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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE TECNOLOGIA DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA QUÍMICA TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO PRODUÇÃO DE CERVEJA WEISS ARTESANAL: PROCESSAMENTO, PARÂMETROS FÍSICO-QUÍMICOS E AVALIAÇÃO SENSORIAL André Jales Henriques da Costa NATAL/RN 2018 ANDRÉ JALES HENRIQUES DA COSTA PRODUÇÃO DE CERVEJA WEISS ARTESANAL: PROCESSAMENTO, PARÂMETROS FÍSICO-QUÍMICOS E AVALIAÇÃO SENSORIAL Trabalho de conclusão de curso apresentado à Universidade do Rio Grande do Norte, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Engenheiro Químico. Orientadora: Prof. Dra. Magna Angélica dos Santos Bezerra Sousa NATAL/RN DEDICATÓRIA Dedico esse trabalho ao meu pai, minha madrasta Paola que sempre foi uma mãe para mim e meus amigos verdadeiros que sempre me incentivaram a nunca desistir e ajudaram de todas as formas possíveis a seguir correndo atrás do meu sonho. AGRADECIMENTOS A minha família por toda base que me foi dada, pelo suporte, incentivo e apoio em todas as minhas decisões e escolhas. A minha orientadora, Prof. Dra. Magna Angélica dos Santos Bezerra Sousa por me acolher de braços abertos e nunca ter recusado me orientar nos momentos finais da graduação, estando sempre prontidão para tirar dúvidas e esclarecimentos. Ao meu amigo Carlos Magno por ter ajudado e ensinado bastante a parte teórica e prática da produção artesanal de cerveja. A cerveja produzida nesse trabalho provavelmente não seria a mesma sem sua ajuda. A meu amigo de graduação Fábio Macedo pela ajuda que me foi concedida dentro do laboratório e tirando dúvidas sobre o desenvolvimento do trabalho. Aos meus amigos mais próximos que conheci durante a graduação em engenharia química, na UFRN e na The University of Alabama. Vocês foram essenciais para que eu não desistisse nos momentos mais difíceis. E por fim, a Deus, por minha vida, família e amigos. “As dificuldades que você encontra se resolverão conforme você avança. Prossiga, e a luz aparecerá, e brilhará com clareza crescente em seu caminho.” Jean le Rond D’Alembert LISTA DE FIGURAS Figura 1 - saccharomyces cerevisiae .............................................................. 18 Figura 2 - saccharomyces uvarum .................................................................. 18 Figura 3 - Fluxograma do processo de produção da cerveja ........................... 23 Figura 4 - Dinâmica de movimentação do whirlpooling ................................... 26 Figura 5 - Intenção de compra da cerveja ....................................................... 44 Figura 6 - Cerveja artesanal de trigo ............................................................... 45 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Características convencionais de uma Weissbier........................... 22 Tabela 2 - Temperatura de fermentação e volume de CO2 dissolvido ............. 29 Tabela 3 - Volume de CO2 desejado de acordo com o estilo de cerveja. ........ 29 Tabela 4 - Ficha utilizada para avaliação sensorial ......................................... 39 Tabela 5 - Resultado das análises físico-químicas .......................................... 40 Tabela 6 - Resultado do teste de aceitação por escala hedônica .................... 42 RESUMO A cerveja é uma bebida alcoólica obtida pela fermentação alcoólica do mosto cervejeiro originado da mistura entre o malte de cevada e água potável, por ação de leveduras e adição de lúpulo. O consumo de cervejas artesanais vem seguindo uma tendência de crescimento nos últimos anos e, com isso, surge a oportunidade de novas microcervejarias se estabeleceram no mercado. O presente trabalho teve como objetivo analisar sensorialmente uma cerveja de trigo de produção artesanal e avaliar parâmetros físico-químicos de acordo com o padrão de identidade, qualidade e legislação vigente. Dois testes sensoriais afetivos foram utilizados: teste de aceitação por escala hedônica de 7 pontos e teste de escala de atitude ou de intenção com 5 pontos. As análises-físico químicas realizadas foram: densidade relativa, pH, acidez total, teor alcoólico, grau Brix, cor e extrato seco total. As análises sensoriais resultaram em uma ótima aceitação do produto e sua a intenção de compra foi satisfatória. Os resultados obtidos com as análises físico-químicas demonstraram que a cerveja produzida está em conformidade com a legislação vigente e dentro do padrão de identidade e qualidade de uma típica cerveja de trigo. Palavras chave: Cerveja de trigo; Cerveja artesanal; Análises físico-químicas; Avaliação sensorial ABSTRACT Beer is an alcoholic beverage obtained from alcoholic fermentation of the brewer's wort which originates from the mixture between barley malt and drinking water by the action of yeasts and by addition of hops. The consumption of craft beers has been following a growing trend in recent years showing an opportunity for new microbreweries to establish themselves. The present work aimed to sensory evaluate a handcrafted wheat beer and to evaluate physical-chemical parameters according to the standard of identity, quality and current legislation. Two evaluation methods were used: acceptance test by a hedonic scale of 7 points and attitude or intention scale test with 5 points. The physical-chemical analyzes were: relative density, pH, total acidity, alcohol content, Brix concentration, color and total dry extract. The sensory analysis resulted in a good product acceptance and its intention of purchase was satisfactory. The results obtained with the physical-chemical analyzes showed that the beer follows the current legislation and fits the identity and quality standards of a typical wheat beer. Keywords: Weiss bier; Craft beer; Physical-chemical analyzes; Sensory evaluation SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ......................................................................................... 12 2. OBJETIVOS ............................................................................................. 13 2.1. Objetivos geral ................................................................................... 13 2.2. Objetivos específicos ......................................................................... 13 3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ................................................................ 13 3.1. História da cerveja ............................................................................. 13 3.2. Mercado nacional de cerveja artesanal .............................................. 15 3.3. Matéria Prima ..................................................................................... 15 3.3.1. Água ............................................................................................ 15 3.3.2. Malte ........................................................................................... 16 3.3.3. Lúpulo.......................................................................................... 17 3.3.4. Fermento biológico (leveduras) ................................................... 17 3.3.5. Adjuntos cervejeiros .................................................................... 19 3.4. Classificação das Cervejas ................................................................ 19 3.4.1. Quanto ao extrato primitivo.......................................................... 20 3.4.2. Quanto à cor ................................................................................ 20 3.4.3. Quanto ao teor alcoólico .............................................................. 21 3.4.4. Quanto à proporção de malte de cevada ..................................... 21 3.4.5. Quanto à fermentação ................................................................. 21 3.5. Weiss Bier .......................................................................................... 