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1. TEORIA DE LIGAÇÃO DE VALÊNCIA A teoria da ligação de valência teve como base as idéias sobre emparelhamento de elétrons, popularizadas, principalmente, por Lewis e Langmuir. Esta teoria dá um tratamento mecânico quântico à questão das ligações químicas, e foi desenvolvida a partir de 1927 por vários cientistas, entre os quais Linus Pauling foi o que mais se destacou. Como era natural, inicialmente as aplicações da TLV eram feitas para se explicar a formação e algumas propriedades de moléculas simples (como o H2, BeH2, BF3, NH3, CH4, PF5, etc.). Porém, a partir de 1940 Linus Pauling começou a usá-la no estudo de compostos de coordenação. Essas aplicações permitem se explicar, satisfatoriamente, as geometrias e as propriedades magnéticas dos compostos de coordenação, bem como interpretar, com limitações, os espectros eletrônicos e algumas outras propriedades desses compostos. 4.4.1 – APLICAÇÃO DA TEORIA DA LIGAÇÃO DE VALÊNCIA AO ESTUDO DOS COMPOSTOS DE COORDENAÇÃO De acordo com o que é postulado através da TLV, a formação de um composto de coordenação ocorre mediante a reação de um ácido com uma base de Lewis, formando ligações entre o metal e o ligante. Freqüentemente representam-se os orbitais de valência do átomo central por quadrados, círculos traços ou pelos símbolos desses orbitais. Tomando como exemplo o cobalto (III), que tem na camada de valência os orbitais 3d, 4s, 4p e 4d, a configuração eletrônica do estado não excitado pode ser representado por: dxy dxz dyz dx2-y2 dz2 4s 4p px py pz 4d dx2-y2 dz2 dxy dxz dyz 3d ↿⇂ ↿ ↿ ↿ ↿ Com esta configuração, o cobalto pode fazer ligações coordenativas, usando os orbitais 4s, 4p e 4d. Na formação do complexo hexafluorocobaltato(III), [CoF6]-, que apresenta geometria octaédrica, existem seis ligações coordenativas. Estas coordenações podem ser feitas utilizando os orbitais 4s, 4p e dois dos orbitais 4d do cobalto. Como nos compostos de geometria octaedrica as ligações são feitas sobre os eixos x, y e z, pode-se dizer que os orbitais 4d envolvidos na coordenação devem ser dx2-y2 e dz2. Ou seja: dxy dxz dyz dx2-y2 dz2 4s 4p px py pz 4d dx2-y2 dz2 dxy dxz dyz 3d ↿⇂ ↿ ↿ ↿ ↿ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↑ ↑ ↑ ↑ ↑ ↑ [CoF6]3- F- F- F- F- F- F- Dados experimentais mostram que o [CoF6]- é paramagnético, o que é um indicativo da existência de elétrons desemparelhados, e isto é compatível com o modelo acima esquematizado. Porém, outros dados experimentais indicam que as seis ligações metal-ligante (ou ácido-base) são iguais e isto não é compatível com este modelo, uma vez que orbitais diferentes (s, p e d) estão envolvidos nas coordenações, devendo, portanto, gerar ligações diferentes. Para superar este problema foi proposto que os orbitais 4s, 4p, 4dx2-y2 e 4dz2 do cobalto, aceptores dos elétrons dos fluoretos, devem estar hibridizados em sp3d2. Ou seja: dxy dxz dyz dx2-y2 dz2 dxy dxz dyz 3d ↿⇂ ↿ ↿ ↿ ↿ sp3d2 ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ 4d ↑ ↑ ↑ ↑ ↑ ↑ [CoF6]3- F - F- F- F- F- F- Quando se analisou a formação do complexo [Co(NH3)6]3+, verificou- se que este íon é diamagnético e, conseqüentemente, o modelo usado para explicar a formação do [CoF6]- não serve para explicar a formação do complexo amínico. Imaginou-se, então, que, neste caso, os elétrons dos orbitais 3d do cobalto deveriam estar emparelhados, estabelecendo a configuração eletrônica seguinte: dxy dxz dyz dx2-y2 dz2 4s 4p px py pz 4d dxy dxz dyz dx2-y2 dz2 3d ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ Neste caso, quando ocorre a coordenação das moléculas de NH3 ao Co3+, a hibridização deve envolver os orbitais 3dx2-y2, 3dz2, 4s e 4p, formando orbitais híbridos do tipo d2sp3, conforme está ilustrado a seguir: dxy dxz dyz 4d dxy dxz dyz dx2-y2 dz2 3d ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ d2sp3 ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↑ ↑ ↑ ↑ ↑ ↑ [Co(NH3)6]3+ NH3 NH3 NH3 NH3 NH3 NH3 O comportamento diferente do NH3 em relação ao F-, deve-se ao fato do NH3 ser uma base mais forte do que o fluoreto, promovendo o emparelhamento dos elétrons 3d do cobalto durante a formação do complexo. Fato semelhante acontece, com muita freqüência, quando se tem a formação de compostos de coordenação de espécies metálicas com ligantes fortes. Isto pode ser observado até mesmo com o elemento metálico em baixos estados de oxidação, na forma atômica ou, com carga negativa, como pode ser ilustrado usando-se como exemplo o hexacarbonilcromo(0), [Cr(CO)6]. Neste composto (com o elemento central no estado oxidação zero), a configuração eletrônica no nível de valência do cromo é 4s1, 3d5. Ou seja: dxy dxz dyz dx2-y2 dz2 4s 4p px py pz 4d dx2-y2 dz2 dxy dxz dyz 3d ↿ ↿ ↿ ↿ ↿ ↿ Desta forma seis ligações seriam possíveis, mas seriam diferentes entre si - pois envolveriam os orbitais 4p e 4d - e o composto seria paramagnético. Porém, experimentalmente se verifica que as seis ligações são iguais e o composto é diamagnético. Mais uma vez, isto pode ser explicado admitindo-se que ocorra hibridização dos orbitais de valência, originando seis orbitais do tipo d2sp3, que receberão os seis pares de elétrons dos grupos ligantes, conforme a ilustração seguinte: dxy dxz dyz 4d dxy dxz dyz dx2-y2 dz2 3d ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ d2sp3 ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↑ ↑ ↑ ↑ ↑ ↑ [Cr(CO)6] C O C O C O C O C O C O Analisando-se, agora o [Fe(CO)5], cuja geometria é do tipo bipiramidal trigonal e apresenta paramagnetismo compatível com a existência de um elétron desemparelhado, deve-se considerar os seguinte aspectos: Com a configuração eletrônica do estado fundamental, o ferro poderia formar três ligações iguais, usando os orbitais 4p, e outras duas diferentes destas, usando os orbitais 4d vazios do seu nível de valência. Porém, não se poderia explicar o paramagnetismo, pois este deveria ser cinco vezes maior, caso fosse mantida a configuração do estado fundamental. dxy dxz dyz dx2-y2 dz2 4s 4p px py pz 4d dxy dxz dyz dx2-y2 dz2 3d ↿ ↿ ↿ ↿ ↿ ↿⇂ Porém, supondo-se que ocorra rearranjo eletrônico nos orbitais de valência do ferro e hibridização dos orbitais 3dz2, 4s e 4p, formando os híbridos dsp3, tanto a natureza das ligações quanto o paramagnetismo do [Fe(CO)5] ficam bem explicados. dxy dxz dyz dx2-y2 4d dxy dxz dyz dx2-y2 dz2 3d ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿ dsp3 ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↑ ↑ ↑ ↑ ↑ [Fe(CO)5] C O C O C O C O C O Para a formação do íon complexo [PtCl4]2-, que tem como elemento central o ion Pt2+, cuja configuração eletrônica no nível de valência está apresentada no quadro abaixo, pode-se considerar o seguinte: dxy dxz dyz dx2-y2 dz2 6s 6p px py pz 4d dxy dxz dyz dx2-y2 dz2 5d ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿ ↿ Dados experimentais demonstram que este íon é quadrado planar e diamagnético. Portanto, na formação do mesmo deve ocorrer emparelhamento dos elétrons dos orbitais 5dx2-y2 e 5dz2, ao mesmo tempo em que se formam os orbitais híbridos dsp2 - a partir dos orbitais 5dx2-y2, 