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Geovana Sanches, TXXIV EMBRIOLOGIA DO SISTEMA REPRODUTOR E DIFERENCIAÇÃO SEXUAL ETAPAS DA DIFERENCIAÇÃO SEXUAL A diferenciação sexual, do ponto de vista biológico, ocorre em 3 etapas. A primeira delas é a fecundação, seguida pelo período indiferenciado e diferenciação morfológica. Fecundação Na fecundação, o sexo cromossômico do embrião será definido pelo cromossomo sexual carregado pelo espermatozoide. Assim, originar- se-á um zigoto feminino (46, XX) ou masculino (46, XY). Desenvolvimento indiferenciado urogenital e gonadal Entre a 3ª e a 6ª semanas após a fecundação, ocorre o desenvolvimento indiferenciado dos aparelhos urogenital e gonádico, ou seja, de maneira idêntica para ambos os sexos cromossômicos. Nesse período, o embrião possui duas cristas urogenitais. Entre a 4ª e a 5ª semanas, as células germinativas primordiais que estão na parede do saco vitelínico, começam a se diferenciar e migram para a crista urogenital. Já entre a 5ª e a 6ª semana, há proliferação do mesênquima das cristas gonadais, com formação dos cordões sexuais primários em ambos os sexos (fase indiferenciada). Posteriormente, há chegada dos gonócitos, os quais se instalam entre os cordões sexuais primários, permanecendo envolvidos por eles. Desenvolve-se assim, a gônada primitiva, que é igual para ambos os sexos. Na 5ª semana do desenvolvimento, há também a indiferenciada dos ductos genitais – ducto mesonéfrico (ou de Wolff) e ducto paramesonéfrico (ou de Muller) – os quais são responsáveis por originar as outras estruturas do sistema reprodutor. Nesse período, ainda não sabemos se a estrutura formada será masculina ou feminina. Diferenciação morfológica As estruturas gonadais, ductos internos e genitália externa tem uma tendência a seguir as características femininas. Sendo assim, a diferenciação sempre é desencadeada por um estímulo genético masculino, pois é esse sexo quem exige atuação ativa. Fase diferenciada dos testículos Quando o embrião apresenta o sexo cromossômico masculino, as células germinativas primordiais carregam o cromossomo Y. No braço curto desse cromossomo, encontra-se o gene SRY, responsável por estimular a diferenciação da gônada primitiva em testículo entre a 6ª e a 8ª semana. O gene Sox9 também se relaciona com esse processo. A partir do estímulo do SRY, os cordões sexuais primários formam os túbulos seminíferos. O mesênquima gonadal, que se encontra entre os cordões, origina as células de Leydig e o epitélio celomático, as células de Sertoli. As células de Leydig secretam testosterona e esse hormônio estimula o desenvolvimento dos ductos de Wolff. Com isso, esse ducto se diferencia para formar o epipídimo, ducto deferente, vesícula seminal e ductos ejaculatórios. Além disso, a testosterona também sofre conversão para di-hidrotestosterona, o qual é responsável pela masculinização externa (formação de pênis e saco escrotal). As células de Sertoli, por sua vez, produzem o hormônio antimulleriano (AMH), responsável por induzir a degeneração dos ductos de Muller (paramesonéfricos). Quando o cromossomo Y não está presente, não há esse estímulo e, portanto, ocorre a fase diferenciada dos ovários. Geovana Sanches, TXXIV Fase diferenciada dos ovários Quando o embrião é geneticamente feminino, as células germinativas primordiais carregam apenas cromossomos X. A ausência do cromossomo Y e, consequentemente, do gene SRY, induz a diferenciação das gônadas primitivas em ovários, processo que se dá entre a 8ª e 12ª semana de desenvolvimento. Os cordões sexuais primários mais medulares originam a medula ovariana, enquanto, os mais corticais originam as células foliculares, as quais envolvem as oogônias originadas pelas células germinativas primordiais. Ainda em decorrência da ausência do cromossomo Y, não há formação de células de Sertoli ou produção de hormônio antimulleriano. Com isso, o ducto de Muller se desenvolve formando o útero, as