e práticas autoritárias de diversos grupos sociais dentro e fora da escola, temos instrumentos administrativos e pedagógicos na Secretaria do Estado do Ceará (Seduc), a célula de protagonismo juvenil, que estimula as comunidades escolares por meio de formação continuada, a formar o grêmio estudantil em cada unidade escolar, como um colegiado extremamente necessário ao seu funcionamento. O Grêmio é uma entidade autônoma, criada e dirigida pelos alunos de uma mesma escola, e exerce relevante papel na implementação da gestão democrática no espaço escolar, competindo-lhe levar à frente as lutas dos estudantes pela melhoria da qualidade do ensino e zelar pela tomada de decisão coletiva. Sua atuação, entretanto, não deve restringir-se aos muros escolares, mas estar em consonância com as causas mais gerais da sociedade para que possa, de fato, contribuir para a formação de estudantes conscientes, críticos e capazes de lutar pelos direitos individuais e coletivos. (SEDUC, 2008). Em virtude disso, destaco a importância do registro da existência da célula de protagonismo juvenil que dispõe a Secretaria de Educação do Estado do Ceará (Seduc) no acompanhamento, incentivo e monitoramento de cada unidade escolar, por meio da Superintendência Escolar e núcleo gestor, para que exista e aconteça o Grêmio Estudantil, um colegiado e instrumento político possível, capaz de dar suporte e inspirar a juventude a estar neste mundo desafiador de forma crítica e propositiva, reconhecendo no espaço escolar um ambiente potencializador para o exercício da cidadania e o encaminhamento desse protagonismo, sem perder jamais a dimensão coletiva, como bem frisa ainda a BNCC em seu texto, que convoca os agentes educativos, sobretudo juvenis, a interferir na realidade em que estão inseridos em amplas dimensões sociais. Analisar processos políticos, econômicos, sociais, ambientais e culturais nos âmbitos local, regional, nacional e mundial em diferentes tempos, a partir de procedimentos epistemológicos e científicos, de modo a compreender e posicionar-se criticamente com relação a esses processos e às possíveis relações entre eles, considerando diferentes pontos de vista e tomando decisões baseadas em argumentos e fontes de natureza científica. (BRASIL, 2018, p. 570). 32 A existência dessa célula pedagógica e os chamamentos e convocações a encontros de caráter presencial com os grêmios estudantis sempre são oportunizados como uma demanda pontual de calendário da Seduc, como pode ser averiguado na página institucional da secretaria: Estudantes da rede estadual de ensino de Fortaleza que integram os grêmios de suas respectivas escolas iniciaram, nesta terça-feira (12), o curso “Construindo Diálogos – Gestão e Protagonismo''. A iniciativa tem o objetivo de fortalecer a atuação dos estudantes enquanto lideranças, criando espaços de discussão, compartilhamento de saberes, reflexões com bases teóricas e experiências práticas na área. A formação tem carga horária de 40h e foi idealizada pela Coordenadoria de Protagonismo Estudantil da Secretaria da Educação. (SEDUC, 2019). A formação dos grêmios estudantis encontra respaldo em leis federal e estadual, que são sinalizadas na página institucional da Seduc: É importante lembrar que a livre agremiação estudantil nos estabelecimentos de ensino públicos e privados está assegurada na Lei Federal N° 7.398/85 e na Lei Estadual N° 13.433/2004, sendo de competência exclusiva dos estudantes a definição das formas, dos critérios, dos estatutos e demais questões referentes à sua organização. Ao estabelecimento de ensino caberá assegurar espaços para a divulgação das atividades, bem como a livre circulação e expressão dos grêmios estudantis. (SEDUC, 2008). Desta feita, os incentivos estão postos pela legislação e pelo suporte pedagógico da própria secretaria de educação estadual. O ambiente democrático e formativo deve pulsar na escola por meio de todos quefazem parte dela, sobretudo os estudantes, que devem se arvorar de ver seu instrumento de participação mais direta, o grêmio estudantil, tornar-se uma realidade que reverbere na escola e para além dela, assim como refletir sobre o papel da disciplina escolar de História e o nosso papel de professores desta disciplina, em especial, não exclusivamente, para sermos parte da provocação e engajamento pelo conhecimento e a necessidade prática de mudanças sociais do menor ao maior espaço. Creio que a ciência histórica, em seus variados conteúdos selecionados, municia-nos ao estímulo do exercício prático da movimentação social e política. No entanto, como nossos alunos estão se apropriando de tal conhecimento com inferência nas suas vidas, nos seus dilemas? Como apoiar com condições de compreensão que o ensino e o aprendizado em História vão além de memorizar datas e nomes? E como compreender e agir na realidade em construção, respeitando seu próprio tempo? Ainda considerando a literatura de nossa legislação educacional, apresento um trecho da Lei de Diretrizes e Bases da Educação no Brasil (LDB), lei 9394/96, já no seu primeiro artigo, que apresenta uma reflexão da amplitude do que se propõe a educação nas premissas da legislação brasileira, como ela se processa e o que pretende alcançar no nosso tecido social: “A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência 33 humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais” (BRASIL, 1996, p.7). Desta feita, entendemos que a educação não é restritiva ao espaço formal da escola e que desde o nascimento de cada brasileiro e brasileira, cada um de nós experimentamos a educação nesses diversos contextos mencionados pela lei. Ela acontece e transforma de sobremaneira a todos nós. Considerando esse aspecto da legislação educacional, a experiência de participar de um grêmio estudantil ou movimento social se configura como uma experiência muito rica e necessária para o processo formativo cidadão de jovens adolescentes no percurso de sua vida escolar, com extensão ainda para a vida adulta, no que diz respeito a se reconhecer e se sentir sujeitos da História e partícipes da vida social em toda sua extensão. É justamente na escola, esse espaço diverso de saberes, descobertas e conflitos, que adquirimos um contato mais intenso e diário com o serviço público. É na escola, para além da sala de aula e seus instrumentais, por meios de mecanismos legais e subjetivos, que se formam conselhos escolares e grêmios estudantis, espaços estes que corroboram para o aprendizado da cidadania e fortalecimento da vivência democrática. Para o leitor que não conhece a dinâmica do serviço público de educação, o Conselho Escolar é um colegiado formado por representantes do segmento escolar: pais, alunos, funcionários e gestão escolar, com os objetivos recorrentes de reunião e deliberação para demandas pedagógicas e administrativas das escolas. Veja o que traz a página do Ministério da Educação sobre o fortalecimento desse modelo de colegiado: O Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos Escolares tem por objetivo fomentar a implantação dos conselhos escolares, por meio da elaboração de material didático específico e formação continuada, presencial e a distância, para técnicos das Secretarias Estaduais e Municipais de educação e para conselheiros escolares, de acordo com as necessidades dos sistemas de ensino, das políticas educacionais e dos profissionais de educação envolvidos com gestão democrática. Aos conselhos escolares cabe deliberar sobre as normas internas e o funcionamento da escola, além de participar da elaboração do Projeto Político-Pedagógico; analisar as questões encaminhadas pelos diversos segmentos da escola, propondo sugestões; acompanhar a execução das ações pedagógicas, administrativas e financeiras da escola e mobilizar a comunidade escolar e local para a participação em atividades em prol da melhoria da qualidade da educação, como prevê a legislação. (BRASIL, s/d). Assim exposto, percebemos quantas possibilidades de gestão e participação democrática cabem aos estudantes no seio da escola pública. E o grêmio estudantil, espaço privilegiado dos maiores agentes e para quem se destina todo o processo educativo, também é convocado e conclamado a tomar parte de decisões importantes e rotineiras de cada escola. Agora, se a burocracia, o obscurantismo autoritário e a falta de transparência existirem, esses espaços colegiados citados podem existir apenas no seu aspecto formal e pouco ou quase nulo 34 de participação, assim sejam conduzidos autoritariamente por alguns núcleos gestores. Todavia, os agentes escolares devem compreender que se faz necessário, se assim for, tencionar e provocar a convocatória e ação de todos e todas. Não à toa, existe no esteio da história dos movimentos sociais do Brasil, capítulos, trabalhos de pesquisa e menções corriqueiras à formação e existência do chamado Movimento Estudantil (ME), tão caro e necessário a tantas lutas e bandeiras erguidas ao longo da História, sobretudo no período republicano. Assim, compreendo que o grêmio estudantil, não de forma fatalista, possa ser porta de entrada para tantos jovens que, passados por essa experiência, carreguem consigo o gene da cidadania que se expressará nas suas vivências cotidianas. Nesse contexto, a História como disciplina escolar no campo das Ciências Humanas e as outras disciplinas, podem e devem ser combustível para que esses sujeitos sociais, através de um olhar científico e fundamentado, insiram-se nesse processo. Desde a mais tenra iniciação como estudante das Ciências Humanas, percebo o vínculo desse conhecimento histórico com as práticas sociais e nossa formação para a vida em sociedade e o mundo do trabalho. Este conhecimento é de fato um aliado no que tange a formar um cidadão em seu aspecto mais participativo e engajado. A organização curricular e os conteúdos da disciplina chamada História nos apresentam variadas amostras de como a sociedade humana se constituiu no seu tecido social a partir de mudanças e permanências, conflitos e resistências. Trago então, aqui exposto, um fragmento das Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica (2013, p.15), que coaduna com nossa proposta reflexiva e de intervenção na realidade: A sociedade, na sua história, constitui-se no locus da vida, das tramas sociais, dos encontros e desencontros nas suas mais diferentes dimensões. É nesse espaço que se inscreve a instituição escolar. O desenvolvimento da sociedade engendra movimentos bastante complexos. Ao traduzir-se, ao mesmo tempo, em território, em cultura, em política, em economia, em modo de vida, em educação, em religião e outras manifestações humanas, a sociedade, especialmente a contemporânea, insere-se dialeticamente e movimenta-se na continuidade e descontinuidade, na universalização e na fragmentação, no entrelaçamento e na ruptura que conformam a sua face. (BRASIL, 2013, p.15). Enfim, a História tende a incomodar, a mexer com as estruturas de formação de qualquer estudante ou pessoa dita leiga, pois ela não se inscreve e nem se limita apenas ao universo escolar, estando cada vez mais inserida num uso público e palco de disputas de narrativas, reforçando as práticas democráticas, como exposto em Laville (1999, p.125): “A ideia de cidadão participante começou a substituir a de cidadão-súdito. O ensino da história não 35 deixou de ganhar com isso. Ao contrário, viu a função de educação para a cidadania democrática substituir sua função anterior de instrução nacional.”. Dando prosseguimento a essa reflexão, busco amparo mais uma vez na legislação brasileira através da LDB (Lei 9394/96), na qual consta, no segundo parágrafodo artigo primeiro, que “a educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social.” Assim sendo, essas práticas seriam, no meu entendimento, as inúmeras possibilidades de os sujeitos históricos aprenderem e aplicarem na vida, as experiências educativas colhidas e vivenciadas em todos os instantes. Assim, enxergo a escola como campo extremamente propício para uma educação política cidadã, visto que no serviço público educacional brasileiro temos um histórico comum de nos depararmos com as possibilidades de seu acesso e ainda com as suas ausências, deficiências e descontinuidade de políticas públicas que fazem os educandos, os trabalhadores da educação e toda a comunidade escolar perceberem a importância de se posicionar politicamente nesta sociedade com uma postura propositiva e combativa, para cobrarmos dos agentes públicos o que está literalmente colocado em nossa legislação como um todo, a iniciar pela nossa atual Constituição Federal e demais documentos balizadores. Ainda explorando a LDB, no seu segundo artigo, chama atenção a parte do texto que delega a educação como um dever da família e do Estado, entendendo de sobremaneira a escola como parte fundamental do que seria o Estado brasileiro: Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (BRASIL, 1996). Norteada por princípios de liberdade, ideais de solidariedade e por finalidades de pleno desenvolvimento do educando e seu preparo para o exercício da cidadania, a escola é campo fértil para fazer acontecer a constituição da experiência do grêmio estudantil, uma possibilidade de vivência dessa cidadania no ambiente escolar. A escola que preza o mínimo que seja pelo cuidado e zelo a democracia poderá vivenciar inúmeras situações que são e podem ser referendadas como exemplos de prática cidadã e participativa: a definição de horários para o uso da quadra, as sugestões para o cardápio da merenda escolar dentro das premissas da nutrição, o acesso dos espaços de aprendizagem como Laboratório de Informática, Ciências, Redação e Biblioteca, a promoção de eventos culturais, sociais e políticos, a participação em Conselho Escolar, enfim, se o corpo dirigente de gestores e professores não cuidarem de excessivamente centralizarem essas decisões, os alunos e alunas devem se sentir convocados 36 ou mesmo se disporão a tencionar para dar conta de participar de tais decisões citadas, que são de grande relevância para a dinâmica da escola. A dinamicidade da vida e da História, sobretudo em tempos recentes, que parecem acelerar o cotidiano e nos fazer refletir e repensar todas as nossas práticas educativas, ainda mais se evidenciam pelos ventos que sopram da política institucional, seja a nível municipal, estadual ou federal. No entanto, por estarmos tratando da educação básica e, em linhas gerais, municiados de documentos que engendraram a composição de novas reformas no Ensino Médio, trago ao exercício da reflexão pesquisadora, e que se propõe transformadora, a ideia de estarmos em constante debate e ação para o desenho de como serão esses anos de educação básica proporcionadas aos nossos jovens. Ainda no compasso das Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica (2013, p.146), exponho aqui minha preocupação com os anseios dessa parcela juvenil que passa pela escola no chamado Ensino Médio: Nos dias atuais, a inquietação das “juventudes” que buscam a escola e o trabalho resulta mais evidente do que no passado. O aprendizado dos conhecimentos escolares têm significados diferentes conforme a realidade do estudante. Vários movimentos sinalizam no sentido de que a escola precisa ser repensada para responder aos desafios colocados pelos jovens. (BRASIL, 2013, p.146). É nessa toada que, de maneira alguma, as juventudes não podem e nem devem renunciar ao seu protagonismo de participar, compreender e deliberar com outras várias instâncias que formulam a educação no Brasil. Que tipo de escola queremos? Essa formação final, chamada Ensino Médio, deve ser vivenciada em quais princípios? Somente a organização coletiva, mesmo que não dando conta de todo o conjunto dos estudantes, poderá agregar e dar sentido a essa etapa tão desafiadora da vida de milhares de jovens brasileiros. Acredito que são estes modelos de juventudes engajadas que precisamos formar para o enfrentamento de dilemas e tomadas de posições tão caras e necessárias a nossa contemporaneidade. Por isso, causa-me espanto e desconforto a inexistência momentânea deste instrumento coletivo chamado grêmio estudantil, na escola em que atuo. Creio que logo haja uma retomada da formação do grêmio por eles próprios, os estudantes ou, com o apoio da gestão e professores, até porque, por experiência, quando exerci a função de diretor escolar, entre 2013 e 2018, a superintendência escolar fez essa observância no sentido de ativar esse colegiado estudantil. Por entender que todo o processo educativo é referencial para o desenvolvimento de articulação e interesse pelos processos políticos, a escola e o ensino de História têm muito a contribuir para essa existência e efervescência, sobretudo considerando que temos e vivemos 37 um momento histórico recente em que a democracia precisa de fortalecimento e mais participação direta, sobretudo das juventudes em movimento. No caso específico da Escola de Ensino Fundamental e Médio Luiza Távora Promorar, que é a escola na qual estou lotado desde 2010, ela se encontra atualmente sem um grêmio estudantil constituído. E uma das ambições deste trabalho é evidenciar como o conhecimento histórico escolar se faz importante para uma tomada de consciência histórica estimulada por todos que fazem a escola, sobretudo com as aulas dos professores de História e de todas as Ciências Humanas ou quem mais puder contribuir. É propício se fazer perceber que as lutas sociais são essenciais para alcançarmos as mudanças e as transformações desejadas. E a composição, existência e atuação de um grêmio estudantil tem muito a contribuir para essa experiência formativa de cidadãos mais engajados e encorajados a enfrentar uma sociedade como a nossa, tão repleta de desigualdades sociais e injustiças. No entanto, se tal colegiado não existe formado, que não seja empecilho para qualquer ação estudantil espontânea e conduzida pelo conjunto dos estudantes. Aproveitando essa natureza do nosso programa de pós-graduação, o mestrado profissional em História é muito oportuno por reunir professores da educação básica que carregam inúmeras experiências de vivência de sala de aula e que há muito vêm contribuindo com a educação e a formação das nossas juventudes pelo Brasil afora. São inúmeros trabalhos com abordagens diversas que nos servem de inspiração e aprendizado para multiplicar saberes e encarar desafios na sociedade brasileira, que atravessa caminhos de amadurecimento democrático, mas que por vezes se apresenta ameaçada de retrocessos reacionários, conservadores e de preservação de privilégios de uma pequena parcela de nossas elites. Nós que atuamos em todas as frentes, seja na