6s, 6px e 6py - os quais acomodam os pares de elétrons doados pelos ligantes. dxy dxz dyz dz2 6d dxy dxz dyz dx2-y2 dz2 5d ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ dsp2 ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↑ ↑↑ ↑ [PtCl4]2- Cl - Cl- Cl- Cl- Outro exemplo típico para aplicação da TLV é a explicação da formação do [NiCl4]2-, que é tetraédrico e paramagnético. No estado fundamental o níquel(II) tem a configuração: dxy dxz dyz dx2-y2 dz2 4s 4p px py pz 4d dxy dxz dyz dx2-y2 dz2 3d ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿ ↿ Neste caso, considerando as propriedades físicas citadas, a TLV sugere a formação de orbitais híbridos do tipo sp3, sem passar por um estado excitado semelhante aos anteriores. Ou seja: dxy dxz dyz dx2-y2 dz2 dxy dxz dyz dx2-y2 dz2 3d ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿ ↿ sp3 ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↑ ↑ ↑ ↑ [NiCl4]2- Cl - Cl- Cl- Cl- Uma explicação para ocorrer emparelhamento de elétrons no complexo de platina e não ocorrer no composto de níquel (platina e níquel são metais do mesmo grupo), pode ser dada em função do tamanho desses íons, seja em termos da acomodação dos quatro cloretos em torno dos íons metálicos ou dos elétrons nos orbitais atômicos dos metais. Considerando-se que o volume iônico da platina é maior do que o do níquel, certamente que os cloretos ficando nos vértices de um quadrado em torno do íon Pt2+ exercem menos repulsão, uns sobre os outros do que ocorreria em torno do íon Ni2+. Ao mesmo tempo, o emparelhamento de elétrons em orbitais 5d da platina, que são mais difusos, ocorre com menos repulsão do que se este emparelhamento se fizesse nos orbitais 3d do níquel. 1.1.1- ALCANCE E LIMITE DA TEORIA DA LIGAÇÃO DE VALÊNCIA Durante cerca de vinte anos, a partir da sua criação, quase todos os estudos sobre compostos de coordenação foram feitos utilizando-se a teoria da ligação de valência. Tal preferência decorreu da simplicidade dessa teoria e de seu alcance na discussão das estruturas e das propriedades magnéticas dos complexos. Porém, mesmo nesses casos, a TLV apresenta limitações. Ela não permite, por exemplo, predizer se um composto de tipo [ML4]q será tetraédrico ou quadrado planar, ou se um dado complexo octaédrico é de alto spin ou de baixo spin. Num complexo como o [Cu(NH3)4]2+, poderia se prever uma geometria tetraédrica, semelhante à observada no [Zn(NH3)4]2+, com o Cu2+ tendo os seus orbitais 4s e 4p hibridizados em sp3. Porém, dados de raios X mostram que esse íon complexo é quadrado planar. Para explicar este fato, por conveniência, pode-se representar a configuração de valência do Cu2+ na forma: dxy dxz dyz dz2 dx2-y2 4s 4p px py pz 4d dxy dxz dyz dx2-y2 dz2 3d ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿ Orbitais do íon livre Cu2+ A partir desta configuração, durante a coordenação, o elétron dz2 passa para o orbital pz. Ao mesmo tempo, os orbitais 3dx2-y2, 4s, 4px e 4py se hibridizam formando orbitais dsp2, característicos da geometria quadrado planar. Ou seja: dxy dxz dyz dx2-y2 dsp 2 pz dxy dxz dyz dx 2 -y 2 dz2 3d ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿ ↑ ↑ ↑ ↑ NH2 NH2 NH2 NH2 Orbitais do íon complexo [Cu(NH3)4]2+ Vale ressaltar que só se pode chegar a essa conclusão a partir de dados experimentais, uma vez que a TLV não oferece base para determinar se a diferença de energia entre as geometrias tetraédrica e quadrado planar é suficiente para excitar um elétron do Cu2+ do nível 3d para o 4p. A TLV também não consegue explicar alguns aspectos estruturais, como o fato de alguns complexos do tipo [ML6]q serem tetragonais, quando poderia se supor (baseado na teoria) que fossem octaédricos. Esses exemplos são suficientes para mostrar que a TLV, apesar da sua ampla aplicação e dos grandes avanços que ensejou aos estudos dos compostos de coordenação, apresenta limitações que, felizmente, estão sendo superadas com a criação de outras teorias, que se intercomplementam, já que estas últimas também, apresentam limitações. 1.2-TEORIA DO CAMPO CRISTALINO A Teoria do Campo cristalino foi lançada por Hans Bethe em 1929 e modificada por Van Vleck em 1935, tendo como objetivos iniciais o estudo de algumas propriedades de íons metálicos de cristais iônicos, que contêm elétrons d no nível de valência. Essa teoria permite se fazer uma abordagem bastante simples da formação dos compostos de coordenação, possibilitando fácil visualização dos efeitos das ligações metal-ligante sobre os orbitais d. Com essa visualização, facilmente se estabelece a distribuição eletrônica nos orbitais formados (a partir dos orbitais d) durante a coordenação e, como conseqüência, se pode explicar os espectros de ultravioleta e visível, as propriedades magnéticas, as cores e alguns aspectos estruturais e termodinâmicos dos compostos de coordenação. Apesar disso, essa teoria que surgiu na mesma época da TLV, por cerca de vinte anos foi usada quase com exclusividade pelos físicos, especialmente em estudos sobre espectros de ultravioleta e visível. Só a partir de 1950 é que os químicos começaram a usá-la intensivamente. A pouca utilização dessa teoria em estudos sobre compostos de coordenação nas décadas de 30 e 40, deveu-se, principalmente, ao sucesso alcançado pela TLV, que respondia, naquele período, à maioria das questões de interesse dos químicos, nas investigações sobre este tipo de compostos. 1.2.1-ASPECTOS PRELIMINARES Para se entender as interações responsáveis pelos efeitos de campo cristalino, é necessário que se tenha um bom conhecimento das relações geométricas e espaciais dos orbitais envolvidos na formação dos compostos, especialmente sobre os orbitais d. Revisando-se alguns aspectos sobre estes orbitais, se pode dizer que a mecânica ondulatória prever a existência de seis funções de onda tetralobados, cujos contornos estão representados graficamente na figura 1. . Figura 1: Funções de onda tetralobados e os orbitais d Porém a mecânica quântica prevê a existência de, apenas, cinco orbitais d, que são os quatro primeiros acima representados (dxy, dxz, dyz e dx2- y2) e o quinto é o orbital dz2, constituído pela combinação das funções de onda que definem os orbitais dx2- z2 e dy2- z2. Como os dois têm componentes sobre o eixo z, o orbital dz2 tem alta densidade eletrônica sobre este eixo e menor no anel localizado sobre o plano xy. Em átomos ou em íons isolados, os cinco orbitais d são degenerados. Isto é: apresentam a mesma energia. Porém, quando esses átomos ou íons estão combinados com espécies químicas ligantes (que podem ser outros átomos, íons ou moléculas), as energias dos orbitais d tornam-se diferentes. Nos compostos formados nessas combinações, os ligantes formam o campo cristalino, que é o fator determinante das diferenciações de energia (ou quebra da degenerescência) dos orbitais d. Os mecanismos imaginados para se explicar as interações entre estes campos e os orbitais d, constituem as bases da Teoria do Campo Cristalino (TCC). Esta teoria tem como pressuposto básico, admitir que a interação metal-ligante é, exclusivamente, de natureza eletrostática. Nela, as