22 3.6. Processo de produção da cerveja ...................................................... 23 3.6.1. Moagem ...................................................................................... 24 3.6.2. Mosturação .................................................................................. 24 3.6.3. Filtração do Mosto ....................................................................... 24 3.6.4. Fervura do Mosto ........................................................................ 25 3.6.5. Resfriamento do Mosto ................................................................ 26 3.6.6. Fermentação ............................................................................... 27 3.6.7. Maturação ................................................................................... 28 3.6.8. Carbonatação .............................................................................. 28 3.6.9. Envase ........................................................................................ 30 4. MATERIAIS E MÉTODOS ....................................................................... 30 4.1. Produção da Cerveja ......................................................................... 30 4.2. Análises Físico-Químicas ................................................................... 32 4.2.1. Densidade relativa ....................................................................... 32 4.2.2. Determinação do pH .................................................................... 33 4.2.3. Acidez total titulável ..................................................................... 34 4.2.4. Teor alcoólico por ebuliometria .................................................... 35 4.2.5. Teor de sólidos solúveis .............................................................. 36 4.2.6. Determinação da Cor (EBC) ........................................................ 36 4.2.7. Determinação do extrato seco total ............................................. 37 4.3. Análise Sensorial ............................................................................... 38 4.3.1. Índice de aceitabilidade ............................................................... 40 5. RESULTADOS E DISCUSSÕES ............................................................. 40 5.1. Análises Físico-Químicas ................................................................... 40 5.2. Análise Sensorial ............................................................................... 42 6. CONCLUSÃO .......................................................................................... 44 7. REFERÊNCIAS ....................................................................................... 46 12 1. INTRODUÇÃO A indústria brasileira de bebidas é um expressivo setor da economia nacional, sendo muito importante para o país devido a uma série de atividades realizadas dentro de uma cadeia produtiva, que começa na importação ou na colheita de insumos provindos da agricultura, passa pelo processamento das matérias-primas e termina na distribuição do produto para os consumidores finais. Em um contexto global, a cerveja pode ser considerada a bebida alcoólica mais consumida devido a seus números expressivos. Deliberalli (2015), cita que em 2014 a estimativa global de produção foi de 196,02 bilhões de litros de acordo com o relatório anual divulgado pela empresa alemã Barth-Haas Group (maior fornecedora de lúpulo do mundo). Dados obtidos pela Associação Brasileira de Bebidas (Abrabe), demonstram que a bebida geralmente é consumida por homens na faixa etária entre 18 a 65 anos e mulheres de 30 a 65, sendo os homens a parte majoritária dos consumidores. A média de litros de cerveja consumidos por habitante aumenta anualmente. Bressiani (2017), relata que o consumo médio nacional é de mais de 68 litros anuais por habitante. Porém, quando comparado à República Tcheca, com 143 litros anuais por habitante ou Alemanha com 106 litros anuais por habitante, demonstra-se um possível espaço para crescimento do consumo nos próximos anos. O setor cervejeiro nacional e mundial continua expandindo, gerando mais oportunidades e permitindo o surgimento de novos empreendedores. O aparecimento de novas microcervejarias é o exemplo que traduz essa expansão do setor, aumentando a competitividade devido a uma maior oferta de cervejas diferenciadas. Nesse quesito, a produção de cervejas especiais bem aceitas sensorialmente e que se encaixem dentro dos padrões de identidade e qualidade pode contribuir para o desenvolvimento desse mercado. Portanto, o seguinte trabalho propõe a fabricação de uma cerveja artesanal Weiss que atenda os parâmetros físico-químicos contidos na legislação vigente e seja bem aceita pelo público consumidor. 13 2. OBJETIVOS 2.1. Objetivos geral Avaliar propriedades físico-químicas e sensoriais de uma cerveja de trigo de produção artesanal, fabricada em Natal no Rio Grande do Norte de acordo com o padrão de identidade, qualidade e legislação vigente. 2.2. Objetivos específicos • Obter artesanalmente uma cerveja de trigo; • Coletar amostras da cerveja de trigo de formulação caseira; • Avaliar sensorialmente a cerveja de acordo com testes de aceitação e de intenção de compra; • Analisar a cerveja artesanal de acordo com alguns parâmetros físico- químicos; • Comparar os resultados das análises com a legislação vigente. 3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA De acordo com a Lei Federal n° 8.918/94 regulamentada pelo Decreto n° 6.871/09, Artigo 36, denomina-se como cerveja a bebida obtida pela fermentação alcoólica do mosto cervejeiro proveniente da junção do malte de cevada e água potável, por atividade de levedura, com adição de lúpulo. (BRASIL, 2009) 3.1. História da cerveja Não se sabe precisamente a data do surgimento da cerveja, porém estudos indicam que a produção da cerveja começou aproximadamente no ano de 8000 a.C. sendo desenvolvida paralelamente aos processos de fermentação de cereais (MEGA; NEVES; ANDRADE, 2011). Alguns autores acreditam que a cerveja possa ter sido uma das primeiras bebidas alcoólicas produzida pelos 14 seres humanos, podendo ser considerada uma das mais antigas. Venturini Filho (2010) cita que a arte da fabricação da cerveja provavelmente surgiu na Mesopotâmia, localizada atualmente no território do Iraque, onde a cevada cresce em estado selvagem. Há registros de que a cerveja foi trazida pela família real portuguesa que estava de mudança para o Brasil Colônia, em 1808. A cachaça era a bebida mais consumida popularmente até o final da década de 1830, além de outras bebidas importadas mais nobres como licores e vinhos. Nessa época, a produção de cerveja já existia, porém em pequena escala e de forma caseira produzida por famílias de imigrantes europeus (COUTINHO; QUINTELLA; PANZANI, 2018). Entre 1870 e 1880, em Porto Alegre, surgiu a primeira produção cervejeira na escala industrial. Com o passar do tempo foi possível um maior controle no processo de fermentação, mais especificamente da temperatura, proporcionado pelo surgimento das primeiras máquinas compressoras frigoríficas, localizadas nos grandes centros urbanos. Com isso, foi observado uma migração de fábricas para o Rio de Janeiro eSão Paulo. A Companhia Cervejaria Brahma e a Antarctica Paulista surgiram nessa época, e mais tarde vieram a se fundir e dominar uma grande parcela o mercado cervejeiro brasileiro. (SANTOS, 2004) Segundo dados do Anuário de 2016 da CervBrasil, o setor cervejeiro nacional representa 1,6% do PIB, com a produção de 14 bilhões de litros de cerveja, totalizando um faturamento de R$ 77 bilhões e arrecadando R$ 23 bilhões de impostos ao ano. O setor também é responsável por distribuir R$ 27 bilhões em salários através de 2,2 milhões de empregos. Paralelamente as empresas, os cervejeiros artesanais criaram a ACervA Brasil - Associação dos Cervejeiros Caseiros Artesanais do Brasil – com objetivo de troca de experiências e conhecimentos, disseminar a cultura cervejeira e promover eventos ligados à bebida. A grande diferença entre a cerveja artesanal e a cerveja industrializada, além do volume produzido, é uma melhor qualidade dos insumos envolvidos no processo produtivo, como também a adição de produtos regionais, gerando assim sabores mais marcantes e inusitados. 