escola particular ou, principalmente, na escola pública, temos esse desafio de valorizar o nosso trabalho na edificação de um novo tempo de construção coletiva e para uma maioria social, em que alunos, professores e sociedade civil, de maneira atuante, compreendamos o significado de estarmos juntos e sintonizados com novas expectativas, visando um novo tempo de conquistas ou pelo menos manutenção daquelas realizadas a duras penas. Acredito que as teorias da História e suas novas abordagens sobre conhecimento histórico escolar, consciência histórica e afins têm se constituído comobase fundamental para nós professores repensarmos sempre nossas práticas de ensino diante de nosso público. Compreendo que a ciência histórica como disciplina escolar tem o apreço de boa parcela dos nossos estudantes, que enxergam qualidades em nós, professores e professoras. É louvável que estejamos superando aquele conceito antiquado de uma disciplina escolar que decora fatos e 38 datas. Casados a uma condição de termos formado nas últimas décadas, a muito custo e luta de vários profissionais do campo acadêmico da História, que imersos no dito mercado e espaço da educação pública, formam e lançam profissionais mais capacitados/as que chegam no ambiente escolar com competência para difundir esse conhecimento tão caro e necessário a todos nós. Na esfera do debate público dos meios de comunicação e redes sociais, como fenômeno mais recente, inúmeras pessoas se lançam a falar de História, através de canais e blogs, construindo narrativas diversas, elaborando aulas de bons conteúdos e reflexões, mas há também os negacionismos, que precisamos observar, ponderar e intervir, como profissionais que somos. Portanto, sem desmerecer aos demais, nós que fizemos a escolha da formação profissional em História, pelo magistério e/ou pesquisa, temos que assumir a responsabilidade de ocupar todos os espaços possíveis desta disputa de narrativas, irmanado com estudantes e comunidade escolar, de dar vazão a um momento mais oportuno de mais engajamento de todos para um projeto de país que valoriza uma educação transformadora, com justiça social e solidariedade. Alguns conceitos são fundamentais para dar sequência a este trabalho. Um deles é a ideia do protagonismo estudantil, que associo ao debate inicial das primeiras aulas de História, em qualquer série da educação básica. Sempre aprendemos na formação inicial enquanto historiadores e por meio dos livros didáticos, que somos sujeitos históricos, que nossa experiência de vida e nossa ação no mundo é tão importante quanto a trajetória de qualquer outro e outra que figuram nos livros de história como líderes, heróis ou heroínas. É esse protagonismo estudantil que compreende, enfrenta e luta, que pretendo ver atuando em cada escola. Para tal, acredito contar com o auxílio institucional bem explicitado aqui nas páginas da Secretaria de Educação do Estado do Ceará: A Coordenadoria de Protagonismo Estudantil é uma estrutura de gestão e operacionalização de ações e iniciativas para a promoção do protagonismo estudantil nas escolas da rede estadual de ensino. Entende-se o protagonismo como elemento fundamental na formação dos estudantes como pessoas humanas, futuros profissionais, cidadãos e potenciais agentes de transformações positivas em suas comunidades, na medida em que compreendem seu papel na sociedade atual. A estratégia da Coordenadoria de Protagonismo Estudantil consiste na criação de uma cultura de engajamento e tomada de atitudes dos estudantes cearenses através da introdução de valores como a cooperação, empatia, respeito às diferenças e protagonismo no dia a dia das escolas. (SEDUC, s/d). Todavia, para que o teórico e a retórica do discurso sejam aplicados no cotidiano escolar, há um percurso a ser traçado e delineado por todos que fazem a escola, e estes agentes educacionais precisam estar imbuídos do que é verdadeiramente uma gestão democrática como consta na Lei de Diretrizes e Bases da educação, no seu artigo catorze: “Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo 39 com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios.” (BRASIL, 1996). Os dois princípios desse artigo ainda versam e reforçam que os profissionais da educação e toda a comunidade escolar devem participar dos conselhos escolares e equivalentes, assim, o grêmio estudantil se configura também como colegiado importante para aumentar o nível de envolvimento dos estudantes com as decisões tomadas na escola. Outro documento basilar para dar ânimo e fôlego a este trabalho são as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica. Dele, em seu texto elaborado com fins a municiar educadores no país inteiro a fazer compreender que a educação seja cada vez mais efetiva e significativa nas vidas de milhares de jovens, retiro uma reflexão sobre que escola podemos alcançar para dar vazão a um público juvenil bem informado e embebido de valores com vistas a lógica dos Direitos Humanos, desejando que a vida possa lhes apresentar as melhores oportunidades de vislumbrar uma condição melhor, não apenas para si, mas para um todo social, que carece demais de uma educação que esteja a serviço da transformação social em busca de paz, igualdade e justiça social. A escola, face às exigências da Educação Básica, precisa ser reinventada: priorizar processos capazes de gerar sujeitos inventivos, participativos, cooperativos, preparados para diversificadas inserções sociais, políticas, culturais, laborais e, ao mesmo tempo, capazes de intervir e problematizar as formas de produção e de vida. A escola tem, diante de si, o desafio de sua própria recriação, pois tudo que a ela se refere constitui-se como invenção: os rituais escolares são invenções de um determinado contexto sociocultural em movimento. (BRASIL, 2013, p.16). Compreendo que a escola não é apenas aquele lugar trivial de preparação para a vida, a cidadania e o mercado de trabalho (o que já são grandes tarefas). Coloca-se para nós educadores grandes responsabilidades e desafios de encarar essas novas elaborações curriculares na educação e especialmente na disciplina escolar de História. Para se caminhar lado a lado com as juventudes, construindo a melhor escolarização possível, seja em escola regular ou integral, como assim sopram os ventos de um plano nacional da educação, que quer estabelecer metas audaciosas de aumento de convivência entre professores e alunos, precisamos estar mais preparados e qualificados para este desafio. Para isso, trago em evidência uma reflexão de Freitas (2016, p.111): Que valores devemos selecionar como objeto de aprendizagem histórica? Aqui, pela terceira vez, percebemos a valência da hierarquização. Podemos elaborar os objetivos segundo os valores que recebemos da família, do credo religioso, da ideologia política etc.? Podemos, recorrentemente o fazemos, mas não devemos assim proceder. E não devemos porque somos professores e não apenas pais, irmãos, tios ou responsáveis. Somos a materialização do Estado democrático de direito. Assim, na educação pública (regrada pelo Estado), somos submetidos a algumas normas das quais podemos até discordar, mas não temos força moral e autoridade jurídica para desobedecer. Estados que regem interesses entre grupos sociais de forma democrática conservam o seu 40 conjunto de valores, normatizando o seu emprego e indicando os responsáveis pelo seu cultivo. É para esse rol de valores que devemos dirigir nossa atenção. Nessa convivência profissional cotidiana e contínua, sabemos por experiência de causa quando marcamos positivamente a vida de nossos alunos e alunas, seja por meio de agradecimentos relatados nas velhas cartinhas e bilhetes de outros tempos passados e, mais atualizados agora, através de postagens em redes sociais ou em meros encontros casuais. Portanto, nossa profissão de professor está para além de meros transmissores de conteúdos e fatos. Mesmo nós, no papel de porta-vozes de uma política educacional intencional e contextualizada com o seu tempo histórico, estamos para além disso. Os valores selecionados na aprendizagem histórica colocam as preocupações do autor a pouco mencionado, quanto ao difícil discernimento de fazer escolhas pedagógicas a todo instante. Há o engessamento, ou eixo norteador, que o Estado coloca e há a possível subversão do que está posto. Temos escolhas e caminhosa seguir. Nem sempre fazemos o devido e o correto, mas, como aprendemos em História, não há apenas um caminho. E assim nos permitimos fazer apostas e tentar algo não convencional ou sempre ditado. Assim, este trabalho tem algumas ambições de revelar como o protagonismo estudantil dos nossos alunos e alunas pode ser muito bem alinhavado e alimentado com novas reflexões acerca do conhecimento histórico escolar e a consciência histórica, a ponto de eles não apenas constituírem um grêmio na sua unidade escolar, mas, como para além dessa experiência, os estudantes e eternos aprendizes compreenderem que os anos escolares são apenas ensaios e esquetes do que eles enfrentarão para toda uma vida que vai exigir posicionamento no mundo. 1.4 As ocupações estudantis nas escolas estaduais do Estado do Ceará em 2016 num contexto de greve dos professores Estávamos em 2016, ano marcado pela realização dos jogos olímpicos no Rio de Janeiro, evento que colocava o Brasil em evidência no cenário mundial com a realização de mais um megaevento, como foi a Copa do Mundo da Fifa de 2014. O recorte é que, mesmo com toda pirotecnia circense que se possa atribuir ao papel destes eventos, parte da população brasileira, sobretudo a parcela mais jovem e mobilizada politicamente, vinha desde as Jornadas de Junho de 2013 questionando e tensionando ainda mais os poderes constituídos do país, principalmente o poder executivo que era exercido pela primeira mulher eleita e reeleita da História do Brasil, a mandatária Dilma Rousseff (2011-2016), que em agosto daquele ano teve o processo de impeachment sacramentado. Além de ser ano eleitoral definindo a composição 41 de prefeituras e câmaras municipais, com muita polarização entre o que convencionamos chamar de esquerda e direita, espectro político este último citado que ganha densidade de representatividade nestas eleições e no debate público brasileiro, como podemos observar nesta matéria jornalística. Na denúncia que desencadeou o processo de impeachment de Dilma por crime de responsabilidade, estavam duas ações de sua gestão: as chamadas “pedaladas fiscais” e os decretos para abrir créditos suplementares. A defesa de Dilma rebateu as acusações, sustentando não haver fundamentos jurídicos consistentes, o que caracterizaria um golpe à democracia. As duas narrativas, que confrontavam o crime de responsabilidade e a tese do golpe, polarizaram a sociedade brasileira como raramente se viu na história recente do país. Como pano de fundo, a grave crise econômica abalava a popularidade de Dilma. (SASAKI, 2017). Com muita conexão, como tem sido de praxe nestes últimos anos, via Google, fui vasculhar as memórias jornalísticas dos periódicos de Fortaleza, as páginas das redes sociais, sobretudo o Facebook com as páginas do movimento Ocupa WSC (Figura 4) e a própria memória que se inscreve como alguém que presenciou e viveu tão de perto esse processo de ocupação e lutas dos estudantes das escolas estaduais do estado do Ceará no ano de 2016. Nesta imagem da página Ocupa WSC, merece atenção o texto que conclama a união dos estudantes de, no mínimo, três escolas diferentes e aproximadas pela geografia, para a ocupação conjunta de uma escola, a Walter de Sá Cavalcante, que unida a outros alunos ocupantes, como da Luiza Távora (Promorar), que é a escola dos nossos poucos alunos ocupantes e a escola Johnson. A garota da foto que apaga a suástica nazista, chama-se Rayane da Silva Vital, ocupante e aluna da escola Water de Sá, que responde a um dos nossos quetionários formulados para alunos que estiveram presentes neste momento histórico. Na ocasião, eu era diretor escolar e a princípio estávamos enfrentando uma greve dos professores da rede estadual, cuja principais pautas de reivindicação eram o reajuste geral dos servidores com data base de primeiro de janeiro do ano corrente e já se estava em março e nada de definição e a inclusão de uma portaria de lotação estadual na educação que suprimia funções de apoio pedagógico nas escolas, afetando a lotação de professores efetivos e por consequência, a não renovação de contrato milhares de professores temporários que ficariam desempregados. O tempo avançava enquanto governo e sindicato não entravam em acordo sobre os valores e também sobre a portaria. Além disso, outras pautas faziam parte do processo, como a convocação dos professores do último concurso realizado pela Seduc, a efetivação dos direitos garantidos como estabilidade, a progressão horizontal e vertical, a ampliação definitiva de carga 42 horária, a liberação dos processos de afastamento para mestrado e doutorado e a revisão do plano de cargos, carreiras e salários dos funcionários da educação (ANEXO C). Figura 4- movimento Ocupa WSC Fonte: Facebook. Deliberada em assembleia geral, em abril de 2016, a categoria de professores do estado do Ceará iniciou um processo de greve e lutas que durou mais de três meses. Já citadas as reivindicações da ordem de salários, carreira e condições pedagógicas, o novo componente desse movimento paredista não seria o inédito apoio dos estudantes, pois todo processo de greve passa por um amadurecimento e chega à maioria dos jovens de forma muito esclarecida e debatida como deve ser no chão de cada escola e o apoio a movimentos anteriores geralmente ocorriam. Contudo, dessa vez, os estudantes com muita personalidade e autonomia decidiram, por eles próprios e inspirados em outras experiências Brasil afora, ocuparem algumas dezenas de escolas em vários municípios do estado do Ceará com suas pautas bem específicas, reivindicando melhorias da qualidade da merenda escolar, da infraestrutura, entre outras demandas pedagógicas que estavam em sintonia com a pauta dos professores para além da questão de reposição salarial. 43 Os estudantes e professores reivindicam aumento da verba para merenda escolar (atualmente de R$ 0,31 centavos por aluno); revogação da portaria de lotação (PL 1169/15); passe-livre para estudantes no sistema de transporte público; aumento de verbas para projetos pedagógicos e culturais; e estudo das questões de gênero na grade curricular, em apoio à greve dos professores, iniciada em abril. (ESTUDANTES, 2016). Para o leitor se situar melhor, vamos lembrar aqui um breve contexto do que aconteceu especialmente no Chile, que, tornando-se uma espécie de referência no aspecto da luta e mobilização estudantil contra os desmontes da educação numa situação de política neoliberal e arrocho, com escassez de investimentos, serviu de inspiração para a nossa estudantada brasileira, mais bem mobilizada desde as Jornadas de junho de 2013, com toda sua pluralidade e diversidade de matrizes de pensamentos ideológicos e encaminhamentos políticos, vimos nossos estudantes secundaristas no Brasil e aqui do Ceará encamparem estas ocupações de escolas de forma bravia e conferindo aos mesmos grandes experiências de lutas: Em todo o Brasil, nos anos de 2015 e de 2016, estudantes secundaristas das redes públicas estaduais protagonizaram importantes reivindicações para, além de prestar solidariedade às reivindicações docentes, demandar o cumprimento do direito à educação pública de qualidade. O levante contou com inspiração do episódio que ficou conhecido como Revolta dos Pinguins: estudantes estabeleceram nova metodologia de funcionamento das escolas ao ocuparem cada espaço de educação formal em 2006, no Chile, em defesa do caráter público e gratuito. Os aprendizados andinos foram compartilhados através de documentos e cartilhas em redes sociais e, frente ao fechamento de escolas em São Paulo e com o grito de esperança ‘Isso aqui vai virar o Chile’, surgiu a Primavera Secundarista brasileira. Rio de Janeiro, Goiás, Minas Gerais também viram florear a mobilização estudantil e não tardou até que chegasse em nosso território. (CARLOS;SOUZA; BRAZ, 2018, p.20). No histórico de ocupações de escolas realizadas aqui no estado do Ceará, em 2016, o protagonismo inaugural ficou por conta da escola estadual CAIC Maria Alves Carioca, localizada no Grande Bom Jardim, periferia de Fortaleza, um bairro permeado de muitas lutas, como descreve esse relatório feito por estudantes da Universidade Federal do Ceará (UFC): Nasce na Escola Pública Estadual CAIC - Maria Alves Carioca, localizada no Grande Bom Jardim, a primeira experiência de insurgência estudantil deste ciclo no Ceará. Composto pelos bairros Bom Jardim, Siqueira, Canindezinho, Granja Lisboa e Granja Portugal, o território situa-se na periferia de Fortaleza e reúne um contingente populacional estimado em 220 mil habitantes. Destes, quase 60% são crianças, adolescentes e jovens - considerando de 0 até 29 anos, idade limite do Estatuto da Juventude na Lei nº 12.852/2013. Estamos falando sobre um lugar de gente jovem. O que não pode se estranhar que suas produções e invenções, como também parte significativa dos seus problemas e desafios, atinja principalmente estes perfis. Por isso, protagonizou cinco ocupações em escolas públicas de forma autônoma, auto gerida por estudantes e com apoio comunitário de movimentos políticos, organizações sociais e coletivos juvenis da cidade de Fortaleza e do Ceará. (CARLOS; SOUZA; BRAZ, 2018, p.12). 