espécies ligantes (ou os pares eletrônicos ligantes) são entendidas como cargas pontuais negativas – sejam elas procedentes de íons (quase sempre ânions), moléculas ou radicais – que interagem com elétrons d do elemento central. Estas cargas, atuando de forma pontual sobre os orbitais d, promovem o desdobramento destes em novos grupos de orbitais, cujas energias são diferentes. Pode-se dizer que os orbitais d perdem a degenerescência - existente quando os mesmos não estão sob a influência de forças externas (espécies atômicas, iônicas, moleculares ou campos de força interagindo com eles) ou internas (assimetria na distribuição eletrônica) - gerando novos orbitais de energias diferentes. Essasinterações, devidas à aproximação entre os orbitais dos ligantes e do átomo central, provocam o aumento da energia desses orbitais. Se o campo produzido pelos ligantes fosse esférico, as energias de todos os orbitais aumentariam igualmente. Porém, como os ligantes ocupam apenas algumas posições em torno do átomo central, o campo produzido afetará a alguns orbitais mais intensamente do que aos outros (figura 2). Figura 2: Efeito do campo cristalino nos orbitais do átomo central. Átomo central livre. Átomo central sob Átomo central sob campo esférico. campo pontual. Para explicar como os efeitos de campo cristalino afetam os orbitais do átomo central, serão tomados como exemplo, inicialmente, espécies químicas do tipo [ML6]q, que constituem os sistemas de mais fácil visualização. Por conveniência, considerar-se-á que os ligantes coordenam-se ao metal ao longo dos eixos, nas posições x, -x, y, -y, z, -z, formando um complexo ou um aduto de geometria octaédrica. Nessa condição, os ligantes interagem mais fortemente com os orbitais dx2 - y2 e d z2 - que têm maior densidade sobre os eixos coordenados - e menos intensamente com os orbitais dxy, dxz, e dyz - que ficam entre estes eixos. Isso provoca a separação dos orbitais d em dois grupos, que são simbolizados por t2g e eg, entre os quais a diferença de energia é definida pelo parâmetro 10 Dq. As variações de energia provocadas por essas interações estão representadas na figura 6, usando-se uma espécie de configuração d10 como referência. O campo esférico, mostrado nas figuras 2 e 3, é hipotético e nele todos os orbitais aumentariam de energia simetricamente. Os campos cristalinos reais não têm simetria esférica, o que faz com que as energias dos orbitais aumentem de formas diferentes em relação ao estado fundamental. Figura 3 - Variações de energia dos orbitais d em campo octaédrico ↿⇂ ↿⇂ eg 10Dq ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ t2g ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ Íon sob campo esférico Complexo Íon d10 livre Complexo hipotético octaédrico não têm simetria esférica, o que faz com que as energias dos orbitais aumentem de formas diferentes em relação ao estado fundamental. Nas espécies octaédricas, quando ocorre a coordenação, o centro de gravidade dos orbitais permanece constante. Porém, dois orbitais d (os de simetria eg) interagem mais fortemente com os ligantes do que os outros três (de simetria t2g). Vale ressaltar que a diminuição de energia dos orbitais d, do campo esférico até gerar os orbitais t2g, é igual ao aumento de energia de d, do campo esférico até formar os orbitais eg, mantendo-se o baricentro. Assim, cada elétron em orbital t2g tem energia 4 Dq menor do que a energia que teria se o campo fosse esférico. De forma semelhante, cada elétron em orbital eg, tem energia 6 Dq maior do que teria em campo esférico. O valor de 10 Dq depende da força de interação metal-ligante e esta, por sua vez, depende da natureza das espécies coordenadas, conforme será visto em seções posteriores. Em campos octaédrico e tetraédricos, os valores de 10 Dq também podem ser representados, respectivamente, pelos símbolos ∆o e ∆t. 1.3.1 -MEDIDAS DOS VALORES DE 10 Dq E n e r g i a Determinações dos valores de 10 Dq podem ser feitas usando-se a espectroscopia de ultravioleta e visível, uma vez que as diferenças de energia entre orbitais t2g e eg, geralmente correspondem a energias de radiações desta faixa do espectro eletromagnético. Para ilustrar como essas determinações são feitas, será usado, como exemplo, o espectro do titânio(III) em solução aquosa, pelo fato deste, sendo um sistema d1, produzir espectros de ultravioleta e visível (UV-Vis) bastante simples, estando entre os de mais fácil interpretação. Em meio aquoso, pode-se admitir que o íon Ti3+ fica coordenado as moléculas de água, formando o íon complexo [Ti(H2O)6]3+. Neste complexo, o único elétron d do titânio deve ocupar um dos orbitais t2g. Este elétron, quando excitado por uma radiação ou por outra forma de energia conveniente, passa para o orbital eg, e esta transição pode ser detectada por um espectrofotômetro de ultravioleta e visível, aparecendo, no espectro, na forma de um pico ou banda de absorção, conforme é mostrado na figura 4. Nesse espectro, o pico de absorção ocorre em 20.300 cm-1, que é a energia necessária para promover a transição: t2g1, eg0 → t2g0, eg1 ; 10 Dq = 20.300cm--1 Esta energia transição é convertida em joules através da equação: 10 Dq = E = hcν onde h é a constante de Plank, c é a velocidade da luz e ν é o número de onda do fóton capaz de promover a transição. Conseqüentemente, o valor de 10 Dq para o íon [Ti(H2O)6]3+ é igual a: 10 Dq = 6,63.10-34 J.s.3.108m.s-1.2,03.106m-1 ou 10 Dq = 4,04.10-19J Como será visto em outros exemplos, o valor de 10 Dq varia de acordo com a configuração eletrônica do átomo central, com a natureza do ligante e com a geometria do composto formado. Figura 4: Espectro de ultravioleta e visível do [Ti(H2O)6]3+ Comprimento de onda (λ) em nm 667 500 400 333 20.300 cm-1 15.000 20.000 25.000 30.000 Vermelho Laranja Amarelo Verde Azul Indigo Violeta Frequência em cm-1 1.3.2- ENERGIA DE ESTABILIZAÇÃO DE CAMPO CRISTALINO - EECC A energia de estabilização de campo cristalino é definida por uma parcela expressa em termos de valores de Dq, relacionada com a distribuição eletrônica em eg e t2g, e outra definida pela repulsão entre os elétrons quando se emparelham dentro de um mesmo orbital. Para explicar a origem desses parâmetros, mais uma vez serão usados compostos de geometria octaédrica, por serem de mais fácil visualização. 