tubas uterinas e a porção superior (1/3) da vagina – alterações em que o ducto não se desenvolve cursam com ausência dessas estruturas. O restante da vagina é formado pelos bulbos sinovaginais (seio urogenital). Também não há formação de células de Leydig e produção de testesterona, de forma que o ducto de Wolff atrofia e não há masculinização externa, formando-se a vulva. Desenvolvimento da genitália externa Até a 7ª semana, a genitália externa de ambos os sexos é indiferenciada. Por volta da 9ª semana, na presença de di- hidrotestosterona, ocorre a diferenciação da genitália externa masculina. O tubérculo genital se alonga e passa a se chamar falo, originando a glande posteriormente. Durante o alongamento, as pregas uretrais se fundem ao redor da uretra formando o corpo do pênis. Por fim, as protuberâncias genitais formam o saco escrotal. Na ausência da di-hidrotestosterona, ocorre o desenvolvimento da genitália externa feminina por estímulo de hormônios produzidos na placenta. Nesse caso, o tubérculo genital forma o clitóris, as pregas uretrais não se fusionam e formam os pequenos lábios e as protuberâncias genitais aumentam para formar os grandes lábios. Nos casos em que há defeito na conversão de testosterona em di-hidrotestosterona, o mesmo efeito ocorre, de forma que não há diferenciação da genitália externa masculina, permanecendo as características femininas. DIFERENCIAÇÃO SEXUAL ANÔMALA CONCEITOS • Gênero: conjunto de características psicológicas, sociais e culturas • Sexo genético ou biológico: é aquele identificado pelo médico ao nascimento HERMAFRODITISMO VERDADEIRO O termo hermafrodita é proveniente da junção de “Hermes” (deus grego da virilidade masculina) e “Afrodite” (deusa grega do amor e da beleza). É uma condição extremamente rara, resultante de um erro na determinação do sexo. Cerca de 70% dos casos são 46, XX; 20% mosaicos (46, XX/46, XY); e 10% são 46, XY. O bebê possui ovário e testículo em glândulas diferentes ou tecido ovariano e testicular na mesma glândula. O fenótipo pode ser masculino, feminino ou ambíguo, com genitália externa de ambos os sexos. Geovana Sanches, TXXIV INTERSEXUALIDADE A intersexualidade também é uma condição rara, resultante da passagem do gene SRY para o cromossomo X durante o crossing over. Assim, a prole XX receberá o SRY, expressando fenótipo masculino; e a prole XY não receberá esse gene, expressando fenótipo feminino. PSEUDO-HERMAFRODITISMO FEMININO O pseudo-hermafroditismo feminino é caracterizado por cariótipo feminino (46, XX), presença de ovários, porém com ambiguidade de genitália externa com masculinização – hipertrofia de clitóris e fusão de grandes lábios. A condição pode ser diagnosticada intra-útero (raro), ao nascimento (mais comum) ou na puberdade. A causa mais comum do pseudo- hermafroditismo feminino é a hiperplasia adrenal congênita. Dentre elas, a mais comum (90% dos casos) é a deficiência da enzima 21-hidroxilase, que cursa com acúmulo de 17-hidroxi- progesterona e androstenediona. Essa deficiência enzimática faz com que o eixo seja desviado para produção de andrógenos, cursando com aumento de testosterona. O tratamento consiste no uso de corticoide sistêmico e cirurgia para redução clitoriana. Outras causas menos comuns são o uso de medicamentos androgênicos durante a gestação e arrenoblastoma (tumor ovariano raro que produz testosterona). PSEUDO-HERMAFRODITISMO MASCULINO O pseudo-hermafroditismo masculino é caracterizado por cariótipo masculino (46, XY), presença do gene SRY (há testículos, geralmente intra-abdominais), porém com alguma falha no metabolismo da testosterona, resultando em fenótipo feminino. O indivíduo apresenta, portanto, corpo feminino, com mamas, genitália externa feminina e vagina curta (terço distal). Tendo em vista que a alteração é na testosterona e não no hormônio anti-mulleriano, opaciente apresenta testículo e não ovários, e não apresenta útero, trompas e o terço superior da vagina. Há