44 Em questão de dias e semanas, outras escolas, seguindo as experiências anteriores já vividas ou em curso, fizeram o movimento de ocupações das escolas estaduais cearenses crescerem com o apoio de parte dos professores mais engajados e assíduos ao movimento e parcelas da comunidade escolar, como pais e mães que se mobilizaram na greve e nas ocupações. As atividades feitas nas escolas mostravam sua diversidade. Aulas preparatórias para o Enem, oficina de culinária, artes marciais, palestras, jogos de tabuleiro. Eram doações e arrecadações de alimentos, realização de pedágios nos semáforos próximos a escola para cotizar dinheiro para materiais de confecção de faixas e cartazes e atividades afins. Dali em diante, mais do que nunca ou antes já visto, as negociações do governo estadual se ampliaram para além das mesas de negociação com o sindicato da classe dos professores. A experiência das ocupações apresenta um fazer sui generis e interessante. A ação coletiva com princípios de autogestão torna o movimento muito plural, diverso, cheio de representantes todos legais e legítimos, mesmo que por muitas vezes o clima entre gestão da escola e estudantes mobilizados e ocupantes tenha ficado muito tenso, dado a novidade de um movimento tão diferente, que por vezes tinham grêmio estudantil organizado na escola ou não. 45 CAPÍTULO 2 – PROTAGONISMO JUVENIL NA COMUNIDADE ESCOLAR Primeiramente, ao resgatar a ideia de protagonismo juvenil na comunidade escolar, quero destacar que esse substantivo, que se associa de imediato à juventude em nosso dicionário da língua portuguesa, remete-me à categoria dos estudantes em evidência, reconhecendo e me apoiando nos documentos oficiais e, para além deles, no que diz respeito a chamada mobilização de conhecimentos ou competências que entende que estes agentes escolares concluam o ensino médio com instrumentais de experiência e conhecimentos capazes de execução desse protagonismo para toda uma vida e para além da escola. Reconhecemos que a unidade escolar é campo fértil para viver experiências de interferência na realidade, de uma prática cidadã que se prolongue para outros aspectos da vida. Entre as dez Competências Gerais da Educação Básica listadas na Base Nacional Curricular Comum (BNCC), temos no texto oficial variados apontamentos que indicam a formação plena e geral, educativa intencional e dirigida pelo Estado e seus agentes, com apoio da sociedade e da família, para formarmos seres humanos dotados de várias virtudes para a vida, as quais, no campo específico das Ciências Humanas, relacionam-se com a ideia de protagonismo, ressaltando aqui a competência de número seis. Valorizar a diversidade de saberes e vivências culturais e apropriar-se de conhecimentos e experiências que lhes possibilitem entender as relações próprias do mundo do trabalho e fazer escolhas alinhadas ao exercício da cidadania e ao seu projeto de vida, com liberdade, autonomia, consciência crítica e responsabilidade. (BNCC, 2018). Esse alinhamento de ideias que impulsionam os sujeitos e sujeitas para a valorização da diversidade, a compreensão da pluralidade, a consciência crítica, sempre reforcei e procurei construir insistentemente na escola, nos papéis de professor e gestor, como algo inalienável de ser exercido por nós educadores e nossos educandos. Nossa caminhada trilhada com a passagem pela escola, inseridos na sociedade para o provável mercado de trabalho nesse contexto da sociedade capitalista e essa cidadania que se busca constantemente, não se pode deixar de querer alcançar, pela incompletude desse contexto social e político de Brasil desigual e excludente. Não vejo uma saída para nós periféricos (assim compreendo que somos no extrato social) que não seja o horizonte das lutas. E tenho a compreensão de que não contaremos com muitos ou nem sei mensurar quantos, devido a um processo proposital de alienação realizada com esmero pelas classes dominantes e outros grupos sociais num mecanismo muito alinhado. Mas a História, enquanto conhecimento escolar, sozinha não dará conta de todo um processo 46 de iniciativa de mudança, tampouco sem ela conseguiremos superar esse cenário de injustiças sociais que convivemos em nosso meio. Saí em busca de sentidos contextualizados que pudessem dialogar com nossa intenção de pesquisa, de revelar, mostrar como a História enquanto disciplina escolar veio na sua trajetória, reformulando-se, ganhando novas ideias e abordagens. Passando pela superação de uma História de caráter nacional, enaltecedora de grandes feitos heroicos que davam brilho a grandes personagens, tivemos uma História enquanto disciplina que buscava superar uma visão excessivamente política e econômica, que, a muito custo, foi incorporando por meio de formação e produção de novos conhecimentos, novas temáticas e possibilidades, que dessem conta de um arcabouço maior, ampliado, em que tudo se pudesse criar conexão com a História, ser a própria. Afinal, por que se estuda História e para que ela serve? [...] o conhecimento histórico não se limita ao passado por si só, ou aquela antiquada noção que estudar história é decorar datas e nomes. Pelo contrário, estudar história é compreender um escopo gigantesco de possibilidades: política, guerra, crises, economia, meios de produção, costumes, religiões, ritos, espiritualidade, tecnologia, ciências, artes, vestuário, objetos, relações sociais, relações de poder, classes sociais, legislação, direito, saúde, sexualidade, corpo, gênero, emoções, gostos, comportamento, doenças, meio-ambiente, cidades, o campo, o espaço geográfico etc. Isso é estudar história. É perceber que o conhecimento histórico pode ser útil para os mais distintos fins, embora alguns nem sempre positivos ou benéficos [...] (VILAR, 2017). Portanto, ao encontrar uma boa síntese da compreensão e admiração que tenho pela História, como profissional dessa ciência que sou, este trabalho visa dar destaque a uma articulação que tenho me esforçado para justificar e convencer: de que a História, presente em toda nossa formação de professores e estudantes na educação básica e findando com a conclusão do Ensino Médio, com uma possível ida de muitos ou alguns ao ensino superior ou diretos ao mercado de trabalho e para toda uma vida, independente do destino de cada um, estará lá, nos bancos escolares, nas mídias em suas diversas narrativas cada vez mais públicas, à disposição para o seu uso ou consulta, como sendo umabússola, através da qual questionamos e buscamos nos orientar aonde queremos chegar e como esse conhecimento nos influenciará e nos ajudará. Em especial aqui na rede estadual de educação do Ceará, a qual possui documentos norteadores, como o Documento Curricular Referencial do Ceará (DCRC) que, passado por um processo de chamada pública para a sua construção em 2019, materializou-se em 2021, estando disponível a todas as escolas e educadores. A partir do Programa de Apoio à Implementação da Base Nacional Comum Curricular, instituído por meio da Portaria MEC nº 331, de 05 de abril de 2018, a Secretaria da Educação do Estado do Ceará vem construindo o Documento Curricular Referencial do Ceará (DCRC) – Ensino Médio, tendo como referência a Base 47 Nacional Comum Curricular (BNCC). Para tanto, inicia-se a consulta pública do capítulo referente à Formação Geral Básica, que compete às matrizes e às concepções de cada área do conhecimento. Sua contribuição é fundamental para fortalecer o processo de elaboração desse Documento, mas, antes de enviar suas contribuições, é importante saber que [...]. (SEDUC, 2019). Assim, numa convocação de colaboração dos educadores da rede estadual em coparticipação com outros agentes educacionais, que dariam cabimento a materializar o documento referencial curricular, como sugere o texto da matéria institucional na página da secretaria de educação, citada a pouco, afirmava-se: “após esta consulta pública, as contribuições serão analisadas e os documentos revisados pelos redatores e colaboradores”. A seguir, então, tal documento ficou pronto e está disponível para análise e uso de toda a rede, como segue nessa outra notícia do mesmo sítio. A Secretaria da Educação (Seduc) entregou, nesta terça-feira (14), o Documento Curricular Referencial do Ceará (DCRC) ao Conselho Estadual de Educação (CEE), para que o órgão faça a apreciação e a homologação da obra. Depois de aprovada, a produção servirá para nortear o sistema de ensino cearense em todas as redes que ofertam o nível médio, quanto à estruturação do currículo. (SEDUC, 2021). Documento pronto e disponível para análise e uso de toda a rede estadual do Ceará, vamos buscar nele mais elementos que reforcem essa ideia do protagonismo juvenil, destacando uma preocupação com o coletivo social. A ação educativa norteada pelo princípio do protagonismo infanto-juvenil explora uma característica latente no ser humano, que apenas requer agentes situacionais provocadores que a façam vir à tona. Os sujeitos são mais ou menos protagonistas em função das oportunidades que têm para exercitar sua capacidade de protagonizar ações. Cumpre considerar que o tipo de educação ainda predominante na escola atual, em que o educando é mero repetidor do que lhe é ensinado, obviamente, não contribui para fazer aflorar seu protagonismo. (CEARÁ, 2019, p.38). Assim, esse protagonismo juvenil deve ser uma experiência viva nas escolas. Estudantes irmanados aos seus professores, pais, núcleo gestor e toda a comunidade escolar, devem desenvolver a compreensão e ação de situações que coloquem a juventude em evidência, como o texto do Documento Curricular Referencial do Ceará (DCRC) sugere nesta parte aqui apresentada e tenho acordo. É essencial, então, que se considere o fato de que sem encarar com vigor a responsabilidade de formar as novas gerações para atuarem, comprometida e competentemente, na construção de novos tempos, o país continuará enfrentando situações que farão jus à crítica de não está dando certo. É também essencial a convicção de que este processo formativo exige novo tipo de relacionamento entre jovens e adultos, no qual o adulto, no caso o professor, deixa de ser simples transmissor de conhecimentos e assume o papel de parceiro na vivência do diálogo, da negociação e da convivência de natureza comunitária. Sai de cena o detentor único 48 do saber e entra o mediador que abre caminhos e orienta o educando a percorrer estradas abertas e descortinar muitas outras. (CEARÁ, 2019, p. 39). Para continuar em consonância com esse ideal de estudantes ativos e dispostos a fazer interferência a partir de suas vivências escolares, trago também o Projeto Político Pedagógico (PPP) da Escola Luiza Távora Promorar, que em seu texto também traz a ideia reforçada de uma juventude participativa e cidadã, na parte Missão da Escola - Objetivo Geral: Oferecer uma educação de qualidade, democrática, visando a valorização do aluno enquanto ser humano capaz de desenvolver suas potencialidades, buscando a sua formação enquanto cidadão consciente do seu papel social e preparado para enfrentar os desafios do mundo do trabalho e do prosseguimento nos estudos nos níveis de educação seguintes. (ANEXO D) Fazendo um elo sempre necessário que reforce a ideia de cidadania construída para a compreensão e prática social dos estudantes, o Projeto Político Pedagógico da escola Luiza Távora Promorar ainda nos traz a reflexão, do cidadão que queremos formar; Queremos formar um homem digno, consciente do seu papel enquanto pessoa e cidadão, na sua relação consigo próprio e com os seus semelhantes a fim de que possa ser um agente propulsor e transformador da sociedade que desejamos ter. Queremos formar um homem íntegro em suas ações a fim de que possa através dos seus atos, difundir valores essenciais e necessários à boa convivência humana. (ANEXO D). Sem perder de vista esse norte da cidadania e trazendo para o campo da História e suas múltiplas funções e possibilidades, exponho aqui um excerto extraído de pesquisa, que muito me convence de que essa disciplina escolar tem, entre tantas potencialidades, A compreensão de cidadania em uma perspectiva histórica, como resultado de lutas, confrontos e negociações, e constituída por intermédio de conquistas sociais de direitos, pode servir como referência para a organização dos conteúdos da disciplina histórica. A partir de problemáticas contemporâneas, que envolvem a constituição da cidadania, pode-se selecionar conteúdos significativos para a atual geração. Identificar e selecionar conteúdos significativos são tarefas fundamentais dos professores, uma vez que se constata a evidência de que é impossível ensinar “toda a história da humanidade”, exigindo a escolha de temas que possam responder às problemáticas contundentes vividas pela nossa sociedade, tais como as discriminações étnicas e culturais, a pobreza e o analfabetismo. (BRASIL, 1999, p. 304-305). Essa reflexão deverá ser mais bem explorada na parte que trataremos do produto desta dissertação, na qual discorrerei sobre a construção de uma disciplina eletiva que traga as possibilidades de elevar uma compreensão de que os conteúdos selecionados na disciplina de História podem e devem nos mover para ir além da teoria. Que percebamos que a prática social seja exercida no nosso cotidiano em variadas situações da nossa vida, para as quais o conhecimento histórico possa dar suporte e encorajamento. 49 2.1 A caminhada junto a escola e outros apontamentos Sou professor de História da rede pública estadual do Ceará desde 2010, com ingresso por via de concurso público. No entanto, meu exercício no magistério se inicia no ano 2000, primeiramente na rede privada com turmas de ensino fundamental, séries finais, as quais proporcionaram mais experiência. Naquele ambiente, além de ter a confiança dos meus gestores/empregadores, tive a oportunidade de trabalhar simultaneamente com turmas de Ensino Médio. Nesses dez anos iniciais de carreira, consegui mesclar minha experiência de sala de aula, tanto na rede privada quanto na pública, na condição de professor em regime de contrato temporário. Faço a opção deste relato porque são experiências e espaços de trabalho e convivência que se apresentam de formas um tanto diferenciadas. Eu sou aqueleque sempre desejei trabalhar exclusivamente com os estudantes da rede pública de ensino, mesmo sabendo que, por vezes, as necessidades financeiras e de sobrevivência me colocaram a rede privada como uma opção. Assim, mesmo aprovado em concurso público para a rede estadual de ensino, quase sempre me dividi entre as duas redes, pública e privada. Estou lotado na mesma unidade escolar até o presente momento do desenvolvimento deste trabalho. A escola em questão é a Escola de Ensino Fundamental e Médio Luiza Távora Promorar. Ela se localiza no bairro Tancredo Neves, periferia de Fortaleza. Somos uma escola regular de funcionamento em três turnos, atendemos da nona série do ensino fundamental em diante, todo o Ensino Médio, incluindo a Educação de Jovens e Adultos, no turno noturno. Nesse ínterim, tive a oportunidade de ser gestor escolar na função de diretor, por quatro anos e meio. Depois dessa valiosa experiência, voltei à sala de aula para ter uma vivência mais profunda como professor da rede pública de ensino. Assim, vou me realizando profissionalmente em atender uma parcela da população juvenil que historicamente carece e necessita de ótimos, regulares e constantes serviços prestados de educação escolar com comprometimento. Faço esse relato, pois a maioria de nós professores conhece o universo das escolas privadas e públicas ao mesmo tempo e, no meu entendimento, ambos os espaços educativos e formativos precisam e merecem professores empenhados na aprendizagem e na convivência honesta do ambiente escolar. É fundamental amar e lutar pelo nosso fazer pedagógico. Reiterando, a escola oferece a partir do nono ano do ensino fundamental (em regime de colaboração com o município), segue com o Ensino Médio no formato de escola regular (EEFM) e ainda possui, no turno noturno, a Educação de Jovens e Adultos (EJA). Atualmente, 50 a rede de ensino do Estado do Ceará apresenta um número crescente de Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral (EEMTI), somadas às Escolas Estaduais de Educação Profissional (EEEP), que também são integrais, visando a atender uma demanda do Plano Nacional de Educação (PNE), Lei 13.005/2014, que busca a ampliação de escolas em tempo integral, na sua meta de número seis. Segundo o Plano Nacional de Educação (PNE 2014-2024), “Oferecer educação em tempo integral em, no mínimo, 50% das escolas públicas, de forma a atender, pelo menos, 25% dos (as) alunos (as) da educação básica”. Portanto, cada vez menos existem escolas regulares na rede estadual de ensino do Ceará. Ao início de cada ano letivo, a procura por matrículas dessas turmas de nono ano do ensino fundamental, séries finais, em nossa escola, é bem generosa, com alunos oriundos da rede pública municipal e escolas privadas do próprio bairro, visto que muitos pais ou responsáveis procuram esse modelo de escola regular para que os jovens possam dar prosseguimento aos estudos conclusivos do Ensino Médio, às vezes também conciliando com atividades de trabalho, mesmo precárias em meio à informalidade recorrente nas periferias das grandes cidades. Por outro lado, temos os estágios na função de menor aprendiz, estes regulamentados por leis específicas que protegem o adolescente e chegam até a escola pública por meio de parcerias entre as secretarias do Estado e empresas. Pode parecer estranho, mas existe uma concorrência entre escolas públicas dentro da mesma rede por matrículas nas proximidades territoriais, pois apesar das impressões de que o serviço público é por todo nivelado por baixo, na cabeça de parte da sociedade brasileira, as escolas e as pessoas que fazem parte dela sentem aquele bom orgulho quando se sabe que a sua escola é bem quista e tem referência de qualidade dos serviços prestados à comunidade. E acrescento que mais alunos matriculados garantem um maior aporte financeiro, que bem gerido e executado, pode auferir mais qualidade de ensino e aprendizagem, de acordo com o índice custo-aluno-qualidade, que através do Plano Nacional de Educação, lei 13.005/2014, visa a garantir recursos básicos ao funcionamento satisfatório das escolas em todo o Brasil. Descrevendo melhor a comunidade escolar da qual faço parte, posso afirmar que o estigma da violência e a pobreza, no quesito baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), faz da região onde a escola se localiza um local repleto de rótulos associados ao medo, ao tráfico e ao consumo de drogas e, por consequência, gera um sentimento de baixa estima em parte da comunidade, que reflete negativamente no ambiente escolar. Os seguintes dados de domínio público trazem um retrato não estático e determinante, mas com certeza traz uma carga de subjetividade sobre a composição dos que lá habitam e estudam. 