15 3.2. Mercado nacional de cerveja artesanal Seguindo a contramão da recessão econômica, foi possível notar um aquecimento do mercado cervejeiro com o surgimento de várias microcervejarias pelo Brasil. O mercado de cervejas especiais vem chamando cada vez mais a atenção de novos empreendedores e consumidores no país. Dados oficiais do MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) mostram que houve no Brasil um crescimento de 91% no número de cervejarias registradas nos últimos 3 anos, saindo de 356 estabelecimentos em 2014 para 679 em 2017. Apenas em 2017, o país teve um ganho de 186 novas fábricas (ALVARENGA, 2018). Segundo o SEBRAE (2017) tem-se observado ultimamente uma tendência de crescimento da produção de cerveja artesanais em todo o país. Essa tendência é evidenciada pelo fato de que os consumidores estão optando por produtos diferenciados, as chamadas “cervejas premium” ou “cervejas especiais” que estão ganhando cada vez mais espaço no mercado. As cervejas fabricadas em microcervejarias se diferenciam por serem mais encorpadas devido a sua concentração mais acentuada de malte por hectolitro, de aroma e sabor mais pronunciados devido ao uso de lúpulos especiais, e são a preferência dos consumidores mais exigentes. 3.3. Matéria Prima 3.3.1. Água A cerveja possui em sua composição aproximadamente 90% de água e a qualidade dessa água tem relação direta no produto final, já que variações em sua composição alteram o paladar da bebida (ACERVA PAULISTA, 2009) São várias as formas de obtenção da água com a finalidade de uso na produção cervejeira, tais como: captação municipal, fontes comerciais de água mineral ou poços artesanais. Qualquer forma de obtenção de água pode ser aplicada, desde que essa água obtida esteja dentro dos padrões estabelecidos pela Anvisa para consumo humano. 16 Alguns parâmetros devem ser respeitados, pois podem gerar consequências diversas, diminuindo assim a qualidade final da bebida. Entre os parâmetros, podemos citar o pH, turbidez, concentração de zinco, ferro, cálcio, magnésio, nitrato, nitrito, sílica e matéria orgânica (JORGE, 2004). Um dos fatores importantes é o pH da água que será utilizada na fabricação de cerveja. Deve-se optar, assim, por uma água com pH mais ácido pois a acidez irá contribuir na etapa de mosturação para uma melhor ação enzimática e evitará formação de taninos durante a lavagem do bagaço na etapa de filtração (SILVA, 2017). Outro parâmetro crucial é a dureza da água. O cálcio ajuda na redução do pH, na clarificação da cerveja pela precipitação das proteínas na etapa de fervura, na fermentação e estabilidade da cerveja. Da mesma maneira que o cálcio, o magnésio serve de micronutriente para as leveduras no processo de fermentação, embora seja obtido majoritariamente dos cereais maltados e não da água. Níveis entre 10 – 30 ppm contribuem como nutrientes para a levedura. Acima de 30 ppm, pode resultar numa adstringência ou amargor na cerveja (SILVA, 2017). Segundo Botelho (2009), a água precisa ser potável, incolor, inodora e insípida. 3.3.2. Malte Por definição, malte é a matéria prima provinda da germinação controlada de qualquer cereal (cevada, arroz, milho, trigo, aveia, etc.) (VENTURINI FILHO, 2010). O malte é obtido através do processo de malteação de cereais e é dividido em três etapas: maceração, germinação e secagem (EVANGELISTA, 2012). A principal função do malte é fornecer açúcares e nutrientes que posteriormente servirão de alimento às leveduras, na fermentação, produzindo álcool, gás carbônico e alguns outros subprodutos da fermentação. A escolha dos cereais maltados utilizados na preparação da cerveja irá proporcionar aromas e sabores característicos, influenciando também na cor da bebida (PASSARELLI, 2009). 17 3.3.3. Lúpulo O lúpulo é uma planta trepadeira da espécie Humulus lupulus, da família Cannabaceae e, embora pertença à mesma família da Cannabis, não apresenta substâncias alucinógenas em sua composição. É uma planta diótica, o que significa dizer que possuem flores masculinas ou femininas (AQUARONE, 2005). Embora existam dois tipos de flores, somente as flores femininas são empregadas na produção de cerveja, por serem as únicas que contém a lupulina, uma substância de alto interesse cervejeiro, pois conferem amargor e aromas característicos da cerveja (ALMEIDA E SILVA, 2005). Os óleos essenciais e as resinas são as frações presentes na lupulina que influenciam diretamente nas propriedades sensoriais da bebida. As resinas são constituídas de α e β ácidos, sendo os principais responsáveis pelo amargor da cerveja, além de atuarem como agentes bacteriostáticos, evitando a proliferação de microrganismos. Já os óleos essenciais são os grandes responsáveis pelos aromas e sabores de lúpulo da cerveja, podendo, em alguns casos, contribuir simultaneamente para as duas funções (SILVA, 2017). O lúpulo pode ser vendido em forma de flores prensadas, pó, extrato e em formato de “pellets”. O extrato é obtido por um processo de extração utilizando um solvente adequado, devendo ser livre de solvente no produto final. Já o formato pellet é talvez o formato mais utilizados nessa indústria devido a sua facilidade de manipulação, armazenamento e transporte. 3.3.4. Fermento biológico (leveduras) As leveduras são fungos unicelulares, podendo ter formato oval, alongados ou esféricos. Por dimensão, possuem um tamanho maior do que as bactérias e reproduzem-se assexuadamente de forma rápida por brotamento (OLIVEIRA, 2011). Esses microrganismos possuem a habilidade de absorver os açúcares simples, como glicose a maltose, contidos no mosto cervejeiro, transformando-os em álcool, gás carbônico e outros subprodutos durante o processo de fermentação. Existem diversas espécies de leveduras, sendo as do gênero Saccharomyces as mais utilizadas por apresentarem várias cepas consideradas 18 seguras e capazes de produzir dois metabólitos primários importantes, etanol e CO2. A levedura saccharomyces cerevisiae (Figura 1) é a mais utilizada para a fabricação de cervejas do tipo ale e são classificadas como de fermentação alta pois atuam na superfície do tanque fermentador em um intervalo de temperatura que varia entre 15 a 22 ºC. Já as leveduras do tipo saccharomyces uvarum (Figura 2) são empregadas na produção de cervejas lager, podendo ser consideradas como de fermentação baixa por atuarem na parte debaixo do tanque de fermentação em um intervalo de temperatura entre 7 a 15°C (SILVA 2017). Figura 1 - saccharomyces cerevisiae Fonte: THE SCREWY BREWER, (2014) Figura 2 - saccharomyces uvarum Fonte: THE SCREWY BREWER, (2014)19 3.3.5. Adjuntos cervejeiros De acordo com o Decreto n° 6.871, de 4 de junho de 2009, consideram- se adjuntos cervejeiros a cevada cervejeira e os demais cereais aptos para o consumo humano, malteados ou não-malteados, bem como os amidos e açúcares de origem vegetal. Segundo o mesmo decreto, parte do malte de cevada pode ser substituído por adjuntos cervejeiros, que não podem exceder 45% em relação ao extrato primitivo (BRASIL, 2009). A utilização de adjuntos na produção de cerveja tem o objetivo de diminuir custos de fabricação, pois os adjuntos geralmente possuem um menor custo quando comparado ao do malte de cevada e, ainda, a produção nacional não consegue suprir a demanda do mercado (EMBRAPA, 2009). Toda cerveja é obtida através da fermentação alcóolica por ação da levedura sobre um mosto constituído de cereais maltados e adição de lúpulo. Entretanto, as cervejas se diferenciam também pela proporção de malte de cevada podendo uma parte dessa cevada ser trocada por outros cereais, tais como o arroz, trigo, centeio, milho, sorgo, aveia, ou outros adjuntos como soja, mandioca e batata (OLIVEIRA; ARAUJO; SERRANO, 2015). 