1.3.2.1 – ENERGIA RELACIONADA À DISTRIBUIÇÃO ELETRÔNICA Nos compostos de coordenação, a distribuição dos elétrons d também se faz de acordo com a regra da Hund. Assim, espécies d1, d2 e d3, quando formam compostos octaédricos, apresentam configurações t2g1, t2g2 e t2g3, respectivamente. Portanto, esses compostos são estabilizados pela entrada de elétrons nos orbitais de menor energia (t2g). Essa energia é denominada Energia de Estabilização do Campo Cristalino (EECC), que para as três configurações citadas, assume os valores – 4 Dq, - 8 Dq e - 12 Dq. Para espécies acima de d3, a entrada de mais 1 elétron em t2g pode fazer aparecer uma energia (repulsiva) de emparelhamento (P), o que ocorre quando dois elétrons ocupam um mesmo orbital. Esta possibilidade existe para sistemas de d4 a d7, que podem assumir duas configurações diferentes, dependendo dos valores de 10 Dq. Se P < 10 Dq (o que ocorre quando o campo cristalino é forte), espécies com até 6 elétrons d terão todos esses elétrons em t2g. Se P > 10 Dq (verificado quando o campo cristalino é fraco), só ocorrerá o primeiro emparelhamento após cada orbital t2g e eg já está com 1 elétron. Para espécies d7, essas condições de preenchimento também são observadas e podem existir duas configurações. Finalmente, as espécies d8, d9 e d10 só podem assumir um tipo de configuração, podendo ocorrer mudança quando ocorre distorção tetragonal das espécies hexacoordenadas. Nos sistemas de d4 a d8, quando os elétrons permanecem desemparelhados (em campo fraco), diz que os compostos são de spin alto e quando os elétrons d são emparelhados (em campo forte) diz-se que o compostos são de spin baixo. Os desdobramentos dos orbitais d em campos octaédricos fraco e forte estão ilustradosna figura 5. Figura 5 – Desdobramento dos orbitais d em campo fraco e em campo forte eg 10Dq eg 10Dq t2g t2g D Complexo de Complexo de Íon livre Campo fraco Campo forte Nestes diagramas, pode-se ver que o valor de 10 Dq em campo fraco é menor do que em campo forte e, com eles, aplicando-se a regra de Hund, obtém-se as configurações eletrônicas das espécies octaédricas. Vale ressaltar, por fim, que o aumento da força do campo implica em aumento da estabilização para compostos de coordenação de espécies de d1 a d9, exceto para d5 com spin alto. 1.3.2.2 – ENERGIA DE EMPARELHAMENTO A energia de cada emparelhamento (P) é composta por dois termos e corresponde à energia necessária para promover o emparelhamento de dois elétrons num mesmo orbital. Um desses termos resulta das repulsões entre E n e r g i a os elétrons que ocupam um mesmo orbital (Pcoul). Esse efeito deve ser maior nos orbitais d dos níveis quânticos menos elevados do que nos níveis inferiores (P3d > P4d > P5d) em virtude do aumento do volume dos orbitais, a medida que o número quântico principal vai aumentando. O segundo termo é devido ao trabalho de o inverter o campo magnético (spin) do elétron quando este entra num orbital que já tenha um outro elétron (Pex). A variação de energia emparelhamento é proporcional ao número de pares de elétrons que se formam a partir dos elétrons desemparelhados. Para ilustrar este efeito, a tabela 1 apresenta alguns valores de energias de emparelhamento calculados de acordo métodos propostos por L. E. Orgel e J. S. Griffith. Tabela 1: Alguns valores de Energias de Emparelhamento, em cm-1 Íon Configuração Pcoul Pex Ptotal Cr2+ d4 5.950 14.474 20.425 Mn2+ d5 7.610 16.215 23.825 Fe3+ d5 10.050 19.825 29.875 Fe2+ d6 7.460 11.690 19.150 Co3+ d6 9.450 14.175 23.625 Co2+ d7 8.400 12.400 20.800 Em sistema d6, a energia de emparelhamento se relaciona à EECC da forma representada pelos gráficos da figura 6. Nesses gráficos, verifica- se que as linhas correspondentes à EECC para campos forte e fraco se cruzam no ponto em que 10Dq = P. O campo ligante que assegura essa condição, faz com que o composto correspondente apresente os estados de alto spin e de baixo spin em equilíbrio, isto é, com as duas formas presentes. A constatação desse fato foi feita pela primeira vez para compostos do tipo [Fe(S2CNR’R”)3]. Nesses compostos, o ferro(III) pode apresentar cinco elétrons desemparelhados (S = 5/2), o que ocorre em campo fraco, ou, apenas, um elétron desemparelhado (S = 1/2), verificado em campo forte. Figura 6: Correlação entre EECC e P em complexos de configuração d6 Força do campo ligante Quando o [Fe(S2CNR’R”)3] é resfriado até próximo do zero absoluto, a suscetibilidade magnética observada equivale à de compostos de baixo spin. Quando aquecido à 350K, a suscetibilidade magnética indica que o composto passou a ser de spin alto. Por fim, na temperatura ambiente, a suscetibilidade magnética observada é intermediária entre os estados de alto e de baixo spin, o que indica a presença dos dois estados no composto. Após essas considerações sobre a estabilização causada pelo desdobramento dos orbitais d (nDq) e sobre a energia de emparelhamento, pode-se determinar as energias de estabilização de campo cristalino, através da expressão: EECC = número de elétrons em t2g x (-4Dq) + número de elétrons em eg x 6 Dq + número de emparelhamentos E N E R G I A E Energia de emparelhamento - P Valor de 10 Dq A tabela 2 apresenta as energias de estabilização de campo cristalino para íons com configurações de d0 a d10, submetidos a campos octaedricos fracos e fortes, em parâmetros nDq + mP. Tabela 2: Energia de Estabilização de Campo Cristalino de Sistemas Octaédricos Espécies Campo Fraco Campo Forte Configuração EECC Configuração EECC d0 Sc3+ t2g0 eg0 0 Dq t2g0 eg0 0 Dq d1 Ti3+ t2g1 eg0 -4 Dq t2g1 eg0 -4 Dq d2 V3+ t2g2 eg0 -8 Dq t2g2 eg0 -8 Dq d3 Cr3+ t2g3 eg0 -12 Dq t2g3 eg0 -12 Dq d4 Mn2+ t2g3 eg1 -6 Dq t2g4 eg0 -16 Dq + P d5 Fe3+ t2g3 eg2 0 Dq t2g5 eg0 -20 Dq + 2 P d6 Co3+ t2g4 eg2 -4Dq + P t2g6 eg0 -24 Dq + 3 P d7 Rh2+ t2g5 eg2 -8 Dq + 2 P t2g6 eg1 -18 Dq + 3 P d8 Ni2+ t2g6 eg2 -12 Dq + 3 P t2g6 eg2 -12 Dq + 3 P d9 Cu1+ t2g6 eg3 -6 Dq + 4 P t2g6 eg3 -6 Dq + 4 P d10 Zn10 t2g6 eg4 0 Dq + 5 P t2g6 eg4 0 Dq + 5 P É importante ressaltar que, nos compostos de spin alto, a energia de emparelhamento não contribui para instabilizá-los, uma vez que, nos íons isolados, os emparelhamentos já existem. Esta influência existe, apenas, nos compostos de spin baixo em que os elementos centrais têm configurações d4, d5, d6 e d7, pois, nestes, o número de emparelhamentos aumenta durante a formação dos compostos. Mesmo assim esta influência é superada pela presença de mais elétrons nos orbitais t2g, de baixas energias. 1.2.4- EVIDÊNCIAS DA VALIDADE DA TCC A explicação das propriedades espectrais e magnéticas dos complexos em função de separação dos orbitais d, além de ser uma importante ferramenta para estudos desse tipo de composto, constitui um forte indício de que o modelo do campo cristalino seja correto. Além dos dados espectrais, muitas análises termodinâmicas têm favorecido a aceitação da TCC. Por exemplo: cálculos de energias de redes cristalinas mostram que os dados obtidos para haletos de Na+, K+, Ca2+, Mn2+ e Zn2+, estão muito mais próximos dos resultados experimentais do que análises semelhantes feitas para haletos de Cr3+, Fe2+, Co2+, Ni2+ e Cu2+, sendo, todos eles, compostos de spin alto. Entre esses dois grupos de íons, uma das diferenças existentes, é que, no primeiro, as configurações eletrônicas são simétricas (d0, d5 ou d10) e, no do segundo grupo, (d6, d7, d8 e d9) são assimétricas. Considerando-se que a energia de ligação entre pares iônicos seja dada pela equação: E= Z+. Z-/r seria de se esperar que, na série de dihaletos do terceiro período, de CaX2 a ZnX2, as energias reticulares crescessem gradualmente, já que os raios iônicos diminuem do Ca2+ para o Zn2+. Verifica-se, porém, que esse aumento não é constante, ocorrendo pontos de mínimos nas configurações d0, d5 e d10, que são os casos onde se tem 0Dq de energia de estabilização de campo cristalino, conforme está ilustrado na tabela 3 e na figura 7. Tabela 3 – Energias