51 A Regional VI reúne 20,37% da população de Fortaleza e tem, também, a população mais jovem: 50% dos habitantes têm, no máximo, 22 anos. É ainda a Regional com maior índice de analfabetismo. Ocupa a terceira colocação em relação à renda familiar média mensal, com 4,67 salários mínimos, abaixo das Regionais II e IV. A principal atividade econômica é a de serviços e a Regional concentra 10,2% dos empregos formais de Fortaleza. (PMF/SER VI, 2011). Observadas estas informações, é de se destacar a importância do equipamento público escolar que foi erguido para atender inúmeras famílias que lá se instalaram para morar e viver. Portanto, são muitos anos de serviços oferecidos em que posso afirmar que foi construída uma rede de afeto e respeito pelos bons serviços prestados por esta escola a várias gerações da comunidade, mesmo com as dificuldades inerentes à convivência diária com a violência de diversas ordens, a baixa escolaridade dos seus moradores e um poder aquisitivo abaixo da média comparativa da cidade. Nesse contexto, a escola se tornou uma fagulha de esperança para a alfabetização em outros tempos, posteriormente assumindo um papel mais dedicado aos estudos finais da educação básica, visto que, como já mencionado, atende da nona série do Ensino Fundamental, Ensino Médio e ainda a Educação de Jovens e Adultos. Assim, temos um retrato do chamado Grande Tancredo Neves (GTN), baseado neste relato de uma realidade pesquisada e aqui apresentada: Dessa maneira, muitas famílias do Grande Tancredo Neves, além de passíveis à degradação ambiental, estão expostas a uma vulnerabilidade civil e socioeconômica: ausência de saneamento básico, insuficientes condições infra estruturais para lazer e cultura, precárias ou inexistentes instalações elétricas, moradias depauperadas, subemprego, desemprego, consumo abusivo de substâncias psicoativas legais e ilícitas etc. Para completar o quadro da privação simbólica e material, o bairro é um dos mais atingidos na capital cearense pelas taxas epidêmicas de crimes violentos que varrem com sangue e mortes as periferias, cortiços e favelas brasileiras. (PIRES, 2020). Sobre os/as meus/minhas alunos/as e minha escola, preciso descrevê-los como os percebo nesse tempo que tenho convivido nesta comunidade do Grande Tancredo Neves. A nossa escola fica numa periferia de Fortaleza, com os problemas sociais típicos da violência, do tráfico intenso e consumo de drogas, da insegurança alimentar, da precariedade de serviços públicos insuficientes às necessidades da comunidade. São jovens que, na escola, apresentam uma enorme diversidade de vida e contexto familiar, com ajustes e desajustes no comportamento, sinais de agressividade, mas também de afeto. É importante falar dos afetos, pois, por mais que a vida se apresente tão dura e sofrível, temos uma maioria de alunos e alunas capazes de gestos de carinho e respeito para com todos e entre si. Posso dizer que abomino qualquer espécie de rótulo que se apregoa a alguém ou a 52 um conjunto de pessoas de uma comunidade. Existe no adágio popular e dizeres de um povo citadino que quando se perguntaa alguém onde você mora e a resposta em Fortaleza são determinados bairros, como Bom Jardim, Barroso ou Tancredo Neves, a expressão de espanto é quase que automática, gerando um esquisito misto de humor sarcástico ou puro preconceito depreciativo vinculado aos graves problemas sociais inerentes ao bairro ou comunidade. E por inúmeros fatores externados pela violência urbana que atualmente nos assola por conta do fenômeno recente das facções, do crime organizado, dizer onde mora, de onde veio e qual a sua origem territorial pode ser prenúncio de problemas. Infelizmente é assim que tem nos ocorrido. Portanto, reitero meu carinho e respeito por esta comunidade que também acaba nos acolhendo como mais do que professores, mas como amigos próximos e quase como sendo familiares deles. Comumente, profissionais por lá trabalharam ao longo de décadas findando com a sonhada aposentadoria. Por vezes, a escola foi contemplada e assistida por projetos de mediação de conflitos e práticas restaurativas, em parceria com o Instituto Terre Des Hommes, na linha de formação da gestão, docentes e estudantes para a resolução de conflitos internos de indisciplina escolar, que são corriqueiros e preenchem muita energia e folhas de livros de ocorrência1. Tivemos também, em um histórico recente, a participação da Polícia Militar do Estado do Ceará em parceria com a Secretaria de Cultura e Educação, através do projeto Ronda Cultural2, com vistas à construção de uma cultura de paz em territórios da cidade, onde se registravam mais vulnerabilidades e relatos de violência de toda ordem. Por meio das artes, em forma de músicas e grafites, a tentativa era de aproximação dos agentes de segurança pública do público escolar. Os meios e recursos institucionais, quando existem, fazem enorme diferença no cotidiano da escola e na vida desses sujeitos. Vivenciei nestes onze anos nesta comunidade a experiência do programa Mais Educação (ANEXO E), um projeto que assistia uma pequena quantidade dos alunos em atividades no contraturno. Através do Projeto, pudemos oferecer oficinas de teatro, reforço de matemática e língua portuguesa, esportes como capoeira e karatê, aulas de grafite, dança e banda fanfarra. Tínhamos também o Escola Aberta, projeto que incentivava a abertura das portas da escola aos finais de semana para manhãs esportivas com tênis de mesa, basquete, voleibol e futebol de salão. Projetos em parcerias com a associação de moradores, o Batalhão e Comando da Polícia Militar e outras entidades são exemplos de apoios que estiveram presentes no meio escolar e fizeram um grande bem no desenvolvimento 1 Cf.: https://www.tdhbrasil.org/reportagem-sobre-acoes-do-projeto-mucuripe-da-paz/ 2 Cf.: https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/seguranca/seguranca-lanca-o-ronda-cultural-1.743402 53 cognitivo e saudáveis hábitos sociais, como eu próprio pude testemunhar. Lamentavelmente, os aportes financeiros, das esferas públicas, sobretudo federal, ficaram mais escassos nos últimos anos, trazendo uma escassez ou quase o fim de atividades suplementares à escola como um todo. Atualmente, é raro destacar parcerias presentes na escola. Desde março de 2020, entramos na espiral dessa pandemia do Covid-19, que abalou o mundo, e a escola então tem sido um misto de novas experiências de aulas remotas com o uso de novas tecnologias, mesmo que a maioria de nós não tenhamos acesso ou ainda estejamos aprendendo a manuseá-las para o ensino-aprendizagem. Tem sido difícil de ver ou fazer novas experiências com nossos estudantes. Outro grande desafio do presente tem sido incluí-los e trazê-los de volta pelo menos para as rotinas das aulas. Tempos difíceis, mas creio que superaremos. É muito difícil fazer tal descrição de comportamentos e projetos de vida sem criar aquela ideia equivocada do rótulo, pois como temos alunos tidos como difíceis e por vezes indomáveis, no sentido disciplinar, temos também diversos estudantes dispostos, estudiosos, criativos, tranquilos ou por vezes “apáticos”, situação que pode também estar associada às dificuldades de diagnosticarmos os variados déficits de aprendizagem. Daí, compreendo que a escola está a serviço de todos, numa lógica totalmente inclusiva, como se destaca no projeto político pedagógico e se aplica na prática diária do acolhimento. A cada uma e a cada um, no seu devido momento vivido, precisamos oferecer as melhores condições que sejam para preparar o/a aluno/a para concluir com sucesso sua educação básica através do ensino fundamental e médio. Inclusive, estive observando que fazer festa de formatura nestas duas séries conclusivas, nono e terceiro ano, deixaram de ser práticas tão recorrentes, pois o desejo de entrar em uma universidade, seja pública ou privada, passou a fazer parte do sonho de uma parte de nossa juventude escolar. Outra parte do alunado também considerável quer o seu “canudo” e partir para o mercado de trabalho. Comumente passaram a fazer apenas festinhas de despedida no formato aula da saudade. Sabemos que não seremos a palmatória do mundo, como tanto se diz popularmente e, nem de perto, sozinhos, resolveremos os inúmeros problemas que surgem, mas em ações coletivas e comprometidas, temos um grupo de educadores que estão na escola para fazer a diferença na vida de muitas pessoas. A convivência diária e contínua com eles e elas neste espaço sagrado que considero a escola constrói em mim um sentimento muito positivo de cuidado, de interesse, para que aprendam e possam passar pela jornada escolar numa mínima transformação que seja para que, a partir dali, tenham uma vida melhor, seja no encaminhamento para o mercado de trabalho, 54 para a ida a um curso técnico ou superior, que lhes oportunizem uma posição melhor na vida. Como professor de História, especialmente falando, desejo que sejam todos cidadãos mais dispostos e bem fundamentados a compreender as engrenagens do sistema econômico e social que vivemos e como se sobressair em meio a ele de forma digna e justa. É trabalho árduo e contínuo, mas necessário. Aprofundando a reflexão sobre nossa comunidade escolar, a qual está inserida no contexto de um país socialmente injusto e cheio de desafios e enfrentamentos que, por vezes, podem parecer invisíveis ou sem muito impacto sobre suas vidas, digo que tudo que os ocorrerem reflete em seus comportamentos e decisões de suas vidas. Para entender a engrenagem do serviço de educação pública, é preciso sentir, viver um tempo numa mesma comunidade escolar para fazer qualquer juízo de valor sobre as aspirações que alunos/as vão construindo a respeito da escola e dos seus objetivos na vida. Às vezes, uma gravidez indesejada ou não planejada, uma situação de dificuldade financeira mais acentuada que os obriga a abraçar um emprego precarizado, a violência que também mata e já vitimou alunos do nosso convívio, decretos extraoficiais do crime organizado expulsando famílias de suas casas, entre tantos outros desafios os fazem abandonar a escola. Não à toa, o combate à evasão escolar e os índices de aprovação e reprovação são pautas que tratamos em coletivo nos conselhos de classe e rotina da nossa escola regular. Nosso último censo pode comprovar tais afirmativas3. Este cenário do censo escolar, bem se detendo nas respostas dos estudantes e concludentes do terceiro ano do ensino médio, observando a baixa escolaridade dos familiares, a relativa frequência com que falam sobre a rotina escolar, presença de aulas, rendimento, participação em reuniões e outros informes, é um parâmetro da realidade que descrevo, tomado pelo convívio que tenho tido nessa caminhada de EEFM Luiza Távora Promorar, onde o sucesso escolar, muitas vezes, é continuar e concluir o Ensino Médio. Se alguns/as conseguem ir além dessa etapa de conclusão básica e chegam ao nível superior, o que tem sido desejo e alcance de um número crescente,é uma alegria imensa e uma realidade mais possível nos últimos anos. O Palácio da Abolição foi cenário, nesta quinta-feira (8), de grande celebração para a Educação no Estado. O Governo do Ceará divulgou que um total de 16.897 alunos da rede pública ingressaram no ensino superior em instituições públicas e privadas no ano passado. Este é o maior número da história cearense. A conquista foi apresentada pelo governador Camilo Santana, acompanhado pelo secretário da Educação, Idilvan Alencar, durante grande festa que reuniu jovens estudantes, educadores e lideranças políticas. (SEDUC, 2018). 3https://novo.qedu.org.br/escola/23073411-eefm-dona-luiza-tavora-promorar/questionarios-saeb/alunos-3em. 55 Sem sombras de dúvidas, sou testemunho desse momento de crescimento do ingresso de estudantes cearenses nas universidades públicas e privadas. Destaco o investimento do concurso público que trouxeram mais professores especialistas em suas áreas de ensino, o incremento de suporte pedagógico nas escolas com mais laboratórios de ciências, redação, matemática, as coordenações de área e o Projeto Professor Diretor de Turma (PPDT), as inúmeras escolas de tempo integral, fossem profissionais ou integrais, além das regulares, deram mais apoio e condições de estudo e sucesso escolar para um ingresso cada vez maior de nossos alunos nas faculdades e universidades. Continuando a explorar essa observação da escola, considerando o engajamento dos estudantes com efeitos a interferir na rotina escolar, reivindico que esse envolvimento seja maior. A princípio, a ausência do grêmio estudantil atualmente constituído, mesmo sendo uma urgência a formação desse colegiado por parte da Superintendência Escolar por meio da secretaria de educação, traz-me uma boa esperança de ler essa meta de gestão no atual projeto político pedagógico da escola em suas metas anuais (2020 a 2022): “programar as ações dos organismos colegiados na E.E.F.M. Luiza Távora Promorar, tais como, Conselho Escolar e Grêmio Estudantil na ordem de 100% até dezembro de 2022”. Assim, em conjunto e incentivando, espero que tenhamos uma maior participação dos estudantes em espaços decisórios da escola como forma de ser um exercício constante para que levem essa experiência para além da escola, no bairro, no trabalho e meio social. Poderia citar exemplos de como essa ausência estudantil pode ser nefasta e de mau costume, como uma acomodação, relaxamento. Se esse coletivo de estudantes, seja através do grêmio estudantil ou mesmo por meio das lideranças de sala, que é premissa de ação dos professores diretores de turma com suas turmas de ensino médio fazerem essas escolhas democráticas, o nível e grau de participação dos alunos decai e, infelizmente, por descuido, desatenção ou intencionalidade, as decisões tipo: planejamento anual letivo, elaboração do calendário, reposição aulas de dias de greve, gincana escolar, semana cultural, feira de ciências, intercalasse e outros eventos, ficam geralmente restrita aos professores em reuniões desses pares. No entanto, nesse coletivo de estudantes da escola, é inegável que temos estudantes como lideranças pulsantes que nem precisam de convocação. Simplesmente elas/eles se apresentam e propõem, reivindicam, questionam e conseguem reverter decisões tomadas apenas pelos ilustres professores. Creio que o comportamento que observamos na escola é muito reflexo do que temos como referência na vida adulta, que cercam nossos jovens em seu cotidiano e meio social e familiar. Há aqueles que lutam pela sua sobrevivência numa batalha 56 diária pelo seu pão de cada dia e há os que ampliam sua dimensão na luta por causas mais coletivas e de longo alcance, parecido com o parafrasear daquela poesia de Bertold Brecht sobre os lutadores sociais que lutam todos os dias e são imprescindíveis. Por isso, colegiados, como o Conselho Escolar, a Unidade Executora e sobretudo, o grêmio estudantil, precisam estar ativados na escola. As deliberações que sabemos que por toda hora acontecem, de uma forma ou de outra, não podem renunciar à presença da ideia dos estudantes. A presença permanente e constante destes atores é imprescindível. 2.2 O conhecimento histórico e a legislação educacional inseridos nessa ideia da intervenção política e social Assim, feitas essas observações pertinentes de como vejo e interpreto a realidade do meu local de trabalho, no contato com as juventudes e as experiências dos meus anos vividos no magistério como observador participante, bem menos no papel de pesquisador e produtor de novas reflexões sobre o conhecimento histórico, mas como um professor mais assíduo ao dito “chão da escola”, desafio-me a levantar algumas observações da produção historiográfica que poderão me ajudar a fazer esse elo que me proponho a mostrar: como o conhecimento histórico processado internamente pelos estudantes pode vir a ser elemento constituinte fundamental e relevante para sua auto-organização e interferência na realidade materializada, seja com a existência ou não de um grêmio estudantil constituído e atuante. Em debates historiográficos acadêmicos mais recentes, persiste uma boa preocupação de como os nossos jovens estudantes estão aprendendo e internalizando a História, disciplina escolar, como uma ciência capaz de provocar melhores intervenções na realidade, como registrado neste extrato: Para que isto ocorra, a aprendizagem da História demanda um processo de internalização de conteúdos e categorias históricas viabilizadores de processos de subjetivação, isto é, de interiorização dos sujeitos, com vistas às ações transformadoras e mudança da realidade. (SCHMIDT, 2009, p.34). Deste modo, a leitura da produção historiográfica sobre como esse saber histórico escolar transforma e faz mudar a compreensão e ação dos estudantes sobre a rotina escolar e a vida serão elucidativos. Carrego uma experiência prática do lecionar que subjetivamente me traz um sentimento de que a disciplina escolar de História cumpre bem o seu papel, diria clássico, ao que podemos chamar de senso comum, de que é uma matéria escolar que dá condições básicas aos educandos de conhecer o passado, entendê-lo e daí terem uma 57 compreensão melhor do presente com possíveis possibilidades de intervenção sobre ele. São respostas bem comuns de se apreender, inclusive, foi o que colhi nos formulários/questionários (ANEXO I) que captei com alunos que, de forma mais direta, estiveram participando das ocupações de escolas estaduais no Ceará em 2016. É um conhecimento que nos dá esse legado, que não é algo desprezível, mas importante para pautar o agir de muitas pessoas que complementam, que com esse mínimo ou mediano conhecimento histórico, pomo-nos a ponderar, refletir e compreender melhor a sociedade e sua trajetória no intuito de darmos passos mais seguros. Nessa busca, trago a contribuição de Lee (2005), novamente no texto de Schmidt (2009): Nessa perspectiva, aprender História significa contar a História, isto é, significa narrar o passado a partir da vida no presente. O principal objetivo é elaborar uma orientação relacionada com a construção da identidade de cada um e, também, organizar a própria atuação nas lutas e ações do presente, individual e coletivamente. (SCHMIDT, 2009, p.37). A leitura desse recorte me faz pensar muito na minha prática de ensino. Afinal, a pesquisa em curso passa muito sobre minha atuação docente, vivências e o meu enlace de professor para com os meus alunos, sobretudo, quando o estudo do passado não tem sentido de ser apenas meras informações de como o mesmo fora, mas se importar de como aqueles fatos interferem no nosso presente. Tomar o presente como premissa e, a partir daí, olhar ao nosso redor e nos posicionarmos como devemos agir socialmente: isso tem sentido e valor de se estudar História. Para novamente apontarpossíveis horizontes de fundamento de pesquisa nesse espaço/roteiro, cito SILVA (2019): É uma observação situada no tempo e com muitas variáveis. Isso porque a história escolar é uma construção social produzida por elaborações e reelaborações constantes de conhecimentos produzidos a partir das relações e interações entre as culturas escolar, política e histórica; com os livros didáticos; com outros saberes que não apenas os históricos e muito menos circunscritos aos formais; com as ideias sobre a história que circulam em novelas, filmes, jogos etc.; e, não menos importante, com a história pública (história de grande circulação, ou de massa). (SILVA, 2019, p.52). Desta