3.4. Classificação das Cervejas Segundo o Decreto nª 6.871, de 4 de junho de 2009, de acordo com o Art. 38, as cervejas podem ser classificadas levando em consideração 5 critérios: quanto ao extrato primitivo, quanto à cor, quanto ao teor alcoólico, quanto à proporção de malte de cevada e quanto à fermentação (BRASIL, 2009). Ressalta-se que existem outras diferentes classificações cervejeiras, definidas por entidades ou associações internacionais. Entretanto, este trabalho toma como base a legislação nacional. 20 3.4.1. Quanto ao extrato primitivo Levando em consideração o extrato primitivo, as classificações das cervejas variam entre leve, comum, extra e forte. Cerveja leve é aquela cujo extrato primitivo é maior ou igual a 5% e menor que 10,5% em peso, podendo ser classificada como cerveja light a cerveja leve que cumpra, simultaneamente, os requisitos constantes dos itens 1 e 2, seguintes: 1. redução de 25% do conteúdo de nutrientes ou do valor energético com relação a uma cerveja similar do mesmo fabricante (mesma marca comercial), ou do valor médio do conteúdo de três cervejas similares conhecidas e que sejam produzidas na região; 2. valor energético da cerveja pronta para o consumo deve ser no máximo de trinta e cinco quilocalorias por cem mililitros; A cerveja comum, ou simplesmente cerveja, é aquela cerveja cujo extrato primitivo é maior ou igual a 10,5% em peso e menor que 12% em peso. Já a cerveja extra, é definida como sendo a cerveja cujo extrato primitivo é maior ou igual a 12% em peso e menor ou igual a 14% em peso. Por fim, classifica-se cerveja forte como sendo a cerveja cujo extrato primitivo é maior que 14% em peso. 3.4.2. Quanto à cor As cervejas podem ser classificadas de acordo com sua coloração. A EBC (European Brewery Convention) é uma escala de referência na medição da coloração das cervejas. A cerveja pode ser classificada como: cerveja clara, cerveja escura e cerveja colorida. A cerveja clara corresponde a cerveja que tiver cor correspondente a menos de 20 unidades EBC. Para a cerveja ser considerada escura, sua cor precisa corresponder a 20 ou mais unidades EBC. Já as cervejas coloridas, apresentam coloração diferente das definidas pelo padrão EBC e sua coloração é resultante da ação de corantes naturais. 21 3.4.3. Quanto ao teor alcoólico Cervejas com conteúdo alcoólico menor ou igual a 0,5% em volume, é considerada uma cerveja sem álcool e, portanto, não precisa constar obrigatoriamente no rótulo seu teor alcoólico. Todas a cerveja com mais de 0,5% de álcool por volume é considerada cerveja alcoólica, devendo obrigatoriamente constar no rótulo seu teor alcoólico. 3.4.4. Quanto à proporção de malte de cevada Podemos classificar as cervejas de acordo com a concentração de malte de cevada. Cerveja puro malte é aquela cerveja que possui 100% de malte de cevada, em peso, sobre o extrato primitivo, como fonte de açúcares. As cervejas que possuírem pelo menos 55% de malte de cevada em peso são classificadas simplesmente pelo nome cerveja. Cervejas que utilizam outros tipos de cereais maltados precisam, necessariamente, mencionar o nome do vegetal predominante. Cerveja de trigo, por exemplo, para as cervejas cujo vegetal predominante seja o trigo e deve possuir uma proporção de malte de cevada maior que 20% e menor que 55%, em peso, sobre o extrato primitivo, como fonte de açúcares. 3.4.5. Quanto à fermentação Em relação a fermentação, existem dois tipos de cervejas: cervejas Lagers e Ales. Cervejas “Lagers” são classificadas como cervejas de baixa fermentação, pois as leveduras localizam-se na parte inferior dos fermentadores durante a etapa de fermentação. Já as cervejas “Ales” são aquelas classificadas como cervejas de alta fermentação, pois suas leveduras localizam-se na parte superior dos tanques fermentadores. 22 3.5. Weiss Bier A cerveja de trigo é classificada como uma cerveja de fermentação alta, com leveduras trabalhando em temperaturas próximas a 20°C durante um curto período (3 a 5 dias). A Weissbier é uma cerveja com boa aceitação no Brasil pois se trata de um estilo de cerveja com coloração convidativa entre amarelo claro ao dourado. A aceitação desse tipo de cerveja também está relacionada a combinação da sensação de maciez bem perceptível da bebida, com alta carbonatação e cremosidade causada por sua espuma espessa de longa duração. É classificada como uma cerveja de corpo leve ou médio, dificilmente sendo encontrada como uma cerveja bastante encorpada. Sua formulação é caracterizada por baixas adições de lúpulos para valorizar as características do sabor do trigo. São cervejas refrescantes e de rápida maturação, exibindo um caráter único de banana e cravo proporcionados pela levedura (BJCP, 2015). Na tradição alemã, pelo menos 50% da moagem total deve ser convertida em malte de trigo, embora algumas versões tenham até 70% e o resto de malte de cevada (BJCP, 2015). A Tabela 1 indica o valor de algumas caracteristícas padrão geralmente encontradas em uma típica cerveja de trigo. Tabela 1 - Características convencionais de uma Weissbier Parâmetro Intervalo Padrão OG FG IBU SRM ABV 1,044 – 1,052 1,01 – 1,014 8 – 15 2 – 6 4,3 – 5,6% Fonte: BJCP (2015) Onde, OG: Densidade original SRM: Standart Research Method (coloração) FG: Densidade Final ABV: Álcool por volume IBU: Índice de amargor 23 3.6. Processo de produção da cerveja No geral, o processo produtivo da cerveja envolve nove etapas: moagem, mosturação, filtração, fervura, resfriamento do mosto, fermentação, maturação, carbonatação e envase. Alguns processos podem ser adicionados dependendo do tipo de cerveja e da cervejaria. A Figura 3 representa um fluxograma genérico da fabricação de cerveja. Figura 3 - Fluxograma do processo de produção da cerveja Fonte: Próprio Autor No processo de produção de cerveja, cada etapa tem sua devida importância. Porém, o sucesso do processo produtivo não será atingido apenas com uma excelente receita. Uma boa limpeza e uma sanitização adequada são 24 duas premissas para a não ocorrência de contaminação no produto final. Essa etapa de sanitização possui um papel fundamental na fabricação da cerveja, pois é responsável por manter alguns microrganismos indesejáveis longe da concorrência pelos açúcares do mosto. Todos os equipamentos que por acaso venham a entrar em contato com o mosto devem ser devidamente limpos e sanitizados. Produtos como álcool 70%, ácido peracético e indofor são os mais utilizados para uma sanitização eficiente dos equipamentos (SILVA, 2017).3.6.1. Moagem O processo de moagem do malte tem como principal objetivo liberar o endosperma contido dentro dos grãos, rico em amido, pela quebra das cascas. É uma etapa crucial da brassagem, pois tem influência direta na solubilização do amido. Vale ressaltar que a moagem não pode ser muito severa para não comprometer a filtração do mosto, pois a preservação das cascas dos grãos exercerá um papel fundamental de elemento filtrante no processo de clarificação e lavagem do mosto. A moagem também não pode apresentar grãos muito grossos, pois isso causaria uma dificuldade maior na conversão do amido, gerando uma perda na eficiência da produção. Dessa maneira, é essencial uma moagem adequada que consiga obter um tamanho ideal de partículas (SILVA, 2017). 3.6.2. Mosturação A mosturação, também chamada de brassagem, é o processo de adição do malte moído em água quente, visando a ativação de enzimas existentes no malte e a solubilização dos açúcares complexos dos grãos para conversão em açucares fermentáveis. Segundo Oliveira (2011) a temperatura não deve exceder os 72°C, pois a partir dessa temperatura as enzimas são inativadas. 