reticulares (U) dos cloretos e dos óxidos da série do cálcio(II) ao zinco(II). Compostos U em kJ/mol Compostos U em kJ/mol Configuração EECC CaCl2 2.258 Cão 3.401 d0 – t2g0, eg0 0 ScCl2 2.380 ScO d1 – t2g1, eg0 ´-4Dq TiCl2 2.501 TiO 3.811 d2 – t2g2, eg0 ´-8Dq VCl2 2.579 VO 3.863 d3 – t2g3, eg0 ´-12Dq CrCl2 2.586 CrO d4 – t2g3, eg1 ´-6Dq MnCl2 2.537 MnO 3.745 d5 – t2g3, eg2 0 FeCl2 2.631 FeO 3.865 d6 – t2g4, eg2 ´-4Dq CoCl2 2.691 Côo 3.910 d7 – t2g5, eg2 ´-8Dq NiCl2 2.772 NiO 4.010 d8 – t2g6, eg2 ´-12Dq CuCl2 2.811 CuO 4.050 d9 – t2g6, eg3 ´-6Dq ZnCl2 2.734 ZnO 3.971 d10 – t2g6, eg4 0 Figura 7 – Energia reticular dos cloretos do cálcio(II) ao zinco(II) 2.200 2.400 2.600 2.800 3.000 CaCl2 ScCl2 TiCl2 VCl2 CrCl2 MnCl2 FeCl2 CoCl2 NiCl2 CuCl2 ZnCl2 U e m k J /m o l Uma evidência mais conveniente, já que está se discutindo compostos de coordenação, é a análise das energias de hidratação de íons de metais de transição. Nesse caso, apesar das medidas serem feitas em 1 soluções diluídas, pode-se considerar que apenas seis moléculas de água entram na esfera de coordenação,formando complexos octaédricos. Pode-se considerar, portanto, que as entalpias de hidratação sejam iguais às entalpias de formação de complexos hexaqua, [M(H2O)6]q. Colocando-se num gráfico as entalpias de hidratação da série de cloretos, do Ca(II) ao Zn(II), observa-se um comportamento semelhante ao verificado para as entalpias reticulares destes sais. Para consolidar, mais ainda, a evidência de que a estabilização por campo cristalino realmente existe, se podem determinar as EECC dessa série de complexos (usando espetroscopia de UV-Vis, por exemplo), subtraindo-se as energias de hidratação correspondentes. Um gráfico dos resultados obtidos com essa operação aproxima-se bastante daquele que se obtém considerando-se, apenas, efeitos de tamanho. Comportamento semelhante é observado para outros dados termodinâmicos de muitos compostos produzidos por outras séries dos tipos apresentadas, com ligantes diferentes. 1.4- EFEITO DO CAMPO CRISTALINO EM COMPOSTOS TETRAÉDRICOS. Nos compostos tetraédricos, os quatros ligantes localizam-se, simetricamente em torno do átomo central, entre os orbitais dxy, dxz e dyz, interagindo mais fortemente com elétrons destes orbitais do que com elétrons dos orbitais dx2-y2 e dz2, como se pode entender analisando a figura 8. 2 Figura 8- Compostos de geometria tetraédrica +z +y -x +x -y -z Nesses compostos, a intensidade das interações entre os ligantes e elétrons dos orbitais d é inversa a aquela observada nos compostos octaédricos, onde ocorrem interações mais fortes com os orbitais dx2-y2 e dz2. Como conseqüência, nos compostos tetraédricos, os orbitais d se desdobram de forma inversa à que ocorre em compostos octraédricos, conforme é ilustrado no diagrama apresentado na figura 13. Deve-se observar, também, que, neste caso, existem apenas quatro ligantes interagindo mais diretamente com elétrons de três dos orbitais d (dxy, dxz, dyz), diferentemente do que ocorre em sistemas octaédricos, onde seis ligantes interagem frontalmente com os elétrons de, apenas, dois orbitais d (os dz2 e dx2 - y2). Conseqüentemente, os valores de 10 Dq em campos tetraédrico são sempre menores do que os observados em campos Oh. ● ● ● ● ● ● Metal ● Ligante 3 Figura 9 - Variações de energia dos orbitais d em campo tetraédrico ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ t2g 4Dq ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ 10Dq 6Dq ↿⇂ ↿⇂ eg ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ Íon sob campo esférico Complexo Íon d10 livre Complexo hipotético Tetraédric Considerando-se as diferenças nas relações numéricas e nas orientações dos ligantes em relação aos elétrons d, conclui-se que os valores de10 Dq em compostos de simetria tetraédrica devem ser menores do que a metade dos valores observados em compostos octaédricos, com a relação entre os valores de 10Dq nas duas simetrias podendo ser expressa por: 10Dq(td) < 4/9 10Dq(Oh) (ou ∆t < 4/9∆o). Freqüentemente, porém, para se calcular variações de energia entre os orbitais eg e t2g, causadas pelos ligantes sobre um dado metal, a partir de dados experimentais de uma das duas formas geométricas, se usa equação: 10 Dq(td) = 10 Dq(Oh) ou ∆t = 4/9∆o. É importante registrar, ainda, que nos compostos tetraédricos, os valores de 10 Dq são sempre menores do que as energias de emparelhamentos (P). Como conseqüência, todos os compostos de coordenação formados com esta geometria, apresentam-se em estado de alto spin. E n e r g i a 4 1.5 RELAÇÕES ENTRE EECC EM SISTEMAS Oh e Td. Sob o ponto de vista puramente eletrostático, a coordenação octaédrica é favorecida em relação à tetraédrica, uma vez que, seis cargas negativas sendo atraídas por uma positiva devem liberar mais energia do que quatro negativas sobre a mesma positiva. Por outro lado, seis ligantes colocados em torno de um átomo se repelem mais fortemente do que quatro ligantes em torno do mesmo átomo, o que favorece a coordenação tetraédrica. Portanto, a preferência por uma dessas simetrias vai depender da prevalência dos fatores que as determinam. Pela aplicação da TCC, já foi visto que os compostos tetraédricos são sempre de alto spin, apresentando valores de 10 Dq pequenos e sempre menores do que os apresentados pelos compostos octaédricos. Isto faz com que a formação de compostos tetraédricos tenda a só ocorrer nos casos em que as energias de estabilização de campo cristalino não sejam fatores muito significativos para estabilização dos compostos, como ocorre nos sistemas d0, d1, d2, d5, d6, d7 e d10 em campo fraco. A influência do valor de 10 Dq sobre as simetrias Td ou Oh pode ser discutida a partir dos dados contidos na tabela 4, onde estão relacionados dados experimentais e dados calculados, para uma série de aquacomplexos de spin baixo, representativos de espécies com configurações de d1 a d9. Nesta tabela, as EECC da simetria Oh são obtidas através da espectroscopia de absorção eletrônica e, a partir destes dados experimentais, se calculam os valores de EECC para sistemas tetraédricos, considerando-se ∆t = 4/9∆o. Com isto, fazendo-se a diferença entre os valores determinados para os dois sistemas em estudo, obtém-se a energia de estabilização de sítio octaédrico (EESO), que expressa a preferência das espécies químicas 5 consideradas formarem complexos tetraédricos ou octaédricos e, para facilitar a interpretação, todos os dados relativos às energias de estabilização estão convertidos para unidade do sistema internacional (kJ/mol). Tabela 4 – Energias de estabilização de campo cristalino em aqua complexos de Configuração eletrônica EESO em Orbitais Campo Campo 10Dq em cm-1 10Dq em kJ/mol Íon D Oh Td Oh(a) Td(b) Oh Td Ti3+ d1 t2g1, e1, 20.100 8.930 96,2 64,1 32,1 V3+ d2 t2g2, e2, 19.950 8.870 190,9 127,0 64,0 V2+ d3 t2g3, e2, 12.100 5.380 174,0 51,5 122,0 Cr3+ d3 t2g3, e2, 17.400 7.730 250,0 74,0 176,0 Cr2+ d4 t2g3, e2, 14.000 6.220 101,0 29,8 71,0 Mn3+ d4 t2g3, e2, 21.000 9.330 151,0 44,6 106,0 Mn2+ d5 t2g3, e2, 7.500 3.330 0,0 0,0 0,0 Fe3+ d5 t2g3, e2, 14.000 6.220 0,0 0,0 0,0 Fe2+ d6 t2g4, e3, 9.350 4.160 44,7 29,9 14,8 Co3+ d6 t2g6, e3, 20.760 - - - - © Co2+ d7 t2g5, e4, 9.200 4.090 88,0 58,7 29,3 Ni2+ d8 t2g6, e4, 8.500 3.780 122,0 36,2 86,0 Cu+ d9 t2g6, e4, 12.000 5.330 86,1 25,5 60,6 (a) Valores obtidos experimentalmente para [M(H2O)6]3+. Lever A. B. P. (b) Valores calculados, considerando ∆t = 4/9∆o (c) Impossível calcular porque a espécie [Co(H2O)6]3+ é de baixo spin. Os resultados apresentados mostram que, para as espécies d1, d2, d5, d6, d7 e d9, os respectivos valores das EESOs são pequenos. Conseqüentemente, compostos de coordenação que tenham elementos centrais com essas configurações podem existir tanto na forma tetraédrica quanto na octaédrica, 6 dependendo dos outros fatores determinantes da estabilização desses compostos. Quando a correlação é feita entre espécies Td e Oh de spin baixo, verifica-se que, apenas, as espécies d1, d2, d9 apresentam possibilidades de formarem compostos tetraédricos. Para as outras configurações, predomina a formação de compostos octaédricos ou outras simetrias derivadas desta. 