uma ação androgênica mínima, de forma que algumas características sexuais masculinas se desenvolvem. Pode haver testículo palpável e hipertrofia clitoriana, estando os pelos ausentes. Causas • Produção inadequada de testosterona pelos testículos fetais; • Erro na biossíntese e no metabolismo da testosterona; • Anormalidades nas células-alvo de andrógenos; • Deficiência da enzima 5-α-redutase, não ocorrendo conversão da testosterona em diidrotestosterona Síndrome da Insensibilidade androgênica A causa mais comum de pseudo- hermafroditismo masculino é a síndrome da insensibilidade androgênica, doença de henrança recessiva ligada ao X, também conhecida como síndrome de Morris ou testículo feminilizante. Trata-se de uma condição em que há secreção de testosterona e di-hidrotestosterona, porém sem efeito sobre suas células-alvo devido a deleção ou mutação no gene do receptor de androgênios. O indivíduo apresenta cariótipo 46XY, com fenótipo feminino e testículos intra-abdominais. A paciente apresenta genitália externa feminina, vagina em fundo cego, ausência de útero e de tubas uterinas, não sendo incomum a descoberta após a puberdade, quando a mulher apresenta amenorreia primária. Tendo em vista que essa paciente não possui um útero, não há a possibilidade de uma gravidez, nem mesmo com uma fertilização in vitro. DISGENESIA GONADAL A disgenesia gonadal ocorre quando as gônadas não se desenvolvem devido a falha na migração das células germinativas primordiais até Geovana Sanches, TXXIV a crista genital ou devido a involução destas células após a migração. O resultado é a persistência de uma gônada rudimentar que não produz hormônios ou os produz de maneira falha. Síndrome de Swyer O indivíduo com síndrome de Swyer apresenta cariótipo masculino, porém com uma mutação no gene SRY, resultando em um fenótipo feminino. Não há ação eficaz do hormônio antimulleriano ou de testosterona, de forma que o paciente desenvolverá útero, vagina e uma gônada em fita (fundo cego de tuba uterina, aumentando o risco para gonadoblastoma). Há desenvolvimento muscular e distribuição de gordura corporal masculino (há testosterona, mas ela é falha), mas caso o diagnóstico seja precoce, é possível fazer reposição com estrógeno para manter a feminilização. É possível, inclusiva, que essa paciente engravide caso seja de sua vontade, através de técnicas de reprodução assistida. A suspeita se dá na adolescente cujo corpo não se desenvolve (ovários malformados), associado a amenorreia. Síndrome de Turner A síndrome de Turner é caracterizada por genótipo 45X0 (Turner puro) ou mosaico 45X/46XX (mais comum). Não se trata, portanto, de um pseudo-hermafroditismo, apenas de uma disgenesia gonadal. São características da síndrome a baixa estatura, o tórax largo, o pescoço curto com dobras e alterações cardíacas. O fenótipo é feminino, mas não há desenvolvimento sexual secundário. No Turner puro, a gônada é em fita (infértil), enquanto no Turner mosaico, a gônada é parcialmente desenvolvida e produz uma pequena quantidade de estrogênios, todavia, há uma atresia muito acelerada dos folículos, de forma que, mesmo antes da puberdade, muitas vezes a paciente já apresenta falência ovariana. Síndrome de Klinefelter A síndrome de Klinefelter é caracterizada por um genótipo 47XXY ou mosaicismo. O fenótipo é masculino, com alta estatura, ginecomastia, hipogonadismo e infertilidade – não se trata, portanto de um pseudo-hermafroditismo. Há hiperplasia das células de Leydig, porém essas não funcionam adequadamente, resultando em baixos níveis de testosterona. O diagnóstico pode ser feito na infância, mas é mais comum após a puberdade, a partir das queixas de genitália pequena, e na vida adulta, a partir de queixas de infertilidade (a baixa de testosterona impede a espermatogênese, resultando em azoospermia). MALFORMAÇÕES MULLERIANAS As malformações mullerianas consistem em defeitos no desenvolvimento dos ductos de Muller. São habitualmente