3.6.3. Filtração do Mosto 25 Após a etapa de mosturação, uma combinação de substâncias dissolvidas e não dissolvidas é obtida. A solução aquosa obtida precisa ser separada da parte não dissolvida, já que apenas o extrato líquido é utilizado nas etapas posteriores da fabricação de cerveja. A filtragem do mosto geralmente é dividida em duas etapas: na primeira etapa, a solução aquosa atravessa a malha filtrante natural formada pelo bagaço do malte dando origem ao mosto primário; na segunda etapa, ocorre uma lavagem do resíduo sólido afim de extrair os açucares residuais, melhorando a eficiência da extração promovendo uma maior quantidade de açucares fermentáveis, além de separar o mosto cervejeiro dos bagaços de malte. A água secundária (água de lavagem) deve estar a 75°C, visando o aumento da extração de açúcar, causando um melhor rendimento do processo (ALMEIDA E SILVA, 2005). Industrialmente no Brasil, utilizam-se tinas de filtração onde uma parte do mosto atravessa um meio filtrante e outra parte fica retida, formando uma torta composta por cascas e restos de parede celular ou de proteínas coaguladas oriundas do malte. Essa torta formada possui um alto valor nutricional para ruminantes e também pode ser processado e comercializado para fabricação de pães (AQUARONE et al, 2005). Na escala artesanal, é recomendado o uso de uma panela com fundo falso, utilizado na etapa de mosturação, para atuar de maneira similar das tinas de filtração utilizada no processo industrial de larga escala. As cascas do malte, juntamente com o fundo falso, irão formar um meio filtrante dando origem ao mosto cervejeiro. 3.6.4. Fervura do Mosto A etapa de fervura do mosto possui diversos objetivos que são importantes para a qualidade do produto final. Com a utilização de uma fonte de calor, eleva-se a temperatura do tanque de fervura para aproximadamente 100°C promovendo a ebulição do mosto cervejeiro. Temperaturas elevadas e a adição de lúpulo promovem a esterilização do mosto, desenvolvimento da cor, formação de substâncias que promovem aroma e sabor, precipitação de substâncias como taninos e proteínas, evaporação de água em excesso e do 26 dimetil sulfeto (DMS) que garante eliminação de alguns off-flavours (MELLO; SIQUEIRA, 2017). Podemos dividir os lúpulos inseridos na etapa de fervura em três categorias: os lúpulos de amargor, os lúpulos de aroma e os lúpulos híbridos. A diferença está basicamente na concentração de alfa-ácidos e óleos essenciais presentes em cada tipo de lúpulo. Na lupulagem para amargor, é preferencial o uso de lúpulos com uma concentração maior de alfa-ácidos logo no início da fervura, pois quanto maior o tempo de contato com o mosto em ebulição, mais favorável será a isomerização dessa substância. Já na lupulagem para aroma, é recomendado a adição de lúpulos apenas ao final da fervura, por volta de 15 min, para evitar a evaporação excessiva de óleos essenciais (fundamentais para o aroma). Para a lupulagem híbrida, o lúpulo deve ser adicionado no intervalo de tempo entre 20-40 minutos para obtenção do equilíbrio entre amargor e sabor da cerveja (SILVA, 2017). Ao final da etapa de fervura, se faz necessário um tratamento do mosto para a retirada do material residual insolúvel do lúpulo e das proteínas coaguladas. Para isso, um sistema de agitação como exemplificado na Figura 4 deve ser acionado para gerar uma força centrífuga com o objetivo de decantar o trub (sedimentos do mosto e lúpulo) de maneira forçada (SILVA, 2017). Figura 4 - Dinâmica de movimentação do whirlpooling Fonte: Adaptado de BRIGGS et al., 2004, p. 353. 3.6.5. Resfriamento do Mosto 27 Terminado o processo de fervura, inicia-se a parte fria do processo cervejeiro. Existem 4 principais motivos para o resfriamento do mostro: redução da formação de dimetil sulfeto (DMS), causar um choque térmico no mosto, evitar contaminação e adequar a temperatura do sistema para inoculação das leveduras. (SILVA, 2017) O resfriamento rápido do mosto interrompe a produção de DMS (dimetil sulfeto). Esse composto deve ser retirado do mosto para evitar a possível formação de características sensoriais indesejáveis. Além disso, o resfriamento abrupto do mosto causa um choque térmico que ajudará na decantação das proteínas para o fundo do recipiente gerando uma diminuição da turbidez. A redução da temperatura também ajuda na diminuição da contaminação gerada por alguns microrganismos que se desenvolvem na faixa de temperatura entre 35 e 65°C. Temperaturas mais amenas são essenciais para o crescimento microbiológico das leveduras, visto que temperaturas mais elevadas desfavorecem o seu desenvolvimento (SILVA, 2017). Existem vários métodos para resfriamento do mosto, dentre eles podemos destacar: o banho-maria, chiller de imersão, chiller de contrafluxo e chiller de placas. O processo de resfriamento do mosto via chiller de imersão em um recipiente com água e gelo reduz bastante o tempo de resfriamento. É um método eficiente para utilização na produção de cerveja artesanal e se caracteriza por ser prático e de baixo custo (SILVA, 2017). 3.6.6. Fermentação A fermentação é um processo anaeróbico no qual as leveduras cervejeiras utilizam oxigênio para transformar os açúcares fermentáveis em álcool, dióxido de carbono e outros subprodutos que agregam propriedades organolépticas à cerveja (NACHEL, 2008). O sucesso para uma boa fermentação depende de algumas variáveis como: a temperatura de fermentação, a concentração de oxigênio presente no mosto, o tempo de fermentação, a quantidade e a viabilidade das leveduras inoculadas. Dessa maneira, um bom planejamento e uma execução que respeite esses cinco fatores, muito provavelmente resultará em uma boa fermentação do mosto (SILVA, 2017). 28 3.6.7. Maturação Logo após o término da fermentação, dá-se início a etapa de maturação da cerveja. Segundo Silva (2017), este é um procedimento importante para o processo cervejeiro, pois uma boa maturação resulta em um ótimo perfil sensorial do produto final. Após a fermentação, a temperatura é reduzida nos fermentadores com o objetivo de retirar compostos indesejáveis originários da etapa anterior (MELLO; SIQUEIRA, 2017). O tempo de maturação está diretamente relacionado com o estilo de cerveja e da qualidade de sua fermentação. Uma cerveja de trigo, por exemplo, não necessita de uma maturação demorada, sendo mais interessante bebe-la em poucos dias após ficar pronta. Uma cerveja fermentada de maneira correta apresenta uma ótima maturação dentro de poucas semanas, enquanto que uma cerveja mal fermentada pode não obter adequada qualidade sensorial,mesmo com uma maturação longa (SILVA, 2017). 3.6.8. Carbonatação Existem dois métodos para carbonatação da cerveja produzida. Na escala industrial, há uma injeção forçada de gás carbônico na cerveja envasada. Já na produção artesanal, a carbonatação ocorre dentro da própria embalagem, também conhecida como priming, através da adição de uma quantidade extra de açucares fermentáveis para a ocorrência de uma fermentação provocada por leveduras residuais ainda presentes após a maturação. Para calcular a quantidade de açúcar que será adicionado na cerveja, primeiramente é preciso levar em consideração a quantidade de gás carbônico residual dissolvido e o volume da cerveja produzida. As Tabelas 2 e 3 abaixo mostram, respectivamente, a relação entre a temperatura de fermentação com o volume de CO2 dissolvido e o volume de CO2 desejado, de acordo com o estilo de cerveja. 