1.5 EFEITO DO CAMPO CRISTALINO EM ESPÉCIES DE SIMETRIA CÚBICA À semelhança do que acontece nos compostos tetraédricos, nas espécies químicas de simetria cúbica - que podem ser representados por fórmulas do tipo [ML8]q - os ligantes localizam-se, simetricamente, entre os orbitais dxy, dxz e dyz, porém, neste caso, ocupando os oito pontos eqüidistantes, existentes entresestes orbitais, como mostra a figura 9. Figura 9- Compostos de simetria cúbica +z +y -x +x -y -z ● ● ● ● ● ● ● ● ● ● Metal ● Ligante 7 Como nesses compostos existem duas vezes mais ligantes interagindo com os orbitais d do átomo central do que nos compostos tetraédricos, deve- se deduzir que a intensidade do desdobramento dos orbitais d sob campo cristalino cúbico, deve ser cerca de duas vezes superior ao verificado em espécies de simetria Td, conforme está ilustrado na figura 10. Figura 10 – Efeitos de campo cristalino em compostos tetraédricos e cúbicos ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ t2g ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ t2g ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ 10Dq(Td) 10Dq(cb) ↿⇂ ↿⇂ eg ↿⇂ ↿⇂ eg Íon sob campo esférico Complexo Complexo hipotético tetraédrico Sob o ponto de vista, apenas, das relações numéricas entre os ligantes e os orbitais d que interagem na formação dos compostos, se pode dizer que os valores de 10Dq em espécies cúbicas, tetraédricas e octaédricas se correlacionam, aproximadamente, pela expressão: 10Dq(Td) = 10Dq(cb)/2 = 4/9(10Dq(Oh)) É necessário ressaltar, porém, que a presença de um maior número de ligantes faz aumentar a repulsão destas espécies, umas sobre as outras, dificultando a formação de compostos octacoordenados, daí porque os E n e r g i a 8 compostos hexacoordenados, com simetria octaédrica ou simetrias derivadas desta, constituem a maioria dos compostos de coordenação. 4.6 COMPOSTOS DE SIMETRIA TETRAGONAL. A simetria tetragonal ocorre em espécies hexacoordenadas, onde duas das ligações metal-ligante são mais longas ou mais curtas do que as outras quatro. Essas distorções podem ser causadas pela natureza do ligante, do átomo central ou pelo efeito combinado destes dois fatores, gerando geometrias distorcidas em relação a octaédrica, como as ilustradas na figura 11. Figura 11: Espécies de simetria octaédrica com distorções tetragonais z z x x y y Em complexo do tipo [ML4L’2]q, onde M apresenta configuração d simétrica, e L é um ligante mais forte do que L′, as ligações M-L são mais curtas do que as ligações M-L’. Se L é um ligante mais fraco do que L′, ocorrerá o inverso. ● ● ● ● ● ● ● ● ● ● ● ● ● ● ● ●Metal ●Ligante 9 Em complexos do tipo [ML6]q, a distorção tetragonal é causada por assimetria na configuração eletrônica d do átomo central. A princípio essa distorção não deveria ocorrer, pois o alongamento de algumas das ligações sempre implica em instabilização dessas ligações. Porém, em alguns casos, este alongamento faz aumentar a estabilidade do composto. A explicação para este fato surgiu em 1937, a partir dos trabalhos de A. H. Jahn e E. Teller, daí porque a distorção tetragonal de complexos do tipo [ML6]q é conhecida como efeito Jahn-Teller. O teorema de Jahn- Teller, proposto por estes pesquisadores, estabelece que: “em moléculas não lineares que estejam num estado degenerado, deve ocorrer abaixamento de simetria, removendo a degeneração e baixando a energia”. Nos compostos de coordenação, esse efeito é causado pelas repulsões entre elétrons dos ligantes e elétrons dos orbitais d do átomo central, quando existe assimetria na distribuição eletrônica nesses orbitais. Estas possibilidades são apresentadas na tabela 5. Tabela 5 – Configurações eletrônicas passíveis do efeito Jahn-Teller Configuração d Distorção de Jahn-Teller Condição 10 d0 Não d1 Sim d2 Sim d3 Não d4 Sim Spin alto e spin baixo d5 Sim Spin baixo d6 Sim Spin alto d7 Sim Spin alto e spin baixo d8 Não d9 Sim d10 Não Como se sabe, o comprimento de uma ligação química é definido pelas dimensões das espécies ligadas e pelo equilíbrio entre as forças atrativas e repulsivas envolvidas na ligação. Assim, quando um ligante se coordena a um átomo metálico, que pode conter elétrons d no seu nível de valência, o comprimento da ligação metal-ligante tenderá a ser tanto menor quanto menor for o número de elétrons nos orbitais d. No caso dos compostos hexacoordenados, nos quais os ligantes se posicionam sobre os eixos cartesianos, onde também ficam os orbitais dz2 e dx2-y2, se houver assimetria na distribuição eletrônica entre estes dois orbitais os comprimentos das ligações serão diferentes. Como exemplos podem ser citados os compostos hexacoordenados do cobre(II) – [CuL6]q – que tem dois elétrons no orbital dx2-y2, e um elétron em dz2. O efeito Jahn-Teller, ao mesmo tempo em que provoca distorção na geometria do composto, se reflete num novo desdobramento dos orbitais d, gerando novos níveis de energia, conforme está ilustrado na figura 12. Vale ressaltar que este efeito, mesmo que em menor intensidade, também pode ser provocado por assimetria na distribuição eletrônica nos orbitais dxy, dxz e 11 dyz, que não ficam dirigidos frontalmente aos ligantes, mas, ficam próximos, quando ocorre a coordenação. Figura 12 – Distorção tetragonal com afastamento dos ligantes em z dx2-y2 dz2 dx2-y2 +1/ 2 δ 1 dz2 -1/2 10Dq d dxy +2/ 3 δ 2 -1/3 dxy dxz dyz dxz dyz Íon sob campo esférico Complexo Complexo Complexo hipotético octaédrico Tetragonal Quando ocorre alongamento de duas ligações sobre o eixo z, por exemplo, simultaneamente ocorre estabilização dos orbitais que tenham a componente z, especialmente o dz2 (figura 16). Como o baricentro deve ser mantido, então os orbitais que não têm a componente z são instabilizados. A distorção pode ocorre, também, com dois ligantes em posições trans se aproximando do átomo metálico, sobre o eixo z. Neste caso, os orbitais que têm componente z serão instabilizados, e o desdobramento dos orbitais eg e t2g, ocorre da forma mostrado na figura 13. Vale registrar que é impossível se predizer em quanto cada orbital eg ou t2g se estabiliza ou instabiliza