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ADMINISTRAÇÃO DO CAPITAL DE GIRO Johny Henrique Magalhães Casado Fluxo de caixa Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Apresentar a ferramenta de orçamento de caixa. Descrever as premissas para a elaboração do fluxo de caixa operacional. Estruturar o fluxo de caixa operacional. Introdução A intensa concorrência tem obrigado as empresas a buscar diferenciais competitivos. Para tanto, elas podem: (i) criar produtos e serviços e adequar os produtos e serviços já ofertados ou (ii) tornar os negócios mais atrativos para os clientes, o que só é possível com o auxílio da gestão financeira. Uma gestão financeira bem feita contribui para a criação de um am- biente de negócios favorável, com boas condições de vendas de produtos e serviços. A gestão financeira também cuida do capital de giro; ou seja, os fundos necessários para sua operação diária. Nesse contexto, o fluxo de caixa é uma das ferramentas utilizadas no controle da manutenção das atividades organizacionais, identificando as necessidades de caixa, administrando prazos de recebimento e de pagamento e definindo volumes de capital com vistas à garantia de con- tinuidade das atividades empresariais a curto e médio prazos. Portanto, é fundamental que os gestores da área controlem o fluxo de caixa e saibam lidar com o orçamento e com o fluxo de caixa operacional. Neste capítulo, veremos como o orçamento de caixa pode ser apli- cado nas empresas. Também abordaremos as premissas principais para a estruturação do fluxo de caixa operacional. 1 O orçamento de caixa Segundo Gitman e Zutter (2010, p. 106), “[…] os planos fi nanceiros de longo prazo (estratégicos) expressam as ações fi nanceiras planejadas por uma em- presa e o impacto previsto dessas ações ao longo de períodos que vão de dois a dez anos”. Assim sendo, o planejamento fi nanceiro da empresa deve estar integrado ao planejamento das áreas de produção e marketing. O orçamento de caixa é uma das ferramentas mais utilizadas pela admi- nistração financeira, pois permite que gestores e empresas tenham noção das entradas de caixa a curto prazo, de modo que o gestor de caixa consiga identificar e sugerir oportunidades financeiras para a empresa com base nesses dados. A sua principal função do é auxiliar o gestor financeiro a definir se há ou não a necessidade de solicitar recursos externos para cobrir eventuais faltas de recursos no caixa da empresa. De acordo com Ross et al. (2015, p. 639), “[…] a ideia do orçamento de caixa é simples: ele registra as estimativas de recebimentos de caixa (o caixa que entra) e de desembolsos de caixa (o caixa que sai). O resultado é uma estimativa de excedentes ou de faltas de caixa”. Em geral, o orçamento de caixa é planejado para períodos de até um ano, sendo que muitas empresas o fazem para períodos mais curtos, como uma semana, uma quinzena, um mês, um bimestre, um trimestre ou um semestre. Conforme Gitman e Zutter (2010, p. 108), “[…] quanto mais sazonais e incertos os fluxos de caixa, maior o número de intervalos. Como muitas empresas se deparam com um padrão sazonal de fluxo de caixa, o orçamento de caixa é muitas vezes elaborado mensalmente”. Seguindo a lógica explicitada pelo autor, por outro lado, quando as organizações possuem fluxos de caixas estáveis, elas podem fazer uso do orçamento de caixa por períodos maiores, como um trimestre ou um semestre, já que os dados de movimentação de caixa seguem uma constante e não precisam ser atualizados com a mesma frequência dos dados relativos a um fluxo de caixa instável. Para realizar o orçamento de caixa, é necessário que a empresa conheça as perspectivas de vendas dos seus produtos ou serviços, informações que os responsáveis pela gestão financeira devem buscar junto ao departamento de marketing. A projeção de vendas pode se basear na análise de um dos três fatores a seguir: 1. revisão externa: “[…] baseia-se nas relações observadas entre as vendas da empresa e determinados indicadores econômicos externos fundamen- tais, como produto interno bruto (PIB), construção de novos imóveis residenciais, confiança do consumidor e renda pessoal disponível” (GITMAN; ZUTTER, 2010, p. 108). 