29 Tabela 2 - Temperatura de fermentação e volume de CO2 dissolvido Temperatura de fermentação Volume de CO2 dissolvido 0°C 1,70 4°C 1,50 8°C 1,30 10°C 1,20 12°C 1,12 14°C 1,05 16°C 0,99 18°C 0,93 20°C 0,88 22°C 0,83 Fonte: Adaptado de SILVA, 2017 Tabela 3 - Volume de CO2 desejado de acordo com o estilo de cerveja. Estilo de cerveja Volume de CO2 Ales Inglesas 1,5 – 2,0 Porter; Stout 1,7 – 2,3 Ales belgas em geral 1,9 – 2,4 Lagers em geral 2,2 – 2,7 Ales Americanas 2,2 – 2,7 Lambics 2,4 – 2,8 Lambics com frutas 3,0 – 4,5 Cervejas de Trigo 3,3 – 4,5 Fonte: SILVA, 2017 Segundo Silva (2017), uma vez conhecida a quantidade de dióxido de carbono residual e o volume de cerveja produzida, é possível calcular a quantidade em gramas de sacarose (açúcar de cana) para a carbonatação de acordo com a seguinte equação: 30 𝑔 𝐿 = 𝑣 − 𝑣0 0,286 Onde: v: volume de CO2 desejado; v0: volume de CO2 residual saturado; 0,286: constante para essa fonte de açúcar; 3.6.9. Envase O envase é a etapa final do processo de fabricação de cerveja. Nessa etapa, se faz necessário uma sanitização completa das garrafas e tampas para que não ocorra uma contaminação por meio da proliferação não desejada de microrganismos que podem alterar a qualidade final da bebida (MELLO; SIQUEIRA, 2017). Ao fim do procedimento de envase, precisa-se levar em consideração alguns cuidados com a temperatura. Uma temperatura muito baixa, causa uma hibernação das leveduras e, consequentemente, não proporciona a carbonatação esperada. O ideal é que a refermentação ocorra na temperatura máxima de fermentação, ao abrigo do sol e com as garrafas em pé para que as leveduras que concluírem seu trabalho possam flocular para o fundo do recipiente. (SILVA, 2017) 4. MATERIAIS E MÉTODOS 4.1. Produção da Cerveja O processo de fabricação da cerveja foi realizado de acordo com os procedimentos e instruções descritos por Palmer (2006) e Silva (2017). Foram utilizadas as instalações e equipamentos da Associação dos Cervejeiros Artesanais do Rio Grande do Norte (Acerva Potiguar). Um volume de aproximadamente 40L de água filtrada por filtros de carvão ativado foi aquecido até a temperatura inicial do processo de mosturação. Três tipos de malte (10,5 kg) foram moídos e adicionados no processo: BestMaltz Pilsen (3,5 EBC), 31 Boortmalt trigo claro (3,5 EBC) e Best Melanoidin Light (50 EBC). Na etapa de mosturação, a temperatura foi aquecida lentamente passando por 4 rampas de temperatura até chegar na temperatura final de 75 ºC. A utilização de rampas de temperatura possibilita a atuação enzimática de diferentes enzimas que serão responsáveis por conferir qualidades sensórias características e específicas de cada processo de fabricação. Dentre as enzimas importantes no processo de fabricação da cerveja podemos citar as proteases, beta-glucanases, beta- amilases, alfa-amilases, etc. Posteriormente ao processo de mosturação, foi realizada a filtração e lavagem do mosto, onde a parte líquida do processo foi separada da parte sólida (bagaço) e transferida para a panela de fervura. Uma água aquecida até a temperatura de 75ºC foi utilizada na lavagem do mosto para extração de açúcares fermentáveis residuais presentes no bagaço após a filtração. A parte líquida do processo (mosto cervejeiro) foi aquecida até atingir a temperatura de ebulição, dando início a etapa de fervura. Logo após alguns minutos, foram adicionados 25g do lúpulo (Hallertau Tradition 6,0%) com a finalidade de promover amargor ao produto final. No final da fervura, foram adicionados mais 25g do mesmo lúpulo com o objetivo de conferir aroma a bebida. Ao final da fervura, um sistema de agitação foi acionado manualmente com o auxilio de uma pá cervejeira, fazendo o movimento rotacional necessário para a formação de um vortex. O mosto permaneceu em repouso por 15 min para a formação do trub, que é rico em proteínas coaguladas, polifenóis, taninos e material residual insolúvel do lúpulo que precisam ser retirados do processo. Após a etapa de fervura, foi realizado um resfriamento do mosto com o auxílio de um chiller de imersão, uma bomba e uma panela contendo água e gelo. O chiller é imerso na panela de fervura para que ocorra uma troca de calor entre o mosto quente e a água fria bombeada por dentro do chiller. Para o processo de fermentação, foi utilizada a levedura Safbrew wheat WB-06. Uma válvula de escape foi utilizada para não haver acumulo de pressão causada pelo CO2 da fermentação alcoólica do mosto. O tanque fermentador foi colocado em um ambiente de temperatura controlada a 20ºC durante 5 dias para a fermentação da cerveja. Em seguida, transferiu-se o tanque para a câmara fria, dando início ao processo de maturação da cerveja. 32 A carbonatação da cerveja foi conduzida pelo método priming. Para o envase da cerveja, adicionou-se uma quantidade extra de açúcar refinado na cerveja maturada com o objetivo de causar uma fermentação secundária das leveduras residuais dentro da própria garrafa. Para a ocorrência da fermentação secundária, a cerveja permaneceu 10 dias em temperatura ambiente, longe de calor, umidade e luz solar. Para o acompanhamento do processo de fabricação da cerveja, foram utilizados termômetros analógicos de mercúrio para medição das temperaturas envolvidas no processamento e um refratômetro manual portátil para medição dos sólidos totais. 4.2. Análises Físico-Químicas Para fins de obtenção de dados experimentais sobre o padrão de identidade e qualidade da cerveja de trigo, produzida artesanalmente no presente trabalho, alguns aspectos físico-químicos foram avaliados. Todas as análises foram realizadas em triplicata, com objetivo de avaliar se a cerveja produzida estava dentro dos padrões de qualidade estabelecidos pela legislação vigente de acordo com o decreto nº 2.314/1997. Foram analisados os parâmetros: densidade relativa, pH, acidez total, teor alcoólico, grau Brix, cor e extrato seco total. As análises foram realizadas com amostras descarbonatadas da cerveja produzida, acondicionadas a temperatura ambiente. A descarbonatação ocorreu dentro de um béquer de 500 mL, através de uma agitação manual com o auxílio de um bastão de vidro sanitizado, mantendo-se a temperatura estável dentro do intervalo de 20 a 25°C. 4.2.1. Densidade relativa Para a análise da densidade relativa, utilizou-se um densímetro devido a sua praticidade e rapidez. O densímetro mede a massa específica de uma solução aquosa através da flutuação do aparelho quando imerso na solução a ser analisada. Na cerveja, o densímetro mede a diferença de densidade entre a água pura e água com açúcar dissolvido na flotação (PALMER, 2006). 33 A leitura é realizada de acordo com o nível do líquido estabilizado logo após a flutuação livre do densímetro na solução. Uma escala de graduação para o nível dolíquido corresponde densidade da amostra. 4.2.1.1. Materiais e equipamentos • Densímetro • Proveta 50 mL 4.2.1.2. Procedimento Uma amostra da cerveja acondicionada a temperatura ambiente e descarbonatada, foi transferida para uma proveta de 50mL. Em seguida, inseriu- se o densímetro para a flutuação livre do aparelho na amostra. Esperou-se a estabilização da altura para a realização da leitura da densidade relativa. 4.2.2. Determinação do pH O pHmetro é utilizado para determinar a concentração dos íons de hidrogênio em uma solução aquosa através de eletrodos e um circuito potenciômetro. Para calibração do aparelho, foram utilizadas duas soluções tampões de pH 4,0 e pH 7,0. 4.2.2.1. Materiais e equipamentos • Solução tampão pH 4,0; • Solução tampão pH 7,0; • Béquer de 100 mL; • pHmetro; 34 4.2.2.2. Procedimento Após calibração, lavou-se o eletrodo com água destilada e secou-se para realização da medição. Inseriu-se o eletrodo dentro da amostra presente no béquer de 100 mL até estabilização da tensão. O valor de pH corresponde a leitura de tensão em milivolts do aparelho. 4.2.3. Acidez total titulável Com o uso de indicador fenolftaleína, esse método fundamenta-se na neutralização de ácidos com uma solução básica de concentração conhecida. 