feita, faz-se desafio no ambiente do conhecimento histórico escolar da educação básica no qual estou inserido compreender como meus alunos e alunas estão se relacionando com o conhecimento histórico, seja ele o escolar ou de domínio público. Será que estamos em sintonia com o aprender a pensar historicamente e, daí, cada qual e/ou em coletivo, com suas operações mentais e vivências, podemos olhar para este mundo e afirmarmos que sabemos por que estamos aqui e onde queremos chegar? São exercícios fascinantes de serem feitos. Creio que na prática, alunos e professores, já o fazemos de maneira inconsciente, porém, municiados 58 de mais embasamento historiográfico fundamentado em novos estudos, vamos juntos encaminhar novos desafios e esperanças de um mundo socialmente mais justo. Acredito nesse potencial da História como conhecimento escolar e para além dela, mais do que antes, com todas as novas interações que estão em evidência nas redes sociais e sua intensidade de uso. Se ser professor em comunhão com os alunos não for para impactar e transformar, não vale a pena. Sem bancar o herói e se considerar a palmatória do mundo, como muito se diz e se escuta na linguagem popular escolar, mas que esse discurso também não soe como ignorar e fazer vista grossa diante do tecido social esgarçado que temos no nosso país e pouco ou nada fazer. Não somos meros reprodutores do passado dando aulas. Defendo que somos sementes e frutos de alguma transformação. Contudo, nós mesmos, os professores, atentos a todo equivocado papel pejorativo de manipuladores que alguns nos acusam, de detentores das verdades impostas, das quais algumas vezes somos caluniados, devemos ter altivez e esmero, pois somos parte ou, no mínimo, corresponsáveis pelo diferente momento que estamos vivenciando de mais abertura e participação da elaboração dos currículos, livros didáticos e políticas públicas, conforme afirma Gatti Júnior (2010): Portanto, as mudanças, que percebemos nos livros didáticos e nos programas de ensino de História em todo Brasil, resultam das pressões dos movimentos sociais, especialmente, de professores, sobre os legisladores e o governo, com resultados que significaram a entrada de temas ausentes das aulas de História em passado recente. (GATTI JÚNIOR, 2010, p. 119). Sem dúvidas, a ciência histórica, no seu exercício de movimento, compreendeu sua dinâmica de desafios e, assim, não permaneceu estática. Passamos por mudanças que vão desde a valorização de novas abordagens, como também mudanças curriculares e de legislação. O ambiente democrático aberto em nosso país nas últimas três décadas nos trouxe mais possibilidades de trabalhar a disciplina escolar de História a partir de novos olhares e novos objetos. Desta feita, reside a importância de todos que contribuem para sua existência. Desde os professores da academia, que buscam delinear suas estruturas de pensamento, base epistemológica e filosófica, passando pelo professor da educação básica, que vai encarar a relação dialógica com os estudantes em salas de aula. Não é objetivo aqui hierarquizar, mas se apontar a necessidade de todos os agentes que contribuem para fazer desse ofício de historiador, pesquisador/professor, que dá sentido à essa ciência em comunhão com o nosso público que vai para além dos alunos, visto que agora, mais do que antes, estamos na seara do enfrentamento das narrativas públicas em disputa. 59 Assim, compreendo que caminhamos neste sentido de compreensão que o conhecimento histórico escolar deve ser necessário para as práticas sociais que reforcem o caráter de aprofundamento democrático de nossa sociedade. Que professores e alunos, em busca de sintonia, sem predomínio de hierarquia de saberes, possam construir o ambiente necessário para, dentro da escola e fora dela, desenvolverem a ideia de construção coletiva que transforma o viver para melhor, aproveitando estas últimas décadas de avanço das pautas dos direitos sociais que não foram plenamente concedidas, mas sim frutos de lutas e acordos com o estado brasileiro, como bem destaca Gatti Júnior (2010): Por outro lado, percebe-se uma série de iniciativas concretas do Estado brasileiro redemocratizado em substituir os conteúdos vinculados à educação patriótica pela disseminação de valores de estímulo a convivência social, ao respeito, à tolerância e à liberdade, no intuito da formação de cidadãos que busquem uma sociedade justa e igualitária. (GATTI JÚNIOR, 2010, p. 121). Assim, temos um longo percurso de reflexões acerca dessas questões de como a ciência histórica vem ganhando novas análises de contorno, evidenciando, como podemos perceber, os avanços da maior participação democrática na construção das leis e conteúdos curriculares, tomando, como parte que serão, os sujeitos históricos: alunos e professores, seja no meio escolar institucional ou bebendo das narrativas e usos públicos da História, que farão o movimento acontecer. E a possibilidade de composição do grêmio estudantil, compreendo ser uma experiência possível de forma prática, ter uma atuação coletiva na escola e, por extensão, levando esses saberes por toda vida. Quando penso que as juventudes são partícipes do presente histórico e podem dar cabo em outras etapas da sua vida a uma participação mais efetiva nas decisões coletivas que a sociedade nos remete, penso que o conhecimento histórico escolar, ou fora do seu escopo, na esfera das narrativas públicas, são imprescindíveis para tal postura, ruptura com a inércia e passividade que percebo tomar de conta de grande parte de nosso povo brasileiro. Historicamente fomos sujeitados e excluídos, na maior parte de nossa história, de uma cidadania plena, com mais acesso à educação e direitos, e este cenário nos condicionou, empurrou-nos a uma tímida participação em movimentos sociais mais organizados para o embate político tão necessário da luta de classes. Já ouvi muitas vezes a frase: “quem não faz política, come da política dos outros”. Talvez de autoria popular ou desconhecida, e endosso. Nesse contexto, compreendo como necessário e fundamental o papel da escola e da disciplina de História, para nos dar o embasamento do entendimento de nossa posição no mundo da exclusão, permitindo-nos, assim, ser mais atuante. A formação e a participação em grêmios estudantis ou outros colegiados pode vir a ser uma experiência e uma vivência inicial enquanto 60 frequentadores de espaços de coletividade pública, entendendo a escola como micro laboratório da sociedade. Se assim somos experimentados ao embate, enfrentamento e resistência, teremos mais capacidade de intervenção na sociedade como um todo: na família, na escola, no bairro, na igreja, no mundo do trabalho, no sindicato, na escolha do que se assiste, do que ler, o que se pesquisa nas mídias em geral e o que produzimos ou reproduzimos. Esses novos sujeitos históricos mais engajados dariam respostas mais eficientes no que tange a propor que outro mundo queremos, sem estar à deriva no mar de situações dominantes e impostas, que uma parcela da sociedade nos sugere e muitos não percebem. Muito se tem refletido e aprimorado dentro dos estudos históricos e filosóficosdo processo de ensino aprendizagem. A escola é um espaço institucional dentro do estado brasileiro e, como tal, tem sua elaboração demarcada no texto constitucional e outras leis e documentos que são balizadores do seu modelo de funcionamento. E, assim, os currículos, materializados e postos na lógica do ensino, trazem suas ideologias sobre a sociedade e o percurso do que deve e como ser ensinado. Portanto, inseridos nesses processos, estamos nós, alunos e professores, protagonistas dessas trajetórias, por horas em sintonia ou desconectados com as diversas intencionalidades que porventura queiram nos apresentar. E, desde já, compreendemos que a relação dialógica entre alunos e professores não deve ser impositiva, forçada no conservadorismo e autoritarismo. Aproveito aqui a reflexão de Marilena Chauí (2016), presente no texto “Ideologia e educação”: Há o risco ideológico de diferenciar o aluno (e a classe social) do professor (e da vanguarda) em termos de imaturidade/maturidade, ignorância/saber, alienação/verdade, em suma, diferenciar hierarquizando e fazendo com que um dos pólos seja uma espécie de receptáculo vazio e dócil no qual venha depositar-se um conteúdo exterior trazido pelo outro polo. Com isso, sob o nome de conscientização, reedita-se sob nova roupagem o conservadorismo e o autoritarismo da educação que se pretendia combater. (CHAUÍ, 2016, p. 255). Esta reflexão é muito reveladora e perspicaz, quando no papel de professor nos vemos algumas vezes invariavelmente como os iluminados que levarão a luz aos que, por imprecisa imaturidade, em alguns momentos do nosso exercício do magistério, supomos que não tenham essa luz do saber: nossos alunos. Esse posicionamento é sempre pertinente, pois não é assim que se operará algum princípio de caminhada conjunta entre alunos e professores para a compreensão dos conteúdos históricos escolares como elementos constitutivos para a prática social, por exemplo. Compreendo aqui, através ainda das reflexões de Chauí (2016, p. 257): “O diálogo do aluno é com o pensamento, com a cultura corporificada nas obras e nas práticas sociais e transmitidas pela linguagem e pelos gestos do professor, simples mediador.” 61 O ensino de História não deve ser encarado como uma narrativa dominante do professor em situação de poder e status. Os educandos trazem consigo experiências vividas historicamente que os fazem aprender, refletir e assimilar os conhecimentos históricos cada qual ao seu modo. Assim também é o professor, cada qual constrói a sua narrativa a partir de suas experiências vividas e seu ensino é reflexo disso. O que então vai se acomodar, o que de fato “ensinado” ficará em cada discente? A proposta aqui é compreender que cada qual vai assimilar de forma diferente o dito e, a partir do vivido, construir-se-á o caminho a ser percorrido. Ninguém impõe nada a ninguém, pois cada qual, na sua trajetória, bebe em várias fontes de informação e conhecimento, para assim projetar a sua ação histórica. Sobre isso, Cunha (2016), na introdução do seu texto, traz esta reflexão: Uma das perguntas me marcou, e inspirou profundamente: - Professor, em que medida suas colocações sobre o conhecimento, sua importância para a educação e seus efeitos humanizadores não podem ser entendidas como uma ideologia? Ideologia, lugar-comum, que o senhor colocou como oposta ao conhecimento. Minha resposta: - A questão não está no que eu disse! Que está ancorado no que eu penso, no que eu acredito sobre educação, sobre conhecimento, sobre humanização, sobre ensino. Transformar o que eu disse e o que vocês ouviram, refletiram e discutiram comigo, em ideologia, não depende de mim. Depende e diz respeito a vocês! Isto é, ideologizar é utilizar minhas colocações como definitivas e reproduzi-las como se fossem um lugar-comum, uma doutrina a ser multiplicada sem acrescentar um ponto ou uma vírgula. Sem questionar, sem refletir, sem criticar. - Transformar ou não em ideologia minhas palavras, conceitos e teorias não me diz respeito, diz respeito ao modo como cada um de vocês vai usar o que ouviu, refletiu e concluiu. (...). (CUNHA, 2016, p. 117). A historiografia e sua produção passaram nas últimas décadas por uma espécie de amadurecimento trazido por novas abordagens no trato do conhecimento histórico, que nos permitiram assimilar que o conhecimento histórico escolar ganhou novos contornos. As reflexões de novos estudos nos apontam que não há, sem questionamento, aquele que ensina e aquele que aprende. As experiências vividas por professores e alunos no seu contexto histórico e trajetórias de vida nos trazem a necessidade de uma nova compreensão de que, para qualquer caminhada conjunta na perspectiva de uma prática social que transforme a realidade, é preciso levar em conta a valorização de todos os sujeitos envolvidos no processo ensino-aprendizagem. Sobre isso, Silva (2019) assim se pronuncia: Essa forma mais abrangente de compreender o percurso formador da história ancora- se, sobretudo, nos sentidos que ela adquiriu nos últimos anos por meio da expansão do leque de temas abordados pela historiografia, na educação e pela forte influência midiática, dando nova configuração à cultura histórica e à cultura escolar.” (SILVA, 2019, p. 53). 62 Assim, reside em nós uma ousadia de fazer um exercício de imaginação e busca prática, em que o conhecimento histórico escolar supere totalmente aquela ideia ultrapassada de memorização e compreensão cronológica dos fatos. A História, como ciência bem estudada, trabalhada e compreendida, tem a pretensão e a possibilidade muito mais alvissareira de reforçar a cidadania e a democracia em que ela resida, de provocar o desejo insurgente de liberdade e busca da justiça e igualdade, onde ela não encontre guarida. Daí, temos pela frente grandes desafios pedagógicos na sala de aula e para além dela, afinal a construção do que podemos chamar consciência histórica tem seu nascedouro nas elaborações de pesquisa e ensino replicados a todos nós que mergulhamos nesse campo do conhecimento. Passando pelas universidades, mesas redondas, conferências, simpósios, essas novas abordagens e perspectivas apresentadas a nós, que nos intitulamos historiadores, chegará até um conjunto de pessoas que podemos chamar de estudantes, alunos ou público, não porque damos espetáculos, mas porque, no mínimo, com os nossos saberes vivenciados, vamos partir para o diálogo com aqueles que, dentro ou fora da escola, pretendem reconhecer na história não apenas a possibilidade de fazer uma melhor leitura do mundo, mas de como, estando nele, compreender o quanto é possível inferir, propor, aceitar ou resistir ao que se vive. É essa consciência histórica tão almejada que queremos para um maior número de pessoas, quando dizemos ou ouvimos em meio ao senso comum: “as coisas são assim porque falta aos outros a consciência histórica”. Esse discurso é bem recorrente quando afirmamos mesmo que falta aos outros, porque na nossa cabeça, nós possuímos essa consciência pelo privilégio de ter estudado e nos formado historiadores. Compreendam minha sutil ironia nesse trecho, pois os estudos mais atuais apresentam a consciência histórica como algo possível a todos e todas. Conforme atesta Martins (2019), Consciência histórica é a expressão utilizada contemporaneamente para designar a consciência que todo agente racional humano adquire e constrói, ao refletir sobre sua vida concreta e sobre sua posição no processo temporal da existência. Ela inclui dois elementos constitutivos: o da identidade pessoal e o da compreensão do conjunto social a que pertence, situados no tempo. (MARTINS, 2019, p.55). Assim, compreendo ser possível a todos e todas essa busca autorreflexiva de consciência histórica, baseando-me nesse relato. E a escola, assim como os variados meios de apreensão do conhecimentohistórico e exercício do viver, é um espaço de aprendizagem. No que concerne à elaboração, à constituição e à execução de nossas leis e diretrizes da educação no Brasil, fico muito à vontade neste trabalho para levantar a discussão e a problemática da formação e atuação de grêmios estudantis e outros colegiados nas escolas públicas da educação básica. Nossa legislação, seja via Constituição Federal ou via Lei de 63 Diretrizes e Bases da Educação e Diretrizes Curriculares Nacionais, dá amparo e suporte para estimular a prática do protagonismo juvenil nas escolas e para além delas no nosso tecido social. Compreendendo que todo movimento é político e movido por forças que impulsionam e retraem. Nesse sentido, Freitas (2016) observa acerca das possibilidades da Constituição Brasileira e leis complementares na montagem de currículos e programas: É um documento fruto de debates e negociações. Não poderia mesmo estar isento de contradições e equívocos. Além disso, como Carta Maior, o documento não poderia definir cada vocábulo indicador de valor. Esse trabalho coube, em teoria, à legislação complementar. No caso da matéria constitucional “educação”, a complementaridade configura-se na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Na LDB a referência explícita aos valores está na definição dos conteúdos curriculares da educação básica. (FREITAS, 2016, p. 113). Complementando e não esgotando essa análise mais dirigida da nossa legislação educacional brasileira, especificamente das nossas Diretrizes Curriculares Nacionais na forma de documento escrito balizador, no qual encontro respaldo e conforto de afirmar que a composição de grêmios estudantis e outros colegiados em nossas escolas da educação básica casam com a ideia de uma educação histórica que se propõe para além da mera apreensão e aprendizagem de conteúdos históricos definidos nos currículos até então historicamente trabalhados e estudados. A ciência histórica no campo das humanidades traz perspectivas de transformação e ação na realidade vivida. Nossos professores e alunos são, atualmente, muito mais provocados por uma produção, pesquisa e observação do mundo que nos cerca na perspectiva de perceber que podem fazer intervenções reais e práticas. Nas Diretrizes Curriculares Nacionais, consta que A escola, face às exigências da Educação Básica, precisa ser reinventada: priorizar processos capazes de gerar sujeitos inventivos, participativos, cooperativos, preparados para diversificadas inserções sociais, políticas, culturais, laborais e, ao mesmo tempo, capazes de intervir e problematizar as formas de produção e de vida. A escola tem, diante de si, o desafio de sua própria recriação, pois tudo que a ela se refere constitui-se como invenção: os rituais escolares são invenções de um determinado contexto sociocultural em movimento. (BRASIL, 2013, p.16). É nessa escola dinâmica, viva, que desafia seus sujeitos, que eu acredito. As condições estão em processo de construção e sabemos que, para que ela se materialize e tenha esse caráter transformador e pulsante, ela precisa superar obstáculos inerentes da própria natureza política dos contrários. São projetos de disputas que sempre se revelam. Pelo menos na escola em que atuo vamos iniciar em 2022 o uso da nova Base Nacional Curricular Comum (BNCC), com novos materiais didáticos que bem provável nos trarão novas práticas de ensino. É um terreno ainda a ser mais explorado e refletido. Só um pouco mais de tempo nos dirá se tal proposto será bem ou mal avaliada. Reitero, assim, que é no coletivo de formulação e ação que poderemos 64 experimentar essa escola que mobiliza seus agentes a visualizar uma sociedade mais justa e fraterna. 