2. Previsão interna: “[…] baseia-se em previsões consensuais de vendas dos canais da própria empresa. Normalmente, pede-se aos vendedores que estimem quantas unidades de cada tipo de produto esperam vender Fluxo de caixa2 no ano vindouro” (GITMAN; ZUTTER, 2010, p. 108). Esse tipo de previsão geralmente é realizado pelos gerentes de vendas, que também devem levar em consideração a capacidade produtiva da empresa no período em questão. 3. Previsão combinada: baseia-se em informações internas e externas, isto é, dados gerados pela própria empresa e dados recolhidos no mercado ou por institutos de pesquisas. Esse tipo de previsão permite o desen- volvimento de uma ampla base de dados, que gera informações mais completas e permite uma tomada de decisão com maior probabilidade de acerto e de representação da realidade. Nas palavras de Gitman e Zutter (2010, p. 108), [...] a empresa consome muito tempo e esforços para preparar uma projeção de vendas com o máximo de precisão possível. Uma análise “retrospectiva” das previsões do ano anterior pode ajudar a empresa a determinar que abordagem ou combinação de abordagens resulta em previsões mais precisas. Portanto, quanto mais completa for a previsão, melhor ela será para o trabalho dos gestores financeiros e da empresa como um todo. O orçamento de caixa é composto por dois tipos de movimentação de capital: os recebimentos e os desembolsos. Na Figura 1, podemos observar a síntese dos conceitos desses dois termos. Figura 1. Recebimentos e desembolsos aplicados ao orçamento de caixa. Fonte: Adaptada de Gitman e Zutter (2010). No exemplo a seguir, apresentamos o caso da empresa Organizações JHMC Ltda., que fez uso do seu orçamento de caixa. 3Fluxo de caixa A empresa Organizações JHMC Ltda. é dona da maior rede de sapatarias do Ceará, contando com 38 lojas em todo o estado: 12 localizadas na capital Fortaleza e as demais unidades distribuídas nas maiores cidades do estado. Com o objetivo de controlar o fluxo de caixa, o gestor financeiro principal determinou que a empresa recorresse ao orçamento de caixa, que deveria ser realização pelos três meses seguintes. Em contato com o departamento de marketing, o gestor obteve as seguintes pro- jeções de vendas: Mês 1: R$ 200.000,00; Mês 2: R$ 260.000,00; Mês 3: R$ 320.000,00. Em seguida, em reunião com o departamento contábil, o gestor obteve as seguintes projeções de despesas para o mesmo período: Mês 1: R$ 230.000,00; Mês 2: R$ 200.000,00; Mês 3: R$ 400.000,00. No entanto, para realizar o orçamento de caixa da Organizações JHMC Ltda., mais algumas considerações são importantes: ▶ A empresa necessita de um orçamento de caixa trimestral; ▶ Todas as entradas de caixa da empresa são oriundas da venda de sapatos nas suas lojas; ▶ No período em questão, a empresa não obteve nenhum outro tipo de recebi- mento, como vendas de ativos, receitas de investimentos ou demais entradas de caixa; ▶ A empresa iniciou o período com R$ 50.000,00 de saldo de caixa inicial, valor a receber resultante de vendas não recebidas no período anterior; ▶ Todos os valores de vendas que a empresa projeta referem-se a valores a serem recebidos à vista, ou seja, são recebidos no próprio mês em que estão descritos; ▶ A empresa determinou o valor de R$ 10.000,00 como saldo de caixa mínimo. A partir dos dados e dos valores citados acima, o orçamento de caixa da Organizações JHMC Ltda. ficaria projetado conforme os dados demonstrados no Quadro 1. Fluxo de caixa4 Analisando o orçamento de caixa da Organizações JHMC Ltda., podemos considerar que a empresa apresenta uma situação positiva em relação ao seu caixa nos dois primeiros meses. Afinal, no primeiro mês, ela projeta um valor positivode R$ 10.000,00 e, no segundo mês, esse valor sobe para R$ 70.000,00. Portanto, não há necessidade de buscar financiamento das atividades de capital para esses dois primeiros meses. Entretanto, a relação muda no terceiro mês, quando a empresa apresenta