4.2.3.1. Materiais e equipamentos • Solução de hidróxido de sódio 0,1 mol/L; • Solução de fenolftaleína a 1% (m/v); • Erlenmeyer de 250 mL • Bureta de 25 mL; • Pipeta volumétrica de 10 mL; • Balança analítica; 4.2.3.2. Procedimento Com um erlenmeyer de 250mL contendo 100 mL de água destilada, adiciona-se 10 mL de amostra. Em seguida, titulou-se com uma solução básica de hidróxido de sódio com concentração conhecida de 0,1 mol/L até atingir o ponto de viragem do indicador fenolftaleína. O valor da acidez total foi encontrado através da equação 1, baseada em BRASIL (1986). 𝐴𝑐𝑖𝑑𝑒𝑧 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙( 𝑔 á𝑐𝑖𝑑𝑜 𝑎𝑐é𝑡𝑖𝑐𝑜 100 𝑚𝐿 𝑐𝑒𝑟𝑣𝑒𝑗𝑎 ) = 𝑉 𝑥 [𝑁𝑎𝑂𝐻] 𝑥 𝑚𝑚𝑒𝑞 á𝑐𝑖𝑑𝑜 𝑎𝑐é𝑡𝑖𝑐𝑜 𝑥 100 𝑃 (Equação 1) 35 Onde: V = volume gasto da solução de hidróxido de sódio (mL); [NaOH] = concentração em mol/L da solução de hidróxido de sódio; mmeq ácido acético = 0,0060g; P = volume da amostra de cerveja (mL). 4.2.4. Teor alcoólico por ebuliometria Para determinação do teor alcoólico da cerveja, utilizou-se o método ebuliométrico que se baseia na determinação da porcentagem de álcool em uma solução alcoólica. Antes da realização do experimento, fixou-se o ponto zero na escala do ebuliômetro. A diferença entre o ponto de ebulição da água (100 ºC) e do álcool (78,4 ºC) torna esse método possível. O valor do ponto de ebulição da solução alcoólica analisada deve estar dentro do intervalo 78,4 °C a 100 °C, sendo expressa de acordo com o grau alcoólico. Ou seja, quanto maior o teor alcoólico, menor será a temperatura de ebulição da amostra. 4.2.4.1. Materiais e equipamentos • Ebuliômetro; • Proveta de 50 mL; 4.2.4.2. Procedimento Depois de lavada com água destilada, foi inserido um volume de amostra na caldeira. Foi conectado o termômetro na caldeira e encheu-se o condensador com água. Posteriormente, acendeu-se a lamparina e colocou-se posicionada sob o condensador. Com o aquecimento da amostra, o marcador de mercúrio dentro do termômetro se deslocou e a temperatura de ebulição da solução foi obtida quando o indicador se estabilizou. 36 4.2.5. Teor de sólidos solúveis Segundo Palmer (2006), a concentração Brix foi elaborada na indústria cervejeira para descrever a concentração de extrato disponível expressa em porcentagem de peso de açúcar em solução, em substituição à densidade. A unidade Brix equivale à quantidade de açúcar diluído em 100g de solução. 4.2.5.1. Materiais e equipamentos • Refratômetro Abbe • Água destilada • Pipeta volumétrica de 20 mL 4.2.5.2. Procedimento Com o refratômetro limpo, pingou-se no prisma duas gotas de amostra com o auxílio de uma pipeta. Posicionou-se o refratômetro contra a luz, ao nível dos olhos e efetuou-se a leitura do valor marcado. 4.2.6. Determinação da Cor (EBC) A cor pode ser determinada através do método de espectrofotometria e expressa em unidades EBC (European Brewery Convention). Esse método baseia-se na medida quantitativa da absorção de luz de uma amostra contida em uma cubeta. 4.2.6.1. Materiais e equipamentos • Espectrofotômetro • Cubeta de Quartzo • Pipeta volumétrica de 20 mL 37 4.2.6.2. Procedimento Com a ajuda de uma pipeta, coletou-se um volume de amostra e transferiu-se para a cubeta de quartzo. Colocou-se a cubeta de quartzo dentro do espectrofotômetro para leitura da quantidade de luz absorvida quando uma luz monocromática de 430 nm atravessa a amostra dentro da cubeta. A cor, na escala EBC, pode ser calculada de acordo com a Equação 2. 𝐸𝐵𝐶 = 25 𝑥 𝐷 𝑥 𝐴430 (Equação 2) Onde: D = 1 (líquido não diluído); A430 = Atenuação da luz 4.2.7. Determinação do extrato seco total O extrato seco total é o resultado de uma evaporação de compostos voláteis dentro de um volume amostral. Após a evaporação, substâncias que não volatilizaram formam um resíduo seco que, através da pesagem, consegue-se determinar o teor de sólidos contidos na amostra. 4.2.7.1. Materiais e equipamentos • Balança analítica • Banho-maria • Estufa • Cápsula de porcelana • Dessecador • Pipeta volumétrica de 20 mL 38 4.2.7.2. Procedimento Com auxílio de uma pipeta, 20 mL de amostra foram transferidas para uma cápsula de porcelana previamente aquecida a 100 °C durante 1 hora, posteriormente resfriou-se em dessecador e anotou-se o peso. Aqueceu-se novamente em banho maria até a secagem. A secagem ocorreu na estufa a 100 °C durante 1 hora e em seguida resfriou-se até temperatura ambiente em um dessecador e novamente anotou-se o peso. A Equação 3 descrita pelo Instituto Adolf Lutz (2008) foi utilizada para o cálculo do extrato seco em porcentagem. % 𝐸𝑋𝑇 = 100 𝑥 𝑃 𝑉 (Equação 3) Onde: %EXT = Extrato Seco em porcentagem; P = Massa do resíduo (g); V = Volume da amostra (mL); 4.3. Análise Sensorial A análise sensorial é definida pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT, 1993) como a disciplina científica usada para evocar, medir, analisar e interpretar reações das características dos alimentos e materiais como são percebidas pelos sentidos da visão, olfato, gosto, tato e audição. Segundo Teixeira (2009), a análise sensorial é uma ferramenta bastante empregada na indústria de alimentos para o desenvolvimento e avaliação da aceitação de novos produtos, reformulação de alguns produtos que por ventura já estejam no mercado, indicações de preferências para melhoria da qualidade, otimização do processo produtivo, entre outros. A análise sensorial deste trabalho utilizou a metodologia proposta pelo Instituto Adolf Lutz (2008) de acordo com dois métodos: 165/IV Testes afetivos – Teste de aceitação por escala hedônica de 7 pontos e 167/IV Testes afetivos – Testes de escala de atitude ou de intenção com 5 pontos. 39 O julgamento da compra de um certo produto depende de inúmeros fatores como: influência econômica, sociocultural, qualidade da rotulagem, qualidades nutricionais, clima, sexo, idade, religião, etc. Já no caso da aceitação, é uma questão da experiencia proporcionada pelo produto em questão que se baseia numa escala de atitude positiva, através de um consumo real do alimento ou bebida apresentada (TEIXEIRA et al., 1987 apud MATOS, 2011). Um total de 65 pessoas participaram da análise sensorial. Um volume de 50 ml foi apresentado aos provadoresem copos de plásticos transparentes. Para a realização da análise sensorial, disponibilizou-se uma ficha com os dois testes. No primeiro teste, os participantes avaliaram quanto ao sabor, odor e cor, de acordo com o grau de gostar ou desgostar, utilizando a escala que varia entre 1. Desgostei extremamente e 7. Gostei extremamente. Para o segundo teste, avaliou-se a escala de atitude ou de intenção com variação entre 1. Certamente não compraria e 5. Certamente compraria. Os testes estão representados abaixo na Tabela 4. Tabela 4 - Ficha utilizada para avaliação sensorial Nome:__________________________________Sexo:____Idade:____Data:___/___/___. Teste 1 - Você está recebendo uma amostra de cerveja. Avalie quanto ao sabor, odor e cor, utilizando a escala abaixo. (7) Gostei extremamente Sabor ( ) (6) Gostei moderadamente (5) Gostei ligeiramente Odor ( ) (4) Indiferente (3) Desgostei ligeiramente Cor ( ) (2) Desgostei moderadamente (1) Desgostei extremamente Teste 2 - Ainda sobre a amostra, avalie quanto à intenção de compra utilizando a escala abaixo. (5) Certamente compraria (4) Provavelmente compraria (3) Talvez compraria / talvez não compraria ( ) (2) Provavelmente não compraria (1) Certamente não compraria 40 4.3.1. Índice de aceitabilidade O índice de aceitabilidade (IA) foi calculado para cada um dos atributos: sabor, odor e cor, tendo como base notas médias resultantes do teste de aceitação. Para o cálculo do índice de aceitação utilizou-se a equação 4: 𝐼𝐴 = 𝐴 𝑥 100 𝐵 (Equação 4) Onde: A = Nota média obtida para o produto; B = Nota máxima dada ao produto. 