assintomáticas e identificadas quando acompanhadas de infertilidade ou complicações obstétricas. Sempre que diagnosticadas, é necessário pesquisar alterações renais associadas, tendo em vista que o desenvolvimento embrionário genital e urinário é simultâneo. Aplasia dos ductos de Muller A aplasia dos ductos de Muller ocorre devido ao não desenvolvimento dos mesmos, ainda que na ausência do hormônio antimulleriano. Aplasias bilaterais A aplasia bilateral completa geralmente é acompanhada de outras malformações e, por isso, é incompatível com a vida. A aplasia bilateral incompleta, por sua vez, é denominada Síndrome de Rockitansky-Kuster- Hauser. O cariótipo é XX e o fenótipo feminino, com resquício das trompas e do útero, os quais não se desenvolvem; os ovários são normais e a vagina é curta. Anomalias renais estão presentes em 15% dos casos. É uma condição geralmente descoberta por queixa de amenorreia. Devido a ausência do útero, pode ser confundida com a Síndrome de Morris (pseudo-hermafroditismo masculino), e a diferenciação pode ser feita através do cariótipo – XX no primeiro caso e XY no segundo. Aplasia unilateral A aplasia unilateral ocorre quando apenas um dos ductos não se desenvolve, de forma que é formado apenas um corno uterino, uma tuba, meio corpo e o colo; não há alteração em ovários. Geovana Sanches, TXXIV Quando um dos lados não se forma completamente, temos aplasia unilateral completa (unicorno verdadeiro). Já nos casos em que há um resquício do outro lado, há aplasia unilateral incompleta, com formação do pseudo- unicorno, o qual não se comunica com o lado bem formado. Em geral, a condição é descoberta na vida adulta devido a abortamento repetido (o útero apresenta apenas um corno e é muito pequeno para suportar a gestação). Não há tratamento, mas a cada gestação o útero sofre uma distensão, aumentando o período de permanência da gestação. Defeitos na fusão dos ductos de Muller Os dois ductos de Muller devem se fundir para formação correta do útero. Perturbações nessa fusão podem causar o útero Di Delfo, no qual há dois úteros, com dois colos uterinos (um dos colos pode acabar obstruído, sem comunicação com a vagina – há dor associada devido ao acúmulo de menstruação), ou útero bicorno (fusão parcial dos ductos, resultando em um útero com formato de coração). Antigamente, fazia-se a correção cirúrgica dessas condições. Entretanto, após cirurgia, o útero em geral rompia no caso de gravidez, tornando esse procedimento sem sentido. Além disso, essas modificações em geral não se relacionam com infertilidade ou perdas gestacionais. No útero Di delfo, habitualmente, há um corno maior do que o outro e a gravidez em geral ocorre no maior, sendo possível prosseguir com a gravidez. Já no útero bicorno, apesar do formato ser diferente, isso não impede a expansão uterina e, portanto, não há implicação na gestação. Alterações da reabsorção do septo de Muller Nesse caso, os ductos de Muller se fundem e ambos os cornos se desenvolvem, mas o septo resultante da fusão não é reabsorvido. O diagnóstico é feito através da histerossanpingografia, exame contrastado do útero. Esse exame permite a visualização apenas da cavidade, de forma que não permite diferenciar o útero bicorno e septado (visualiza-se apenas a porcao interna e não o miométrio). Sendo assim, pode-se realizar uma ultrassonografia 3D, a qual permite a visualização do fundo uterino e do miométrio, ou uma ressonância magnética, que também auxilia na diferenciação. Essa diferenciação é importante pois não tratamos o útero bicorno, mas o septado sim. A condição aumenta o risco de abortamento devido a presença de parede fibrosa, todavia, pode ser corrigida através daseptoplastia, via histeroscopia (também atua como exame diagnóstico). Histrerossalpingografia Ultrassonografia 3D As imagens a esquerda representam úteros bicornos, enquanto as da direita, úteros septados.
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