2.3 Reflexões sobre as entrevistas/formulários dos alunos no contexto das ocupações de 2016 Uma parte muito preciosa deste trabalho de mestrado profissional em História segue e traz mais luz ao debate e reflexão, com essas oito significativas entrevistas via formulário que recebi como retorno de ex-alunos da minha escola Luiza Távora Promorar e de outras duas, como o Constança Távora e o Walter de Sá Cavalcante, escola ocupada que proporcionou tal vivência e experiência a estes meninos e meninas, os quais estiveram à frente na condução desse evento tão singular na história local de nossa cidade e Estado, que foram as ocupações de suas ou outras dezenas de escolas estaduais. As ocupações, que compreenderam a tomada e a apropriação do prédio escolar como algo para além de suas simples e singulares presenças físicas ali, representaram esse empoderamento exercido por estes sujeitos históricos jovens, com uma carga de simbolismo e representatividade de que as lutas sociais e coletivas valem muito a pena. É preciso ganhar as mentes e os corações de outros sujeitos, para a conquista de mais direitos sociais que, se não reivindicados, limitam-se a servirem minimamente aos que mais precisam do espaço escolar e serviço público, neste caso, as condições e os recursos que as escolas precisam para contribuir na transformação das vidas desses jovens estudantes. Já relatei aqui, em outro momento da escrita deste trabalho, as pautas de reivindicações que faziam os estudantes, mas vou relembrá-las: melhorias estruturais nos prédios escolares, mais equipamentos e espaços de aprendizagem como os laboratórios de informática, ciências, redação e matemática, que nem todas as escolas possuem, mais qualidade na merenda e refeição escolar (específico para as escolas de tempo integral e profissional que fornecem almoço), manutenção de projetos pedagógicos garantidos via manutenção de carga horária de professores lotados nestes projetos (Professor Coordenador de Área- PCA e Professor Diretor de Turma - PDT), que acabariam em virtude de uma portaria estadual que os extinguia. Enfim, num contexto de greve de professores, os estudantes levantaram suas pautas e, em apoio aos docentes, criaram o seu próprio movimento de reivindicação, bastante legítimo, diga-se de passagem. Procurarei seguir aqui dialogando e refletindo com os meus leitores e leitoras acerca das circunstâncias que se inscreveram para que tais ocupações ocorressem. Considerando o 65 local de moradia dos estudantes aqui entrevistados, percebe-se facilmente dentro da geografia da cidade de Fortaleza que os estudantes participantes estavam e ainda estão habitando no entorno de suas escolas. O que para mim configura que essa proximidade tem uma forte relação de pertencimento a este local simbólico que é a escola. Mesmo o movimento de ocupação não tendo mobilizado com presença frequente mais da metade dos alunos em sua totalidade de matriculados, víamos nas redes sociais manifestações de apoio, assim como posteriormente, devido à extensão dos dias, desgaste e cansaço, algumas críticas que se faziam ao movimento ocupante das escolas. Feitas as perguntas iniciais de identificação e localização dos estudantes ocupantes desta pesquisa, indagamos se os participantes tinham alguma ligação, vivência com grupos diversos, partidos políticos ou coletivos de luta. O que podemos avaliar, com base nas respostas à pergunta de número quatro (assim se confira os formulários que estão disponíveis), é que a grande maioria dos entrevistados não tinham ligação com grupos ou partidos, menos a aluna Marcela Conceição Ferreira Roseno, que era integrante do grêmio estudantil da escola Walter de Sá Cavalcante. No meu entendimento, como um professor que na ocasião estava como diretor escolar, nessa caminhada de educação pública, tenho percebido que alguns contatos iniciais dos alunos se dão ou ocorrem sutilmente por meio de pautas identitárias de lutas LGBTs, questões raciais que se inserem por movimentos musicais ou experiências de sofrimento de violência, pautas feministas e, como disse anteriormente, é bem comum, uma parte considerável dos estudantesparticiparem de movimentos religiosos em igrejas que eles frequentam. Nas escolas que tive oportunidade de lecionar e conhecer, é muito distante essa ligação dos adolescentes de uma faixa etária entre 14 e 17 anos de iniciarem uma experiência política mais frequente como um coletivo organizado ou partido político. Talvez, essas organizações não consigam ser orgânicas e presentes ao ponto de estarem dentro dos bairros e próximos das escolas para convocarem ou atraírem alunos tão jovens aos seus movimentos. Isso posto, posso dizer com um pouco de propriedade que por estar por perto na ocasião dando apoio aos estudantes que ocupavam as escolas junto a outros professores, que nem mesmo a maioria dos docentes são militantes frequentes e orgânicos. Ao afirmar isto, as críticas de ocasião que levantavam suspeitas de que os estudantes seriam marionetes manipulados nas mãos de experientes militantes sociais, a meu ver, caem por terra e representavam mera retórica conservadora de quem se incomodava com o movimento. Em suma, os estudantes mais assíduos das ocupações aprenderam por conta de suas próprias experiências o fazer político daquele momento. Contudo, o apoio moral e a 66 presença de retaguarda de alguns militantes sociais, de todas as cidades onde elas ocorreram, mobilizando experiências, arrecadações, notas de apoio, oficinas, aulões preparatórios para o Enem e outras atividades, deram sua cota de contribuição. Na pergunta seguinte, a de número cinco, pudemos perceber a afirmação bem unânime da importância da participação da juventude nos processos políticos, desde a resposta lacônica do aluno da escola Luiza Távora Promorar, Cicero Keven Carneiro dos Santos, que simplesmente responde SIM, e a comparação que se pode fazer entre respostas mais bem elaboradas e complexas como da aluna Rayane da Silva Vital, da escola Walter de Sá Cavalcante que responde, “a política é uma das categorias fundantes desse sistema capitalista patriarcal, então, na atual situação da sociedade, não há mais perspectiva de futuro dentro da política, nem pra jovem e pra ninguém. A saída é a suplantação de uma nova sociedade emancipada”. Até onde conheço, essa elaboração de pensamento se aproxima muito do grupo Crítica Radical4, muito orgânico aqui em Fortaleza. Pelo contexto da resposta da referida aluna, percebo um alinhamento bem aproximado dessa corrente, mas não posso afirmar categoricamente se hoje ela milita por esta tese. Portanto, no geral, os estudantes afirmaram como algo valoroso e fundamental a participação da juventude nos movimentos políticos da sociedade em geral e sobretudo na escola. O curioso seria saber dos que não se aproximaram das ocupações naquele instante se também compartilham dessa importância e por quais motivos não estiveram mais próximos, mais orgânicos do movimento na ocasião. No quesito participação em grêmio estudantil, da própria escola ou outro órgão colegiado, o grupo de alunos está bem dividido. Três alunas estiveram mais organicamente participando desses espaços. Como citei em determinado momento deste trabalho, o envolvimento dos estudantes em espaços de deliberação precisa ser estimulado e ampliado. A cultura de uma maior participação exige ambiente democrático nas escolas por meio das gestões ou provocadas por alunos e professores que mais se incomodam com uma certa lógica da exclusão. No meu entendimento, trago uma insistência positiva para a ativação do colegiado grêmio estudantil na escola Luiza Távora, pois já temos um certo período de inexistência desse instrumento tão educativo politicamente ao conjunto dos estudantes. Para tal, apresento as últimas atas da gestão eleita em nossa escola, no ano de 2015. É bem expressivo destacar a organização do processo eleitoral, que teve a ajuda de um bolsista do projeto Mais Educação, o Joel Domingos, como presidente da Comissão Eleitoral e a minha assinatura como diretor escolar (ANEXO F). Na segunda ata (ANEXO G), a da primeira 4 Perfil no Facebook: https://www.facebook.com/criticaradical/ 67 reunião do colegiado eleito, eles reivindicam bolas diversas para a prática de esportes, além da definição e organização do espaço da quadra. Na sequência, levantam uma problemática que os incomodavam, ‘sobre “o representante Joel Domingos” que estava exercendo funções não cabíveis a ele...’. Depois, definem a direção e outras funções dos gremistas e anunciam a organização de uma futura assembleia geral. Na terceira e última ata registrada (ANEXO H), os gremistas elencam várias ações tais como: organização de festa junina, do desfile de Sete de Setembro, muito tradicional no calendário escolar, aulões preparatórios para o Enem, avaliação do desempenho dos professores, feira cultural, gincana solidária, comemoração de final de ano e até mapeamento de sala. Enfim, como podemos perceber, muitas ideias e ações que desejaram tocar e assim, assumiam esse protagonismo de forma concreta. Na pergunta de número sete, que indaga se os estudantes tiveram experiências formais ou informais dentro e fora da escola em coletivos diversos, incluindo até movimentos religiosos com características de militância, é bem diverso o conjunto das respostas e, diria, até animador, apesar de três estudantes responderam não ter participado. Conseguimos captar o envolvimento da maioria como uma primeira experiência de luta, tendo a ocupação como referência. Além disso, uma das meninas, a Marcela Roseno, com uma participação no coletivo RUA5. A aluna Karyla Passos traz uma resposta muito bem articulada e que, de uma forma muito sincera, sinto uma alegria por tê-la conhecido, assim como a todos e todas a quem enviei o formulário, tendo sido ou não alunos lá do Luiza Távora, tivemos algum contato no período das ocupações, no qual pude ministrar aula preparatória para o Enem, participar de cine-debate ou assembleias. Eis o que Karyla nos traz: Na época da escola, não participei de nenhum movimento, devido ao pouco acesso a esses espaços quase inexistente no bairro onde eu moro. Porém, após ingressar na universidade pública no curso de História, tive mais contato com grupos como o grupo afrocentrado Formação, Centro acadêmico, setorial de mulheres e setorial de LGBTQIA+, e depois em uma coletiva de mulheres no meu bairro e numa biblioteca comunitária também localizada no meu bairro. (ENTREVISTA 3). Assim, a oitava pergunta, indaga os motivos pelos quais os alunos da escola Luiza Távora não ocuparam sua própria escola e, confesso, fiquei muito curioso com as respostas, sobretudo dos que foram nossos alunos. Lembro bem que a aluna Maria Eliziária Girão da Silva foi uma grande liderança no contexto de nossa escola. Sempre participativa reivindicando quadra para o futebol de salão feminino, fez parte do Conselho Escolar como aluna e teve sua mãe como membro do segmento dos pais. Avaliando as circunstâncias de difícil mobilização 5 Perfil Instagram: https://www.instagram.com/rua_juventudeanticapitalista/?hl=pt-br 68 dos estudantes de sua própria escola, cravou tal resposta: “porque não tínhamos pessoas responsáveis, com garras para querer lutar pelos nossos direitos, pouquíssimas pessoas queriam mas não era o suficiente, o despreparo foi um grande fato. Pois sem interesse foi complicado”. Assim sendo, Eliziaria se fez muito presente na ocupação da escola Walter de Sá, o que acaba cruzando essa afirmativa com a resposta da aluna Rayane da Silva Vital, que alega e reforça que, no entendimento deles, uma maioria dos estudantes estavam à parte, desinteressados, mas os poucos que estiveram presentes faziam a diferença. Segue resposta. Infelizmente não tenho lembrança do motivo. Mas, acredito que tenha sido por falta de pessoas. Infelizmente muitos alunos não deram importância para a situação e nem mesmo tiveram interesse em participar do movimento. Foram poucos os alunos do Luizatavora que participaram das manifestações e atos que fazíamos no WSC. Mas os poucos que participaram, se disponibilizaram e estavam presentes pra ajudar em tudo que fosse preciso. (ENTREVISTA 4). No embalo de não ter a própria escola ocupada e ter que migrar para fazer ocupação e luta em outro território, é bem revelador a coragem de quem se dispôs a sair de certa zona de conforto e não ficar em casa como uma ampla maioria dos estudantes ficavam. Eliziaria, Elayne, Evilázio e Cícero foram os quatro alunos possíveis de localizar que foram ao Walter de Sá para conhecer e participar mais de perto mesmo do movimento. A aluna Janaína seria a quinta aluna da nossa escola, mas o seu questionário deixa bem nítido que seu enlace com o movimento se deu por notícias. Ela não esteve lá presente. Das respostas colhidas, tocou-me muito o senso de solidariedade da aluna Rayane Vital sobre receber colegas de outras escolas estaduais. “Lá no WSC (Walter de Sá Cavalcante), acolhemos todos os outros alunos de outras escolas dos bairros aos redores que estavam dispostos a participarem do movimento”. Enquanto a resposta do aluno Cícero Keven traz um misto de decepção dele e curiosidade minha com sua resposta, que ele não justifica e nem aprofunda do que ele viu, viveu e não gostou. “Esperança mais acabei vendo a miséria do movimento”. 69 Analisando as respostas dos alunos da escola Luiza Távora Promorar, a memória de uma maioria tende a avaliar que tínhamos em 2016 um grêmio constituído, mas pouco ativo e participativo para realizar ou mesmo participar de uma ocupação em outra escola. No Constança Távora, não havia grêmio e no Walter de Sá percebe-se um conflito da existência ou inexistência desse colegiado, segundo as diferentes respostas de Marcela Roseno, “foi interessante, pude ver na época quem realmente estava no Grêmio e que estava engajado nos projetos da escola”, enquanto Rayane Vital escreve “na minha escola não tinha grêmio''. Na sequência do formulário, perguntamos sobre as pautas das ocupações estudantis no seu contexto geral e aqui já trouxemos as principais. Percebi que, com evidência, algumas escolas tinham reivindicações específicas. No caso da escola Walter de Sá, a aluna Marcela Roseno levanta uma queixa muito incisiva, que é a reforma da quadra poliesportiva de sua escola e o possível mau uso do dinheiro público: “Falta de grana para os professores, diretores e secretários desviando dinheiros, quadras poliesportivas acabadas e muitas delas caindo os tetos, falta de empatia com professores e até mesmo alunos”. Sobre a memória do movimento, uma maioria dos entrevistados afirmaram ter recordações e/ou fontes históricas, em fotos sobretudo arquivadas nas redes sociais, na ocasião sendo o Facebook a mais usual. De fato, o movimento das ocupações fez um bom uso das redes sociais para efeitos de aprendizado com outras experiências, divulgação e mobilização do movimento. Os movimentos estudantis que aconteceram no Brasil, entre 2015 e 2016, tanto no Ceará quanto em São Paulo e no restante do país, foram denominados de Primavera Secundarista e tiveram como referência os movimentos estudantis no Chile - Revolta dos Pinguins, em 2006 e 2011. A partir das experiências de ocupação e uso das redes sociais, os estudantes brasileiros, traduziram o manual elaborado pelos estudantes do Chile que construía um passo a passo de como ocupar sua escola. O manual explicava o plano de ação e dividia as ocupações por comissões (segurança, comida, imprensa, informação, limpeza e relações externas). O documento sugeria que os estudantes fizessem assembleias periódicas, coordenadas em todas as cidades para serem realizadas manifestações simultâneas. Eles criaram uma autogestão e foi com toda essa troca de experiência que os estudantes ocuparam as escolas públicas, iniciando em São Paulo e se espalhando por todo o Brasil, conectando-se através da internet principalmente pelas páginas no facebook criada por cada escola, constituindo uma grande rede de escolas. (RÊDES, 2018, p. 187). Quanto ao desfecho das ocupações e lições para a vida de cada um, temos respostas variadas. Dois alunos do Luiza Távora, Cícero Kevin e Evilázio Mesquita, colocam críticas às posturas ocorridas mais ao final das ocupações. Evilázio elabora tal resposta: “minha atuação foi bem pouco no meio, e me desliguei totalmente quando começou a virar bagunça dentro das escolas. Infelizmente o movimento começou a ser deixado de lado e as escolas começaram a se tornar apenas um espaço para muitos dos jovens fazerem uso de entorpecentes”. 