um caixa no valor negativo de R$ 10.000,00, o que exige que ela procure por uma fonte de financiamento para arcar com as suas despesas. A partir dessa análise, podemos afirmar que a Organizações JHMC Ltda. possui despesas altas no último mês averiguado, de modo que ela deve elaborar formas de reduzir esses valores e, assim, diminuir a demanda de capital de terceiros para financiar as suas atividades. Mês 1 Mês 2 Mês 3 Recebimentos R$ 200.000,00 R$ 260.000,00 R$ 320.000,00 (–) Desembolsos R$ 230.000,00 R$ 200.000,00 R$ 400.000,00 (=) Fluxo de caixa líquido R$ 30.000,00 R$ 60.000,00 R$ 80.000,00 (+) Saldo de caixa inicial R$ 50.000,00 R$ 20.000,00 R$ 80.000,00 (=) Saldo de caixa final R$ 20.000,00 R$ 80.000,00 – (–) Saldo de caixa mínimo R$ 10.000,00 R$ 10.000,00 R$ 10.000,00 (=) Financiamento total necessário – – R$ 10.000,00 (=) Saldo excedente de caixa R$ 10.000,00 R$ 70.000,00 – Quadro 1. Orçamento de caixa da Organizações JHMC Ltda. 5Fluxo de caixa Para Gitman e Zutter (2010, p. 113), o orçamento de caixa “[…] não é ape- nas uma excelente ferramenta para informar a administração quando haverá déficits ou superávits de caixa, mas também pode ser um documento exigido por credores em potencial”. Isso porque o orçamento de caixa também oferece informações sobre quando os valores dos empréstimos serão amortizados pela empresa. 2 O fluxo de caixa operacional A administração fi nanceira dispõe ainda de outras ferramentas para acompa- nhar a situação das fi nanças organizacionais. Entre elas, podemos destacar o fl uxo de caixa operacional da empresa, que representa o “[…] fl uxo de caixa que ela gera a partir de suas operações regulares — produção e venda de bens e serviços” (ROSS et al., 2015, p. 102). Na Figura 2, podemos visualizar a fórmula para calcular o fluxo de caixa operacional de uma empresa. Figura 2. Fórmula para calcular o fluxo de caixa operacional. É importante ressaltarmos que a empresa deve obter o valor do seu lucro líquido para poder calcular o fluxo de caixa operacional (ROSS et al., 2015). Ainda que obtenha um prejuízo líquido, ela pode apresentar um fluxo de caixa operacional positivo se as depreciações e demais despesas não desembolsáveis do período forem superiores ao valor do prejuízo. Além dessas, existem outras duas premissas a respeito da elaboração do fluxo de caixa operacional. Com relação à depreciação, temos de considerar que ela deve ser “[…] tratada como uma entrada de caixa em separado, apenas as variações brutas, e não líquidas, do ativo imobilizado aparecem na demonstração dos fluxos de caixa. Esse tratamento evita o risco de dupla contagem da depreciação” (GITMAN; ZUT- TER, 2010, p. 100). A última premissa que trata do fato de que os lançamentos Fluxo de caixa6 “[…] diretos de variações nos lucros retidos não são incluídos na demonstração dos fluxos de caixa” (GITMAN; ZUTTER, 2010, p. 100). Dessa forma, o primeiro passo para calcular o fluxo de caixa operacional da empresa é obter o valor do lucro operacional líquido após os impostos — cuja sigla, NOPAT, vem da expressão em inglês Net Operating Profit After Taxes. Esse valor é fundamental para que a empresa atinja um fluxo de caixa operacional fidedigno com a sua realidade (PADOVEZE, 2010). Na Figura 3, podemos ver a fórmula para calcular o lucro operacional líquido após os impostos. Na fórmula, T corresponde ao valor da alíquota aplicável e LAJIR corresponde ao valor do lucro antes dos juros e do imposto de renda no período do fluxo de caixa operacional. Figura 3. Fórmula para calcular o lucro operacional líquido após os impostos. Com o intuito de simplificar o cálculo do fluxo de caixa operacional, podemos substituir o NOPAT da fórmula pela equação que o representa. Nesse caso, obtemos o fluxo de caixa da empresa com base na fórmula que consta na Figura 4. Figura 4. Fórmula para calcular o fluxo de caixa operacional. Fonte: Adaptada de Higgins (2014). Alguns autores ainda utilizam as deduções dos impostos no cálculo do fluxo de caixa operacional (HIGGINS, 2014). Entretanto, essa decisão é exclusiva da empresa e, neste capítulo, estamos de acordo com os autores que optaram 7Fluxo de caixa por considerar a fórmula de cálculo do fluxo de caixa operacional conforme ilustrado na Figura 4. 