pela distorção tetragonal. Pode-se afirmar, porém, que esse efeito (δ) é sempre menor do que 10Dq e que os orbitais t2g E n e r g i a 12 são menos afetados pela distorção do que os orbitais eg, pelo fato destes últimos estarem mais próximos dos ligantes. Pode-se dizer, ainda, que a determinação de valores de δ, possível de ser feita experimentalmente, se constitui numa demonstração do teorema que descreve o efeito Jahn-Teller. Figura 13 – Distorção tetragonal com aproximação dos ligantes em z dz2 dx2-y2 dz2 +1/ 2 δ 1 dx2-y2 -1/2 10Dq d dxz dyz +2/ 3 δ 2 -1/3 dxy dxz dyz dxy Íon sob campo esférico Complexo Complexo Complexo hipotético octaédrico Tetragonal O efeito Jahn-Teller pode ser mais bem entendido analisando-se o complexo [Ti(H2O)6]3+, que é um sistema bastante simples (configuração d1), com poucas possibilidades de interações repulsivas entre os ligantes e o único elétron d. É Impossível predizer quetipo de distorção deva acontecer no complexo, mas, certamente, os ligantes que se dirijam para o orbital que contenha o elétron d, ficarão mais afastados do que os outros. Deve ocorrer, então, quebra da degenerescência dos orbitais eg, e t2g, que podem se distribuir da forma mostrada na figura 14. E n e r g i a 13 Figura 14 – Orbitais d do [Ti(H2O)6]3+ dz2 eg ν 2 dx2-y2 ν 1 dxz, dyz t2g ↿ dxy ↿ Uma evidência desse fato é vista no espectro do [Ti(H2O)6]3+, mostrado na figura 8, onde se pode observar duas bandas de absorção devidas às transições t2g1, eg0 → t2g0, eg1. Uma das bandas aparece próximo de 16.000 cm-1 (ν1)e a outra em 20.300cm-1 (ν 2). Em alguns casos, as separações das bandas causadas por distorção tetragonal são grandes a ponto de fazer aparecerem picos bem diferenciados, como ocorre no espectro do [CoF6]3-, apresentado na figura 15. Esses dois exemplos já demonstram que o efeito Jahn-Teller existe. Porém, onde sua presença é mais notada é em compostos nos quais o átomo central tem configuração d9, como o Cu(II). Nestes compostos, o nono elétron fica emparelhado em dz2 ou em dx2--y2, que são degenerados. 14 Figura 15 - Espectro de ultravioleta e visível do K3[CoF6] em meio aquoso Comprimento de onda (λ) em nm 1000 833 714 625 10.000 12.000 14.000 16.000 Frequência em cm-1 Quando se forma o campo octaédrico, se os ligantes que estão posicionados sobre o eixo z ficam mais longe do metal do que os que se posicionam sobre os eixos x e y, então a distorção ocorre com os orbitais que tenham componente z ficando menos energéticos do que os que tenham apenas componentes x e y, gerando o diagrama de orbitais mostrado na figura 16. Com esse diagrama, a configuração eletrônica gerada pela coordenação de espécies d9 possibilita uma estabilização adicional, devida ao efeito Jahn-Teller, correspondente a (1/2).δ1. Não tem como se prever se ocorrerá encurtamento ou alongamento das ligações sobre o eixo z. Porém, os dados existentes mostram que os alongamentos são mais freqüentes do que os encurtamentos, conforme está ilustrado na tabela 6. 15 Figura 16 – Compostos de Cu(II) com ligações alongadas sôbre z dx2-y2 dz2 dx2-y2 ↿ +1/ 2 ↿⇂ ↿ δ 1 ↿⇂ dz2 -1/2 10Dq ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ dxy +2/ 3 δ 2 ↿⇂ ↿⇂ ↿⇂ -1/3 dxy dxz dyz ↿⇂ ↿⇂ dxz dyz Íon sob campo esférico Complexo Complexo Complexo hipotético octaédrico Tetragonal Outra forma de se evidenciar o efeito Jahn- Teller e de se mostrar a sua importância sob o ponto de vista químico, é analisar os valores das constantes de equilíbrio de formação de alguns quelatos. Por exemplo: na série que vai do Mn2+ ao Zn2+, essas constantes expressam os equilíbrios químicos das reações apresentadas a seguir: E n e r g i a 16 Tabela 6 – Típicos comprimentos de ligações em alguns compostos de cobre e de cromo Composto Ligações curtas Ligações longas Número Comprimento em pm Raio do Número Comprimento em pm Raio do Na2CuF4 4 (F) 191 120 2 (F) 237 166 K2CuF4 4 (F) 192 121 2 (F) 222 151 CuCl2 4 (Cl) 230 131 2 (Cl) 295 196 CuBr2 4 (Br) 240 2 (Br) 318 [Cu(NH3)]3+ 4 (N) 207 132 2 (N) 262 187 CrF2 4 (F) 200 119 2 (F) 243 172 KCrF3 2 (F) 200 119 4 (F) 214 143 [M(H2O)6]2+ + en D [M(H2O)4en]2+ + 2H2O; K1 [M(H2O)4en]2+ + em D [M(H2O)2(en)2]2+ + 2H2O; K2 [M(H2O)2(en)2]2+ + em D [M(en)3]2+ + 2H2O; K3 Os valores destas constantes de equilíbrio estão apresentados na tabela 7 e o comportamento dessas constantes é mostrado na figura 17. 17 Tabela 7 – Constantes de equilíbrio de reações de aquacomplexos com etilenodiamina. Complexos K1 K2 K3 - pK1 - pK2 - pK3 [Mn(H2O)nenm]2+ 1,15 0,95 0,35 [Fe(H2O)nenm]2+ 1,75 1,35 0,75 [Co(H2O)nenm]2+ 2,45 1,95 1,25 [Ni(H2O)nenm]2+ 3,15 2,65 1,85 [Cu(H2O)nenm]2+ 4,35 3,75 0,01 [Zn(H2O)nenm]2+ 2,45 2,05 0,75 Pode-se observar que os valores de K1 e K2 variam uniformemente. Já o valor de K3 sofre uma brusca descontinuidade na reação do [Cu(H2O)2(en)2]2+ para receber a terceira molécula da etilenodiamina, tornando-se muito pequeno. Isso pode ser explicado pelo fato do efeito Jahn-Teller ser pouco significativo quando existe assimetria na distribuição eletrônica apenas nos orbitais t2g (d6 e d7) ou inexistente, quando não se tem assimetria nem mesmo nesses orbitais (d5, d8 e d10). No caso do cobre, o efeito é importante porque envolve diretamente os orbitais eg,. Quando o primeiro e o segundo ligantes se coordenam, a distorção estrutural e orbital pode ocorrer sem dificuldade, com duas moléculas de água se ligando a uma maior distância do Cu2+, sobre o eixo z. Porém, quando o terceiro ligante se coordena ao metal, a distorção é dificultada, em virtude do ligante ser bidentado. Isso praticamente impede o efeito Jahn-Teller, além de fazer aparecer outras tensões no complexo, instabilizando-o. 18 Figura 18 – Constantes de equilíbrio de reações de aquacomplexos com etilenodiamina -1 0 1 2 3 4 5 Mn2+ Fe2+ Co2+ Ni2+ Cu2+ Zn2+ - p K A dificuldade para que o efeito Jahn-Teller ocorra no complexo tris- etilenodiamincobre(II), pode ser mais facilmente entendida analisando-se a estrutura formada com a entrada da terceira molécula do ligante, conforme ilustra a figura 19. Figura 19 – Estruturas do [Cu(H2O)2(en)2]2+ e do [Cu(en)3]2+. Z x en y z x + 2H2O K3; y K1 K2 K3 Mn2+ Fe2+ Co2+ Ni2+ Cu2+ Zn2+ H2O H2O N N N N N N N N N N Cu Cu 19 - COMPOSTOS QUADRADOS PLANARES Os compostos quadrados planares, esquematizados na figura 20, podem ser considerados como casos extremos de distorções tetragonais, nos quais os ligantes que poderiam existir sobre o eixo z foram removidos. Esses compostos são formados, principalmente, por íons metálicos d8, coordenados a ligantes fortes. Para elementos da primeira série de transição, só ligantes razoavelmente fortes produzem compostos com essa simetria, como é o caso do [Ni(CN)4]2-. Já nas séries seguintes, até mesmo haletos podem formar compostos dessa natureza, conforme se verificar nos compostos: [Pt(NH3)4]2+, [PdCl4]2- e [AuCl4]-. Figura 20 – Compostos de simetria quadrado planar z x y Como nesses compostos não existe nenhum ligante sobre o eixo z, os orbitais que tem componente z ficam mais estáveis. Por outro lado, o orbital dx2-y2 interage frontalmente com os quatro ligantes e, conseqüentemente, isto ● ● ● ● ● ● Metal ● Ligante 20 faz aumentar bastante a sua energia, bem como a energia do orbital dxy. Essasinterações fazem surgir o diagrama de energia dos orbitais d apresentado na figura 21. Com base no diagrama apresentado nessa figura, percebe-se que os sistemas d8 podem ficar com o orbital dx2-y2 vazio, possibilitando que os quatro ligantes interajam fortemente com o metal, formando compostos de spin baixo. Nessa distorção, a real posição do orbital dz2 é incerta, podendo ficar acima ou abaixo dos orbitais dxz e dyz. Figura 21 – Desdobramento dos orbitais d da simetria Oh para quadrado dx2-y2 dx2-y2 dx2-y2, dz2 10Dq dz2 dxy dz2 d dxy dxy, dxz, dyz dxz, dyz dxz, dyz Íon livre Simetrias Oh Tetragonal Quadrado planar A distorção tetragonal na sua possibilidade limite, que é a de formar compostos quadrados planares, pode esclarecer o comportamento químico de alguns elementos. Entre os constituintes do grupo IB, por exemplo, o cobre é mais estável no estado de oxidação +2, já o ouro é mais estável nos estados +1 e +3. Isto corre porque, no estado +2, o orbital dx2-y2 fica com um elétron. Como no ouro esse orbital é mais energético do que no cobre, E N E R G I A 21 logicamente existe facilidade para o elétron dx2-y2 ser removido, com o ouro(II) passando a ouro(III), formando compostos quadrados planares e estabilizando o sistema. FATORES QUE AFETAM O VALOR DE 10Dq O valor de 10Dq é dimensionado pela separação dos orbitais d, ocorrida durante as coordenações, tendo como fatores determinantes a carga do íon central, a simetria do campo formado, a natureza do ligante e o número quântico principal do orbital d de valência, como pode ser visto na tabela 8. Tabela 8 – Fatores que influenciam o valor de 10Dq. Íon complexo (Natireza do Estado de oxidação do Simetria do complexo Valor de 10Dq em cm-1 [CrF6]3- 3 Oh 15.060 [CrF6]2- 4 Oh 22.000 [FeCN)6]4- 2 Oh 32.200 [FeCN)6]3- 3 Oh 35.000 [CoF6]3- 3 Oh 13.100 [CrF6]4- 4 Oh 20.300 [VCl6]2- 4 Oh 15.400 VCl4 4 Td 7.900 [Co(NH3)6]2+ 2 Oh 10.200 [Co(NH3)4]2+ 2 Td 5.900 [Fe(H2O)6]3+ 3 Oh 14.000 [Fe(CN)6]3- 3 Oh 35.000 [CoF6]3- 3 Oh 13.100 [Co(H2O)6]3+ 3 Oh 20.760 22 [Co(NH3]3+ 3 Oh 22.870 [Rh(H2O)6]3+ 3 Oh 27.200 [Rh(NH3)6]3+ 3 Oh 34.100 [Ir(NH3)6]3+ 3 Oh 41.200 a) Carga do íon Central Como a teoria do campo cristalino tem como fundamento, considerar que as ligações metal-ligante são de natureza eletrostática, quanto maior a carga do íon central maior deve ser força da ligação e, portanto, maior deve ser o valor de 10Dq. Assim, o aumento de uma unidade de carga em um íon (de M2+ para M3+, por exemplo), provoca aumentos de cerca de 50 % no valor de 10Dq. Essa constatação é mais um argumento que evidencia a validade da TCC. Simetria do Campo Como já se discutiu anteriormente, a distribuição dos ligantes em torno do átomo (ou íon) central influi bastante sobre o valor de 10Dq. Assim, quando se passa da simetria tetraédrica para a octaédrica, o valor de 10Dq aumenta pelo fato dos ligantes ficarem mais próximos dos orbitais d no segundo caso do que no primeiro e, também, pela presença de mais ligantes interagindo mais diretamente com menos orbitais do átomo central. Figura 22 – Desdobramento dos orbitais d em vários campos cristalinos. 23 dx 2 -y 2 t2g dx 2 - 10Dq eg t2g dz 2 dxy 10Dq 10Dq 10Dq dz 2 dxy eg t2g dxz dyz dxz dyz eg Íon livre Td Cúbico Oh Tg Qp Campos dos ligantes As mais representativas influências de simetria de campo cristalino sobre o valor de 10Dq, bem como as modificações das energias dos orbitais d do átomo ou íon central, provocadas por estes campos, estão apresentadas de forma simplificada, na figura 22. 4.5.7.3 - Natureza do ligante Alguns dados que evidenciam a influência da natureza do ligante sobre o valor de 10 Dq, podem ser vistos nos espectros dos complexos: [Fe(H2O)6]3+ ν1 = 14.000 cm-1; [Fe(CN)6]3- ν1 = 35.000 cm-1; [CoF6]3- ν1 = 13.100 cm-1; [Co(H2O)6]3+ ν1 = 20.760 cm-1 e [Co(NH3)]3+ ν1 = 22.870 cm-1, Essa influência pode ser vista de forma ainda mais clara na figura 26, que apresenta espetros de complexos do cromo(III) com alguns ligantes. E n e r g i a 24 Em cada um dos espectros dessa figura, o pico de menor energia (ν1) corresponde a 10Dq, e os outros dois (ν2 e ν3) são devidas a outras transições, que serão discutidas posteriormente. Tomando-se várias séries de compostos em que o átomo ou íon central seja mantido e os ligantes sejam trocados, verifica-se que as posições relativas das bandas fundamentais (10Dq) quase sempre são mantidas, deslocando-se, para regiões de mais alta ou mais baixa energia, em função da força do ligante. A partir da observação deste fato, tornou-se possível ordenar os ligantes numa seqüência determinada pelas suas capacidades de afetar o valor de 10Dq. Essa seqüência é denominada SÉRIE ESPECTROQUÍMICA, que, para alguns dos ligantes mais estudados, assume a seguinte distribuição: I- < Br- < SCN - < Cl - < NO3- < F- < OH- < Ox2- < H2O < NCS- < CH3CN < NH3 < en < dipy < phen < NO2- < CN- < CO. Figura 26 – Espectros de complexos do cromo(III) 20.000 30.000 40.000 25 λ(nm) Com relação aos átomos doadores, verifica-se que, em geral, os valores de 10Dq aumentam na seqüência: Cl < S < O < N < C. Apesar da série espectroqímica permitir racionalizações sobre diferenças entre espectros de um grande número de compostos e, inclusive, possibilitar predições sobre algumas propriedades, ela apresenta dificuldades de interpretação quando se raciocina em termos do pré-suposto básico da TCC. Como, por essa teoria, a separação dos orbitais d resulta, apenas, de efeitos de cargas pontuais (de ânions, para ligantes aniônicos, ou dipolos, para ligantes moleculares) sobre o íon central, era de se esperar que ligantes aniônicos estivessem no fim da série espectroquímica. No entanto, o OH- está antes da H2O. Ao mesmo tempo, o NH3 produz maior efeito de campo 26 do que H2O, apesar da água ser mais polarizada do que o NH3 (µH2O = 6,17 .10-30 Cm e µH2O = 4,90 . 10-30 Cm). Fatos como esses podem trazer dúvidas sobre a validade da teoria do campo cristalino, inviabilizando a idéia de se procurar interpretar as ligações metal-ligante como resultantes, apenas, de ligações eletrostáticas. Número Quântico Principal do Orbital d de Valência Dados espectrais mostram, também, que, para espécies de mesma carga e mesma simetria, coordenadas a um mesmo ligante, o número quântico principal do orbital d de valência do átomo central influi bastante sobre o valor de 10Dq. Este fator gera uma mudança de cerca de 50%, quando se passa de um período para outro da tabela periódica, como pode ser visto nos espectros de soluções aquosas dos complexos [Co(NH3]3+, [Rh(NH3)6]3+ e [Ir(NH3)6]3+,nos quais os valores de 10Dq são, respectivamente, 22.870, 34.100 e 41.200 cm-1. O aumento de 10Dq com o valor de n, pode ser explicado em função da maior distância entre os elétrons d num sistema (n+1)d do que num sistema nd, permitindo deslocamento de cargas no primeiro mais facilmente do que no segundo Essa característica faz com que os complexos octaédricos de sistemas 4d e 5d sejam, quase sempre, de spin baixo.
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