70 O aluno Cícero tece uma crítica mais direcionada à ideia de que o movimento de jovens da ocupação tinha o viés de esquerda e tal, e por isso não vingaria, segundo sua análise: “que movimento de jovem de esquerda não funciona por muito tempo”. Por outro lado, temos uma análise, diria mais positiva, por parte das meninas entrevistadas, que relataram que a união de pessoas jovens em busca de melhorias em comum é e foi necessária e importante para as conquistas de suas lutas estudantis e outras possíveis. Nessa linha, gostaria de destacar a resposta da aluna Karyla Passos: Acredito que foi positivo, apesar das dificuldades encontradas devido ao prolongamento da greve e a pouca articulação estudantil em Fortaleza. Acho que a maior lição foi entender o sentido de uma luta coletiva e como juntos somos mais fortes e podemos mudar a realidade a nossa volta de alguma forma, ainda que pequena. (ENTREVISTA 3) Ao serem indagados sobre a ideia de terem feito História ao participar desse movimento, somente uma negativa surge, através do aluno Evilázio Mesquita, pois se considera ter ido a reboque de amigos, por influência. No mais, as meninas, de forma geral, possuem a compreensão de que foram momentos históricos que marcaram a trajetória de vida de muitas delas, sobretudo reforçando a categoria ser jovem e estudante. Na continuidade, agora se detendo sobre a importância do ensino escolar de História para os jovens e os pontos positivos dos conteúdos trabalhados, percebo nas respostas a essência desse ensino, no sentido de assegurá-los uma gama de conhecimentos capazes de os fazerem entender melhor o presente que vivem ao saberem das circunstâncias do passado. A citação dos assuntos estudados mais propriamente não lhes vem de imediato, mas sem dúvidas reconhecem o bom propósito da disciplina escolar e surgem os elogios aos bons professores que passaram na vida escolar deles e delas. Curioso que a aluna Rayane Vital, como ocupante aguerrida que fora, cita a luta do povo de Canudos, sendo a única a fazer menção a um conteúdo especificamente trabalhado. “Atualmente não tenho muita lembrança do que vi na escola kkkkk. Mais os fatos históricos de guerras (tipo guerra de canudos), é incrível. Acho de extrema importância essas abordagens”. O destoante no comparativo com as demais respostas aqui nestas entrevistas tem sido por muitas vezes as colocações do aluno Cícero Keven, que destaca como importante o estudo da disciplina de História, mas que não sejam mentiras, e aponta o uso de muita manipulação, como algo positivo e, ao mesmo tempo, negativo. Os possíveis pontos elencados como negativos sobre a disciplina de História nas entrevistas trazem, mais uma vez, a ideia de manipulação ou doutrinação por parte de professores. Sem dúvidas, nestes últimos anos, esse debate público do Escola sem Partido foi 71 apropriado por muitos e, eventualmente, essa questão permeou o imaginário e trouxe conflitos em muitas escolas com situações delicadas entre professores, alunos, pais e gestão, chegando até aos parlamentos, pautarem projetos de lei neste sentido. Não afirmo que seja algo que tomou conta geral e infernizou o trabalho de uma grande maioria, trazendo-nos descredibilidade, mas que trouxe tormenta para muitos de nós, inegavelmente,isso trouxe. Um incômodo, por vezes transformado em perseguição e reflexão enquanto professores de História, do campo das humanas ou demais disciplinas, que podem ser alvo de ataques por gerarem um saber crítico-reflexivo e atuante. Vejamos, pois, a resposta do aluno Evilázio Mesquita, que parece ter absorvido essa narrativa da negação do nosso posicionamento e da busca de tal neutralidade: “A disciplina tem que ser imparcial, ela apenas tem que mostrar o ocorrido se possível mostrar os dois lados da moeda. O profissional que irá transmitir a informação tem que ser o mais neutro possível para não influenciar a decisão dos jovens no futuro.” (ENTREVISTA 7). No entanto, nas demais respostas, percebo a crítica como ponto negativo, uma carga horária reduzida, como frisa Karyla Passos: “acho que a quantidade de aulas disponíveis nas escola para a disciplina”. E, no mais, uma determinada cobrança aos professores que não conseguem dinamizar e tornar a aula envolvente. Em vias de conclusão acerca das respostas dos formulários, que não foram muitos, mas se revelaram muito significativos, concluímos perguntando se os conteúdos da disciplina de História guardam mais relações que possam ser ditas acerca dos movimentos de ocupações das escolas estaduais do Ceará em 2016. Na minha percepção, as respostas dadas foram bem assertivas no tocante a se revelarem em palavras que aqueles momentos vividos por cada um possuem sua singularidade, mas que, para quem deu aquela mergulhada no movimento e hoje olha com uma certa distância, pode-se perceber que valeu muito a pena. Uma das garotas, Karyla Passos, simplesmente se tornou estudante acadêmica de História, isto dito no transcorrer da entrevista, e os demais, mesmo não sabendo ou sendo revelado o que fazem hoje de suas vidas, passaram-se a sensação de que, de alguma forma, esse evento das ocupações foi bem marcante na vida deles e delas. A marca da necessidade de fazer política está clara nas respostas de quem positivamente avaliou a sua própria participação. Destaco aqui a resposta de Elayne Lima, por entender que ela tenha dado conta das possíveis e inúmeras dimensões de sermos sujeitos históricos e realizadores dela a todo instante. 72 As ocupações foram cruciais naquele momento para a melhoria e foi o mais correto a se fazer no momento, não é atoa que teve conquistas. E a disciplina de história é apaixonante pois temos como aprender tudo sobre antigamente e até mesmo na atualidade, pois sempre está atualizando e nós mesmo fazemos história, então no futuro nossas vidas ou momentos que estão acontecendo hoje em dia virará assunto no futuro para muitos. (ENTREVISTA 1). Assim, reitero, parafraseando o grande compositor e cantor Gonzaguinha, que eu “acredito é na rapaziada”. Acredito que os nossos saberes históricos mobilizados podem fazer muita diferença para a ação-reflexão de todos nós no caminhar de nossas vidas. A experiência de fazer movimento dos estudantes nas ocupações, que não tenha sido a única e última experiência. Pelo que sabemos do Brasil, nosso contexto e realidade, não dá para se entregar sem luta. 73 CAPÍTULO 3 - O DESENVOLVIMENTO DO PRODUTO A construção de um chamado produto, com vistas a apresentar um caminho estratégico para a formação de estudantes mais críticos, cidadãos e afeitos a intervenções no nosso tecido social com objetivos de alcance de uma sociedade mais justa neste horizonte democrático, é um sonho que necessita de muito apoio, sentimentos emanados a partir da compreensão de que nada será fácil. Primeiro, porque esse percurso de formação requer de nós, professores, uma formação profissional cada vez mais engajada e consolidada numa base científica bem peculiar da nossa História, como disciplina do campo das Ciências Humanas, que também flerta e dialoga com outras áreas do conhecimento que compõem os currículos inscritos oficialmente e os ocultos, derivados de outros tantos saberes que são construídos na formação e vida de cada um e cada uma de nós. Segundo, forças reais se contrapõem e tentam impedir que estes avanços e interferências realmente ocorram na sociedade, pois manter jovens e pessoas em geral marginalizadas e alienadas é um outro projeto de sociedade daqueles que não se comovem com a miséria, a injustiça e a exclusão. Portanto, há muito a ser feito. Acredito que como professor com vinte e poucos anos de magistério, tenho ainda muito a aprender, a amadurecer e sigo nessa busca. Contudo, essa jornada me habilita e me qualifica ainda mais a continuar exercendo essa forma de intervenção social através do meu trabalho. A formação acadêmica de graduação, já tão distante, deu-me a base e a inspiração necessária para iniciar esse ofício de professor de História, que muito lecionou e leciona, num ativismo de trabalho docente que ganhava um ritmo de produção em larga escala, correndo de escola em escola, com turmas e aulas nem sempre da disciplina formada, confessando a necessidade capital de ter mais aulas e mais recursos financeiros, acabamos por entrar na seara alheia e assim acontecia. Esse relato me vem, pois, nessa correria que nos consome os anos, muitas vezes nos foge a necessidade de novamente sentar e dialogar em bancos acadêmicos com os nossos pares e/ou outros formadores. E essa parada estratégica para cursar uma pós-graduação em História, sobretudo profissional, é de uma experiência sem igual, claro, sem desmerecer as pós-graduações de outra natureza. Assim, ao ingressar nesse curso, confesso como foi importante olhar e refletir sobre minha prática de ensino e as perspectivas que temos e que nos cerca. 74 Ao me submeter ao certame do ProfHistória e olhar para aquela prova, facilmente percebi que novas abordagens vindouras estavam em cena: lugares de fala, narrativas e usos públicos da História, novas tecnologias integradas ao ensino, eram assuntos que pouco ou não recordo se tratei nas minhas formações iniciais pelos idos anos 90 e início dos anos 2000. Enfim, tem sido uma boa novidade esse aprendizado de novos saberes em História em conjunto com uma geração de professores de idades e experiências variadas, tanto os colegas de turma como os professores do mestrado. Ao falar de formação profissional, quero prestar um reconhecimento à produção dos livros didáticos nos anos que seguiram a minha graduação. Distante do convívio acadêmico em formações pontuais, foram os manuais do professor e o próprio livro didático com seus textos, gravuras e atividades de exercícios de rotina e de pesquisa que puseram a me atualizar um pouco mais sobre as mudanças e novos ventos que sopravam das academias e o mercado editorial absorvia e nos apresentava. História temática, do cotidiano, integrada, crítica, enfim, novos saberes que íamos experimentando junto aos nossos alunos, pois, para mim, somente a observância de alguns anos letivos me fazem compreender e assimilar se determinado material didático é condizente para aquele meu público específico, seja de escola particular ou pública. Falo dessa experiência e ressalto a importância de nós podermos ter o contato com esses materiais didáticos de forma muito livre. Nesse tempo, nunca fui assediado por editoras e divulgadores para influenciar na escolha do nosso valoroso material de trabalho. Preciso destacar que as interferências que recordo sobre a escolha de material didático vinha, algumas vezes, de pequenas escolas particulares de bairro, que fechavam acordos comerciais com os divulgadores das editoras, por conta de vantagens econômicas para a escola e os pais na condição de clientes e possibilidades de parcelamentos do material didático dos filhos. No entanto, destaco o predomínio de nossa liberdade de escolha. E assim, credibilizo os livros didáticos, não apenas o de História, como primordiais, por serem provavelmente os únicos livros que entram sobretudo nas casasdas famílias menos aquinhoadas de nosso tão desigual país, distante de ser uma nação de ávidos leitores. Sobre a produção e difusão do livro didático no Brasil, me reporto a Munakata (2012): A circulação, em se tratando de livro didático no Brasil, é uma operação complexa, exatamente pela materialidade desse objeto: imagine-se, por exemplo, a logística envolvida para que os 160 milhões de exemplares, adquiridos pelo Programa Nacional de Livro Didático (PNLD), cheguem simultaneamente no início do ano letivo em todos os recantos do território brasileiro. (pág.184). 75 Assim, notadamente, tendo a reconhecer essa política pública do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) como uma vitória, um acerto dentro do processo educacional recente no Brasil, pois garantiu aos professores, e sobretudo aos estudantes, um apoio material substantivo de qualidade, pois passa pelo crivo dos especialistas que os fazem e dos profissionais que o avaliam, até chegar ao grande público a que se destina. Outro debate que ainda fazemos entre nossos pares, professores, é que não há livro ruim. Pode ser que tenhamos uns mais atrativos, ilustrados, inteligíveis, ao gosto e avaliação dentro da subjetividade de cada um de nós, mas no dia a dia do batente, nossa relação dialógica com o livro e a turma se fazem passíveis de contornos pedagógicos. Assim, julgo ser melhor termos esses materiais didáticos ao nosso alcance do que ter a penúria e ausência desse recurso, que não tínhamos em outros tempos de forma tão mais pontual, eficiente e democrática. De posse da minha formação continuada, meu lugar no mundo, carregado de saberes que venho construindo ao longo de minha vida, eis-me em sala de aula, com os materiais didáticos bem diversos já experimentados com meus alunos. Esse sentimento de "propriedade'' ao chamar “meus alunos” é uma retórica que merece explicação. Ao sermos contratados por uma escola privada, por meio de seleção, indicação ou entrevista, somos referendados por termos uma formação que precisamos comprovar que somos profissionais. Quando estamos na escola pública, por meio de contrato temporário ou concurso público, sempre atestamos que somos aptos para ocupar estes espaços que são as salas de aula. E, ainda assim, o convívio com nossos alunos, com nossos pares, gestores ou empregadores, coloca-nos em constante observação sobre o nosso trabalho, seja uma espécie de patrulha ou relação de confiança, reforço, que os alunos, a quem possa considerá-los imaturos, são os que mais e melhor nos conhecem pela intensidade e quantidade de horas-aula relacionadas. O sentimento, então, de ter e viver esse espaço privilegiado que é a sala de aula não pode e nem deve ser alvo de uma mordaça covarde que deseja intimidar a nenhum de nós. Nossas leis são muito claras neste sentido, como bem posso me remeter ao artigo 206 da nossa Constituição Federal, que anuncia: “o ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: II- liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber”. Assim, ainda em meio a esse debate tão atual e necessário que visa construir esse ambiente de liberdade e confiança em nosso trabalho de relação pedagógica segura e honesta com nossos alunos, temos o complemento do mesmo artigo, que nos assegura que o ensino será ministrado ainda, com base no “pluralismo de ideias e concepções pedagógicas”. 76 No histórico do ensino de História em território nacional, nossos pares passaram por inúmeras experiências e formatos de enquadramento e intenções do Estado brasileiro de dirigir o que se ensina e o que se aprende. No entanto, como o ensino-aprendizagem é uma relação extremamente dialógica, que carrega em nós todos e todas as nossas experiências vividas e apreendidas, nenhuma intencionalidade, por mais caprichada e bem elaborada que seja, foi ou será capaz de atrair como um imã, que puxa, atrai e se encaixa na totalidade do público para o que se deseja. Destaco aqui um trecho do trabalho de Fonseca (1995): Assim a desqualificação dos professores, sobretudo de História, no bojo do processo de reformas, era estratégica para o poder político autoritário. É evidente que as outras medidas também eram importantes politicamente, mas formar um professor de acordo com as concepções do regime significava conseguir hegemonia e legitimidade a médio e longo prazo, no espaço educacional voltado para as massas. Desqualificar o professor de História, ou qualificá-lo e prepará-lo para uma escola que impunha tarefas e necessidades de submissão à maioria da sociedade brasileira, significava, sem dúvida, fortalecer e legitimar um modelo antidemocrático e concentrador de riquezas, além de limitar ainda mais as possibilidades de debates mais profundos (na área) no interior das nossas escolas de lº e 2º graus. (p.29). Mas, felizmente e a custo de muitas lutas dos professores nessa história do ensino de História, temos que reconhecer que os embates travados até aqui por nossos pares têm valido a pena. Seja no interior das escolas, nas ruas, universidades ou parlamentos, a articulação política deu a tônica de movimento vivo e pulsante, mesmo em anos de regime de exceção, pois condições ideais e harmônicas de ensino e aprendizagem nunca existiram. Sempre tivemos campos de batalha nesse processo político de formação dos professores, na questão do material didático e em outros campos. Ainda usando o texto de Fonseca (1995, p. 33), é importante destacar que As resistências e as lutas dos trabalhadores/professores ganham uma dimensão classista: surgem novos sindicatos, as greves e reivindicações salariais passam a fazer parte do calendário escolar e a escola passa a ser encarada como um espaço de luta de classes. Entretanto, a organização e a mobilização dão-se não apenas em função da revalorização profissional, mas questionam fundo a política educacional, a função social da escola, dos currículos e o processo educativo como um todo. Desta feita, garanto sem medo de errar que sou filho dessa escola de formação de lutas aqui citadas pelos idos anos 80 e 90. Lembro demais dos perfis aguerridos e destemidos de professores que eu tive. Como aluno, já relatei que estudei no modelo de séries iniciais que se chamavam Estudos Sociais, conheci os materiais didáticos de Educação Moral e Cívica (EMC) e Organização Social e Política do Brasil (OSPB) e nem assim minha formação geral e visão de mundo me fez ter empatia pelo militarismo. 77 Estudar História, como aluno, sempre me fascinou, principalmente quando tive a dimensão de sermos sujeitos históricos que podemos lutar, resistir, reformar ou revolucionar. Como professor, carrego a mesma dimensão da atitude de, junto aos meus alunos, estudarmos esse conhecimento escolar com vistas a fazer uso dele para sairmos de qualquer inércia que nos anula e torna a nossa vida ainda mais difícil. Por isso, a escolha de relatar as experiências das ocupações de escolas públicas no Ceará em 2016 e como a formação e existência de um colegiado como o grêmio estudantil pode ser importante para os estudantes de uma maneira geral se organizarem coletivamente e exercer essa cidadania e protagonismo inicialmente na escola e para além dela. A História do tempo presente é assunto que traz a nós, historiadores, novas perspectivas e uma boa dose de questionamentos. Devemos estar mais distanciados do objeto de pesquisa por quanto tempo ou aproximado do mesmo? Confesso que também na minha formação de graduação vi pouco sobre esse debate, mas trago aqui a contribuição de Delgado e Ferreira (2013, p.21): Antes de tudo, é preciso lembrar que apesar das inovações teóricas e metodológicas que têm caracterizado o campo da produção historiográfica, a história do tempo presente nem sempre tem sido bem assimilada por parte da comunidade de historiadores, pois ainda é sólida a concepçãode que o estudo da história deve distanciar-se do tempo do acontecido. No meu caso específico, como gestor escolar em 2016, sempre professor e um militante social, estive por perto no processo de ocupação das escolas estaduais como um parceiro presente junto aos estudantes, ministrando aulas preparatórias para o Enem, participando de Cine Debate e angariando arrecadação para alimentação dos ocupantes, contudo, obviamente, todo o protagonismo foi deles e delas. Inclusive, concomitantemente, tínhamos nossa greve dos professores e as nossas demandas tocadas. Então, estar presente nesta quadra histórica citada e pesquisada foi inevitável para mim. Mas, voltando ao debate historiográfico da História do tempo presente, mais um trecho da leitura de Delgado e Ferreira (2013, p.22) me ajuda a compreender e me tranquilizar, de não haver problemas nessa questão, quando afirma que “Mas a despeito das resistências, que não são poucas, a escolha do tempo presente como campo de estudo e pesquisa de historiadores vem ganhando legitimidade crescente e sugere reflexões epistemológicas e metodológicas urgentes.” 78 Assim, me vejo mais à vontade para contar essa História, explanando um pouco sobre as características gerais do movimento de ocupação das escolas estaduais em 2016. A partir das entrevistas via formulários, percebendo o quanto estes estudantes, uns mais e outros menos, inseridos no processo de luta, perceberam e viveram aquele momento tão significativo para a maioria dos entrevistados, que no caso desta pesquisa, descreve a realidade de três escolas diferentes: a escola Walter de Sá Cavalcante, a escola ocupada, que acolheu alunos de outras duas, o Constança Távora e a escola que eu trabalho, Luiza Távora Promorar. 