3 A estruturação do fluxo de caixa operacional O cálculo do fl uxo de caixa operacional é muito utilizado por empresas que desejam implantar um novo projeto, pois é por meio desse cálculo que elas conseguem defi nir se o projeto é interessante ou não para os seus negócios. No exemplo a seguir, vamos supor que a empresa Organizações Brasil Ltda. realiza a projeção do seu fluxo de caixa operacional. A Organizações Brasil Ltda. é referência na produção de motocicletas e os seus produtos são vendidos em todo o Brasil. A empresa está projetando o lançamento de um novo modelo de moto para o próximo ano e, para isso, apresentará uma série de inovações, tendo a oportunidade de tornar-se líder no seu setor. Para isso, a empresa lançará duas versões do novo modelo, cujos valores são os seguintes: Modelo 1: LAJIR de R$ 35.000,00; depreciação no período de R$ 5.000,00; e valor de impostos igual a zero. Projeta-se a venda de 5.000 unidades desse modelo. Modelo 2: LAJIR de R$ 25.000,00; depreciação no período de R$ 7.000,00; e valor de impostos igual a zero. Projeta-se a venda de 4.500 unidades desse modelo. A partir dos valores descritos acima, a empresa obtém os seguintes valores de fluxo de caixa operacional: Fluxo de caixa do Modelo 1: (35.000 – 5.000) * 5.000 Total do fluxo de caixa do Modelo 1: R$ 150.000.000,00 Fluxo de caixa do Modelo 2: (25.000 – 7.000) * 4.500 Total do fluxo de caixa do Modelo 2: R$ 81.000.000,00 Considerando os dados apresentados, podemos interpretar que a Organização Brasil Ltda. obterá um fluxo de caixa operacional de R$ 150.000.000,00 caso opte por lançar o primeiro modelo de moto elétrica e de R$ 81.000.000,00 caso opte por lançar o segundo modelo. A decisão sobre qual é o melhor modelo a ser lançado ou, ainda, se a empresa lançará os dois modelos e projetará vendas menores para cada um deles deve levar em consideração o fluxo de caixa operacional almejado e outras informações, principalmente sobre o mercado de atuação, tendo em vista que as projeções de vendas ainda precisam ser confirmadas. Fluxo de caixa8 De acordo com Gitman e Zutter (2010, p. 95), “[…] do ponto de vista financeiro, as empresas muitas vezes se concentram no fluxo de caixa opera- cional, usado na tomada de decisões gerenciais”. Portanto, cabe ao gestor fazer uma boa projeção financeira, com dados confiáveis, que permita à empresa realizar a tomada de decisão com base em dados reais e fidedignos. Ademais, dois aspectos fundamentais do processo de planejamento financeiro são o planejamento de caixa e o planejamento de lucros, de modo que o fluxo de caixa contribui com a tarefa do administrador financeiro nas organizações. Fundamentados nos nossos estudos ao longo deste capítulo, podemos afirmar que o fluxo de caixa das organizações possui uma enorme importância para a análise da gestão do capital de giro, uma vez que possibilita aos gesto- res financeiros a geração de informações relevantes para todo o processo de tomada de decisão. Além disso, a gestão financeira demanda cada vez mais profissionais capacitados que dominem conceitos teóricos e saibam aplicá-los ao dia a dia das organizações, de modo que cabe aos que desejam atuar nesta área a busca constante por novos conhecimentos. GITMAN, L. J.; ZUTTER, C. J. Princípios de administração financeira. 12. ed. São Paulo: Pearson, 2010. HIGGINS, R. C. Análise para administração financeira.10. ed. Porto Alegre: AMGH, 2014. PADOVEZE, C. L. Contabilidade gerencial: um enfoque em sistema de informação con- tábil. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2010. ROSS, S. A. et al. Administração financeira. 10. ed. Porto Alegre: AMGH, 2015. Leitura recomendada PADOVEZE, C. L. Administração financeira: uma abordagem global. São Paulo: Saraiva, 2016. 9Fluxo de caixa Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu fun- cionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. Fluxo de caixa10