5. RESULTADOS E DISCUSSÕES 5.1. Análises Físico-Químicas A Tabela 5 apresenta valores obtidos por meio das análises físico- químicas realizadas e representam as médias dos resultados das triplicatas de cada experimento, seguindo as metodologias descritas no presente trabalho. Tabela 5 - Resultado das análises físico-químicas Análises Resultado Esperado Densidade relativa (g/cm3) pH Acidez Total (%v/v) Teor Alcoólico (°GL) Sólidos solúveis (°Brix) Cor (EBC) Extrato seco total (%EXT) 1,01 3,34 ± 0,01 0,14 4,2 ± 0,1 5,5 15 3,53 ± 0,03 1,01 ~ 1,014 3,2 ~ 3,4 0,09 ~ 0,15 4,3 ~ 5,6 5,5 ~ 6,0 < 20 2,0 ~ 7,0 41 Segundo BJCP (2015), a densidade se encontra dentro dos padrões desejáveis de acordo com o padrão de identidade de uma cerveja de trigo, o qual define um intervalo entre 1,01 e 1,014 g/cm3 para esse tipo de cerveja. A densidade da cerveja produzida nesse trabalho também está dentro dos padrões estabelecidos pela ANVISA, o qual determina valores dentro do intervalo entre 1,007 a 1,022 g/cm3. O resultado das análises de pH foi satisfatório para uma boa qualidade da cerveja, uma vez que o valor encontrado (pH 3,34) apresenta-se dentro da faixa de 3,2 a 3,4 para as cervejas de trigo (BUSHMAN 2015). Segundo Hoffmann (2001), um pH menor do que 4,5 é de extrema importância para proteger a cerveja de microrganismos patogênicos como o Clostridium botulinum, uma bactéria que causa uma doença rara e potencialmente fatal. A acidez da cerveja está diretamente ligada com a carbonatação da mesma, visto que o responsável pela acidez da bebida é o ácido carbônico obtido através da reação entre a água e o CO2 obtido na fermentação alcoólica (VENTURINI FILHO, 2000). Uma acidez adequada é essencial para inibição do desenvolvimento de microrganismos indesejáveis que possam trazer alterações no produto final. De acordo com Compton (1978), uma boa acidez se encontra no intervalo entre 0,09% a 0,15%. O valor obtido para a acidez total foi de 0,14% e demonstra um ótimo resultado para a qualidade da cerveja. O teor alcoólico apresentou um valor ligeiramente abaixo do esperado para uma cerveja de trigo de acordo com BJCP (2015), o qual determina o intervalo entre 4,3% e 5,6% de álcool. No entanto, pode-se afirmar que a cerveja analisada não está fora dos padrões estabelecidos na legislação brasileira pois o decreto n° 6.871 não constrange um teor alcoólico específico para esse estilo de cerveja. O valor da quantidade de sólidos solúveis na cerveja é uma forma de representação da densidade da bebida, pois expressa a porcentagem em peso de açúcares na solução. Uma menor quantidade de sólidos solúveis torna a cerveja menos densa devido a transformação dos açúcares em álcool. A concentração 5,5 ° Brix foi satisfatória pois os valores de densidade relativa e teor alcoólico já se encontram dentro do esperado para uma boa qualidade do produto final. 42 Conforme o decreto n° 6.871 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, a cor está relacionada com os índices EBC. Cervejas claras possuem o índice EBC menor que 20 e cervejas escuras índices EBC iguais ou superiores à 20. Desta forma, o resultado obtido com a análise de cor demonstra um índice EBC 15, o que caracteriza a cerveja como uma cerveja clara. Segundo BJCP (2015), o valor está dentro do intervalo característico da cerveja de trigo, onde a cerveja possui uma cor que varia entre o amarelo palha ao dourado. O extrato seco total demonstra o conjunto de substâncias que não se volatilizaram em condições físicas específicas. As análises resultaram no valor de 3,53%. Esse valor ficou dentro do padrão estabelecido pela ANVISA, que determina o intervalo entre 2,0 a 7,0%. 5.2. Análise Sensorial A cerveja de trigo desenvolvida neste trabalho foi avaliada quanto a 3 atributos principais (sabor, odor e cor) através do teste de aceitação na escala hedônica e intenção de compra dos provadores. Um total de 65 julgadores não treinados aceitaram o convite para participação da análise sensorial da cerveja, destes 66,15% homens e 33,85% mulheres. Alguns critérios foram levados em consideração para a possibilidade da participação dos provadores, tais como: o fato do provador possuir idade superior ou igual a 18 anos, já ter bebido algum tipo de cerveja para fins comparativos e não ser alérgico aos componentes da cerveja como por exemplo o glúten. A Tabela 6 apresenta a média das notas resultantes da análise sensorial do teste de aceitação por escala hedônica de 7 pontos, bem como os índices de aceitação para cada um dos atributos. Tabela 6 - Resultado do teste de aceitação por escala hedônica Atributos Média Índice de aceitação Sabor Odor Cor 5,98 6,06 6,08 85,49% 86,59% 86,81% 43 Uma média de aproximadamente 6,0 foi confirmada para os atributos sabor, odor e cor, que corresponde a avaliação “gostei moderadamente” na escala estruturada na ficha avaliativa segundo Instituto Adolfo Lutz (1985). Bathke et al. (2013) avaliaram uma cerveja tradicional industrializada quanto ao sabor, odor e cor e obtiveram resultados parecidos com o presente trabalho, apresentando médias que variam entre 7,17 a 7,39 numa escala hedônica de nove pontos, o que evidenciam 79,6% e 82,11% respectivamente da nota máxima da escala utilizada. Schork (2015) analisou sensorialmente 3 formulações de cerveja de acordo com sabor, odor e cor, sendo duas artesanais e uma comercial. A cerveja mais bem avaliada em seu trabalho foi a comercial e obteve as notas de 83,88% para o atributo sabor, 78,88% para o atributo odor e 84,00% para o atributo cor. Quando comparado ao valor obtido no presente trabalho de 85,71% em média para os atributos sabor, odor e cor, podemos considerar que a cerveja de trigo produzida teve elevada aceitação sensorial, demonstrando um potencial a ser explorado pois foipossível a elaboração de um produto com boa aceitação, mesmo utilizando recursos de fácil acesso para produção artesanal, quando comparado aos encontrados na indústria. A pesquisa também analisou através do teste de intenção de compra os participantes da análise sensorial e o resultado está demonstrado na Figura 5. 44 Figura 5 - Intenção de compra da cerveja Quando comparado com os trabalhos sensoriais de Bathke et al. (2013) e Schork (2015), que obtiveram médias de intenção de compra de 87,64% e 84% respectivamente, o resultado obtido no presente trabalho (84,51%) indica uma excelente escala de atitude ou intenção de compra para a cerveja produzida. 6. CONCLUSÃO Com a obtenção de uma cerveja de trigo (Figura 6) de coloração convidativa, com aromas e sabores atrativos, foi possível concluir, do ponto de vista sensorial, que a cerveja fabricada foi bem recebida, de acordo com os provadores. As análises sensoriais resultaram em uma ótima aceitação do produto e sua a intenção de compra foi satisfatória. 0,00 10,00 20,00 30,00 40,00 50,00 60,00 55,38% 29,23% 7,69% 4,62% 1,54% Intenção de Compra 45 Figura 6 - Cerveja artesanal de trigo Com relação as análises físico-químicas, foi constatado que o objetivo desse trabalho foi cumprido com sucesso, pois o padrão de qualidade e identidade da cerveja foi atingido como o planejado. Pode-se concluir também que, embora os participantes da análise sensorial não foram provadores treinados para essa avaliação específica, a cerveja apresentada neste trabalho teve uma ótima recepção com o público pois alguns provadores demonstraram interesse na possibilidade da compra de mais cervejas como as que provaram, evidenciando mais uma vez uma ótima aceitabilidade do produto final. Alguns estudos como a eficiência do processo produtivo, análise econômica, instrumentação e controle do processo podem ser avaliados em trabalhos futuros para um melhor embasamento sobre custos associados, minimização de perdas no processo e uma melhor padronização da cerveja produzida. 46 7. REFERÊNCIAS ALMEIDA E SILVA, J.B. Tecnologia de bebidas: matéria prima, processamento, BPF / APPCC, legislação e mercado. São Paulo: Edgard Blucher, 2005. p.347-380 ALVARENGA, Darlan. Número de cervejarias no Brasil quase dobra em 3 anos e setor volta criar empregos.2018. 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