3.1 Enfim, o produto O produto deste mestrado profissional em História seguramente tem objetivos claros de garantir aos estudantes que estão ao meu alcance mais qualidade conceitual e mais conteúdo, tanto de História quanto de outras ciências auxiliares, que possam chegar até nós de uma forma cada vez mais qualificada e que nos impulsionam a entender que mundo é esse que vivemos, em meio a tantos desafios e injustiças que devem nos incomodar, pois, em História, nada pode ser naturalizado, mas se faz necessário a justa compreensão do que seja o socialmente construído. As escolas estaduais aqui no Ceará, como já citei anteriormente, estão dispostas ao seu público em três formatos: escolas regulares, escolas profissionalizantes e escolas em tempo integral. A última citada, chamada Escola de Ensino Médio em Tempo Integral (EEMTI), tem por base a lei estadual 16.287/2017, que institui a política de ensino médio em tempo integral no âmbito da rede estadual de ensino do Ceará. A referida lei deixa nítido em seu corpo textual, entre suas finalidades, a de “cumprir as metas dos planos Nacional e Estadual de Educação relacionados ao Ensino Médio” e acrescento, com ênfase e destaque, outra finalidade que é a de “garantir o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico”. Assim, cabe destacar que esse trabalho organizativo da rede de ensino estadual do Ceará vem se afirmando e buscando dar condições de amparo aos estudantes, como se apresenta na página institucional da Seduc/Ceará: O Governo do Ceará, por meio da Secretaria da Educação (Seduc), iniciou, em 2016, a implantação do Ensino Médio em tempo integral nas escolas estaduais. Atualmente, a rede pública conta com 155 Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral (EEMTIs) distribuídas em 71 municípios cearenses. Cada escola de tempo integral oferta uma jornada de nove horas, garantindo três refeições diárias. O currículo é composto por 30 horas semanais de disciplinas da base comum a todos estudantes e 15 horas na parte flexível, sendo que 10 são escolhidas pelos alunos. Este modelo de ensino 79 aumenta o tempo escolar e amplia as oportunidades de aprendizagem que favorecem o desenvolvimento de competências cognitivas e socioemocionais, além do protagonismo estudantil por meio de escolhas de componentes curriculares eletivos. (SEDUC, 2021). É válido ressaltar ainda que este percurso de aumento de oferta de escolas em tempo integral segue crescente e fundamentado por um Projeto Político Pedagógico do Ensino Médio em Tempo Integral na rede estadual de ensino do Ceará que pode ser conferido na mesma página institucional da secretaria, feito na última citação. Sobre alguns dados dessa rede, segue mais informações deste projeto político pedagógico: A rede estadual do Ceará possui 645 escolas com oferta de ensino médio regular ou integrado à educação profissional, em funcionamento no ano de 2016, com matrícula de 334.128 alunos, de acordo com o Sistema Integrado de Gestão Escolar (Sige). Do total de matrícula do ensino médio, 51.574 estão em turmas de tempo integral, perfazendo 15,4%. No Ensino Médio em Tempo Integral, o Ceará oferta duas possibilidades formativas: o integrado à educação profissional e o regular[...]. (CEARÁ, 2020, p. 4). Portanto, a Escola de Ensino Fundamental e Médio Luiza Távora Promorar, na qual estou lotado, ainda é uma escola regular. Nossa rede vem iniciando os trabalhos numa perspectiva do Novo Ensino Médio de forma paulatina. Até a conclusão do ano letivo de 2021, temos trabalhado ainda com o material didático do Programa Nacional do Livro Didático no formato seriado, com livros de disciplinas específicas para cada série do Ensino Médio. No entanto, para o ano de 2022, já escolhemos o novo material didático e este vem todo na nova roupagem do Novo Ensino Médio. No entanto, a título de conhecimento, as escolas de Ensino Médio em Tempo Integral, por terem tido uma expansão da carga horária desde sua implementação, passaram a ter ao seu dispor um catálogo de componentes eletivos para escolha dos professores e o público ao qual se destina, os estudantes, que passam a ter os chamados itinerários formativos como uma novidade do Novo Ensino Médio. Vejamos um trecho da apresentação deste catálogo, à disposição para a rede estadual de ensino do Ceará. O Catálogo de Componentes Eletivos das Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral (EEMTI) da rede estadual do Ceará propõe-se a ser um condutor para as escolhas dos itinerários formativos dos estudantes, no que diz respeito à parte flexível do currículo desenvolvido nessas escolas. O objetivo maior desse instrumento é ofertar, às escolas e aos estudantes, componentes que contribuam para consolidar a formação integral dos nossos jovens e o desenvolvimento de competências e habilidades, vinculadas também à parte diversificada do currículo, a saber: Núcleo de Trabalho, Pesquisa e Práticas Sociais (NTPPS) e Projeto Professor Diretor de Turma (PPDT). Para o ano letivo de 2021, o Catálogo traz uma nova formatação, com foco nas áreas de conhecimento e nos eixos estruturantes da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), pois os itinerários formativos do Ensino Médio, que se organizam a partir dos eixos: Investigação Científica; Processos Criativos; Mediação e 80 Intervenção Sociocultural e Empreendedorismo, conectam experiências educativas com a realidade contemporânea, promovendo aprendizagens sintonizadas com os componentes eletivos e as áreas de conhecimento. (CEARÁ, 2021, p.5). Como minha escola ainda passará por estas mudanças de acréscimo de novos componentes curriculares, com vistas a ofertar disciplinas eletivas para atender o aumento progressivo de carga horária previsto no Novo Ensino Médio ainda em 2022, compreendi que este catálogo contempla, mas não esgota, minha perspectiva de trabalhar junto aos meus alunos e alunas uma abordagem da disciplina de História que reforce cada vez mais a busca da efetivação de uma cidadania que seja capaz de fazê-los perceber que asmudanças que almejamos a favor de uma maioria social precisam de todos os conhecimentos organizados e a serviço dessa transformação. E a História, como disciplina escolar, traz para todos nós, seja nos bancos escolares ou no seu uso público, muitas possibilidades de adquirirmos uma visão, uma concepção de mundo que descortine o nosso olhar para não entender o que nos rodeia, no seu aspecto político, econômico, social e cultural como algo natural e imutável, mas socialmente construído e passível de transformação. Passeando pelo catálogo de componentes eletivos do ano de 2021 na área de Ciências Humanas, o seu texto de apresentação casa bem com o que pretendemos no alcance dessa área de ensino. CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS APLICADAS (CHS) Estão correlacionados os componentes eletivos com foco na área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas onde se define aprendizagens centradas na análise, comparação, interpretação e amplia essa base conceitual, mantendo referência às principais categorias da área; concentra-se na análise e na avaliação das relações sociais, dos modelos econômicos, dos processos políticos e das diversas culturas. (BNCC, 2017). Ao todo, na área de Ciências Humanas, olhando mais detidamente com conhecimentos mais aproximados da disciplina de História, fiz a seleção de cinco disciplinas eletivas que gostaria de sugerir e experimentar trabalhar junto aos estudantes da minha escola, em sintonia com os propósitos já mencionados neste trabalho de conclusão de curso. Permita-me apresentar essas disciplinas eletivas e suas ementas já construídas por muitas mãos e saberes dos professores de nossa própria rede de ensino cearense. 81 Figura 5 – Disciplina Eletiva Atualidades para o Enem Fonte: Seduc, 2020. 82 Figura 6 – Disciplina Eletiva Cultura Política Fonte: Seduc, 2020. 83 Figura 7 – Disciplina Eletiva Direitos Humanos e Cidadania Fonte: Seduc, 2020. 84 Figura 8 – Disciplina Eletiva Educação para a Cidadania na Escola Fonte: Seduc, 2020. 85 Figura 9 – Disciplina Eletiva História do Tempo Presente Fonte: Seduc, 2020. 86 Apresentadas as ementas das eletivas, podemos perceber o quanto os conteúdos propostos apresentam uma proposta transdisciplinar na área de Ciências Humanas, através da qual um professor de História pode, com habilidade e constante capacitação/formação, desenvolver junto aos alunos a construção do conhecimento por meio das pesquisas com as mais variadas fontes, destacando que, como nunca dantes, tivemos tantas possibilidades de conexão e uso da internet, por meio de celulares, tablets e até laboratórios de informática montados nas escolas, mesmo que, em muitos casos, precários e desassistidos de manutenção. Precisando do cuidado com a credibilidade das fontes históricas, destaco também o bom acervo das bibliotecas das escolas estaduais do Ceará, chamadas de sala de multimeios, onde podemos encontrar apoio pedagógico constante para trabalhos de pesquisa. As chamadas disciplinas eletivas possuem uma nota técnica que orienta e adverte para sua organização e oferta. Pude identificar como a flexibilização curricular pode oferecer aos estudantes possibilidades de ampliar conhecimentos que julguem mais relevantes no decorrer do seu Ensino Médio. Os Componentes Curriculares Eletivos são ofertados pela escola, no tempo reservado na Matriz Curricular para o desenvolvimento da Parte Flexível do Currículo. Tratam- se de 10 (dez) horas/aula semanais, que devem ser divididas em 5 (cinco) tempos eletivos de 2h/a geminadas. Em cada tempo eletivo, a escola deve apresentar aos estudantes um conjunto de ofertas relacionadas aos eixos temáticos, com duração semestral de 40h/a, em que os alunos optam por cursar os componentes do seu interesse ou necessidade, propostos no seu projeto de vida, que é desenvolvido nas atividades do Núcleo de Trabalho, Pesquisa e Práticas Sociais (NTPPS) e acompanhado pelo Professor Diretor de Turma (PDT). (CEARÁ, 2017, p.1). Recordo bem que, em algumas situações, como aluno, sempre questionávamos os motivos de estudarmos tais conteúdos de tantas disciplinas e se estes teriam utilidade para nossa vida na prática. Como professor, é comum ouvir o desejo de construir o nosso próprio material didático e propor algo diferente dos manuais que escolhemos das editoras junto a autores e autoras considerados/as consagrados/as. O formato do Novo Ensino Médio nos desafia. São muitas incertezas diante deste novo modelo. Estou muito curioso para conhecer na prática como será. Sempre considerei só conhecer melhor e mais profundamente um material didático novo, uma nova função na educação, como coordenador ou diretor, se vivermos o cotidiano dessas novidades. Assim me porto ao Novo Ensino Médio. Só terei melhores condições de avaliá-lo quando, pelo menos em um ou dois anos letivos, tiver experimentado essa experiência junto aos meus alunos e comunidade escolar. 87 CONSIDERAÇÕES FINAIS Este trabalho, que por hora apresento, não se trata de algo finalizado, mas a afirmação da continuidade de um trabalho pedagógico e fundamentado no saber histórico com a partilha e a complementação de outros saberes, junto com tudo que já pude aprender por leituras, vivências, filmes, músicas, peças de teatro e outras fontes de saber. Se eu busco constante formação, tenho o poder de contribuir na formação de outras pessoas. E esse é o grande propósito. A sala de aula e a sua magia não me saem da cabeça. Fico imaginando como construir juntos os saberes nestas proposições contidas neste trabalho. Uma hora, logo mais, esse produto se materializará e ganhará consistência. Como sabemos, na educação, o planejado, o previsto, pode nem ocorrer como desejamos. As expectativas de aplicar de um modo diferente o conhecimento histórico me desafiam. Na educação básica, especialmente no meu ambiente do ensino médio, com todas essas mudanças que já chegaram ou se aproximam, muito frisson e especulação de como vai ser, o que vai dar certo e errado, já toma conta de nossas conversas e preocupações. E são pertinentes. A disciplina de História vai ter carga horária reduzida? Vamos brigar entre nós pela predileção dos alunos e alunas para cursarem nossas eletivas e itinerários formativos? Quem quer estudar Humanas e buscar essa formação superior? Quem valoriza a História e afins? São muitas perguntas e dúvidas difíceis de ter respostas prontas. Repito, só o tempo e a experiência de trabalhar nesse Novo Ensino Médio nos dirá algo mais concreto. Espero que meus alunos possam ter comigo a experiência da melhor forma de compreender os processos históricos na nossa relação dialógica e horizontal. Hoje, ainda mais do que ontem, a educação pede a construção de autonomia, liberdade, capacidade de ouvir e liderar. É um processo contínuo de aprendizado que todos nós passamos e estamos vivendo. Acredito que, com sabedoria e sensibilidade, posso contribuir ao propósito de termos cidadãos mais críticos, participativos e decididos a não se calar diante das injustiças que todos os dias presenciamos em cada cantinho, seja na nossa aldeia minúscula ou nesse mundão. Se o caminho se apresentar tortuoso e pedregoso, vamos reiniciar, aproveitando o que foi bom e descartando o que não foi louvável. Se nosso horizonte foi sempre lutar pela educação, por ela vamos honrar a memória de tantos que doaram seus corpos, suas vidas, por essa causa tão nobre. E no setor público, sobretudo, quando temos a dimensão de que o nosso povo é o que mais precisa de uma educação de qualidade, jamais poderemos esmorecer e se entregar. Levo comigo a tranquilidade que nem todos entenderão ou farão uso do que foi 88 pensado, mas sei que a História é um relógio que não tem descanso e nem parada, portanto,a busca pelo saber histórico que há anos venho buscando e aprimorando há de encontrar ressonância em muitas mentes e corações, que deverão estar dispostos a construir e defender um conhecimento que liberta, transforma e faz justiça. Os encontros em sala de aula, os saberes adquiridos ao longo da vida, os debates e reflexões em torno do conhecimento histórico devem se materializar em ações de um projeto coletivo de sociedade, que amenize, supere ou derrote as mazelas sociais que bem conhecemos que existem em nosso meio e nos incomodam. Que não haja acomodação ou conformismo numa retórica de naturalizar o que sabemos que é socialmente construído. 89 REFERÊNCIAS ALMEIDA, Djair Lázaro de. Educação moral e cívica na ditadura militar: um estudo de manuais didáticos/ Djair Lázaro de Almeida- São Carlos: UFSCar, 2009. P.1. BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB. 9394/1996. BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica. Brasília: MEC, SEB, DICEI, 2013. BRASIL. Plano Nacional de Educação. Disponível em: <http://pne.mec.gov.br/18-planos- subnacionais-de-educacao/543-plano-nacional-de-educacao-lei-n-13-005-2014> Acesso em 14.dez.2020. BRASIL. 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Na ocasião, quero me reportar as ocupações das escolas estaduais no ano de 2016 aqui no Estado do Ceará, quando ao mesmo tempo ocorria uma greve de professores e um movimento significativo da luta estudantil que foram as ocupações. Sou aluno do mestrado profissional em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte e professor da rede estadual de ensino no Ceará. Minha pesquisa busca compreender entre tantas situações, como o ensino de História se fez importante para que cada um e cada uma se sentisse a vontade de participar desse movimento que entrou para a história com grande singularidade. Suas respostas serão de grande importância para o desenvolvimento deste trabalho acadêmico de pesquisa que busca trazer contribuições sociais para o encontro de uma sociedade mais justa. Conto com a sua colaboração e caso precise, podemos lhes acrescentar nomes fictícios caso não desejem a identificação pessoal. Muito obrigado. 1) Nome completo e data de nascimento – idade. 2) Bairro de Fortaleza onde você morava em 2016 e mora hoje. 3) Nome da escola onde você estudava no ano de 2016. 4) Nessa época da ocupação (2016), você participava de alguma entidade, grupo, partido político ou qualquer outro coletivo de jovens? Por quê? 5) O que você pensa sobre a participação de jovens em ações políticas e quais os espaços que você imagina que seria importante os jovens atuarem? 6) Quando você era aluno da educação básica (ensino fundamental ou Médio) você fez parte de grêmios estudantis e de algum outro órgão (conselho escolar, por exemplo) ligado às escolas onde você estudou? Por quê? 7) Nesse período de vida estudantil, você participou de outros coletivos de jovens (grupos com objetivos políticos, identitários- de mulheres, de negros, de LGBTQI, religioso, etc...), sejam eles formais ou informais e que estiveram situados dentro ou fora das escolas? Se possível, identifique e justifique a sua participação ou o seu distanciamento desses grupos. 8) Com relação às ocupações que ocorreram em dezenas de escolas estaduais cearenses no ano de 2016, porque os alunos da escola Luiza Távora Promorar não ocuparam a própria escola onde estudavam? 9) Diante das circunstâncias de não ter a própria escola em que estudava ocupada, o que levou você a participar de atividades de ocupação em outra escola estadual? 10) Como você analisa a participação do grêmio estudantil nessas ocupações? (no caso da existência do Grêmio na sua escola na época). 11) Quais são as recordações das pautas que os estudantes defendiam naquele momento das ocupações das escolas estaduais no ano de 2106? 103 12) Você tem algum material, fonte histórica guardado que represente aquele momento vivido das ocupações de 2016? Quais seriam essas fontes históricas? 13) Como você analisa o desfecho das ocupações das escolas estaduais no ano de 2016? O que você tirou de lição pra sua vida? 14) No seu entendimento, você entende ter feito história ao participar desse movimento de ocupação das escolas? Justifique sua resposta. 15) Na sua opinião, a disciplina escolar de História é importante para a formação de um jovem? Por quê? 16) O que você mais destacaria como ponto positivo com relação aos conteúdos trabalhados na disciplina de História e com relação à forma de ensino dessa disciplina? 17) O que você mais destacaria como ponto negativo com relação aos conteúdos trabalhados na disciplina de História e com relação à forma de ensino dessa disciplina? 18) Analisando os conteúdos da disciplina de História, você considera que eles foramúteis para a sua atuação nesse movimento de ocupação das escolas? Por quê? 19) Nesse último item, você pode escrever mais alguma coisa que você considerar importante com relação às ocupações das escolas e com relação à disciplina de História.